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TEXTO 1. INCLUSÃO – ESCOLA PARA TODOS (adaptado) Todas as crianças são bem-vindas à escola A inclusão é uma inovação, cujo sentido tem sido muito distorcido e um movimento muito polemizado pelos mais diferentes segmentos educacionais e sociais. No entanto, inserir alunos com déficits de toda ordem, permanentes ou temporários, mais graves ou menos severos no ensino regular nada mais é do que garantir o direito de todos à educação – e assim diz a Constituição! Inovar não tem necessariamente o sentido do inusitado. As grandes inovações estão, muitas vezes na concretização do óbvio, do simples, do que é possível fazer, mas que precisa ser desvelado, para que possa ser compreendido por todos e aceito sem outras resistências, senão aquelas que dão brilho e vigor ao debate das novidades. O objetivo de nossa participação neste evento é clarear o sentido da inclusão, como inovação, tornando- o compreensível, aos que se interessam pela educação como um direito de todos, que precisa ser respeitado. Pretendemos também demonstrar a viabilidade da inclusão pela transformação geral das escolas, visando a atender aos princípios deste novo paradigma educacional. Para descrever o nosso caminho na direção das escolas inclusivas vamos focalizar nossas experiências, no cenário educacional brasileiro sob três ângulos: o dos desafios provocados por essa inovação, o das ações no sentido de efetivá-la nas turmas escolares, incluindo o trabalho de formação de professores e, finalmente o das perspectivas que se abrem à educação escolar, a partir de sua implementação. UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS O princípio democrático da educação para todos só se evidencia nos sistemas educacionais que se especializam em todos os alunos, não apenas em alguns deles, os alunos com deficiência. A inclusão, como consequência de um ensino de qualidade para todos os alunos provoca e exige da escola brasileira novos posicionamentos e é um motivo a mais para que o ensino se modernize e para que os professores aperfeiçoem as suas práticas. É uma inovação que implica num esforço de atualização e reestruturação das condições atuais da maioria de nossas escolas de nível básico. O motivo que sustenta a luta pela inclusão como uma nova perspectiva para as pessoas com deficiência é, sem dúvida, a qualidade de ensino nas escolas públicas e privadas, de modo que se tornem aptas para responder às necessidades de cada um de seus alunos, de acordo com suas especificidades, sem cair nas teias da educação especial e suas modalidades de exclusão. O sucesso da inclusão de alunos com deficiência na escola regular decorre, portanto, das possibilidades de se conseguir progressos significativos desses alunos na escolaridade, por meio da adequação das práticas pedagógicas à diversidade dos aprendizes. E só se consegue atingir esse sucesso, quando a escola regular assume que as dificuldades de alguns alunos não são apenas deles, mas resultam em grande parte do modo como o ensino é ministrado, a aprendizagem é concebida e avaliada. Pois não apenas os deficientes são excluídas, mas também as que são pobres, as que não vão às aulas porque trabalham, as que pertencem a grupos discriminados, as que de tanto repetir desistiram de estudar. OS DESAFIOS Toda criança precisa da escola para aprender e não para marcar passo ou ser segregada em classes especiais e atendimentos à parte. A trajetória escolar não pode ser comparada a um rio perigoso e ameaçador, em cujas águas os alunos podem afundar. Mas há sistemas organizacionais de ensino que tornam esse percurso muito difícil de ser vencido, uma verdadeira competição entre a correnteza do rio e a força dos que querem se manter no seu curso principal. Um desses sistemas, que muito apropriadamente se denomina “de cascata”, prevê a exclusão de algumas crianças, que têm déficits temporários ou permanentes e em função dos quais apresentam dificuldades para aprender. Esse sistema contrapõe-se à melhoria do ensino nas escolas, pois mantém ativo, o ensino especial, que atende aos alunos que caíram na cascata, por não conseguirem corresponder às exigências e expectativas da escola regular. Para se evitar a queda na cascata, na maioria das vezes sem volta, é preciso remar contra a correnteza, ou seja, enfrentar os desafios da inclusão: o ensino de baixa qualidade e o subsistema de ensino especial, desvinculado e justaposto ao regular. Priorizar a qualidade do ensino regular é, pois, um desafio que precisa ser assumido por todos os educadores. É um compromisso inadiável das escolas, pois a educação básica é um dos fatores do desenvolvimento econômico e social. Trata-se de uma tarefa possível de ser realizada, mas é impossível de se efetivar por meio dos modelos tradicionais de organização do sistema escolar. Se hoje já podemos contar com uma Lei Educacional que propõe e viabiliza novas alternativas para melhoria do ensino nas escolas, estas ainda estão longe, na maioria dos casos, de se tornarem inclusivas, isto é, abertas a todos os alunos, indistinta e incondicionalmente. O que existe em geral são projetos de inclusão parcial, que não estão associados a mudanças de base nas escolas e que continuam a atender aos alunos com deficiência em espaços escolares semi ou totalmente segregados (classes especiais, salas de recurso, turmas de aceleração, escolas especiais, os serviços de itinerância). As escolas que não estão atendendo alunos com deficiência em suas turmas regulares se justificam, na maioria das vezes pelo despreparo dos seus professores para esse fim. Existem também as que não acreditam nos benefícios que esses alunos poderão tirar da nova situação, especialmente os casos mais graves, pois não teriam condições de acompanhar os avanços dos demais colegas e seriam ainda mais marginalizados e discriminados do que nas classes e escolas especiais. Em