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Mário de Andrade: Reinventando o Brasil (1893/1945)
 “– Ai! que preguiça! ... que o herói suspirava enfarado. E dando as costas pra ela adormecia bem. Mas Ci queria brincar inda mais ... Convidava convidava... O herói ferrado no sono. Então a mãe do mato pegava na txara e cotucava o companheiro. Macunaíma se acordava dando grandes gargalhadas estorcegando de cócegas
- Faz isso não, oferecida!
- Faço!
- Deixa a gente dormir, seu bem...
- Vamos brincar.
- Ai! que preguiça!...” 								
Macunaíma (p.19)
Mario Raul Morais de Andrade 
Filiação : Carlos Augusto de Morais Andrade e Maria Luísa Leite Morais Andrade
Nascimento : 09/10/1893 – São Paulo. Morte - 25/02/1945 – São Paulo.
Mario Raul Morais de Andrade nasceu em São Paulo em 09 de outubro de 1893. Iniciou seus estudos de piano em 1911. Apreciador de música, formou-se no Conservatório Dramático e Musical, onde tornou-se professor de História da Música. No ano de 1917, publicou seu primeiro livro de poema Há uma gota de sangue em cada poema, no qual criticava o derramamento de sangue, causado pela Primeira Guerra Mundial. Foi um dos líderes do grupo de intelectuais participantes da Semana de Arte Moderna em São Paulo. 
Em 1924, foi com um grupo de amigos para Minas Gerais. Em 1927, viajou pelo Norte e Nordeste do Brasil para colher histórias. As viagens pelo Brasil foram descritas pelo próprio Mário como viagens etnográficas. Portanto, além de um pesquisador e estudioso da cultura e folclore brasileiros, conhecia música, festas, modinhas do Brasil. 
Em 1928, publicou Macunaíma. Exerceu várias funções de estudos da cultura brasileira, dentre elas, foi diretor do Departamento de Cultura da cidade de São Paulo.
Foi um dos escritores mais multifacetados da literatura brasileira. Ele mesmo ecoou: “Eu sou trezentos, sou trezentos e cincoenta” (Remate dos Males). 
Principais obras de Mario de Andrade
Poesia:
 Há uma gota de sangue em cada poema (1917)	
Paulicéia desvairada (1922 )
Losango cáqui (1926 )				
Clã do jabuti (1927)
Remate de Males ( 1930 )				
Poesia (1941) 
 Lira Paulistana, seguida de O carro da miséria (1946)
Contos: 
Primeiro andar (1926)				
Belazarte (1934)  
Contos Novos (1946) 
Romance: 
Amar, verbo intransitivo (1927)			
Macunaíma (1928)
Ensaios: 
A escrava que não é Isaura (1925) 		
Música do Brasil (1941)
O movimento modernista (1942)			
O Baile das quatro Artes (1943)
O empalhador de passarinhos (1944) 
Os dois Andrades
Mario de Andrade e Oswald de Andrade não eram parentes. Aproximaram-se em 1917. Os dois encontravam-se freqüentemente com os outros artistas modernistas. No Jornal do Commercio, em 1921, Oswald escreveu um artigo sobre Mario de Andrade, intitulado O Meu Poeta Futurista. Em 1922, finalmente, essa amizade definiu novas bases para a Literatura Brasileira.  Diferentes na postura artística e estilo literário, foram as lideranças do Modernismo brasileiro. 
Afastaram-se em 1929. Segundo Paulo Mendes de Almeida, crítico de Arte e amigo de ambos, “ foram eles o elemento de coesão de todo o grupo, ao qual transfundiam audácia, segurança e entusiasmo.” 
Linha do tempo
1888 – Abolição da escravatura no Brasil
1889 – Proclamação da República no Brasil
1893 – Nasce Mário de Andrade
1893- Assentamento do grupo de Antonio Conselheiro em Belo Monte
1902 – Publicação de Os Sertões de Euclides da Cunha
1904 – Revolta da Vacina no Rio de Janeiro
1905 – Albert Einstein anuncia a teoria da relatividade
1906 – Santos Dumont realiza em Paris o primeiro vôo
1906 – Várias greves operárias eclodem no Brasil
1912 – Naufrágio do Titanic, o maior e mais luxuoso navio do mundo
1913 – Ano em que o Brasil recebe o maior número de imigrantes: 192.683
1914- Início da Primeira Guerra Mundial
1915 – Início do Modernismo em Portugal com a publicação da revista Orfheu
1917 – Exposição de Anita Malfatti
1917 – Greve geral no Rio de Janeiro e São Paulo
1917 – Revolução Russa
1917 – O Brasil entra na Primeira Guerra Mundial
1922 – Semana de Arte Moderna
1928 – Publicação de Macunaíma
1929 - Quebra da Bolsa de Nova Iorque
1930 – Uma junta militar depõe o presidente Washington Luís
1931 – Inauguração da estátua do Cristo Redentor no Rio de Janeiro
1933- Hitler assume o governo da Alemanha como chefe do nazismo
1937 – O presidente Getúlio Vargas decreta O Estado Novo no Brasil
1939 - Início da Segunda Guerra Mundial
1942- O Brasil entra na Segunda Guerra Mundial
1945 – Morre Mario de Andrade
1945 – Término da Segunda Guerra Mundial
1945 – Aprovada a carta mundial que cria a Organização das Nações Unidas ( ONU )
Macunaíma – Quem é esse brasileiro? 
Nos mitos e lendas Vom Roraima Zum Orinoco, coligidos na Amazônia pelo naturalista alemão, Koch – Grunberg, Mario de Andrade conheceu o deus Makunaima. Figura intrigante do folclore brasileiro, astuto, zombeteiro e alegre. 
Ele criou vida própria em 1928 na rapsódia modernista do autor. Nasceu da mistura de três etnias : negro, índio e branco. Nasceu da mistura dos textos do folclore brasileiro. Nasceu dos mitos e lendas do Brasil. Vive na multiplicidade de se tornar vários seres, em todos os tempos, o tempo todo, em todos os lugares. Como mote no caminhar de suas aventuras, não havia a salvação de uma dama ou de um ideal, mas a busca de um amuleto: muiraquitã.
Como companheiros fiéis e inseparáveis, seus irmãos Maanape e Jiguê. Como amores, todas as mulheres, deusas, semi-deusas, simples mortais. 
Transpôs obstáculos para reaver sua muiraquitã. Encontrou-a às margens do Tietê, na cidade de São Paulo. Lutou contra o vilão, Venceslau Pietro Pietra . Terminou seus dias sem a consagração que merece todo o herói, mas narrando suas glórias a um papagaio. 
Rapsódia - designava na Grécia antiga, a recitação de fragmentos de poemas épicos, notadamente homéricos pelos rapsodos, poetas ou declamadores ambulantes, que saíam de cidade em cidade, propagando a Ilíada e a Odisséia. Surgidos provavelmente no século VII a C (...) Nos domínios literários o vocábulo rapsódia equivale para compilação, numa mesma obra, de temas ou assuntos heterogêneos e de várias origens. Macunaíma, de Mario de Andrade, constitui a rapsódia das principais lendas afro-indígenas que compõem o substrato folclórico nacional. 
Massaud MOISÉS. Dicionário de termos literários.
Macunaima - E não Macunaíma, entidade divina para os macuxis, acavis, arecunas, taulipangues, indígenas caraíbas, a oeste de “ plateau” da serra Roraima e Alto Rio Branco, na Guiana Brasileira. (...) A tradução da Bíblia para o idioma caraíba divulgou Macunaima como sinônimo de deus. (...) Com o passar dos tempos e convergência de tradições orais entre as tribos, interdependência cultural, decorrentes de guerras, viagens, permutas de produtos, Macunaíma foi-se tornando herói, centro de um ciclo etiológico, zoológico, personagem essencial de aventuras e episódios reveladores de seu espírito inventivo, inesgotável de recursos mágicos (...) Tornou-se um mito de astúcia, maldade instintiva e natural, de alegria zombeteira e feliz. É o herói das estórias populares contadas nos acampamentos e aldeados indígenas, fazendo rir e pensar, um pouco despido dos atributos de deus olímpico, poderoso e sisudo. Theodor Koch- Grunberg (1872-1924) reuniu a melhor e maior coleção de aventuras de Mcuanaima nessa fase popularesca, no Vom Roroima Zum Orinoco ( Berlin, 1917 ). (...) Algumas dessas histórias foram traduzidas pelo doutor Clemente Brandenburger e publicadas na revista de Arte e Ciência nº 9, em março de 1925 no Rio de Janeiro Lendas índias da Guiana Brasileira. Denominou um romance de Mário de Andrade de Macunaíma. 
O herói sem nenhum caráter. Rapsódia. São Paulo, 1928.  
 Luís da Câmara CASCUDO. Dicionário do Folclore Brasileiro.Muiraquitã -Artefato de Jade, que se tem encontrado no Baixo Amazonas e principalmente nos arredores de Óbidos (...) a que se atribuem qualidades de amuleto. Segundo uma tradição ainda viva, o muiraquitã teria sido presente que as amazonas davam aos homens em lembrança de sua visita anual. Conta-se que para isso, nas noites de Lua cheia, elas extraíam a pedra ainda mole do fundo do lago em cuja margem viviam, dando-lhes a forma que entendiam, antes de ficarem duras com a exposição ao sol (...) 
 
Luís da Câmara CASCUDO. Dicionário do Folclore Brasileiro.
Como usar o vídeo? 
Indicaremos algumas sugestões de trabalho, dentre inúmeras possíveis, a partir do vídeo e da leitura da obra. Temos certeza de que, a partir delas, outras surgirão de você, professor ( a ). O conhecimento é uma teia de hipertextos entrelaçados. Lembre-se disso. Para cada palavra, afirmação, imagem, texto há uma infinidade de possibilidades de trabalho. Faça suas opções.
Atividades de Língua Portuguesa
1. Antes de assistir ao vídeo, coloque uma questão problematizadora aos alunos . Peça a eles que levantem uma figura marcante, considerada uma herói. Pode ser qualquer figura, de qualquer época, com quem tenham mantido contato por qualquer meio. Dê um tempo a eles e peça para que escrevam no caderno o nome desse herói e quais são os atributos que o tornam um herói. 
É bem provável que os heróis levantados venham da historiografia brasileira, dos filmes de aventura ou sejam personalidades esportivas. Chega-se, com grande margem de certeza, a uma conclusão homogênea. O herói tem coragem, enfrenta obstáculos incomuns, representa um grupo de pessoas, age em prol do coletivo. Depois das discussões e levantamento das características, coloque a questão : “ Será que há um herói cuja marca interjeitiva é : Ai! Que preguiça ?”. Após a discussão, passe o vídeo. Discuta se Macunaíma é um herói. ( Aproveite para lembrar – se da figura de Peri de O Guarani ) 
2. No caso de Macunaíma, Mario de Andrade enche sua narrativa de falares populares, expressões indígenas e construções sintáticas que fogem à norma culta, com exceção do capítulo : Carta pras Icamiabas. Transcreva trechos da obra e peça aos alunos para observarem a subversão da norma culta ( pontuação, colocação pronominal, uso do pronome oblíquo, escolha lexical etc ). Mario de Andrade foi muitas vezes criticado por reproduzir a fala coloquial do povo brasileiro. 
3. No capítulo Carta pras Icamiabas, como diz o vídeo, o autor quis fazer uma crítica explícita à linguagem hermética de autores passados e à própria postura da elite paulistana. Trabalhe alguns trechos da carta, interprete essas críticas e faça alusão à intertextualidade com o poema épico de Luís de Camões, Os Lusíadas.
“Porém já cinco Sóis eram passados
Que dali nos partiríamos, cortando
Os mares nunca de outrem navegados 
Prosperamente os ventos assoprando.” Os Lusíadas, Canto V, estrofe 37
“ Nem cinco sóis eram passados que de vós nos partiríamos, quando a mais poderosa desdita pesou sobre nós.” Macunaíma,p.55
4. O excesso de digressões, a presença do fantástico e a mistura de lendas, histórias e crendices populares tornam a obra, embora de narrativa rápida, complexa na proposição constante da intertextualidade. Há alusão a várias figuras de nosso folclore. No caso, divida os alunos em grupos, peça a cada grupo que faça uma pesquisa sobre um personagem folclórico da obra, registre sua história e apresente para a classe, oralmente, usando os recursos que quiser. Os livros de Luís da Câmara Cascudo, citados nas fontes de consulta, ajudarão bastante.
5. O vídeo traz um grupo de rapper que musica um poema de Mario de Andrade .Trabalhe com os alunos esse tipo de manifestação musical. Se houver algum interesse, proponha a criação de um rap, partindo de outro poema de Mario de Andrade.
6. O vídeo traz a informação de que Anita Malfatti foi severamente criticada por Monteiro Lobato, quando de sua exposição em 1917. Proponha um julgamento simulado do Modernismo por parte dos alunos. Escolha um juiz, advogados e testemunhas de defesa e acusação. Para tanto, os alunos devem estudar todos os fatos envolvidos na Semana de Arte Moderna. Os jornais brasileiros, com mais ênfase os paulistanos, devido às comemorações dos 80 anos da Semana de Arte Moderna, têm veiculado fontes documentais muito ricas sobre o evento.
Mostre aos alunos, também, a tela Homem Amarelo de Anita Malfatti, reproduzida em transparência e leia parte do artigo de Monteiro Lobato, reproduzido abaixo. Essa atividade costuma entusiasmar bastante os alunos e incentivá-los a construírem conhecimentos substanciais sobre o assunto. 
“ Sejamos sinceros : futurismo, cubismo, impressionismo e “tutti quanti” não passam de outros tantos ramos da arte caricatural. É a extensão da caricatura a regiões onde não havia até agora penetrado. Caricatura da cor, caricatura da forma – caricatura que não visa como a primitiva, ressaltar uma idéia cômica, mas sim desnortear, aparvalhar o espectador.”  Monteiro LOBATO em O Estado de São Paulo de 20/12/1917 sob o título de Paranóia ou Mistificação?
7. Peça uma pesquisa aos alunos sobre as vanguardas européias citadas pelo vídeo e sintetizadas neste texto. Os alunos devem trazer informações, figuras, poemas e apresentar para a classe. O livro Vanguarda Européia e o Modernismo Brasileiro ( citado na bibliografia), por exemplo, traz os principais manifestos na íntegra. 
Como outra sugestão, leia para os alunos um desses manifestos, com bastante ênfase e proponha a eles para criarem um manifesto para o século XXI e darem um nome para a vanguarda. Trabalha-se a criatividade, argumentação e a produção textual.
8. Reproduza para os alunos o poema abaixo : 
Ode ao burguês (poema extraído do livro Paulicéia Desvairada)
Eu insulto o burguês ! O burguês-níquel,
O burguês-burguês !
A digestão bem-feita de São Paulo!
O homem-curva! o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano,
É sempre um cauteloso pouco-a-pouco !
Eu insulto as aristocracias cautelosas!
Os barões lampeões! os condes Joões! os duques zurros!
que vivem dentro de muros sem pulos;
e gemem sangue de alguns mil-réis fracos
para dizerem que as filhas da senhora falam o francês
e tocam o “ Printemps” com as unhas!
Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros!
Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais
o êxtase fará sempre Sol! 
Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais!
Morte ao burguês-mensal!
ao burguês-cinema! ao burguês tílburi!
Padaria Suíssa! Morte viva ao Adriano!
- Ai, filha, que te darei pelos teus anos?
- Um colar ... - Conto e quinhentos!!!
Mas nós morremos de fome!” 
Come! Come-te a ti mesmo, oh, gelatina pasma!
Oh! purée de batatas morais!
Oh! cabelos nas ventas! oh! Carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!
Òdio aos relógios musculares! Morte e infâmia!
Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados!
Òdio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia!
Dois a dois! Primeira posição! Marcha!
Todos para a Central de meu rancor inebriante!
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos,
cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o bom burguês! ...
Peça, primeiramente, para os alunos sintetizarem oralmente o assunto do poema, a partir do que ouviram no vídeo. Em seguida, com o poema às mãos, trabalhe as críticas à burguesia, vocabulário, construção, intenção, enfim, toda a riqueza estético-literária do poema. 
Proponha aos alunos, também, para pesquisaremo significado de Ode.
Atividades interdisciplinares
1. Foi publicado em 2001 um livro com as Cartas de Mario de Andrade a Luís da Câmara Cascudo. No trecho a seguir, Mario de Andrade pede ao amigo algumas contribuições sobre a cultura musical brasileira. Nas demais cartas ( várias ), ambos se ajudam para aprimorar suas obras. Reproduza o trecho para os alunos, leia - o e peça a eles que simulem uma resposta à carta de Mario, falando de alguns ritmos musicais brasileiros que conhecem e também sobre algumas lendas que o ajudariam a criar seus livros. Os professores de História, Arte, Língua Portuguesa podem trabalhá-la. Além da pesquisa da cultura brasileira , os alunos trabalham o gênero epistolar. 
São Paulo, 10-VIII-926
“ Luís, 
Esta é só um pedido. Desculpe. Você por acaso conhece a melodia de alguns aboiados aí do norte ? Com letra si possível, ou milhor as sílabas com que os vaqueiro apresentam suas frases musicais. Veja si mi arranja alguns, me mande todos os que puder, por mais insignificantes que sejam ( ... ) Si você tiver amigos aí no norte, Pará, Amazonas, Sergipe etc que se possam interessar por mim, veja si arranja com eles também alguma coisa ( ... ) E no mais te espero e abraço rijo 
(a) M”
2 . Em um ensaio denominado “ Sampaterrasdotietê . As andanças do “ preto retinto e filho do medo da noite” na São Paulo dos anos 20”, o autor, José Alfredo Pontes, defende que o clímax de Macunaíma dá-se em Sâo Paulo. 
“ Muito embora o “ herói sem nenhum caráter” seja amazônico de origem, a saga macunaímica atinge seu clímax nas terras do igarapé Tietê. E não podia ser em outro lugar. De todas as grandes cidades brasileiras, São Paulo é a que menos tem um caráter definido, justamente por não ter uma marca específica, mas sim uma multiplicidade de caracteres como o próprio Brasil. No caso, ter “ nenhum caráter” não é nulidade mas, ao contrário, ter vários : o que não é singular é plural, assim como o branco é a super posição de todas as cores básicas.” 
A partir desse trecho e do vídeo, os professores de Geografia e História podem estudar com mais profundidade a cidade de São Paulo e sua constituição populacional. 
Use esse trecho, também, para desenvolver com o cuidado merecido a afirmação de que Macunaíma é um “ herói sem nenhum caráter”. 
3. Macunaíma é a mistura das três etnias formadoras da identidade nacional. Estude com os alunos a formação do povo brasileiro e a contribuição cultural das etnias formadoras de nossa identidade. Não se esqueça de trabalhar o censo 2000 e a condição do negro e do índio no início do século XXI. Em Biologia, pode-se trabalhar os conceitos de etnia e raça, pois no momento da elaboração da obra, bem como em estudos subseqüentes sobre ela, usava-se apenas o termo raças.
4. A partir da linha do tempo, aprofunde os temas. As marcas históricas abrangem aspectos sociais, políticos, culturais, artísticos e até simples curiosidades.
5. Em Ciências , trabalhe a teoria da relatividade e todos os aspectos das Ciências no século XX. Por exemplo, a questão dos meios de destruição em massa, aprimorados nas duas Grandes Guerras.
6. A Capa da revista Época , Ano IV nº178, 15/10/2001, traz a releitura do quadro O Grito de Edvard Munch. A manchete é O mundo ficou perigoso. 
Trabalhe-a com os alunos. Os passos são os seguintes :
· Leia aos alunos a manchete, sem mostrar a capa. 
· Peça a eles para imaginarem uma figura ou mesmo produzirem um desenho que corresponda à manchete .
· Se puder, traga algumas telas vanguardistas, dentre elas O grito, e mostre-as em transparências. Conte aos alunos que uma das telas serviu de inspiração à revista. Pergunte qual foi ?
· Mostre aos alunos a capa em transparência e discuta com eles o porquê da revista escolher essa tela. 
 Quais são as semelhanças e diferenças entre o momento em que o pintor a produziu e a época em que se
veiculou a revista ? 
· Esse trabalho proporciona inúmeras discussões sobre vários aspectos sociais, econômicos, políticos, culturais, vividos no início do século XXI. 
8. Sugestões de alguns temas para projetos interdisciplinares.
· Imigração e formação do povo brasileiro.		· Macunaíma . Típico brasileiro ?
· Revisitando a Semana de Arte Moderna. 		· Sarau literário – A Semana de Arte Pós -Moderna.
· Temática indígena hoje.				· Internacionalização da Amazônia. 
Pesquisa. 
Atenção para essa proposta.
O papel do professor como orientador das pesquisas e projetos dos alunos é uma das chaves para o sucesso dos trabalhos. Há alguns passos básicos a seguir : 
· Escolher um tema significativo. 
· Definir o cronograma, etapas do trabalho e acompanhá-las.
· Delimitar os objetivos e explicitar sua finalidade.
· Definir junto aos alunos a metodologia, ou seja, os melhores métodos de obtenção dos dados. ( entrevista, fichamento, visitas a museus, pesquisa bibliográfica etc ) 
· Definir o produto final, a veiculação da pesquisa e seu público alvo. ( texto, apresentação oral, cartazes, feiras etc ) 
· Indicar aos alunos algumas fontes de pesquisa .( livros, museus, sites, artigos de opinião etc ) 
· Lembrar os alunos para indicarem, com precisão, as fontes consultadas.
Para assistir
· 1900- Bernardo Bertolucci , 1976.		· Eternamente Pagu – Norma Bengel, 1987.
· Gaijin – Tizuka Iamazaki, 1988.			· Guerra de Canudos – Sérgio Rezende, 1997.
· Lição de amor - Eduardo Escorel , 1975.		· Macunaíma - Joaquim Pedro de Andrade, 1969.
· O Quatrilho – Fabio Barreto ,1995 .		· Reds - Warren Beatty , 1981.
 · Tempos Modernos - Charles Chaplin , 1936.
Para ouvir
CDs Documento Sonoro do Folclore Brasileiro ( Vários volumes ).Acervo Funarte da Música Brasileira
CD Doze Lendas Brasileiras- Clarice Lispector 
Claude Debussy, Maurice Ravel, Heitor Villa Lobos
O site www.artemusical.com/martinsferreira traz informações preciosas sobre o uso da música como instrumento didático.
Para consultar, ler , apreciar e pesquisar
· A História vai ao Cinema. Vinte filmes brasileiros comentados por historiadores. Organização de Mariza de Carvalho Soares e Jorge Ferreira. Editora Record, 2001.
· Brasileiro ( a ) é assim mesmo. Cidadania e Preconceito. Jaime Pinsk e Luzia Nagib Eluf. Editora Contexto,1997.
· Cartas de Mário de Andrade a Luís da Câmara Cascudo. Editora Itatiaia,2000.
· Como usar a música em sala de aula. Martins Ferreira. Editora Contexto,2001.
· Lendas Brasileiras de Luís da Câmara Cascudo. Editora Global,2000.
· Lendas do índio Brasileiro. Organização de Alberto da Costa e Silva. Editora Ediouro, 1999. ( Traz a lenda de Macunaíma , traduzida de Koch –Grunberg ) 
· O Mario que não é de Andrade. O menino da cidade lambida pelo Igarapé Tietê. Luciana Sandroni. Companhia das Letrinhas, 2001.
· Parâmetros Curriculares Nacionais . Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental. MEC.
· Personae. Grandes personagens da Literatura Brasileira. Organização de Lourenço Dantas Mota e Benjamin Abdala Junior. Editora Senac, 2001.
· Telas de Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral, Lasar Segall, Anita Malfatti, Cândido Portinari , Salvador Dali, Pablo Picasso
· Esculturas de Victor Brecheret ( O monumento às Bandeiras no Parque Ibirapuera, em São Paulo, é de sua autoria)
 
