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106 IRVIN O. YALOM sexualizada e desvalorizar ou competir com todos os homens. Em sintese, fica claro que a potencia com- parativa dos fatores terapeuticos e uma ques- tao complexa. Diferentes fatores sao valoriza- dos por diferentes tipos de grupos de terapia, pelo mesmo grupo em diferentes estagios de desenvolvimento e por diferentes pacientes dentro do mesmo grupo, dependendo das ne- cessidades e capacidades individuais. Entretan- to, de urn modo geral, a maior parte das evi- dencias de pesquisas indica que a forc;a do gru- po interacional para pacientes externos ema- na de suas propriedades interpessoais. A inte- rac;ao e a explorac;ao interpessoais (abrangen- do a catarse e a autocompreensao) e a coesao grupal sao as condic;6es sine qua non da tera- pia de grupo efetiva. Os terapeutas de grupo efetivos devem direcionar seus esforc;os para 0 desenvolvimento maximo desses recursos te- rapeuticos. Os capitulos seguintes consideram o papel e as tecnicas do terapeuta de grupo, a partir do ponto de vista desses fatores tera- peuticos. Agora que consideramos a maneira como as pessoas mudam na terapia de grupo, e hora de analisar 0 papel do terapeuta no processo terapeutico. Neste capitulo, considero as tare- fas basicas do terapeuta e· as tecnicas pelas quais podem ser realizadas. Os quatro capitulos anteriores sustentam que a terapiae urn processo complexo que e composto de fatores elementares entrelac;ados de maneira intricada. 0 trabalho do terapeuta de grupo e criar 0 equipamento da terapia, coloca-Io em ac;ao e mante-l0 operando com efetividade maxima. As vezes, penso no grupo de.terapia como urn dfnamo enonne: 0 terapeu- ta mergulha no interior - trabalhando, experi- mentando, interagindo (e sendo influenciado pessoalmente pelo campo energetico). Em ou- tros momentos, ele veste roupas de mecfmico e conserta 0 exterior, lubrificando, apertando porcas e parafusos, substituindo pec;as. Antes de nos voltannos a tarefas e tecni- cas espedficas, eu gostaria de enfatizar algo ao qual retornarei muitas vezes nas pr6ximas paginas. Subjacente a todas as considerac;6es tecnicas, deve haver urn relacionamento con- sistente e positiv~ entre 0 terapeuta e 0 pacien- teo A postura basica do terapeuta com 0 pacien- te deve ser de interesse, aceitac;ao, genuinidade, empatia. Nada, nenhuma considera(:ao tecnica, tem precedencia sobre essa atitude. E claro que ha momentos em que 0 terapeuta desafia 0 pa- ciente, demonstra frustrac;ao e ate sugere que, se nao estiver disposto a trabalhar, 0 paciente deve pensar em deixar 0 grupo. Contudo, es- • • • • • • • • • o terapeuta: tarefas basicas ses esforc;os (que nas circunstancias certas po- dem ter poder terapeutico) nunca sao efetivos se nao forem comparados com 0 horizonte de urn relacionamento solidario e interessado en- tre 0 terapeuta e 0 paciente. Discutirei as tecnicas do terapeuta no que diz respeito a tres tarefas fundamentais: 1. Criac;ao e manutenc;ao do grupo. 2. Construc;ao de uma cultura de grupo. 3. Ativac;ao e esc1arecimento do aqui-e-agora. Discutirei a primeira delas apenas breve- mente, voltando a ela em maior detalhe apcs apresentar 0 material basico essencial dos Ca- pitulos 8, 9 e 10. Neste capitulo, concentro- me principalmente na segunda tarefa, constru- fao de uma cultura de grupo, e, no capitulo se- guinte, trato da terce ira tarefa, ativa(:ao e es- - clarecimento do aqui-e-agora. CRIA~AO E MANUTEN~AO DO GRUPO o lider e 0 unico responsavel por criar e reunir 0 grupo. Sua oferta de ctiuda profissio- nal ajuda a servir como a razao de ser inicial do grupo, e voce estabelece a hora e 0 local para os encontros. Uma parte consideravel da tarefa de manutenc;ao realiza-se antes de cada encontro e, como discutirei em capitulos pos- teriores, 0 conhecimento e a experiencia do Ji- der na selec;ao e na preparac;ao dos membros influenciara muito 0 destino do grupo. 108 IRVIN D. YALOM Quando 0 grupo come\a, 0 terapeuta tra- balba como urn guardiao, especialmente para prevenir atritos entre os membros. Ocasional- mente, urn individuo tera. uma experiencia negativa no grupo, resultando no termino pre- maturo da terapia. Por exemplo, 0 fracasso ou a rejei\ao em urn grupo podem ser tao per- turbadores para 0 paciente, a ponto de prepara- 10 de forma ideal para outro terapeuta. Toda- via, de urn modo geral, urn paciente que aban- dona 0 grupo no infcio deve ser considerado urn fracasso terapeutico. 0 paciente nao ape- nas nao teve beneficios, como 0 progresso do restante do grupo e afetado de forma adversa. A estabilidade dos membros e uma condi\ao sine qua non da terapia de grupo. Se houver desistencias, 0 terapeuta deve, com exce\ao de urn grupo fechado (ver Capitulo 10), adicio- nar novos membros para manter 0 grupo em seu tamanho ideal. No inicio, os pacientes sao estranhos uns aos outros e somente conhecem 0 terapeuta, que e a principal for\a que unifica 0 grupo. Os membros relacionam-se inicialmente por meio de seu relacionamento comum com 0 terapeuta e essas alian\as estabelecem 0 espa\o para 0 desenvolvimento da coesao grupal. o terapeuta deve reconhecer e deter quaisquer for\as que ameacem a coesao do grupo. Atrasos, ausencias, a forma\ao de subgrupos, socializa<;ao diruptiva fora do gru- po e 0 uso de bodes expiat6rios amea\am a integridade funcional do grupo e necessitam da interven<;ao do terapeuta. Cada uma dessas quest6es sera discutida em maior detalhe em capitulos posteriores. Por enquanto, e neces- sario apenas enfatizar a responsabilidade do terapeuta com as necessidades supra-indivi- duais. Sua primeira tarefa e ajudar a criar uma entidade fisica, urn grupo coeso. Havera mo- mentos em que voce devera esperar para tra- tar das necessidades de urn paciente individual e, as vezes, tera de tirar urn membro do grUpO, pelo bern dos outros. Uma vinheta c1fnica ilustra essas quest6es: Uma vez, apresentei duas novas participan- tes a urn grupo de pacientes externos. Esse grupo, com urn nuc1eo estavel de quatro ho- mens, tinha dificuldade para manter mu- lheres, sendo que duas haviam saido no mes anterior. A reuniao ja come\ou de maneira desfavoravel para uma delas, cujo perfume desencadeou urn ataque de espirros em urn dos homens, que afastou sua cadeira dela e, abrindo a janela vigorosamente, a infor- mou sobre sua alergia a perfumes e a "pro i- bi\ao de perfumes" no grupo. Nesse momento, chegou outro membro, Mitch, alguns minutos atrasado e, sem olbar para as mulheres, declarou: "Hoje eu preci- so de tempo para falar. Fiquei sacudido pela reuniao da semana passada. Fui para casa muito perturbado com seus comentanos de que eu sou urn porco. Nao gostei das insi- nua\6es de voces, ou da sua [falando comi- go]. Posteriormente naquela noite, tive uma briga enorme com a minha esposa, que nao gostou de eu ler urn jornal medico (Mitch era medico) na mesa do jantm; e nao fala- mos desde entao". Essa abertura espedfica era urn born come- \0 para a maioria das reuni5es de grupo, por varias raz5es. 0 paciente disse que pre- cisava de tempo para falar. (Quanto mais os membros chegam pedindo espa<;o e com vontade de trabalhar, mais energico sera 0 encontro.) Aieill disso, ele queria trabalhar quest6es que_foram levantadas no encon- tro anterior. (Como regra geral, quanto mais os membros trabalham temas de forma con- tinua a cada encontro, mais forte 0 grupo se torna.) Em seguida, ele come\ou a ata- car 0 terapeuta - 0 que foi born, pois esse grupo vinha me tratando bern demais. Eu sabia que 0 ataque de Mitch~ embora desconfortavel, produziria urn importante trabalho para 0 grupo. Assirn, eu tinha muitas opini6es diferentes para come\ar, mas havia uma tarefa a qual eu deveria dar mais prioridade: manter aintegridade funcional do grupo. Eu havia apresentado duas mulheres para urn grupo que ja tinha tido dificuldade para manter mulheres. E como os membros do grupo res- ponderam? Nada beml Eles praticamente haviam tirado os direitos das novas partici- pantes. Ap6s 0 incidente dos espirros, Mitch I nem sequer reconheceu a presen\a delas e mergulhou em urn discurso de abertura - que, embora pessoalmente irnportante, ex- c1uiu as novas mulheres sistematicamente, com sua referencia ao encontro passado. Entao, seria irnportante que eu encontras- se uma nova forma de abordar essa tarefa e, se possivel, tambem abordar as quest5es que Mitch havia levantado. No Capitulo 2, apresentei 0 principio Msico de que a tera- pia