ambas as circunstâncias, o que fica evidenciado é a necessidade de se redefinir e de se colocar em ação novas alternativas e práticas pedagógicas, que favoreçam a todos os alunos, o que, implica na atualização e desenvolvimento de conceitos e em aplicações educacionais compatíveis com esse grande desafio. Muda então a escola ou mudam os alunos, para se ajustarem às suas velhas exigências? Ensino especializado em todas as crianças ou ensino especial para deficientes? Professores que se aperfeiçoam para exercer suas funções, atendendo às peculiaridades de todos os alunos, ou professores especializados para ensinar aos que não aprendem e aos que não sabem ensinar? AS AÇÕES Visando os aspectos organizacionais A nosso ver é preciso mudar a escola e mais precisamente o ensino nelas ministrado. A escola aberta para todos é a grande meta e, ao mesmo tempo, o grande problema da educação na virada do século. Mudar a escola é enfrentar uma tarefa que exige trabalho em muitas frentes. Destacaremos as que consideramos primordiais, para que se possa transformar a escola, em direção de um ensino de qualidade e, em consequência, inclusivo. Temos de agir urgentemente: • Colocando a aprendizagem como o eixo das escolas, porque escola foi feita para fazer com que todos os alunos aprendam; • Garantindo tempo para que todos possam aprender e reprovando a repetência; • Abrindo espaço para que a cooperação, o diálogo, a solidariedade, a criatividade e o espírito crítico sejam exercitados nas escolas, por professores, administradores, funcionários e alunos, pois são habilidades mínimas para o exercício da verdadeira cidadania; • Estimulando, formando continuamente e valorizando o professor que é o responsável pela tarefa fundamental da escola – a aprendizagem dos alunos; • Elaborando planos de cargos e aumentando salários, realizando concursos públicosde ingresso, acesso e remoção de professores. Que ações implementar para que a escola mude? Para melhorar as condições pelas quais o ensino é ministrado nas escolas, visando, universalizar o acesso, ou seja, a inclusão de todos, incondicionalmente, nas turmas escolares e democratizar a educação, sugerimos o que, felizmente, já está ocorrendo em muitas redes de ensino, verdadeiras vitrines que expõem o sucesso da inclusão. A primeira sugestão para que se caminhe para uma educação de qualidade é estimular as escolas para que elaborem com autonomia e de forma participativa o seu Projeto Político Pedagógico, diagnosticando a demanda, ou seja, verificando quantos são os alunos, onde estão e porque alguns estão fora da escola. Sem que a escola conheça os seus alunos e os que estão à margem dela, não será possível elaborar um currículo escolar que reflita o meio social e cultural em que se insere. A integração entre as áreas do conhecimento e a concepção transversal das novas propostas de organização curricular consideram as disciplinas acadêmicas como meios e não fins em si mesmas e partem do respeito à realidade do aluno, de suas experiências de vida cotidiana, para chegar à sistematização do saber. Como essa experiência varia entre os alunos, mesmo sendo membros de uma mesma comunidade, a implantação dos ciclos de formação é uma solução justa, embora ainda muito incompreendida pelos professores e pais, por ser uma novidade e por estar sendo ainda pouco difundida e aplicada pelas redes de ensino. De fato, se dermos mais tempo para que os alunos aprendam, eliminando a seriação, a reprovação, nas passagens de um ano para outro, estaremos adequando o processo de aprendizagem ao ritmo e condições de desenvolvimento dos aprendizes – um dos princípios das escolas de qualidade para todos Por outro lado, a inclusão não implica em que se desenvolva um ensino individualizado para os alunos que apresentam déficits intelectuais, problemas de aprendizagem e outros, relacionados ao desempenho escolar. Na visão inclusiva, não se segregam os atendimentos, seja dentro ou fora das salas de aula e, portanto, nenhum aluno é encaminhado às salas de reforço ou aprende, a partir de currículos adaptados. O professor não predetermina a extensão e a profundidade dos conteúdos a serem construídos pelos alunos, nem facilita as atividades para alguns, porque, de antemão já prevê a dificuldade que possam encontrar para realizá-las. Porque é o aluno que se adapta ao novo conhecimento e só ele é capaz de regular o seu processo de construção intelectual. A avaliação constitui outro entrave à implementação da inclusão. É urgente suprimir o caráter classificatório da avaliação escolar, através de notas, provas, pela visão diagnóstica desse processo que deverá ser contínuo e qualitativo, visando depurar o ensino e torná-lo cada vez mais adequado e eficiente à aprendizagem de todos os alunos. Essa medida já diminuiria substancialmente o número de alunos que são indevidamente avaliados e categorizados como deficientes, nas escolas regulares. A aprendizagem como o centro das atividades escolares e o sucesso dos alunos, como a meta da escola independentemente do nível de desempenho a que cada um seja capaz de chegar são condições de base para que se caminhe na direção de escolas acolhedoras. O sentido desse acolhimento não é o da aceitação passiva das possibilidades de cada um, mas o de serem receptivas a todas as crianças, pois as escolas existem, para formar as novas gerações, e não apenas alguns de seus futuros membros, os mais privilegiados. A inclusão não prevê a utilização de métodos e técnicas de ensino específicas para esta ou aquela deficiência. Os alunos aprendem até o limite em que conseguem chegar, se o ensino for de qualidade, isto é, se o professor considera o nível de possibilidades de desenvolvimento de cada um e explora essas possibilidades, por meio de atividades abertas, nas quais cada aluno se enquadra por si mesmo, na medida de seus interesses e necessidades, seja para construir uma idéia, ou