Para navegar
www.ibge.net
 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
www.arteplastica.com
Artes plásticas na rede
www.museuvirtual.com.br
 Dedicado aos artistas nacionais
www.usp.br/geral/cultura/musebli.shtml
Acesso à coleção do Instituto de Estudos Brasileiros na USP
www.terra.com.br/literatura/modernismo/modernismo.shtm
 Explicação minuciosa do movimento modernista
Referências Bibliográficas
ANDRADE, Mario. Macunaíma. O herói sem nenhum caráter. Belo Horizonte: Editora Villa Rica, 1997.
BATISTA, Marta R., LIMA, Yone. Coleção Mario de Andrade. Artes Plásticas. 2ed. São Paulo : Instituto de Estudos Brasileiros, 1998. 
CALDEIRA, Jorge e outros. Viagem pela História do Brasil. São Paulo : Companhia das Letras, 1997 
CAMÕES,Luís Vaz de. Os Lusíadas. São Paulo : Cultrix, 1982. 
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro : Ediouro, s/d.
MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. São Paulo: Cultrix, 1988.
________________. História da Literatura Brasileira. Modernismo. São Paulo : Cultrix, 1989
TELES, Gilberto Mendonça. Vanguarda Européia e Modernismo Brasileiro. 8ed. Petrópolis, Vozes, 1985.
Materiais disponíveis na Videoteca :
 " Mário de Andrade : Reinventando o Brasil" / documentário(2002) 30’ 		Fita 97
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
 " Mário... Um homem Desinfeliz" / documentário(1993) 		 25’ 	 Fitas 97/70
Vídeo de Adilson Ruiz, em comemoração ao centenário de nascimento do escritor, idealizado e realizado pelo Itaú Cultural.
 " Mário de Andrade " / documentário(1980) 				50’ 	 Fitas 97/52
Documentário histórico, sobre a vida e a obra do escritor.
 " Macunaíma" / filme (1969) 				102’ 	Fita 95
Baseado no livro homônimo de Mário de Andrade. Direção de Joaquim Pedro de Andrade.
 " Lição de Amor" / filme (1976) 				 81’ 	Fita 96
Baseado no livro Amar, Verbo Intransitivo. Direção de Eduardo Escorel.
Atenção : Sugerimos também os materiais disponíveis no Capítulo Semana de Arte Moderna �
 Machado de Assis: Um mestre da periferia(1839-1908)
Ângela Carvalho e Jorge Ribeiro
“O que se deve exigir do escritor, antes de tudo, é certo  sentimento que o torne homem do seu tempo e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço.” Sentimento de Nacionalidade (Ensaio) 
Apresentação do autor				Memórias Póstumas de Brás Cubas
Atividades de Língua e Literatura			Interdisciplinaridade
 Para ler 
I. Apresentação do autor
21 de junho de 1839. Numa casa modesta da Chácara do Livramento, na periferia do Rio de Janeiro, nascia Joaquim Maria Machado de Assis. Naquele momento, nada no ambiente que o cercava parecia indicar que o recém nascido estava destinado a se tornar o maior escritor brasileiro do século XIX e, talvez, de toda a nossa história literária. De acordo com o vídeo a que você assistiu, há vários modos de se referir a Machado: “bruxo do Cosme Velho”, “homem subterrâneo”, “mestre na periferia do capitalismo”. 
Sua cor era parda, quase negra. Seu pai, Francisco de Assis, era neto de escravos e pintor decorador, uma espécie de artista-operário que pintava paredes. Sua mãe, Maria Leopoldina, era branca de origem portuguesa. Trabalhava em serviços caseiros e fazia costuras para ajudar o marido. Embora pobres e humildes, não eram analfabetos. Pelo contrário, gostavam de ler, e é provável que seus hábitos de leitura tenham influenciado o menino.
Entretanto, sua origem social e racial não contribuíam para lhe tornar as coisas fáceis. Machado de Assis viveu numa época em que jovens brancos e ricos tinham condições para estudar e completar o ensino superior, o que faziam geralmente em Portugal. Ao que parece, não chegou nem mesmo a freqüentar regularmente uma escola. 
Sua mãe morreu muito cedo; o pai casou-se novamente, com uma brasileira Maria Inês, que passou a cuidar do menino. Aos 16 anos, já adolescente, saiu da periferia e passou a viver no centro da cidade. A essa altura da vida, já lia razoavelmente em inglês e francês. Tornou-se, então, aprendiz de tipógrafo da Tipografia Nacional e publicou seu primeiro trabalho literário, um poema, num jornal chamado A Marmota Fluminense. Passa a trabalhar no Ministério da Agricultura, a partir de 1874, numa seção que tinha entre suas funções, garantir a execução da Lei do Ventre-Livre, editada em 28/09/1871. Permaneceu nesse cargo por trinta e cinco anos, com sucessivas promoções. 
Escreveu para diversas revistas e jornais. Publicava, críticas literárias, peças de teatro, poemas, crônicas e contos cada vez melhores e mais interessantes. Entretanto, só lançou seu primeiro romance, Ressurreição, em 1872, quando já tinha mais de 30 anos de idade. Nessa época, ele já era bastante conhecido como jornalista e escritor.
Em 1881, era publicado o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, do qual você leu alguns trechos nesta revista e assistiu ao vídeo. Famosa e importantíssima para a literatura brasileira, essa obra é considerada um marco: com ela se inicia um movimento literário chamado Realismo. Segundo o Prof. Alfredo Bosi esse romance “...como revolução formal foi a mais importante da literatura brasileira”.
Alguns biógrafos afirmam que Machado de Assis traiu suas origens sociais, isto é, sua infância pobre e sua condição de filho de operário, ao escrever apenas sobre as pessoas ricas. Mas essa afirmação não é correta, pois em seus livros o autor registrou o modo de ser da sociedade senhorial e escravista, para criticá-la, utilizando a ironia e mostrando a conduta artificial, insensível e egoísta da classe dominante, como se pode ver em Memórias Póstumas de Brás Cubas. Essas características fazem de Memórias Póstumas de Brás Cubas um livro ético. 
O vídeo nos mostra que Machado antevia a abolição dos escravos, mas já sabia que a estrutura básica da sociedade não seria alterada. Ele não via o Brasil caminhando em direção a uma sociedade igualitária, democrática, pelo contrário, ele representou a forma e os mecanismos criados pela sociedade para garantir estratégias de privilégios e de exclusão. Por mais que mudasse, continuaria a mesma. O vídeo também nos mostra o que dizia Machado: “ você pode trocar de roupa sem mudar de pele”. Isto é: continuar a mesma coisa. 
A grandeza de Machado de Assis está justamente aí: ao narrar histórias individuais das classes ricas, tratou com ironia e sutileza questões importantes da sociedade da época, dando ao leitor a oportunidade de também pensar sobre essas questões.
Machado de Assis foi fundador e primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras. Deixou uma obra vastíssima, entre romances, livros de poemas, contos, crônicas e peças de teatro. Além de romances, já citados, escreveu Dom Casmurro, Quincas Borba, Helena, Iaiá Garcia, Esaú e Jacó e diversos outros. Morreu em 29 de setembro de 1908, quatro anos depois de sua mulher, Carolina Xavier de Novais, grande amor de sua vida, com a qual foi casado durante trinta anos.
II.O romance Memórias Póstumas de Brás Cubas
Geralmente, as pessoas têm paciência para assistir a mais de cem capítulos de uma telenovela, e não lêem duas páginas sequer deste tão famoso romance de Machado de Assis. Por quê? Porque a linguagem é difícil e os acontecimentos narrados distanciam-se da realidade atual. Este livro, primeiramente, foi sendo publicado aos poucos; eram pequenas tiras que circulavam no jornal da época, chamado de folhetim. A cada dia, quem sabia ler podia, por assim dizer, assistir a sua novela. 
1. Algumas Características do romance de Machado de Assis 
O personagem central desta obra é Brás Cubas contando, em primeira pessoa, suas aventuras e desventuras. Ainda criança, ele se diverte montando em um escravo como se fosse seu cavalo. 
O narrador assim se caracteriza no capítulo nove: “Desde os cinco anos merecera eu a alcunha de ‘menino – diabo’; fui dos mais malignos do meu tempo, arguto, indiscreto, traquinas e voluntarioso".(p. 26) Acrescentando, mais adiante: “Não se conclua daqui que eu levasse todo o resto de minha vida a quebrar a cabeça dos outros nem a esconder–lhes os chapéus; mas opiniático, egoísta, e algo contemptor dos homens, isso fui; se não passei o tempo a esconder – lhes os chapéus, alguma vez lhes puxei, pelo rabicho as cabeleiras”. (p.26)
O fato é que, enquanto narra, o personagem vai sendo pintado para o leitor, mas é nos capítulos iniciais do romance que ele se apresenta com mais ênfase: “Outrossim, afeiçoei – me à contemplação da injustiça humana, inclinei– me a atenuá–la, a explicá–la, a classificá–la por partes, a entendê–la não segundo um padrão rígido, mas ao sabor das circunstâncias e lugares”. 
No ano de 1822, Brás Cubas tinha dezessete anos e, assim, mostra-se ao leitor: “...pungia – me um buçozinho que eu forcejava por trazer a bigode. Os olhos, vivos e resolutos, eram a minha feição verdadeiramente máscula. Como ostentasse certa arrogância, não se distinguia se era uma criança com fumos de homem, se um homem com ares de menino.” (p.26) 
Mais traços da curiosa personalidade de Brás Cubas podem ser observados quando ele fala de Marcela, sua primeira aventura amorosa: “Primeira comoção da minha juventude, que doce que me foste! Tal devia ser, na criação bíblica, o efeito do primeiro sol, a bater de chapa na face de um mundo em flor. Pois foi a mesma coisa, leitor amigo, e se alguma vez contaste dezoito anos, deves lembrar – te que foi assim mesmo”. (p. 34)
Entretanto, adiante, ao se referir, mais uma vez, a seu caso amoroso com Marcela ele diz a célebre frase: “Marcela amou – me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos”. Anos depois, quando volta a se encontrar com Marcela ela está com o rosto deformado pela varíola. 
Desfeito o romance com Marcela, o pai de Brás Cubas obriga – o a estudar em Portugal, Coimbra. Lá, ele bacharelou – se, mas veja o que ele afirma sobre esse fato: “Tinha eu conquistado em Coimbra uma grande nomeada de folião; era um acadêmico estróina, superficial, tumultuário e petulante, dado às aventuras, fazendo romantismo prático e liberalismo teórico, vivendo a pura fé dos olhos pretos e das constituições escritas”.(p. 42)
Retorna de Coimbra, morre–lhe a mãe e ele conhece Eugênia, moça de dezessete anos, mas não chega a ter um romance com ela. Parece que Eugênia mancando de uma das pernas não combina com o narrador, manco no espírito. Sobre ela, afirma o narrador: “... foste aí pela estrada da vida, manquejando da perna e do amor, triste como os enterros pobres, solitária, calada, laboriosa, até que vieste também para esta margem.” (p.56) A certa altura da narrativa o Brás Cubas, novamente afirma sobre ela: “O pior é que era coxa. Uns olhos tão lúcidos, uma boca tão fresca, uma compostura tão senhoril; e coxa! Esse contraste faria suspeitar que a natureza é às vezes um imenso escárnio. Por que bonita, se coxa? Por que coxa, se bonita?” (p. 54) A última mulher que aparece na vida de Brás Cubas, Eulália, com a qual ele estava disposto a casar, morre aos dezenove anos. Sobre ela, afirma o narrador: “Era notável a diferença que ela fazia de si mesma; estudava–se e estudava–me. A vida elegante e polida atraía – a, principalmente porque lhe parecia o meio mais seguro de ajustar nossas pessoas”. (p. 122) Outro caso amoroso que a história apresenta é com Virgília, filha do Conselheiro Dutra. Sobre ela, logo de saída, ao conhecê–la, diz o narrador: “...e o nosso olhar primeiro foi pura e simplesmente conjugal. No fim de um mês estávamos íntimos”. E mais adiante: “Positivamente, era um diabrete Virgília, um diabrete angélico, se querem, mas era – o, e então...” 
Na seqüência, perde Virgília para Lobo Neves e morre–lhe o pai. 
No entanto, mesmo com Vírgilia casada, eles iniciam um romance adúltero, sem que o narrador expresse o menor sentimento de culpa. Diz o narrador: “Sim senhor, amávamos. Agora, que todas as leis sociais no–lo impediam, agora é que nos amávamos deveras. Achávamo-nos jungidos um ao outro, como as duas almas que o poeta encontrou no purgatório”. Nos capítulos seguintes Brás Cubas continua a escrever versos e comentários políticos. Assim, Brás Cubas acaba solteiro e sem filhos. Depois da morte de Eulália, ele tenta se candidatar ministro, mas, em virtude da mediocridade do discurso por ele apresentado, acaba sendo rejeitado. Em seguida ele funda um jornal para atacar os políticos que não o aceitaram. Tempos depois adoece e morre. Um pouco antes de sua morte, ainda no início do livro, recebe a visita de Virgília que vem acompanhada do filho.
No final do último capítulo o narrador deixa a frase célebre: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria”. 
Brás Cubas, “autor – defunto”, narra em primeira pessoa um enredo caracterizado, no vídeo, pelo crítico e ensaísta Roberto Schwarz como banal. Não há em Machado de Assis preocupação de povoar a narrativa com muitos acontecimentos; ele preocupa – se muito mais com a análise das personagens através de profundas reflexões. Assim, o narrador vai conversando com o leitor e analisando a própria narrativa, interrompendo – a sucessivamente para que o leitor possa refletir sobre aquilo que está sendo lido.
“O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado. Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguei na composição destas Memórias, trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, e aliás desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago – me da tarefa; se te não agradar, pago –te com um piparote, e adeus”. (página 12)
Como nos diz Schwartz, no vídeo, a presença do narrador em Memórias “é um insulto ao leitor”. 
2. As duas fases do romance de Machado de Assis.
Os romances de Machado de Assis costumam ser divididos em duas fases. Segundo o crítico e ensaísta Roberto Schwartz, no vídeo, a primeira fase, contém “romances considerados convencionais, tanto por manterem – se presos às características dos romances do século XIX como pela abordagem do contexto social”. É, por assim dizer, a fase romântica do autor. A segunda fase vem depois das crises epilépticas de Machado e é como se tivesse havido uma evolução espiritual do autor. Esta é a fase, chamada realista.
Roberto Schwartz nos diz que é nesta fase que Machado de Assis “dá a pena (de escrever)” às elites do seu tempo, ironizando o autoritarismo e a sociedade senhorial.
Aspectos formais de Memórias Póstumas de Brás Cubas e a segunda fase de Machado de Assis
Espaço: O Rio de Janeiro. A natureza do livro permite que o narrador dispense pouca atenção à paisagem. O que importa são as reflexões desenvolvidas ao longo dos capítulos, no mundo das elites, donas de escravos, em 1800; um ambiente em que predominava a preguiça e o descanso. Uma das raras descrições de paisagem: “O morro estava ainda nu de habitações, salvo o velho palacete do alto, onde era a capela”. (p. 121)
Linguagem: o processo narrativo desse romance de Machado de Assis pode ser estudado a partir da elasticidade de sua estrutura. Claro está que ele apresenta começo, meio e fim, mas, já no início, Brás Cubas fala de sua morte, no meio fala de sua vida, e no final, remete – nos ao primeiro capítulo e encerra o livro. Nessa narrativa, o narrador inclui outros gêneros literários utilizando, por exemplo, cartas e pequenas histórias. 
Os capítulos são curtos e todos eles têm um título como que para orientar o leitor a não perder de vista as intenções do narrador. O estilo brincalhão e galhofeiro deste livro está aliado a uma linguagem em que as frases exigem muita atenção e reflexão. “Então, considerei que as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de os descalçar”. (p.56)
Cosmovisão do autor: a visão do mundo de Machado de Assis engloba observação aguda e análise profunda da realidade. Isto ele faz, através do humor, carregado de ironia e, também, através de um pessimismo que, longe de ser marcado pelo desespero ou pela angústia, propõe de forma irônica que se desfrutem os pequenos prazeres que a vida possa trazer, já que é impossível ser completamente feliz. Uma das célebres digressões de Brás Cubas sobre o homem: “...é uma errata pensante...cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes”. Esse modo de narrar, filosófico e cômico, aliado a outros elementos da narrativa, a linguagem e posiçãodo narrador, por exemplo, transcorre em ritmo de Carnaval, o que levou o crítico José Guilherme Merquior a chamar o livro de “O romance carnavalesco de Machado”. Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, brincadeiras e críticas se alternam para que o narrador execute sua crítica moral e, para isso, prevalecendo – se de fértil imaginação e laboriosa reflexão. Capítulos curtos e muitas digressões, através de constantes conversas com o leitor, são possíveis porque a estrutura desse romance é elástica, permitindo divertidas manobras. O simples fato de estar na boca de um narrador defunto a tarefa de narrar, permite que o autor abuse das críticas e dos comentários sobre o modo de vida dos homens de oitocentos, sem se comprometer. As relações todas entre as pessoas permitem vislumbrar a presença de um autor, pesando os fatos e as idéias. No vídeo, afirma o ensaísta e crítico literário Roberto Schwartz sobre o modo de Machado de Assis ver a realidade em suas obras da segunda fase: “Enquanto o Machado de Assis da primeira fase tinha uma visão de quem quer colaborar para ilustrar a sociedade, para aumentar o seu brilho, para torná–la mais civilizada, o da segunda fase dizia: isto aqui não tem remédio, isto aqui só tem cara de civilizado, na verdade é completamente bárbaro...” , antes ele havia dito sobre a primeira fase: “...não tem objeções ao modo de vida da sociedade brasileira, nem ao desejo de ascensão social) - ... 
III. Atividades de língua e literatura
Atividade de expressão oral
Em sua vida diária, os alunos são permanentemente expostos a vários tipos de discurso: dos comercias de televisão aos chamados “filmes de ação”, entre outros. O intuito desta atividade é contribuir para que eles adotem uma atitude crítica diante das informações que recebem, exercitando desse modo sua capacidade de discernir e fazer escolhas no decorrer da vida. 
Atividades como estas, atendem a necessidade de preparar o aluno para diferentes situações comunicativas. Um bom domínio das linguagens oral e escrita é condição fundamental para a plena participação social. Entretanto esse domínio só se efetiva quando o indivíduo é capaz de transitar, sem constrangimentos, pelos diversos contextos sociais. Para isso, ele precisa dominar o saber lingüístico de seu contexto social de origem e
outros saberes, produzidos e utilizados em esferas decisórias da sociedade. O objetivo é propiciar condições para que o aluno possa desenvolver sua capacidade lingüística , encorajando – o a tomar a palavra e a defender suas opiniões na vida escolar e, mais tarde, na vida profissional e no exercício dos seus direitos e deveres de cidadãos.
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A ENTREVISTA estimula o aluno a perceber que um dos caminhos da aprendizagem é questionar- a si mesmo e aos outros -, fazer uma entrevista acompanhada de um esforço íntimo em busca de respostas. O questionamento por si só é importante, mas sua dimensão criadora e crítica só se revela quando aquele que indaga procura construir, ele próprio, os instrumentos que lhe trarão a resposta.
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1. O Prof. De Literatura Brasileira da USP, Alfredo Bosi, afirma que Machado de Assis sofreu muito durante sua vida, mas foi bem sucedido. Conforme nos mostra o ensaísta e crítico literário Roberto Schwartz: Machado de Assis não acreditava no progresso e numa futura sociedade igualitária. Do início ao fim do vídeo há depoimentos sobre a vida Machado de Assis. Solicite a seus alunos que:
· Elaborem uma entrevista com as questões que seguem:
a) quem foi Machado de Assis;
b) o título de um livro, poema, crônica ou conto?
c) conhece alguma história de suas publicações?
· Eles devem anotar os dados da entrevista da seguinte forma:
Nome: Ana Maria de Sá 			Idade: 43 anos
Respostas: Machado de Assis escreveu Memórias póstumas de Brás Cubas, um defunto que resolveu contar sua vida, começando pelo enterro.
· Observar, na sua leitura com a classe, as características de um texto biográfico. Que informações ele oferece? É possível saber se a pessoa biografada ainda vive?
· Aproveitar a leitura do texto biográfico. Criar uma biografia (a história de um escritor ou qualquer outra personagem inventada pelo aluno). Fazer uma lista das informações e usar rascunho. Não se esquecer das características do texto biográfico.
Finalize a atividade com uma aula em que os alunos lêem em voz alta a biografia produzida por eles. Diga aos alunos que o vídeo começa com a narração da biografia de Machado de Assis e termina quando ele morre, as informações biográficas permeiam o vídeo.
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Objetivos e Conceitos estudados:
Saber fazer uma entrevista.
Identificar os elementos conceituais e formais do texto biográfico.
Executar, resolver e interpretar coesão e coerência textual.
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Atividade de expressão escrita
2. No vídeo há, nas entrelinhas, uma longa reflexão sobre o escravismo e o que vem a ser realmente a liberdade. Há vários textos de Machado de Assis que abordam temas relacionados ao escravismo e ao preconceito racial. A herança da escravidão ainda não foi totalmente superada. Ela subsiste no preconceito, na descriminação racial e social, na marginalização dos negros e na existência do trabalho escravo em algumas regiões de nosso país.
Aproveitar a leitura do capítulo “O vergalho” para comentar que Brás Cubas vê uma briga na rua em que um negro bate em outro. Reconhece no agressor o moleque escravo( cena do vídeo) em que ele batia quando criança. Prudêncio, o escravo, agora liberto, dono de uma quitanda, era senhor de um escravo, e acusava seu novo escravo de alcoolismo. O autor nos mostra nesta passagem do romance que a escravidão e o racismo deixaram seqüelas emocionais na personagem. Cubas intervém e obriga-o a perdoar o outro.
Observar, numa leitura com a classe, o diálogo que aparece no capítulo “O vergalho”:
”-É, sim, nhônhô.
-Fez-te alguma coisa?
-É uma vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.
-Está bom, perdoa-lhe, disse eu.
-Pois não, nhônhô. Nhônhô manda, não pede. Entra para casa bêbado!”
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Vergalho: este verbete apresenta dois significados: chicote e patife.
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Comentar aos alunos que, embora fosse livre, Prudêncio manteve uma atitude de escravo, obedecendo à ordem de Brás Cubas: . “Nhônhô manda, não pede.” E, ao mesmo tempo, ele era um senhor de escravos.
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A DIVERSIDADE TEXTUAL
Com a intenção de formar bons produtores, as atividades de produção textual devem ter a preocupação de mostrar aos alunos diversos tipos de texto, da biografia ‘a produção de poemas, da argumentação à canção popular. O objetivo é estimular o poder criador, desenvolver a imaginação do aluno e iniciá-lo na convivência com a literatura em geral.
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· Aproveitar a leitura do capítulo para organizar um debate para desenvolver a capacidade de argumentação dos alunos. O tema proposto é: o escravismo e o que vem a ser realmente a liberdade. Talvez os alunos não mudem de opinião, mas haverá um crescimento na medida em que se pensou uma questão social em grupo. O tema proposto envolve questões fundamentais para a formação de um pensamento ético.
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O DEBATE
1ª os alunos elegem um colega para ser o coordenador(mediador) do debate, que deverá abrir a discussão e apresentar o tema.
2ª cinco alunos serão escolhidos para a função de debatedores, que sentarão lado a lado, de frente para classe(o público), se possível, por trás de uma mesa. Entre eles deve estar o coordenador.
3ª Cada debatedor terá dois minutos para apresentar a sua posição a respeito do tema em discussão:a) se o escravo era racista; b) se há liberdade nas relações de trabalho; c) por que ainda há trabalho escravo no Brasil.
4ª O coordenador estabelece o turno de fala dos debatedores e concede a palavra a cada um deles no momento adequado. Procura saber se têm mais alguma coisa a acrescentar ao que disseram seus companheiros.Sempre intermediados pelo coordenador, os alunos devem expor seu ponto de vista e fazer perguntas a algum(s)debatedor(es).
Finalize a atividade com uma dissertação, faça um levantamento das argumentações defendidas no debate.
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Objetivos e Conceitos estudados:
Saber fazer uma debate.
Identificar os elementos conceituais e formais do texto argumentativo.
Executar, resolver e interpretar coesão e coerência textual.
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IV. Interdisciplinaridade 			Oldimar Pontes Cardoso
Seqüência didática
3. No início do vídeo, o professor de História da Unicamp Sidney Chalhoub informa que Machado de Assis nasceu no Morro do Livramento, então propriedade da família Barroso. Ele vivia ali com sua família “dependente, agregada” dos Barroso, que eram grandes proprietários rurais. Solicite a seus alunos:
· Procurem em um dicionário os diversos significados das palavras dependente e agregado e os registrem em seus cadernos. Caso haja na biblioteca da escola algum dicionário técnico de Sociologia ou História, solicite também que procurem nessas fontes.
· Diante dos diversos significados encontrados, escolham aquele que acreditam ser o mais próximo daquilo que Chalhoub quis dizer.
Finalize a atividade com uma aula expositiva sobre a organização da propriedade da terra no Brasil do final do século 19.
4. O professor de História da Unicamp Sidney Chalhoub nos diz no vídeo que Machado de Assis se tornou funcionário do Ministério da Agricultura a partir de 1874, numa seção que tinha entre suas funções, garantir a execução da Lei do Ventre-Livre, editada em 28/09/1871. Diz também que os conflitos que deve ter vivenciado com os interesses dos grandes proprietários rurais o inspiraram a produzir algumas personagens e passagens de sua obra. Para melhor entender esta questão, reproduza para seus alunos a Lei do Ventre-Livre, que pode ser encontrada em diversos livros didáticos, coletâneas de documentos históricos, ou no site da TV Escola. Em seguida, solicite a seus alunos que leiam a Lei do Ventre-Livre e a Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, transcrita abaixo. Após a leitura, seus alunos devem:
· Elaborar um glossário com os termos desconhecidos fundamentais para o entendimento das duas leis.
· Levantar hipóteses sobre por que a Lei Áurea, mais importante que a Lei do Ventre-Livre, apresenta um texto muito mais sucinto que o dela.
Finalize a atividade com uma aula expositiva que solucione as dúvidas de seus alunos a respeito desta atividade, identifique a eles os outros projetos de abolição existentes naquele contexto e explique porque ela foi realizada na forma da Lei Áurea.
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“Lei Áurea
Declara extinta a escravidão no Brasil
A princesa imperial regente em nome de Sua Majestade o imperador, o senhor d. Pedro II, faz saber a todos os súditos do Império que a Assembléia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:
Art. 1o: É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil.
Art. 2o: Revogam-se as disposições em contrário.
Manda portanto a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida lei pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém.
O secretário de Estado dos Negócios d’Agricultura, Comércio e Obras Públicas e interino dos Negócios Estrangeiros, bacharel Rodrigo Augusto da Silva, do Conselho de sua majestade o imperador, o faça imprimir, publicar e correr.
Dado no Palácio do Rio de Janeiro, em 13 de maio de 1888, 67o da Independência e do Império.
Carta de lei, pela qual Vossa Alteza Imperial manda executar o decreto da Assembléia Geral, que houve por bem sancionar declarando extinta a escravidão no Brasil, como nela se declara.
Para Vossa Alteza Imperial ver.”
BONAVIDES, Paulo & AMARAL VIEIRA, R. A. Textos políticos da história do Brasil. Fortaleza: Imprensa Universitária da Universidade Federal do Ceará, s/d, p. 788.
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5. O ensaísta e crítico literário Roberto Schwartz disse no vídeo: “Machado de Assis teve essa coisa extraordinária de ser cético em relação ao progresso.” Para trabalhar com seus alunos a exaltação do progresso, típica do final do século 19, e o ceticismo de Machado de Assis em relação a ela, é interessante abordar estas questões pelo viés da interpretação que o autor faz da escravidão e da abolição. Para isto, passe novamente para seus alunos dois trechos indicados do vídeo, ou solicite que leiam sua transcrição abaixo. A seguir, solicite a eles que:
· Procurem em casa ou na biblioteca da escola artigos em jornais e revistas que confirmem ou questionem os dois trechos selecionados do vídeo.
· Escutem alguns dos colegas expondo o conteúdos dos artigos trazidos para a sala.
· Selecionem os melhores artigos expostos pelos colegas.
· Produzam um texto argumentativo subsidiado pelo conteúdo dos artigos selecionados, a favor ou contra o discurso presente nos dois trechos do vídeo, revistos para esta atividade.
Finalize esta atividade realizando uma correção coletiva de um dos textos argumentativos produzidos por seus alunos. Para realizá-la, copie o texto escolhido numa folha de transparência e o projete na parede com a utilização de um retroprojetor. Cabe a você definir se o texto argumentativo escolhido para a correção coletiva deve ser um bom ou ruim e se o aluno que o produziu deve ser identificado.
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Trecho 1
“(...) oito anos antes da abolição, o Machado de Assis teve (...) a inteligência de dizer: - Aqui vai haver a abolição da escravidão, mas a estrutura básica da sociedade não vai mudar, quer dizer, não é verdade que o Brasil esteja progredindo em direção de uma sociedade igualitária”. Roberto Schwartz
Trecho 2
“(...) artisticamente, ele representou muito bem a forma como essa sociedade criava mecanismos para manter ao longo do tempo estratégias de exclusão, de privilégios. Por mais que ela mudasse, ela mudava para permanecer a mesma. Como Machado mesmo disse isso várias vezes: - Você pode trocar de roupa sem mudar de pele.”
Sidney Chalhoub
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6. O ensaísta e crítico literário Roberto Schwartz classifica Machado de Assis como um “mestre na periferia do capitalismo”, produtor de uma “arte peculiar de primeira qualidade”. Em sua obra D. Casmurro, o autor ironiza o autoritarismo das elites brasileiras, que como o protagonista de sua obra, fracassa na realização de seus projetos, mas considera-se autorizado pela propriedade. Para discutir estas questões com seus alunos, solicite a eles que:
· Procurem em outras fontes os significados da expressão “periferia do capitalismo” ou das palavras “periferia” e “capitalismo” e os registrem em seus cadernos.
· Escutem as definições encontradas por alguns de seus colegas e selecionem aquelas que pareçam mais próximas do discurso de Roberto Schwartz.
Finalize esta atividade com uma aula expositiva que explique o significado da expressão “periferia do capitalismo”.
Materiais disponíveis na Videoteca
 " O Mundo de Machado " / programa informativo (2002) 17’ 		Fita 10
Produção do Canal Futura, da Série Sala de Notícias.
 " Machado de Assis : Um Mestre da Periferia" / documentário (2002) 30’ 		Fita 10
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
José de Alencar: O múltiplo(1829-1877)
Gracia Klein
“Os dois homens olharam-se um momento em silêncio; ambos tinham a mesma grandeza de alma e a mesma nobreza de sentimentos; entretanto as circunstâncias da vida haviam criado neles um contraste. Em Álvaro, a honra e um espírito de lealdade cavalheiresca dominavam as suas ações; não havia afeição ou interesse que pudesse quebrar a linha invariável, que ele havia traçado, e era a linha do dever.
Em Peri a dedicação sobrepujava tudo; viver para uma senhora, criar uma espécie de providência humana, era a sua vida; sacrificaria o mundo se preciso fosse, contanto que pudesse como o Noé dos índios, salvar uma palmeira onde abrigar Cecília. Entretanto essas duas naturezas, uma filha da civilização, a outra filha da liberdade selvagem (...)” 									 O Guarani 
José de Alencar					Atividades de Língua Portuguesa
Principais Obras					Atividades Interdisciplinares
Linha doTempo 					Para assistir
Para ouvirPeri , o guarani					
�� HYPERLINK "http://www.mec.gov.br/seed/tvescola/mestres/" \l "video" �Como usar o vídeo�				Para ler
 		 Referência Bibliográfica 
Cantar os Brasis
Em meados do século XIX, as mulheres da burguesia costumavam socializar as obras literárias por meio da leitura coletiva de jornais. Enquanto bordavam, em grandes salões, essas mulheres se emocionavam com o simples e mágico ato de ler em voz alta . 
Por meio dessas leituras, autores românticos penetraram na sociedade através desse público ouvinte para quem, gradativamente, se habituavam a escrever. Esses momentos exalavam prazer, soluços, risos e gozo, sentimentos provocados pelos romances românticos e seus personagens marcantes.
Um dos grandes escritores desses romances “ caseiros e dengosos”, segundo Antônio Cândido, foi José de Alencar. Neles, o escritor desvelou as várias faces de um Brasil recém independente, em busca de suas singularidades para delinear e sedimentar a identidade nacional, escurecida e escondida no peito dos brasileiros. 
Mostrar essas faces era apresentar os índios que aqui nasceram, encararam os colonizadores e misturaram-se a eles em atos de violência e amor. Era fazer brotar os heróis de nossa história, de norte a sul do país. Era adentrar, sem ser convidado, na intimidade burguesa da cidade do Rio de Janeiro . Era iniciar os brasileiros no conhecimento da realidade de seu país.
José de Alencar, contumaz leitor de autores do Romantismo europeu tais como Victor Hugo e Walter Scott, imaginou, nas andanças pelo Brasil, cantar suas belezas, riquezas, gentes, terra, pátria. Cantou-as com todas as melodias. Pintou-as com todas as cores. Escreveu-as com todas as letras. As melodias, as cores e as letras de um Brasil que despontava orgulhoso e independente da metrópole portuguesa.
Romance – narrativa em prosa, geralmente extensa, que conta diversos tipos de histórias. Via de regra, congrega vários personagens que se relacionam em diferentes espaços . Não podemos confundir romance com romântico, pois há romances românticos, realistas, de ficção, de terror etc. 
Victor Hugo (1802 - 1885) – escritor romântico francês, autor, dentre outras obras de O corcunda de Notre Dame e Os Miseráveis, a obra prima da ficção romântica. 
Walter Scott (1771 – 1832) – escritor romântico escocês, autor de Ivanhoé. Marco do romance histórico ocidental, exalta os cavaleiros medievais, o amor cortês, as batalhas sangrentas e aventuras espetaculares.
Romantismo
O Romantismo nomeou o movimento literária e as tendências artístico-culturais que se manifestaram primeiramente na Inglaterra e Alemanha, no final do século XVIII. Contrariamente ao formalismo, racionalidade e universalismo do Classicismo e Neoclassicismo, o movimento romântico privilegiou a imaginação, sonho, idealização, paisagens exóticas, nacionalismo, exaltação da natureza e emotividade . 
Na Europa, os regimes absolutistas dos séculos XVII e XVIII oprimiam a população camponesa e urbana e alargavam o abismo entre os poucos privilegiados da aristocracia e o restante do povo que vivia em condição de injustiça social e miséria. A Revolução Francesa, a Declaração dos Direitos do Homem e o Iluminismo, respostas a essa situação, trouxeram o sonho de uma vida mais digna e a possibilidade da justiça almejada. Portanto, florescia o ideal de liberdade : a liberdade das nações, a liberdade do ser humano, a liberdade de escolha, a liberdade de criação. 
Nesse mesmo século XVIII, na Inglaterra, a Revolução Industrial proporcionou, por meio de adventos científicos, como as máquinas a vapor e novos modelos de produção, um grande desenvolvimento para as nações . Emergiram, com isso, duas novas classes sociais : a burguesia e o proletariado .
Nesse contexto geral, fortemente marcado pela Revolução Industrial e Revolução Francesa que representavam, respectivamente, inovação e liberdade, nasceu o Romantismo. 
O fortalecimento do nacionalismo, também marcante na época, levou os autores da prosa romântica a buscarem em seus países lendas, histórias particulares, sonhos, fantasias e heroísmo. Na Europa, portanto, recuperou-se a cultura medieval, com suas brumas, castelos e cavaleiros . 
E no Brasil ? No Brasil não foi diferente. No século XVIII, a busca por uma identidade brasileira começava a despontar. Intelectuais brasileiros, influenciados pelos ideais europeus de liberdade e por movimentos de Independência em outros países, fizeram eclodir movimentos políticos contra a metrópole, como a Inconfidência Mineira, violentamente reprimidos por Portugal. 
Além disso, recusando-se a aderir ao Bloqueio Continental contra a Inglaterra, Portugal foi invadido por tropas napoleônicas, obrigando a família real portuguesa a vir em 1808 para o Rio de Janeiro. Isso acarretou um desenvolvimento cultural para a população e delineou modestamente um desenvolvimento industrial, visto que o Brasil era um país essencialmente agrário. Novos hábitos “ civilizados e educados ” começaram a fazer parte do cotidiano de uma cidade com a maioria da população escrava. Nesse contexto e com a independência política, em 1822, o Brasil viu surgir as idéias românticas na busca de uma nação independente e diferente de Portugal.
Para tanto, os intelectuais precisaram procurar vestígios de antigas civilizações brasileiras. Afinal, o que nos diferenciava dos portugueses ? Onde estavam nossas lendas ? Quem eram os genuínos heróis de nossa gente ? Os índios. 
População 
“ O Brasil tinha por volta de 1822, cerca de 3 milhões de habitantes. Mais gente do que em Portugal ou nos Estados Unidos, metade dos habitantes da Inglaterra, e um sexto da população da França, a nação mais populosa da Europa. Mas os brasileiros tinham traços peculiares. Um terço deles era constituído de escravos e um quarto, de índios. Do restante, os poucos vistos como cidadãos, a maioria era de mulatos, mamelucos ou cafuzos. Além disso, havia os portugueses cujo destino era incerto, pois podiam optar pela cidadania portuguesa.” 
Jorge CALDEIRA. Viagem pela História do Brasil. p.154 
José Martiniano de Alencar
Apelido : Cazuza
Filiação: José Martiniano de Alencar e Ana Josefina de Alencar
Data de nascimento : 1º/05/1829 – Mecejana – Ceará
Data da morte : 12/12/1877- Rio de Janeiro
José Martiniano de Alencar nasceu no estado do Ceará, na cidade de Mecejana, em 1º de maio de 1829. Em 1840, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde realizou seus estudos elementares. Em 1843, matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, estabelecendo-se nessa cidade até 1850, ano em que se formou advogado. Nesse mesmo ano, retornou ao Rio de Janeiro e iniciou as atividades de jornalista. Em 1854, já assinava uma coluna no jornal Correio Mercantil, denominada Ao correr da pena .
Transferiu-se, tempos depois, para o Diário do Rio de Janeiro e, a fim de aumentar as vendas desse jornal, escrevia folhetins diários. Nesse mesmo jornal, José de Alencar travou algumas polêmicas com o imperador Dom Pedro II, criando uma inimizade entre eles , o que prejudicaria sua futura vida política, iniciada em 1860, ano em que se elegeu deputado.
Sempre se manteve na vida política, porém foi fiel às suas atividades jornalísticas e literárias. Faleceu em dezembro de 1877, aos 48 de idade e nos deixou como legado “ o mapa completo do Brasil , no correr de sua pena” .
Manuel Bandeira, poeta modernista, lembrou :
“ Ainda hoje gosto de Diva
-Nem posso negar
-Peri, tão pouco índio é fato
-Mas tão brasileiro ... Viva
-Viva José de Alencar.
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O folhetim foi criado na França no final do século XVIII e significava um espaço impresso, na parte inferior ou rodapé de uma página do jornal, separada do resto da mesma por um fio horizontal, e era chamado feuilleton ou pequena folha. (...) Passou a divulgar posteriormente romances em prestações diárias ou semanais.
Afrânio COUTINHO e J. Galante SOUSA. Enciclopédia de Literatura Brasileira. Vol.I.
Diva - Romance urbano de José de Alencar, publicadoem 1864 . Retrata a figura da jovem Emília, uma “ diva”, ao despertar para o amor e transpor os obstáculos para concretizá-lo. Tal como Lucíola e Aurélia, Emília é uma das personagens femininas marcantes de Alencar que, mais uma vez, pintou com cores vivas a sociedade da corte do século XIX.
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Principais obras de José de Alencar
Prosa de ficção :
Romances urbanos : Cinco Minutos (1856 ), A viuvinha (1860 ), Lucíola (1862 ), Diva (1864 ), A pata da gazela (1870 ), Sonhos d´ouro (1872 ), Senhora (1875 ), Encarnação 
(1893 ) 
Romances indianistas : O Guarani (1857 ), Iracema (1865 ), Ubirajara (1874)
Romances históricos : As minas de prata (1862 ), Guerra dos mascates (1871 ), Alfarrábios (1873 )
Romances regionalistas : O Gaúcho (1870 ), O tronco do ipê (1871 ), Til (1872), O Sertanejo (1875 ) 
Teatro : Verso e reverso (1857 ), O demônio familiar (1858 ), As asas de um anjo (1860 ), Mãe (1862 ), O jesuíta (1875 ) 
Autobiografia : Como e porque sou romancista (1893 )
Linha do tempo
1774 – Wolfgang Goethe (1778-1842 ), escritor alemão, publica o romance “ Os sofrimentos do jovem Werther ”, o primeiro livro a apresentar um personagem tipicamente romântico
1776 – Independência dos Estados Unidos da América
1789 – Revolução Francesa e Declaração dos “ Direitos do Homem e do Cidadão”
1789 – Inconfidência Mineira 
1799- Ascensão de Napoleão Bonaparte ao trono da França
1808 – Transferência da família real para o Brasil
1808 – Publicação do primeiro jornal impresso do Brasil : A Gazeta do Rio de Janeiro
1811 a 1828 – Vários países da América Latina declaram independência
1822 – Independência do Brasil
1824 – Outorgada a primeira Constituição brasileira
1825- Início do Romantismo em Portugal com a publicação do poema Camões de Almeida Garret 
1827 – Fundação da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco
1829 – Nasce José de Alencar
1831 – Dom Pedro I abdica do trono do Brasil a favor de seu filho, Dom Pedro II - Início do período regencial
1835 a 1845 - Várias revoltas e rebeliões tomam conta das províncias do Brasil, dentre elas: Sabinada (Bahia ), Balaiada (Maranhão ), Cabanagem (Pará ) e Guerra dos Farrapos (Rio Grande do Sul )
1836 – Publicação do livro Suspiros Poéticos e Saudades de Gonçalves de Magalhães - Marco do Romantismo Brasileiro
1848- Marx e Engels escrevem o Manifesto Comunista
1850 – Promulgação da lei Eusébio de Queirós, proibindo o tráfico de escravos
1857 – Publicação de O Guarani, escrito em folhetins de janeiro a abril 
1859- Charles Darwin publica A origem das espécies
1865 – Guerra do Paraguai
1870 – Apresentação da ópera O Guarani de Carlos Gomes, em Milão, Itália
1871 – Lei do Ventre Livre
1877 – Morre José de Alencar
1881 – Início do Realismo no Brasil com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis
“ Um índio descerá de uma estrela			“ Meu canto de morte, 
Colorida , brilhante (...)				Guerreiros, ouvi:
Virá (...) apaixonadamente como Peri” 		Sou filho das selvas,
Um Índio - Caetano Veloso			Nas selvas cresci;
						Guerreiros descendo
 Da tribo tupi.” 
 I-Juca Pirama – Gonçalves Dias
Peri, protagonista de O Guarani, desceu de uma estrela . Surgiu valoroso e nobre como símbolo do nacionalismo romântico de um novo Brasil que surgia . 
Para além de um maniqueísmo ingênuo, Peri representava um herói catalisador da identidade almejada pelo recém-independente país. Embora idealizado e europeizado em intenções, gestos e ações, ainda assim manteve em si as lendas e tradições dos povos indígenas. Como diz Antônio Cândido, “Alencar foi o único escritor brasileiro de nossa literatura a criar um mito heróico, o de Peri (...) Assim como Walter Scott fascinou a imaginação da Europa com os seus castelos e cavaleiros, Alencar fixou um dos mais caros modelos da sensibilidade brasileira : O do índio ideal, elaborado por Gonçalves Dias, mas lançado por ele na própria vida quotidiana.” 
Além do protagonista, José de Alencar buscava um tema para seu romance; ou pelo menos, “uma cena e uma época.” Encontrou . A época : 1604. A cena : um paraíso natural : Serra dos Órgãos- Sertão do Estado do Rio de Janeiro, às margens do rio Paquequer, afluente do Paraíba.
A história de “ O Guarani” retrata o período da colonização do Brasil e as peripécias dos desbravadores para povoar o interior. Dom Antônio de Mariz, fidalgo português, construiu, nesse paraíso natural, uma casa luxuosa, ao estilo dos nobres portugueses, às margens do Paquequer. Morava com sua esposa, Lauriana; filha, Cecília; filho, Diogo e sua sobrinha, Isabel. Ao núcleo familiar, juntavam-se aventureiros, escudeiros e fidalgos. 
Álvaro, fidalgo e honrado jovem , cortejava Cecília. Loredano, um frade disfarçado de aventureiro , traiçoeiro, buscava um tesouro que não lhe pertencia. E Peri ... Peri, da tribo dos goitacás, deixara para trás sua gente para viver com a família dos Mariz, depois de ter salvo sua Ceci. 
Em meio a traições, (Loredano traiu D. Antônio), amores não correspondidos (Isabel amava Álvaro que amava Cecília), grandes lutas (batalha contra os Aimorés), feitos heróicos (Peri dispôs de sua vida várias vezes para salvar Cecília) e todos os ingredientes para um grande romance romântico, a obra de José de Alencar está aí. Para ser lida, contada e recontada. Professor (a), não deixe de lê-la na íntegra. Encontre o prazer nessa leitura e incentive os alunos a fazerem o mesmo. O vídeo complementa essa leitura.
Como usar o vídeo ? 
Indicaremos algumas sugestões de trabalho, dentre inúmeras possíveis, a partir do vídeo e da leitura da obra. Temos certeza de que, a partir delas, outras surgirão de você. O conhecimento é uma teia de hipertextos entrelaçados. Lembre-se disso. Para cada palavra, afirmação, imagem, texto há uma infinidade de possibilidades de trabalho. Portanto, faça suas opções.
Atividades de Língua Portuguesa
1. Toque para os alunos a música de Caetano Veloso: Um Índio . Transcreva na lousa o trecho que faz alusão a Peri e pergunte aos alunos se eles o conhecem. Continue levantando algumas questões, tais como: O que sabem desse personagem ? O que sabem sobre os índios no Brasil, já que o título da música é Um Índio? 
A partir das considerações levantadas pelos alunos, podemos chegar à seguinte afirmação: Houve uma época na História do Brasil e na História da Literatura em que o índio foi considerado herói. Esse é só um exemplo de como podemos começar. O importante é ressaltar que o trabalho de levantamento prévio de conhecimentos é um elemento facilitador da aprendizagem. A partir dessas discussões, passe o vídeo e comece a trabalhá-lo do ponto que achar mais conveniente para sua classe. 
2. Poderá ser interessante e proveitoso trabalhar os folhetins com os alunos. Há vários caminhos para isso, dentre eles: 
Peça aos alunos que, em grupo, elaborem uma narrativa romântica que seja divulgada em folhetins no mural da escola. Partindo do estudo do romance romântico O Guarani, ressalte os personagens, o tempo, os conflitos, o espaço ou espaços, o enredo. Trabalhe o romance e o Romantismo, mostrando algumas de suas características marcantes. Isso pode levar até um semestre, pois o objetivo maior é desenvolver as habilidades de escrita nos alunos, sua criatividade e o gosto pela leitura e escrita. Você poderá implantar uma aula por semana em que o grupo , além de colar no mural parte da história, lerá o folhetim para a classe. 
Outra maneira é escolher uma outra obra do Romantismo brasileiro e ler trechos para os alunos, no início de cada aula. Levante uma reflexão sobre as novelas da televisão brasileira e sobre o fato de terem adentrado, tal como os autores românticos, a privacidade das famílias brasileiras sem pedir licença. 
3. O ato de ler em voz alta para crianças e jovens é fundamental para a formação de leitores. Sem sombra de dúvida,é uma das ações responsáveis pelo incentivo à leitura. Constatamos que, infelizmente, no Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série e Ensino Médio, isso não faz mais parte das aulas em geral e nem mesmo das aulas de Língua Portuguesa. Podemos implantar novamente esse hábito, não só lendo capítulos para os alunos como sugerido no item 2, mas trabalhando trechos da obra O Guarani de maneira mais profunda. Não há dúvida de que saber a história da Literatura brasileira e seus autores e obras é fundamental, porém tão ou mais importante é o aluno tornar-se um leitor competente para entender o que lê. Isso só acontece com um trabalho intencional de nossa parte. 
Leia, portanto, com bastante atenção, alguns trechos do livro e interprete-os com os alunos. Você pode transcrevê-los em uma transparência e projetar para a classe. Por exemplo, trabalhar o amor romântico , a partir do trecho:
“ Assim o amor se transformava tão completamente nessas organizações, que apresentava três sentimentos bem distintos: um era uma loucura, o outro uma paixão, o último uma religião. Loredano desejava; Álvaro amava; Peri adorava. O aventureiro daria a vida para gozar; o cavalheiro arrostaria a morte para merecer um olhar; o selvagem se mataria, se preciso fosse, só para fazer Cecília sorrir.” O Guarani. p.52
4.Os trechos a seguir foram transcritos do livro de Michel Pastoreau: No tempo dos cavaleiros da Távola Redonda. Transcreva os trechos e discuta com os alunos algumas questões que os levarão a desenvolver as habilidades de relacionar e comparar : 
Peri pode ser comparado aos heróis medievais, tão ressaltados na literatura romântica européia ? Ele possui algumas características dos cavaleiros europeus ? 
O trecho 1 pode ser relacionado a Peri ?
Pesquise na obra O Guarani ou relembre algumas cenas da reconstituição da história de Peri, feitas no vídeo que podem sustentar sua semelhança aos cavaleiros medievais.
· A idealização da figura de Cecília (loira, angelical, à semelhanças das virgens de Murilo, comparada até a Nossa Senhora) configura-se tipicamente romântica e vem da idealização feminina da Idade Média, conforme o trecho 2 ?
Encontre na obra O Guarani a descrição de Cecília. 
Trecho 1 “ O amante, totalmente submisso à sua dama, deve-lhe um longo e total serviço amoroso sem esperar recompensa. Deve consagrar suas forças a viver dessa incerteza, progredindo moralmente em função da temperança que se impõe e dos obstáculos que enfrenta. Inversamente, essa ética só se justifica e se fundamenta pelos méritos da dama, sempre celebrada como a mais bela e a mais nobre.”
Trecho 2 “As heroínas dos romances têm sempre pele clara, o rosto alongado, os cabelos louros, a boca pequena, os olhos azuis e as sobrancelhas bem desenhadas.”
No tempo dos cavaleiros da Távola Redonda. pp.145 e 147
5. “Peri domina a natureza. Ele tem o outro saber.” Diz o vídeo. Traga aos alunos algumas narrativas indígenas que demonstram uma nova forma de interpretar e conceber o mundo. Por exemplo, a lenda do Tamandaré, o Noé indígena que é ressaltada na obra. Encontra-se aí uma boa oportunidade para trabalhar as lendas indígenas e mostrar aos alunos que existem várias lendas, porque não existe o índio, mas vários índios de diferentes etnias. Pode-se discutir dessa forma, a diversidade e respeito às crenças do outro. Trabalhe, também, a narrativa bíblica sobre o dilúvio.
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Tamandaré - Noé indígena que foi lembrado por Peri quando sua vida e a de Cecília estavam em perigo. Conta a lenda que o herói mítico, Tamandaré, quando um dilúvio cobriria toda a terra e mataria todos os homens, foi alertado por Tupã, o grande deus do trovão. O deus escolheu Tamandaré para sobreviver e perpetuar a espécie . Aconselhou-o a subir em uma palmeira com sua mulher. A palmeira, embora tenha sido arrancada com violência da terra, boiou e os dois se salvaram, tal como Peri e Ceci, que podem representar para Alencar o casal mítico que povoaria o Brasil. 
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6. Comente os outros livros indianistas de José de Alencar: Ubirajara e Iracema. Como bem é colocado no vídeo, representam os três estágios da relação da colonização : o não contato com o branco em Ubirajara, o contato casual em Iracema e o contato intencional, civilizatório em O Guarani. 
7. O excesso descritivo na obra de José de Alencar é lugar comum em críticas feitas a sua obra e que, muitas vezes, a reduzem a histórias enfadonhas. Podemos trabalhar o movimento da descrição , a partir de alguns trechos. Enfatize com os alunos a escolha lexical, a quantidade de metáforas, os adjetivos e seu significado para a idealização da paisagem, a plasticidade da imagem etc. Esse trabalho os ajudará a aprimorar os próprios textos.
Reproduzimos o início da obra. Transcreva para os alunos e aproveite também para compará-la com o início da obra Ivanhoé de Walter Scott. Ambas iniciam com o local do sonho, idealizado para a narrativa romântica . 
“ De um dos cabeços da Serra dos Órgãos desliza um fio de água que se dirige para o norte, e engrossado com os mananciais que recebe no seu curso de dez léguas, torna-se o rio caudal. 
É o Paquequer, saltando de cascata em cascata, enroscando-se como uma serpente, vai depois se espreguiçar na várzea e embeber no Paraíba, que rola majestosamente em seu vasto leito. Dir-se-ia que, vassalo e tributário desse rei das águas, o pequeno rio, altivo e sobranceiro contra os rochedos, curva-se humildemente aos pés do suserano.” O Guarani p.15
“ Naquela região agradável da alegre Inglaterra que é banhada pelo rio Don, estendia-se em época remota, uma grande floresta, cobrindo a maior parte das belas colinas e vales que jazem entre Sheffield e a prazível localidade de Doncaster. Os restos dessa extensa floresta podem ainda ser vistos nas nobres paragens de Wentworth, em Warncliffe Park e ao derredor de Rotherdam. Lá aparecia antigamente o fabuloso dragão de Wanthley, lá se travavam muitas das mais desesperadas batalhas, durante as Guerras Civis de Rosas! E lá também floresceram, em tempos distantes, aqueles bandos de proscritos galantes, cujas façanhas se tornaram tão populares nas canções inglesas.” Ivanhoé p. 23
Atividades interdisciplinares
1. “Filha de duas raças inimigas devia amar a ambas; entretanto minha mãe desgraçada fez-me odiar a uma, o desdém com que me tratam fez-me desprezar a outra.” O Guarani p.146
“ Tua mãe não diz que um índio é um animal como um cavalo ou um cão?” Idem p.35
Os dois trechos acima mostram como os colonizadores enxergavam os índios. O primeiro refere-se a Isabel: mestiça de branco e indígena. Foi desprezada por essa ascendência. Nas aulas de História e Geografia, discuta com os alunos essa discriminação, trazendo à tona o lugar do índio na sociedade dos séculos XX e XXI. Relembre alguns fatos: o número de indígenas no Brasil hoje, a pauperização que vêm sofrendo, a morte do índio pataxó, Galdino Jesus dos Santos e o recém julgamento dos jovens que o mataram em Brasília .
2. Em História e Geografia, pode-se trabalhar com os dados populacionais de 1822 e fazer um estudo da população do Brasil de hoje, levando-se em conta o processo de colonização, imigratório, formação do povo. Faça uma comparação com os números populacionais dos outros países citados. 
3. Muito pouco é estudado de História da Ciência no mundo e no Brasil. Proponha aos alunos uma pesquisa da produção científica no mundo e no Brasil do século XIX. 
4. A linha do tempo deste caderno pode e deve ser trabalhada com mais profundidade em outras disciplinas. Aproveite e desenvolva alguns temas estruturantes para estudar José de Alencar, o Romantismo e a época que abrange a linha do tempo. Desenvolva, também, os conceitos de Absolutismo e Aristocracia, na aula de História. 
5. Explore algumas telas românticas e inicie as aulas com a leitura dessas telas. Reproduza-as em transparências. O uso de imagens é um recurso didático valioso. 
6. Trabalhe, em Matemática, um trecho, escrito pelo próprio Alencar, quando fala da venda de O Guarani . Otexto é muito curioso e interessante, além de possibilitar um trabalho de pesquisa com as diferentes moedas do Brasil. 
“ Era essa edição de mil exemplares, porém, trezentos estavam truncados, com a venda de volumes que se faziam a formiga na tipografia. Restavam pois, setecentos, saindo o exemplar a 2$000.Foi isso em 1857. Dois anos depois comprava-se o exemplar a 5$000, nos belchiores que o tinham a cavalo do cordel, embaixo dos arcos do Paço, donde os tirou o Xavier Pinto para a sua livraria da Rua dos ciganos.” 
José de ALENCAR em Como e por que sou romancista citado por Ivo BARBIERI e outros em Brasiliana . Da Biblioteca Nacional. Guia das Fontes sobre o Brasil. p.460
7. Proponha um debate na aula de História, Geografia, Ciências ou Biologia, a partir do tema polêmico da apropriação de recursos e saberes tradicionais de populações indígenas por multinacionais, por exemplo. Para embasar a discussão, leia ou reproduza para os alunos o artigo abaixo de Manuela Carneiro da Cunha.: Saber tradicional.
Saber tradicional – Folha de São Paulo
19/12/2001
Autor: MANUELA CARNEIRO DA CUNHA
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Saber tradicional 
MANUELA CARNEIRO DA CUNHA
O BRASIL vai entregar à Organização Mundial de Propriedade Intelectual (Ompi) um documento assinado há pouco em São Luís (MA) por representantes e pajés indígenas e que trata da proteção dos direitos intelectuais das populações tradicionais: a Carta de São Luís, que resultou de uma reunião convocada pelo Inpi e pela Funai.
Como deve ser estimulado e protegido o conhecimento tradicional? Como garantir equidade e assegurar a continuidade do saber tradicional? Não há respostas simples. Quanto à equidade, é injusto o sistema atual: empresas sobretudo, mas não exclusivamente estrangeiras apropriam-se de conhecimentos tradicionais sem que os grupos que os produziram participem adequadamente dos eventuais benefícios. Engana-se quem acha que basta reconhecer propriedade intelectual coletiva de grupos tradicionais sobre seus saberes.
O saber tradicional, descrito na Convenção da Diversidade Biológica (CDB) como incluindo conhecimentos, práticas e inovações, não é um simples repositório de conhecimentos do passado. É um modo de produzir inovações e transmitir conhecimentos por meio de práticas específicas. "O que é tradicional no saber tradicional não é sua antigüidade, mas a maneira como ele é adquirido e usado", diz a CDB.
Mesmo para quem não queira admitir que o saber tradicional seja um valor em si, resta a escolha: recolher em uma safra única (supondo que a coisa seja possível) os conhecimentos acumulados até agora ou pensar também no que se pode produzir e inovar daqui para a frente. Um problema é, portanto, o da equidade. Como garantir que populações tradicionais participem dos benefícios eventuais que podem resultar dos seus conhecimentos?
Há uma disparidade flagrante entre o respeito internacional à propriedade intelectual que a OMC impõe a todos os seus membros e a ausência de respeito pelo domínio público alheio. Vigoram dois pesos e duas medidas nos EUA a respeito do que deve ser considerado conhecimento de domínio público. Se interno aos EUA, basta testemunho oral. Mas, se externo, é necessário o registro escrito. Embora as razões apresentadas pelo Serviço de Patenteamento dos EUA sejam simplesmente de ordem prática, de fato, coloca-se o ônus da prova na vítima da espoliação, quem menos tem condições de satisfazê-la.
Ora, os EUA, que souberam impor a internacionalização do seu sistema de propriedade intelectual (aqui vale lembrar que, até 1891, os EUA pirateavam direitos autorais ingleses), recusam-se a internacionalizar o domínio público. Os registros de conhecimentos que estão sendo feitos em alguns países, como no Peru e na Índia, e que têm suas virtudes, atendem a essa exigência esdrúxula. Mas há outras maneiras de a combater.
Para reverter o ônus da prova, uma exigência importante é que cada invenção ou produto para os quais se solicitem direitos intelectuais em qualquer parte do mundo exiba a sua história. Caso tenha utilizado conhecimento tradicional, deverá mostrar como o adquiriu e exibir a prova do consentimento informado da 
população que o cedeu.
Muitas indústrias não vão diretamente às populações, e sim aos bancos de dados que já existem ou à literatura científica; outras recolhem plantas medicinais nos mercados das cidades da região e, assim, dissociam os conhecimentos de sua origem.
Os registros em si, que são instrumentos importantes, devem ser manejados com cuidado. Certamente não podem ser a única prova. Ninguém _nem nenhum grupo_ deve ser obrigado a registrar conhecimentos para ter seus direitos intelectuais reconhecidos. Tão ou mais efetiva do que qualquer outra medida é a de pôr à disposição das populações tradicionais contratos-padrão e um grupo de advogados que as ajudem a negociar contratos. No Peru, o sucesso dos aguaruna em sua negociação com a Monsanto-Searle se deveu a isso. Na Carta de São Luís, reivindica-se o treinamento de advogados indígenas.
Outro dado importante para uma negociação eqüitativa é conhecer a participação real do saber tradicional na indústria farmacêutica, de cosméticos, de defensivos agrícolas e de sementes, ou seja, saber quanto essas indústrias economizam usando pistas fornecidas por conhecimentos tradicionais. Esse é um segredo bem guardado, mas que países como o nosso deveriam se empenhar em investigar, pois a indústria farmacêutica movimenta, com produtos derivados de recursos genéticos, pelo menos US$ 75 bilhões anuais; a indústria de sementes, uns US$ 30 bilhões; e uns US$ 60 bilhões anuais são movimentados por produtos derivados de recursos genéticos em outros campos. Essas estimativas provêm de pesquisadores de um dos maiores bancos genéticos do mundo, o Jardim Botânico de Londres.
Por outro lado, a continuidade da produção do saber é uma questão ainda mais vasta. Tem razão a Carta de São Luís ao declarar: "Nossos conhecimentos da biodiversidade não se separam de nossas identidades, leis, instituições, sistemas de valores e da nossa visão cosmológica como povos indígenas".
O saber tradicional se exerce e enriquece a partir de um habitat. Direitos sobre a terra são, portanto, condição "sine qua non" de sua continuidade. Eles são exercidos por meio de instituições próprias a cada grupo, fundamentalmente diferentes daquelas do mundo industrial contemporâneo. Não é forçoso nem conveniente que se adaptem ao regime de direitos intelectuais de hoje.
A figura da propriedade intelectual se firmou no século 18 e é também específica de uma organização social e de uma época. É "sui generis". O problema é como articular com ela (sem que tenham de se fundir nela) todas essas outras formas igualmente "sui generis".
A Carta de São Luís defende as idéias da livre circulação de conhecimentos e de uma política de ciência tradicional com estímulo à pesquisa indígena, a programas de preservação de diversidade genética "in situ" e com outras sugestões inovadoras. O Brasil toma iniciativas importantes na esfera internacional, mas deixa no limbo as leis domésticas, como a do acesso a recursos genéticos e conhecimentos tradicionais e o novo estatuto das sociedades indígenas. O Brasil saiu atrasado nesse assunto, mas dá mostras de querer se recuperar.
Manuela Carneiro da Cunha, antropóloga, doutora pela Unicamp, é professora da Universidade de Chicago (EUA).
8. Sugestão de alguns temas para projetos interdisciplinares. 
· Brasil e brasileiros: afinal quem somos ? 
· Imagens do Brasil no exterior.
· Mapear o Brasil: regiões, costumes, geografia, clima, alimentação, população, IDH, analfabetismo , lendas. 
· Censo 2000. Como estamos ?
Pesquisa. Atenção para essa proposta.
O papel do professor como orientador das pesquisas e projetos dos alunos é uma das chaves para o sucesso dos trabalhos. Há alguns passos básicos a seguir: 
· Escolher um tema significativo. 
· Definir o cronograma, etapas do trabalho e acompanhá-las.
· Delimitar os objetivos e explicitar sua finalidade.· Definir junto aos alunos a metodologia, ou seja, os melhores métodos de obtenção dos dados. (entrevista, fichamento, visitas a museus, pesquisa bibliográfica etc) 
· Definir o produto final, a veiculação da pesquisa e seu público alvo. (texto, apresentação oral, cartazes, feiras etc) 
· Indicar aos alunos algumas fontes de pesquisa .(livros, museus, sites, artigos de opinião etc ) 
· Lembrar os alunos para indicarem, com precisão, as fontes consultadas.
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Para assistir 
· Carlota Joaquina. Princesa do Brasil – Carla Camurati, 1994. 
· Guerra do Brasil – Sylvio Back – Documentário sobre a Guerra do Paraguai , 1987.
· Ivanhoé - Richard Thorpe ,1952.
· Guarani –Norma Bengel , 1996.
· Os Miseráveis –Bille August, 1998.
· Yndio – Sylvio Back- Sobreposição de dezenas de filmes nacionais e estrangeiros, revela como o cinema vê o índio brasileiro desde 1912. 1995.
Para ouvir
· CDs produzidos pelo Núcleo de Cultura Indígena
· Um Índio – Música de Caetano Veloso
· O Guarani – Ópera de Carlos Gomes 
· Ludwig Van Bethoven, Franz Shubert, Frédéric Chopin
O site de www.artemusical.com/martinsferreira traz informações preciosas sobre o uso da música como instrumento didático.
Para consultar, ler , apreciar e pesquisar
· Cadernos da TV Escola: Índios no Brasil. Volumes 1, 2 e 3 .Ministério da Educação. Secretaria de Educação a Distância, 1999.
· Como usar a música em sala de aula. Martins Ferreira. Editora Contexto, 2001.
· História da Literatura Brasileira. Romantismo. Massaud Moisés. Editora Cultix, 1985.
· História dos índios no Brasil. Organização de Manuela Carneiro da Cunha. Editora Companhia das Letras, 1998.
· Identidade Nacional em Debate. Organização de Marcia Kupstas. Editora Moderna, 1997.
· José de Alencar. O Poeta Armado do século XIX. Coleção: Os que fazem a História. Antonio Rodrigues. Editora FGV, 2001.
· Livro da Arte. Editora Martins Fontes, 1999.
· Parâmetros Curriculares Nacionais . Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental. MEC
· Telas de Cândido Portinari sobre o Império. 
· Telas de Pedro Américo, pintor romântico brasileiro.
Referências Bibliográficas
ALENCAR, José de. O Guarani. São Paulo: Ática, 1997.
CALDEIRA, Jorge e outros. Viagem pela História do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
CÂNDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. 2º volume(1836-1880).Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1993.
COUTINHO, Afrânio; SOUSA, J. Galante. Enciclopédia de Literatura Brasileira. Volumes I e II. São Paulo: Global Editora, 2001.
PASTOREAU, Michel. A vida cotidiana. No tempo dos cavaleiros da Távola Redonda. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
PEREIRA, Paulo Roberto. (org) Brasiliana . Da Biblioteca Nacional. Guia das Fontes sobre o Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
SCOTT, Walter. Ivanhoé. Tradução de Brenno Silveira. Rio de Janeiro: Ediouro. s/data.
Materiais disponíveis na Videoteca
 " José de Alencar : O Múltiplo " / documentário (2002) 30’ 			Fita 83
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
 " O Guarani " / filme (1997) 				91’ 		Fita 83
Da obra homônima, dirigido por Norma Benguel.
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Graciliano Ramos: Literatura sem bijuterias(1892-1953)
 Ângela Carvalho e Jorge Ribeiro
Tinha culpa de ser bruto? Quem tinha culpa?
Se não fosse aquilo...Nem sabia. 
O fio da idéia cresceu, engrossou - e partiu-se. Difícil pensar. 
Vivia tão agarrado aos bichos...Nunca vira uma escola." 					Vidas Secas 
Apresentação do autor					Atividades de Língua e Literatura		
Vidas Secas						Atividade de expressão escrita
Algumas características					Atividades de análise e reflexão textual
Os personagens						Interdisciplinaridade
Graciliano Ramos e o Modernismo				Referências bibliográficas
 
