proposta de vida em abundância em Cristo é um entrave para se alcançar a plenitude humana. Seguir a Jesus pelo seu caminho de humanização resultará na vitória definitiva sobre o pecado e a morte242. O caráter testemunhal da evangelização reside no fato de que ela é um encontro humano entre homens e mulheres que compartilham e recebem o evangelho, a partir da sua situação concreta e vulnerável. Nesse encontro as pessoas levam a si mesmas, compartilhando as limitações humanas e a existência precária comum de participar do mesmo mundo de pecadores e de vítimas do pecado. Costas ressalta que em algum momento “alguém pode ser a vítima ou pode ser parte de um processo que vitimizou outros”243, seguindo a mesma ideia do apóstolo Paulo, para quem “todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus” (Romanos 3.23). Ainda assim, este é um tema difícil porque procura dar conta da precariedade da condição humana quando ela erra o alvo de uma vida autêntica vivida como criatura de Deus. Especialmente no contexto da capelania hospitalar, a 240 LEÓN, Jorge A. A caminho de uma evangelização restauradora. São Leopoldo: Sinodal; Quito: CLAI, 2010, p. 64. 241 LEÓN, 2010, p. 65. 242 LEÓN, 2010, p. 65. 243 COSTAS, 2014, p. 57. 142 experiência mostra como é necessário nesse aspecto lidar com cautela, sensibilidade e profundo respeito pela pessoa enferma. Pois ela se encontra num estado ou situação vivencial delicada que merece a máxima atenção, cuidado e amorosidade. Nesse sentido, a atitude de Jesus para com pessoas enfermas como testemunhada nos evangelhos é exemplar. Em relação à primeira proposição de Costas, ela nos parece relevante para a capelania hospitalar pautada por uma evangelização contextual. O momento da visita consistiria no encontro entre duas pessoas que trazem consigo suas vivências, valores, cosmovisão, limitações e, neste espaço limitado, mas intenso, compartilham o evangelho. O capelão ou capelã jamais olha para o paciente com uma postura de superioridade, como bem salientou a capelã MVCA1, porque sabe que da mesma forma que o paciente se encontra naquele momento com uma limitação física, o próprio capelão também tem as suas limitações em outras esferas da vida ou um dia já esteve ou poderá vivenciar uma situação semelhante a do paciente. No caso da capelã MVCA1, ela relatou que o fato de ter passado por uma experiência de hospitalização fez com que compreendesse melhor o drama de alguém que está hospitalizado, além de este fato ter contribuído para sua escolha em trabalhar como capelã hospitalar. Essa experiência corrobora com o pensamento de Hernández sobre a doença servindo como veículo de encarnação da escuta sensível ao outro. A consciência de pecado não se presta a uma atitude de julgamento entre capelão e paciente ou vice-versa, mas serve para o reconhecimento de que ambos são pessoas falhas e necessitam de Deus, de sua misericórdia e bênção. Sendo assim, o capelão ou capelã evangelizam o paciente de maneira solidária, comunicando o evangelho de Jesus Cristo que não ignora as nossas mazelas, mas as transcende, nos libertando e transformando para uma nova vida. Na segunda proposição, Costas defende que a evangelização “envolve pessoas às quais um Deus santo e amoroso se dirige com as novas libertadoras de Jesus Cristo no poder do Espírito Santo”. A iniciativa e o esforço de evangelização começam a partir do próprio Deus. Deus tinha uma clara intenção ao comunicar o evangelho por meio de uma palavra pessoa que foi incorporada em Jesus, que 143 nasceu dentro de uma realidade com elementos sociais, históricos e culturais peculiares244. Costas afirma que Deus escolheu comunicar o evangelho prioritariamente na língua e cultura de um judeu galileu do século primeiro e expõe o significado deste gesto: O Deus da encarnação é o Deus que em liberdade soberana escolheu não apenas se contextualizar na história e na realidade sociocultural de um judeu galileu do primeiro século, mas também escolheu se tornar disponível, por intermédio da transmissão do evangelho no poder do Espírito a todas as pessoas e comunidades em sua realidade concreta. 245 O fato de Jesus, o filho de Deus, ter nascido em uma manjedoura e crescido em um contexto social e cultural de pobreza e opressão, significa que, em Jesus Cristo, Deus “se tornou parte da história, identificando-se com suas mais humildes expressões e sofrendo a sua dor mais profunda”246 que é a morte. O conhecido texto da carta de Paulo aos Filipenses (2.5-8) remete ao Deus que se contextualiza para comunicar o seu evangelho: De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. Para receber o evangelho contextual do Deus que se encarna na fraqueza humana é necessária uma ação do Espírito Santo, pois é ele quem capacita o ser humano a ouvir a voz de Deus, seja na esfera pessoal ou coletiva, e a responder a esse chamado na sua história e consciência. O Espírito Santo faz com que ouvidos sejam abertos para ouvir a mensagem de salvação, transmitindo o dom da fé e iluminando mentes e corações para aceitarem e confiarem naquilo que Deus realizou por meio do seu Filho, a saber, “uma passagem da morte para a vida, uma entrada no reino de Deus e uma incorporação na nova criação”247. Aqueles que recebem o evangelho têm como promessa a esperança de libertação completa do pecado e da morte, de um novo céu e uma nova terra onde 244 COSTAS, 2014, p. 59. 245 COSTAS, 2014, p. 60. 246 COSTAS, 2014, p. 63. 247 COSTAS, 2014, p. 64. 144 habita a justiça (Apocalipse 21.1; 2 Pedro 3.13). Essa esperança deve mover as pessoas a lutarem para vencerem as dificuldades cotidianas. Nesse sentido, quem recebe e comunica o evangelho também se compromete a participar na transformação libertadora do mundo. O conteúdo do evangelho é esperança para esta vida, para sua renovação, e um convite à ação transformadora248. Como se pode perceber, esta segunda proposição de Costas para uma evangelização contextual parte do principio de que a iniciativa primeira em evangelizar é do próprio Deus. Os capelães e capelãs, que se dispõem a comunicar o evangelho com sua tarefa de acompanhamento a pessoas enfermas e que sofrem no corpo as limitações da vida, como vimos nos depoimentos, o fazem inspirados pelo Espírito Santo, tendo recebido primeiramente a esperança do evangelho, para então transmitir essa esperança ao paciente. Na terceira proposição, Costas relaciona evangelização e práxis, afirmando que a evangelização “envolve pessoas e comunidades trabalhando pelas transformações de suas respectivas situações de vida”. Em um primeiro momento, só é possível participar na transformação de um contexto quando já se experimentou na própria vida os sinais concretos da graça, do perdão e da libertação de Deus249. Todavia, apenas a experiência pessoal não é suficiente para dar autenticidade à tarefa evangelizadora. Uma vez que o evangelho destina-se a pessoas localizadas em um contexto social e histórico, se faz necessário um comprometimento e engajamento com processos de mudanças positivas em situações de vida, além de um conhecimento desse contexto que exige estudo e capacidade de leitura ou interpretação dos fatos. O evangelho não