resolver um problema, realizar uma tarefa. Eis aí um grande desafio a ser enfrentado pelas escolas regulares tradicionais, cujo paradigma é conteudista, e baseado na transmissão dos conhecimentos. O trabalho coletivo e diversificado nas turmas e na escola como um todo é compatível com a vocação da escola de formar as gerações. É nos bancos escolares que aprendemos a viver entre os nossos pares, a dividir as responsabilidades, repartir as tarefas. O exercício dessas ações desenvolve a cooperação, o sentido de se trabalhar e produzir em grupo, o reconhecimento da diversidade dos talentos humanos e a valorização do trabalho de cada pessoa para a consecução de metas comuns de um mesmo grupo. A tutoria nas salas de aula tem sido uma solução natural, que pode ajudar muito os alunos, desenvolvendo neles o hábito de compartilhar o saber. O apoio ao colega com dificuldade é uma atitude extremamente útil e humana e que tem sido muito pouco desenvolvida nas escolas, sempre tão competitivas e despreocupadas com a construção de valores e de atitudes morais. Além dessas sugestões, referentes ao ensino nas escolas, a educação de qualidade para todos e a inclusão implicam em mudanças de outras condições relativas à administração e aos papéis desempenhados pelos membros da organização escolar. Nesse sentido é primordial que sejam revistos os papéis desempenhados pelos diretores e coordenadores, no sentido de que ultrapassem o teor controlador, fiscalizador e burocrático de suas funções pelo trabalho de apoio, orientação do professor e de toda a comunidade escolar. A descentralização da gestão administrativa, por sua vez, promove uma maior autonomia pedagógica, administrativa e financeira de recursos materiais e humanos das escolas, por meio dos conselhos, colegiados, assembleias de pais e de alunos. Mudam-se os rumos da administração escolar e com isso o aspecto pedagógico das funções do diretor e dos coordenadores e supervisores emerge. Deixam de existir os motivos pelos quais esses profissionais ficam confinados aos gabinetes, às questões burocráticas, sem tempo para conhecer e participar do que acontece nas salas de aula. Visando a formação continuada dos professores Sabemos que, no geral, os professores são bastante resistentes às inovações educacionais, como a inclusão. A tendência é se refugiarem no impossível, considerando que a proposta de uma educação para todos é válida, porém utópica, impossível de ser concretizada com muitos alunos e nas circunstâncias em que se trabalha, hoje, nas escolas, principalmente nas redes públicas de ensino. A maioria dos professores tem uma visão funcional do ensino e tudo o que ameaça romper o esquema de trabalho prático que aprenderam a aplicar em suas salas de aula é rejeitado. Também reconhecemos que as inovações educacionais abalam a identidade profissional, e o lugar conquistado pelos professores em uma dada estrutura ou sistema de ensino, atentando contra a experiência, os conhecimentos e o esforço que fizeram para adquiri-los. Os professores, como qualquer ser humano, tendem a adaptar uma situação nova às anteriores. E o que é habitual, no caso dos cursos de formação inicial e na educação continuada, é a separação entre teoria e prática. Essa visão dicotômica do ensino dificulta a nossa atuação, como formadores. Os professores reagem inicialmente à nossa metodologia, porque estão habituados a aprender de maneira incompleta, fragmentada e essencialmente instrucional. Eles esperam aprender uma prática inclusiva, ou melhor, uma formação que lhes permita aplicar esquemas de trabalho pré-definidos às suas salas de aulas, garantindo-lhesa solução dos problemas que presumem encontrar nas escolas inclusivas. Em uma palavra, os professores acreditam que a formação em serviço lhes assegurará o preparo de que necessitam para se especializarem em todos os alunos, mas concebem essa formação como sendo mais um curso de extensão, de especialização com uma terminalidade e com um certificado que lhes convalida a capacidade de efetivar a inclusão escolar. Eles introjetaram o papel de praticantes e esperam que os formadores lhes ensinem o que é preciso fazer, para trabalhar com níveis diferentes de desempenho escolar, transmitindo-lhes os novos conhecimentos, conduzindo-lhes da mesma maneira como geralmente trabalham com seus próprios alunos. Acreditam que os conhecimentos que lhes faltam para ensinar as crianças com deficiência ou dificuldade de aprender por outras incontáveis causas referem-se primordialmente à conceituação, etiologia, prognósticos das deficiências e que precisam conhecer e saber aplicar métodos e técnicas específicas para a aprendizagem escolar desses alunos. Os dirigentes das redes de ensino e das escolas particulares também pretendem o mesmo, num primeiro momento, em que solicitam a nossa colaboração. Se de um lado é preciso continuar investindo maciçamente na direção da formação de profissionais qualificados, não se pode descuidar da realização dessa formação e estar atento ao modo pelo qual os professores aprendem para se profissionalizar e para aperfeiçoar seus conhecimentos pedagógicos, assim como reagem às novidades, aos novos possíveis educacionais. A metodologia Diante dessas circunstâncias e para que possamos atingir nossos propósitos de formar professores para uma escola de qualidade para todos, idealizamos um projeto de formação que tem sido adotado por redes de ensino públicas e escolas particulares brasileiras, desde 1991. Nossa proposta de formação se baseia em princípios educacionais construtivistas, pois reconhecemos que a cooperação, a autonomia intelectual e social, a aprendizagem ativa e a cooperação são condições que propiciam o desenvolvimento global de todos os alunos, assim como a capacitação e o aprimoramento profissional dos professores. Nesse contexto, o professor é uma referência para o aluno e não apenas um mero instrutor, pois