 
 Apresentação do autor
Alagoano da pequena localidade de Quebrangulo, Graciliano Ramos nasceu no dia 27 de outubro de 1892, foi o primeiro dos dezesseis filhos de sua família. Fez estudos secundários em Maceió. Transferiu-se em 1910 para Palmeira dos Índios, também em Alagoas, onde seu pai era comerciante. O depoimento de Dom Fernando Lório, Bispo de Palmeira dos Índios, inforque que o escritor não chegou a concluir o Ensino Médio. Essa paisagem da infância, segundo o escritor Milton Hatoum, "é crucial para o escritor, o que ele vivenciou naqueles momentos de formação, quando ele também conhece o mundo, ele se conhece..."
Em 1914, viajou para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como revisor nos jornais Correio da Manhã e A Tarde. O depoimento da sobrinha Elba Ramos da Costa nos diz que Graciliano Ramos se casa com Maria Augusta em 1915, com quem tem quatro filhos - " ela morreu cedo, de parto, quando nasceu a filha Maria Augusta...Viúvo continua trabalhando na loja de tecidos e dando aulas para crianças." No vídeo, outro depoimento de Leonardo Pinto, aluno do escritor, nessa época: " - Eu agradeço o que sei hoje, assinar meu nome, a ele..." De volta a Palmeira dos Índios, foi jornalista e político, elegendo-se prefeito da cidade em 1928, já casado com Heloísa, sua segunda esposa. Dois anos depois, renunciou ao cargo e instalou-se em Maceió. Iniciado em literatura, datam desse período seus contatos mais intensos com os escritores José Lins do Rego, Rachel de Queiroz e Jorge Amado, ao lado dos quais daria um novo rumo ao romance modernista brasileiro. Em 1932, publicaria seu primeiro livro, o romance São Bernardo, escrito em Palmeira dos Índios.
Graciliano Ramos fazia parte de um grupo de artistas e escritores que criticavam o sistema capitalista e apoiavam as lutas pelo socialismo. Em 1935, o Partido Comunista tentou chegar ao poder por meio de uma revolta armada. A tentativa fracassou e o governo de Getúlio Vargas reprimiu duramente todos aqueles que tinham idéias socialistas. Acusado de subversivo, Graciliano Ramos foi preso em 1936. Mesmo não havendo provas contra ele, passou por diversos presídios, até ser solto em janeiro do ano seguinte. Essa experiência é relatada no romance Memórias do cárcere, que depois foi transformado em filme.
Após a prisão, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde continuou suas atividades literárias. Em 1945, já consagrado como um de nossos maiores romancistas, ingressou no Partido Comunista Brasileiro. Faleceu em 20 de março de 1953, aos 61 anos de idade. Além de São Bernardo, seus livros mais importantes são Vidas Secas (romance), Angústia (romance), Insônia (contos), Alexandre e outros heróis (contos) e o já citado Memórias do cárcere (livro de memórias).
Manassés Ramos, seu sobrinho, afirma, no vídeo: " De uma família burguesa... comportamento de esquerda... de socialista a comunista... conseguiu todos os espaços dele por conta própria... falava vários idiomas... aprendeu sozinho... inteligência, perseverança e dignidade fizeram dele o grande escritor que era".
O romance Vidas Secas
Algumas características do romance Vidas Secas
A paráfrase do romance em questão é a trajetória de uma família de retirantes nordestinos, as hipóteses interpretativas da obra ultrapassam essa temática no conteúdo e na forma. A narração é feita em terceira pessoa. O narrador onisciente é um excelente exemplo de discurso indireto livre, ele coloca a máscara da personagem e fala como ela. Até mesmo a cadela, Baleia, fala através do discurso do narrador. Ao referir - se ao papel do narrador, neste romance, o referido escritor afirma: " Há também em Vidas Secas essa mudança de narrador de primeira para terceira pessoa - discurso indireto livre - há monólogo interior - até a cachorra Baleia pensa e delira ... sonha com preás ... um paraíso ... gordos ... beleza e tristeza ... ela se humaniza ali, enquanto os seres humanos se animalizam...". O discurso direto é cheio de interjeições guturais. Afirma no vídeo, o bispo Dom Fernando: "Em Vidas Secas, nós encontramos o ser humano que é reduzido ao ser humano baixo, a um bicho, chega até a grunhir, vezes muitas SinhaVitória está grunhindo e justamente Fabiano da mesma maneira e, finalmente, eles se coisificam... nem falam mais...". Adiante, o depoimento do Professor Carlos: "Ele fala até em termos de interjeição gutural que, mais uma vez, rebaixa esses personagens a um nível animalesco, não num sentido pejorativo, num sentido de ridicularizá-los, mas talvez para mostrar quanto eles estão submetidos a uma situação bastante limitadora das suas potencialidades humanas". Diz o escritor Miltom Hatoum: "Os personagens dele vão atrás da linguagem, atrás da palavra certa para dizer e não acham, aqueles meninos não conseguem falar o que eles querem dizer..." A presença de poucos diálogos pode causar estranheza ao leitor; sobre isso afirma, no vídeo o professor Carlos Minchillo: " Há pouquíssimos diálogos no livro e, quando existem, são bastante curtos como que indicando que entre esses personagens existe pouca interação do ponto de vista de língua". A linguagem proporciona uma leitura em que se vislumbram as mínimas condições de vida expressas na construção, no estilo; a linguagem é concisa, seca, há ausência de diálogos, que são as mais das vezes guturais. Desta forma o autor animaliza a família e humaniza a cadela, Baleia. 
E para emoldurar esse universo de poucos palavras o livro apresenta uma narrativa cuja estrutura é completamente fragmentada, composta de quadros que podem ser lidos separadamente. Sobre o estilo de Vidas Secas, afirma, no vídeo, o escritor Milton Hatoum: " Foi quase um ponto de inflexão da Literatura Brasileira, falar de um drama humano de uma forma tão concisa", reafirmando mais adiante: "... maravilhoso como ele fala da seca... a fome... drama social... se reflete, interage muito bem com a linguagem que é desprovida de qualquer excesso". 
Ainda sobre o processo de criação de Graciliano, diz, no vídeo, a pesquisadora Eliane Jacqueline Mattalia: " ... reescrevendo e condensando, a sua escrita é condensada, carregada de sentido, leva sete anos para escrever um livro... é muito bonito estudar os manuscritos porque a gente vai vendo as metáforas sendo formadas..."
O romance tem estilo cíclico. Há treze capítulos na obra: o primeiro Mudança e o último Fuga formam um ciclo de que a família não consegue escapar:
SECA-CHUVA-SECA = FUGA-FUGA
Se olharmos para o valor semântico dos termos Mudança e Fuga, podemos dizer que Graciliano termina a obra com mais pessimismo com relação 'a problemática da seca, migrações e miséria. O professor Carlos Minchillo afirma sobre a estrutura de Vidas Secas:
"... por trás disso, no entanto, na versão final da obra, o Graciliano escolheu como primeiro e último capítulo justamente os capítulos que mostram a fuga e, depois, a mesma situação se repete... parece que está instituída uma estrutura circular na obra... de um ciclo que se repete interminavelmente". 
Já no final da análise de Vidas Secas, apresentada no vídeo, afirma o escritor Milton Hatoum: " ...é um romance que pode ser estudado sob vários ângulos: pelo lado do conhecimentoda região, do drama social de um jovem brasileiro que percebe que ali há um drama que perdura ... o Brasil ainda é um Brasil de muitos Fabianos ... e pelo lado da linguagem, ali há um vocabulário que um jovem desconhece, acostumado só à imagem visual, ele desconhece aquele vocabulário... isso enriquece muito, ele está dando uma enorme contribuição para a língua brasileira, para a língua portuguesa que tem a ver com a construção também do próprio Graciliano".
A visão de mundo expressa pelo autor reune poesia bela, patética e triste. Nada apresenta solução, tudo parece perdido em um mundo de caminhos secos. Mal começa a narrativa e o papagaio já foi devorado pela família de retirantes, a cadela tem de ser morta pelo vaqueiro que tanto observa as estrelas do céu como olha o chão à cata de rastros, vasculhando o espaço em busca daquilo que ele nem tem certeza do que possa ser. Os urubus e as aves de arribação compõem com precisão esse cenário de morte do qual os personagens não conseguem se libertar. O menino mais novo sonha ser como o pai: "Ia crescer, espichar-se numa cama de varas, fumar cigarros de palha, calçar sapatos de couro cru" (p. 52) O menino mais velho, ironicamente, deseja saber o que é inferno, apanha da mãe ao buscar a resposta e depois pensa: "-Inferno, inferno/Não acreditava que um nome tão bonito sevisse para designar coisa ruim". (p60) E mais adiante: "Entristeceu. Talvez sinha Vitória dissesse a verdade. O inferno devia estar cheio de jararacas e suçuaranas, e as pessoas que moravam lá recebiam cocorotes, puxões de orelhas e pancadas com bainha de faca"> (p.61).
Não há esperanças, na visão do autor, tudo continuará como está, vai seguir perenemente a marcha triste, como um enterro, dos retirantes fugindo da fome. 
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O que aquela família faz na sua vida cotidiana? Não há cadeiras, sofás e nenhum eletrodoméstico. Eles não recebem informações, não sabem o que está acontecendo, não participam dos acontecimentos atuais, não tem assunto para conversarem. Fica difícil fazer a análise psicológica das personagens, mesmo porque elas não falam.
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As personagens
Fabiano, o vaqueiro retirante, tem barba e cabelo ruivo, olhos azuis, ele filho e neto de vaqueiro era acostumado a percorrer veredas, afastando o mato com as mãos, "gesto hereditário"(p.17) que os seus filhos já começavam a reproduzir. O narrador onisciente, com estilo enxuto, em poucas linhas mostra muito do drama humano que está sendo narrado quando afirma: "Esses movimentos eram inúteis, mas o vaqueiro, o pai do vaqueiro, o avô e outros antepassados mais antigos haviam-se acostumado a percorrer veredas, afastando o mato com as mãos. E os filhos já começavam a reproduzir o gesto hereditário". (p. 17)
Sinha Vitória, mulher de Fabiano, traz consigo a marca do romance cíclico: começa a narrativa magra, "com a cara murcha, as nádegas bambas" (p. 16 ), no último capítulo está com as "nádegas volumosas e os peitos cheio. Dentro em pouco estaria magra com os seios bambos. Mas recuperaria as carnes. " (P.121)
O sonho dessa personagem é ter uma cama, queria "ser gente" e ter uma cama igual a do seu Tomás da bolandeira. Um fato que chama atenção quanto a linguagem é que não há acento no nome desta personagem, a norma culta nos diz que todos os monossílabos tônicos terminados em "a, "e" e "o" são acentuados; esse evento pode ser interpretado como um sutil trocadilho que marcaria a sina desta mulher que sequer tem uma cama.
Os meninos, personagens sem nome, outra marca lingüística importante, são chamados de "o menino mais velho" e "o menino mais novo".
A cadela, Baleia, pensa, narra a própria morte.
O soldado Amarelo traz o governo para o enredo, mostra o abismo entre o vaqueiro humilde e o poder público.
Seu Tomás da bolandeira mostra a importância que o vaqueiro Fabiano dá a quem conhece as palavras, uma espécie de monólogo interior de Fabiano com um mundo diferente do seu.
Graciliano Ramos e o Modernismo
De acordo com o depoimento do Professor Carlos Minchillo, Graciliano Ramos "...é localizado pela história literária nessa fase do Modernismo que é chamada Romance regionalista ou, então, Ciclo do romance nordestino". Trata-se da segunda fase do romantismo, que os estudiosos costumam caracterizar como uma retomada da realidade brasileira, ampliando as metas dos modernistas da primeira fase. Os fatos políticos dessa época despertam nos artistas uma forte consciência política.
Em Vidas Secas encontram-se as principais características da prosa dessa fase: o regionalismo, que já havia surgido durante o Romantismo, portanto, uma tradição de nossa literatura e a linguagem que se apodera das conquistas da primeira fase modernista; a fala brasileira aparece com muito mais força pois os artistas sentiam-se mais livres para explorá-la.
Um dos muitos exemplos dessa fala brasileira, em Vidas Secas: "Fabiano atentou na farda com respeito e gaguejou: - Isto é. Vamos e não vamos. Quer dizer. Enfim, contanto, etc. É conforme". (p.26) Um outro exemplo,quando Fabiano, bêbado, no meio da festa, no vilarejo diz?: " Cadê o valente? Quem é que tem coragem de dizer que eu sou feio? Apareça um homem". (p. 78).
Em dado momento da narrativa, Fabiano desejando humilhar os homens que se encontram na festa diz: "- Cambada de...". No entanto, não consegue finalizar a frase, não encontra a palavra certa e depois de muito pensar conclui: "- Cambada de cachorros". Essa luta com as palavras permeia toda a narrativa deste romance em que a seca e a fome denunciam os contrastes sociais da região Nordeste. Sobre a linguagem de "Vidas Secas". Afirma no vídeo o Professor Carlos Minchillo: A questão da linguagem modernista já está mais ou menos incorporada e deixa de ser a grande bandeira e a questão política aflora, especialmente na prosa que é, na verdade, o gênero que mais se destaca nesse momento, com particularidades muito próprias". E, mais adiante, conclui: "Vidas Secas se transformou num ícone ... serve de referência a um certo estilo, aquilo que muitos consideram como o exemplo mais bem acabado do romance regionalista".
Interessante observar um trecho do depoimento do Bispo Dom Fernando, sobre o processo de criação de Vidas Secas: " O romance era grosso e ele foi cada vez mais depurando ... a ponto da professora dizer: Você não mais bulir nesse romance senão ele vai terminar num almanaquezinho".
Graciliano Ramos, junto a Rachel de Queirós, José Lins do Rego e Jorge Amado, está entre os grandes representantes dessa época.
Atividades de Língua e Literatura
Atividade de expressão escrita
a) Duplas devem copiar e ler o trecho a seguir, do romance Vidas Secas, que narra o momento em que o personagem Fabiano - um sertanejo que foge da seca com a mulher, os filhos e a cadela Baleia - encontra uma propriedade abandonada, depois de vários dias de caminhada errante:
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"Fabiano procurou em vão perceber um toque de chocalho. Avizinhou-se da casa, bateu, tentou forçar a porta. Encontrando resistência, penetrou num cercadinho cheio de plantas mortas, rodeou a tapera, alcançou o terreiro do fundo, viu um barreiro vazio, um bosque de catingueiras murchas, um pé-de-turco e o prolongamento da cerca do curral. Trepou-se no mourão do canto, examinou a catinga, onde avultavam as ossadas e o negrume dos urubus. Desceu, empurrou a porta da cozinha. Voltou desanimado, ficou um instante no copiar, fazendo tenção de hospedar ali a família. Mas chegando aos juazeiros, encontrou os meninos adormecidos e não quis acordá-los. Foi apanhar gravetos, trouxe do chiqueiro das cabras uma braçada de madeira meio roída pelo cupim, arrancou as touceiras de macambira, arrumou tudo para a fogueira." (RAMOS, Graciliano. Vidas Secas.31ed.São Paulo, Martins,1993.p.47.) 
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As duplas procuram no texto palavras que desconhecem. Em seguida, consultam-nas no dicionário e copiam os significados encontrados: chocalho - pequeno sino que se ata ao pescoço de animais; tapera - casebre, casa muito pobre; barreiro - reservatório cavado no barro para armazenar água da chuva; catingueiras - plantas que servem de alimento para o gado; mourão - pau que sustenta uma cerca; catinga (ou caatinga) - vegetação baixa e espinhosa característica do sertão nordestino; copiar - varanda; macambira - planta de folhas duras e espinhosas.
Depois, fazem um levantamento de trechos, palavras ou expressões que retratam a seca. Respostas pessoais. Sugestões "plantas mortas", "viu um barreiro vazio, um bosque de catingueiras murchas", "examinou a catinga, onde avultavam as ossadas e o negrume dos urubus".
Cartazes com material recolhido sobre o fenômeno da seca no Sertão nordestino
b) Atividade de reescrita: os alunos copiam em seus cadernos os seguintes verbos e locuções verbais:
Fazia / apareceu / haviam repousado /andavam / progredira / tinham / caminhado / alargavam / estavam / procuravam
Também, copiam o trecho sem verbos retirado do início da livro Vidas Secas, para depois inserirem os verbos e locuções verbais nos lugares adequados:
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"Na planície avermelhada os juazeiros duas manchas verdes. Os infelizes o dia inteiro, cansados e famintos. Ordinariamente pouco, mas como bastante na areiado rio seco, a viagem bem três léguas. Horas que uma sombra. A folhagem dos juazeiros longe, através dos galhos pelados da catinga rala." (RAMOS, Graciliano. Vidas Secas.31ed.São Paulo, Martins,1993.p.43.) 
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Resposta em ordem alargavam; tinham caminhado; estavam; andavam; haviam repousado; progredira; Fazia; procuravam; apareceu. 
2. Atividade de expressão oral
O professor lê em voz alta, ou mostra em transparência o trecho do livro do filho de Graciliano Ramos, Ricardo Ramos, para uma discussão sobre a prisão de Graciliano. Este texto servirá também para atividades de análise e reflexão textual (Novo nome que o PCN deu ao estudo de Gramática) em que estudaremos o condicional e concisão de linguagem.
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"Eu tinha pouco menos de 15 anos quando cheguei ao Rio e foi aí que praticamente conheci meu pai. Sua prisão me deixara muito pequeno, lá em Maceió, na casa de meu avô materno. Umas férias ligeiras, dois meses corridos entre espantos, cariocas, não haviam bastado para nos aproximar. Se dele quase não aguardar nem o rosto, quanto mais traços de temperamento. È facil imaginar as surpresas que tive, no primeiro encontro, me oferecendo um cigarro ("Você fuma?") ou nas muitas conversas continuadas.
Logo eu trabalhava em jornal, fazia política, estudava 'a noite. Ele era inspetor de ensino na minha escola, acreditei piamente que só fiscalizava a mim. Depois eu começava a escrever, umas coisas que pareciam contos, e naturalmente foi meu primeiro leitor. Além do geral de política e literatura, nosso terreno mais comum, passamos a falar daquilo em particular. Principiava meu aprendizado.
- Não escreva "algo" - ele implicou
Quis saber por quê, me respondeu:
- É crime confesso de imprecisão.
Mais tarde eu estranhei:
- Por que você não usa reticências e exclamações?
Não demorou um segundo:
- Reticências, porque é melhor dizer do que deixar em suspenso. Exclamações, porque não sou idiota para ficar me espantando 'a toa.
E certa vez, a propósito de um parágrafo que eu empregara diferentes tempos de um verbo( passado, presente , futuro), recomendou:
- Não faça isso.
Resisti, Machado de Assis fazia, até numa frase. Estava certo. Era um erro sim. Não gramatical, mas de pensamento. Ninguém raciocina aos pulos. E arrematou:
- O importante é escrever duas páginas no condicional sem ficar monocórdio, nem dar eco, sem que se perceba.
Esmoreci, confessando:
- Não vou conseguir isso nunca.
Ele me animou:
- Vai, sim. Com suor, paciência, vai.
(RAMOS, Ricardo. Graciliano: retrato Fragmentado. São Paulo, Siciliano, 1992.p.19-20)
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1. No vídeo o trecho que aborda a prisão de Graciliano Ramos deve ser revisitado em dois momentos: primeiro o depoimento da Pesquisadora de Literatura Brasileira- USP, Eliane Jacqueline Mattalia "Depois ele é nomeado diretor da instrução pública - secretário da educação - dessa função é levado preso... Um oficial pede uma terceira chance para sua filha passar de ano na escola e Graciliano não concede - várias vezes - o mesmo sujeito o leva preso, por uma denúncia anônima. Nesta época o Integralismo estava triunfando, depois do levante comunista de 35.......é como se ele fosse um ladrão de cavalo, sei lá..." O segundo momento deve ser precedido da explicação de que Graciliano escreveu Memórias do Cárcere para narrar sua triste experiência na prisão, quando estava preso escreveu Angústia, outro romance influenciado por essa experiência. O escritor Miltom Hatoum nos diz: "... ele está escrevendo memórias na ficção e ficção nas memórias, nem tudo nas memórias é confiável,...fronteiras não muito rígidas entre a ficção e as memórias..."
Depois os alunos podem fazer uma pesquisa, juntamente com o professor de História sobre o Integralismo e o levante comunista de 35. Esta lição ajudará na discussão sobre a prisão de dez meses de Graciliano Ramos.
A discussão em sala deve responderas questões que seguem:
a) Quando e por que Graciliano Ramos foi preso?Março de 1936, acusado de ser comunista.
b) O que aconteceu com Ricardo Ramos após a prisão de seu pai?Ficou com seus avós maternos, e só com 15 anos passou a conviver com o pai.
c) Que livro Graciliano Ramos escreveu na Prisão?Angústia.
d) Que livro Graciliano Ramos escreveu antes de morrer? Memórias do Cárcere, "...escrevia Memórias do Cárcere, morre, o câncer do pulmão tirava a vida do homem que tirou os brincos da literatura."( depoimento do escritor Miltom Hautom)
e) Graciliano era um escritor de ficção? Não ele narrava a realidade, transformava realidade em ficção. 
f) Por que o escritor Miltom Hautom nos diz: "...nem tudo nas memórias é confiável."? Porque são memórias de um escritor.
Atividades de análise e reflexão textual
A)No texto( de Ricardo Ramos), Graciliano Ramos diz ao filho que a palavra algo é "crime confesso de imprecisão". O motivo dessa afirmação é que este é um pronome indefinido, vago, impreciso.
Vamos pensar nessa palavra. Mostre aos alunos:
-Mãe, quero "algo" para comer!
(E se sua mãe lhe desse alpiste?)
Fale algo!
(Que tal:blábláblá?)
Até grandes escritores implicam com certos vocábulos. Gostar ou não de algumas palavras ou expressões sempre tem a ver com razões pessoais do autor ou do falante. Discuta com os alunos se eles implicam com alguma palavra ou expressão. Por que isso ocorre? As escolhas vocabulares passam por valores estéticos ligados 'as escolhas emocionais do escritor ou do falante - e por seus estilos de época. Aqui se inclui também a gíria.
Os alunos podem copiar em seus cadernos o trecho que segue e responder 'as questões sugeridas:
"Além do geral de política e literatura, nosso terreno mais comum, passamos a falar daquilo em particular. Principiava meu aprendizado."
a) O que seria "daquilo em particular"? O ato de escrever
b) A que aprendizado se refere o narrador? O aprendizado do escritor.
B) O professor Carlos Minchillo afirma: "... nesses momentos que você tem o emprego dos condicionais ... parece que esse narrador desconfia dos pensamentos que são retratados dos personagens ... o Fabiano acredita, diz acreditar, que tudo pode mudar, e na tranfrormação estilística que esse pensamento sofre na elaboração das frase, isso acaba sendo transformado como: isso poderia mudar..."
Sugestão de Atividade: escolher um trecho curto de um dos capítulos e escrevê-lo no quadro para os alunos copiarem. A seguir, pedir que apontem características que fazem do trecho, um bom exemplo de linguagem bem utilizada. Marcar com flechas o que for sendo levantado pelos alunos. A princípio, é provável que eles se atenham apenas ao vocabulário. Leve - os a observarem as figuras utilizadas pelo autor, a forma como os vocábulos são dispostos na frase, as descrições de espaço e as referências temporais.
Sugestão: "Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se no chão". (p.9)
Observar o estilo cinematográfico do autor. Se o autor tivesse escrito: o menino mais velho começou a chorar, estaria dizendo a mesma coisa, mas o modo como escreveu é muito mais belo. Os alunos devem perceber que há muitos modos de se dizer a mesma coisa e é nessa busca de mais expressividade que se consegue desenvolver as habilidades lingüísticas.
Interdisciplinaridade
Proposta de interdisciplinaridade com Geografia.
Laércio Furquim Junior.
O vídeo apresenta fatos marcantes sobre a vida de Graciliano Ramos. Entre eles, os locais por onde o autor morou, atividades profissionais que desempenhou, posicionamento político, relacionamentos amorosos e constituição de família. Cita-se que ele nasceu no agreste alagoano e que teve 15 irmãos. Na abertura do vídeo, o ator Joseildo Cavalcanti Ferreira lê trecho de "Infância" em que Graciliano escreve: "...a generalização é ruim e isso me pertuba." Buscando desmistificar generalizações relativas à região nordestina, identifique, diferencie e localize a zona a litorânea, a zona da mata, o agreste e o sertão nordestino. Em cada uma dessas zonas ocorrem distintas formações naturais e, também distintas atividades geoeconômicas que fazem com que a organização socioespacial do nordeste seja, atualmente, bastante diversificada daquela contextualizada na obra de Graciliano Ramos.
Seqüência Didática
1a aula: Localize em mapas e aborde características geográficas gerais da região onde se passa a obra. Utilize mapas temáticos do Brasil em que se possa identificar características gerais da região nordeste, de clima e vegetação, de sua densidade populacional e dados de migração. Peça aos alunos que anotem em seus cadernos os dados passados na aula. Após localizar a região nordeste, escolha um tema para iniciar as atividades, que pode ser a sua classificação climática mais ampla: tropical semi-árido. Indique os principais aspectos da caatinga, índices e características climáticas do sertão, da zona da Mata, do agreste e da área litorânea como: 
médias anuais de pluviosidade 
índices de pluviosidade, regularidade dos períodos secos e chuvosos 
características gerais da vegetação 
tipos de solo. 
Como lição de casa, peça aos alunos que façam, individualmente, pesquisas em livros ou à internet para responder às seguintes questões: 
O que são massas de ar? 
Quais massas de ar atingem o nordeste brasileiro? 
Quais são as causas que originam as secas no nordeste? 
Quais os tipos de mercadorias mais produzidas atualmente no nordeste? 
Qual é a densidade demográfica do nordeste e quais as áreas mais populosas? 
Na 2a aula, a partir das respostas dadas pelos alunos na tarefa de casa, pode-se iniciar uma discussão sobre as interferências que as atividades humanas imprimem à natureza apresentando-se os conceitos de primeira e de segunda natureza. Pode-se entender o conceito primeira Natureza como a natureza ainda intocada pelo homem, tão escassa nos dias atuais, já que esta independência é relativizada pelo fato do homem conseguir dados sobre praticamente toda extensão do planeta com satélites que circulam 24 horas por dia emitindo informações sobre a Terra. Já a segunda Natureza reflete a construção do espaço geográfico. É o fruto do trabalho transformando a natureza com suas obras e construções: projetos agrários, projetos de irrigação (como os existentes no Rio São Francisco), construção e vida nas cidades, extrativismos, exploração de minérios, poluição etc. 
Inicia-se a 3a aula localizando-se, novamente em mapa, a área onde se desenvolve a trama. Solicite aos alunos que formem grupos, variando de tamanho de acordo com a dinâmica da classe. Assim, poderão utilizar o horário da aula para pesquisarem. Cada grupo fica responsável por uma temática e deverá entregar a pesquisa escrita ao professor no final da quinta aula da seqüência. Estabeleça a tarefa que cada membro do grupo desempenhará.
Primeiro grupo. Em Vidas Secas, Graciliano Ramos cita o inverno como uma época chuvosa no sertão, "época de esperanças". Questão disparadora: fala do escritor amazonense Milton Hatoum: " O impacto maior foi quando eu li a obra do Graciliano Ramos ... primeiro, um dos primeiros livros que eu li quando estava no ginásio amazonense, no colégio Pedro II, de Manaus, eu li o Vidas Secas. Eu tinha uns 13 ou 14 anos. Era o avesso do que eu, do meu mundo, que é o mundo das águas, mundo da Amazônia... a partir do começo, já são retirante; a condição deles de classe social é a mais adversa possível... eles são proprietários temporários, efêmeros, daquela fazenda abandonada, mas depois como se fosse um ciclo de bonança, e, ao mesmo tempo, de seca, de miséria, eles vão caminhando nesse ciclo até a retirada final, essa abertura para a cidade ... esperança longínqua, muito esfumada, vaga, quase uma desesperança".
Aspectos a serem trabalhados:
a) Localize, em mapa, o sertão e sua proximidade com o agreste alagoano, onde se desenvolve a trama. Caracterize a transição do agreste para o sertão.b) O sertão nordestino é uma área onde se aproximam quatro massas de ar: quais?
c) Como e quando a Massa Equatorial Continental (surgida na Amazônia), chega ao sertão nordestino? Quais as conseqüências de tal confluência?
d) Identifique as áreas nordestinas onde o relevo oferece resistências à passagem da massa equatorial atlântica.
e) Analise as áreas de maior pluviosidade do nordeste e relacione-a com as características da massa de ar que mais atua na região.
f) Registre as diferentes médias de pluviosidade que ocorrem no nordeste e construa um gráfico para representa-las.
Segundo grupo: Questão disparadora: O professor de literatura da Universidade de São Paulo, afirma no vídeo que Graciliano Ramos desenvolve uma "literatura realista". Assim, levante alguns dados que ajudem a explicar o drama vivido pela família de Fabiano no livro Vidas Secas e que até os dias de hoje ecoam por uma enorme área territorial brasileira.
Aspectos a serem trabalhados:
a) Quais as principais características do ecossistema da caatinga?
b) Qual a sua área em km2 ? 
c) O quanto isto representa em relação á área do território nacional?
d) Quantas pessoas vivem na área da caatinga? 
e) Quais os estados que são abrangidos pela caatinga?
f) Essa formação ocorre em vários estados do Nordeste e no norte de Minas Gerais.
g) Para que e onde estão sendo desenvolvidos os projetos de irrigação do Rio São Francisco? 
h) Quais as conseqüências ambientais originadas por tal processo de irrigação?
i) Por quê não se desenvolve a construção de poços para se explorar os lençóis freáticos do nordeste ao invés de se construir canais de irrigação que tiram as águas do rio São Francisco? 
Terceiro grupo. Questão disparadora: "As áreas do Nordeste nas quais a resistência às mudanças continua sendo a 'marca registrada' do ambiente sócio-econômico, correspondem a aquelas onde se pratica a tradicional cultura canavieira e no Sertão semi-árido. Nessas amplas porções do território nordestino, o processo de modernização, quando ocorreu, foi espacialmente seletivo e restrito, fato que contribuiu para a manutenção das estruturas tradicionais." (Nelson Bacic Olic A questão nordestina: permanências e mudanças).
Aspectos a serem trabalhados:
a) As secas no Nordeste devem ser analisadas em escala global. De acordo com os movimentos das massas de ar, torna-se possível prevê-las?
b) A miséria de grande parte dos habitantes do sertão relaciona-se, geralmente, ao clima semi-árido. Há poucas chuvas no nordeste como um todo?
c) O solo não favorece ou desfavorece a agropecuária ? Qual sua principal: falta d'água ou escassez de sais minerais? O solo nordestino é pobre?
d) Há formação rica em espécies frutíferas, plantas que produzem fibras, óleos vegetais e ceras? Quais? Onde?
e) O que significa a expressão "indústria da seca"?
f) O que é SUDENE? Para que e em qual contexto foi criada?
g) Quais seus principais projetos?
h) Quais as ligações existentes entre a construção de hidrelétricas no leito do rio São Francisco e a SUDENE? 
i) Desenvolva um breve histórico do início das atividades ligadas à cana-de-açúcar no nordeste. Quais os maiores produtores do nordeste?
j) Qual a importância da produção açucareira para a formação do estado de Alagoas?
k) As atividades da pecuária perderam espaço para a agricultura? Justifique.
l) Explique como ocorrem as principais formas de relações de trabalho no campo. Explique o significado de: latifúndio, trabalhador temporário, arrendatário, posseiro e grileiro.
Quarto grupo: as migrações e os aspectos socioespaciais. Questão disparadora: " Em Vidas Secas, já ali no começo, o drama já existe. Eles são retirantes, a condição deles de classe social é a mais adversa possível. Eles são proprietários temporários e efêmeros daquela fazenda abandonada. Mas, depois, como se fosse um ciclo de bonança e, ao mesmo tempo de seca, de miséria, eles vão caminhando nesse ciclo até a retirada final. Essa abertura para a cidade que deixa essa esperança muito longínqua, muito vaga. Diria que é quase uma desesperança." (Miltom Hatoum, em trecho do vídeo).
Aspectos a serrem trabalhados:
a) Quais fatores naturais, sociais e políticos incentivaram as migrações para o sudeste. Relacione com o processo de industrialização do Brasil.
b) Caracterize os atuais fluxos de migração no território brasileiro.
c) De acordo com a atual organização espacial do território brasileiro, considere a seguinte suposição: se tivesse que migrar atualmente, a família de retirantes se dirigiriam ao Sudeste? Justifique sua resposta.
d) Até que ponto as políticas de interiorização do território e dos projetos de integração nacional que se desenvolveram no Brasil durante o século XX, principalmente em sua segunda reduziram o fluxo migracional inter-regional?
e) Construa um mapa e analise os principais fluxos populacionais brasileiros a partir de meados do século XX.
f) Classifique os seguintes índices no estado de Alagoas, no nordeste relacionando-os aos índices nacionais: 
- mortalidade infantil;
- IDH Índice de Desenvolvimento Humano)
- PIB (Produto Interno Bruto)
- analfabetismo;
- médicos por habitantes e leitos hospitalares por habitantes, hospitais públicos (1999) 
g) Identifique pelo menos sete áreas de maior dinamismo econômico no interior da região nordeste: 
Utilize integralmente a quarta aula para a produção final do trabalho em grupo. Os grupos se encarregam formular um resumo com os principais aspectos de suas pesquisas que serão distribuídas para a classe no início da aula seguinte.
Na quinta aula, quando se encerra a seqüência, oriente cada grupo a apresentar uma síntese (em cinco minutos cada grupo) dos temas estudados. Em seguida, para finalizar a seqüência, escreva na lousa a seguinte questão que será debatida entre os alunos: o que pode ser mutável no Sertão? Para aquecer a discussão, leia ou entregue impressa a seguinte citação do geógrafo Milton Santos:
Partimos do pressuposto de que o homem é indissociável da natureza. Ao longo dos tempos o homem foi incorporando a natureza à sua vida. Isso vem ocorrendo num processo longo, múltiplo, complexo e se dá em dois planos que são complementares e inseparáveis. O primeiro plano é configurado por componentes simbólicos, culturais e políticos. Já o segundo, por componentes que organizam a vida material: a produção econômica e os sistemas técnicos que constróem os ambientes humanos.
Referências bibliográficas
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- Almanaque Abril, Editora Abril, 2000 e 2001.
- FERREIRA, G. M. L.. Atlas Geográfico. Espaço Mundial. São Paulo: Moderna, 2000. 
- GIANSANTI, Roberto; OLIVA, Jaime.Temas da Geografia do Brasil . São Paulo: Editora Atual, 2000.
- ROSS, J. L. S. Os fundamentos da geografia da natureza. In: Geografia do Brasil. Jurandyr L Sanches Ross (org.). São Paulo: Edusp - FDE, 1996.
- SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. 
- SANTOS, Milton; SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record, 2001.Bibliografia de Graciliano Ramos
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986. 
____ "Céu, inferno" in: Céu, inferno. São Paulo, editora Ática, 1988, pp.10-33.
CANDIDO, Antonio. Ficção e confissão: ensaios sobre Graciliano Ramos. Rio de 
Janeiro: Ed. 34, 1992.
COUTINHO, Carlos Nelson. "Uma análise estrutural dos romances de Graciliano 
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1966, pp. 107-150. (Também in: BRAYNER, Sônia. (org.). Graciliano Ramos. 2a 
ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978).
LAFETÁ, João Luiz. "O mundo à revelia" in: RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro, ed. Record, p. 173-197.
LINS, Álvaro. "Valores e Misérias das Vidas Secas". In: Os mortos desobrecasaca. 
(1940-1960). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1963.
PUCCINELLI, Lamberto. Graciliano Ramos: relações entre ficção e realidade. São 
Paulo: Quíron; Brasília: INL, 1975.
Ministério do Desenvolvimento Agrário
Graciliano Ramos
Embrapa - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Revista Pangea
Materiais disponíveis na Videoteca
 " Graciliano Ramos " / programa informativo (2002) 		17’ 		Fita 10
Produção do Canal Futura, da Série Sala de Notícias.
 " Graciliano Ramos : Literatura sem Bijuterias" / documentário (2002) 30’ 		Fita 10
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
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Guimarães Rosa: O mágico do reino das palavras(1908-1967)
Ângela Carvalho e Jorge Ribeiro
"Vida é sorte perigosa
passada na obrigação
toda noite é rio-abaixo
todo dia é escuridão..." 				Grande Sertão Veredas 
Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas
Elementos da narrativa
Atividade de expressão escrita
Atividade de expressão oral
Interdisciplinaridade
Para ler mais 
Apresentação do autor 
Na pequena localidade de Cordisburgo, em município de Minas Gerais, nasceu Guimarães Rosa no dia 27 de junho de 1908, " Não gosto de falar da minha infância, é um tempo de coisas boas, mas sempre com pessoas grandes incomodando a gente, intervindo comentando, estragando os prazeres. Recordo o tempo de criança, vejo por lá um excesso de adultos. Papai era comerciante rigoroso. Quando eu era menino, ele me levava para caçar com ele, eu avistava a caça e gritava: - Papai, ele vinha correndo e a caça fugia. Um dia ele desconfiou que eu gritava de propósito, só para ele não matar os bichos e nunca mais me levou. " 
Primeiro dos seis filhos de D. Francisca Guimarães Rosa e de Floduardo Pinto Rosa, o pequeno João apresentou, desde de muito cedo, aptidão para o estudo de Línguas. Começou a estudar francês, por conta própria, " com apenas seis anos ele já lia em francês e logo depois aprendeu holandês. Em 1918 seu avô e padrinho Luiz Guimarães o levou para Belo Horizonte para continuar os estudos." " Foi aqui em Belo Horizonte, no Colégio Arnaldo, que o menino João Guimarães Rosa cursou o ginásio. Nessa escola estudaram, também, outras celebridades como Carlos Drummond de Andrade e o Henfil. Era um colégio de origem alemã e logo, logo, Joãozito aprendeu este idioma. Nessa fase da vida ele frequentava muito as bibliotecas da cidade, dando continuidade ao seu hábito para a leitura e aumentando ainda mais a sua paixão pelos livros." Antes dos quinze anos, já dominava o alemão e o inglês. 
Entretanto, o notável conhecimento de línguas estrangeiras não influenciou a primeira escolha profissional de João Guimarães Rosa: a medicina. No vídeo o depoimento de seu irmão José Luiz Guimarães Rosa nos diz: " Desde pequenininho que ele era estudioso de Línguas, quando ele estudou medicina, aqueles colegas que podiam importavam livros da França, da Alemanha da Inglaterra, livros de medicina. Então, ele era chamado para estudar com os colegas, porque ele lia e traduzia para os colegas, para que eles pudessem estudar. "
Formado em 1930, o primogênito de D. Francisca exerceu a profissão de médico durante quatro anos. O depoimento de Vilma Guimarães Rosa, filha de Guimarães Rosa e escritora nos diz: " Ele foi fazer a interiorização da medicina, numa época em que não se conhecia esta palavra, interiorização; ele escolheu, no mapa um lugar onde não houvesse médico e foi o pioneiro. Eu tenho muito orgulho dessa fase da vida do meu pai, porque eu nasci ali, na roça, no interior, no lugar onde ele foi o primeiro médico. Era respeitado como o famoso doutor Rosa." Boa parte deste tempo, ele passou no sertão de Minas Gerais, onde desenvolveu os seus conhecimentos sobre a vida do sertanejo. Já nessa época, João Guimarães Rosa dedicava-se à literatura.
O fascínio pela linguagem tornava-se um sério concorrente ao exercício da medicina. No vídeo o depoimento de Heloisa Murgel Starling, Professora de História das Idéias - U.F.M.G. - " Essa experiência dele como médico no interior, deve ter sido uma coisa importante, porque colocou o Guimarães Rosa perto daquilo que é essencial do ser humano: a dor, a morte, o nascimento... Aproximou o Guimarães Rosa, fez com que ele tivesse uma vivência de determinadas emoções e de determinados sentimentos do ser humano que, provavelmente o ajudaram, quando ele foi pensar nos personagens." Embora tenha sido um aluno exemplar durante a faculdade, ele já percebia a falta de vocação para a carreira médica. " A vida de médico deixava Guimarães Rosa muioto angustiado, ele viu que era completamente incapaz de acabar com os sofrimentos e os males humanos. Então ele abandona definitivamente a medicina e presta concurso para o Itamaraty."
Incentivado por um amigo próximo, impressionado com os seus conhecimentos, João Guimarães Rosa prestou concurso para o Itamaraty em 1934, obtendo o segundo lugar. As obrigações da carreira diplomática impuseram-lhe o abandono da medicina, e, de certa forma, aproximou o escritor de sua verdadeira vocação: as artes da linguagem. Depois de tornar-se diplomata, João Guimarães Rosa colecionou prêmios literários, adquiriu notoriedade e foi reconhecido por grande parte da crítica literária como o maior escritor brasileiro do século XX. " Fui médico, rebelde, soldado; foram etapas importantes de minha vida como médico conheci o valor da consciência e como soldado, o valor da proximidade da morte. Essas três experiências formaram até agora o meu mundo interior e para que isso não pareça demasiadamente simples queria acrescentar que também configuraram o meu mundo a diplomacia, o trato com cavalos, vacas, religiões e idiomas. Quem lida com eles aprende muito para sua vida e a vida dos outros. Eu queria que o mundo fosse habitado apenas por vaqueiros e então, tudo andaria melhor."
Ainda que tenha sido um homem do mundo, João Guimarães Rosa escreveu, quase exclusivamente, sobre o universo sertanejo. A cultura produzida pelos jagunços, pela roça e pelos trabalhadores do eito inspirou uma dezena de escritos. A experiência com o sertão, adquirida por ele durante o período em que foi médico em Minas Gerais, marcou definitivamente o projeto literário de Guimarães Rosa. 
O autor de O grande sertão: veredas morreu, subitamente em seu apartamento em Copacabana, três dias após a sua posse na Academia Brasileira de Letras. 
O romance Grande Sertão: Veredas
Grande sertão: veredas é a obra prima de João Guimarães Rosa, e considerado por muitos o romance mais significativo da moderna literatura brasileira. O romance organiza-se a partir do encontro de Riobaldo, homem do sertão, com um "senhor" para quem Riobaldo narra sua vida. O centro de gravidade ao redor do qual giram as memórias da personagem é a relação que manteve com Diadorim, ex-companheiro dele do tempo de jagunço.
Segundo a Prfª. Marcia Marques: " Para o Grande Sertão existem dois tipos de leitor: quem nunca o leu e quem não conseguiu ler só uma vez... então aquele início de recepção foi um início problemático, porque a linguagem, ela causa aquele estranhamento inicial, ela é exporada até os seus primórdios, mas é uma linguagem tão forte que ela começa a calar muito fundo em quem lê o Grande Sertão." Em tese, trata-se de um argumento bastante simples: homem relembra a vida e, ao recontá-la, refaz o percurso de suas andanças, tristezas e felicidades. No vídeo a crítica Literária nos diz: " Resumir Grande Sertão: Veredas é muito difícil. Trata-se de um grande longo denso monólogo de Riobaldo, um jagunço, que ao narrar sua história, já é um ex-jagunço, no meio da história da jagunçagem... O problema, contudo, encontra-se no modo pelo qual se constrói a narrativa, repleta de ações paralelas e casos inusitados, sobre os quais o engenho e arte de Guimarães Rosa deram vida e significado. 
O talento do escritor se reflete para o leitor em, pelo menos, três níveis: o primeiro, e mais sensível, encontra-se no plano da linguagem.No vídeo a Profª. Marcia Marques analisa o título da obra: " foi uma das coisas que chamou muita atenção da crítica: Grande Sertão : Veredas. Nada é por acaso para Guimarães Rosa sobretudo com relação ao código linguístico, a essa Língua. Então Grande Sertão, dois pontos, uma explicação: Veredas? Grande Sertão singular, dois pontos Veredas, plural. Grande Sertão, um Sertão adjetivando no grande sem artigo, as Veredas mais plurais, como eu disse menos determinado." Animada por um movimento pendular, a linguagem narrativa d'O grande sertão: veredas ora aproxima-se do registro popular em que o universo dos jagunços se faz existir, ora afasta-se dele para permitir certa margem de manobra ao escritor na criação de um vocabulário próprio, cujas raízes encontram-se esparramadas pelas inúmeras línguas de que Guimarães Rosa tinha conhecimento. O depoimento da Profª. Heloísa M. Starling nos diz: "Se você lê o Grande Sertão em voz alta, tem horas que na batalha o ritmo acelera, depois tem horas que você vai lendo, parece um carro de bois, mesmo, o ritmo é lento, então o Tom Jobim dizia que tem vários ritmos, então seria legal na hora que você lia em voz alta porque você percebia sons do livro."
Em nível mais profundo, o tema do romance também não escapa desse movimento de ida e vinda. O universo sertanejo, pelas mãos hábeis do escritor, abre-se como o palco de paixões humanas, de modo que os sentimentos pelos quais Riobaldo animou a sua existência poderiam acontecer em qualquer época ou lugar. Daí o caráter universal do romance. O depoimento do Prof. Willi Bolle nos diz: " Grande Sertão: dois universos paralelos... é uma montagem em contraste com isso o autor se refere a dois universos de linguagem, dois mundos de fala. De um lado, o grande discurso, a grande eloqüência, a norma culta, do outro lado, as veredas, a fala humilde das pessoas que moram no sertão. As veredas são os cursos de água e por extensão as clareiras onde se estabelecem mais facilmente as moradias." Ao mesmo tempo, a evocação de um conjunto de significados tão característico do ambiente do sertão impõe à obra um forte traço particular, do qual Guimarães Rosa não pretende escapar. Por isso, a fortuna crítica d'O grande sertão insiste em marcar o movimento ambivalente da narrativa, sempre oscilante entre o regional e o universal.
Por fim, o romance invade regiões mais sombrias da narrativa, isto é, a relação mesma de Riobaldo e Diadorim. A amizade e o amor se confundem durante a travessia dos dois jagunços. Ainda que os dois personagens se unam pelo regime da violência, o sentimento que catalisa a relação deles parece estranho àquele universo de rifles, gritos e morte por onde se faz a narrativa O grande sertão: veredas. 
Estamos diante de um livro orgânico, cujos alicerces de sustentação se encontram todos fincados no espírito criativo daquele que é considerado o maior escritor brasileiro do século XX. No vídeo a Profª.Heloísa M. Starling: "Eu vou dizer para você que do Grande Sertão dá para a gente entrar em Veredas...dá pra fazer múltiplas Leituras do Grande Sertão... Antônio Cândido, que é um crítico, ele diz, que o Grande Sertão tem tudo para quem estiver a ler, então se você quiser ler, por exemplo, você está procurando com o Grande Sertão: a vegetação do sertão, a botânica...o historiador vai encontrar a marca do seu ofício, o botânico vai encontrar, o ecologista vai encontrar, o sociólogo vai encontar, o filósofo vai encontrar. O Tom Jobim foi lá e ouviu música no Grande Sertão. Ele botou o livro no ouvido, igual concha do mar e ouviu música."
Os elementos da narrativa Grande Sertão: Veredas
Esses elementos são trabalhados de tal forma, que o narrador, Riobaldo, ao narrar a história tem a aportunidade de focalizar uma vasta realidade que é, ao mesmo tempo simples e complexa, particular e universal. O narrador vai do monólogo ao diálogo direto, descreve, narra, disserta, recorre ao diálogo indireto livre, inventa "estórias" dentro da história, volta ao monólogo, vai ao diálogo indireto, sempre se utilizando de recursos como os neologismos, os aforismos, os diminutivos, a derivação imprópria . Somam-se a isso as rupturas sintáticas, a utilização da silepse de número, a presença do modo de falar do sertanejo e um criterioso uso dos recursos poéticos. Tudo isso para realizar a travessia do sertão em busca da alegria. 
Examinemos o início do livro:
"- Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja". (p. 7). 
O personagem central começa a falar, após o travessão. Anuncia-se um diálogo direto, mas é um monólogo o que ocorrerá. "Nonada", o não e o nada, não foi nada, ele está a dizer. Já de saída, revela-se o personagem narrador, através de sua fala, de seu jeito coloquial de falar "...foram de briga de homem, não". 
Examinemos as linhas finais do romance:
"Cerro. O senhor vë. Contei tudo. Agora estou aqui, quase barranqueiro. Para a velhice vou, com ordem e trabalho. Sei de mim? Cumpro. O Rio São Francisco - que de tão grande se comparece - parece é um pau grosso, em pé, enorme... Amável o senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o diabo não existe. Pois não? O senhor é um homem soberano, circunspecto. Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for... Existe é homem humano. Travessia." (p.568). Já não é o mesmo homem de palavras simples, do início da narrativa. É como se a narrativa tivesse possibilitado a transformação da personagem, continua a fala coloquial, mas os adjetivos são de doutor, por exemplo, "soberano", "circunspecto", elogiando o leitor ouvinte. E o que ouve, além da história, esse leitor? Nelogismos: " capisquei, desfalam etc., aforismos: "Riobaldo", a colheita é comum, mas o capinar é sozinho"; "Moço, Deus é a paciëncia, o contrário é o Diabo"; os diminutivos: "meninozinhos", Limãozinho, "manhãnzim"; atribuições de novos sentido para as palavras: "O rio São Francisco que de tão grande se comparece...", o verbo comparecer parece ter o objetivo, aqui, de tornar o rio mais presente; a derivação imprópria: "...foi caçar poleiro para o bom adormecer". Note-se que "bom", adjetivo e "adormecer", verbo, são substantivados. O leitor pode "ouvir", também, as rupturas sintáticas: "Dono dele nem sei quem for"; as silepses de número: "A gente viemos do inferno - nós todos...". Todos esses recursos harmonizados funcionam como que uma alquimia nas mãos do narrador quando narra, descreve e disserta.
Observe-se o narrador descrevendo o sertão: "Lugar sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez, quinze léguas, sem topar com casa de morador; e onde criminoso vive seu cristo-jesus, arredado de arrocho de autoridade. O Urucuia vem dos montões oestes..."; ou, dissertando, em uma das inúmeras digressões que permeiam a narrativa: "O senhor ache e não ache. Tudo é e não é... Quase todo mais grave criminoso feroz, sempre é muito bom marido, bom filho, bom pai, e é bom-amigo-de-seus-amigos! Sei desses. Só que tem os depois - e Deus junto. Vi muitas nuvens". O que se nota, aqui, é a presença do filosófico e do poético,expresso na antítese e na musicalidade. Nas descrições de personagens a genialidade na utilização da linguagem também se faz presente: "Olhe: um chamado Aleixo, residente a légua do Passo do Pubo, no da Areia, era o homem de maiores ruindades calmas que já se viu", ou "... nunca vi cara de homem fornecida de bruteza e maldade mais, do que nesse. Como que era urco, trouxo de atarracado, reluzia um cru nos olhos pequenos, e armava um queixo de pedra, sobrancelhonas; não demedia nem testa. Não ria, não se riu nem uma vez; mas falando ou calado, a gente via sempre dele algum dente, presa pontuda de guará". Nas descrições de Diadorim encontram-se as mais da vezes uma atmosfera suave, lírica, de requintado lirismo: " Aquilo ia dizendo, e era um menino bonito, claro com a testa alta e os olhos aos-grandes, verdes..."; ou " Mas eu olhava esse menino, com um prazer de companhia, como nunca por ninguém eu não tinha sentido ainda. Achava queele era muito diferente, gostei daquelas finas feições, a voz mesma, muito leve, muito aprazível ..."; 
