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Texto-base - Emília Ferreiro_ um divisor de águas na alfabetização _ Silvia Colello_ ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO II - SAL002

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Estudos da educadora argentina Emília Ferreiro colocaram a criança no centro da
aprendizagem, ressignificando o papel da escola e do professor
Por Silvia M. Gasparian Colello
Doutora em Educação, professora da Faculdade de Educação da USP, coordenadora do Grupo de
Estudos sobre Alfabetização e Letramento (GEAL), autora dos livros Alfabetização em questão e A
Escola que (não) ensina a escrever (Paz e Terra, 2004 e 2007). Artigo publicado na revista Carta
Fundamental (2009).
No campo da Educação, as pesquisas de Emilia Ferreiro (as de seus colaboradores e todas as demais
inspiradas no mesmo referencial teórico), sem dúvida alguma, marcaram definitivamente o modo como
hoje pensamos o ensino da língua materna, a condição do sujeito cognoscente, o processo de
aprendizagem e o papel do professor. Mais que isso, o conjunto desses trabalhos impõe aos educadores
o desafio de conhecer o aprendiz para a ele ajustar o processo pedagógico, perspectiva sem a qual não
mais podemos vislumbrar a educação de qualidade.
Para situar a contribuição dessa pesquisadora argentina, hoje radicada no México, atuando no Centro
de Investigações e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional, importa apontar o potencial
transformador de seu trabalho como um divisor de águas, a partir do qual se delineiam os rumos hoje
assumidos na alfabetização.
Mudança de paradigmas
Embora o referencial de Piaget já estivesse disponível desde a primeira metade do século XX, sua teoria
sobre o desenvolvimento humano e os processos cognitivos pouco chegava às salas de aula, dadas as
dificuldades de transposição da pesquisa básica para o cotidiano escolar. Até a década de 70, fora
alguns aspectos da Matemática e da Geometria estudados pelo pesquisador suíço, a prática pedagógica
inspirada em Piaget acabava por reproduzir as situações do seu método clínico, tentando estimular
capacidades tais como classificar e seriar objetos. A despeito desses esforços isolados, o que prevalecia
(e, em muitos contextos, ainda prevalece) na Educação era a concepção empirista, típica da escola
tradicional, que pressupõe um aluno passivo na relação com o professor detentor do conhecimento. 
Ao retornar da Suíça em 1971, onde desenvolvera sua pesquisa de doutorado sob a orientação de
Piaget, Ferreiro recupera o referencial de seu mestre, aplicando-o à aquisição da escrita, sob uma ótica
nunca antes experimentada. Liderando um grupo de pesquisadoras na Universidade de Buenos Aires,
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Ferreiro partiu de dois pressupostos fundamentais: 1º) a criança é um sujeito ativo na construção do
conhecimento e, como tal, não pede autorização para aprender; 2º) a língua escrita, longe de um código
a ser dominado pelas técnicas de associar grafemas e fonemas (letras e sons) de acordo com as regras
ortográficas ou de interpretar mecanicamente as marcas do papel, configura-se como um sistema
complexo de representação da fala. A partir daí, importava compreender: como se comporta a criança
diante da língua escrita? Quais as suas hipóteses para lidar com esse objeto cultural? Como se dá a
passagem das diferentes concepções ao longo do seu processo de aprendizagem? E, finalmente, como
a escola interfere nesse processo?
HIPÓTESES INFANTIS
Lidar com uma ordem de investigação em que a criança é o centro do processo de aprendizagem
pressupõe, em primeiro lugar, a necessidade de descartar ideias preconcebidas e já tão arraigadas,
como a concepção de que a aprendizagem é consequência necessária do ensino ou de que as crianças
aprendem por uma única trajetória regida pelo método de ensino. Em segundo lugar, o estabelecimento
de uma interlocução com a criança, respeitando-a enquanto sujeito construtor de conhecimento.
Finalmente, é preciso preparar-se para respostas inusitadas.
De fato, quando se pede às crianças que escrevam do seu jeito, surgem estranhas produções que não
parecem fazer sentido àquele que lê e escreve convencionalmente. Algumas interpretam cada letra do
seu nome como sendo o nome completo dos pais e irmãos (afinal, todos vivem na mesma casa!); outras
esperam encontrar correspondências entre a escrita e os objetos (não seria justo a palavra “formiguinha”
ser maior do que “boi”!); há quem atribua o valor silábico a cada letra, não se conformando que a palavra
“palhaço” tenha mais que três letras; alguns insistem em colocar um ponto ao final de cada linha como
que endossando a ruptura espacial; outros dizem que, ao suprimirmos uma letra da palavra “gato”,
teríamos “gatinho”.
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PROCESSO CONSTRUTIVO
Todos esses exemplos nos dão prova de um sujeito cognitivamente ativo e das inúmeras
problematizações em pauta para quem tenta compreender a escrita e interpretar a realidade
grafocêntrica à sua volta. Eles nos dão também indícios de um processamento endógeno a partir de
informações e observações vivenciadas no plano externo das interações sociais. Aprender a escrever é,
então, um complexo processamento mental no qual a criança é levada a construir hipóteses, colocá-las
à prova e, nos casos de conflitos (por exemplo, ao descobrir que “boi” é menor que “formiguinha”), ter
bons motivos para reelaborar as suas concepções. Nesse processo construtivo, não há estaca zero de
conhecimentos porque, vivendo em uma sociedade letrada e participando de experiências de leitura e
escrita, a criança sempre lida com algum grau de informação, o que lhe permite lançar-se para a
aventura do conhecimento. Vem daí uma compreensão revolucionária sobre o processo de
aprendizagem: “Saber algo a respeito de certo objeto não quer dizer necessariamente saber algo
socialmente aceito como ‘conhecimento’. ‘Saber’ quer dizer ter construído alguma concepção que
explica certo conjunto de fenômenos ou de objetos da realidade” (FERREIRO, 1987).