enfatizamos a importância de seu papel tanto na construção do conhecimento, como na formação de atitudes e valores do futuro cidadão. Assim sendo, a formação continuada vai além dos aspectos instrumentais de ensino. A metodologia que adotamos reconhece que o professor, assim como o seu aluno, não aprende no vazio. Assim sendo, partimos do “saber fazer” desses profissionais, que já possuem conhecimentos, experiências, crenças, esquemas de trabalho, ao entrar em contato com a inclusão ou qualquer outra inovação. Em nossos projetos de aprimoramento e atualização do professor consideramos fundamental o exercício constante de reflexão e o compartilhamento de idéias, sentimentos, ações entre os professores, diretores, coordenadores da escola. Interessam-nos as experiências concretas, os problemas reais, as situações do dia-a-dia que desequilibram o trabalho, nas salas de aula. Eles são a matéria-prima das mudanças. O questionamento da própria prática, as comparações, a análise das circunstâncias e dos fatos que provocam perturbações e/ou respondem pelo sucesso vão definindo, pouco a pouco, aos professores as suas “teorias pedagógicas”. Pretendemos que os professores sejam capazes de explicar o que outrora só sabiam reproduzir, a partir do que aprendiam em cursos, oficinas, palestras, exclusivamente. Incentivamos os professores para que interajam com seus colegas com regularidade, estudem juntos, com e sem o nosso apoio técnico e que estejam abertos para colaborar com seus pares, na busca dos caminhos pedagógicos da inclusão. O fato de os professores fundamentarem suas práticas e argumentos pedagógicos no senso comum dificulta a explicitação dos problemas de aprendizagem. Essa dificuldade pode mudar o rumo da trajetória escolar de alunos que muitas vezes são encaminhados indevidamente para as modalidades do ensino especial e outras opções segregativas de atendimento educacional. Daí a necessidade de se formarem grupos de estudos nas escolas, para a discussão e a compreensão dos problemas educacionais, à luz do conhecimento científico e interdisciplinarmente, se possível. Os grupos são organizados espontaneamente pelos próprios professores, no horário em que estão nas escolas e são acompanhados, inicialmente, pela equipe da rede de ensino, encarregada da coordenação das ações de formação. As reuniões têm como ponto de partida, as necessidades e interesse comuns de alguns professores de esclarecer situações e de aperfeiçoar o modo como trabalham nas salas de aula. O foco dos estudos está na resolução dos problemas de aprendizagem, o que remete à análise de como o ensino está sendo ministrado, pois o processo de construção do conhecimento é interativo e os seus dois lados devem ser analisados, quando se quer esclarecê-lo. Participam dos grupos, além dos professores, o diretor da escola, coordenadores, mas há grupos que se formam entre membros de diversas escolas, que estejam voltados para um mesmo tema de estudo, como por exemplo a indisciplina, a sexualidade, a ética e a violência, a avaliação e outros assuntos pertinentes.A equipe responsável pela coordenação da formação é constituída por professores, coordenadores, que são da própria rede de ensino, e por parceiros de outras Secretarias afins: Saúde, Esportes, Cultura. Nós trabalhamos diretamente com esses profissionais, mas também participamos do trabalho nas escolas, acompanhando-as esporadicamente, quando somos solicitados – minha equipe de alunos e eu. Maria Teresa Eglér Mantoan Universidade Estadual de Campinas / Unicamp Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Reabilitação de Pessoas com Deficiência – LEPED/ FE/ Unicamp. Disponível em: https://www.exerciciodorespeito.com.br/inclusao-escola-para-todos/ TEXTO 2 : IDEIA 53: A reinvenção da escola Sim, um professor vale mais do que o Neymar. E sem investir neles o Brasil continuará semi-analfabeto. Mas a solução só virá mesmo com algo bem maior: uma revolução nos métodos de ensino. Por André Gravatá Revista SUPER Interessante “Ao entrar na escola pública, encontrei alunos que não conseguiam decifrar palavras no fim do ensino fundamental. Como eles passam tantos anos na escola e não aprendem o mínimo?”, diz Caroline da Silva, professora de escola municipal de São Paulo. Infelizmente, a situação que Caroline encontrou na sala de aula é uma realidade comum: quase um terço dos brasileiros é incapaz de compreender esta frase. Quase 10% da população é incapaz de escrever o próprio nome, e outros 20% são os chamados “analfabetos funcionais” – eufemismo do IBGE para aquelas pessoas que reconhecem as palavras mas não conseguem interpretar um texto minimamente. PUBLICIDADE Existem várias explicações para essa (falta de) educação ligadas à falta de investimento. Escolas com péssima infra-estrutura, salas de aula lotadas, professores mal pagos, mal preparados e desmotivados. Mas a verdade é que a escola também se distanciou da realidade em que vivemos. Ela ainda reproduz um modelo baseado na decoreba de assuntos desconectados da prática e não consegue estimular os alunos a aprenderem nem sequer o tal “mínimo”. Em pleno século 21, com tanta informação disponível, esse formato de ensino que não valoriza a criatividade e a capacidade dos alunos de conectar novos conhecimentos está em crise. “A escola não muda a sociedade, mas muda com a sociedade”, diz o educador português José Pacheco. Criador de um modelode ensino de referência no seu país, ele hoje trabalha no Brasil como mentor do Projeto Âncora, escola que vira o ensino tradicional pelo avesso. “Defendo um salário digno para os professores brasileiros, mas isso sozinho não vai resolver os problemas da educação”, diz Pacheco. “Eles podem ganhar dez vezes mais, mas não vai adiantar se continuarem a repetir as práticas de hoje. A solução é mudar a cultura da escola.” O Projeto Âncora faz sua parte. A escola em Cotia (SP) atende cerca de 300 estudantes