Tudo vai sendo contado de modo que linguagem regional recriada por Guimarães Rosa, juntamente com a concepção regional e universal do sertanejo e, também, o processo narrativo cujo enredo principal se agrega a pequenas histórias que exploram o ponto de vista psicológico e filosófico das personagens, acaba por criar uma obra em que desfilam, além do narrativo, vários gêneros literários: o lírico, o épico e o dramático; o lírico expresso, sobretudo, no amor e amizade por Diadorim; épico, na figura de Riobaldo e, por fim, dramático na morte de Diadorim. Utilizando esses diferentes gêneros mostram-se diferentes realidades do sertão, com seus diferentes estratos: político, social, geográfico e, vai mais longe, examinam-se o psicológico e o metafísico que habitam o sertão, que na verdade é, também, o universo onde desfilam Deus, o diabo, o amor, a violência, o bem, o mal e a morte.
Atravessa-se o sertão, chega-se ao final do livro como quem chega de longa viagem, de cenários contundentes, de fatos maravilhosos e grandiosos, sensuais. Nessa travessia o tempo vai e volta com toda a liberdade conquistada pelo narrador ao tratar de forma inusitada o jeito de contar as aventuras e as desventuras das personagens que povoam o enredo do livro. Riobaldo conta, no presente, fatos já passados, em tempos idos. ""Conto o que fui e vi, no levantar do dia. Auroras.
Atividade de expressão escrita
1. No vídeo a que você assistiu, alguns professores, escritores, familiares e um narrador em primeira pessoa contam a história da vida de um grande escritor. Grandes escritores fazem parte da vida de leitores. Os alunos devem nesta atividade refletir e escrever sobre suas experiências leitoras. Um autor francês muito famoso, chamado Marcel Proust, elaborou um questionário que pode servir de guia para esta atividade. As perguntas que seguem vão ser disparadoras para a produção de um texto.
1. Qual foi o primeiro texto que você escreveu?
2. Por que o escreveu?
3. Quem leu esse texto?
4. Quais foram os primeiros comentários que você recebeu sobre ele?
5. O que está lendo atualmente?
6. Qual é o seu poema preferido?
7. Que livros você prefere?
8. Quais são seus personagens de ficção favoritos?
9. Como você se sente quando alguém critica seus textos?
10. Quais são as etapas de seu trabalho até chegar no texto definitivo?
11. Que livro você gostaria de Ter escrito?
12. Qual é o seu personagem favorito na História do Brasil?
13. Qual é a sua música favorita?
14. Qual é o principal traço de seu caráter? Você é brincalhão ou meio fechado? Tem força de vontade? É leal com os amigos? Gosta de ajudar os outros?
15. Para que serve um escritor?
2. Guimarães Rosa, quando exercia medicina, fez uma excursão pelo interior de Minas Gerais, anotando informações sobre a flora, a fauna, a gente sertaneja, seus usos, costumes, crenças, linguagens, superstições e canções. O depoimento do Prof. Willi Bolle nos diz: " aqueles elementos todos, cadernetas de viagens, listas de palavras - são elementos subsidiários para entendermos o processo de criação, mas na câmara íntima da criação de Guimarães Rosa, eu acho que ninguém penetrou."
O professor utiliza o questionário e o depoimento citado para começar uma discussão sobre o processo de criação. A filha de Guimarães Rosa deve ser lembrada: " Mas uma vez nós tivemos um papo muito interessante, ele me disse que a inspiração pode ser comparada a um estado de transe." As questões dez e nove são compartilhadas na sala de aula. A atividade deve começar em um pequeno caderno, caderneta, bloquinho ou até mesmo no caderno de Língua Portuguesa.
O aluno anotará durante uma semana palavras novas, cenários por onde passou, a flora, a fauna (se for possível), as pessoas de seu lugar, costumes, crenças, superstições, canções e outras coisas que achar importante. O material é levado para aula compartilhado com os colegas e o aluno produz um texto narrando a história desses dias em que fez anotações; este texto deve ter as características da narrativa: personagens; tempo; espaço; enredo, e o narrador que, nesse caso, será o próprio aluno falando com um interlocutor; o personagem Riobaldo pode servir de modelo. As produções são afixadas no mural da sala. E o professor encerra a discussão do processo de criação com a questão: A inspiração pode ser comparada a um estado de transe? Várias respostas podem aparecer, mas devemos lembrar aos alunos que um texto nunca sai pronto no papel, ele pode até ser resultado de um maravilhoso estado de transe, mas há muito trabalho na produção de um texto, esse processo de reescrita pode ser exemplificado com os manuscritos de Guimarães Rosa que seguem.
Os originais de Guimarães Rosa do Grande Sertão: Veredas, repletos de correções manuscritas devem vir aqui. Eles podem ser encontrados na página 104 do livro: Uma vida entre livros - Reencontros com o tempo, de José Mindlin, Edusp/Companhia das Letras.
3. Guimarães Rosa inventava palavras por composição, derivação ou por adaptação de vocábulos estrangeiros: brumalva ( bruma + alva ); capisquei( entendi, compreedi, do italiano capire); sujeito esmarte ( do inglês smart, esperto). Ou atribuia novos sentidos a palavras usuais por meio da contextualização: "Nosso pai.... decidiu um adeus para gente". Note como o verbo "decidir", nesse contexto, ganha outra dimensão de sentido: "decidir um adeus" é mais definitivo que dar um adeus, como é expressão corrente. Esses eventos são chamados de NEOLOGISMOS 
O professor faz uma oficina de neologismos, na lousa o poema de José Paulo Paes:
Seu metaléxico
Economiopia
Desenvolmentir
Utopiada
Consumidoidos 
patriotários
suicidadãos
( Um por todos. São Paulo, Brasiliense, 1985)
O professor mostra aos alunos que o poeta uniu dois elementos significativos: meta - que significa "reflexão crítica sobre alguma coisa", e "léxico", que significa "palavra", formando uma nova palavra. Com isso, ele apresenta uma reflexão crítica sobre as próprias palavras, formando uma nova palavra: metaléxico. Os alunos tentam identificar quais foram as outras uniões que o poeta fez ao longo do poema. Depois, criam mensagens com neologismos que pode ou não ser por composição.
a) Grupos de no máximo três alunos, juntos, escolhem um tema qualquer (pode ser político, sentimental, ecológico, do cotidiano, relativo a esportes, etc.)
b) Uma lista com diversas palavras que tenham a ver com o tema escolhido é produzida.
c) O professor mostra, mais uma vez, o recurso utilizado por José Paulo Paes para construir o poema "Seu Metaléxico" e os estudantes começam a agrupar as palavras escolhidas ou a criarem outras para formarem uma que tenha sentido próprio.
d) Com as novas palavras os alunos criam uma mensagem de acordo com o tema escolhido.
Seria interessante nesta atividade que os alunos tivessem acesso ao texto que segue:
CANTADA
Guimarães Rosa
Caso contigo, Carmela,
caso cumpras condição
Cobrarei casa, comida,
cama, cavalo, canção,
carinho, cobres, cachaça,
carnaval camaradão,
casino ( com conta certa)
cerveja, coleira e cão,
chevrolé cinco cilindros,
canja e consideração,
calista, cabeleireiro,
cinema, calefação,
chá, café, confeitaria,
chocolate, chimarrão,
casimira - cinco cortes,
cada compra - comissão,
conforto, comodidades,
cachimbo, calma,...caixão.
Convém-te, cara Carmela?
Cherubim!...Consolação!...
(Caso contrário, cabaças!,
casarei com Conceição.)
Caso contigo, Carmela,
correndo, com coração!...
____________________
Chega. Caceteei? Consola-te: concluí.
Folha de São Paulo, 30 de agosto de 1987.
Quando utilizamos a repetição de fonemas idênticos no início das frases ou versos para reforçar o ritmo do poema, enfatizar a musicalidade do texto ou apenas brincar com palavras estamos utilizando um recurso de linguagem, este efeito é chamado de aliteração. 
Os estudantes procuram na obra de Guimarães Rosa exemplos de aliteração.O professor mostra aos estudantes que esse efeito reforça o ritmo da prosa e da poesia trazendo musicalidade 'a obra do grande escritor. Os alunos escrevem um texto em verso ou em prosa em que ocorra aliteração. O tema deste texto pode ser o amor.
Atividade de expressão oral
Trecho: - Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não , Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser - se viu - ; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiço, esse figurava rindo feito uma pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram - era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri certas risadas... Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir, instantaneamente - depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o sertão ". P. 7
O trecho selecionado pode ser aproveitado para diversas atividades
1. Organizados em grupos, todos os alunos lêem o trecho em voz alta e escolhem entre si um representante que o lerá para a classe. 
2. Os alunos decoram o trecho e o apresentam na sala de aula, em um dia combinado previamente. Se os alunos resistirem a decorar, a atividade pode ser alterada e passam a se apresentar recorrendo ao texto escrito em um papel para dele se auxiliar, não para ler, mas para recorrer a ele somente em caso de necessidade. 
3. Os alunos podem fazer a mesma atividade em grupos. Preparam-se, individualmente, reúnem-se na sala de aula, elaboram a apresentação, combinam os detalhes e, em seguida, mostram a criação para a classe. Nas três atividades pode ser nomeada uma comissão que analisa as apresentações e expõe as conclusões para a classe. Se o professor achar conveniente, a comissão poderá apontar as melhores apresentações.
Para ler mais Guimarães Rosa
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986. 
____ "Céu, inferno" in: Céu, inferno. São Paulo, editora Ática, 1988, pp.10-33.
FARACO, C.E. & MOURA, F.M. Língua e literatura. São Paulo: Ática, 1996. v.3. 
GALVÃO, Walnice Nogueira. Folha explica: Guimarães Rosa. São Paulo, Editora Folha de São Paulo, 2001.
HOLZEMAYR, Rosenfield Kathrin. Grande Sertão: Veredas. São Paulo: Ática, 1996. (Roteiro de Leitura). 
MACEDO, Tânia. Guimarãres Rosa. São Paulo: Ática, 1996. (Ponto por Ponto). 
PASSOS, Cleusa Rios. Guimarães Rosa: do feminino e suas histórias. São Paulo, Hucitec, 2000. 
PASTA JR., José Antônio. "O romance de Rosa - temas do Grande Sertão e do Brasil". In: Novos estudos CEBRAP n° 55. São Paulo, novembro de 1999.
PEREZ, Renard. Em Memória de João Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968. 
ROSA, Vilma Guimarães. Relembramentos, Guimarães Rosa, meu pai. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983. 
SANTO, Wendel. A construção do romance em Guimarães Rosa. São Paulo: Ática, 1996. 
SCHWARZ, Roberto. " Grande-Sertão: a fala" in: A sereia e o desconfiado. Rio Janeiro, Paz e Terra, 2ª ed., 1981, pp. 37-43.
____. " Grande-Sertão e Dr. Faustus" in: A sereia e o desconfiado. Rio Janeiro, Paz e Terra, 2ª ed., 1981, pp. 43-53.
SPERBER, Suzi Frankl. Guimarães Rosa: signo e sentimento. São Paulo: Ática, 1996. (Ensaio). 
ZILBERMAN, R. A Leitura e o ensino da literatura. São Paulo: Contexto, 1989. 
Materiais disponíveis na Videoteca :
 " Guimarães Rosa : O Mágico do Reino das Palavras " / documentário (2002) 	30’ Fita 04
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
 " Grande Sertão : Veredas " / filme (1970) 						90’ 	Fita 04
Da obra homônima. 
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Lima Barreto: Um grito brasileiro(1881-1922)
Ângela Carvalho e Jorge Ribeiro
"A vida é uma comédia sem sentido...
Uma história de sangue e de poeira
Um deserto sem luz..." 				Triste Fim de Policarpo Quaresma
 Apresentação
O triste fim de Policarpo Quaresma
Elementos da narrativa
Atividade de expressão escrita
Atividade de expressão oral
Interdisciplinaridade
Para ler
Apresentação do autor 
Afonso Henriques de Lima Barreto nasceu em 13 de maio de 1881, era filho de um tipógrafo da Imprensa nacional e de uma professora pública, a quem ele perdeu aos sete anos de idade. Mestiço, foi iniciado nos estudos pela mãe e depois pelas mãos de seu padrinho de batismo, Visconde de Ouro Preto. Como nos informa a fita de vídeo, já na abertura: “Esta é a história de um menino mulato, neto de escravos, a história de um jovem inteligente e pobre que viu o pai enlouquecer e, para cuidar da família, teve que abandonar os seus estudos. A vida de um homem que escreveria, denunciando os absurdos de uma sociedade injusta, autor de Triste Fim de Policarpo Quaresma, incompreendido, considerado louco e que morreu aos 41 anos. Esta é a história de Lima Barreto, um dos grandes mestres da literatura brasileira”.
Segundo a professora de Teoria Literária da UFRJ, Beatriz Resende: “Então aquele mulato, um mulato escuro, dos cabelos arrepiados, ele entra numa escola de engenharia, ele entra na Politécnica, como se chamava naquele momento”, mas o plano de Lima Barreto de se tornar engenheiro é destruído quando ele tem de assumir o papel de chefe de família, devido ao enlouquecimento do pai. A fita nos informa: “Começa uma fase tenebrosa na vida do escritor. Na madrugada de 15 de agosto de 1902, o pai do escritor irá enlouquecer, tendo que abandonar os estudos na Politécnica”. 1897 – “O Lima estudante já está se movimentando, já está interessado no jornalismo, já está namorando essa idéia de atuar escrevendo, de uma forma até mais facilmente divulgada”. Observemos as palavras da Professora Beatriz: “Talvez para nós, hoje, leitores, isso tenha sido um benefício, porque não tivemos o engenheiro Lima Barreto, mas tivemos o escritor Lima Barreto”.
Com o modesto emprego na Secretaria da Guerra e tendo o encargo de arrimo, Lima Barreto inicia, em 1904, a primeira versão de Clara dos Anjos, o seu primeiro romance. Palavras de Afonso Carlos Marques dos Santos, Historiador e professor da UFRJ, na fita de vídeo:
“Ele guardou uma memória familiar, dramática do golpe do 15 de novembro de 1889, da ditadura militar que se segue especialmente no duríssimo governo de Floriano Peixoto...”
Dono de um talento inegável, os seus livros foram bem acolhidos pela crítica literária da época, a qual creditava a ele o título de sucessor de Machado de Assis. Com O triste fim de Policarpo Quaresma, Lima Barreto atinge grande notoriedade, o que, possivelmente, animou sua intenção em candidatar-se a uma vaga na Academia Brasileira de Letras. A fita de vídeo nos informa: “O Lima então começa a publicar o primeiro trabalho que só recentemente foi reconstituído, é uma série de reportagens que ele escreve para o jornal carioca Correio da Manhã e é uma série de reportagens sobre os primeiros movimentos de demolição do Morro do Castelo... enfeia a cidade, a cidade não deve ter esse ar tão tropical...” Palavras de Lima Barreto: “Remodelar o rio, mas como? Arrasando morros?” E, em seguida, no vídeo, palavras do professor Afonso Carlos M. dos Santos: “A relação de Lima Barreto com a cidade do Rio de Janeiro é uma relação visceral, ... ele vivia a cidade assim como a cidade vivia dentro dele e, nesse sentido, a cidade é uma espécie de laboratório para pensar o Brasil, e a cidade e também um objeto duma reflexão profunda sobre a sociedade brasileira de seu tempo, sobre uma sociedade republicana... é assim que ele vai cunhar uma expressão botafogano para identificar aqueles que, mesmo nascendo no rio de Janeiro, viviam com a cabeça em Paris”. Em seguida, afirma a professora Beatriz: “... seus primeiros romances que ele escreve ao mesmo tempo ... Vida e morte de M. J. Gonzaga de Sá e o Recordações do Escrivão Isaías caminha... e aí está ogrande problema, o Recordações é a história de um jovem aspirante a jornalista que trabalha em um jornal e o Lima cria, então, uma série de personagens que todo mundo facilmente reconhece. O diretor do jornal que é o Loberã é, na verdade, Edmundo Bittencourt... diretor do jornal Correio da Manhã. Mas, enfim, quando o romance vai a público, Edmundo Bittencourt fica absolutamente enfurecido com a crítica que sofre no romance e decreta que o jornal, que era muito forte naquele momento, nunca mencione o nome de Lima Barreto. Isso vai fazer com que a imprensa um pouco se feche contra esse jovem escritor que, se tivesse tido uma recepção favorável, já faria sucesso imediatamente. Mas Lima continua escrevendo... e em seguida vai escrever o seu grande romance...”
Possivelmente, os inúmeros problemas com o alcoolismo, o tom extremamente crítico de seus textos somados à mestiçagem tenha, de algum modo, pesado na desconsideração de sua candidatura a ABL por boa parte dos acadêmicos. O caso de Lima Barreto com a Academia estendeu-se por algum tempo, uma vez que ele lhe pleiteou mais duas vezes, e sem sucesso, uma vaga.
Observemos o que nos informa a fita de vídeo com as palavras da Professora Beatriz de Resende: “A gente tem cuidado, a gente não gosta de dizer que existe racismo no Brasil, embora a gente sabe que existe e continua existindo, a principal barreira que o Lima encontra nesse momento é o racismo, é o conservadorismo dentro da própria universidade”.
Ao passo que frustravam suas tentativas de ingresso na ABL, Lima Barreto sofreu inúmeras crises nervosas, uma delas responsável pela internação dele em um hospício no final de 1920. Aos problemas nervosos agregavam-se as crises de reumatismo e o vício pela bebida. Todavia, o escritor não interrompeu o seu trabalho, dedicando-se com afinco à produção literária, ainda que muitos de seus escritos tenham sido publicados somente depois de sua morte. Informa-nos a fita: “Exatamente no ano de 1911 é que encontraremos um Lima Barreto já voltado para a questão da bebida; isso será um grande problema durante esse período que seria o período mais útil da vida do escritor que é exatamente quando ele tem trinta anos de idade. Encontraremos Lima Barreto em vários momentos largado pelo meio da rua, totalmente bêbado, entregue à bebida. Disso ele guardará grandes mágoas, porque é o que ele pensa a vida inteira, não devo beber, principalmente em excesso”.
Lima Barreto faleceu miserável no dia um de novembro de 1922 na mesma cidade em que nasceu. O reconhecimento de sua extensa obra cresceu muito durante o século XX, sendo a ela dedicados inúmeros trabalhos e teses acadêmicas. Afirma na fita o ator Paulo José: “Uma vida de sofrimento... terrível ... lamentável, mas que é muito exemplo do que sofre um artista autêntico, num país periférico como o Brasil ... a intransigência, se você não ceder aos modelos estrangeiros, você querer ter um modelo autenticamente nacional, próprio, pode fazer de você um ser execrado, um ser que acaba na solidão e na loucura, Lima Barreto é um caso desses”. Assim somos informados, a seguir, na fita: “Os últimos dias de vida de Lima Barreto foram dias realmente enclausurados, onde a casa foi o abrigo, sem esperança com o futuro, sabendo estar próximo o seu fim ... É aqui, especificamente na rua Major Mascarenhas que o escritor irá morrer”. Segundo o Professor Afonso: “Ele vai simbolicamente morrer, no ano em que o Brasil, teoricamente, estaria entrando na modernidade, do ponto de vista das artes, do ponto de vista da renovação dos critérios artísticos, dos parâmetros; ele morre exatamente em 22”.
O romance: Triste fim de Policarpo Quaresma
O triste fim de Policarpo Quaresma, principal livro de Lima Barreto, tem na vida do funcionário público Policarpo Quaresma, subsecretário no Arsenal de Guerra e conhecido por todos como major Quaresma, o eixo principal da narrativa. O leitor se encontra, desde o início do romance, diante de um personagem amalucado, animado por um misto de ideário nacionalista com uma ética inabalável da sinceridade. Daí o caráter cômico da trajetória de Quaresma. Para ele o Brasil é modelo de perfeição inquestionável, seja pela natureza exuberante do país, seja pela singularidade da cultura produzida em terra pátria. Nesta toada, o Amazonas se torna, sob os olhos do major, o maior rio do mundo, mesmo que para chegar a essa conclusão Quaresma tenha suprimido alguns metros do Nilo. Do mesmo modo, o violão, instrumento marginalizado na época, é eleito o símbolo máximo de nossa cultura. 
Os problemas surgem quando tais idéias são defendidas no âmbito público por Quaresma, o que leva o major ao centro de um amplo movimento de difamação animado por seus pares. A idéia mais esdrúxula do major, a adoção do tupi-guarani como língua pátria, provoca a suspensão de seus afazeres no Arsenal de Guerra e uma internação, por alguns meses, em um hospício. O processo resulta na aposentadoria de Quaresma.
Desiludido, o major se muda para um sítio acompanhado da irmã Adelaide. Dele pretende tirar o sustento de sua família e, também, desenvolver um projeto agrícola para o Brasil. Despende muito dinheiro na compra de livros e instrumentos para a lavoura. No entanto, vê o seu plano ruir quando não compactua com os interesses dos coronéis da região, o que acaba por tornar o seu sítio alvo de multas indevidas. A incapacidade de vender toda a safra de seu sítio se soma à hostilidade dos vizinhos de Quaresma como fator de derrocada do seu projeto agrícola, o qual recebe o golpe de misericórdia com a praga de saúvas que invade as plantações do seu sítio.
Quando os problemas parecem sem solução, explode no Rio de Janeiro a revolta da Armada. O major deixa a irmã no sítio e vai combater ao lado de Floriano Peixoto. Surpreende-se com o fato do Marechal ter tomado conhecimento do seu projeto agrícola, o que reforça o sentimento guerreiro de Quaresma, honrado por lutar ao lado do grande marechal. Infelizmente, o major Quaresma é ferido em batalha, e vê-se obrigado a convalescer no hospital. Durante o processo de recuperação, ele questiona os motivos daquela batalha e deseja voltar para junto de sua irmã em seu sítio. 
Os planos de Quaresma sofrem um revés quando ele, após o fim da revolta da Aramada, é designado para exercer o cargo de carcereiro da Ilha das Enxadas, prisão dos marinheiros insurgentes. Impressionado com as arbitrariedades existentes na cadeia, Quaresma escreve a Floriano para denunciar as atrocidades cometidas no cárcere. A reação do Marechal é imediata: o major é preso como traidor e conduzido à Ilha das Cobras, onde é condenado à morte. E este será o triste fim de Policarpo Quaresma. Palavras do professor Afonso C. M. dos Santos: “O Lima Barreto é um dos autores que vive o Brasil com drama, como vários da geração viveram, mas nele isso se dá de forma aguda e ele quase que cria o grande personagem da literatura brasileira, da abertura do século XX. O Policarpo Quaresma, ele expressa a crítica à República, naquilo que para o Lima decepcionava, quem havia acreditado no projeto civilizatório da República, e ele tem no Policarpo esse personagem síntese que enlouquece de amor pelo país. Essa é uma imagem que fica muito forte”.
Referindo-se ao romance Triste Fim de Policarpo Quaresma, afirma Maria Tereza Arruda Campos – editora e consultora em educação: “... a gente pode dividir em três partes. Aliás a obra está dividida em três partes: a primeira o Policarpo se dedica ao projeto cultural, ele faz lá uma petição propondo que se adote no Brasil a Língua Tupi-Guarani que ele considera a verdadeira expressão nacional”. “Na Segunda parte, há um projeto agrícola... onde ele vai... provar que a terra brasileira tudo dá e que é uma questão de método, uma questão de dedicação...” “... e a última parte há um projeto político, dessa terceira parte do livro, uma das coisas mais importantes é o documento que ele escreve... leva ao Marechal Floriano Peixoto... sugestão muito detalhada e na qual ele se empenhou demais, é oque fazer para o Brasil dar certo, e é uma pergunta que a gente até hoje se faz: o que fazer para o Brasil dar certo?”
Importante observar, na fita de vídeo, o depoimento de Paulo José, ator: “... até o século XVIII ... não se falava o português no Brasil, falava-se o Nhengatu, que é a língua geral, a língua tupi-guarani, o marquês de Pombal é que começou a proibir que se ensinasse nas escolas o Nhengatu... Tupi-guarani misturado com palavras portuguesas... então o Policarpo não era tão maluco assim... durante três séculos foi a língua oficial do Brasil”.
Sobre Policarpo Quaresma, em seu depoimento na fita de vídeo, Nicolau Sevecenco – Professor de História da Cultura – USP, afirma: “Ele acaba sendo vítima dos seus próprios sonhos, como seus sonhos eram imensamente generosos, a mensagem que o livro transmite é de como essa República brasileira traiu suas promessas, como ela abortou os desejos e aspirações que ela trouxe consigo e acabou construindo uma realidade que é o inverso daquilo que ela propunha ... e como essa sociedade profundamente injusta e desigual ainda prevalece, ele talvez tenha sido i primeiro homem a fazer ecoar de forma profunda esse sentimento enorme de justiça”. Mais adiante, complementa Maria T. ª Campos: “... chama muito a atenção ... a atualidade dessa obra, não só em termo da linguagem, ele escrevia numa linguagem bastante acessível, bastante próxima até da oralidade, linguagem pela qual ele foi muito criticado pelos seus pares intelectuais da época, ... não só por essa linguagem, mas também pelo modo como ele trata esses temas; a questão do preconceito, a questão da mulher, do preconceito contra a mulher, temas como ecologia, a desfiguração da paisagem urbana, acho que a gente até pode ir além, porque muitos problemas do Brasil, daquela época, que ele critica ... permanecem absolutamente atuais”.
Os elementos da narrativa em Triste Fim de Policarpo Quaresma
O que se pode notar em Triste Fim de Policarpo Quaresma, na configuração dos elementos da narrativa é a presença predominante da ironia e as impertinências contidas na figura central do romance, Quaresma, alegando que o tupi, por ser a língua nativa brasileira proporcionaria melhor adaptação ao nosso aparelho fonador. Além disso, segundo ele, os portugueses são os donos da língua e, para alterá-la teríamos de pedir licença a eles. O narrador é solidário com sua personagem pois não deixa de criticar os que zombam de Quaresma. No livro, encontramos ora um Quaresma, entusiasmado, apaixonado pelo Brasil, ora um Quaresma desiludido, amargo, diante da ingratidão do país para com seus bons objetivos. Nesse ponto, o que vemos é um personagem condenado à solidão, já que seus ideais batem de frente com os interesses políticos e com o capital estrangeiro.
Desse modo, temos o personagem central vivendo três momentos na obra: valorizando as coisas da terra – a história, a geografia, a literatura, o folclore; no sítio do sossego a frustrada busca de uma solução para o problema agrário, o que faz o romance se vestir de uma profunda atualidade; finalmente, o envolvimento na Revolta da Armada, o que acaba lhe custando a vida. Afirma Maria Tereza A Campos na fita: “... Floriano entrou em guerra, mas ele começa a ver as atrocidades que são cometidas contra vária pessoas e começa a querer denunciar essas atrocidades... e acaba sendo preso e morto pela própria ordem que ele ajudou a defender”. 
O leitor com essa obra prima de Lima Barreto tem a oportunidade de ler um pouco da história do Brasil, através de um enredo que envolve e de personagens muito verdadeiros, reais. 
Para que possamos observar a linguagem de Lima Barreto, observemos as linhas iniciais do romance: “Com de hábito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma, bateu em casa às quatro e quinze da tarde. Havia mais de vinte anos que isso acontecia. Saindo do Arsenal de Guerra, onde era subsecretário, bongava pelas confeitarias algumas frutas, comprava um queijo, às vezes, e sempre o pão de padaria francesa.” O que se nota é a acessibilidade da linguagem, é um primeira caracterização de Quaresma e sua longa amizade com o narrador, visto que há tantos anos é visitado por ele. “Vestia-se sempre de fraque preto, azul, ou de cinza, de pano listrado, mas sempre de fraque, e era raro que não se cobrisse com uma cartola de abas curtas e muito alta, feita segundo um figurino antigo de que ele sabia com precisão a época”.
Lima Barreto é um escritor que mostra a paisagem de forma natural e, do mesmo modo os acontecimentos na rua ou as cenas onde ocorrem os encontros domésticos o que aproxima o Triste Fim de Policarpo Quaresma da linguagem da crônica. Vê-se aí a presença do jornalista no romancista, na forma como ele mostra os ambientes, as cenas do cotidiano, os cafés, os jornais e a vida burocrática. Vejamos um dos depoimentos de Beatriz Resende: “Lima Barreto é esse autor que trabalha muito o centro da cidade, onde as coisas estão acontecendo, os cafés, a rua nobre que é a rua do Ouvidor...”; “... ele é também um dos primeiros autores que fala da zona sul da cidade, em crônicas em que ele descreve o Leme, a praia do Leme, o início da praia de Copacabana, que era o ponto final de um bonde que ele pegava na cidade...”; “... então esse homem da cidade que vai andando e vai falando e vai descrevendo e descreve os vestidos das mulheres, os chapéus... Lima Barreto era aquele homem que gostava de andar, como ele dizia, esbodegado, com a roupa suja, maltratada, mas que estava observando as modas, os vestidos, os chapéus, as lojas. Há quem diga, mesmo, que Lima Barreto foi um quase etnólogo, alguém capaz de fazer a etnografia que é isso, a observação da vida e a narrativa dos usos, dos costumes...”; “Esse homem que nunca saiu do Rio de Janeiro tinha em relação à idéia de república, a idéia de paz, a idéia de Pátria, uma concepção muito arrojada, por exemplo, quando ele escreve, durante a Primeira Grande Guerra ... ele já diz ao público os perigos que a idéia da defesa do nacionalismo, da idéia de Pátria pode acarretar, se você joga um país contra o outro”.
Voltando ao Triste Fim de Policarpo Quaresma, romance que já anuncia no título o seu desfecho pouco alegre, apesar do enredo em que os efeitos cômicos estão aliados ao entusiasmo ingênuo do personagem central e ao seu inconformismo e obsessões. Quaresma é um tipo rico em manifestações inusitadas: seus requerimentos pedindo o tupi-guarani como língua oficial, seu jeito de receber chorando as visitas, suas pesquisas folclóricas; tudo procurando despertar o riso no leitor que, no final, presencia sua morte solitária e triste: “ Com tal gente era melhor tê-lo deixado morrer só e heroicamente num ilhéu qualquer, mas levando para o túmulo inteiramente intacto o seu orgulho, a sua doçura, a sua personalidade moral, sem a mácula de um empenho, que diminuísse a injustiça de sua morte, que de algum modo fizesse crer aos algozes que eles tinham direito de matá-lo”. 
Outro personagem que merece especial atenção é Ricardo Coração dos Outros, o seresteiro do subúrbio, que enriquece a narrativa em que se mostra a paixão pela cidade, os bairros distantes, as serenatas e os violões compondo um cenário pitoresco do Rio de Janeiro da época.
A idéia que predomina no conteúdo do livro é o desencontro entre o ideal e o real, mas o protagonista, apesar de idealizador, não é um tipo imóvel, pelo contrário, apresenta variedade de comportamentos o que o torna atraente e sedutor aos olhos dos leitores. “Logo aos dezoito anos quis fazer-se militar; mas a junta de saúde julgou-o incapaz. Desgostou-se, sofreu, mas não maldisse a Pátria. O ministério era liberal, ele se fez conservador e continuou mais do que nunca a amar a terra que o viu nascer. Impossibilitado de evoluir-se sob os dourados do Exército, procurou a administração e dos seus ramos escolheu o militar”. Nessa trecho, podemos observar a caracterização de Quaresma, seus encontros e desencontros, bem como suas qualidades de caráter.
Atividade de expressão escritaO pai do Lima Barreto enlouquece, e o escritor tem de abandonar os estudos na Politécnica”. 1897 – “O Lima estudante já está se movimentando, já está interessado no jornalismo, já está namorando essa idéia de atuar escrevendo, de uma forma até mais facilmente divulgada”. Observemos as palavras da Professora Beatriz: “Talvez para nós, hoje, leitores, isso tenha sido um benefício, porque não tivemos o engenheiro Lima Barreto, mas tivemos o escritor Lima Barreto”.
O texto jornalístico mais importante é a reportagem. O professor deve fazer um levantamento das características do texto jornalístico na lousa:
a) Um relato jornalístico geralmente é narrado em terceira pessoa.
b) Encontramos reportagens em revistas e jornais.
c) Neste tipo texto aparece claramente o predomínio da função informativa da linguagem.
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A reportagem é um texto jornalístico que dá informações sobre um determinado tema. Baseada no testemunho do repórter e nos depoimentos colhidos, é narrada geralmente em terceira pessoa e , ‘as vezes, pode apresentar discurso direto e indireto. As figuras de estilo ou recursos expressivos são pouco freqüentes, mas podem ocorrer.
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Esta atividade será finalizada com a produção de uma reportagem. O professor pede aos alunos para trazerem reportagens encontradas em jornais e revistas para sala de aula. Numa aula de leitura compartilhada os alunos observam em seu material que as informações desta ou daquela reportagem são fruto de uma pesquisa sobre um tema abordado. Outro foco para essa aula é a presença do discurso direto que aparece nos textos jornalísticos entre aspas.
Na última parte do livro Triste Fim de Policarpo Quaresma há um projeto político: “dessa terceira parte do livro, uma das coisas mais importantes é o documento que ele escreve... leva ao Marechal Floriano Peixoto... sugestão muito detalhada e na qual ele se empenhou demais, é o que fazer para o Brasil dar certo, e é uma pergunta que a gente até hoje se faz: o que fazer para o Brasil dar certo?” Esta pergunta deve ser usada nas entrevistas que os estudantes vão fazer para elaborarem suas reportagens.
Os alunos organizam a entrevista da seguinte forma:
Nome: Lúcia
Idade: 10 anos
Ocupação: estudante
O que devemos fazer para o Brasil dar certo? Devemos tirar as crianças pobres da rua.
O professor avalia as entrevistas oralmente. A entrevista é uma ótima fonte de informação na qual a reportagem pode se basear. Quanto mais entrevistados mais rica ficará a reportagem. A fidelidade aos fatos e dados deve ser lembrada. O resultado desta atividade pode ser uma revista com os textos dos alunos. 
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Objetivos e Conceitos estudados:
Saber fazer uma reportagem.
Identificar os elementos conceituais e formais do texto jornalístico.
Discurso direto e indireto.
Executar, resolver e interpretar coesão e coerência textual.
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Atividade de expressão oral
No vídeo o Prof. de História da Cultura –USP Nicolau Servenco comenta o sentimento de justiça de Lima Barreto: “ Ele acaba sendo vítima dos seus próprios sonhos, como seus sonhos eram imensamente generosos a mensagem que o livro (Triste Fim de Policarpo Quaresma) transmite é de como essa República brasileira traiu as promessas, como ela abordou os desejos e aspirações que ela trouxe consigo e acabou construindo uma realidade que é o inverso daquilo que propunha... e como essa sociedade profundamente injusta e desigual ainda prevalece; ele talvez tenha sido o primeiro homem a fazer ecoar de forma profunda esse sentimento enorme de justiça.”
O professor pode levantar uma questão disparadora sobre justiça: Há justiça enquanto existir pobreza? A riqueza e a pobreza são valores que remontam a muito tempo. Em maio de 1920, por exemplo, Lima Barreto publicava no jornal Marginália uma crônica em que tratava do tema, mais especificamente a forma pela qual o dinheiro público é ‘as vezes utilizado de forma condenável. O trecho que segue pode ser transcrito na lousa para os alunos copiarem em seus cadernos ou lido para a classe:
“ Não há dúvida alguma que o Brasil é um país muito rico. Nós nele vivemos, não nos apercebemos bem disso; e até, ao contrário, o supomos muito pobre, pois a toda hora e a todo instante estamos vendo o governo lamentar-se que não faz aquilo por falta de verba. 
Nas ruas da cidade, nas mais centrais até andam pequenos vadios, a cursar a perigosa universidade da calçaria das sarjetas, aos quais o governo não dá destino, não os mete num asilo, num colégio profissional, porque não tem dinheiro. E o Brasil é rico...
Surgem epidemias pasmosas, a matar e a enfermar milhares de pessoas, que vêm mostrar a falta de hospitais na cidade, a má localização dos existentes. Pede-se a construção de outros bem situados e o governo responde que não pode fazer porque não tem verba, não tem dinheiro. E o Brasil é um país rico...”
Marginália, 8/5/1920
(Adaptado de BARRETO, Lima. Crônicas escolhidas. São Paulo, Ática/Folha de São Paulo, 1995. P.59-60)
Em 1920 faltava investimento público para área social, de educação, saúde e segurança. Problema que permanece até nossos dias. O professor pode organizar um debate; os alunos trazem para o debate, transcrito em seus cadernos, um exemplo atual de falta de investimento público que termine com a frase “e o governo responde que não pode fazer porque não tem verba, não tem dinheiro. E o Brasil é um país rico...”
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A repetição é usada como recurso expressivo para destacar um problema, tornando-se importante na estruturação do texto, neste caso, por criticar o mau uso do dinheiro público. 
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O tema central do debate é a justiça, a discussão deve abordar problemas de saúde pública, atendimento a meninos de rua, escolas e outros que os estudantes trouxerem.
Aproveitar a produção dos alunos para organizar um debate para desenvolver a capacidade de argumentação dos alunos. Haverá um crescimento quanto ao sentimento de justiça na medida em que se pensou uma questão social em grupo. O tema proposto envolve questões fundamentais para a formação de um pensamento ético. 
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O DEBATE
1ª os alunos elegem um colega para ser o coordenador(mediador) do debate, que deverá abrir a discussão e apresentar o tema.
2ª cinco alunos serão escolhidos para a função de debatedores, que sentarão lado a lado, de frente para classe(o público), se possível, por trás de uma mesa. Entre eles deve estar o coordenador.
3ª Cada debatedor terá dois minutos para apresentar a sua posição a respeito do tema em discussão:
a) se há justiça no governo;
b) se há atendimento aos meninos de rua;
c) por que ainda há problemas com a saúde pública.
4ª O coordenador estabelece o turno de fala dos debatedores e concede a palavra a cada um deles no momento adequado. Procura saber se têm mais alguma coisa a acrescentar ao que disseram seus companheiros. Sempre intermediados pelo coordenador, os alunos devem expor seu ponto de vista e fazer perguntas a algum(s) debatedor(es).
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Finalize a atividade com uma dissertação, faça um levantamento das argumentações defendidas no debate.
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Objetivos e Conceitos estudados:
Saber fazer uma debate.
Identificar os elementos conceituais e formais do texto dissertativo.
Executar, resolver e interpretar coesão e coerência textual.
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Interdisciplinaridade
Prof. Oldimar Pontes Cardoso
Seqüência didática
1. No início do vídeo, o professor e historiador da UFRJ Afonso Carlos Marques dos Santos diz que Lima Barreto "guardou uma memória familiar dramática do golpe do 15 de novembro de 1889, da ditadura militar que se segue, especialmente, no duríssimo governo de Floriano Peixoto (...)". Solicite a seus alunos que:
Procurem em diferentes livros didáticos descrições dos acontecimentos de 15 de novembro de 1889 e do governo que se segue a ele, registrando todas as versões encontradas em seus cadernos; 
Produzam na lousa uma estatísticas de quantos livros apresentam o governo republicano como uma ditadura militar e quantos não utilizam este conceito para descrevê-lo; 
Levanteminformações para descobrir em qual(is) outro(s) período(s) o Brasil foi governado por ditadura(s) militar(es) e porquê. 
Finalize a atividade com uma aula expositiva que explique aos alunos por que a proclamação da república brasileira pode ser considerada um golpe militar e por que há esta divergência entre os autores sobre o uso do conceito de ditadura militar para descrever o início da república brasileira.
2. A professora de Teoria Literária da UFRJ, Beatriz Resende, diz no vídeo que o primeiro trabalho de Lima Barreto foi "uma série de reportagens (...) para o jornal carioca Correio da Manhã (...) sobre os primeiros movimentos de demolição do Morro do Castelo, (...) que se decide que enfeia a cidade - a cidade não deve ter esse ar tão tropical." Ela está se referindo às reformas implantadas pelo prefeito Pereira Passos na cidade do Rio de Janeiro do início do século 20. Para entender esta referência e contextualizar a obra de Lima Barreto, seus alunos devem:
Levantar informações sobre o governo de Pereira Passos, os motivos que o levaram a realizar tais reformas e como a população do Rio de Janeiro reagiu a elas. 
Produzir um pequeno texto utilizando as informações levantadas para explicar por que no início do século 20 se considerava que "a cidade não deve ter esse ar tão tropical." 
Finalize a atividade com uma aula expositiva sobre a higienização da cidade do Rio de Janeiro realizada no início do século 20, suas conseqüências e controvérsias.
3. A professora de Teoria Literária da UFRJ, Beatriz Resende, diz no vídeo que em seu romance Recordações do escrivão Isaías Caminha, Lima Barreto "cria uma série de personagens que todo mundo facilmente reconhece. O diretor do jornal, que é (o personagem) Loberant, na verdade é Edmundo Bittencourt, (...) diretor do jornal carioca Correio da Manhã. (...) quando o livro vai a público, Edmundo Bittencourt fica absolutamente enfurecido com a crítica que sofre no romance e decreta que o jornal, que era muito forte naquele momento, nunca mencione o livro de Lima Barreto. Isso vai fazer com que a imprensa (...) se feche contra esse jovem escritor que, se tivesse uma recepção favorável, já faria sucesso imediatamente." Passe este trecho do vídeo novamente a seus alunos. A seguir, solicite a eles que:
Procurem em casa ou na biblioteca da escola artigos em jornais e revistas atuais que relatem algum fato ou pessoa que, como Lima Barreto, tenha sido boicotado por algum meio de comunicação. Caso não encontrem nenhum registro escrito de um fato desta natureza, seus alunos podem entrevistar pessoas que os relatem; 
Escutem alguns dos colegas expondo o conteúdos dos artigos ou transcrições de entrevistas trazidos para a sala; 
Selecionem os melhores textos expostos pelos colegas; 
Produzam um texto argumentativo subsidiado pelo conteúdo dos textos selecionados, posicionando-se a respeito do papel da mídia na sociedade. 
Finalize esta atividade realizando uma correção coletiva de um dos textos argumentativos produzidos por seus alunos. Para realizá-la, copie o texto escolhido numa folha de transparência e o projete na parede com a utilização de um retroprojetor. Cabe a você definir se o texto argumentativo escolhido para a correção coletiva deve ser um bom ou ruim e se o aluno que o produziu deve ser identificado.
4. O professor e historiador da UFRJ, Afonso Carlos Marques dos Santos, diz no vídeo que o protagonista do romance de Lima Barreto Triste fim de Policarpo Quaresma "expressa a crítica à República naquilo que (...) decepcionava quem havia acreditado (em seu) projeto civilizatório." Para melhor entender esta questão, reproduza para seus alunos o Manifesto Republicano, que pode ser encontrado em diversos livros didáticos, coletâneas de documentos históricos, ou no site da TV Escola. Em seguida, solicite a seus alunos que leiam este documento histórico. Após a leitura, seus alunos devem:
Elaborar um glossário com os termos desconhecidos fundamentais para o entendimento do manifesto; 
Levantar hipóteses sobre por que o projeto republicano decepcionou alguns de seus seguidores. 
Finalize a atividade com uma aula expositiva sobre os diversos projetos republicanos que surgiram no Brasil após 1870 e como eles concretizaram na chamada República Velha.
Para ler mais sobre Lima Barreto
ASSIS BARBOSA, Vida de Lima Barreto. 2° ed., Rio de Janeiro, Livraria José Olympio, 1959.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986.
COUTINHO, Carlos Nelson. “O significado de Lima Barreto na literatura brasileira” in: Vários Autores, Realismo e anti-realismo na literatura brasileira. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974, pp.1-56.
LINS, Osman. Lima Barreto e o espaço romanesco. São Paulo, Ática, 1976.
MONTENEGRO, Olívio. O romance brasileiro. Rio de Janeiro, José Olympio, 1955. 
PRADO, Antônio Arnoni. Lima Barreto: o crítico e a crise. Rio de Janeiro, Cátedra e Mec, 1976. 
Material disponível na Videoteca
 " Lima Barreto : Um Grito Brasileiro" / documentário (2002) 		30’ 		Fita 10
Produção da TV Escola, que serve de base para este material impresso.
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José Lins do Rego (1901-1957)
DADOS BIBLIOGRÁFICOS
José Lins do Rego Cavalcanti nasceu no município de Pilar, estado da Paraíba, no ano de 1901, e veio a falecer na cidade do Rio de Janeiro no ano de 1957. Criado no engenho Corredor, de propriedade do avô materno, fez os estudos secundários em Itabaiana e na Paraíba (atual João Pessoa), vindo a se formar em Direito no Recife no ano de 1918. Foi também no Recife que veio a conhecer intelectuais como Gilberto Freire, José Américo de Almeida e Olívio Montenegro. Tempos depois conheceria em Maceió dois grandes nomes da literatura de seu tempo: Jorge de Lima e Graciliano Ramos. Exerceu o cargo de promotor público em Manhaçu (MG). Publicava, desde sua tenra juventude, artigos em suplementos literários, passando após algum tempo a escrever romances. Seu primeiro livro foi publicado em 1932: Menino de Engenho, custeado com dinheiro do próprio bolso, e que atingiu enorme repercussão, abrindo caminho para uma série de obras de grande importância em nossa literatura. José Lins do Rego acabou se mudando em 1935 para o Rio de Janeiro, cidade pela qual viveria até a morte. Consagrado como o grande escritor regionalista brasileiro ao lado de Graciliano Ramos, foi nomeado como membro da Academia Brasileira de Letras no ano de 1956.
CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS
Detentora de um profundo lirismo, uma linguagem cheia de vocábulos regionais, dignas de quem conviveu de perto com a região e o povo descrito em sua obra, e uma narrativa com uma forte inspiração na literatura de cordel, dando ênfase à oralidade, a obra de José Lins do Rego tem como alvo a região nordestina brasileira do fim do século XIX e início do século XX, onde são visíveis a decadência da sociedade patriarcal e a transição dos já obsoletos engenhos de cana-de-açúcar para as poderosas usinas.
Neto de um poderoso senhor de engenho, José Lins do Rego conviveu com essa transição econômica e cultural por toda a sua juventude, o que concede à sua obra um tom de biografia que se estende desde o seu primeiro livro: Menino de Engenho. A mecanização que assombra e derruba engenhos da Zona da Mata Nordestina, acabando com engenhos e colocando um fim na mão-de-obra de ex-escravos, é somente uma das facetas da obra do escritor paraibano, que explora e descreve toda a tradição, o folclore e o misticismo daquele povo sofrido, criando personagens muitas vezes inspirados na realidade, como a imagem de seu próprio avô, que deu origem ao imponente Coronel José Paulino.
Criou também tipos inesquecíveis, como a figura quixotesca do Capitão Vitorino em Fogo Morto. Prendendo-se muitas vezes numa análise psicológica de cada personagem, José Lins mostra a família patriarcal, que se torna o próprio retrato do declínio, onde a vida do patrão e de sua mulher submissa consiste em assistir, na maioria das vezes sem reação,o fim do engenho e de suas vidas. Em contraponto, tem-se a vida simples e problemática, o trabalho duro e a miséria dos empregados e moradores do engenho, em sua maioria descendentes de escravos. A convivência entre ricos e pobres é muitas vezes conflituosa, servindo para denunciar a desigualdade social e certas picaretagens políticas. É o que o próprio autor intitulou de ciclo da cana-de-açúcar, encaixando-se nele as seguintes obras: Menino de Engenho, Doidinho, Bangüê, Fogo Morto e Usina.
A figura dos cangaceiros e os árduos combates que estes travavam com a polícia local também estão presentes, denunciando não somente o terror que o cangaço alastrava pela região, às vezes sob a forma de lendas e histórias, como também o abuso de autoridade que a polícia nordestina empregava nas inúmeras buscas que empreendia, fazendo-nos repensar sobre quem eram realmente os bandidos e quem eram os heróis. Apesar do cangaço estar presente em quase toda a sua obra, alguns de seus livros o retratam com maior ênfase. É o chamado ciclo do cangaço, misticismo e seca: onde estão as obras Pedra Bonita e Cangaceiros. 
José Lins do Rego escreveu ainda alguns livros que se poderiam se encaixar perfeitamente nos dois ciclos anteriores, ou em nenhum deles. São as suas chamadas obras independentes: O Moleque Ricardo, Pureza, Riacho Doce, Água-mãe e Eurídice, além de um livro de memórias intitulado Meus Verdes Anos, onde o autor funde fatos comuns de sua infância com lugares e personagens presentes em alguns de seus livros, principalmente de Menino de Engenho, o que nos concede um mistério acerca de sua obra: até onde seus livros descrevem simples lembranças de sua infância, e até onde são criações de sua lírica e profunda imaginação?
PRINCIPAIS OBRAS
Romance
Menino de Engenho (1932); Doidinho (1933); Bangüê (1934); O Moleque Ricardo (1935); Usina (1936); Pureza (1937); Pedra Bonita (1938); Riacho Doce (1939); Água-mãe (1941); Fogo Morto (1943); Eurídice (1947); Cangaceiros (1953).
Memórias
Meus Verdes Anos (1953).
Literatura Infantil
Histórias da Velha Totonha (1936).
Crônicas
Gordos e Magros (1942); Poesia e Vida (1945); Homens, Seres e Coisas (1952); A Casa e o Homem (1954); Presença do Nordeste na Literatura Brasileira (1957); O Vulcão e a Fonte (1958); Dias Idos e Vividos (1981).
FOGO MORTO
A obra é dividida em três partes que se ligam e se completam: 
O mestre José Amaro, O engenho do Seu Lula, e O Capitão Vitorino.
O mestre José Amaro:
É relatada a vida do seleiro José Amaro, homem do sertão que vivia nas terras do Engenho Santa Fé com a família: a mulher Sinhá e a filha. Trabalhando em frente de sua casa, o mestre recebe visitas freqüentes: seu compadre Capitão Vitorino, que os moleques chamavam de "Papa-Rabo" quando este passava com seu burro pelas estradas, o que lhe causava tremenda fúria. Também recebia o negro Passarinho, o cego Torquato, entre outros. Sua vida, na verdade, é marcada pela desilusão e frustração com a vida e com a família. A dor de não ter tido um filho homem para ensinar sua profissão faz com que mestre Amaro convive amargamente com a mulher e com a filha que não consegue se casar e que aos poucos enlouquece. Intimado pelo Coronel Lula, dono do engenho, a deixar suas terras, José Amaro torna-se ainda mais revoltado e fechado dentro de si, tornando difícil o convívio familiar dentro de sua casa. Passa a andar pela noite e, para sua maior tristeza, começa a ser chamado de lobisomem pelo povo. Vê na figura do cangaceiro Antônio Silvino a solução e a salvação dos oprimidos como ele, e resolve ajudá-lo.
O Engenho do Seu Lula:
Essa segunda parte nos remete ao passado e nos conta sobre a formação do Engenho Santa Fé. Desbravado pelo Capitão Tomás Cabral de Melo, o engenho viveu seu apogeu durante toda a sua vida. Casado com uma mulher de nome Mariquinha, Capitão Tomás teve duas filhas: Amélia e Olívia. A primeira casou-se com Luís César de Holanda Chacon, o Seu Lula, enquanto Olívia enlouquecera. Após a morte do Capitão Tomás, o engenho entrou em decadência nas mãos do genro, que aos poucos empobrece e vai se tornando cada vez mais doente e imprestável, como o próprio negócio que nunca soube cuidar.
O Capitão Vitorino:
A terceira parte da obra começa com as constantes brigas entre Antônio Silvino e seus cangaceiros contra as tropas do Tenente Maurício. Seu Lula dá um ultimato a José Amaro, para que esse deixe logo suas terras. Surge imponentemente a figura do Capitão Vitorino, compadre de José Amaro, uma espécie de herói à moda de Don Quixote, que tem fortes interesses políticos e se põe nas causas nos oprimidos. Como Seu Lula não quis ouvir os argumentos de Vitorino, a solução de José Amaro foi o auxílio do cangaceiro Antônio Silvino. Sem a filha, que fora para o hospício, e sem a mulher, que o abandonara, só lhe resta apoiar e ajudar o cangaço. Os cangaceiros invadem o Engenho Santa Fé e a permanência de José Amaro é assegurada. O tenente Maurício, na busca incessante por Antônio Silvino, prende José Amaro, maltratando-o e surrando-o. Vitorino tenta salvar seu compadre e acaba preso também, sendo solto pelo seu primo, o Coronel José Paulino.
José Amaro é também solto e volta pra casa, onde acaba se matando com uma faca, enquanto o engenho do Santa Fé pára de produzir de vez. Está enfim de "fogo morto". 
MENINO DE ENGENHO
Carlos de Melo, já adulto, relata de uma forma saudosa a sua infância, quando era apenas o menino Carlinhos, que perdeu a mãe, assassinada pelos desvarios do pai, e fora morar no engenho Santa Rosa, de propriedade do avô materno, o Coronel José Paulino.
Criado inicialmente pelos dengos da tia Maria, Carlinhos passava a maior parte do tempo dividido entre o comportamento mais divino, terno e maternal de sua companhia e o convívio mais extrovertido e libertino dos primos, que revelavam a ele uma face mais carnal do engenho, sempre marcada por alguma travessura.
Carlinhos conheceu no engenho do avô um mundo totalmente diferente: desde as desigualdades sociais que moldavam a figura dos empregados e seus conflitos familiares e sociais, até a força da natureza agindo sobre aquela terra tantas vezes castigada. O cangaço também se fazia presente nas lendas e na realidade do engenho, de modo a aguçar a mente do menino a ponto dele mesmo pedir ao cangaceiro Antônio Silvino para segui-lo junto ao bando, quando da visita deste. 
Carlinhos também vai conhecer personagens que marcariam profundamente suas lembranças, como a velha Totonha, com suas histórias, e o negro Passarinho, que vivia cantando bêbado.
Conheceu ali também o amor, primeiramente expresso pela figura pálida e doente da prima Lili, que veio a falecer muito criança. Logo viria uma outra prima do Recife passar alguns dias no engenho, chamada Maria Clara. Menina da cidade e um pouco mais velha que Carlinhos, contava ao menino suas grandes diversões e novidades vistas na cidade, durante os longos passeios pelas terras. Desses passeios, nasceu seu primeiro beijo. Quando a prima voltou para Recife, o menino sentiu na pele a perda da primeira namorada. Logo sentiria a perda da Segunda mãe: o casamento da tia Maria, que o deixaria aos cuidados da austeridade da tia Sinhazinha, mais fria e austera. Austeridade que se torna uma libertinagem maior, quando Carlinhos se inicia e se aprofunda no sexo a ponto de contrair, aos doze anos, gálico. A única saída para tanta rudeza é o colégio, que Carlinhos não tarda a ir, mesmo forçado.
Materiais disponíveis na Videoteca :
 " José Lins do Rêgo " / programa informativo (2001) 		14’ 		Fita 98
Programa da série Sala de Notícias, que apresenta um fato, até então, inédito sobre a vida do escritor .
 " Fogo Morto " / filme (1976) 					88’ 		Fita 98
Da obra homônima.�
João Cabral de Melo Neto (1920-1999)
O POETA E SUA HISTÓRIA
Descendente de tradicionais famílias de Pernambuco e da Paraíba, João Cabral de Melo Neto foi o segundo dos seis filhos de Luiz Antonio Cabral de Melo e de Carmem CarneiroLeão Cabral de Melo.
Nasceu no Recife, capital do Estado de Pernambuco, no dia 9 de janeiro de 1920, mas como seu pai era senhor de engenho, passou parte da infância e adolescência em engenhos de açúcar. Primeiro no Poço do Aleixo, em São Lourenço da Mata, e depois nos engenhos Pacoval e Dois Irmãos, no município de Moreno. A vida no campo marcou profundamente o poeta. 
Apesar da vivência nos grandes centros, Cabral nunca se adaptou à cidade grande e à agitação do mundo urbano, sentindo-se para sempre um homem do interior. Na infância feliz, seu tempo era dividido entre as brincadeiras na casa grande com Virgínio, seu irmão mais velho a quem era muito unido, e os passeios a cavalo pelo canavial. João Cabral era uma criança sensível e, desde pequeno, demostrava preocupação com o ser humano, numa atitude muito singular para sua pouca idade.
Por volta dos oito anos de idade, ele morava com a família em Recife e ía para o engenho no tempo das férias. Seu irmão Virgínio lembrou que, aos domingos, o administrador do engenho ia à feira fazer as compras de mantimentos para a casa. Nestas ocasiões João Cabral dava-lhe dinheiro e encomendava a compra de folhetos de cordel. À tarde ele ia para a moita do engenho e, com os empregados todos ao redor de si, lia três, quatro folhetins para o pessoal do engenho.
O contato com os trabalhadores da usina seria uma experiência fundamental para o poeta pois, mais tarde, na vida adulta, viajando pelo mundo como diplomata, Cabral teria o necessário distanciamento para ver melhor, com preocupação e pungência, a verdadeira realidade do nordeste e retratá-la em sua obra. 
De forma bem humorada o escritor Décio Pignatari definiu assim o poeta João Cabral: "Ele tem um lado popular que se chama João Cabral e tem um lado aristocrático que se chama Melo Neto. Então, ele é, um pouco, todo este universo conflituado e passou quarenta anos tentando resolver este conflito." 
Em 1930, ano da revolução, terminava a Primeira República. Começava a Era Vargas e, por complicações políticas com o presidente Getúlio Vargas, seu pai, Luís Antônio Cabral de Melo, foi obrigado a abandonar o engenho. No Recife, um novo mundo menos acolhedor e tranqüilo se apresentava ao poeta e, apesar das brincadeiras nos trilhos de trem e dos alegres acompanhamentos no corso em época de carnaval, a vida já não era tão feliz. 
Matriculado no colégio Marista onde cursou até o secundário, Cabral sofria profundamente com a severidade do estabelecimento. Criança tímida embora avessa a tudo aquilo, não conseguia se rebelar, desenvolvendo uma personalidade introspectiva, séria e profundamente angustiada. Apesar de toda racionalidade com que sempre enxergou a vida manteve, para sempre, um terrível medo do inferno com suas labaredas, caldeirões e todo aquele mundo tenebroso de culpa e pecado com que os padres costumavam ameaçá-lo. 
No Recife, a visão dos retirantes fugitivos da seca, dos miseráveis habitantes dos manguezais, o contraste entre os casarões e os mocambos construídos dentro da lama, também afetariam o poeta. Uma realidade que mais tarde se transformaria num outro elemento importante de sua poesia participante.
Faleceu no dia 09 de outubro de 1999, no Rio de Janeiro, aos 79 anos.
O POETA, A PAISAGEM E A POESIA
João Cabral se sentia um homem nordestino e como tal dizia: 
"Nenhum nordestino é indiferente ao meio em que vive, em que se criou." 
O universo poético de João Cabral de Melo Neto é, principalmente, o da zona da mata e do sertão nordestino. Sua poesia remete o leitor constantemente às cidades de Olinda e de Recife com seus casarões antigos , seus mares e rios importantes como o Beberibe e o Capibaribe, e aos canaviais da zona da mata pernambucana. Mas também remete para a vegetação escassa da caatinga e à dor do agreste brasileiro. Por isso mesmo, dois de seus livros, "Pedra do sono", de 1942 e "A educação pela pedra", de 1966, trazem no título a idéia de pedra, símbolo da secura sertaneja e do solo pedroso da região. 
"A obra de poetas como João Cabral de Melo Neto exerce um papel na formação e na manutenção da identidade nacional. A obra de João Cabral está indissoluvelmente ligada a esta identidade profunda e verdadeira do nosso país e do nosso povo." Ariano Suassuna - escritor
Por temperamento, apesar de ter vivido em meio à exuberância sonora dos ritmos pernambucanos, João Cabral de Melo Neto foi um poeta não-musical, avesso principalmente à melodia e à musicalidade do verso. Através de rigoroso trabalho de linguagem e construção, a dura poesia de Cabral , feita de "pedras" e a "palo seco", como gostava de dizer, inspira-se na aridez geográfica e humana do sertão para se tornar, também ela, uma poesia seca e exterior. 
Personalidade sensível, obsessiva, angustiada e fascinante. O poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto recebeu inúmeros prêmios literários importantes como o New Stadium International Prize, em 1992, nos Estados Unidos e na Espanha, em 1994, o prêmio Rainha Sofia de Poesia pelo conjunto de sua obra. Além disso João Cabral foi, durante vários anos, um dos fortes candidatos ao Nobel de Literatura, mas estes fatos não abalaram ou comoveram o escritor que não acreditava em vitórias literárias.
Coerente com sua idéias, João Cabral não gostava de dar entrevistas e receber homenagens. Em 1968, quando sua original poesia ainda provocava impacto nos meios literários, o sempre polêmico Cabral, num depoimento para o disco " Cabral por ele mesmo", chegou a afirmar que se considerava um marginal da poesia luso-brasileira ao definir-se como poeta.
Nos últimos anos de sua vida ele estava quase cego (o que o impedia de ler e escrever ) e enfrentava muitos problemas de saúde. Mesmo assim o poeta continuava com grande vitalidade intelectual. Exigente e corajoso, nunca se sentia plenamente satisfeito como criador. Considerava que sua obra estava ainda em processo. Poesia é risco, costumava avaliar.
POESIA CONCRETA E VISUAL
A poesia de João Cabral de Melo Neto é um marco dentro da literatura brasileira. Sua obra desencadeia uma revolução formal das mais importantes na história da poesia do nosso país e representa a maturidade das conquistas estéticas mais radicais do século XX.
Opondo-se ao principal curso da poética nacional que sempre fora sentimental, retórica, ornamental, João Cabral de Melo Neto constrói uma poesia não-lírica, não-confessional, presa à realidade e dirigida ao intelecto. Apesar de pertencer cronologicamente à geração de 45, formada por nomes como Péricles da Silva Ramos, Geraldo Vidigal, Ciro Pimentel e outros, Cabral não se enquadra esteticamente nesta geração. A geração de 45 propunha um retorno às formas tradicionais do verso, como o soneto, e negava o experimentalismo dos modernistas de 1922. João Cabral é tido como o único poeta da geração de 45 que influencia a forte geração posterior, formada pela vanguarda brasileira dos anos 50 e 60 sobretudo a vanguarda concreta. 
"Pode-se dizer que ele não tem antecedentes na poesia brasileira, a obra dele tem conseqüentes. Porque é a poesia concreta que vai manter, continuar, expandir e levar para outros caminhos essa linhagem de uma poesia não sentimental, de uma poesia objetiva, uma poesia de concretude, uma poesia crítica, como é a poesia de João." 
Augusto de Campos, poeta e ensaísta
A este respeito disse João Cabral:
"A poesia concreta é muito mais visual do que auditiva e talvez resida aí a possível influência minha sobre ela. A poesia concreta é muito interessante e não precisava de mim pra ser o que ela é." 
A poesia concreta brasileira interessou a muita gente e não só no Brasil. Em 1966 houve na Bélgica um importante festival de poesia e, segundo o próprio João Cabral que estava lá a serviço do Itamaraty, o assunto principal, em discussão no festival, foi a poesia concreta no Brasil. 
Em 50 anos de intensa atividade literária, João Cabral de Melo Neto publicou 18 livros de poemas e 2 autos dramáticos "Morte e Vida Severina" e "Auto do Frade". 
Poeta dorigor, não existe em sua obra "o livro mais importante" mas sim um conjunto de poemas fundamentais da literatura brasileira. Em prosa, Cabral sempre escreveu pouco, seu ensaio mais significativo foi Joan Miró sobre o pintor espanhol, publicado em Barcelona em 1950, com ilustrações do próprio Miró.
A poesia de João Cabral de Melo Neto pode ser dividida em dois módulos distintos, propostos pelo próprio poeta ao publicar o livro Duas Águas, de 1956. Uma água construtiva e outra participante.
A primeira água seria formada pelos poemas experimentais, arquitetônicos, feitos para poetas e que versam sobre o próprio fazer poético.
A água participante volta-se para a problemática social do homem do nordeste e é formada por obras como "O cão sem plumas" e "O rio" que são poemas longos sobre os miseráveis habitantes dos manguezais do rio Capibaribe. Apesar do mesmo rigor estético das obras construtivistas, atingem com mais facilidade o leitor comum, pois lidam com problemas universais do ser humano: a fome, a miséria, as diferenças sociais. 
O escritor e ensaísta Décio Pignatari não concorda com esta divisão. 
"Eu acho que é reducionista e prejudica o entendimento da obra de João Cabral. O pessoal da Academia de Letras e os acadêmicos da Universidade se contentam com esta divisão e acham que ela explica tudo. Mas não é bem assim. João Cabral sustenta uma enorme crise, um debate que nunca se resolve, entre a obra de arte em si e a obra de arte enquanto instrumento de melhoramento e aperfeiçoamento social. Ele mantém esta contradição constantemente, e isto impregna toda a obra dele. O conflito é rico e é muito mais entranhado."
A poesia de João Cabral de Mello Neto é difícil para o grande público porque não dialoga apenas com o leitor comum mas, também com os realizadores de poesia. A principal temática de Cabral é a reflexão do próprio fazer poético. Sua poesia é auto-explicativa e ninguém melhor do que ele mesmo, através de sua obra, se analisou. 
Em sintonia com a corrente evolutiva da melhor literatura contemporânea parte da poesia de Cabral reflete uma postura crítica sobre o ato de escrever e são descrições ou mesmo reflexões, quase sempre indiretas, sobre o fazer literário de outros escritores como a americana Marianne More , o português Cesário Verde, os franceses Beaudelaire, Paul Valéry e Mallarmé. 
Para o poeta Haroldo de Campos sempre existiram poetas críticos importantes na literatura mundial como Dante, Fernando Pessoa e Goethe. O romantismo alemão produziu um grande número de poetas críticos e Goethe é seu maior representante. Mas, exitem também os importantíssimos poetas críticos de língua inglesa como Colleridge, T.S.Elliot e Ezra Pound. O escritor russo Boris Pasternak ( Prêmio Nobel de Literatura em 1958 - "Dr. Givago" ) e Otávio Paz, que o poeta Haroldo de Campos considera "o grande poeta crítico na América Latina", são outros exemplos.
João Cabral de Mello Neto é um poeta construtivista, ligado por temperamento às formas visuais de expressão fato que o levou a, desde cedo, se interessar pela arquitetura e pelas artes plásticas. Ele valoriza a forma visual dos poemas, a geometrização. Propõe para a poesia um verso construído, desmistificando o ato de "criar com inspiração".
Sua poesia dialoga com artistas plásticos contemporâneos como Mondrian ou Juan Miró e tem afinidade com os cubistas. Além das influências literárias, seus poemas são inspirados nas teorias arquitetônicas de Le Corbusier e nas estruturas das artes plásticas construtivas. Seus poemas são trabalhados em blocos ou "quadras-blocos" que funcionam como os retângulos de um quadro de Mondrian.
Em geral os poetas só começam a pensar na publicação de um livro após terem escrito um certo número de poemas. João Cabral procedia de maneira diferente. Ele planejava seus livros antes mesmo de começar a escrever e sabia, exatamente, como queria editá-los; assim, ele determinava o formato e o número de poemas que seriam publicados em cada um de seus livros. O próprio poeta afirmava que se impunha todas essas dificuldades para que o livro e os poemas crescessem paralelamente. João Cabral costumava dizer que o livro não é um depósito de poemas e, portanto, deveria ser concebido como uma estrutura total, uma macroestrutura. 
Seu livro "A Educação pela Pedra" de 1966, é dividido em 4 partes: a, A, b e B . Nas partes minúsculas os poemas são curtos e nas partes maiúsculas os poemas são longos. Os temas dos poemas também são distribuídos conforme as letras. Esta maneira de organizar os poemas pode exemplificar a preocupação do poeta com um livro cuidadosamente projetado. 
AMBIENTE CULTURAL E AS PRIMEIRAS POESIAS
Apesar de ser primo, pelo lado paterno, do poeta Manoel Bandeira e, pelo lado materno, do escritor e sociólogo Gilberto Freire, até os 15 anos de idade Cabral não havia demonstrado interesse pela literatura mas, sim por futebol. Em 1935 jogava pelo juvenil do América, seu time de devoção. Depois tornou-se campeão pernambucano ao participar do Campeonato Juvenil pelo Santa Cruz.
O interesse pela poesia só viria em 1936 quando descobre uma antologia de poetas modernos e entra em contato com os poemas de Manoel Bandeira, Jorge de Lima e Carlos Drummond de Andrade. 
Os anos trinta foram de especial importância para a literatura brasileira e caracterizou-se pela literatura regionalista de Graciliano Ramos e João Guimarães Rosa e pela poesia de Cecília Meirelles e do mineiro Carlos Drummond de Andrade. O movimento modernista de 1922, que se insurgiu contra o parnasianismo, criou espaço para o aparecimento desta importante geração de escritores. Quem se iniciava na literatura na década de 30 tratava de assimilar a melhor contribuição que os poetas e escritores da geração de 30 traziam e, a partir dali, buscar seus próprios caminhos. 
E foi esse o percurso de João Cabral. Através da poesia abre-se para ele todo o universo da arte em que ele mergulha decididamente, transformando-se num grande intelectual.
Em 1938, em Recife havia um grupo de intelectuais interessados em literatura e foi com eles que Cabral primeiro dialogou. Uma roda literária que circulava no Café Lafaiete e se reunia em torno de Ville Levy e do pintor Vicente do Rego Monteiro.Ville Levy dava especial atenção aos surrealistas e incentivava os jovens escritores para que lessem novos autores principalmente os franceses. 
Cabral, então, começa a se influenciar pela poesia de Beaudelaire e Mallarmé. Mas foram os ensaios críticos de arquitetura, de Paul Valéry, que mais influenciaram o pensador e intelectual João Cabral de Melo Neto. Nessa mesma época foi construída a primeira grande obra cívica da arquitetura moderna brasileira, que é o prédio do Ministério da Educação, de Le Corbusier, Niemayer, dos irmãos Roberto e Lúcio Costa com quem, finalmente, nós o Brasil ingressava na arquitetura moderna e João Cabral esteve inserido nesse clima.
João Cabral era um autodidata e não se animou a fazer nenhum curso superior. Começou a trabalhar. Surgem os sintomas de uma forte dor de cabeça, celebrizada em versos (Num monumento à aspirina) e que o acompanharia ao longo da vida, fragilizando sua saúde. Num período de hospitalização Cabral intensificou seu interesse pela poesia; datam dessa época seus primeiros poemas. 
"João começou a escrever por volta de mil novecentos e trinta e poucos, mas trancava tudo nas gavetas. Ele só ia escrevendo e trancando. Ninguém via nada. Em 1940 nós fomos passar umas férias no Rio de Janeiro e ele mostrou as poesias dele a Murilo Mendes que escreveu, no Jornal do Brasil, um artigo sobre o poeta de 20 anos. Eu li essa notícia e como eu era meio bisbilhoteiro e além de bisbilhoteiro eu era o primogênito, criado dentro daquele regime do norte em que o primogênito tem uma certa ascendência sobre os demais, eu procurei descobrir onde é que João guardava esses escritos. Descobri, tirei e mostrei a papai. Papai gostou e procurou a Empresa Gráfica Brasileira que era a melhor tipografia que tinha naquele tempo,aqui em Recife, e assim nasceu Pedra do Sono." 
Virnílio Cabral de Melo
Essa viagem para o Rio de Janeiro foi um marco na vida de João Cabral. Ele foi apresentado, por Murilo Mendes, a Carlos Drummond de Andrade e ao círculo de intelectuais que se reunia no consultório do médico e escritor Jorge de Lima. Influenciado pelo humor amargo de Drummond em sua primeira fase e pela poesia imagética de Murilo Mendes, Cabral estreou na poesia com Pedra do Sono, um livro com influências surrealistas. Nesse mesmo ano de 1942 o poeta mudou-se para o Rio de Janeiro e começou a escrever "O Engenheiro" onde radicalizava seus processos construtivistas negando definitivamente o surrealismo e o subjetivismo. 
"Eu era muito amigo de Joaquim Cardozo que era o calculista de cimento armado de Oscar Niemayer e tudo isso me encorajou muito a levar a poesia pra esse lado arquitetônico."
João Cabral de Melo Neto
A vida no Rio transcorreu intensa. Cabral freqüentava os intelectuais que se reuniam no Café Amarelinho e no Café Vermelhinho no centro da cidade. Publicou, nesta época, Os três mal amados inspirado no poema Quadrilha de Carlos Drummond de Andrade e ficou amigo do poeta Vinicius de Moraes que sempre considerou como seu irmão. Em 1945, prestou concurso para a carreira diplomática para a qual foi nomeado em dezembro. Em 1946, Cabral se casou-se com Stela Maria Barbosa de Oliveira com quem teve cinco filhos. Em 1947, em função da carreira diplomática, passou a viver fora do Brasil. 
Curiosamente o primeiro livro importante de João Cabral chama-se O Engenheiro, mas poderia chamar-se o arquiteto pois a influência que teve da arquitetura foi marcante. A descoberta da arquitetura e das teorias de Le Corbusier acontece ainda no Recife por intermédio de um grupo de arquitetos com os quais conviveu.
Quando veio a público, a poesia de Cabral chocava. A secura da linguagem, o rigor construtivo do poeta que não acreditava em inspiração punha em cheque toda uma tradição. Cabral passou então a ser muito combatido pela crítica e pelos escritores de 1945. Acusavam-no de ser um poeta sem alma, que fazia poemas frios, racionalistas, medidos a fita métrica e sem coração. 
Apesar das críticas Cabral se manteve impassível em suas convicções estéticas. Em diversos depoimentos dados à imprensa durante toda a sua vida ele sempre deixou clara a sua posição. 
"A poesia é a linguagem para a sensibilidade. E a prosa é uma linguagem pra razão. São duas maneiras muito categóricas de ver a coisa porque existe uma prosa como a do James Joyce - é uma prosa que é poesia também - e existe uma poesia como a do Carlos Drummond - é uma poesia que também é prosa, Poesia e prosa são dois extremos mas exatamente o poeta e o prosador muitas vezes ganham de jogar em dois lados. O que acontece com muitos poetas é que eles escrevem os poemas e depois poetizam o poema. Eu tenho a impressão de que a poesia é uma forma de expressão diferente da prosa e não é preciso poetizar o poema. O poema bom, o poema verdadeiro já é poético não precisa fazer poético. A poesia é... nós estivemos falando de corrida de touros ... aquele meu poema sobre Manolete termina assim sem perfumar sua flor, sem poetizar seu poema" 	João Cabral de Melo Neto
POETA E DIPLOMATA
João Cabral de Melo Neto viveu quarenta anos no exterior, em diversos e contrastantes países: Espanha, Inglaterra, França, Senegal, Mauritânia, Conacre, Guiné, Equador, Honduras, Portugal... desenvolvendo, lá fora, boa parte de sua obra literária. Na Europa, Cabral ampliou suas impressões do Brasil e nunca se esqueceu de Pernambuco, além de manter contato com intelectuais e artistas brasileiros que o visitavam no exterior ou trocavam correspondência com o poeta. 
Viver na Espanha e conhecer a cultura espanhola fez, curiosamente, o olhar de João Cabral voltar-se para a poesia e o romanceiro popular do Nordeste. Pode-se dizer que ele passou por uma espécie de conversão e não pode fugir da literatura regionalista de sua época cujo último representante foi o escritor Guimarães Rosa. 
De todos os países em que esteve, o mais decisivo para sua vida e obra foi a Espanha. Cabral morou diversas vezes e por longos anos nas cidades de Madri, Barcelona e Sevilha. Nesses períodos aprofundou-se na literatura espanhola desde a leitura de " EL CID " até os poetas contemporâneos. E se deixou fascinar pela região da Andaluzia, elegendo para si a cidade de Sevilha. Além de Recife, Sevilha foi a cidade em que ele mais gostou de viver. Considerava-se regionalista não só em relação a Pernambuco mas, também era regionalista na Espanha. Apesar de ter vivido em Barcelona e Madri, João Cabral considerava-se sevilhano. 
"Há que sevilhizar a vida . 
Há que sevilhizar o mundo." J.C. de Melo Neto 
O contato com a Espanha ampliou o conceito dialético da sofisticada poesia de Cabral. Tensões e encontros: do litoral com o sertão, da Zona da Mata com o agreste, o encontro dos rios Beberibe e Capibaribe, e destes rios com o mar e também de duas cidades de países distintos: Sevilha, na Espanha e Recife, em Pernambuco. Aos poucos, sem abandonar a linhagem profundamente nordestina de seus poemas, Cabral passou a tecer constantes paralelos entre o universo dos engenhos, do mar e do sertão nordestino com a também seca e quente, cigana e exoticamente árabe região da Andaluzia.
O primeiro posto consular de João Cabral de Melo Neto foi em Barcelona em 1947. Lá o poeta tornou-se amigo pessoal de importantes artistas catalãos como os pintores Juan Miró e Antoni Tapis e o escritor e poeta visual Joan Brossa um grupo de intelectuais que se reunia em sua casa, na Calle Montanier, para trocar idéias sobre arte e política.
A Espanha estava vivendo um dos períodos mais difíceis do regime ditatorial do General Francisco Franco e suas fronteiras estavam fechadas. Para os artistas, uma vez que a arte contemporânea era proscrita pelo regime franquista, a convivência com João Cabral significava a possibilidade de estarem em contato com novas idéias e de manterem-se informados sobre o que acontecia no mundo exterior. João Cabral , por sua vez, era um crítico extraordinário e, com sua visão marxista, procurava influenciar este grupo de artistas na produção de uma arte mais humanista e menos apegada às correntes de vanguarda da época como o surrealismo e o dadaísmo.
Em Barcelona, Cabral ampliou suas considerações sobre o livro como suporte instrumental e artístico do poema. Ao lado das artes plásticas, o amor pelas artes gráficas se tornou tão manifesto que o poeta adquiriu uma pequena tipografia artesanal com a qual imprimia livros de poetas brasileiros e espanhóis, além de seus próprios poemas. 
João Cabral era muito cuidadoso e manejava a prensa com grande precisão. Ele chamava estas publicações de " livro inconsútil " . Desta tipografia saíram Psicologia da Composição, de sua autoria, e a primeira edição de Sonetos de Caruixa do espanhol Joan Brossa que, até então, nunca tivera um trabalho seu impresso em livro. O aspecto gráfico da obra de João Cabral, embora não tenha sido bastante destacado, é quase tão importante como a própria poesia porque um complementa a outra. 
Em 1950, Cabral publicou por sua própria editora O Cão sem Plumas e em 1954, O Rio. Nessa época, acusado de comunista e de fazer poemas engajados, foi obrigado a retornar ao Brasil e colocado em disponibilidade não remunerada pelo Itamaraty enquanto respondia a inquérito.
Segundo o próprio João Cabral, foi um acontecimento sem grandes conseqüências e após três anos ele retomou, normalmente, sua carreira diplomática. 
Dando continuidade às suas concepções sobre o livro como suporte da poesia, João Cabral participou de um importante grupo chamado O Gráfico Amador, fundado por Aloísio Magalhães. Era um movimento de artistas pernambucanos, ligados às artes gráficas, que publicavam algumas edições em imprensa manual e apuravam o conceito do livro como um objeto artístico.
Nesta época Cabral lançou Aniki Bobo especialmente para O Gráfico.
João Cabralpermaneceu no Brasil de 1953 até 1956. Neste período, além de Poemas Reunidos, publicou Duas Águas com os inéditos Morte e Vida Severina, Paisagem com Figuras e Uma Faca só Lâmina, obras bastante influenciadas por sua vivência no exterior.
Morte e Vida Severina é uma homenagem às diversas literaturas ibéricas. A obra foi encenada em 1965 no TUCA, teatro da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com direção de Silney Siqueira, adaptação de Roberto Freire, música de Chico Buarque de Holanda e o ator Paulo Autran no elenco. Tornou-se um marco na história do teatro brasileiro. Narra a trajetória do retirante Severino que foge da seca do sertão, em busca de sobrevivência no litoral. No caminho, ao invés da vida que tanto anseia só encontra a morte.
O sucesso da montagem e da música, que foi tema da peça, tornaram João Cabral conhecido do grande público, mas nem por isso assimilado. Sua poesia, altamente intelectualizada, é difícil para o leitor comum, por isso, até hoje, em função da adaptação teatral, "Morte e Vida Severina" é um dos seus trabalhos mais lidos, estudados e encenados.
Em Uma faca só Lâmina Cabral concretiza a trajetória da melhor poesia moderna que é a de permitir várias leituras e interpretações da obra e não aceitar o leitor passivo. 
Paisagem com Figuras é considerado seu momento espanhol. Entre outros poemas sobre a Espanha encontra-se o importante Alguns Toureiros onde mais uma vez Cabral define suas idéias sobre poesia e metapoesia, isto é, uma poesia sobre como deve ser a poesia. 
O poema Pregão Turistico de Recife teve uma edição de 20 exemplares ilustrados pelo O Gráfico Amador. 
INFLUÊNCIAS DE SEVILHA
Em 1956, João Cabral foi novamente removido para Barcelona como Cônsul Adjunto e autorizado a morar em Sevilha para fazer pesquisas no Arquivo das Índias. Foi então que Cabral descobriu definitivamente a cidade. Saiu dos bairros turísticos, dos grandes monumentos que representam uma Sevilha mais aparente e mais exterior e foi para a Sevilha íntima, que não se oferece facilmente. Caminhou por todos os bairros populares como Macarena e Santa Maria la Blanca descobrindo seus becos, tabacarias e praças; participou de tertúlias no bairro taurino de São Bernardo onde sempre via toureiros como os irmãos Pepe Luiz, Antonio e Manolo Vasquez; conheceu bailadores de flamenco do bairro cigano de Triena; fez longos passeios pela Calle Ciertes até La Campana; e passou a traduzir todo esse mundo fascinante em sua poesia. 
Nessa época, Cabral começou a escrever Quaderna onde sua bailadora é comparada aos quatro elementos: a terra, a água, o fogo e o ar , em diferentes estrofes de "Estudos para uma Bailadora Andaluza ".
Seus trabalhos seguintes foram Os Dois Parlamentos e Serial que, ao lado de Quaderna, foram reunidos, em 1961, num livro chamado Terceira Feira.
Em 1968, foi publicada a primeira edição de Poesias Completas e João Cabral é eleito para a Academia Brasileira de Letras na vaga de Assis Chateubriand. 
Em 1975, publicou Museu de Tudo, um livro que reúne poemas diversos. Em 1980, Cabral lançou A Escola das Facas e, em 1985, Agrestes, dedicado a Augusto de Campos, um poeta por quem Cabral teve grande admiração.
" Eu, no livro O Anticrítico, que publiquei logo a seguir, respondi ao João Cabral dedicando a obra a ele com este poema: "Agrestes".
Augusto de Campos 
UM LIRISMO CONTIDO
Em 1987 Cabral publicou Crime na Calle Relator. Em 1990, já aposentado na carreira diplomática como embaixador, publicou Sevilha Andando. Pela primeira vez Cabral escreveu um livro inspirado numa única pessoa, a poeta Marli de Oliveira com quem se casou, em 1986, ao enviuvar do primeiro casamento. 
A partir daí começam a surgir livros que não estão baseados em projetos únicos, detalhados. João Cabral retoma e retrabalha os grandes temas que já estavam presentes em sua obra. O professor ensaísta João Alexandre Barbosa faz a seguinte análise: 
Os poemas de Sevilha Andando repercutem o que já estava em Quaderna, livro produzido na década de 60. Nesse trabalho, pela primeira vez, a mulher e o lirismo amoroso entram na obra de João Cabral e entram sob o domínio da tensão e não pela facilitação. Já em Sevilha Andando, parece ter havido uma pacificação. É como se ele tivesse encontrado a mulher sevilhana que ele havia procurado em livros anteriores. 
Além de Sevilha Andando ele escreveu Andando Sevilha onde de modo novo retoma temas antigos.
Na opinião do escritor e ensaista Décio Pignatari " é preciso compreender o barroco para compreender a Espanha. E isto ajuda a compreender a obra de João Cabral porque ele vai assimilar o barroco enquanto conceito e levar isso ao extremo. Um barroco que tenta resgatar o Homem, assim como o barroco da Espanha tinha de resgatar Deus. Ele fez um esforço extraordinário de tentar juntar a visão marxista, o problema pré industrial do nordeste, a miséria do nordeste, o barroco espanhol... buscando uma solução conceitual do seu poema ". 
"O Homem pra mim é, precisamente, o homem sofredor do Nordeste. O homem que me interessa é o cidadão miserável, do nordeste cujo futuro, menos miserável, 
está ligado ao desenvolvimento do Brasil." João Cabral de Melo Neto 
ENSINAR E APRENDER
1) "Quando veio a público, a poesia de Cabral chocava. A secura da linguagem, o rigor construtivo do poeta que não acreditava em inspiração punha em cheque toda uma tradição. Cabral passou então a ser muito combatido pela crítica e pelos escritores de 1945. Acusavam-no de ser um poeta sem alma que fazia poemas frios, racionalistas, medidos a fita métrica e sem coração." (Trecho do documentário Duas Águas - Direção e roteiro: Cristina Fonseca)
a - Solicite aos alunos que façam uma pesquisa sobre os conceitos de poesia. Sugira livros didáticos, literários, enciclopédias, dicionários, sites, vídeos, filmes etc. Podem ser consultados os seguintes livros:
Bosi, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 
(Cap. 1 - Imagem, Discurso; cap. 2 - O som no signo; cap. 5 - Poesia.Resistência)
Hegel, Georg W. F. Estética: o belo artístico ou ideal. São Paulo:Nova Cultural, 1991.
Paz, Octavio. O arco e a lira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982. (Introdução e cap. 1 - 
O poema).
b - Selecione algumas poesias de João Cabral de Melo Neto e coloque os alunos em contato com o tipo de linguagem e com a construção de poesia desse autor. Por exemplo: "Lição de poesia" do livro O Engenheiro (1945), O Cão sem Plumas (1984) ou "Alguns Toureiros" do livro Paisagens com Figuras (1954).
c - Proponha que comparem os conceitos de poesia com os poemas de João Cabral selecionados e estudados.
2) Tendo em vista a pesquisa empreendida sobre o conceito de imagem na poesia (Bosi, Octavio Paz), propor que os alunos ilustrem alguns poemas tais como: "As Nuvens", "A Bailarina" e "O Engenheiro" do livro O Engenheiro (1945). Sugerir, em seguida, a construção de um mural contendo as ilustrações e o trecho do poema a que dizem respeito.
3) A obra de João Cabral de Melo Neto está profundamente relacionada ao meio geográfico e social do qual provém. Proponha um estudo da biografia e da carreira literária do poeta.
Em sua pesquisa sobre a vida de João Cabral, os alunos devem se deparar com o fato de que ele, como diplomata, morou vários anos na Espanha. Propor, a partir disso, uma comparação entre seus poemas que focalizam o ambiente nordestino e os centrados na paisagem espanhola. Características como o sol tórrido, o solo seco, o toureiro/cabra macho, entre outros, aproximam paisagens aparentemente tão diversas).
4) Considerando a influência da literatura de cordel nordestina sobre a poesia de João Cabral de Melo Neto, propor um estudo que tenha como tema a literatura de cordel, ressaltando seu aspecto social e de registro histórico da vida nordestina.
5) "Em O Rio (1953), ... A voz poética é a do rio, que narra suas experiências históricas e sociais em um tom de "prosa" bem popular".(Campedelli, S.Y.; Abdala Jr., Benjamin. Literatura Comentada)
Após uma análise do poema, resgatando e tentando identificar cada um dos momentos citados durante a narrativa, os alunos deverão escolher outro rio ou até mesmo uma rodovia que passe por diferentes locais (exemplo: rio Tietê, rio São Francisco, rio Itajaí, rodovia Belém-Brasília etc.) e tentar compor um poema que descreva esses locais, semelhantemente ao que fez João Cabral em relação ao rio Capibaribe.
6) Propor a leitura do livro Vidas Secas (1938), de Graciliano Ramos e comparar com o auto Morte e Vida Severina (1965), de João Cabral de Melo Neto, no que diz respeito à linguagem e ao conteúdo.
7) Abaixo foram transcritos dois poemas, um de Manuel Bandeira e outro de João Cabral de Melo Neto. Após a leitura, proponha aos alunos que tentem descobrir semelhanças e diferenças entre eles. Leia-os também em voz alta com os alunos para que percebam a diferença de ritmo entre os poemas. Seria interessante que os alunos atentassem, por exemplo, para o fato de os versos de Bandeira, serem em sua maioria mais longos que os de Cabral. É como se Bandeira se deixasse invadir pelo fluxo das lembranças, enquanto João Cabral parece manter maior distanciamento.
Poesia de Manuel Bandeira
Evocação do Recife
Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois -
           Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A Rua da União onde eu brincava de chicote-queimado e partia as vidraças da casa de Dona Aninha Viegas 
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras, mexericos, namoros, risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:
             Coelho sai!
             Não sai! 
A distância as vozes macias das meninas politonavam:
              Roseira dá-me uma rosa
              Craveiro dá-me um botão
              (Dessas rosas muito rosa
              Terá morrido em botão...)
De repente
               nos longes da noite
um sino
Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era São José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva se ser menino porque não podia ir ver o fogo
Rua da União...
Como eram lindos os nomes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame do Dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
...onde se ia pescar escondido
Capibaribe
-Capibaribe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redomoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras
Novenas
Cavalhadas
Eu me deitei no colo da menina e ela começou a passar a mão nos meus cabelos
Capibaribe
- Capibaribe
Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
           que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
              Ovos frescos e baratos
              Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
              Ao passo que nós
              O que fazemos
              É macaquear
              A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
              Rua da União...
                                        A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
              Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro como a casa de meu avô
(Em Estrela da vida inteira - 1966) 
Poesia de João Cabral de Melo Neto
Volta a Pernambuco 
A Benedito Coutinho
Contemplando a maré baixa
nos mangues do Tijipió
lembro a baía de Dublin
que daqui já me lembrou.
Em meio à bacia negra
desta maré quando em cio,
eis a Albufera, Valência,
onde o Recife me surgiu.
As janelas do cais da Aurora,
olhos compridos, vadios,
incansáveis, como em Chelsea,
vêem rio substituir rio,
e essas várzeas de Tiuma
com seus estendais de cana
vêm devolver-me os trigais
de Guadalajara, Espanha.
Mas as lajes da cidade
não me devolvem só uma,
nem foi uma só cidade
que me lembrou destas ruas.
As cidades se parecem
nas pedras do calçamento
das ruas artérias regando
faces de vário cimento,
por onde iguais procissões
do trabalho, sem andor,
vão levar o seu produto
aos mercados do suor.
Todas lembravam o Recife,
este em todas se situa,
em todas em que é um crime
para o povo estar na rua,
em todas em que esse crime,
traço comum que surpreendo,
pôs nódoas de vida humana
nas pedras do pavimento.
( Em Paisagens com Figuras -1954)
8) Ler o auto Morte e Vida Severina (1965) e fazer relações com o contexto social do nordeste. Proponha também a encenação da peça toda ou parte dela.
9) Abaixo foram transcritos três poemas: um de Carlos Drummond de Andrade, um de Manuel Bandeira e outro de João Cabral de Melo Neto. Leia-os e tente achar pelo menos um elemento em comum.
Poema de Carlos Drummnod de Andrade
Desaparecimento de Luísa Porto
Pede-se a quem souber
do paradeiro de Luísa Porto
avise sua residência
à Rua Santos Óleos, 48.
Previna urgente
solitária mãe enferma
entrevada há longos anos
erma de seus cuidados.
Pede-se a quem avistar 
Luísa Porto, de 37 anos,
que apareça, que escreva, que mande dizer
onde está.
Suplica-se ao repórter-amador,
ao caixeiro, ao mata-mosquitos, ao transeunte,
a qualquer do povo e da classe média,
até mesmo aos senhores ricos,
que tenham pena de mãe aflita
e lhe restituam a filha volatilizada
ou pelo menos dêem informações.
É alta, magra,
morena, rosto penugento, dentes alvos,
sinal de nascença junto ao olho esquerdo,
levemente estrábica.
Vestidinho simples. Óculos.
Sumida há três meses.
Mãe entrevada chamando.
Roga-se ao povo caritativo desta cidade
que tome em consideração um caso de família
digno de simpatia especial.
Luísa é de bom gênio, correta,
meiga, trabalhadora, religiosa.
Foi fazer compras na feira da praça.
Não voltou.
Levava pouco dinheiro na bolsa.
(Procurem Luísa.)
De ordinário não se demorava.
(Procurem Luísa.)
Namorado isso não tinha.
(Procurem. Procurem.)
Faz tanta falta.
Se, todavia, não a encontrarem
nem por isso deixem de procurar
com obstinação e confiança que Deus sempre recompensa
e talvez encontrem.
Mãe, viúva pobre, não perde a esperança.
Luísa ia pouco à cidade
e aqui no bairro é onde melhor pode ser pesquisada.
Sua melhor amiga, depois da mãe enferma,
é Rita Santana, costureira, moça desimpedida,
a qual não dá notícia nenhuma,
limitando-se a responder: Não sei.
O que não deixa de ser esquisito.
Somem tantas pessoas anualmente
numa cidade como o Rio de Janeiro
que talvez Luísa Porto jamais seja encontrada.
Uma vez, em 1898
ou 9,
sumiu o próprio chefe de polícia
que saíra à tarde para uma volta no Largo do Rocio
e até hoje.
A mãe de Luísa, então jovem,
leu no Diário Mercantil,
ficou pasma.
O jornal embrulhado na memória.
Mal sabia ela que o casamento curto, a viuvez,
a pobreza, a paralisia, o queixume
seriam, na vida, seu lote
e que sua única filha, afável posto que estrábica,
se diluiria sem explicação.
Pela última vez e em nome de Deus
todo-poderoso e cheio de misericórdia
procurem a moça, procurem 
essa que se chama Luísa Portoe é sem namorado.
Esqueçam a luta política,
ponham de lado preocupações comerciais,
percam um pouco de tempo indagando,
inquirindo, remexendo.
Não se arrependerão. Não
há gratificação maior do que o sorriso
de mãe em festa
e a paz íntima
conseqüente às boas e desinteressadas ações,
puro orvalho de alma.
Não me venham dizer que Luísa suicidou-se.
O santo lume da fé
ardeu sempre em sua alma
que pertence a Deus e a Teresinha do Menino Jesus.
Ela não se matou.
Procurem-na.
Tampouco foi vítima de desastre
que a polícia ignora
e os jornais não deram.
Está viva para consolo de uma entrevada
e triunfo geral do amor materno,
filial
e do próximo.
Nada de insinuações quanto à moça casta
e que não tinha, não tinha namorado.
Algo de extraordinário terá acontecido,
terremoto, chegada de rei,
as ruas mudaram de rumo,
para que demore tanto, é noite.
Mas há de voltar, espontânea
ou trazida por mão benigna,
o olhar desviado e terno, 
canção.
A qualquer hora do dia ou da noite
quem a encontrar avise a Rua Santos Óleos.
Não tem telefone.
Tem uma empregada velha que apanha o recado
e tomará providências.
Mas
se acharem que a sorte dos povos é mais importante
e que não devemos atentar nas dores individuais,
se fecharem ouvidos a este apelo de campainha,
não faz mal, insultem a mãe de Luísa,
virem a página:
Deus terá compaixão da abandonada e da ausente,
erguerá a enferma, e os membros perclusos
já se desatam em forma de busca.
Deus lhe dirá:
Vai,
procura tua filha, beija-a e fecha-a para sempre em teu coração.
Ou talvez não seja preciso esse favor divino.
A mãe de Luísa (somos pecadores)
sabe-se indigna de tamanha graça.
E resta a espera, que sempre é um dom.
Sim, os extraviados um dia regressam
ou nunca, ou pode ser, ou ontem.
E de pensar realizamos.
Quer apenas sua filhinha
que numa tarde remota de Cachoeiro
acabou de nascer e cheira a leite,
a cólica, a lágrima.
Já não interessa a descrição do corpo
nem esta, perdoem, fotografia,
disfarces de realidade mais intensa
e que anúncio algum proverá.
Cessem pesquisas, rádios, calai-vos.
Calma de flores abrindo
no canteiro azul
onde desabrocham seios e uma forma de virgem
intata nos tempos.
E de sentir compreendemos.
Já não adianta procurar
minha querida filha Luísa
que enquanto vagueio pelas cinzas do mundo
com inúteis pés fixados, enquanto sofro
e sofrendo me solto e me recomponho
e torno a viver e ando,
está inerte
cravada no centro da estrela invisível
Amor.
(Em Reunião - 1969)
Poema de Manuel Bandeira
Poema tirado de uma notícia de jornal
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da 
Babilônia num barracão
sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
(Em Estrela da vida inteira - 1966)
Poema de João Cabral de Melo Neto
Num monumento à aspirina
Claramente: o mais prático dos sóis,
o sol de um comprimido de aspirina:
de emprego fácil, portátil e barato, 
compacto de sol na lápide sucinta.
Principalmente porque, sol artificial,
que nada limita a funcionar de dia,
que a noite não expulsa, cada noite,
sol imune às leis de meteorologia,
a toda hora em que se necessita dele
levanta e vem (sempre num claro dia):
acende, para secar a aniagem da alma,
quará-la, em linhos de um meio-dia.
                          * 
Convergem: a aparência e os efeitos
da lente do comprimido de aspirina:
o acabamento esmerado desse cristal,
polido a esmeril e repolido a lima,
prefigura o clima onde ele faz viver
e o cartesiano de tudo nesse clima.
De outro lado, porque lente interna,
de uso interno, por detrás da retina,
não serve exclusivamente para o olho
a lente, ou o comprimido de aspirina:
ela reenfoca, para o corpo inteiro,
o borroso de ao redor, e o reafina.
(Em A educação pela pedra - 1966)
Ficha Técnica Ensinar e Aprender:
Atividades pedagógicas: Vera Denise Barba
Coordenação pedagógica: Pedro Paulo Demartini 
OBRAS DO AUTOR
Poesia
Pedra do sono. Recife: Edição do autor, 1942.
Os três mal-amados. Rio de Janeiro: Revista do Brasil, 1943.
O engenheiro. Rio de Janeiro: Amigos da Poesia, 1945.
Psicologia da composição com a fábula de Anfion e Antiode. Barcelona: O livro inconsútil, 1947.
O cão sem plumas. Barcelona: O livro inconsútil, 1950.
O rio ou Relação da viagem que faz o Capibaribe de sua nascente à cidade do Recife. São Paulo: Edição da Comissão do IV Centenário de São Paulo, 1954.
Dois parlamentos. Madrid: Edição do autor, 1960.
Quaderna. Lisboa: Guimarães Editores, 1960.
A educação pela pedra. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1966.
Museu de tudo. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1975.
A escola das facas. Rio de Janeiro: Editora José Olympio,1980.
Auto do frade. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1984.
Agrestes. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1985.
Crime na Calle Relator. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1987. 
Primeiros poemas. Rio de Janeiro: Edição da Faculdade de Letras da UFRJ, 1990.
Sevilha andando. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1990.
Poemas Reunidos
Poemas reunidos. Rio de Janeiro: Edição de Orfeu, 1954.
Duas águas. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1956.
Terceira feira. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1961. 
Poesias completas. Rio de Janeiro: Editora Sabiá, 1968.
Poesia completa. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1986.
Museu de tudo e depois (Poesia Completa II). Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1988.
Poemas escolhidos. Seleção de Alexandre O'Neil. Lisboa: Portugália Editora, 1963.
Antologia poética. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1965.
Morte e vida severina. São Paulo: Teatro da Universidade Católica, 1965.
Morte e vida severina e outros poemas em voz alta. Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1966.
Morte e vida severina. Rio de Janeiro: Editora Sabiá, 1969.
O melhor da poesia brasileira (Drummond, Cabral, Bandeira, Vinicius) Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1979.
João Cabral de Melo Neto. Seleção de José Fulaneti de Nadal. São Paulo: Abril Educação, 1982.
Poesia crítica. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1982.
Morte e vida severina. Litografias de Liliane Dardot. Recife: Grandes Moinhos do Brasil S/A, 1984.
Morte e vida severina e outros poemas em voz alta. Recife: Moinho Recife, 1984.
Os melhores poemas de João Cabral de Melo Neto. Seleção de Antônio Carlos Secchin. São Paulo: Global Editora, 1985.
Poemas pernambucanos. Centro Cultural José Mariano. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1988.
Poemas sevilhanos. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1992.
Prosa
Considerações sobre o poeta dormindo. Recife: Renovação, 1941.
Joan Miró. Barcelona: Editions de l'Oc, 1950.
Joan Miró. Rio de Janeiro: Cadernos de Cultura do MEC,1952. 
O Arquivo das Índias e o Brasil [pesquisa histórica]. Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exteriores, 1966.
Poesia e composição. Coimbra: Fenda Edições, 1982.
Filmes
O curso do poeta. Produtores: Fernando Sabino e David Neves. Roteiro e direção de Jorge Laclette, 1973.
Morte e vida severina: um filme documento. Direção de Zelito Vianna, 1976.
O mundo espanhol de João Cabral de Melo Neto. Produção e direção de Carlos Henrique Maranhão, 1979.
Morte e vida severina. Direção de Walter Avancini. TV Globo, 1981.
O ovo da galinha. Recitado por Ney Latorraca. TV Globo, 1980.
Duas águas - Tv Cultura SP - 1997
Discografia
Poesias - Murilo Mendes e João Cabral de Melo Neto. LP 010. Festa, Discos Ltda., 1956.
O Teatro da Universidade Católica de São Paulo apresenta Morte e vida severina. 
P.632.900 L., Nancy, 1966.
Morte e vida severina - Música de Chico Buarque de Holanda, CAR 4002, Caritas.
João Cabral de Melo Neto por ele mesmo. IG 79.029. Festa, Série de Lux. s/d.
Poemas de João Cabral de Melo Neto. 2 discos. Som Livre, 1982.
Morte e Vida Severina
Gênese e história da obra 
 