deveria tentar transformar todas as quest5es em quest5es do aqui-e-agora. Te- ria sido insensatez lidar explicitamente com a briga de Mitch com a sua esposa. Os da- dos que ele havia apresentado sobre ela eram tendenciosos e ele acabaria com qual- quer opiniao contraria a sua. Felizmente, contudo, havia uma maneira de lidar comambas as quest5es de uma s6 vez. A forma como Mitch tratou as duas mulhe- res no grupo assemelhava-se a forma como tratou a ~ua esposa na mesa .do jantar. Ele havia sido tao insensivel para com a pre- sen\a delas e de suas necessidades particu- lares quanta com as de sua esposa. De fato, era exatamente por causa.dessa insensibili- dade que 0 grupo 0 havia confrontado na reuniao anterior. Portanto, com meia hora de reuniao, afas- tei a aten\ao de Mitch de sua esposa e da sessao pass ada, dizendo: "Mitch, eu gosta- ria de saber 0 que voce acha que nossas duas novas participantes estao sentindo no gru- po hoje". Esse questionamento levou Mitch a ques- tao geral da empatia e de sua incapacidade ou indisposi\ao em muitas situa<;5es a en- trar no mundo das experiencias do outro. Felizmente, essa tMica nao apenas chamou a aten\ao dos outros membros do grupo para a maneira como todos haviam ignora- do as duas mulheres, como tambem ajudou Mitch a refletir efetivamente sobre seu prin- cipal problema: sua incapacidade de reco- nhecer e entender as necessidades e dese- jos dos outros. Mesmo que nao fosse possf- vellidar com algumas das quest6es centrais para Mitch, eu preferi optar por tratar da integra<;ao das novas participantes, pois a PSICOTERAPIA DE GRUPO 109 sobrevivencia fisica do grupo deve ter pre- cedencia sobre as outras tarefas. A CONSIRU~Ao DA CULIURA Quando 0 grupo e uma realidade fisica, a energia do terapeuta deve se voltar para transforma-lo em urn sistema social terapeu- tico. Urn c6digo verbal de regras ou normas de comportamento deve s!!r estabelecido para orientar a intera\ao do grupo. E quais sao as normas desejaveis para urn grupo terapeutico? Elas ocorrem logicamente a partir da discus- sao dos fatores terapeuticos. Considere por urn momento os fatores terapeuticos apresentados nos quatro prirnei- ros capitulos: aceita\ao e apoio, universalida- de, orienta\ao, aprendizagem interpessoal, al- truismo e esperan<;a - quem os proporciona? Obviamente, os outros membros do grupo! Assirn, ate certo ponto, 0 grupo e 0 agente da mudan~a. Ai esra uma diferen\a crucial nas regras basicas do terapeuta individual e do terapeuta de grupo. No formato individual, 0 terapeuta funciona como 0 unico agente de mudan\a di- reta designado. 0 terapeuta de grupo funcio- na de forma mais indireta. Em outras palavras, se sao os membros do grupo que, em suas intera~i5es, mobilizam os diversos fatores terapeuticos, a tarefa do terapeuta de grupo e eriar uma eultura grupaZ que eonduza ao mcixi- mo a intera~i5es efetivas no grupo. o jogo de xadrez e uma boa analogia para isso. Habeis ou nao, os jogadores nao come- \am 0 jogo tentando fazer urn xeque-mate ou capturar uma pe\a, mas tentam obter quadra- dos estrategicos no tabuleiro, aumentando as- sim 0 poder de cada uma de suas pe\as. Dessa forma, os jogadores avan<;am indiretamente para 0 sucesso pois, a medida que 0 jogo se- gue, essa posi\ao estrategica superior favore- cera urn ataque efetivo e 0 ganho material fi- nal. E dessa forma, tambem, 0 terapeuta de grupo constr6i metodicamente uma cultura que exercera urn grande poder terapeutico. Urn pianista de jazz, membro de urn dos meus bTftlPOS, comentou uma vez sobre 0 pa- 110 IRVIN D. YALOM pel do lider, refletindo que, no come<;o de sua carreira musical, ele admirava profunda men- te os grandes virtuoses instrumentais. Somen- te mais tarde foi que come<;ou a entender que os verdadeiros grandes musicos de jazz eram aqueles que sabiam como potencializar 0 som dos outros, como usar 0 silencio, como melho- rar 0 funcionamento da banda como urn todo. E obvio que 0 grupo de terapia tern nor- mas que diferem radicalmente das regras, ou da etiqueta, das intera<;5es socia is tfpicas. Ao contrario de quase todos os outros tipos de gru- po, os membros devem se sentir livres para co- mentar sentimentos imediatos que experimen- tam para com 0 grupo, os outros membros e 0 terapeuta. A honestidade e a espontaneidade de expressao devem ser estimuladas no grupo. Para que 0 grupo desenvolva urn verdadeiro microcosmo social, os membros devem inte- ragir livremente. Em forma esquematica, as vias de intera<;ao devem se parecer com 0 primeiro diagrama, e nao com 0 segundo, no qual as comunica<;5es ocorrem principalmente com ou por meio do terapeuta. Outras normas desejaveis incluem 0 en- volvimento ativo no grupo, a aceita<;ao impar- cial dos outros, uma auto-revela<;ao amp la, 0 desejo de autocompreensao e a vontade de mudar os atuais modos de comportamento. As normas podem ser uma prescri~ao para e uma proscri~ao contra certos tipos de comportamen- to, podendo ser implfcitas e explicitas. De fato, os membros de urn grupo geralmente nao po- dem elaborar as normas do grupo de forma consciente. Assim, para conhecer as normas de urn grupo, 0 pesquisador nao deve pedir que os membros fa<;am uma lista dessas regras ver- bais. Uma abordagem muito melhor e apresen- tar aos membros uma lista de comportamen- tos e pedir que eles indiquem quais sao apro- priados e quais sao inadequados para 0 grupo. Invariavelmente, criam-se normas em to- dos os tipos de grupo - sociais, profissionais e terapeuticos. 1 Nao ha como evitar que urn gru- po de terapia crie normas que acabam facili- tando 0 processo terapeutico. As observa<;5es sistematicas de grupos de terapia revelam que muitos estao sobrecarregados com normas de- bilitantes. Por exemplo, urn grupo pode valori- zar bastante a catarse hostil que nao produz sentimentos positivos, outro grupo pode desen- volver urn formato de "altemar a vez", no qual os membros descrevem seus problemas em se- quencia para 0 grupo, e outro po de ter normas que nao permitam que os membros questio- nem ou desafiem 0 terapeuta. Vou discutir al- gumas normas especificas que atrapalham ou faci1itam a terapia, mas antes quero conside- rar como as normas ocorrem. A constru~iio de normas As normas de urn grupo sao construidas a partir das expectativas dos membros em re- la<;ao ao seu grupo e do direcionamento expli- cito e implicito do lider e dos membros mais influentes. Se as expectativas dos membros nao sao firmes, 0 lider tern mais oportunidade para criar uma cultura de grupo que, em sua opi- niao, seja mais terapeutica. As declara<;5es do lider do grupo desempenham 0 papel podero- so, mas geralmente implicito, de determinar as normas estabelecidas no grupo. Y Em urn es- tudo, os pesquisadores observaram que quan- do 0 lider fazia urn comentario logo apos de- terminado membro agir; 0 membro tomava-se o centro das aten<;5es do grupo e muitas vezes assumia urn papel importante nos proximos en- contros. Alem disso, a relativa infrequencia dos comentarios do lider aumentavaa for<;a de suas interven<;6es.2 Pesquisadores que estudam gru- pos de forma<;ao experimental intensiva para terapeutas de grupo tambem concluiram que os lideres que eram modelos de afeto e conhe- cimento tecnico tinham resultados mais posi- tivos: os membros de seus grupos tinham mai- or autoconfian<;a e maior consciencia da dina- mica do grupo e do papel do lider.3 De urn modo geral, os lideres que estabelecem nor- mas de maior envolvimento e menor conflito tern melhores resultados clinicos.4 Ao discutir 0 lider como urn criador de normas, nao estou propondo urn papel novo ou limitado para 0 terapeuta. De forma volun- taria ou involuntaria, 0 lider sempre molda as normas do grupo e deve estar ciente dessa fun- <;ao. Assim como e impossivel nao se comuni- car, 0 lider nao consegue nao influenciar as no/"- mas. Praticamente todo 0 seu comportamento inicial no grupo tern influencia. Alem disso, aquilo que· nao se faz muitas vezes e tao im- portante quanta 0 que se faz. Uma vez, observei urn grupo orientado por urn analista de grupo britanico, no qual urn membra que esteve ausente nos seis en- contrOS anteriores chegou alguns minutos atra- sado. 0 terapeuta ignorou a chegada do mem- bro. Depois da sessao, ele explicou aos estu- dantes observadores que decidiu nao influen- ciar 0 grupo, pois preferia que eles fizessem suas proprias regras sobre como receber mem- bros atrasados ou prodigos. Ficou claro para mim, porem, que a falta de acolhimento por parte do terapeuta foi urn ato influente e uma forte sugestao para uma norma. Sem duvida como resultado de muitas atitudes semelhan- tes anteriores, seu grupo havia se transforma- do em urn grupo inseguro e desinteressado, cujos membros procuravam metodos para ob- ter a preferencia do lider. As normas sao criadas relativamente no come<;o da vida do grupo e, quando estabele- cidas, sao dificeis de mudar. Por exemplo, con- sid ere urn grupo pequeno em urn cenario in- dustrial que cria normas regulando 0 compor- tamento individual, ou uma gangue de delin- quentes que estabelece codigos de comporta- mento, ou uma clinica psiquiatrica que cria normas de comportamentos esperados para a equipe e os pacientes. E extremamente diffcil mudar padroes arraigados, exigindo urn tem- po consideravel e muitas vezes uma rotativi- dade muito grande dos membros. Em sintese: cada grupo cria urn conjunto de regras ou norm as verbais que detemlinam os seus procedinlentos. 