de baixa renda de 3 a 15 anos com uma proposta baseada na autonomia do aluno. Para efeitos burocráticos, eles estão no ensino infantil ou no fundamental. Mas, na prática, não há séries ou disciplinas separadas. Os alunos desenvolvem projetos sobre assuntos deu seu próprio interesse, escolhidos por eles mesmos (no último semestre, os temas foram de escravidão a kung fu). O conhecimento é assimilado de forma integrada, tudo ao mesmo tempo. Os alunos são incentivados a encontrar soluções em equipe, baseados em experiências reais, exatamente como vão precisar fazer na vida fora da escola. Ao estimular a solução de problemas em conjunto, a ideia é favorecer um clima de cooperação, em vez de competição. E o trabalho coletivo vai além dos projetos em grupo. A cada quinzena, os alunos fazem assembleias com os professores para debater rotinas e regras de convivência. “É sempre um trabalho por consenso”, diz o professor Victor Lacerda. Dar voz ativa aos alunos faz com que eles se envolvam mais com a aprendizagem. Essa subversão da grade curricular não é exclusividade do Âncora, mas uma resposta comum de escolas que inovam para resolver a falta de conexão entre disciplinas. Na Índia, a Riverside School também tem essa dinâmica. Quando o tema foi chocolate, por exemplo, as crianças pesquisaram, fabricaram e venderam o dito cujo. Durante o processo, aprenderam ao mesmo tempo história, biologia, química e matemática. O aprendizado já vem empacotado com sua aplicação. De quebra, o trabalho é uma experiência social, em que eles desenvolvem conhecimentos úteis normalmente negligenciados no ensino convencional, como relações pessoais e culinária. O uso de estratégias para engajar o aluno no processo de aprendizagem é uma das principais tônicas dessa reinvenção do ensino. Na escola pública Quest to Learn, de Nova York, o uso de jogos está na essência do ensino. Lá, quase tudo envolve “gamificação” – uso da dinâmica de jogos para abordar temas do cotidiano. Os alunos aprendem a resolver equações, por exemplo, com jogos de mesa. Ou então fazem engenhocas como as destas páginas, que substituem as tradicionais provas escritas de fim de bimestre. O objetivo é acompanhar o desenvolvimento da capacidade dos alunos para trabalhar em grupo e solucionar problemas reais. A busca por soluções para cada parte do invento extrapola os limites da escola. Os estudantes buscam ideias em qualquer lugar. Por trás desta gincana, está algo maior: fazer do mundo inteiro um espaço de aprendizagem. Os alunos são incentivados a exercitar a busca por conhecimento onde quer que estejam, não apenas na sala de aula. A estrutura dessas instituições, como é de se esperar, também é diferente. Na Quest to Learn, os alunos se espalham por salas com cadeiras em grupo. Há livros, pincéis e tintas à disposição, e as paredes são cobertas por desenhos. “Quando descobri a escola, senti na hora que queria estudar lá”, diz Rocco Rose, 14 anos. O professor facilitador Nesse ambiente em que os alunos parecem mandar na escola, o professor desce do pedestal. A descentralização da autoridade e a valorização da liberdade do aluno são marcas centrais dessas escolas inovadoras. “Aquele jeito hierárquico de lidar com a educação é bastante ultrapassado e ineficaz para o mundo dinâmico em que vivemos hoje”, diz Victor Lacerda, educador do Projeto Âncora. Na construção das engenhocas da Quest to Learn, por exemplo, os professores não ensinam a montar nada. Em vez disso, eles facilitam o processo indicando caminhos e dando pistas sobre onde descobrir o que precisam para que o projeto funcione. “A maneira mais efetiva de ensinar é deixar os estudantes no controle da sua própria aprendizagem”, afirma Elisa Aragon, diretora da Quest to Learn. Se o professor perde sua condição de “proprietário” de um conhecimento que vai apenas entregar, a figura dos alunos obcecados em decorar conteúdos em busca das melhores notas se torna algo raro. Nessa proposta de educação, em um mundo onde a Wikipedia pode ser acessada do celular, o cdf – e sua quantidade exorbitante de conhecimento na ponta da língua – deve entrar em extinção. A ignorância, essa sim, tem sido cada vez mais valorizada como um instrumento importante de aprendizagem. Nos EUA, Stuart Firestein, professor de biologia e pesquisador da Universidade Columbia, fez sucesso com o livro Ignorance: How it Drives Science (“Ignorância: como ela guia a ciência”, sem edição no Brasil). “O propósito de conhecer um monte de coisas não é saber um monte de coisas, mas ser capaz de elaborar questões profundas e interessantes”, escreve. É exatamente essa grande interrogação que os professores facilitadores querem manter acesa na mente dos alunos. A ideia é incentivar constantemente a sua curiosidade e fazer do aprendizado mais um instrumento que um fim. Certo, tudo isso pode ser muito legal, mas difícil de implantar no rígido sistema educacional brasileiro, não é? Nem tanto. “A homogeneidade não é obrigatória para as escolas – e é a pior palavra que podemos usar para resumir um espaço de aprendizagem”, diz Pilar Lacerda, ex-secretária de Educação Básica do Ministério da Educação. Ela lembra que a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, que rege a educação nacional, prevê a autonomia das escolas na elaboração do seu projeto pedagógico, entre outras aberturas. Ou seja, o Brasil já tem uma porta aberta para a experimentação. Tanto que já existem escolas do tipo no país. O que falta, como acredita José Pacheco, é conhecer, valorizar e divulgar essas novas práticas. E às vezes nem é preciso criar uma nova escola do zero. Pequenas atitudes dos professores que se mobilizam dentro dos colégios tradicionais já produzem impactos significativos. É o caso de Caroline da Silva, aquela que, no começo desta matéria, se impressionou com o analfabetismo de seus alunos no fim do ensino fundamental. A professora organizou um pequeno