Morte e Vida Severina foi escrito em 1954/55, por encomenda de Maria ClaraMachado, então diretora do grupo O Tablado, que não pôde levar ao palco a peça. Publicado inicialmente no livro Duas Águas (1956), o texto foi finalmente montado pelo grupo do TUCA (Teatro da Universidade Católica de São Paulo), dirigido por Roberto Freire e Silnei Siqueira, com música de Chico Buarque de Holanda, e obteve sucesso mundial numa turnê em 1966. A partir daquele ano, passou a integrar o volume Poemas em Voz Alta, que reúne a parcela mais comunicativa da obra do "poeta engenheiro". 
 
As duas águas de João Cabral de Melo Neto 
 
João Cabral de Melo Neto (Recife, 1920) dividiu sua obra em duas "águas", duas facetas como as do telhado de uma casa: a primeira seria a da comunicação restrita, elaborada e de difícil consumo; a segunda, uma poesia mais popular, de compreensão mais imediata, de comunicação com um público mais amplo e menos cultivado. Nesta última se incluem os seus "poemas em voz alta", que foram escritos para serem lidos a um público ouvinte. O poema dramático Morte e Vida Severina com certeza pertence à segunda ''água", pois, embora tenha algumas características fundamentais do poeta cerebral que é João Cabral como o rigor formal da metrificação variada e aproximativa e das rimas toantes e o "falar com coisas", a utilização de imagens contundentes e concretas foi escrito com o intuito de alcançar um público maior e recorre a diversas fontes da poesia popular na sua elaboração. 
 
Um Auto de Natal Pernambucano - influências
 
O subtítulo do livro revela seu débito aos autos sacramentais da tradição ibérica medieval, dos quais herda o teor poético e alegórico, assim como uma tendência à justaposição das cenas e à sátira dos costumes. Além de se inspirar na antiga poesia narrativa ibérica, os romances, João Cabral reelabora parodicamente, nas cenas do presépio final a poesia do folclore pernambucano. Outra influência clara na concepção do livro é o Regionalismo de 30, com sua preocupação realista de observação, crítica e denúncia social que podemos encontrar em autores como José Américo de Almeida, Rachel de Queirós e, principalmente, Graciliano Ramos. 
 
O enredo: da morte à vida severina 
 
A inversão do sintagma "vida e morte" no título da peça demonstra o percurso do retirante Severino: parte da morte no Sertão para encontrar a vida em Recife. Severino acompanha o rio Capibaribe e só vai encontrando pobreza e morte pelo caminho. Chegando a Recife, foz do rio, o mesmo se repete. Desesperançado, pensa em cometer suicídio atirando-se ao rio, quando testemunha o nascimento de uma criança que devolve a esperança à vida severina. Tanto morte quanto vida são "severinas", adjetivo neológico formado a partir do nome próprio, pois ambas se aplicam a todos os "severinos" quase anônimos do Sertão nordestino. 
 
Estrutura geral 
 
Morte e Vida Severina se divide em 18 cenas ou fragmentos poéticos, todos precedidos por um título explicativo de seu conteúdo, praticamente resumos do que encontramos nos poemas em si. Podemos separá-los em dois grandes gupos: as primeiras 12 cenas descrevem a peregrinação de Severino. Trata-se do Caminho ou Fuga da Morte. Nesta parte o poeta habilmente alterna monólogos de Severino com diálogos que trava ou escuta no caminho; as últimas 6 cenas apresentam O Presépio ou O Encontro com a Vida, em que é descrito o nascimento do filho de José, mestre carpina, em clara alusão ao nascimento de Jesus. 
 
As cenas da morte 
 
1. (Monólogo) - Severino se apresenta. Tem dificuldades para se diferenciar dos outros "severinos", pois são "iguais em tudo na vida". Este Severino representa a todos. 
 
2. (Diálogo) - Conversa com dois homens carregando um defunto numa rede. 
 
3. (Monólogo) - Teme se perder porque o rio Capibaribe secou com o verão. 
 
4. (Diálogo) - Ouve cantarem excelências para um defunto dentro de uma casa, enquanto um homem, do lado de fora, vai ironizando as palavras dos cantadores. 
 
5. (Monólogo) - Cansado da viagem e desiludido, pensa interrompê-la por algum tempo e procurar trabalho ali onde se encontra. 
 
6. (Diálogo) - Dirige-se a uma mulher na janela em busca de trabalho, mas esta, rezadeira, diz que por lá não há serviço para lavradores como ele, só para quem lida profissionalmente com a morte. 
 
7. (Monólogo) - Chega, maravilhado, à Zona da Mata, região de vegetação mais rica, que o faz pensar, outra vez, em interromper a viagem. 
 
8. (Diálogo) - Assiste ao enterro de um lavrador e ouve os amigos do morto dizerem, com ironia, que agora sim este tinha a sua terra, a terra da cova rasa. 
 
9. (Monólogo) - Cercado pela morte, resolve apressar os passos para chegar logo a Recife, na esperança de uma mudança para melhor. 
 
10. (Diálogo) - Chegando a Recife, senta-se para descansar ao pé do muro de um cemitério e ouve, sem ser notado, a conversa pessimista de dois coveiros.
 
11. (Monólogo) - Desiludido, aproxima-se de um dos cais do Capibaribe e pensa em se atirar ao rio para acabar de vez com seu sofrimento. 
 
12. (Diálogo) - Conversa com José, mestre carpina, morador de um dos mocambos à margem do rio, e lhe pergunta se não é melhor se atirar logo ao rio e à morte. 
 
O presépio: encontro com a vida 
 
13. Uma mulher, da porta da casa de José, anuncia-lhe que seu filho nascera. 
 
14. Os vizinhos, os amigos, duas ciganas, etc. cantam em louvor ao menino. 
 
15. Falam as pessoas que trazem presentes de todos os tipos e de todos os cantos de Pernambuco para o recém-nascido. 
 
16. Falam as duas ciganas que haviam aparecido com os vizinhos. Uma prevê uma vida enlameada de pescador pobre, outra de operário um pouco menos pobre. 
 
17. Todos cantam a beleza do recém-nascido. Beleza da novidade, da vida que se multiplica e renova, incansável. 
 
18. O carpina responde à pergunta que Severino fizera, reafirmando o valor da vida, mesmo que seja "severina". 
 
 Resumo:
Severino é um retirante: ele é como muitos outros e que está partindo para o litoral, fugindo da seca, da morte _ _ . A vida na Capital parece mais atraente, mais "vida", menos "severina". Em suas andanças, entretanto, Severino se depara a todo momento não com a vida, mas sim com o que já conhece como coisa vulgar: a morte e o desespero que a cerca _ . 
Em seu primeiro encontro com ela, o retirante topa com dois homens carregando um defunto até sua última morada. Durante uma conversa, descobre que o pobre coitado havia sido assassinado e que o motivo fora ter querido expandir um pouco suas terras, que praticamente não eram produtíveis _ _ . O retirante segue sua viagem e percebe que na região onde se encontra, nem o rio Capibaribe - seco no verão - consegue cumprir o seu papel. Severino sente medo de não conseguir chegar ao seu destino. 
Escuta, então, uma cantoria e, aproximando-se, vê que está sendo encomendado um defunto. Pela primeira vez, Severino pensa em interromper sua "descida" para o litoral e procurar trabalho naquela vila. Ao dirigir-se a uma mulher, descobre que tudo que sabe fazer não serve ali, e o único trabalho existente e lucrativo é o que ajuda na morte: médico, rezadeira, farmacêutico, coveiro _ _ . E o lucro é certo nessas profissões, pois não faltam fregueses, uma vez que ali a morte também é coisa vulgar _ . 
Se não há como trabalhar, mais uma vez Severino retoma seu rumo e chega à Zona da Mata, onde novamente pensa em interromper sua viagem e se fixar naquela terra branda e macia, tão diferente da solo do Sertão. Mais do que isso: começou a acreditar que não via ninguém porque a vida ali deveria ser tão boa, que todos estavam de folga e que ninguém deveria conhecer a morte em vida, a vida severina _ . Ilusão de quem está à procura do paraíso: logo Severino assiste ao enterro de um trabalhador de eito e ouve o que dizem do morto os amigos que o levaram ao cemitério _ . Severino se dá conta que ali as privações são as mesmas que ele conhece bem e que também a única parte que pode sersua daquela terra é uma cova para sepultura, nada mais _ _ . 
O retirante resolve então apressar o passo para chegar logo ao Recife. Severino senta-se para descansar ao pé de um muro alto e ouve uma conversa _ . É mais uma vez a morte rondando, são dois coveiros que lhe dão a má notícia: toda a gente que vai do Sertão até ali procurando morrer de velhice, vai na verdade é seguindo o próprio enterro, pois logo que chegam, são os cemitérios que os esperam _ _ _ . 
Severino nunca quis muito da vida, mas está desiludido: esperava encontrar trabalho, trabalho duro mas agora - desespero! - já se imagina um defunto como aqueles que os coveiros descreviam, faltava apenas cumprir seu destino de retirante _ _ _ . 
Nesse momento, aproxima-se de Severino seu José, mestre carpina, morador de um dos mocambos que havia entre o cais e a água do rio. O retirante, desesperançado, revela ao mestre carpina sua intenção de suicídio, de se jogar naquele rio e ter uma mortalha "macia e líquida". Se José tenta convencer Severino que ainda vale a pena lutar pela vida, mesmo que seja vida severina _ . Mas Severino não vê mais diferença entre vida e morte e lança a pergunta: "que diferença faria/ se em vez de continuar/tomasse melhor saída:/a de saltar, numa noite,/ fora da ponte e da vida?" 
Da porta de onde havia saído o mestre carpina, surge uma mulher, que grita uma notícia. Um filho nascera, o filho de seu José _ ! Chegam vizinhos, amigos, pessoas trazendo presentes ao recém-nascido _ _ . Vêm também duas ciganas, que fazem a previsão do futuro do menino: ele crescerá aprendendo com os bichos e no futuro trabalhará numa fábrica, lambuzado de graxa e, quem sabe, poderá morar num lugar um pouco melhor _ . 
Severino assiste ao movimento, ao clima de euforia com a vinda do menino _ _ . O carpina se aproxima novamente do retirante e reata a conversa que estavam levando. Diz que não sabe a resposta da pergunta feita, mas, melhor que palavras, o nascimento da criança podia ser uma resposta: a vida vale a pena ser defendida.
Materiais disponíveis na Videoteca :
 " Morte e Vida Severina " / filme (1977) 				82’ 		Fita 99
Baseado na obra homônima. Direção de Zelito Vianna.
 " Recife de Dentro para Fora " / curta metragem (1997) 		15’ 		Fita 99
Baseado no poema Cão sem Plumas, faz um passeio pelo rio Capibaribe, mostrando a vida que se alimenta do rio. Embaladas pela música de Geraldo Azevedo, as imagens do filme apresentam a população ribeirinha, o trabalho e as dificuldades de sobrevivência. 
 " Duas Águas " / documentário (1997) 				60’ 	 Fita 102
Produzido pela TV Cultura. A obra de João Cabral é analisada por escritores como Ariano Suassuna e Haroldo de Campos. O vídeo traz poemas lidos pelo próprio poeta e por Arnaldo Antunes. Amplas sugestões de como usar o vídeo em sala de aula no endereço www.mec.gov.br/semtec/ensmed/ftp/DuasAguas.pdf
documentário produzido pela TV �
Padre Antônio Vieira (1608-1697)
Lutou em benefício dos índios e dos negros. 
 Criou sua obra nos dois países: Portugal e Brasil. 
 Defendia os direitos humanos através de seus Sermões. 
Um sermão importante : Sermão da Sexagésima expõe sua polêmica frente a arte Cultista, analisa o papel do pregador e do ouvinte que não sabendo pregar adequadamente (os padres) faziam perecer à palavra de Deus.
 