0 grupo de terapia ideal tern normas que permitem que os fatores tera- PSICOTERAPIA DE GRUPO 111 peuticos operem com maxima efetividade. As normas sao moldadas pelas expectativas dos membros do grupo e pelo comportamento do terapeuta. 0 terapeuta tern uma grande in- fluencia no estabelecimento de normas - de fato, essa e uma fun<;ao que 0 lider nao pode evitar. As normas construidas no come<;o do grupo tern uma perseveran<;a consideravel. Assim, 0 terapeuta deve cumprir essa importan- te fun<;ao de maneira informada e deliberada. COMO 0 LiOER MOlDA AS NORMAS? Existem dois papeis basicos que 0 terapeu- ta pode assumir em urn grupo: 0 de especialis- ta tecnico e 0 de participante que estabelece modelos. Em cada urn desses papeis, 0 terapeuta ~uda a moldar as normas do grupo. o especialista tecnico Ao assumirem 0 papel de especialista tec- nico, os terapeutas deliberadamente vestem a roupagem de especialista e empregam uma variedade de tecnicas para levar 0 grupo a uma dire<;ao que considerem desejavel. Eles tentam moldar as normas explicitamente durante sua prepara<;ao dos pacientes para a terapia de gru- po. Nesse procedimento, descrito integralmen- te no Capitulo 10, os terapeutas instruem seus pacientes cuidadosamente sobre as regras do grupo e refor<;am a instru<;ao de duas manei- ras: baseando-a no peso da autoridade e da experiencia e apresentando 0 raciocinio por tras do modo de procedimento sugerido para ob- ter 0 apoio do grupo. No come<;o de urn grupo, os terapeutas tern uma ampla variedade de tecnicas a sua disposi<;ao para moldar a cultura do grupo, variando de instru<;6es e sugest6es explicitas a tecnicas de refor<;o sutis. Por exemplo, confor- me descrevi antes, 0 !ider deve tentar criar uma rede de intera<;6es, na qual os membros intera- jam livremente em vez de fazerem todos os co- mentarios para/ou por meio do terapeuta. Com essa finalidade, os terapeutas podem instruir os membros implicitamente em suas entrevis- tas antes do infcio do grupo ou nas primeiras 112 IRVIN D. YALOM sess6es. Eles podem perguntar muitas vezes du- rante os encontros pelas rea<;6es dos membros aos outros membros ou algum problema do grupo. Podem ainda: questionar por que a con- versa invariavelmente e voltada para 0 tera- peuta; negar-se a responder perguntas; pedir que 0 grupo fa<;a exercicios que ensinem os pacientes a interagir - por exemplo, pedir a cada membro do grupo para dar a sua primei- ra impressao dos outros; ou, de maneira muito menos obstrutiva, podem moldar 0 comporta- mento recompensando os membros que falam com os outros - sacudir a cabe<;a ou sorrir para eles, falar com eles de forma afetuosa ou mu- dar suas posturas para uma forma mais recep- tiva. AB mesmas abordagens podem ser aplica- das a variedade de outras normas que 0 tera- peuta deseja fomentar: auto-revela<;ao, expres- sao aberta de emo<;6es, prontidao, auto-explo- ra<;ao e assim por diante. Os terapeutas variam consideravelmente em seus estilos. Embora muitos prefiram mol- dar as normas explicitamente, todos os tera- peutas, em urn nfvel muitas vezes maior do que sup6em, cumprem suas tarefas por meio da tecnica sutil do refor<;o social. 0 comportamen- to humane e continuamente influenciado por uma serie de eventos ambientais (refor<;os), que podem ter uma valencia positiva ou nega- tiva, exercendo sua influencia consciente ou subliminarmente. AB tecnicas de publicidade ou propagan- da poHtica sao apenas dois exemplos de mo- biliza<;ao sistematica de agentes de refor<;o. A psicoterapia tambem se baseia no usa de re- for<;os sociais sutis e muitas vezes involuntarios. Embora poucos terapeutas conscientes gostem de se considerar agentes de refor<;o social, eles exercem influencia continuamente dessa ma- neira, seja de modo inconsciente ou delibera- do. Eles podem refor<;ar 0 comportamento po- sitivamente com divers os atos verbais e nao- verbais, induindo sacudir a cabe<;a, sorrir, in- dinar-se para a frente ou fazer urn "mmm" in- teressado ou uma pergunta direta para obter mais informa<;6es. Por outro lado, os terapeutas tentam extinguir 0 comportamento que nao parece salutar ao nao fazer comentarios a seu respeito, nao sacudir a cabe<;a, ignorar 0 com- portamento, voltar sua aten<;ao para outro pa- ciente, olhar de forma cetica, levantar as 50- brancelhas e assim por diante. De fato, a pes- quisa sugere que os terapeutas que refor<;am 0 comportamento dos membros indiretamente em favor do grupo muitas vezes sao mais efeti- vos do que aqueles que incentivam esse com- portamento de forma expHcita.s Qualquer di- retriz verbal obvia por parte do terapeuta tor- na-se especialmente efetiva por causa da ca- Fencia dessas interven<;6es. Toda a forma de psicoterapia e urn proces- so de aprendizado, baseado em parte no condi- cionamento operante. Qualquer terapia, mes- mo a psicanalise, sem alguma forma de refor<;o ou manipula<;ao do terapeuta e uma miragem que desaparece com 0 exame minucioso.6 Uma quantidade consideravel de pesqui- sas demonstra a eficacia de tecnicas de condi- cionamento operante para moldar 0 compor- tamento do grupo.? Usando essas tecnicas deli- beradamente, podem-se reduzir os silenciosB ou aumentar os comentarios pessoais ou do grupo, express6es de hostilidade para com 0 Hder ou aceita<;ao entre os membros.9 Embora hajaevidencias de que eles devem grande par- te de sua efetividade a esses principios da aprendizagem, os psicoterapeutas muitas ve- zes rejeitam essas evidencias por causa de seu temor infundado de que uma visao tao meca- nica sabote 0 componente humane essencial da experiencia terapeutica. Ainda assim, os fatos sao instigantes e a compreensao do pro- prio comportamento nao tira a espontaneida- de dos terapeutas. Afinal, 0 objetivo de se usa- rem tecnicas de condicionamento operante e fomentar 0 envolvimento autentico e signifi- cativo. Os terapeutas que reconhecem que exer- cern grande influencia por meio do refor<;o so- cial e que formulam urn principio organiza- cional central serao mais efetivos e consisten- tes em suas interven<;6es terapeuticas. o participante que estabelece modelos Os !ideres moldam as normas do grupo nao apenas pela engenharia social exp!icita ou im- plfcita, mas tambem pelo exemplo que dao com seu proprio comportamento no grupO.lO A cul- tura do grupo de terapia representa urn afasta- mento radical das regras sociais as quais os pa- cientes estao acostumados. Eles precisam des- cartar conven<;6es sociais familiares, experimen- tar novos comportamentos e correr muitos ris- cos. Como os terapeutas podem demonstrar para seus pacientes que 0 novo comportamento nao tera as conseqiiencias adversas previstas? Urn metodo, que tern uma consideravel base de pesquisas, e a modelagem: os pacientes sentem-se estimulados para alterar 0 seu com- portamento ao observar seus terapeutas exe- cutando 0 comportamento desejado livremen- te e sem efeitos adversos. Bandura demonstrou em muitos estudos controlados que os indivi- duos podem ser influenciados a ter comporta- mentos mais adaptativos (por exemplo, supe- rar fobias especificas) 11 ou menos adaptativos (por exemplo, agressividade irrestrita) 12 ao 0 b- servar e adotar 0 comportamento de outras pessoas. o !ider pode, oferecendo urn modele de aceita<;ao e entendimento imparcial das capa- cidades e de areas problematicas do individuo, ajudar a maldar urn grupo saudavel. Por outro lado, se os Hderes conceituarem seu papel como o de urn detetive da psicopat'ologia, os mem- bros do grupo 0 acompanharao. Por exemplo, uma mulher vinha trabalhando ativamente nos problemas dos outros membros do grupo, mas havia se negado terminantemente a revelar os seus proprios problemas. Finalmente, em urn encontro, ela confessou que urn ana antes ha- via passado dois meses em urn hospital psiquia- trico. 