festival na escola, com apresentações de música e dança, oficinas de origami e mágica, entre outras atividades. Organizando tudo, descobriu que havia um piano abandonado em uma sala fechada da escola. “Procuramos a chave e vimos que o instrumento não estava quebrado, apenas desafinado”, diz. Com a ajuda de uma aluna que sabia tocar, o piano virou uma grande atração do evento. Com o pouco que tinha, ela incentivou outra prática valorizada nas escolas inovadoras: a de aprender com o corpo inteiro, não apenas com a cabeça. A iniciativa mostra que atitudes simples e baratas podem ensaiar uma nova melodia em nossas desafinadas escolas públicas. Valorizar essas atitudes pode ser a chave para reverter um triste indicador de nossa educação. Um em cada quatro alunos que entram no ensino fundamental abandona os estudos pela metade. Entre os 100 países com maior índice de desenvolvimento humano, o Brasil tem o terceiro maior índice de evasão escolar. Aumentar o salário dos educadores, essas pessoas com o potencial de operar pequenas revoluções e mudar nosssa realidade, seria justo. Mas reinventar a escola pode não depender tanto assim de dinheiro, e sim de mais disposição para pensar a escola de um jeito diferente. Ideia 59: Mais dinheiro para a educação O Brasil precisa investir melhor o dinheiro que destina à educação. Mastambém é preciso investir mais. O piso nacional dos professores que ensinam o bê-a-bá é de R$ 2.455,35. É o pior salário do país, entre as carreiras de nível superior. Hoje, eles recebem em média apenas 59% do que ganham outros profissionais com faculdade. “O salário e o plano de carreira são primordiais. Estamos perdendo educadores”, diz Jamil Cury, professor da pós-graduação em educação da PUC-MG. O Plano Nacional de Educação, em discussão no Senado, exige que se invista 7% do PIB nos próximos cinco anos e 10% até o fim da década. Seria um bom reforço para diminuir a diferença de investimento por aluno que existe entre o Brasil e países mais desenvolvidos. Sem dinheiro Um único estudante americano recebe o mesmo investimento que 4,4 brasileiros. Investimentos em educação por aluno * 1º Luxemburgo – US$ 19.964 2º Noruega – US$ 13.066 3º Estados Unidos – US$ 11.859 29º Brasil – US$ 2.653 30º México – US$ 2.278 31º Turquia – US$ 2.008 Disponível em http://super.abril.com.br/comportamento/ideia-53-a-reinvencao-da-escola/ Texto 3 : ENSINO, AVALIAÇÃO E DEMOCRATIZAÇÃO SOCIAL Por Cipriano Luckesi http://luckesi.blogspot.com.br/ INTRODUÇÃO Pretendo, neste texto, tratar da questão do nosso investimento de educadores regulares na democratização social através de nossos cotidianos atos de ensinar estudantes sob nossa reponsabilidade no cotidiano escolar. Parto, (01) da compreensão da força que nós educadores temos em mãos, como mediadores no processo de aprendizagem e desenvolvimento dos nossos estudantes, na perspectiva de estamos investindo na democratização social; passo, a seguir, (02) para uma compreensão de recursos para uma prática pedagógica consistente, onde professor ensina e estudante aprende; prossigo, (03) lembrando das posturas necessárias de nós educadores no investimento na aprendizagem dos nossos educandos; e, por último, (04) abordo a avaliação nas práticas educativas escolares como nossa parceira na conquista do sucesso em nossa atividade, contribuindo dessa forma para a democratização social. Certamente que é um projeto de longo alcance, em termos de tempo, desde que na história e na construção de significativas mudanças a demanda de tempo sempre se faz presente. Nossos investimentos não produzirão modificações na vida humana amanhã, em termos de dias, mas será significativa no amanhã em termos de futuro. 01 - CONTRIBUIÇÃO DO ENSINO-APRENDIZAGEM PARA A DEMOCRATIZAÇÃO SOCIAL Democratização social significa que todos os cidadãos podem participar, em situação de igualdade, da vida individual e coletiva. Para que isso ocorra, importa recursos. Claro, o ideal seria que os recursos econômicos fossem efetivamente distribuídos para o bem-estar de todos. Contudo, sabemos que, no contexto desse fator e de múltiplos outros, vivemos numa sociedade de desiguais. Também vale ficar ciente de que a educação, por si e diretamente, não tem poder suficiente para proceder essa distribuição. Porém, tem um poder indireto, formando sujeitos capazes de buscar e exercitar seus direitos, com base em suas habilidades construídas no cotidiano de nossas escolas. Hoje temos no Brasil, segundo o Censo Escolar de Educação Básica, 2016, INEP, 180.100 (cento e oitenta mil e cem escolas de ensino básico), nas quais atuam 2.200.000 (dois milhões e duzentos mil) professores. E, 48.800.000 (quarenta e oito milhões e oitocentos mil) estudantes matriculados no Ensino Básico, ou seja, um quarto da população do país. Acrescente-se a esse número os estudantes de nível superior. Diante desses dados, cabe perguntar: Que consequências sociais, políticas, econômicas e éticas teríamos no país, se efetivamente todos nós educadores, em nossas escolas, efetivamente garantíssemos a aprendizagem e, consequentemente, o desenvolvimento dos nossos educandos? Essa é a questão que desejo abordar nesse texto. Mais que isso, desejo abordar compreensões e recursos para uma prática de ensino eficiente a serviço do bem de todos nós cidadãos desta nação. 