DADOS BIOGRÁFICOS
Padre Antônio Vieira nasceu em Lisboa, em 1608. Veio para a Bahia, aos seis anos de idade, ingressando pouco tempo depois no Colégio dos Jesuítas, do qual não mais se afastou. Iniciou sua carreira de pregador em 1633; viajou para Portugal, tão logo soube que este havia se libertado do domínio espanhol (A Restauração). Em 1641, já havia proferido alguns sermões que o tornaram famoso. Em Portugal participou ativamente da vida política da época, colocando-se em defesa dos cristãos-novos e suscitando ódio da Inquisição, que o prendeu. Anos depois, regressou ao Brasil e se estabeleceu no Maranhão, dedicando-se à evangelização dos índios e à defesa destes contra os colonos. Tal conflito terminou com sua expulsão e de toda a Companhia. Novamente em Portugal foi perseguido e processado pela Inquisição; após o perdão, viajou para Roma, onde pregou durante alguns anos .Retornou definitivamente à Bahia em 1681, onde reviu e organizou seus sermões para publicação. Morreu em 1697, no Colégio da Bahia.
CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS
Dividido entre Portugal e Brasil, Vieira foi um produtivo escritor do Barroco brasileiro, que se impôs como teórico e como modelo. Sua obra constitui-se de 200 sermões, entre os quais o Sermão da Sexagésima, cerca de 500 cartas – importantes documentos históricos que abordam a situação da Colônia, a Inquisição, os cristão-novos, a relação entre Portugal e Holanda, entre outros fatos – e profecias. À parte suas opiniões proféticas, que revelam nacionalismo exacerbado e um servilismo extraordinário dos jesuítas, e as inúmeras cartas, abordando os mais diversos assuntos, o melhor de sua obra encontra-se nos sermões que, em linguagem simples e sem torneios de estilo, revelam extraordinário domínio da língua, imaginação, sensibilidade, humanidade e convicções.
Utilizando-se da retórica jesuítica no trabalho das idéias e conceitos, Vieira mostrou-se um barroco conceitista, no desenvolvimento de idéias lógicas, destinadas a persuadir o público, e clássico na clareza e simplicidade de expressão. Seus temas preferidos foram: a valorização da vida humana, para reaproximá-la de Deus, e a exaltação do sofrimento, porque nele está o caminho da salvação.
PRODUÇÃO LITERÁRIA
Consta de 42 obras impressas, além de inúmeras outras deixadas manuscritas, dentre as quais a famosa Clavis Prophetarum. As mais importantes são:
Sermões 15 volumes (207 sermões) - publicados a partir de 1679 até o ano de 1748 
Sermão do Bonsucesso das Armas de Portugal contra os de Holanda (Bahia, 1640); Sermão da Sexagésima (Lisboa, 1655); Sermão de Santo Antonio aos Peixes (Maranhão, 1653); Sermão da Primeira Dominga da Quaresma (Maranhão, 1653); Sermão do Mandato (Lisboa, 1643); Sermão do Rosário (Bahia, 1633). 
Obras de Profecia
História do Futuro; História de Portugal; Esperanças de Portugal;Clavis Prophetarum.
Cartas
Publicadas em 1735
Material disponível na Videoteca :
 " Os Sermões – A História de Antônio Vieira " / filme (1989) 		76’ Fita 100
Vida e obra de um dos maiores estilistas da língua portuguesa Dirigido por Julio Bressane.
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Gregório de Matos (1636-1696)
Autor de sátiras de extrema irreverência o que fez com que fosse degregado para Angola. 
Vocabulário forte, não poupava qualquer camada social em suas sátiras. 
Desenvolveu o cultismo sem deixar de lado o conceptismo. 
Contraste entre o pecado e o perdão, o antagonismo que vive o homem barroco (religioso). 
Biografia Gregório de Matos e Guerra nasceu em 1636 na cidade de Salvador – Bahia. De família rica e influente, de senhores de engenho, passou a infância na Bahia com seu irmão, o padre Eusébio Matos, e estudou no Colégio dos Jesuítas. Termina o curso em 1652 transferindo-se para Coimbra, onde posteriormente, em 1661, se bacharelou em direito canônico. Nesse mesmo ano habilitou-se a um cargo de magistratura portuguesa. Em 1663 foi nomeado curador de órfãos e juiz do cível em Lisboa, graças ao seu casamento com Michaela de Andrade, de família ilustre, em 1671.
Por motivos ainda desconhecidos, não se dava bem com o príncipe regente D. Pedro II. Viúvo em 1678, teve o auxílio do arcebispo da Bahia D. Gaspar Barata de Mendonça, para em 1682 voltar à terra natal, com o ofício de "clérigo tonsurado", a fim de ocupar o cargo do tesoureiro-mor da Sé. Após a morte do seu protetor, perdeu o cargo ocupado por negar-se às ordens sacras, onde mais tarde voltaria a exercer advocacia.
Gregório de Matos casou-se novamente. Desta vez com uma viúva sem fortuna Maria de Póvoas, com quem teve um filho.
Vivendo na Bahia cercado deinimigos e desafeto, passou à desferir ferozes sátiras contra a sociedade local e aos nobres, sem distinção, o que lhe rendeu o apelido de "Boca do Inferno" e em alguns casos como "Boca-de-Brasa", e em 1694 foi degredado para Angola, justamente pela virulência de suas sátiras para com as autoridades civis, eclesiásticas, militares, e também com a população local, dizendo em um dos casos que "a cidade da Bahia pode conter dois ff – um de furtar, outro de foder".
Em Angola se envolveu em um golpe militar e colocou-se contra os aliados, virou conselheiro do governo, e por sua atuação para com a população local, foi autorizado a regressar para o Brasil.
Fixou-se no Recife – PE, onde não logrou viver pior do que na Bahia. Vivendo lá também estaria longe do alcance das perseguições que era ameaçado na Bahia.
Dos seus gêneros literários, destacou-se mais no satírico, por motivos que serão citados adiante.
Gregório de Matos e Guerra teve uma vida relativamente "agitada", indo e vindo do país, sendo perseguido e renomado, até mesmo processado perante a inquisição já havia sido, mas por ser renomado, importante, e rico, conseguiu escapar.
Gregório de Matos foi o primeiro, e sem dúvida um dos maiores, representantes de uma literatura autenticamente brasileira.
Gregório de Matos e Guerra morreu em 1695, aos 59 anos, vítima da febre da malária – contraída durante sua estadia na África –, pouco tempo depois de seu regresso ao Brasil, em Recife – PE, e foi sepultado no antigo Hospício da Igreja de Nossa Senhora da Penha dos Capuchinhos Franceses.
Características Literárias de Gregório de Matos
É inevitável notar em quaisquer obras de poetas, uma certa lógica em seu poema, ou um certo tema, escrita, vocabulário ou até modos de escrita semelhantes.
A poesia de Gregório de Matos está profundamente enraizada na realidade brasileira.
Superficialmente falando, as obras de Gregório de Matos se ramificavam em duas vertentes: uma lírica, com fundo religioso e moral, onde reponta sempre o amor metafísico e carnal; outra, satírica, oscilando entre zombaria e mordacidade, freqüentemente com conteúdo erótico e pornográfico.
Foi por este último que Gregório de Matos se tornou mais conhecido e que já até foi dito anteriormente, rendeu seu apelido de "Boca do Inferno" ou "Boca-de-Brasa". E também por criticar todas as classes, relatar todos os fatos e costumes do Brasil. Não diferenciava linguagem para falar a respeito de negros, nobres ou religiosos. Falava de todos sem poupar nem mesmo a Portugal (Poema Analisado).
Seus poemas seguiam o estilo barroco, possuindo em sua maioria: jogos de palavras; linguagem ornamentada, com hipérboles e metáforas; conceptismo e cultismo; e o indispensável paradoxo.
Outra característica de Gregório de Matos, é que a maioria de suas obras não possuíam um título propriamente dito, e sim uma dedicatória a quem ou que ele escrevia, fazendo de suas obras uma espécie de "homenagem" aos alvos de seus poemas.
Seus textos, como já foi dito, procuravam mostrar, com clareza, a realidade do Brasil. Com detalhes até impressionantes, por fazerem parte de uma sátira.
Por sua linguagem pornográfica, não pôde escapar de uma imposição judicial que lhe proibiu de desferir sua sátiras, o que não o impediu de desferi-las.
Por que é difícil estudar Gregório de Matos?
O principal motivo desta dificuldade encontrada é devido ao grande número de estudiosos de sua vida.
A primeira obra sobre Gregório de Matos, surgiu apenas em 1850, quando já se passara 55 anos de óbito do poeta.
Um fato interessante, é que a própria data de nascimento e morte do poeta não são tão convictas assim. Por exemplo, são muitas variantes encontradas na sua data de nascimento da obra biográfica produzida por Manuel Pereira Rabelo, no século 18, são citadas as datas de 1623 e 1633, e que aparece em outras obras também as datas 1636, 1634. Isso em apenas duas obras.
Outro dos motivos é o estudo dos seus poemas. Isso porque a maioria de suas obras eram feitas em folhas à parte, e passadas à diante de mão em mão, o que resultava em várias perdas, pois não se tem exatamente as palavras do poeta, mas sim, a versão de cada pessoa que a copiava. Gregório dificilmente publicava uma obra com as folhas organizadas, e quando isso acontecia a inquisição apreendia a obra.
Gregório de Matos, ou a vida dele, sempre terá uma das características de seus poemas, o paradoxo. Não se sabe ao exato o que aconteceu, e o que foi meramente inventado, não se sabe se Gregório era um inteligente homem, ou um simples plagiário, como foi acusado por vezes, mas sabe-se ao certo que Gregório de Matos foi um dos, senão o maior, contribuinte para a Literatura Brasileira.
Análise do Poema Aos Srs. Governadores do Mundo em Seco da Bahia e seus Costumes
"A cada canto um grande Conselheiro
que nos quer governar cabana e vinha;
não sabem governar sua cozinha,
e querem governar o Mundo inteiro!
Em cada porta um bem freqüente Olheiro
da vida do Vizinho e da Vizinha,
pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha
para o levar à Praça e ao Terreiro.
Muitos Mulatos desavergonhados,
trazendo pelos pés aos Homens nobres;
posta nas palmas toda picardia.
Estupendas usuras nos mercados:
todos os que não furtam, muito pobres:
eis aqui a Cidade da Bahia."
A Análise:
Neste poema Gregório critica a colonização do Brasil pelos portugueses e também de carona o domínio europeu ao mundo. Chegamos a essa conclusão através dos versos iniciais, onde concluímos que com a palavra conselheiro, se referia aos portugueses devido aos três próximos versos, em que ele fala que os portugueses mal sabem governar a própria casa (país) e querem colonizar todo o mundo, inclusive o Brasil (referido como Bahia).
Na segunda estrofe nota-se também o uso de letras maiúsculas para substantivos comuns, o que nos levou a concluir que seriam trocadilhos, então observamos que o poeta fala nesta estrofe, sobre os países vizinhos a Portugal (sobretudo França e Holanda) por estes estarem em constante ameaça à expansão portuguesa.
Já nos últimos versos começa a falar mal do povo brasileiro criticando a ação dos índios em dar toda a riqueza aos portugueses em troca de nada, e chamando todo o povo brasileiro, principalmente da Bahia, de ignorantes, fechando com a frase "… eis aqui a Cidade da Bahia…" dando a impressão de estar a descrever a Bahia com seu poema.
As características barrocas notadas neste poema são: jogos de palavras; conceptismo, e o imprescindível paradoxo. 5
O paradoxo notado não aparece claramente, e sim no contexto. Neste caso, no começo do poema Gregório de Matos mostra toda sua indignação com a colonização, criticando os portugueses e nos colocando como vítimas. Já no decorrer do poema começa a colocar o povo brasileiro como um povo que furta, e engana, fofoca, e em fim, coloca o povo brasileiro como sendo o próprio vilão.
Material disponível na Videoteca :
 " Gregório de Mattos e Guerra " / documentário 	 		47’ 		 Fita 100
Vida e obra do poeta que irá anunciar, com sua trágica vida e sua impressionante obra, o perfil tenso e dividido do povo brasileiro.
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CASTRO ALVES, o poeta da resistência Mário Maestri
Castro Alves nasceu em março de 1847, numa fazenda pastoril baiana. Seu pai, o médico Antônio José Alves, filho de um comerciante lusitano pobre, casou-se com Clélia Brasília Castro, filha natural de um rico fazendeiro. Na época, o Brasil era a maior nação escravista do mundo. Em 1854, a família Castro mudou-se para Salvador, onde Antônio José dedicou-se à clínica de homens livres e escravizados. Quatro anos antes, terminara o tráfico transatlântico de cativos, o que não debilitara o dinamismo da produção negreira.
No Brasil, reinava a cafeicultura escravista sediada no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Porém, apesar da crise da produção açucareira, a Bahia possuía ainda a segunda população escravizada, com 300.000 cativos. O Riode Janeiro e a Corte possuíam meio milhão de escravos. Em 1858, aos 11 anos, Castro Alves foi matriculado no Ginásio Baiano. Seu proprietário se destacaria pela idéias reformistas, introduzindo o ensino gradual e concomitante das matérias e o aprendizado do português a partir dos grandes mestres, e não mais do latim. A grande inovação pedagógica de Abílio Borges foi a substituição do castigo físico pela emulação estabelecida através de competições literárias.
MULTIDÕES DE NEGROS - A sociedade senhorial e ilustrada baiana era a ponta exposta do imenso iceberg escravista. As ruas de Salvador regurgitam de africanos, cativos ou libertos, vestidos com coloridos turbantes e panos da costa. Eles trabalhavam nos serviços doméstico, nos transportes, nos mercados, nas armações, etc. Na cidade, falavam-se línguas da Costa e vivia-se segundo padrões africanos aclimatados ao Brasil.
A existência do cativo urbano era dura - ainda que fosse melhor do que a do negro rural. Os senhores estabeleciam estratégias de captação social e de controle ideológico. Porém, sem a violência do castigo, a massa escrava não se manteria na submissão. Em Salvador, doze anos antes do nascimento de Castro Alves reprimira-se a mais importante revolta urbana de cativos na América.
Em sua excelente bibliografia - ABC de Castro Alves - Jorge Amado lembra pertinentemente que a onipresença da população escrava de Salvador determinou a formação de Castro Alves. Porém, tal fato não era comum. Então, era absoluto o consenso das elites sobre a manutenção da escravidão, sendo que as raquíticas "classes médias" submetiam-se simplesmente a tal opinião.
NACIONALIDADE - Não sabemos quando Castro Alves escreveu sua primeira poesia sobre a questão servil. Com treze anos, declamou durante o "outeiro" dedicado ao aniversário do proprietário do Ginásio Baiano, poesia destacando a abolição do castigo físico como recurso pedagógico. No ano seguinte, em 1861, em homenagem à Independência, referiu-se à escravidão, apresentando-a como contingência histórica e insinuando a contradição entre cativeiro e nacionalidade.
Em janeiro de 1862, com 15 anos, ele e seu irmão mais velho partiam para Recife para inscreverem-se no curso preparatório à Escola de Direito. Nesse ano, publicou a poesia "Destruição de Jerusalém", no Jornal do Recife, alcançando seu primeiro sucesso de público. Em 1863, dedicando-se pouco aos estudos e muito à poesia, foi reprovado no curso preparatório. Em maio, com 16 anos, publicou seus primeiros versos claramente abolicionistas. No seu poema romântico e ingênuo "A canção do Africano", cantou a nostalgia do cativo e colocou em contradição a África, sem escravidão, e o Brasil, pátria do escravismo.
"Lá todos vivem felizes
Todos dançam no terreiro;
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro."
Em 2 de julho de 1863, declamou poesia em homenagem ao transcurso do aniversário da expulsão dos portugueses da Bahia. A primeira parte do poema é dedicada ao "cativo". Na quarta estrofe, põe na boca do escravo, ao morrer, seu grito de "vingança". O poeta retomaria, com virulência, o tema do ódio servil.
"Um suor frio lhe passou nos membros...
No corpo a vida para sempre cansa.
Caiu por terra, mas lembrando o filho
Com os lábios hirtos repetiu - vingança."
Ainda em 1865, quando a poesia anti-escravista de Castro Alves assumiu singular radicalidade, o movimento abolicionista praticamente inexistia. Então, imperava um estado geral de conformidade sobre a sorte dos cativos. Os escravistas toleravam, no máximo, discutir o emancipacionismo - extinção lenta, gradual e segura da ordem maldita.
A pregação abolicionista de Castro Alves não surgiu do nada. Nesses anos, importantes fenômenos minavam o escravismo. Em 1850, o fim do tráfico negreiro internacional determinara o encarecimento dos cativos, levando a que fossem vendidos, de todo Brasil, para o Centro-Sul cafeicultor. O que formaria bolsões não-escravistas, corroendo o consenso negreiro.
PÁTRIA ESCRAVISTA - Com a crise do regime colonial, o cativeiro fora extinto, sucessivamente, nas repúblicas hispano-americanas. Apoiada pela opinião internacional, surgiu no Brasil uma tímida opinião anti-escravista, entre a população livre. Em 1865, com o fim da guerra da Secessão, o Brasil tornou-se a única nação escravista independente.
Em agosto de 1865, em Recife, com 18 anos, Castro Alves compôs e declamou, durante a abertura dos cursos jurídicos, o poema libertário, anticlerical, democrático e abolicionista "O século". Nele, cantava:
"Quebre-se o cetro do Papa.
Faça-se dele - uma cruz!
A púrpura sirva ao povo
Pra cobrir os ombros nus.
Que os gritos do Niágara
Sem escravos, - Guanabara
Se eleve ao fulgor dos sóis!"
A poesia concluía chamando a juventude à luta revolucionária anti-escravista:
Quem cai na luta com a glória,
Tomba nos braços da História,
No coração do Brasil!
Moços, do topo dos Andes,
Pirâmides vastas, grandes,
Vos contemplam séculos mil!
POVO NO PODER - Em fins de 1865, sob forte pressão emancipacionista, Pedro II apoiou a tímida proposta de emancipação do ventre escravo. O projeto não passou pelo Conselho de Estado. A guerra contra o Paraguai, iniciada naquele ano, serviu como pretexto para que nada se fizesse em relação à instituição. No início de 1866, na Bahia, Castro Alves fundou a associação abolicionista. Em novembro, o governo imperial, demagogicamente, decretou a liberdade dos cativos estatais que fossem lutar no Paraguai. Em dezembro, Castro Alves publicou vibrante poema contra a repressão policial de comício republicano - "O povo ao poder".
A praça! A praça é do povo
Como o céu é do condor
É o antro onde a liberdade
Cria águias seu calor. em
Senhor!...pois quereis a praça?
Desgraçada a populaça
Só tem a rua de seu...
Ninguém vos rouba os castelos
Tende palácios tão belos...
Deixai a terra ao Anteu.
Em fevereiro de 1867, o gabinete liberal submeteu ao Conselho de Estado, outra vez inutilmente, proposta de emancipação dos ventres, acrescida da abolição da escravidão em 1900, com indenização! No início do ano, em Recife, Castro Alves escrevia o drama Gonzaga ou a Revolução de Minas, onde identificava a abolição com a questão da independência e da nacionalidade.
Em 1868, em São Paulo, centro da produção escravista, compôs e recitou o seu maior poema abolicionista. Com "O navio negreiro", referia-se alegoricamente à imensa nação que encobria com sua bandeira o cativeiro. Castro Alves lembrava a bastardia na nacionalidade brasileira enquanto a cidadania não compreendesse todos seus filhos.
"Auriverde pendão da minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra,
E as promessas divinas da esperança...
Tu, que da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança.
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!"
AMOR CARNAL - A família de Castro Alves fora golpeada pela enfermidade de seu século - a tuberculose. Sua mãe morrera jovem e seu pai sofrera dos pulmões. Em meados de 1863, com apenas 16 anos, uma primeira hemoptise revela a Castro Alves que o mal também lhe alcançara. Talvez a enfermidade tenha contribuído para a intensidade com que se entregou à luta abolicionista. A mesma entrega nortearia sua vida amorosa.
Ao contrário dos poetas românticos de sua época, em geral castos cavaleiros que amavam platonicamente suas Dulcinéias, ao evocar os seios alvos ou morenos de seus amores, sabia exatamente do que tratava. Castro Alves escandalizaria sua sociedade ao viver, publicamente, com Eugênia Câmara, artista dramática de sucesso, mais velha e mãe de uma menina.
Em julho de 1868, Pedro II promoveu a substituição dos liberais pelos conservadores. A ação motivou forte agitação anti-escravista e liberal. Em setembro, numa época em que Castro Alves sofria os golpes causados pelo rompimento com a amada e pelas dificuldades do abolicionismo, feriu-se gravemente, no calcanhar, com um disparo acidental, quando caçava, no Braz, em São Paulo.Em meados de 1869, o governo proibiu a separação da mãe escrava dos filhos menores de 15 anos e pôs fim aos leilões públicos de cativos - os privados, eram permitidos. Em junho, Castro Alves, gravemente doente dos pulmões, e com seu ferimento gangrenado, teve o pé ferido amputado, em operação realizada na Corte, sem clorofórmio, devido a sua fraqueza. Em novembro, embarcou para a Bahia, e, em janeiro, viajou para o interior da província, buscando melhores ares.
Em inícios de 1870, com o fim da guerra do Paraguai, a discussão sobre a escravidão tornou-se questão ‘nacional’, debatida nos salões e nas praças públicas. Mesmo se sabendo condenado, Castro Alves planejava escrever poema-histórico sobre os Quilombos dos Palmares. Nos sertões, escreveu sua "Saudação a Palmares", soberbo elogio da revolta negra e implacável crítica dos intelectuais vendidos ao poder.
"Cantem Eunucos devassos
Dos reis os marmóreos paços;
E beijem os férreos laços,
Que não ousam sacudir...
Eu canto a beleza tua,
Caçadora seminua!
Em cuja perna flutua
Ruiva a pele de um tapir"
Em outubro, Castro Alves via publicado seu primeiro livro - Espumas flutuantes.
Em maio de 1871, em hábil manobra, o governo imperial apresentou projeto de lei que determinava a emancipação dos filhos de mulheres escravizadas. Tratava-se de uma armadilha escravista. Segundo a lei, os ingênuos trabalhariam ainda para os senhores de suas mães, até os 21 anos, de graça. Em 6 de julho, Castro Alves morria, com 24 anos, em Salvador.
Por dez anos, o movimento emancipacionista refluiria para renascer, em inícios de 1880, exigindo o fim definitivo da escravidão. O que seria obtido, em 1888, após os trabalhadores escravizados abandonarem maciçamente as grandes fazendas de café, pondo fim à escravidão.
Obras: Espumas flutuantes (1870); Gonzaga ou a Revolução de Minas (1876); A cachoeira de Paulo Afonso (1876); Os escravos, obra dividida em duas partes: 1. A cachoeira de Paulo Afonso; 2. Manuscritos de Stênio (1883). Obras completas Edição do cinqüentenário da morte de Castro Alves, comentada, anotada e com numerosos inéditos, por Afrânio Peixoto, em 2 vols.
Materiais disponíveis na Videoteca
 " Castro Alves - Retrato do Poeta " / filme (1999) 71’ 				 Fita 101
Poeta libertário, Castro Alves é um símbolo da literatura brasileira e um modelo para a nossa juventude. É assim que é visto e analisado por Sílvio Tendler, no filme. O resgate da trajetória existencial do poeta revela também a modernidade de sua mensagem poética. Com a fidelidade do docudrama aos textos de Castro Alves , Sílvio Tendler tornou possível a identificação do personagem histórico e permite ao espectador, a um só tempo, a vida e a obra de um dos nossos maiores poetas.
 " Castro Alves : A Noiva " / documentário(2002)		41’ 			 Fita 101
Reúne cartas, poemas e textos de Castro Alves, além de resgatar a história de uma mulher que teria vivido um romance com o poeta, nos últimos meses de vida, a atriz portuguesa Eugênia Câmara , que se dizia sua noiva.
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CRUZ E SOUZA(1861-1898)
É considerado o nosso mais importante poeta simbolista e um dos maiores poetas nacionais de todos os tempos, Cruz e Souza, que fincou o marco inicial do simbolismo em nossa pátria, com a publicação de Missal e Broquéis. 
Filho de Guilherme, um escravo que trabalhava como mestre-pedreiro, e Carolina Eva da Conceição, uma negra alforriada, Cruz e Souza foi criado por uma família aristocrática, que lhe nutriram com estudo nos mais diversos campos do conhecimento; Estudou francês, grego, latim, inglês, matemática e ciências naturais, distinguindo-se acima de todos os seus condiscípulos. 
Uma desilusão amorosa ocorrera em sua juventude, ao apaixonar-se por uma pianista branca, que marcou profundamente sua poesia. Morou no Rio de Janeiro, aonde foi alvo de forte preconceito racial no Brasil escravocrata. É nomeado promotor por seu amigo, Dr. Francisco Luís da Gama Rosa, mas não exerceu o cargo por pressão de líderes políticos, que eram contra um negro em tal cargo. 
Casa-se com Gavita Rosa Gonçalves, uma negra que conhece no Cemitério do Catumbi em 1892, e que mais tarde, viria a enlouquecer. O casal teve quatro filhos, porém apenas dois sobreviveram. O poeta morre pobre e desconhecido, aos 36 anos vítima da terrível tuberculose. 
Seu valor veio a ser reconhecido quando o sociólogo francês Roger Bastide colocou-o entre os maiores nomes do simbolismo universal. 
Cruz e Sousa foi um dos escritores que mais tenazmente lutou pelo seu ideal estético-literário. Foi um ser que viveu para a poesia. Corporificou sua existência em poemas. Sofreu a tortura estética. Como verdadeiro fanático da arte, consagrou sua existência ao ansioso empenho pela realização poética.
“Emparedado” por pobreza e preconceito racial, experimentou dramaticamente na própria carne a incompreensão, o desprezo e a oposição. Entretanto, não vacilou nunca e
“entre raios, pedradas e metralhas
ficou gemendo, mas ficou sonhando” .
E deixou um legado do mais alto mérito literário. Sua glória é sua obra. E bem merece continuar agora, após o “Triunfo Supremo” , o seu “ Caminho de Glória”, tendo superado a “Vida Obscura” e confirmado sua condição de “O Assinalado”. Se em vida lutou contra a pobreza, a miséria, a doença e o preconceito, tudo sacrificando pela sua criação literária, essa obra construída com o sacrifício da dedicação total e sob a angústia do aguilhão estético, nunca satisfeito e sempre a exigir mais, essa obra corporifica o que de mais admirável, sólido e denso pode criar o espírito humano, quando se obsessiona por uma causa enraizada em convicção profunda.
João da Cruz e Sousa nasceu na cidade de Desterro, antiga denominação de Florianópolis, a 24 de novembro de 1861, filho de negros a serviço do Marechal Guilherme Xavier de Sousa, do qual o menino recebeu as melhores condições e estímulo para desenvolver bons estudos. Inteligente e dedicado, concluiu o curso secundário em 1876, tendo o renomado cientista Fritz Muller sido um dos seus professores. Em seguida, tentou o magistério particular e logo depois empregou-se no comércio. Ligou-se a um grupo de jovens literatos, junto com os quais lutou posteriormente pela “ Idéia Nova”, ou seja, pela implantação das idéias e da estética realista em oposição ao desgastado Romantismo. Participavam do grupo: Virgílio Várzea, Santos Lostada, Araújo Figueiredo e Horácio de Carvalho.
Aproximando do jornalismo, publicou seus primeiros escritos poéticos por 1879-80. Em 1881 tornou-se “ponto” de uma companhia teatral. De 1882 a 1885, novamente como “ ponto”, percorreu todo o país. Nessa época foi anunciado seu livro de poemas “Cambiantes”, que não chegou a ser publicado, mas cujos poemas foram posteriormente incorporados ao Livro Derradeiro. Em 1885, de volta a Desterro, assume a redação do jornal “O Moleque”, dinamizando-o, mas sofrendo várias restrições e resistências, devido ao preconceito de cor. 	No mesmo ano estréia, em conjunto com Virgílio Várzea, com o livro “ Tropos e Fantasias”. De 1886 a 1887 é novamente “ponto”, continuando em seguida no jornalismo, em Desterro. Em 1888 tentou o jornalismo no Rio de Janeiro, mas após oito terríveis meses retornou.
Em 1890, no entanto, Virgílio Várzea, que já se encontrava bem colocado na Corte animou-o em convite e Cruz e Sousa seguiu, em dezembro, novamente para o Rio, onde passou a viver do trabalho em jornais. Logo no ano seguinte, é abalado pela morte de sua mãe, em Desterro.
No Rio, tornou-se adepto da Escola Nova (Simbolismo), comungando as mesmas idéias e aspirações de Bernardino Lopes, Emiliano Perneta, Emilio de Menezes, Nestor Vítor, Gonzaga Duque, Oscar Rosas e outros, grupo que estabeleceu grandes polêmicas (como “novos”) contra os “velhos” da vitoriosa tradição parnasiana. O ano de 1893 tornou-se posteriormente, marco histórico-literário, devido à publicação dos livros de Cruz e Sousa – “Missal” (prosa) e “ Broqueis” (poesia), que deflagravam o Simbolismono Brasil.
Desde 1891, Cruz e Sousa conhecera a bela moça negra Gavita Rosa Gonçalves. Em maio de 1893 já estavam vivendo juntos e em novembro casaram, embora sem recursos, mas estando ela já no sexto mês de gravidez. Em dezembro, Cruz e Sousa obteve modesto emprego de arquivista na Estrada de Ferro Central do Brasil, emprego necessário para a subsistência, mas burocrática atividade martirizante para seu gênio livre e de altos vôos poéticos. Em fevereiro de 1894 nasceu o primeiro filho. A pobreza atingia níveis dramáticos, que se refletiam em seus versos pessimistas. Sua luta pela superação da obscuridade e sua ânsia de glória literária não chegavam a realizar-se. Nestor Vítor, o mais achegado de seus amigos, caracterizou-o como verdadeiro fanático da arte, que tudo empenhou pelo ideal poético.
Em 1895, Cruz e Sousa recebeu a visita de Alphonsus de Guimarães, que o procurava para melhor conhecer sua arte, sentindo-se atraído pelas mesmas tendências. Tornou-se posteriormente a grande alma irmã de Cruz e Sousa, os dois expoentes máximos no nosso Simbolismo. Em outubro daquele ano, nasceu o segundo filho e Gavita ainda o amamentava quando, em março de 1896, chegou à demência, que perdurou por seis terríveis meses. As tribulações do poeta eram superiores às suas forças. Sobreveio, ainda, em agosto do mesmo ano, a morte do pai do poeta. Em 1897 nasceu o terceiro filho e o poeta sentiu-se tuberculoso. Viu dois filhos morrerem, enquanto ele lutava desesperadamente contra a doença e a pobreza.
Em 1898, logo nos inícios, não podendo mais trabalhar, foi aconselhado pelo médico a procurar melhores ares. Transportado para clima considerado mais saudável, em Sítio-MG, não resistiu e veio a falecer a 19 de março de 1898. Gavita, que estava grávida, deu à luz um quarto filho, João da Cruz e Sousa Jr. O terceiro filho também faleceu logo em seguida e Gavita igualmente o seguiu em 1901. O filho póstumo do poeta sobreviveu até 1915, quando também morreu, mas deixando grávida D. Francelina, da qual nasceu posteriormente Sílvio Cruz e Sousa, neto do desditoso poeta, que conservou sua descendência, residindo em Moça Bonita-RJ.
Todo o drama existencial de Cruz e Sousa foi magistralmente narrado por Raimundo Magalhães Jr. No livro “Poesia e Vida de Cruz e Sousa”, obra de leitura tão fascinante quanto instrutiva. O próprio poeta deixou ressoar sua vivência dramática através de inúmeros poemas, um dos quais é “Vida Obscura”.
Após a morte, e somente então, a glória de Cruz e Sousa foi crescendo sempre mais. Figura insuperável do Simbolismo Brasileiro, e seu grande mestre, tornou-se das mais altas expressões da poesia universal, cada vez mais descoberto e estudado no estrangeiro. Entre nós, pouco reconhecido em vida, não obstante sua angustiante busca de realização literária, desprezado mesmo e combatido, seu reconhecimento foi lento e gradativo. Mas sua consagração já se manifesta de forma inconfundível pela ala espiritualista do Modernismo, com Tasso da Silveira, Cecília Meireles, Jorge de Lima e outros. E continua inabalável, sempre em linha ascendente.
Cruz e Sousa formou seu espírito dentro do movimento da “Idéia Nova”, que lutou pela implantação do pensamento realista e naturalista em Santa Catarina. Mais tarde, quando residia e militava no Rio de Janeiro, assimilou as novas idéias simbolistas. Sua produção inicial é claramente parnasiana, pelo rigor da métrica e meticulosidade da rima. E seu débito com o Parnasianismo acompanhou-o sempre, considerando-se sobretudo o rigor formalista de seus sonetos e um certo materialismo pessimista implícito em suas idéias. Mas na fase simbolista enriqueceu sua poética com um misticismo pagão e com vagas aspirações espiritualistas, bem como, no plano formal, com a rica musicalidade, a potência verbal, a opulência de estilo e a capacidade de criar imagens vibrantes e de sensível beleza.
Entre os estudiosos de sua obra, sobretudo Abelardo F. Montenegro a interpretou como uma válvula de escape para suas tensões interiores, como compensação de insatisfações. Aliás, Montenegro, em seu alentado estudo, também é o autor que mais extenso e pormenorizado paralelo traça entre os dois mestres do Simbolismo Brasileiro: Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimarães. Realmente a trajetória humana e poética do Poeta Negro está marcada por uma densa angústia, por constante senso trágico, mas evidenciando ao mesmo tempo sua personalidade sofrida, sua entrega total à realização artística, sua firme persistência e perseverança na busca do ideal.
“Emparedado”, anseia pela libertação na transcendência e sublimação, por transpor-se para um misticismo cósmico. Revela-se, assim, constante em sua poesia e consciência de posições antiestéticas: por um lado a sensação amarga e pessimista da existência, a angustia trágica, a consciência da raça sofredora, o vivo sentido da dor, como muito bem retrata em “Vida Obscura”; por outro lado, a busca da libertação, de reconhecimento e igualdade, a ânsia do infinito, o anseio pela ascensão ao mundo das Essências, a aspiração ao sonho, à diluição no vago, indefinido e nebuloso. Daí sua poesia revestir-se de dramaticidade e perenidade, realidade e sonho, carne e espírito, materialidade concreta e diluição no abstrato. Um dos seus sonetos magistrais é “Cárcere das almas”, que bem exemplifica esses traços.
Roger Bastide analisou muito bem as implicações simbolistas da poesia de Cruz e Sousa, quando colocou a gênese do Simbolismo no misticismo e mostrou a luta constante, na poesia do Cisne Negro, por desprender-se da natureza concreta, da prisão corporal, para ascender às esferas celestes, ao mundo das Essências, à transcendência – num misto de Platonismo e Cristianismo. Afirmando que o Simbolismo de Cruz e Sousa “é uma experiência sofrida e vivida do símbolo no interior de uma busca espiritual”, Bastide confere ao autor de “Últimos Sonetos” “situação à parte na grande Tríade harmoniosa: Mallarmé, Stephan George e Cruz e Sousa.” Essa afirmação, partida de alguém nascido na França, pátria do Simbolismo, é indiscutivelmente honrosa, ao menos “pós-mortem”, para nosso inditosa poeta.
  Livros publicados:
Poesia: 
» "Broquéis" (1893)
» "Faróis" (1900)
» "Últimos Sonetos" (1905)
» "O livro Derradeiro" (1961). 
Poemas em Prosa: 
» "Tropos e Fanfarras" (1885) - em conjunto com Virgílio Várzea
» "Missal" (1893)
» "Evocações" (1898)
» "Outras Evocações" (1961)
» "Dispersos" (1961) 
Material disponível na Videoteca
 " Cruz e Souza – O Poeta do Desterro " / filme (2000) 86’ 			 Fita 103
Biografia do poeta brasileiro, filho de escravos fundador do Simbolismo no Brasil e considerado o maior poeta negro da língua portuguesa. Através de 34 "estrofes visuais", o filme rastreia desde as arrebatadoras paixões do poeta em Florianópolis (SC) ao seu emparedamento social, racial e intelectual e trágico fim no Rio de Janeiro. Direção de Sylvio Back.
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CLARICE LISPECTOR(1920-1977)
"Tenho várias caras. Uma é quase bonita, outra é quase feia. Sou um o quê? Um quase tudo". 
"... eu só escrevo quando eu quero, eu sou uma amadora e faço questão de continuar a ser amadora. Profissional é aquele que tem uma obrigação consigo mesmo de escrever, ou então em relação ao outro. Agora, eu faço questão de não ser profissional, para manter minha liberdade." 
Clarice nasce em Tchelchenik, na Ucrânia, em 1920. Chega ao Brasil com os pais e as duas irmãs aos dois meses de idade, instalando-se em Recife. A infância é envolta em sérias dificuldades financeiras. A mãe morre quando ela conta 9 anos de idade. A família então se transfere para o Rio de Janeiro, onde Clarice começa a trabalhar como professora particular de português. A relação professor/aluno seria um dos temas preferidos e recorrentes em toda a sua obra - desde o primeiro romance: Perto do Coração Selvagem. Ela estuda Direito, por contingência. Em seguida, começa a trabalhar na Agência Nacional, como redatora. No jornalismo, conhece e se aproxima de escritorese jornalistas como Antônio Callado, Hélio Pelegrino, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Alberto Dines e Rubem Braga. Os passos seguintes são o jornal A Noite e o início do livro Perto do Coração Selvagem - segundo ela, um processo cercado pela angústia. O romance a persegue. As idéias surgem a qualquer hora, em qualquer lugar. Nasce aí uma das características do seu método de escrita - anotar as idéias a qualquer hora, em qualquer pedaço de papel. 
Em 43, conhece e casa-se com Maury Gurgel Valente, futuro diplomata. O casamento dura 15 anos. Dele nascem Pedro e Paulo. No ano seguinte, ela publica Perto do Coração Selvagem. Em plena Segunda Guerra Mundial, o casal vai para a Europa. Perto do Coração Selvagem desnorteia a crítica literaria. Há os que pretendem não compreender o romance, os que procuram influências - de Virgínia Wolf e James Joyce, quando ela nem os tinha lido - e ainda os que invocam o temperamento feminino. Influências?
Perto do Coração Selvagem recebe o prêmio da Fundação Graça Aranha. Nas palavras de Lauro Escorel, as características do romance revelam uma "personalidade de romancista verdadeiramente excepcional, pelos seus recursos técnicos e pela força da sua natureza inteligente e sensível". Já no primeiro livro, identifica-se o estilo muito pessoal da escritora. Nas páginas, Clarice explora pela primeira vez a solidão e a incomunicabilidade humana, através de uma prosa inquieta, próxima da poesia em determinados momentos.
Rumo à Europa, os Gurgel Valente passam por Natal. De lá para Nápoles. Já na saída do Brasil, Clarice mostra-se dividida entre a obrigação de acompanhar o marido e ter de deixar a família e os amigos. Quando chega à Itália, depois de um mês de viagem, escreve: "Na verdade não sei escrever cartas sobre viagens, na verdade nem mesmo sei viajar". Clarice permanece em Nápoles até 1946. Durante a II Guerra, presta ajuda num hospital de soldados brasileiros. Uma dúvida: um serviço prestado como cidadã brasileira ou como mulher de um diplomata brasileiro? Como escritora, ela sente a presença do sucesso. Por telegrama, sabe do prêmio recebido pelo romance deixado no Brasil. Mantém uma correspondência constante com os amigos que deixara para trás. 
Em Nápoles, em 44, conclui O Lustre, livro iniciado no Brasil e que seria publicado em 1946. Virgínia, a personagem principal de O Lustre, tem a história narrada desde a infância e também aparece sob o signo do mal, tal como Joana, personagem do primeiro romance. Em O Lustre, Virgínia mantém um relacionamento incestuoso com o irmão, Daniel, com quem faz reuniões secretas em que experimentam verdades, na condição de iniciados especiais. Nessa época, Clarice Lispector se corresponde com Lúcio Cardoso, que não gosta do título do livro: acha-o "mansfieldiano" e um pouco pobre para pessoa tão rica como Clarice. 
“ Eu escrevo simples. Eu não enfeito. “
Manuel Bandeira, que publicara Poesias Completas e Poemas Traduzidos e enviara os exemplares para Clarice na Europa, pede, em 1945, alguns de seus poemas para serem publicados. 
Quando O Lustre é lançado, Clarice está no Brasil, onde passa um mês. De volta à Europa, transfere-se para a Suiça, "um cemitério de sensações", segundo a escritora. Durante três anos, passa por dificuldades em relação à escrita e à vida pessoal. Em 46, tenta iniciar A Cidade Sitiada, livro que sairia em 49. Vendo-se impossibilitada de escrever, coleciona frases de Kafka, referentes a preguiça, impaciência e inspiração. Para Clarice, a vida em Berna é de miséria existencial. A Cidade Sitiada acaba sendo escrito na Suíça. Na crônica "Lembrança de uma fonte, de uma cidade", Clarice afirma que, em Berna, sua vida foi salva por causa do nascimento do filho Pedro e por ter escrito um dos livros "menos gostados". Terminado o último capítulo, dá à luz. Nasce então um complemento ao método de trabalho. Ela escreve com a máquina no colo, para cuidar do filho. 
O período na Suíça caracteriza-se pela saudade do Brasil, dos amigos e das irmãs. A correspondência que recebe não lhe parece suficiente. Até 52, escreveria contos, gênero em que Clarice Lispector talvez não tenha sido alcançada na literatura brasileira. Alguns Contos foi publicado em 52, quando ela já tinha deixado Berna, passado seis meses na Inglaterra e partido para os Estados Unidos, acompanhando o marido.
Em 1950, na Inglaterra, Clarice inicia o esboço do que viria a ser A Maçã no Escuro, livro publicado em 61. Antes de se fixar em Washington ela passa pelo Brasil. Trabalha novamente em jornais, entre maio e setembro de 52, assinando a página "Entre Mulheres", no jornal O Comício, no Rio, sob o pseudônimo de Tereza Quadros. Em setembro vai para os Estados Unidos, grávida. Durante os oito anos de permanência no país, vem ao Brasil várias vezes. Em fevereiro de 53, nasce Paulo. Ela continua a escrever A Maçã no Escuro, em meio a conflitos domésticos e interiores. Mãe, Clarice Lispector divide seu tempo entre os filhos, A Maçã no Escuro, os contos de Laços de Família e a literatura infantil. O primeiro livro para crianças seria O Mistério do Coelhinho Pensante , uma exigência do filho Paulo. A obra ganharia o prêmio Calunga, em 67, da Campanha Nacional da Criança. Ela ainda escreveria três livros infantis: A Mulher que Matou os Peixes, A Vida Íntima de Laura e Quase de Verdade. Nos Estados Unidos, Clarice Lispector conhece Érico e Mafalda Veríssimo, dos quais torna-se grande amiga. Veríssimo e família retornam ao Brasil em 56. Entre os escritores, inicia-se uma vasta correspondência. No primeiro semestre de 59, o casal Gurgel Valente decide-se pela separação. Clarice volta a morar no Rio de Janeiro, com os filhos. Sobre o "conciliar" casamento/literatura, afirmava que escrevia de qualquer maneira, mas o fato de cumprir o seu papel como mulher de diplomata sempre a enjoou muito. Cumpria a obrigação. Nada além. Na volta ao país, mais um período de dificuldades afetivas e financeiras. 
Ela prefere a solidão ao círculo que tinha relação com o ex-marido.
O dinheiro que recebia como pensão não era suficiente, nem os recursos arrecadados com direitos autorais. Clarice retorna ao jornalismo. Escreve contos para revista Senhor, torna-se colunista do Correio da Manhã, em 59, e, no ano seguinte, começa a assinar a coluna Só para Mulheres, como "ghost writer" da atriz Ilka Soares no Diário da Noite. A atividade jornalística seria exercida até 1975. No final dos anos 60, Clarice faz entrevistas para a revista Manchete. Entre 67 e 73 mantém uma crônica semanal no Jornal do Brasil, e, entre 75 e 77, realiza entrevistas para a Fatos & Fotos. 
"Nasci para escrever. Cada livro meu é uma estréia penosa e feliz. Essa capacidade de me renovar toda à medida que o tempo passa é o que chamo de viver e escrever." 
A década de 60 principia com a publicação do livro de contos Laços de Família. Seguiriam-se as publicações de A Maçã no Escuro, em 61, livro que recebeu o Prêmio Carmen Dolores Barbosa, A Legião Estrangeira, em 62, e A Paixão Segundo G.H., em 64. 
Neste ultimo, uma escultora de classe alta, que mora num apartamento de cobertura num edifício do Rio, resolve arrumar o quarto de empregada, cômodo que supõe, seja o mais sujo da casa, o que não é verdade. O quarto é claro e límpido. Entre várias experiências desmistificatórias, a crucial: abre a porta do guarda-roupa e se vê diante de uma barata. 
Embora afirme que o livro não tem nada de experiência pessoal, admite que a obra fugira do seu controle... 
"É um romance com uma personagem de nome desconhecido, indiciado apenas pelas primeiras letras, e que, como freqüentemente acontece nos textos de Clarice, representa a questão do nomear e do percurso que se experimenta nessa procura do nome ou da própria identidade. Esse percurso doloroso e prazeroso, espécie de via sacra que se chama paixão, estende-se até um ponto máximo, na união temporária entre o eu e o outro. Apenas G.H., que conta a alguém o que lhe aconteceu no dia anterior, criando um interlocutor imagináriocomo recurso que lhe dê coragem para fazer o relato." Nádia Gotlib
Entre 65 e 67, Clarice dedica-se à educação dos filhos e com a saúde de Pedro, que apresenta um quadro de esquizofrenia, exigindo cuidados especiais. Apesar de traduzida para diversos idiomas e da republicação de diversos livros, a situação econômica de Clarice é muito difícil. Em setembro de 67, acontece o acidente que deixa marcas no corpo e na alma da escritora - um incêndio no quarto que ela tenta apagar com as mãos. Fica gravemente ferida, passa 3 dias entre a vida e a morte. Três dias definidos por ela como "estar no inferno." 
"Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas, continuarei a escrever." 
Em 69, publica o romance Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres. Em 71, a coletânea de contos Felicidade Clandestina, volume que inclui O Ovo e a Galinha, escrito sob o impacto da morte do bandido Mineirinho, assassinado pela polícia com treze tiros, no Rio de Janeiro
Os últimos anos de vida são de intensa produção: A Imitação da Rosa (contos) e Água Viva (ficção), em 1973; A Via Crucis do Corpo (contos) e Onde Estivestes de Noite, também contos, em 74. Visão do Esplendor (crônicas), em 75. Nesse ano, é convidada a participar, em Bogotá, do Congresso Mundial de Bruxaria. Sua participação limita-se à leitura do conto O Ovo e a Galinha. No ano seguinte, Clarice Lispector recebe o 1° prêmio do X Concurso Literário Nacional, pelo conjunto da obra. 
"Ninguém me entendia. Agora me entendem. A que você atribui isso? Eu não sei... que eu saiba não fiz concessões." 
Em 77, concede entrevista à TV Cultura, com o compromisso de só ser transmitida após a sua morte. Ela antecipa a publicação de um novo livro, que viria a se chamar A Hora da Estrela, adaptado para o cinema nos anos 80 por Suzana Amaral
Clarice morre, no Rio, no dia 9 de dezembro de 1977, um dia antes do seu 57° aniversário. Queria ser enterrada no Cemitério São João Batista, mas era judia. O enterro aconteceu no Cemitério Israelita do Caju.
Postumamente, foram publicados Um Sopro de Vida, Para Não Esquecer e A Bela e a Fera. 
CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS
Com seu primeiro romance, Perto do Coração Selvagem , Clarice desperta estranhamento e surpresa em alguns críticos, precisamente porque sua obra não se enquadrava em qualquer programa dos modernistas, nem dos regionalistas do período anterior.
O trabalho da escritora é complexo e identificado como o ponto mais alto da segunda fase do Modernismo. O tema dominante versa sobre a necessidade que o homem tem de amparar-se na linguagem para suportar o desamparo diante do universo, recoberto pelo silêncio intraduzível.
A tarefa da escritora é aprisionar esse silêncio e dar-lhe sentido. Esse trabalho exige contínuas retomadas que vão criando um discurso paradoxal, transitório, assim definido por Benedito Nunes: "o sentido erra entre o exprimível dos significantes e o inexprimível do significado".
Nas obras de Clarice se destacam: o emprego intenso da metáfora, o fluxo da consciência e o rompimento com o enredo. No conjunto, essa técnica colabora para a visitação do mundo interior das personagens, sempre manifestado pela subjetividade em crise. A memória serve de elo condutor entre o subjetivo e o "real", favorecendo à auto-análise, numa espécie de "um contínuo denso de experiência existencial".
Essa experiência resulta em despersonalização das personagens, diante da impossibilidade da representação do mundo e do quotidiano, enquanto buscam o centro de si mesmas. É, pois, uma queda no vazio, provocadora de horror, como em A Paixão Segundo G.H. Seus temas mais comuns são: a relação entre o bem e o mal, a culpa, o crime, o castigo e o pecado.
 				