0 terapeuta respondeu reflexivamente: "Por que voce nao nos contou isso antes?". Esse comentario, que a paciente percebeu como punitiv~, serviu apenas para refor<;ar 0 seu medo e desestimular mais revela<;6es pes- soais. Obviamente, existem quest6es e comen- tarios que fecharao as pessoas e outros que as ajudarao a se abrir. 0 terapeuta tinha op<;6es de "abertura": por exemplo, "acho otimo que voce agora confie no grupo 0 suficiente para compartilhar esses fatos sobre voce"; ou "deve ter side diffcil para voce ficar no grupo, que- rendo compartilhar essa revela<;ao, mas tendo medo de faze-Io". PSICOTERAPIA DE GRUPO 113 o tider estabelece urn modelo de honesti- dade e espontaneidade interpessoais, mas tam- bern deve ter em mente as atuais necessidades dos membros e demonstrar comportamentos que sejam congruentes com elas. Nao conclua que os terapeutas de grupo devam expressar todos os sentimentos livremente. A desinibi<;ao total nao e mais salutar na terapia de grupo do que em outras formas de encontros hurnanos e pode levar a intera<;6es negativas e destrutivas. o terapeuta deve modelar a responsabilidade e o comedimento adequado alem da honestida- de. Queremos envolver nossos pacientes e per- mitir que eles nos afetem. De fato, 0 "envolvi- mento pessoal disciplinado" e urna parte valio- sa do armamentario do Hder de grupO.13 Penni- tir que nossos pacientes tenham inlportancia para nos nao e apenas terapeutico para eles, tambem podemos usar nossas proprias rea<;6es como dados valiosos sobre eles - desde que nos canhe<;amos 0 suficiente.Y Considere a seguinte interven<;ao, que foi efetiva do ponto de vista terapeutico: • Na primeira sessao de urn grupo de empre- sanos que se reuniam para urn laborat6rio de rela<;6es humanas de cinco dias, urn mem- bra afetado e agressivo de 25 anos, que ob- viamente havia bebido, come<;ou a dominar a reuniao e fazer papel de tolo. Ele se van- gloriou de suas realiza<;6es, diminuiu 0 gru- po, monopo!izou a reuniao, interrompeu, anulou e insultou todos os outros membros. Todas as tentativas de !idar com a situa<;ao - o feedback sobre 0 quanto os outros podiam estar se sentindo bravos ou magoados, ou interpreta<;6es sobre 0 significado e a causa de seu comportamento - fracassaram. En- tao, minha co-lfder comentou com sinceri- dade: "Sabe 0 que eu gosto em voce? Seu medo e sua falta de confian<;a. Voce esta apa- vorado, assinl como eu. Estamos todos apa- vorados com 0 que vai acontecer-nos nesta semana". Essa dedara<;ao permitiu que 0 paciente abandonasse sua fachada e, enfim, se tomasse urn membra valioso do grupo. Alem disso, a Hder, modelando urn estilo emparico e imparcial, ajudou a estabelecer uma cultura de grupo cortes e solidaria. 114 IRVIN D. YALOM Essa interven~ao efetiva exigiu que a co- Ifder primeiramente reconhecesse 0 impacto negativo do comportamento daquele membro e articulasse de mane ira solidaria a vulnerabi- lidade que esta por tras do comportamento ofensivo.14 Interagir como urn membro do grupo exi- ge, entre outras coisas, que os terapeutas acei- tern e admitam sua falibilidade pessoal. Os terapeutas que precisam parecer infalfveis dao urn exemplo confuso e obstrutivo para seus pa- cientes. As vezes, eles podem relutar tanto para admitir urn erro que se retraem ou se afastam em seu relacionamento corn 0 grupo. Por exem- plo, em urn grupo, 0 terapeuta, que precisava parecer onisciente, estaria viajando na proxinla reuniao. Ele sugeriu que os membros do grupo se encontrassem sem ele e gravassem 0 encon- tro, prometendo ouvir a fita antes da sessao se- guinte, mas esqueceu de ouvir a fita e nao ad- mitiu para 0 grupo. Conseqiientemente, a reu- niao subseqiiente, na qual 0 terapeuta enganou a todos evitando mencionar a sessao anterior, foi difusa, confusa e desestirnulante. Outro exemplo envolve urn terapeuta neOfito com necessidades semelhantes. Urn membro do grupo 0 acusou de fazer deelara- ~oes confusas e emoladas. Como foi a primei- ra vez que 0 terapeuta foi confrontado nesse grupo novo, os membros estavam tensos e sen- tados na ponta das cadeiras. 0 terapeuta 0 questionou se 0 paciente nao estava confun- dindo-o com alguem do passado. 0 membro que 0 atacava aceitou a sugestao, oferecendo o seu pai como candidato, e a crise passou, com os membros do grupo relaxando em suas ca- deiras. Todavia, esse mesmo terapeutaja tinha feito parte de urn grupo (de estudantes de psicoterapia) e seus colegas sempre se concen- travam em sua tendencia de fazer comentarios confusos e emolados. De fato, parecia que 0 paciente havia enxergado 0 terapeuta de uma forma bastante correta, mas foi persuadido a abandonar as suas percep<;oes. Se urn dos obje- tivos da terapia e ajudar os pacientes a testarem a realidade e eselarecerem seus relacionamen- tos interpessoais, essa transa~ao foi antitera- peutica. Esse e urn exemplo ern que as necessi- dades do terapeuta tiveram precedencia sobre as necessidades do paciente na psicoterapia.)" Outra conseqiiencia da necessidade de ser perfeito ocorre quando os terapeutas sao cau- telosos demais. Com medo de errar, eles esco- !hem suas palavras com tanto cuidado, intera- gindo de forma tao deliberada que sacrificam a espontaneidade e moldam urn grupo formal e sem vida. Muitas vezes,0 terapeuta que man- tern urn papel distante e onipotente esta di- zendo, na verdade: "Fa~am 0 que quiserem, voces nao podem me ferir ou me tocar". Essa postura pode ter 0 efeito contraproducente de agravar 0 sentido de impotencia interpessoal dos pacientes, impedindo 0 desenvolvimento de urn grupo autonomo. • Em urn grupo, umjovem chamado Les ha- via mexido-se pouco durante meses, ape- sar dos esfor~os vigorosos do !ider nesse sentido. Em praticamente todos os encon- tros, 0 lider tentava trazer Les para a dis- cussao, mas nao tinha jeito. Em vez disso, ele se tornava mais hostil e retraido, e 0 terapeuta ficava mais ativo e insistente. Fi- nalmente, Joan, outra participante, comen- tou para 0 terapeuta que ele era como urn pai cabe<;udo, tratando Les como urn filho teimoso, resolvido e determinado a muda- 10. Les estava gostando do papel do filho rebelde que estava determinado a derrotar o pai. 0 comentario de Joan pareceu corre- ~ to para 0 terapeuta, compativel com a sua experiencia interior, e ele reconheceu esse fato para 0 grupo e agradeceu a Joan por seus comentarios. Nesse exemplo, 0 comportamento do terapeuta foi extremamente importante para o grupo. Na verdade, ele disse que valorizava os membros, 0 grupo e essa forma de aprendi- zado. Alem disso, ele refor~ou as normas de auto-explora~ao e a intera<;ao honesta com 0 terapeuta. A transa~ao foi proveitosa para 0 terapeuta (infelizes dos terapeutas que nao conseguem aprender mais sobre si mesmos ern seu trabalho terapeutico) e para Les, que pas- sou a explorar os dividendos de sua postura desafiadora para com 0 terapeuta. Ocasionalmente, necessita-se de menoS modelagem por parte do terapeuta, por causa da presen<;a de certos membros ideais do gru- i·" po que preenchem essa fun~ao. De fato, exis- tern estudos em que membros selecionados sao introduzidos deliberadamente em um grupo para atuar como modelos. 