02 - COMO SE PROCESSA A APRENDIZAGEM EFETIVA POR PARTE DO ESTUDANTE O objetivo da escola é ensinar “para que os estudantes efetivamente aprendam”. Todas as atividades humanas destinam-se a produzir os resultados positivos desejados. Ninguém de nós age, apostando no insucesso de nossa ação. Em sã consciência, ninguém de nós coloca resultado negativos como objetivo de nossa ação. Os resultados propostos e desejados de nossa ação pedagógica, no seio de nossas escolas, são a aprendizagem de nossos estudantes, segundo o currículo estabelecido, e o seu consequente desenvolvimento. Para investir na busca do sucesso em nossas práticas de ensino, de início, importa compreender como o estudante aprende, afim de que possamos agir com base nessa compreensão. A aprendizagem constrói dentro de nós, como também dentro de nossos estudantes, as habilidades necessárias para estar e agir no mundo da forma mais satisfatória possível. As aprendizagens constroem os algoritmos neurológicos de nossas habilidades mentais, afetivas, emocionais e motoras. Para tanto, importa que o ensino-aprendizagem tenha a característica fundamental de realizar-se ativamente. Nosso sistema nervoso cria os algoritmos de memória, a serem utilizados quando necessário, de forma, ao mesmo tempo, compreensiva e ativa. Tendo em vista praticar um ensino-aprendizagem ativo, importa ter presente os passos que se seguem. (01) Uma aprendizagem ativa pela exposição de conteúdos novos. O responsável por trazer os conteúdos novos, herdados da experiência sociocultural anterior da humanidade é o educador, subsidiado pelos recursos didáticos. O educador pode expor oralmente novos conteúdos, mas também pode servir-se de recursos que levem novos conteúdos aos estudantes, tais como livros didáticos ou não, documentários, tapes, filmes... A exposição é o meio pelo qual o educador faz a mediação entre as heranças socioculturais da humanidade e o estudante, que vai aprender --- adquirir habilidades ---, através dessa mediação. (02) O segundo passo da aprendizagem é a assimilação dos conteúdos expostos. Para aprender “ativamente”, importa que o estudante assimile o novo conteúdo e, para isso, necessita do suporte do educador. Observar que, na assimilação, o estudante passa a ser o personagem principal da aprendizagem. Afinal, é ele quem aprende. O professor dá-lhe suporte. Suporte, aqui, significa auxiliar o estudante a compreender o que foi exposto, tomando posse inicial desse conteúdo. Diz-se “inicial” devido ao fato de que, nesse estágio, o estudante somente assimilou os conteúdos exposto, ou seja, compreendeu o quem lhe fora comunicado. (03) O terceiro passo necessário da aprendizagem é a exercitação orientada pelo educador. O professor cria os exercícios articulados com o conteúdo exposto e a ser aprendido pelo estudante, ao mesmo tempo que o orienta, corrige, reorienta. O estudante, ao exercitar os conteúdos novos, torna-os propriamente seus, transformando-os em habilidades. A construção de habilidades depende de exercitação em todos os campos da vida humana, desde que o ser humano é um ser ativo. (04) O quarto passo está comprometido com a aplicação dos conteúdos aprendidos. Após tornar-se senhor de um conteúdo novo, através da assimilação e da exercitação, o educando pode, então, realizar aplicações desse conteúdo em diversos campos da vida. A aplicação de um conteúdo em variados campos da vida amplia uma habilidade adquirida, devido o estudante perceber que aquela habilidade possibilita outras possibilidades de compreensão, assim como de ação. (05)O quinto passo está comprometido com a re-criação dos conteúdos aprendidos. Após o aprendiz adquirir uma habilidade (compreensão teórica + modo de agir), mediada pela exposição + assimilação + exercitação + aplicação, está apto a recriar uma determinada compreensão como uma determinada habilidade; e, então, poder servir-se de sua aprendizagem de modo pessoal e segundo suas necessidades. Esse passo da aprendizagem pode ser traduzido pela afirmação: “Já sei isso e, então, posso recriar essa compreensão e essa prática tendo em vista novas e emergentes situações”. O aprendido garante a possibilidade de sua re-criação. (06) O sexto passo é a elaboração da síntese. Todos os passos da aprendizagem, sinalizados anteriormente, conduzem à síntese, que representa a posse plena de um conhecimento novo; é a integração ordenada das múltiplas facetas de uma aprendizagem como um todo. A síntese nem sempre será realizada no decurso das aprendizagens escolares, desde que estas são parciais. Usualmente, devido expressar uma integração de partes, a síntese demandará mais tempo, assim como maturidade psicológica e cognitiva por parte do estudante ou do profissional. Importa observar que, à medida que os passos do ensino-aprendizagem seguem o seu curso, o aprendiz (estudante) vai tomando conta do processo e o educador vai acompanhando e dando suporte para que o estudante faça seu caminho de conhecimento e, pois, constitua sua autonomia e sua independência. A concepção piagetiana do ensinar-prender está comprometida com a construção da autonomia do estudante: inicia uma aprendizagem dependente do professor e a conclui com sua autonomia. No primeiro passo --- exposição ---, o professor tem o predomínio; contudo, do segundo passo em diante, quem tem o predomínio ativo é o aprendiz; afinal, é ele quem aprende, estruturando seu próprio algoritmo neurológico relativo à habilidade adquirida, registrado na memória dentro de si, no seu sistema nervoso. Os algoritmos neurológicos da memória (que serão acessados na vida cotidiana, quando necessários) são construídos --- por meio dos milhares e milhares de sinapses --- no seio do sistema nervoso do estudante, pela sua ação de aprender. O professor será seu parceiro nesse caminhar pela aprendizagem. Os passos, acima indicados, no processo de ensinar e aprender, não necessariamente seguirão a sequência de passos 1º, 2º 3º..., nessa referida ordem. Pode-se tentar iniciar por qualquer um deles, contudo, a aprendizagem efetiva dependerá de todos eles. Podemos iniciar por uma atividade (exercício ou aplicação) e, então, o estudante perguntará --- “mas, como se compreende isso?” --- e, então, haverá necessidade de se retornar à exposição (= retomar a herança sociocultural já trilhada e elaborada pela humanidade, que contém os conceitos dos quais se está necessitando. Poderá se iniciar por uma “síntese” e, então, haverá necessidade de se retomar “as partes” para se compreender