Compreender as hipóteses infantis, seus “erros” e, principalmente, como as concepções elementares
vão progressivamente sendo substituídas por outras mais próximas do sistema convencional, permite
ainda uma nova interpretação sobre as diferenças individuais no processo de aprendizagem. O que até
então era considerado problema do indivíduo (incapacidade ou carência) passa a ser interpretado como
falta de oportunidades de vivenciar o sistema de escrita, conhecer seus suportes ou refletir sobre suas
funções e modo de funcionamento (principalmente no caso de crianças de classes menos favorecidas).
Nessa concepção, evidencia-se o despreparo da escola para lidar com a heterogeneidade e a
dificuldade em promover experiências significativas e contextualizadas na aprendizagem da leitura e da
escrita. 
Em 1979, os primeiros resultados da pesquisa liderada por Ferreiro foram publicados em Los sistemas
de escritura em el desarrollo del nino, em coautoria com Ana Teberosky (no Brasil, em 1986, com o título
Psicogênese da língua escrita), trazendo perspectivas inovadoras para a Educação, mas também
dificuldades que se traduziram tanto pela assimilação difícil, por vezes equivocada e reducionista, dos
novos paradigmas, como pela complexidade no que diz respeito à transposição pedagógica. Exemplos
disso são escolas que, nas sondagens junto aos alunos, procuram classificar as crianças segundos as
clássicas hipóteses conceituais descritas pelas autoras (pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e
alfabético) desconsiderando a complexidade do processo construtivo e, ainda, insistindo em velhas
práticas artificiais e sem sentido.
REFLEXÃO LINGUÍSTICA
O amplo espectro das pesquisas de Ferreiro teve um decisivo impacto na Educação em diversos países.
Superando a dimensão mecânica e instrumental, o ensino da língua escritapassou a ser visto como um
efetivo objeto de aprendizagem balizado pela reflexão linguística. Pela primeira vez, não mais dispomos
de métodos preestabelecidos para o ensino da escrita, mas de uma convocação para que se assuma
uma nova postura face aos alunos e ao processo de aprendizagem.
Assim, é possível delinear diretrizes educacionais hoje indiscutíveis: 
1º) Urgência de um ensino capaz de lidar com a diversidade;
2º) Necessidade de romper com a distância entre a escola e a vida, instituindo um ensino
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significativo e contextualizado;
3º) Valorização do sujeito cognoscente que, como centro da aprendizagem, é capaz de criar e
recriar;
4º) Condução do ensinar na perspectiva do aprendiz;
5º) Reorientação do ensino pelas práticas interlocutivas, respeitando os alunos, colocando-os frente
a propostas desafiadoras; e
6º) Enriquecimento de situações pedagógicas, visando ampliar a experiência do estudante. 
Alavancando o movimento construtivista, Ferreiro não pretendeu resolver o problema do analfabetismo,
muito menos propor novos métodos para ensinar, mas situar o desafio de ressignificar a Educação em
prol de uma sociedade efetivamente democrática.
DESTAQUE: ANTES E DEPOIS DE EMÍLIA FERREIRO
Aspectos predominantes nas
práticas alfabetizadoras até a
década de 70
Diretrizes para a alfabetização
a partir dos anos 80
Sujeito aprendiz Tratado como ser passivo que
nada sabe ao entrar na escola.
Aluno como ser ativo colocado
como centro da aprendizagem.
Aprendizagem
Dependente da ação sistemática
do professor: pretensão de
homogeneidade no grupo, sem
considerar as diversidades e os
processos dos alunos.
Construção cognitiva com base
em concepções, hipóteses,
conflitos e reconstruções.
Psicogênese como uma
trajetória dinâmica de processos
diversificados.
Professor
Como único informante
autorizado, busca o método ideal
e determina o que ensinar para
controlar a aprendizagem.
Problematizador, cria
oportunidades e desafia o aluno
a partir de situações
significativas e contextualizadas.
Língua escrita
Código simples a ser aprendido
pela associação de letras e sons
ou pela silabação.
Sistema complexo de
representação da fala,
assimilado pela compreensão da
língua.
Prática pedagógica
Valorização dos exercícios de
prontidão (habilidades
Valorização da escrita
espontânea, da interação, da
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perceptomotoras).
Cartilhas como recurso
privilegiado: progressão
predeterminada, linear, cumulativa
e fragmentada.
Práticas mecânicas, repetitivas e
descontextualizadas.
variedade de experiências,
gêneros e suportes.
Escritas e leituras significativas,
com propósitos sociais.
Desafios e resolução de
problemas.
Dificuldades
Problemas atribuídos aos alunos:
carências, desequilíbrios ou
inabilidades.
Respeito ao ritmo da criança
que teve menos oportunidade de
aprender: estímulos e despertar
de interesses.
Referências
Ferreiro, E. Cultura escrita e educação. Porto Alegre: Artmed, 2001.
Ferreiro, E. Passado e presente dos verbos ler e escrever. São Paulo: Cortez, 2002.
FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1987.
FERREIRO, E; TEBEROSKY, A. Los sistemas de escritura em el desarrollo del niño. México: Siglo XXI, 1979.
FERREIRO, E; TEBEROSKY, A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. 
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