1S Em urn estudo, pesquisadores introduziram aliados treinados (ern vez de pacientes, estudantes de pos-gra- dua<;ao em psicologia) em dois grupos de pa- cientes extemos.16 Eles fingiam ser pacientes, mas se reuniam regularmente com os tera- peutas e supervisores para discussoes. Seu pa- pel e comportamento eram planejados para facilitar, por seu exemplo pessoal, a auto-reve- la<;ao, a expressao livre de afeto, a confronta- <;ao com 0 terapeuta, 0 silenciamento dos monopolizadores, 0 bloqueio de subgrupos e assirn por diante. Os dois grupos foram estu- dados (por meio de questionarios de coesao e sociometricos administrados aos participantes) e os resultados indicaram que os participantes acreditavam que os falsos pacientes, ainda que nao fossem os membros mais populares, facili- tavam a terapia. Alem disso, os autores con- eluiram (ainda que nao houvesse grupos de controle) que os falsos pacientes serviram para aumentar a coesao grupal. Emboraum falso paciente treinado repre- sente uma forma de fraude incompativel com o processo da terapia de grupo, 0 usa desses individuos tern implica<;oes elinicas intrigan- tes. Por exemplo, urn novo grupo de terapia pode ser semeado com urn membro ideal de outro grupo, que entao continuaria a terapia nos dois grupos. Ou urn individuo que tenha coneluido sua· terapia de forma satisfatoria re- centemente po de servir como terapeuta auxi- liar para atuar como modele aurante 0 perfo- do de forma~ao do grupo novo. Talvez urn gru- po em andamento pudesse decidir acrescentar novos membros antes da gradua~ao de mem- bros antigos, em vez de depois, para capitali- zar a modelagem que membros experientes e bem-sucedidos proporcionam. Deixando essas possibilidades de lado, e o terapeuta quem, de forma voluntaria ou involuntaria, continuant a servir como 0 prin- cipal modelo para os membros do grupo. Con- seqiientemente, e de fundamental importan- cia que 0 terapeuta tenha suficiente autocon- fian<;a para cumprir com essa fun~ao. Se os terapeutas sentirem-se desconfortaveis, eles se- PSICOTERAPIA DE GRUPO 115 rao mais provaveis de encontrar dificuldades nesse aspecto de seu papel e se inelinariio para urn ou outro extrema em seu envolvimento pessoal no grupo: assumirao urn papel profis- sional fechado e confortavelou fugirao da an- siedade e responsabilidade inerente ao papel de !ider, sirnplesmente abdicando e se tornan- do mais urn membro da gangue. )"17 Os terapeutas neofitos sao particularmen- te propensos a essas posi<;oes de atividade ou inatividade exageradas diante de demand as emocionais que envolvem liderar grupos de terapia. Os dois extremos tern conseqiiencias desfavoraveis para 0 desenvolvimento de nor- mas do grupo. Urn !ider muito fechado criara normas de cautela e prote~ao. Urn terapeuta que se abstiver de sua autoridade nao conse- guira usar a ampla variedade de metodos dis- poniveis para moldar as normas. Alem disso, esse terapeuta criara urn grupo que provavel- mente nao conseguira trabalhar de forma pro- dutiva com importantes questoes relacionadas com a transferencia. A questao da transparencia do terapeuta tern implica~oes que vaG alem da tarefa de es- tabelecer normas. Y Quando os terapeutas re- velam-se no grupo, eles nao apenas modelam o comportamento, como realizam urn ato que tern grande irnportancia de muitas outras ma- neiras para 0 processo terapeutico. Muitos pa- cientes desenvolvem sentimentos conflituosos e distorcidos para com 0 terapeuta. A transpa- rencia do terapeuta facilita 0 traba!ho dos mem- bros com a transferencia_ Discutirei as ran1ifi- ca~oes da transparencia em maior detalhe no Capitulo 7. Passemos agora dessa discussao geral de normas para as normas especificas que aumentam 0 poder da terapia de grupo. EXEMPLOS DE NORMAS DE GRUPO TERAPEUTICAS o automonitoramento do grupo E irnportante que 0 grupo comece a assu- mir a responsabilidade pelo proprio funciona- mento. Se essa norma nao for desenvolvida, 0 grupo torna-se passivo, com membros que de- pendem do !ider para prover direcionamento e movimento. 0 !ider de um grupo assim, que 116 IRVIN D. YALOM se sente fatigado e irritado com 0 fardo de ter que fazer tudo funcionar, esta ciente de que algo saiu errado no desenvolvimento inicial do grupo. Quando dirijo grupos como esse, muitas vezes sinto que seus membros estao no cinema. E como se viessem ao grupo toda a semana para ver 0 que esta passando. Se eles se inte- ressarem, envolvem-se na reuniao. Se nao, pen- sam: "Que pena, espero que tenha urn fiIme melhor na semana que vern!". Minha tarefa no grupo e ajudar os membros a entenderem que eles sao 0 filme. Se nao se apresentarem, nao havera apresenta<;;ao: a tela ficara em branco. trabalhando de forma efetiva e quando esta desperdi<;ando 0 seu tempo". Se urn membro lamenta, por exemplo, que "a unica parte envolvente da reuniao fo- ram os primeiros 10 minutos - depois disso nos apenas batemos papo por 45 minutos", minha resposta e: "Entao por que voce deixou conti- nuar? Como voce poderia ter interrompido?" ou "Todos voces parecem saber disso. 0 que os impediu de agir? Por que sempre e minha fun- <;;ao fazer 0 que voces sao capazes de fazer?". Em seguida, hayed urn consenso sobre 0 que e improdutivo no trabalho do grupo. (E, quase invariaveImente, 0 trabalho produtivo ocorre quando 0 grupo mantem seu foco no aqui-e- agora - a ser discutido no proximo capitulo.) Desde 0 come<;;o, tento transferir a res- ponsabilidade do grupo para os seus membros. Sempre lembro que, no come<;;o de urn grupo, eu sou a unica pessoa na sala que tem uma boa definifao do que constitui um bom encontro de grupo. Meu trabalho e ensinar aos membros, Auto-revela"ao compartilhar essa defini<;;ao com eles. Assim, se 0 grupo tiver uma reuniao particularmente Os terapeutas de grupo podem discordar boa, gosto de defini-Iadessa forma. Por exem- sobre muitos aspectos do procedimento tera- plo, posso comentar ao final que "e hora de peutico de grupo, mas existe urn grande con- parar, que pena. Detesto interromper urn en- senso sobre uma questao: a auto-revelafao e contro desses". Em encontros futuros, sempre absolutamente essencial no processo terapeutico fa<;;o questao de me referir aquele encontro es- de grupo. Os participantes nao se beneficiarao pecffico. Em urn grupo jovem, urn encontro com a terapia de grupo, a menos qu~ se n~ve particularmente produtivo costurna ser segui- lem e 0 fa<;;am completamente .. Pr~,firo onen- do por outro em que os membros recuam urn tar urn grupo com' normas que mdlquem que pouco da intera<;;ao intensiva. Nesse outro en- - deve haver auto-re,vela<;;ao - mas no ri~o ?e contro, apos meia hora, comento: "Imagino cada membro. Prefiro que os membros nao sm- como todos se sentem com a reuniao de hoje. tam 0 grupo como urn confessionario for<;;ado, Como ela se compara com a da semana passa- onde revela<;;oes profundas sao arrancadas a da? 0 que fizemos de diferente na semana pas- for<;;a de cada membro, urn por urn. IS sada?" Durante as reunioes de prepara<;;ao antes Tambem e possivel ajudar os membros a do infcio do grup?, deixo essas questoes explf- desenvolverem uma defini<;;ao de uma boa reu- citas para os pacientes, para que eles entrem niao solicitando que examinem e avaliem par- para 0 grupo complet~n:ente inform,ados ~e tes de uma mesma reuniao. Por exemplo, nos que, para que se benefiClem da terapla, terao primeiros encontros de urn grupo, posso inter- de compartilhar partes muito fntimas de si mes- romper e dizer: "Vejo que se passou uma hora mos mais cedo ou mais tarde com os outros e gostaria de perguntar como esta 0 grupo hoje? membros do grupo. . . Voces estao satisfeitos com ele? Qual foi a par- Tenha em mente que 0 aspecto subJetlvo te mais envolvente do encontro de hoje ate da auto-revela<;;ao e 0 que realmente importa, aqui? E a menos envolvente?". A questao geral Podem haver momentos em que terapeutas ou e clara: tento transferir a fun<;;ao de avalia<;;ao observadores concluam erroneamente que 0 de mim para os membros do grupo. Digo para grupo nao esta revelando-se ou que a revel,a- eles: "Voces tern capacidade - e responsabili- <;;ao e superficial ou trivial. Muitas vezes, eXlS- dade _ para detenninar quando este grupo esta te uma discrepancia enorme entre a auto-re- vela<;;ao subjetiva e a objetiva - uma discrepan- cia que, de maneira incidental, confunde as pesquisas que mensuram a auto-revela<;;iio em escalas padronizadas. Muitos membros de gru- pos de terapia tiveram poucos confidentes fn- timos na vida. Dessa fonna, aquela revela<;;ao, que pode parecer pequena, pode ser 0 primei- ro ate de compartilhamento com alguma pes- soa. 0 contexte da revela<;;ao de cada indivf- duo e essencial para se entender 0 seu signifi- cado. Ter consciencia desse contexto e uma parte crucial do desenvolvimento de empatia, conforme ilustra 0 seguinte exemplo. • Urn membro de urn grupo, Mark, falou de forma lenta e metodica sobre sua intensa ansiedade social. Marie, uma jovem amar- ga e cronicamente deprimida, irritou-se com a longa e elaborada narrativa de suas di- ficuldades. Em urn certo ponto, ela questi- onou por que os outros pareciam incenti- var Mark e se animar com a sua fala, quan- do ela se sentia tao impaciente com a lenti- dao do grupo. Marie estava preocupada que nao conseguiria chegar em sua agenda pes- soal: obter orienta<;;ao sobre como se fazer mais agradavel. 0 feedback que recebeu a surpreendeu: os membros sentiam-se alie- nados dela por causa de sua incapacidade de sentir empatia pelos outros. 