a síntese. Então, o que importa não é a ordem dos passos, mas sim que eles sejam utilizados, a fim de que a aprendizagem consistente e satisfatória se dê. 03 – ATITUDES DO EDUCADOR NO PROCESSO DE ENSINAR E APRENDER Antes de mais nada, para uma prática educativa escolar consistente, importa uma postura necessária do educador. O educador necessita ir para a sala de aula ou para seus estudantes despido de todo e qualquer preconceito, com o objetivo claro de que ele vai ensinar e todos os estudantes sob sua liderança irão aprender. Sem a clareza e a posse desse objetivo, o mais comum entre todos nós, educadores escolares, é nos dirigirmos para a sala de aula ou para os grupos de nossos estudantes com a certeza de que “somente alguns aprenderão”, supostamente “os mais hábeis”; outros... certamente ... serão reprovados. A postura do senso comum cotidiano não oferece nenhum suporte ao educador tendo em vista trabalhar com todos, servindo-se dos passos do ensinar e aprender, acima indicados. Já relatei em múltiplas ocasiões, nas palestras que fiz para variados públicos, que fui uma criança multi- repetente e que saí dessa situação, em torno dos quatorze anos de idade, devido um professor de Língua Portuguesa ter dito a mim e a outros colegas de infortúnio que “se fossemos bem ensinados, aprenderíamos”. E acrescentou que iria cuidar de todos nós. Desse dia em diante, deixei de ser repetente em qualquer atividade cognitiva das quais tenha participado. Meu bom professor de Língua Portuguesa, em seus cuidados pedagógicos com nós, os repetentes, praticou as posturas que exponho a seguir. Ensinar significa apostar que somos capazes de ensinar e que nossos estudantes são capazes de aprender. Então, qual a razão para as não-aprendizagens e as reprovações? Dificuldades existirão, mas qual ação humana não se depara com impasses? Se desejamos sucesso em nossa ação, importa buscar soluções para ultrapassá-los. Então, a postura inicial fundamental do educador é: “meus estudantes aprenderão, desde que se invista efetivamente em seu ensino”. Com essa postura, penso que os atos do educador em sala de aula, seguem aproximadamente, os componentes, a seguir apresentados: acolher, nutrir, sustentar e confrontar. Acolher significa receber, de coração aberto, o educando com as qualidades com as quais ele chega a nossa atividade de ensino (turma de estudantes). Alto, baixo, pele branca, vermelha, negra, traços indígenas, dos centros das cidades, das periferias, com traços europeus, africanos, orientais, portador de pré-requisitos cognitivos e socioculturais, carente desses pré-requisitos... enfim, acolher o estudante como ele chega à turma com a qual iremos atuar ou com a qual estamos trabalhando. Ele é o nosso estudante, a pessoa a quem daremos suporte para que aprenda os variados conteúdos escolares, seguindo os passos do ensinar e aprender, anteriormente sinalizados. Ele aprenderá, se --- de início e sempre --- o acolhermos e, no cotidiano de nossa ação pedagógica, estivermos atentos às questões metodológicas da aprendizagem ativa, da qual falamos no tópico anterior deste texto. Acolher o estudante com as condições que chega em nossa sala de aula; esse é o ponto de partida do ensino-aprendizagem. Sem o acolhimento inicial e subsequente, não há ponto de partida nem condição para o ensino-aprendizagem. Nutrir significa oferecer aos nossos estudantes a melhor exposição dos novos conteúdos, seguindo os passos do ensinar e aprender sinalizados anteriormente. Muitos dirão: “Mas, eles não aprendem”. Como não aprendem, se são neurologicamente saudáveis? Necessitam, sim, de ajuda, suporte, nutrição paciente e permanente, parceria no caminhar pela aprendizagem. Então, aprenderão. Sustentar a experiência de aprender significa acompanhar o estudante e realimentá-lo todas as vezes que isso for necessário. Certamente não será somente com uma exposição que o estudante aprenderá aquilo que estivermos ensinando. Não aconteceu comigo nem com o caro leitor que a experiência da exposição de um novo conteúdo, de imediato, fosse plenamente assimilada e aprendida (aquisição da compreensão e habilidade do novo conteúdo). Em nossas vidas, tivemos necessidade de ajuda e suporte para aprendermos, nossos estudantes também terão necessidade de ajuda e suporte. A aprendizagem, como vimos, se faz ativamente e isso demanda sustentação, ou seja, tempo para os exercícios e orientação constante. Para nos servirmos de um termo bastante presente em nosso meio cotidiano, há necessidade de um bom e consistente feedback. Confrontar significa observar a ação de aprender dos estudantes e os consequentes resultados alcançados. Em caso positivo, ótimo, seguimos em frente; em caso, negativo,novos investimentos para que efetivamente eles aprendam e... certamente aprenderão com os nossos cuidados. Ninguém aprende sozinho, sempre com o suporte do outro. Cotidianamente nos servimos das falas e recomendações dos outros. De suas observações. De seus ensinamentos, através dos livros, meios variados de comunicação, tais como TV, rádio, livros, documentários, filmes... Um professor sempre encontrará um meio novo de oferecer suporte ao seu aprendiz, a afim de que crie suas habilidades. Mas isso é preciso desejar e investir nesse desejo Enfim, ensinar eficientemente implica em cuidados permanentes do profissional de educação com os seus estudantes, afinal, o objetivo de sua ação. A sequência de atitudes --- acolher, nutrir, sustentar e confrontar --- expressa os sucessivos cuidados que um educador necessita ter ao exercitar o ensino. Os passos metodológicos do ensino --- exposição, assimilação, exercitação, aplicação, re-criação e elaboração de sínteses ---, indicados no tópico anterior deste texto, só serão bem utilizados se as condutas do educador estiverem configuradas pelas cuidados imediatamente acima indicados.
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