0 que esta- va acontecendo na reuniao com Mark era urn caso importante, disseram-lhe. Eles sen- tiam que a revela<;;ao pessoal de Mark na reuniao era urn grande passo para ele. 0 que a impedia de ver 0 que os outros viam? Essa era a questao crftica. Explorar essa di- ficuldade era 0 "conselho" que 0 grupo lhe of ere cia. Eo grande segredo? Urn membro pode chegar na terapia com urn segredo importante sobre algum aspecto central de sua vida - por exemplo, roubo compulsiv~, abuso de substan- cias secreto, uma senten<;;a criminal anterior, bulimia, travestismo, incesto. Eles se sentem em uma armadilha. Embora desejem trabalhar no grupo de terapia, tambem se sentem apa- vorados demais para compartilhar seu segre- do com urn grupo grande de pessoas. PSICOTERAPIA DE GRUPO 117 Em minhas sess6es preparatorias indivi- duais, deixo claro para esses pacientes que mais cedo ou mais tarde eles terao que comparti- lhar 0 segredo com os outros membros. Enfatizo que eles podem fazer isso em seu rit- mo proprio, podendo preferir esperar ate que sintam mais confian<;;a no grupo, mas que, urn dia, deve haver compartilhamento para que a terapia avance. Os membros que decidem nao compartilhar urn segredo importante estao destinado~ a simplesmente recriar no grupo os mesmos modos dubios de se relacionar com os outros que existem fora do grupo. Para mante- rem 0 segredo oculto, eles devem proteger qual- quer caminho que possa levar a ele. A vigilan- cia e a prote<;;ao aumentam, a espontaneidade diminui e aqueles que carre gam 0 segredo per- dem-se em uma rede crescente de inibi<;;ao ao seu redor. As vezes, e adaptativo guardar urn segre- do por urn tempo. Considere os dois membros de grupos a seguir, John e Charles. John era urn travesti desde os 12 anos e se travestia com freqiiencia, mas em segredo. Charles entrou para 0 grupo com cancer e disse que ja havia tide muito trabalho para aprender a enfrentar o cancer. Ele conhecia 0 seu prognostico: vive- ria por mais dois ou tres anos. Procurou, en- tao, a terapia de grupo para viver 0 restante de sua vida de forma mais completa, e queria especialmente relacionar-se de maneira mais intima com as pessoas importantes de sua vida.. Isso parecia urn objetivo legitimo para a tera- pia de grupo. Eu 0 coloquei em urn grupo de terapia regular para pacientes extemos. (Des- crevi 0 tratamento desse individuo integralmen- te em outro texto.)19 John e Charles preferiram nao revelar seus segredos por muitas sess6es e eu ja come<;;ava a ficar ansioso e impaciente. Eu fazia olhares in- tencionais ou cOI1vites sutis para eles. Finalmen- te, ambos integraram-se totalmente ao grupo e desenvolveram uma confian<;;a profunda nos outros membros. Apos aproximadamente 12 en- contros, decidiram se revelar completamente. Em retrospectiva, a decisao deles de postergar foi sensata. Os membros do grupo passaram a conhecer esses dois membros como pessoas, como John e Charles, que enfrentavam grandes 118 IRVIN D. YALOM problemas em suas vidas, nao como urn traves- ti e urn paciente com cancer. John e Charles es- tavamjustificavelmente preocupados que, se se revelassem cedo demais, eles seriam estereoti- pados e que 0 estereotipo impediria que os ou- tros membros os conhecessem integralmente. Como pode 0 lfder do grupo determinar se a demora do paciente em se revelar e ade- quada ou antiterapeutica? 0 contexto e imp or- tante. Mesmo que nao tenha havido uma reve- lac;ao total, existe urn movimento, ainda que lento, para maior abertura e confian<;a? Sera que a passagem do tempo vai facilitar a revela- c;ao, como aconteceu com John e Charles, ou aumentar a tensao e a evita<;ao? Muitas vezes, agarrar-se a urn grande se- gredo por tempo demais po de ser contrapro- ducente. Considere 0 seguinte exemplo: • Lisa, uma paciente em urn grupo de tempo limitado de seis meses, que havia trabalha- do por alguns anos como psicologa (apos obter sua formac;ao com 0 lider do grupo!), mas abandonara a pratica havia 15 anos para entrar para 0 mundo dos negocios, onde se tornou extraordinariamente bem- sucedida, entrou para 0 grupopor causa de sua insatisfac;ao com sua vida social. Lisa sentia-se so e alienada. Ela sabia que, como colocou, jogava com suas cartas "perto de- mais do corpo" - ela era cordial com os outros e era uma boa ouvinte, mas tinha uma tendencia a permanecer distante. Ela atribuia isso a sua enOllle riqueza, que acre- ditava ter de ocultar para nao causar inveja e ressentimento nos outros. No quinto mes, Lisa ainda nao havia reve- lado muita coisa. Ela ainda mantinha suas habilidades psicoterapeuticas e se mostra- va util para muitos membros, que a admi- ravam por sua percep<;ao e sensibilidade. Porem, replicava seus relacionamentos so- ciais externos no aqui-e-agora do grupo, po is sentia-se distante e escondida dos ou- tros membros. Lisa solicitou uma sessao in- dividual com 0 !ider do grupo para discutir a sua participac;ao. Durante essa sessao, 0 terapeuta a aconselhou a revelar as suas preocupac;6es com a sua riqueza e, especi- almente, sua formac;ao em psicoterapia, ad- vertindo que, se ela esperasse demais, aI- guem jogaria uma cadE;ira nela quando fi- nalmente dissesse ao grupo que ja tinha sido terapeuta. Finalmente, Lisa deu 0 saito e, nos ultimos encontros que restavam, fez mais trabaiho terapeutico do que em todos os outros encontros juntos. Que postura deve 0 terapeuta ado tar quando alguem revela urn grande segredo? Para responder a essa quesliio, devo fazer an- tes uma importante distin<;iio. Creio que, quan- do urn individuo revela urn grande segredo, 0 terapeuta deve ajuda-lo a revelar ainda mais sobre 0 segredo, mas de urn modo horizontal, em vez de vertical. Como revelafllo vertical, re- firo-me ao conteudo, a uma maior profundi- dade na revela<;ao do segredo. Por exemplo, quando John revelou 0 seu travestismo para 0 grupo, a tendencia natural dos membros foi explorar 0 segredo verticalmente. Eles pergun- taram detalhes: "Que idade voce tinha quan- do come<;ou?", "De quem eram as roupas de baixo que voce come<;ou a usar?", "Que fanta- sias voce tern quando se traveste?", "Como voce passa por mulher em publico com esse bigo- de?". Mas John ja havia revelado muita coisa verticalmente sobre 0 seu segredo, e agora se- ria mais importante para ele revelar algo hori- zontalmente: ou seja, revelar-se sobre a revela- ¢o (meta-revelat;:iio) - especialmente sobre os aspectos interacionais da revelariio.20 Assirn, quando John divulgou 0 seu tra- vestismo para 0 grupo, fiz perguntas como: ':Tohn, voce tern vindo ao grupo h3 aproxima- damente 12 encontros e nao conseguia com- partilhar isso conosco. Imagino como era para voce vir aqui a cada semana e permanecer em silencio sobre 0 seu segredo". "Voce estava desconfortavel com a perspectiva de compar- tilhar isso conosco?" "Nao parecia seguro para voce compartilhar isso antes, mas hoje voce decidiu falar. 0 que mudou no grupo ou em seus sentimentos para com 0 grupo que permi- tiu que voce falasse?" "Quais eram os seus me- dos no pass ado com relac;ao a revelar isso para nos? 0 que voce pensava que aconteceria? Como voce achava que responderiamos?" John respondeu que temia ser ridiculari- zado ou que rissem dele ou que 0 consideras- sem esquisito. Para continuar com essa inves- tigac;ao no aqui-e-agora, euo conduzi mais pro- fundamente no processo interpessoal, pergun- tando: "Quem no grupo ridicularizaria voce?" "Quem acharia voce esquisito?" E enta~, de- pois de John selecionar certos membros, eu 0 convidei a conferir essas vis6es com eles. Acei- tando a revelac;ao atrasada, ao inves de criti- car a demora, 0 terapeuta apoia 0 paciente e fortalece a cooperac;ao terapeutica. Como re- gra, sempre e born passar de afirmac;6es gerais sobre 0 "grupo" para afirma<;6es mais pessoais: em outras palavras, pe<;a que os membros di- ferenciem os outros membros do grupo. A auto-revelac;ao sempre e urn ato inter- pessoal. 0 irnportante nao e que 0 individuo se revele, mas que ele revele algo importante no contexto de seu relacionamento com os outros. o ato da auto-revelac;ao assume irnportancia verdadeira por causa de suas implica<;6es para a natureza dos relacionamentos atuais. Ainda mais importante do que 0 fato de. se tirar urn peso das costas e 0 fato de que a revelac;ao re- sulta em urn relacionamento mais profundo, mais rico e mais completo com outras pessoas. (E por iss6 que, ao contrario de-outros pesqui- sadores,Y nao considero a auto-revela<;ao como urn fator terapeutico separaao, mas a inc1uo na aprendizagem interpessoal.) A revela<;ao de abuso sexual ou incesto e particularmente carregada. As vitimas de abu- so sexual muitas vezes sao traumatizadas nao apenas pelo abuso em si, mas pela maneira como outras pessoas responderam quando re- velaram 0 abuso no passado. Nao e incomum que a revela<;ao inicial para a fanulia da vitima seja recebida com negac;ao, culpa e rejei<;ao. Como resultado, a ideia de se revelar no grupo de terapia evoca 0 medo de ser maltratado e ate uma nova traumatiza<;ao, em vez de espe- ran<;a de trabaihar 0 abuso.21 Se urn membro for pressionado demais para se revelaI; dependendo dos problemas do paciente especifico e seu estagio na terapia, res- pondo de diversas maneiras. Por exemplo, pos- so aliviar a pressao comentando: "Existem ob- viamente coisas que John ainda nao sente no sentido de compartilhar seus problemas. 0 gru- po parece impaciente, ate ansioso, para trazer John a bordo, mas ele ainda nao se sente sufi- PSICOTERAPIA DE {lRUPO 119 cientemente seguro ou confortavel" (a palavra "ainda" e importante, pois transmite as expec- tativas apropriadas). Continuo sugerindo que examinemos os aspectos inseguros do grupo, nao apenas pela perspectiva de John, mas tam- bern de outros membros. Assim, mudo a enfa- se do grupo, for<;ando revela<;6es para explo- rar os obstaculos a revelac;ao. 0 que produz 0 medo? Quais sao as conseqiiencias temidas previstas? De quem no grupo os membros es- peram desaprova<;ao? Ninguem jamais deve ser punido por sua auto-revelariio. Urn dos eventos mais destruti- vos que pode ocorrer em urn grupo e os mem- bros usarem material pessoal e sensivel que foi discutido de forma confiavel no grupo contra os outros em tempos de conflito. 0 terapeuta deve intervir vigorosamente se isso ocorrer. Nao apenas representa urn golpe baixo, como sa- bota importantes normas do grupo. Essa inter- venc;ao vigorosa pode assumir muitas formas. De algum modo, 0 terapeuta deve chamar aten- <;ao para a viola<;ao da confian<;a. Muitas ve- zes, simplesmente interrompo a a<;ao e 0 con- flito e mostro que algo muito irnportante aca- ba de acontecer no grupo. Pec;o que 0 membro of en dido fale de seus sentimentos sobre 0 in- cidente, pergunto aos outros sobre os seus, se alguem ja teve experiencias semeihantes, mos- tro como isso vai dificultar para que outros se revelem, e assirn por diante. Qualquer outro trabalho do grupo e temporariamente suspen- so. 0 fundamental e que 0 incidente seja en- fatizado para reforc;ar a norma de que a auto- revelac;ao nao apenas e importante, como se- gura. Somente apos a norma ter sido estabe- lecida, podemos examinar outros aspectos do incidente. Normas de procedimento o Formato otimo na terapia e que 0 gru- po nao seja estruturado, mas seja espontaneo e interaja livremente. Mas esse Jormato nunca evolui de uma forma natural: e necessario que 0 terapeuta molde a cultura ativamente. Ele deve combater muitas tendencias. A tendencia na- tural de um gmpo novo e dedicar uma reuniao inteira a cada um dos membros, em rota<;ao. 120 IRVIN D. YALOM Com freqiiencia, a primeira pessoa a falar ou a que apresenta a crise mais urgente naquela se- mana obtem 0 espa<;o naquela reuniao. Alguns grupos tern grande dificuldade para mudar 0 foco de urn membro para outro, pois existe uma norma de procedimentosegundo a qual qual- quer mudan<;a de tcpieo e considerada ruim, rude ou rejei<;ao. Os membros podem ficar em silencio: eles nao ousam interromper e pedir a vez, mas recusam-se a fazer perguntas ao ou- tro membro, pois esperam,:em silencio, que ele pare logo de falar. Esses padr5es atrapalham 0 desenvolvi- mento de urn grupo forte e resultam em frus- tra<;ao e desestimulo para 0 grupo. Prefiro li- dar com essas normas antiterapeuticas chaman- do aten<;ao para elas e indicando que, assim como as construiu, 0 grupo tern poder para muda-las. Por exemplo, posso dizer: "Tenho obser- vado que, nas ultimas sessoes, toda a reuniao foi dedicada a apenas uma pessoa, normalmen- te a primeira pessoa que fala naquele dia, e tambem que os outros nao parecem dispostos a interromper e, creio eu, mantem-se em si- lencio quando tern sentimentos importantes. Imagino como essa pratica come<;ou e se que- remos muda-la ou nao". Urn comentario dessa natureza pode ser libertador para 0 grupo. 0 terapeuta nao apenas deu voz a algo que to- dos sabem ser verdade, como levantou a pos- sibilidade de outras op<;oes. Alguns grupos desenvolvem urn formate de "check-in" formal, no qual os membros se altemam e discutem questoes importantes da semana anterior ou momentos de grande per- turba<;ao. As vezes, especialmente com grupos com membros muito ansiosos e disfuncionais, essa estrutura inicial e necessaria e facilitadora, mas, em minha experiencia, na maioria dos grupos, essa estrutura formal geralmente esti- mula urn encontro ineficiente, com urn enfoque nao-interativo e altemado no "la-e-entao". Pre- firo urn formato em que os membros possam simplesmente anunciar no infcio: "Preciso de espa<;o hoje", e eles e 0 terapeuta tentem, na evolu<;ao natural da sessao, voltar-se a cad a urn dos participantes. Os grupos especializados, especialmente aqueles com tempo limitado e membros mais problematicos, muitas vezes exigem normas de procedimento diferentes. Deve haver conces- s5es em nome do manejo eficiente do tempo e o lider deve construir uma estrutura explicita. Discutirei essas modifica<;5es tecnicas no Capi- tulo 15, mas por enquanto desejo apenas enfatizar 0 prindpio geral de que 0 lfder deve tentar estruturar 0 grupo de maneira a embu- tir as normas terapeuticas que discuti neste capitulo: apoio e confronta<;ao, auto-revela<;ao, automonitoramento, intera<;ao, espontaneida- de, a importancia dos membros do grupo como agentes de ajuda. A importiincia do grupo para seus membros Quanto mais importante os membros con- sideram 0 grupo, mais efetivo ele se toma. Acre- dito que a condi<;ao terapeutica ideal esta pre- sente quando os pacientes consideram que a reuniao do grupo de terapia e 0 evento mais importante da semana. 0 terapeuta deve re- for<;ar essa cren<;a de qualquer maneira pOSSI- ve!. Quando sou for<;ado a faltar a urn encon- tro, informo os membros antecipadamente e transmito minha preocupa<;ao quanta a minha ausencia. Sempre chego as reuniqes pontual- mente. Se penso 'no grupo entre as sess6es, posso compartilhar alguns desses pens amen- tos com os membros. Quaisquer revela<;5es pessoais que fa<;o sao feitas a servi<;o do grupo. Embora alguns terapeutas evitem essa revela- <;ao pessoal, creio que e importante articular 0 quanta 0 grupo importa para voce. Sempre incentivo os membros quando eles falam da utilidade do grupo ou quando indicam que pensaram nos outros membros durante a semana. Se urn membro lastima que o grupo nao va se reunir nas duas semanas das festas de fim de ano, digo para expressar seus sentimentos sobre sua conexao com 0 grupo. o que significa gostar do grupo? Reclamar da interrup<;ao? Ter urn lugar para descrever suas preocupa<;6es abertamente em vez de afogar a suas ansias? Quanto rna is continuidade houver entre as reunioes, melhor. Urn grupo que funcione bern continua a trabalhar as questoes de urn encontro para 0 outro. 0 terapeuta deve esti- I I i mular a continuidade. Mais do que qualquer urn, 0 terapeuta e 0 historiador do grupo, conectando eventos e encaixando experienci- as na matriz temporal do grupo. "1sso parece muito com 0 que John estava trabalhando duas semanas atras", ou "Ruthellen, notei que des- de que voce e Debbie tiveram aquele desen- tendimento ha tres semanas, voce ficou depri- mida e retraida. Como voce se sente agora para com Debbie?" E raro eu come<;ar uma reuniao de gru- po, mas, quando 0 fa<;o, e invariavelmente para dar continuidade entre as reuni5es. Assim, quando parece apropriado, posso come<;ar urn encontro dizendo: "A ultima reuniao foi muito intensa! Imagino que tipos de sentimento voces levaram do grupo para casa e como eles estao agora". No Capitulo 14, descreverei 0 resume do grupo, uma tecnica q\le serve para aumentar 0 sentido de continuidade entre- as reunioes. Es- crevo urn resume detalhado do encontro do grupo a cada semana (uma descri<;ao narrati- va editorializada do conteudo e do processo) e o envio aos membros entre as sess5es. Uma das fun<;6es 'mais importantes do resume e que ele proporciona mais urn contato semanal com o grupo e aumenta a probabilidade de que os temas de determinado encontro continuem no seguinte. o grupo aumenta em importancia quan- do os membros passam a reconhece-Io como urn rico reservatcrio de informa<;5es e apoio. Quando os membros expressam curiosidade sobre eles mesmos, de urn ou de outro modo, tento transmitir a cren<;a de que qualquer in- JonnQl;cro que os membros possam desejar sobre eles mesmos estd dispon[vel na sala do grupo, desde que aprendam como Jazer uso dela. As- sim, quando Ken questiona se ele e dominante e amea<;ador demais para os outros, meu re- flexo e responder: "Ken, existem muitas pessoas que 0 conhecem bern nesta sala. Por que voce nao pergunta a elas?". Os eventos que fortalecem os vfnculos entre os membros aumentam a potencia do grupo. E urn born pressagio quando os mem- bros do grupo saem para tomar urn cafe apes uma reuniao, tern longas conversas no estacio- namento ou se telefonam durante a semana PSICOTERAPIA DE GRUPO 121 em epocas de crise. (Esse contato fora do grupo nao esta livre de efeitos adversos potenciais, como discutirei em detalhe no Capitulo 11.) Os membros como agentes da ajuda o grupo funciona melhor se seus mem- bros entendem a ajuda valiosa que podem pro- porcionar uns aos outros. Se 0 grupo continua a enxergar 0 terapeuta como a uniea fonte de ajuda, e bastante improvavel que ele alcance urn nlvel adequado de autonomia e auto-res- peito. Para refor<;ar essa norma, 0 terapeuta pode chamar aten<;ao para incidentes que de- monstrem a utilidade mutua dos membros. 0 terapeuta tambem pode ensinar metodos mais efetivos para os membros se ajudarem. Por exemplo, apes urn paciente ter trabalhado uma questao com 0 grupo por grande parte da reu- niao, 0 terapeuta po de comentar: "Reid, voce pode refletir sobre os ultimos 45 minutos? Que comentarios 0 ajudaram mais equal foi 0 ulti- mo delest" ou; "Victor, vejo que voce esta es- perando para falar no grupo ha bastante tem- po e ate hoje nao conseguiu. De alguma for- ma, Eve 0 ajudou a se abrir. 0 que ela fez? E 0 que Ben fez hoje que pareceu fecha-Io em vez de abri-Io?". Nao se deve pennitir que com- portamentos que sabotem a norma de auxilio mutua passem despercebidos. Por exemplo, se urn membro desafia outro com rela<;ao a sua forma de tratar uma terceira pessoa, dizendo: "Fred, que direito voce tern de falar com Peter sobre isso? Voce e muito pior do que ele nesse sentido", posso intervir comentando: "Phil, acho que voce esta com sentimentos negativos com rela<;ao ao Fred hoje, talvez vindos de ou- tra fonte. Talvez devamos entrar neles. Toda- via, nao posso concordar quando voce diz que, como Frede parecido com Peter; ele nao pode ajudar. De fato, 0 oposto disso tern acontecido aqui no grupo". Apoio e confronta~iio Conforme enfatizei em minha discussao da coesao, e essencial que os membros perce- bam seu grupo de terapia como seguro e soli- 122 IRVIN D. YALOM dario. Essencialmente, no decorrer da terapia, muitas questoes desconfortaveis devem ser tocadas e exploradas. Muitos pacientes tern pro- blemas com a raiva, ou sao arrogantes ou con- descendentes ou insensiveis ou simplesmente intrataveis. 0 grupo de terapia nao pode ofe- recer ajuda sem que esses tra~os apare~am durante as intera~oes dos membros. De fato, seu surgimento e bern recebido como uma oportunidade terapeutica. Essencialmente, deve haver conflito no grupo de terapia e, como discutirei no Capitulo 12, ele e essencial para o trabalho da terapia. Entretanto, ao mesmo tempo, conflitos demais no comec;:o do grupo podem atrapalhar 0 seu desenvolvimento. An- tes que os membros se sintam suficientemente livres para expressar suas discordancias, eles devem se sentir suficientemente seguros e de- vern valorizar 0 grupo 0 suficiente para que estejam dispostos a tolerar reunioes desconfor- taveis. Assim, 0 terapeuta deve construir 0 gru- po com normas que permitam conflitos, mas apenas depois de estabelecer bases firmes de seguranc;:a e apoio. Muitas vezes, e necessario intervir para prevenir a prolifera~ao de confli- tos demais no come~o do grupo, conforme i!us- tra 0 seguinte incidente. • Em urn grupo de terapia novo, havia duas participantes particularmente hostis e, na terceira reuniao, ja havia consideravel cen- sura, sarcasmo e conflito. 0 quarto encon- tro foi aberto por Estelle (uma das duas), enfatizando 0 quanto 0 grupo nao tinha side uti! para ela ate aquele momento. Estelle tinha uma maneira de transformar cad a comentario positiv~ que fizessem sobre ela em algo negativo e agressivo. Ela reclama- va, por exemplo, que nao podia se expres- sar bern e que havia muitas coisas que que- ria dizer, mas que nao era articulada para conseguir transrniti-Ias. Quando outro mem- bro do grupo discordou e disse que achava Estelle extremamente articulada, ela 0 de- safiou por duvidar de seu julgamento. Mais adiante na reuniao, ela cumprimentou ou- tra participante, dizendo: "Ilene, voce e a (mica que me faz alguma pergunta inteli- gente". Obviamente, Ilene ficou bastante desconfortavel com esse cumprimento des- locado. Nesse momento, senti que era imperativo desafiar as normas de hostilidade e critica que haviam desenvolvido-se no grupo, e in- tervim vigorosamente .. Perguntei a Estelle: "Como voce acha que seu comentario para Ilene faz os outros membros se sentirem?". Estelle tossiu e hesitou, mas finalmente dis- se que eles talvez se sentissem insultados. Sugeri que ela perguntasse aos outros mem- bros. Ela 0 fez e viu que sua suposi~ao esta- va correta. Seu comentario nao apenas ha- via insultado a todos, como tambem havia feito Ilene se sentir irritada e desmoraliza- da. Entao, falei: "Estelle, parece que voce estava certa. Voce insultou 0 grupo. Tam- bern parece que voce sabia que isso aconte- ceria, mas 0 estranho e 0 beneficio disso para voce. 0 que voce ganha com isso?". Estelle sugeriu duas possibilidades. Primei- ramente, ela disse: "Eu preferia ser rejeita- da por insultar as pessoas do que por ser legal com elas". Essa logica parecia ser distorcida, mas, ainda assim, compreensi- vel. Sua segunda declarac;:ao foi: "Pelo me- nos, desse jeito eu sou 0 centro das aten- ~oes". "Como agora?", perguntei. Ela con- cordou, sacudindo a cabe~a. "E como isso parece agora?", questionei. Estelle disse: "E born". "E 0 resto da sua vida?", perguntei. Ela respondeu, de maneira ingenua: "E so- litaria. Na verdade, e isto aqui. Esta hora e meia representa as pessoas na minha vida". Falei: "Entao este grupo e urn lugar real- mente importante para voce?". Estelle con- cordou. Comentei: "Estelle, voce sempre diz que uma das razoes pelas quais critica os outros no grupo e que nao ha nada mais importante do que a honestidade comple- tao Porem, se quiser ser absolutamente ho- nesta conosco, acho que voce deve dizer 0 quanto somos importantes para voce e 0 quanto voce gosta de estar aqui. Voce nun- ca faz isso, e eu acho que voce deveria co- me~ar a investigar por que e tao doloroso e artiscado para voce mostrar aos outros 0 quanto eles sao importantes para voce". Nesse momento, Estelle havia assumido urn tom rna is conciliador e eu consegui ter rna is influencia, fazendo com que ela concordas- se que sua hostilidade e seus insultos cons- tituiam urn problema para ela e que seria born que chamassemos a sua aten~ao para isso - ou seja, se instantaneamente rotulas- semos qualquer comportamento insultuoso por parte dela. Sempre ajuda obter esse tipo de contrato dos membros: nos encontros seguintes, 0 terapeuta pode confrontar os membros com algum aspecto particular de seu comportamento, para 0 qual pediram que se Ihes chamasse a aten~ao. Como se sentem aliados nesse processo de reconhe- cimento e confronta~ao, sao muito menos provaveis de se sentir defensivos com a in- terven~ao. PSICOTERAPIA DE GRUPO 123 Muitos desses exemplos de comportamen- tos do terapeuta podem parecer deliberados, pedantes e ate pontificais. Eles nao sao os co- mentarios imparciais, nao-diretivos, exempla- res e esclarecedores tipicos do comportamen- to de urn terapeuta em outro~ aspectos do pro- cesso terapeutico. Todavia, e vital que 0 tera- peuta trate deliberadamente das tarefas de cria- ~ao do grupo e constru~ao de sua cultura. Es- sas tarefas estao por tras e, em urn grau am- plo, precedem grande parte do trabalho do terapeuta. E chegada a hora de nos voltarmos a ter- ceira tarefa basica do terapeuta: a ativac;:ao e a i!uminac;:ao do aqui-e-agora.
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