PRINCIPAIS OBRAS
Romances
Perto do Coração Selvagem (1943); O Lustre (1946); A Cidade Sitiada (1949); A Maçã no Escuro (1961); A Paixão Segundo GH (1964); Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres (1969); Água Viva (1973); A Hora da Estrela (1977).
Contos
Alguns Contos (1952); Laços de Família (1960); A Legião Estrangeira (1964), contos e crônicas; Felicidade Clandestina (1971); A Imitação da Rosa (1973); A Via Crucis do Corpo (1974); Onde Estivestes de Noite? (1974); A Bela e a Fera (1979).
Crônicas e entrevistas
De Corpo Inteiro (1975), entrevista; Visão do Esplendor (1975) crônicas; A Descoberta do Mundo (1984) crônicas.
Infantil
O Mistério do Coelho Pensante (1967); A Mulher que Matou os Peixes (1969); A Vida Íntima de Laura (1973); Quase de Verdade (1978).
Especial
Cartas perto do Coração (2001)(correspondência com Fernando Sabino);  Correspondências (2002).
FONTES : Alô Escola / TV Cultura
 www.nilc.icmsc.sc.usp.br/literatura/claricelispector.htm
Materiais disponíveis na Videoteca
 " Clandestina Felicidade " / curta metragem (1998) 		14’ Fita 104
Livre adaptação do conto Felicidade Clandestina, reconta a infância de Clarice pelas ruas do Recife .
 " A Hora da Estrela " / filme (1985) 				95’ 		 Fita 104
Da obra homônima.
 " Cine Jornal – CL, 25 Anos de Saudades" / (2002) 		22’ 	 Fita 105
Enfatiza as obras que foram adaptadas para o cinema e o teatro. 
 " Ruído de Passos" / curta metragem (1995)			11’ 	 Fita 105
Baseado no conto homônimo. 
 " Clarice Lispector" / (2002) 					42’ 	 Fita 105
Episódio da série 30 Anos Incríveis (TV Cultura) , trazendo entrevista concedida a Júlio Lerner, no programa Panorama, em 01.02.77, e depoimentos de Nádia Battella Gotlib , autora de "Clarice, uma vida que se conta", da Editora Ática.
 " Chamada Final" / curta metragem (1994)				32’ 	 Fita 105
Episódio nacional de Erotique (produção que contém 4 curtas de países diferentes), baseado no conto A Língua do P.
FERREIRA GULLAR (1930 - )
Renato Roschel
A Poesia Social surge em 1957, como forma de reação contra os excessos formais do concretismo, ela é mais comunicativa e voltada para os problemas do país. Fazem parte desse grupo Ferreira Gullar, Thiago de Melo, Affonso Ávila e Jamil Haddad.
Em suas obras, Ferreira Gullar, inicialmente, voltou-se aos experimentos concretistas, passando depois a uma opção participante, de uso da poesia como denúncia e crítica. Empregando muitas vezes ritmos e temas da literatura de cordel, Gullar põe a nu as tensões sociais, expondo forte conteúdo ideológico.
"A história humana não se desenrola apenas nos campos de batalha e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos quintais, entre plantas e galinhas; nas ruas de subúrbio, nas casas de jogo, nos prostíbulos, nos colégios, nas ruínas, nos namoros de esquina. Disso quis eu fazer a minha poesia, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não têm voz".
José Ribamar Ferreira, o Ferreira Gullar, nasceu a 10 de setembro de 1930, em São Luís Maranhão. Em outubro deste mesmo ano, Getúlio Vargas lideraria um movimento revolucionário que iria depor o presidente Washington Luís e encerraria o período da República Velha.
Em 1937, quando José Ribamar ainda era um garoto que corria pelas ruas de São Luís, o mesmo Getúlio Vargas dá um novo golpe e instaura a ditadura do Estado Novo. É também em 1937 que José Ribamar passa a freqüentar as aulas particulares de ensino primário no Colégio São Luís de Gonzaga. José Ribamar concluiria o ensino primário em 1941.
Durante seu primário no Colégio São Luís, o mundo onde vivia o menino José Ribamar entrou na sua 2ª Guerra Mundial, mais exatamente em 1939.Em 1942 o Brasil entra na Guerra do lado dos aliados, nesse mesmo ano, José Ribamar classifica-se em segundo lugar no exame de admissão do Ateneu Teixeira Mendes, mas não chega a terminar o ano neste colégio, pois passaria a freqüentar a Escola Técnica de SãoLuís, na qual estudou de 1943 até 1947.
No ano seguinte José Ribamar começa a trabalhar como locutor na rádio Timbiras e a colaborar no Diário de São Luís. Já com o pseudônimo de Ferreira Gullar publica Um Pouco Acima do Chão.
O ano de 1950 foi agitado para o jovem Ferreira Gullar, neste ano ele participou de uma campanha política de oposição ao governo do Estado, perdeu o emprego de locutor e venceu, com o poema "Galo", um concurso literário de âmbito nacional promovido pelo Jornal de Letras.
No ano seguinte, 1951, Gullar muda-se para o Rio de Janeiro para trabalhar na revista IAPC (Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Comerciários) e em O Cruzeiro. Seu livro A Luta Corporal é publicado em 1954.
Em 1956, Ferreira Gullar estabelece contato com o grupo de concretistas de São Paulo; trabalha, nesse período, como revisor e editor da revista Manchete, depois na redação do Diário Carioca e mais adiante inicia, com Oliveira Bastos, o Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, no qual seria publicado, em 1959, a Teoria do Não-Objeto.
Foi diretor da Fundação Cultural, em Brasília, durante o ano de 1961. Em 62 integrou o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, chegando a ser eleito presidente do mesmo no ano seguinte.
Em 1964, após o Golpe Militar, Ferreira Gullar funda o grupo Opinião junto com Oduvaldo Viana Filho, Paulo Pontes, Armando Costa e outros. Em 1966, escreveu, com Oduvaldo Viana Filho, a peça teatral Se Correr o Bicho Pega, se Ficar o Bicho Come.
Com o recrudescimento do Governo Militar, em 1968, através da instalação do Ato Institucional nº 5 que fechou o Congresso, cassou mandatos, suspendeu direitos políticos e levou Gullar à prisão, junto com Paulo Francis, Caetano Veloso, Gilberto Gil e outros artistas e intelectuais.
Em 1969, publica o ensaio Vanguarda e Subdesenvolvimento, no ano seguinte, inicia-se para Gullar um período de clandestinidade, no qual arrefeceu sua ação política, exercida essencialmente no setor artístico.
Em 1971, Gullar vai embora para Paris. Até 1976 morará ainda no Chile, Peru e Argentina; do exílio escreve para imprensa brasileira (seus artigos em O Pasquim eram assinados com o pseudônimo de Frederico Marques).
Volta ao Brasil em 1977 e reassume suas atividades de jornalista, poeta e crítico. Passa também a escrever para a televisão -as histórias vividas por Pedro e Bino, personagens centrais da série Carga Pesada, foram escritas por Gullar, assim como a novela Araponga, de 1990.
Entre 1992 e 1994, Ferreira Gullar foi presidente da Funarte. Em 2000 Ferreira Gullar recebeu o Prêmio Jabuti por seu belíssimo livro de poemas, "Muitas Vozes", de 1999. Ferreira Gullar é hoje o maior poeta vivo de nossa língua. Sua grande poesia, calada por 12 anos, anteriores à publicação de seu último livro "Muitas Vozes", foi um silêncio de depuração e hoje o que temos é um poema com um dos melhores livros de poesia dos últimos tempos e uma obra fantástica e convidativa.
Sua poesia é o meio com o qual indaga e compreende o mundo. É um conhecer e um descobridor do mundo pela poesia, tudo que sabe é pela poesia, a poesia é seu caminho, seu veículo e seu destino. Ferreira Gullar é, como ele mesmo escreveu, "um poeta do Nordeste brasileiro, um poeta do Maranhão, da cidade de São Luís do Maranhão. Sou um poeta da Rua do Coqueiro, da Rua dos Afogados, da Quinta dos Medeiros, do Cao-Osso, da Rua do Sol e da Praia do Caju".
Ferreira Gullar é um representante dos seus, um propagandista da vida dura dos nordestinos, "um poeta da casa do quitandeiro Newton Ferreira, da casa de dona Zizi, irmão de Dodo e de Adi, de Newton, de Nélson de Alzirinha, de Concina, de Norma, de Consuelo, amigo de Esmagado e de Espírito da Garagem da Bosta. Um foragido e um sobrevivente. Alguém que conseguiu escapar do anonimato, que vem do sofrimento menor, da tragédia cotidiana e obscura que se desenrola sob os tetos de minha pátria, abafada em solução; a tragédia da vida-nada, da vida-ninguém. Se algum sentido tem o que escrevo, é dar voz a esse mundo sem história".
Ferreira Gullar é um homem-povo como poucos, aglutina aquilo que lhe é mais peculiar para tornar-se cada vez mais multidão. É uma jóia rara em um país onde se produz milhares de pessoas analfabetas. Gullar é uma exceção que não se cala, um homem que tornou-se um dos maiores expoentes da literatura de um país com mais de 30 milhões de analfabetos que não podem lê-lo e dos quais ele tanto fala.
Mistura de homem comum e poeta crivado de indagações, artista perplexo e crítico radical, Ferreira Gullar tem a força daqueles que podem implodir a linguagem poética. Atualmente ele representa com seu espírito crítico a tão necessária intelectualidade indagadora e polêmica, em um país de índices sociais tão medíocres como o nosso. 
Às vezes sua capacidade de síntese e contenção o tornam um legítimo drummondiano, como no poema "Dentro sem Fora" de seu livro Barulhos:
A vida está
Dentro da vida
e si mesma circunscrita
sem saída.
Nenhum riso
nem soluço
rompe 
a barreira de barulhos.
A vasão
é para o nada.
Por conseguinte
não vasa.
Gullar mostra em sua obra que quanto mais o poeta se aprofunda em sua arte mais ela se mostra indecifrável, chega a afirmar que " a poesia é a verdade que emociona, comove. Não adianta ser verdade se não é dito de maneira a emocionar as pessoas. Então sem emoção não há poesia. Quanto mais a gente se aprofunda no problema poético, a gente vê a impossibilidade de defini-lo. A emoção não é poética é tanto mais profunda quanto mais densa é a expressão contida".
É por causa da falta de emoção que Ferreira Gullar abandonou a poesia concreta. Gullar afirma que os seus poemas da fase concreta "possuem um enorme esforço para incutir numa linguagem ascética o máximo de emoção. Certamente os meus poemas concretos foram os menos frios que foram escritos. Istoprovocou meu rompimento com o grupo concretista. Percebi que o meu esforço era para colocar emoção no poema, justamente o esforço um esforço inverso ao dos outros que queriam o poema cada vez mais cerebral, irracionalista."
Depois da saída de Gullar do concretismo, fez-se então a dissidência que resultaria mais tarde no neo-concretismo. Na verdade o novo movimento não foi muito adiante porque os próprios dissidentes, especialmente Gullar, perceberam a posteriori que a experiência excluía a emoção.
Em 2002, teve seu nome indicado para o Prêmio Nobel de Literatura. A indicação ocorreu graças a amigos e intelectuais que o inscreveram, mesmo à sua revelia. 
Obras mais importantes: 
A Luta Corporal (1954)
Poemas (1958, poesia)
 João Boa-Morte: Cabra Marcado pra Morrer (1962, poesia)
 Se Correr o Bicho Pega, se Ficar o Bicho Come (1966, teatro, em co-autoria com Oduvaldo Viana Filho)
 Dentro da Noite Veloz (1975, poesia)
 Poema Sujo (1976, poesia)
 Na Vertigem do Dia (1980, poesia)
 Barulhos (1987, poesia)
 "Muitas Vozes" (1999, poesia).
Materiais disponíveis na Videoteca
 " O Canto e a Fúria " / documentário (1994) 			54’ 	 Fita 106
Documentário em vídeo com depoimentos de Ferreira Gullar, direção de Zelito Viana. Sempre no mesmo cenário, Gullar fala de todas as fases de sua obra: conta casos engraçados como o fracasso do "Poema enterrado", criado com Hélio Oiticica; explica a opção que fez pela poesia política no início dos anos 60; e ainda lê alguns de seus poemas preferidos.
 " O Maranhão de Ferreira Gullar " / documentário (1997) 	28’ 	 Fita 106
Episódio da série Expresso Brasil . Conheça a arte, os costumes, os mitos, as lendas, as características geográficas e históricas do estado natal de FL, ciceroneado por ele mesmo. 
 " Ferreira Gullar " / programa (2000) 				30’ 	 Fita 106
Programa da série Revista Literária, que mostra um diálogo entre Ivan Junqueira, poeta e ensaísta, e Ferreira Gullar 
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EUCLIDES DA CUNHA (1866-1909)Em 1896, no sertão da Bahia, teve início um dos acontecimentos mais impressionantes e sangrentos de toda a história do Brasil: a Campanha de Canudos. Quatro expedições foram enviadas durante um ano contra mais de vinte mil habitantes da região: índios, mulatos, caboclos, pretos... sertanejos dirigidos pelo beato Antônio Conselheiro e munidos apenas de paus, pedras e armas rústicas. Os soldados traziam metralhadoras, granadas e canhões. Estavam poderosamente armados e eram numericamente muitas vezes superiores aos revoltosos, mas perdiam todas as batalhas. A resistência do sertanejo assombrava o país, e a derrota de Canudos tornou-se para o Exército e para a República uma questão de honra nacional. 
Época de mudanças 
A passagem da monarquia para a república, no final do século XIX, foi um período de muita agitação nacional. A libertação dos escravos em 1888 fora o golpe fatal na monarquia. No ano seguinte, o golpe militar do dia 15 de novembro, liderado pelo marechal Deodoro da Fonseca, proclamou a República. O novo regime trazia a promessa de uma organização de homens livres e iguais perante a lei. As eleições democráticas dariam a todos o direito político de escolher seus dirigentes, e o trabalho livre traria salários. Eram mudanças radicais, que pareciam acabar com antigos privilégios. Já se esperava um levante monarquista. Mas nunca de um grupo de desvalidos... Canudos representou o imprevisto. Para o governo, o nordeste só poderia se beneficiar com a nova ordem. No entanto, em pleno sertão, homens lutavam até a morte em nome dessa rejeição. 
O desconhecido sertão 
Até o início da guerra, as elites do litoral e do sul ignoravam o que fosse o sertão: uma estranha pátria sem dono, abandonada pelas leis e instituições, vivendo sob o jugo da terra e dos latifundiários. Para compreender a revolta era necessário que o sertão viesse à tona, numa nova tradução. Foi essa a grande proeza do jornalista e engenheiro militar Euclides da Cunha, ao publicar seu livro "Os Sertões", em 1902. Uma obra contundente, que destruía o sonho brasileiro da república e da civilização branca europeizada. O livro "Os Sertões" nasceu de uma reportagem sobre a Guerra de Canudos para o jornal "O Estado de São Paulo". Euclides da Cunha foi cobrir o evento, em 1897, como enviado de guerra.
Até a Campanha de Canudos, Euclides da Cunha foi um defensor incondicional do novo regime. Sua história se confunde em muitos momentos com a própria história da República. No Colégio Aquino, onde cursou o secundário, foi aluno do grande mentor republicano Benjamim Constant. Logo depois, Euclides ingressou no exército - onde chegou a tenente - e também na Escola Militar do Rio de Janeiro, que formava engenheiros para a construção de estradas, portos e pontes. O exército, influenciado pelo positivismo de Augusto Comte, se organizava enquanto classe. Ainda não era republicano como conjunto, mas Euclides da Cunha sim. Ainda em 1888, num ato de rebeldia, o escritor lançou sua espada aos pés do ministro da Guerra, um monarquista. Foi preso e expulso das fileiras militares. Logo depois, quando foi proclamada a República, esse ato o transformou em herói. Euclides da Cunha fazia parte de uma elite militar que se impôs depois da Guerra do Paraguai. Nomes como marechal Floriano Peixoto e general Moreira César passavam a fazer história. Estariam entre os responsáveis pela implantação do novo regime.
Republicano apaixonado, o escritor desembarcou no dia 7 de setembro em Monte Santo - base da operação militar - ao lado do ministro da Guerra, general Machado Bittencourt. Pensava defender a república contra um levante bárbaro e monarquista. A quarta Campanha contra Canudos estava no final. E Euclides da Cunha jamais seria o mesmo. Caberia a ele questionar a república que se formava e ser um dos maiores críticos do Exército brasileiro.
Um homem de personalidade obsessiva e passional: assim foi o escritor Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha. Desde muito cedo levou uma vida errante e aventureira. Muitas vezes como jornalista, outras como engenheiro e militar, viajou por todo o país. Escreveu dois livros de ensaios; "Contrates e Confrontos", de 1907, "A Margem da História", de 1909, e um relatório técnico, "Peru versus Bolívia", de 1907. Mas sua grandeza como escritor deve-se a "Os Sertões".
	 Toda a sua obra é marcada por suas viagens. Além do nordeste, visitou o norte do Brasil, onde chefiou a comissão brasileira que atuava na demarcação das fronteiras. Conheceu de perto e num curto intervalo de tempo o "inferno verde da Amazônia" e o "saara vermelho" do sertão e da seca nordestina. Foi um dos primeiros escritores brasileiros a mostrar a miséria e o isolamento a que estava condenada parte dessas populações. Desenvolveu uma literatura das massas marginalizadas do país sem confissões ou excessos emocionais . 
Euclides da Cunha nasceu em 20 de janeiro de 1866, na fazenda Saudade, no município de Cantagalo, estado do Rio de Janeiro. Morreu no bairro da Piedade, aos 42 anos, assassinado pelo jovem cabo Dilermando Reis, amante de sua mulher, Ana Maria Cunha, filha do Coronel Sólon Ribeiro, importante personalidade da República. A vida de Euclides da Cunha foi marcada pela tragédia. Órfão de mãe aos 3 anos de idade, foi entregue aos cuidados de vários parentes. Do Rio de Janeiro foi para Salvador e depois para São Paulo. Sua vida era feita de diferentes casas, bairros e afetos entrecortados; sua mente, uma sucessão de múltiplas paisagens. Composições que só ajudariam o geógrafo, o sociólogo e o antropólogo surpreendente que ele se revelaria anos mais tarde. Desde muito cedo Euclides da Cunha foi tido como gênio por seus contemporâneos. Sua mente lúcida impressionava. Apesar do temperamento arredio e turbulento, sempre soube preservar as amizades. Foi amigo de intelectuais e de gente poderosa como o barão do Rio Branco. Mas nunca conheceu o afeto feminino.
Em Canudos, ao acompanhar a luta de perto, Euclides da Cunha logo percebeu que a guerra tinha como razões aparentes o fanatismo religioso, o messianismo e o sebastianismo sertanejos. Suas razões profundas eram o latifúndio, o coronelismo, a servidão, o isolamento cultural e a dureza do meio. Ele foi o primeiro escritor brasileiro a diagnosticar o subdesenvolvimento do Brasil, referindo-se à existência de dois países contraditórios: o do litoral e o do sertão. Canudos resultou do confronto entre esses dois Brasis, distintos entre si no espaço e no tempo, pelo atraso de séculos em que vivia mergulhada a sociedade rural.
	 Euclides da Cunha revelou ao Brasil o que ninguém até então conhecia: que o sertão é um só, uma pátria independente. Canudos é uma síntese perfeita, em escala reduzida, dos aspectos predominantes dos sertões do norte. Os sertões de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Piauí. Mostrou, com isso, que a Guerra de Canudos não foi apenas um acontecimento local, mas um grito de revolta de todo o sertão brasileiro. 
O escritor estruturou sua obra em três partes: "A Terra", "O Homem" e " A Luta". Ele só fala do conflito depois de levantar dados geográficos e culturais da região de Canudos e do Brasil. Ainda que o capítulo sobre a luta seja o mais lido e conhecido, a grande contribuição do escritor foi justamente a descrição detalhada que ele fez, em capítulos diferentes, da terra e do homem. O capítulo "A Terra" é um dos mais singulares da prosa brasileira. De forma literária, examina a constituição geográfica do continente americano e da região de Canudos. São estudados o solo, a flora, a fauna e o clima. Euclides da Cunha mostrou que todos os reveses sertanejos estão ligados à terra, desde a opressão semifeudal do latifúndio até a ignorância e o isolamento a que esta parte do Brasil sempre esteve condenada. E evidenciou que nada supera a principal calamidade do sertão: a seca. Antes de se transformar no retirante estropiado que abandona a região, o sertanejo encara de frente a fatalidade e reage, numa luta indescritível. Nessahora ele não é mais o indolente ou o impulsivo violento, mas o herói que tem nos sertões, para todo o sempre perdidas, tragédias espantosas. A princípio ele reza. O seu primeiro amparo é de fé religiosa. Para ele, a seca é uma maldição. Euclides da Cunha apontou a coivara índia - prática de plantio por queimadas, que os sertanejos adotam - como uma das causas daquele deserto. Ali, a dor do homem vem do sofrimento milenar da terra. O escritor deixou registrado que as grandes secas do nordeste obedecem a um ciclo de 9 a 12 anos, desde o século XVIII, numa ordem cabalística. E até hoje esse fenômeno amplia o misticismo do matuto. O sertanejo se sente um abandonado numa terra barbaramente estéril e maravilhosamente exuberante. O escritor verificou estarrecido a transformação daquele deserto medonho nos poucos dias de chuva, quando as matas se cobrem de verde, o mandacaru floresce... e assistiu à transformação de espírito que essa mudança natural provoca na alma do sertanejo. O homem fechado e taciturno, seco como sua terra, transfigura-se em risos e comemorações. O sertão entra em festa.
Na paisagem inóspita,
um grande personagem: O SERTANEJO 
O sertão, com seus ventos bíblicos, calmarias pesadas e noites frias, impressiona. Cortado por veredas e árvores retorcidas em desespero, todo ele são monótonos caminhos de caatingas e areais ressequidos. As "pueiras", lagoas mortas, de aspectos lúgubres, são o único oásis do sertanejo. A serra de Monte Santo, com seus tons azulados, é uma cortina de muralha monumental. As conformações rochosas, no ermo vazio do Bendegó, dão a ilusão de ruínas antigas. Os grandes desmoronamentos rochosos do sertão lembram "mares de pedras". Os rios salgados, quando secam, parecem um fundo de mar extinto, uma impressão acentuada pelos fenômenos ópticos do calor. Isso reforça a mítica sertaneja de que "um dia o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão". 
No sertão, a começar pelo solo e clima, tudo é adverso. O sertanejo sobrevive porque é uma raça forte. Assim como o cacto mais resistente, ele foi feito para o sertão. Tem o pêlo, o corpo e a psicologia próprios para suportar o suplício da seca. Conhece profundamente a flora e fauna. 
	 Sabe o nome e as vantagens de cada cacto, de cada mandacaru, de cada xiquexique. Seus pássaros: o carcará, o acauã... a asa branca. E a natureza que ele tanto ama é sua aliada na luta pela sobrevivência. Desidratado como as plantas, consegue viver dias só com o trivial e um copo d'água. E ama o sertão. Não se habitua a outro lugar. O sertão o destrói e hipnotiza. É o homem rude e sereno acostumado desde muito novo com a morte. Um resistente num lugar onde quase só existe deserto e onde a água é uma miragem.
"O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços do litoral. A sua aparência, entretanto, no primeiro lance de vista, revela o contrário(...). É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasimodo (...) é o homem permanentemente fatigado (...) Entretanto, toda essa aparência de cansaço ilude (...) No revés o homem transfigura-se . (...) e da figura vulgar do tabaréu canhestro reponta, inesperadamente, o aspecto dominador de um titã acobreado e potente, num desdobramento surpreendente de força e agilidade extraordinárias." 					Trecho do livro "Os Sertões". 
Ao tentar compreender a psicologia do sertanejo, Euclides da Cunha fez um ensaio revelador sobre a formação do homem brasileiro. Desmistificou o pensamento vigente entre as elites do período, de que somente os brancos de origem européia eram legítimos representantes da nação. Mostrou que não existe no país raça branca pura, mas uma infinidade de combinações multirraciais. Previu um destino trágico para o Brasil, se o país continuasse a não levar em conta as diversas raças que o formaram. Mostrou que o Brasil tinha contradições e diferenças étnicas e culturais extremas. Concluiu que havia uma necessidade imperiosa de se inventar uma raça. Caso contrário, o Brasil seria candidato a desaparecer. Para Euclides da Cunha, a mestiçagem enfraquecia o indivíduo e implicava uma perda de identidade - um problema para a concepção de nação. Para ele, o mestiço do litoral é degenerado e o sertanejo, retrógrado. No caso do sertão, porém, considerou que só esse mestiço se adaptaria à região.
Sertanejo: origens
No sertão, a mistura de raças deu-se mais entre brancos e índios. O jesuíta, o vaqueiro e o bandeirante foram os primeiros habitantes brancos que migraram para a região. Deram origem aos tipos populares que compõem o sertão: o beato, o cangaceiro e o jagunço. Ali estão todos, com suas vestes características, seu apego às tradições mais remotas, o sentimento religioso levado até o fanatismo e o seu exagerado senso de honra. 
"Eu tenho orgulho de ser filha de Canudos! Tenho orgulho, mesmo! Me sinto feliz com essa palavra: Canudos não se rendeu ! Morreram todos, mas não se renderam!... D. Zefinha. 
Tanto o cangaceiro quanto o jagunço são guerreiros. Homens de armas. O cangaceiro age em bando e por conta própria, vive como andarilho pelo deserto, obedecendo às leis do chefe do bando. O jagunço muitas vezes age sozinho. Protege alguém, que tanto pode ser um coronel como uma pessoa com quem tem uma dívida de honra. O fazendeiro dos sertões vive no litoral, longe de suas propriedades; quem cuida de suas terras é o vaqueiro, de fidelidade assombrosa e submissão inconsciente e servil. Mas na adversidade sua roupa de couro pode se tornar a armadura de jagunço. Qualquer vaqueiro sabe lutar e lidar com armas. Oculta em si o guerreiro. As sertanejas são diferentes das mulheres do litoral: são rezadeiras, rendeiras, mocinhas ingênuas, bruxas velhas e alcoviteiras. Mulheres de coragem e encrenqueiras. 
"Algumas mulheres lá em Canudos eram terríveis! Brigavam na trincheira, mulheres brigando a bem do Conselheiro!" Ioiô da Professora. 
A devoção do matuto
Descendentes dos antigos jesuítas, os padres, os beatos e os conselheiros dão conselhos e são beatos da categoria mais alta entre a população. Padres e beatos podem se tornar líderes messiânicos como o padre Cícero, de Juazeiro do Norte, de grande influência no sertão. Rebeliões religiosas são constantes na história do sertão: um universo primitivo, impregnado de um fanatismo rude e impressionante, originário, segundo o autor, "do que existe de pior nas crenças místicas das três raças que o formaram". Sob tais influências, o matuto vai da extrema brutalidade ao máximo devotamento. Apesar da coragem, acredita em todos os mal-assombramentos. Está propenso a ser um "desvairado pelo fanatismo e um transfigurado pela fé." Por isso é um seguidor de messias fanáticos que o arrastam e endoidecem.
Euclides da Cunha mostrou que um universo de tal natureza era governado por leis próprias. Demonstrou que a Campanha de Canudos foi absurda, pois a população não era monarquista, como o exército acreditava. Pregar contra a república era apenas uma variante do delírio religioso de Antônio Conselheiro. Uma sociedade tão primitiva era incapaz de compreender tanto a forma republicana como a monarquia constitucional. Só aceitava o império de um chefe sacerdotal ou guerreiro. Conselheiro foi esse chefe sacerdotal. Anos mais tarde, o cangaceiro Lampião seria o chefe guerreiro.
Antônio Conselheiro: um herói popular 
Antônio dos Mares, Santo Antônio Aparecido, Bom Jesus Conselheiro ou apenas Antônio Conselheiro foi um dos maiores lideres sertanejos de todos os tempos. Foi um asceta do século II D.C. em plena era industrial. Um mito. Seus seguidores o consideravam divino, com poderes e milagres próprios de um santo. Era também a lei. Sua vontade e seus princípios eram ordens. E sua vida pessoal aos poucos foi dando lugar a lendas de originalidade trágica, que até hoje circulam pelo sertão. 
"Antônio Conselheiro morava em Pernambuco e a mulher dele... se diz que toda a noite entrava um homem pela janela quando ele saía para pregar. Ele pregava e entrava um homem pela janela e dormiacom a mulher dele (...) Uma vez ele se escondeu... Comprou uma espingarda, se escondeu e quando deu 9 horas, o homem chegou na janela e entrou. Era a mãe dele, vestida de roupa de homem. Ele passou fogo e derrubou, e quando foi ver era a mãe dele com roupa de homem. Pra não ser preso, veio pro estado de Sergipe, do Sergipe veio pra Bahia, e aí inventou de fazer uma igreja no Canudos..." Alberto Gonçalves Teixeira, "Índio Alberto" - nascido em 1902. 
Antônio Vicente Mendes Maciel nasceu em Quixeramobim, Ceará, em 1830. Vinha de uma família turbulenta, mas era calmo e correto, avesso a confusão. Perdeu a mãe quando era pequeno e jamais matou alguém. Depois de casado, Antônio Vicente saiu de Quixeramobim, tornando-se caixeiro viajante. Sua vida de casado era um inferno, minando aos poucos seu equilíbrio e serenidade. Até que veio o golpe fatal: a mulher fugiu com um policial. Era o ano de 1860 e o alucinado Antônio Vicente, fulminado de vergonha, desapareceu no sertão. Queria o abrigo da absoluta obscuridade. E nesses 10 anos de andanças, deu-se a transformação. 
Com um camisão de brim azul, vivendo de esmolas e carregando numa mão mão um livro com a "Missão Abreviada" e na outra "As Horas Marianas", Antônio Conselheiro iniciou sua carreira de andarilho, como beato. Mas logo se transformou num condutor de sertanejos. Acompanhado por duas professas, entrava nas cidades rezando terços e ladainhas. Depois pregava, possuído por um furor místico que arrastava multidões.
Perseguição a Conselheiro
	 Ajudado pelo povo que o seguia, Antônio construía e restaurava igrejas. Levantava muros de cemitérios. Fundou povoados que se tornaram cidades, como o de Bom Jesus, atual Crisópolis, onde ainda hoje há uma igreja feita por ele. Pouco antes da seca de 1877, a maior do século XIX, começou a abrir tanques d'água. Em 1874, já apareceu na Bahia dando conselhos. Aí tomou definitivamente o nome de Conselheiro. E se firmou. A Igreja, sentindo-se desprestigiada, pediu em 1876 o afastamento do Conselheiro do sertão. 
"Então veio um grupo de oficiais que o levaram para Salvador (...) Ele disse ao povo que ia preso, mas que dentro de três dias, quatro, estava ali de novo". Ioiô da Professora. 
A prisão, na Zona de Itapicuru, foi o início das perseguições que ele sofreria, e também da sua consagração. Além de louco, Conselheiro foi acusado de matar a própria mãe. Quando se provou sua inocência, foi solto. Retornou no dia e hora que havia previsto. Era o início de uma série de profecias. Para o sertanejo, a comprovação de que estava diante de um poder divino: o milagreiro resignado e fatalista prometia a felicidade para depois do fim do mundo, marcado para 1900. 
"... Em 1896 há de rebanhos mil correr da praia para o sertão;
então o sertão virará praia e a praia virará sertão.
Em 1897 haverá muito pasto e pouco rastro e um só pastor e um só rebanho. 
Em 1898 haverá muitos chapéus e poucas cabeças.
Em 1899 ficarão as águas em sangue e o planeta há de 
aparecer no nascente com o raio do sol que o ramo 
se confrontará na terra e a terra em algum lugar se confrontará no céu... 
Há de chover uma grande chuva de estrelas e ali será o fim do mundo. 
Em 1900 se apagarão as luzes. Deus disse no evangelho: 
eu tenho um rebanho que anda fora deste aprisco e é preciso 
que se reúnam porque há um só pastor e um só rebanho!" 
Cantador imitando leitura de Antônio Conselheiro 
"Alguns jagunços foram presos. Ai Arthur Oscar disse: - Deixa eu experimentar esses home. Rapaz, você quer a liberdade? - Se o senhor me der, eu quero. - Vou lhe fazer uma proposta. Diga Viva a República! E morra Antônio conselheiro!" Ele disse: - Morra a República E viva Antônio Conselheiro! - Rapaz, eu vou lhe dar a liberdade! Diga direito. Ele diz: - Eu já disse! - Diga de novo: Viva a República! E morra Antônio Conselheiro! - Ele disse: "Viva o Conselheiro e morra a República!" - Leve ele pra degola, não tem jeito, não! E matava."
Ioiô da Professora. 
O livro "Os Sertões" levou cinco anos para ser escrito. Até a morte do autor, em 1909, sofreu alterações. Obra em eterno processo, foi escrita de forma apaixonada e contraditória. Concluída, tornou-se um dos maiores épicos da literatura brasileira e latino-americana, e um dos grandes livros da literatura universal, traduzido em 60 países e em idiomas como o japonês, o russo e o chinês. Misto de ensaio científico, panfleto e relato jornalístico, o livro impressiona por sua força estética. É fundamentalmente uma obra literária, de um gigantismo comparável aos "Lusíadas" de Luís de Camões ou mesmo "Dom Quixote", de Miguel de Cervantes, seja na construção dos tipos, seja no conteúdo trágico, seja no estilo. Sua linguagem tende para o solene e o monumental, mas é moderna no registro dos conflitos sociais, dos desvarios psíquicos e do heroísmo anônimo das populações sertanejas. A Guerra de Canudos foi um dos maiores genocídios da história do Brasil. Em nome da república foram cometidas atrocidades que sem o livro de Euclides da Cunha jamais seriam reveladas.
Conselheiro, imperador do sertão
	 Na curta estada em Monte Santo, cidade histórica do sertão baiano, Conselheiro e seu povo restauraram os muros da via sacra, formada por um rosário de 24 capelinhas. Corria o ano de 1893 e o beato era o imperador absoluto de todo o sertão. Vinha de uma peregrinação de 22 anos por todos os recantos do interior do norte, fazendo melhorias. Seu nome ecoava no litoral. Antes, era tratado nos jornais como maníaco seguido por fanáticos. Agora, o tom das notícias começava a mudar: ao lado dos fanáticos havia jagunços. 
Conselheiro já não era apenas o místico inofensivo, que roubava fiéis da igreja. Não era só o doido que arrastava multidões e tirava toda a mão de obra das fazendas. Era também o homem político, que se protegia com jagunços e não aceitava as notícias vindas do litoral, de que o Imperador havia sido expulso por uma tal de república. A república era coisa do cão. Conselheiro deixou escrito que "Deus, através da Princesa Isabel, libertara os escravos, e o demônio, para se vingar, derrubou a monarquia." Por isso, em 1893, em Bom Conselho, Antônio Conselheiro mandou o povo queimar os editais de impostos do município. Trinta praças saíram de Salvador para prender os rebeldes. Na estrada de Monte Santo, encontraram um grupo feroz de 200 homens dispostos a tudo. Bateram em retirada. 
Canudos, segunda cidade da Bahia 
Perseguidos pelo poder local, Conselheiro e seus sertanejos entraram cada vez mais para o deserto. E encontraram seu reduto: Canudos, "velha fazenda abandonada à beira do rio Vaza-Barris". Nessa região inóspita e isolada do sertão baiano, protegida pelas serras do Cambaio e Canabrava, e rodeada pelas cidades de Monte Santo, Cumbe, Rosário, Cocorobó e Uauá, fundaram um arraial: o "Império de Belo Monte". Em torno da fazenda em ruínas e de uma igrejinha local, em pouco tempo Canudos cresceu vertiginosamente. Os faveleiros, como eram chamadas as construções simples, de pau-a-pique e barro, porque lembravam a flor sertaneja favela, iam coalhando as montanhas numa rapidez assombrosa: eram construídas até 12 casas por dia, para atender a multidão que chegava. 
	 Em Canudos, com exceção de poucas casas de telha, que eram dos comerciantes, as habitações eram todas iguais. Os recém-chegados entregavam ao Conselheiro tudo o que traziam. Preparavam-se para um futuro de justiça e prosperidade que viria depois do juízo final, quando voltaria a reinar Dom Sebastião, rei português morto pelos mouros em 1580 e transformado numa figura mítica, cuja volta era profetizada em épocas de calamidade. 
Para lá iam todos: ricos e pobres, comerciantes e bandidos violentos. Desvalidos de toda espécie, numa romaria miraculosa para os céus. "Bem-aventurados os que sofrem" era a grande pregação do Conselheiro. A extrema dor era a absolvição plena na Terra. Por isso mesmo os infelizes, os velhos alquebrados, os doentes e os estropiados tinham lugar dehonra nesse clã. 
Canudos logo se tornou a segunda maior cidade da Bahia, depois de Salvador. A maioria vivia com dificuldades, mas ninguém passava fome. Além das rezadeiras, do sineiro Timotinho, Antônio Conselheiro vivia cercado por 12 apóstolos, todos armados. Jagunços famosos como João Abade ou Pajeú, que na guerra se transformariam em seus capitães. 
"O que vinha pra lá era jagunço. (...) Todo mundo que ia pra lá já estava preparado com armas. Os que tinham levavam, os que não tinham recebiam lá." Ioiô da Professora. 
"Os armamentos que eles tinham eram uns clavinotes, umas espingardas, foice, facão. Bridavam assim, naquela brutalidade e naquela ignorância." João de Régis. 
Exército entra em cena: violência
Em 1894, na Bahia, um deputado chamou a atenção dos poderes públicos para a parte dos sertão "perturbada" por Antônio Conselheiro. Em 1895, uma missão católica tentou convencer Conselheiro a desarmar seu povo. Inutilmente. Mas só em 1896 Canudos passou a preocupar a Capital. Conselheiro queria construir uma nova igreja em Canudos. Comprou umas madeiras em Juazeiro mas não recebeu o material. Resolveu ir com seu povo buscar o que era seu. O juiz local denunciou o Conselheiro em Salvador. De Salvador, cem praças comandados pelo tenente Manuel Pires Ferreira chegaram ao local. Na noite de 12 de novembro, partiram para Canudos. Não alcançaram seu destino, pois foram surpreendidos na cidade de Uauá, Os soldados tinham mais armas, mas se assombraram com o assalto corajoso dos matutos. Fugiram. O mesmo destino teriam os quinhentos homens do major Febrônio de Brito, que chegaram às portas de Canudos em janeiro de 1897. Vieram arrogantes, com armas vistosas e canhão. Mas na estrada do Cambaio os jagunços apareceram em trincheiras, num repentino deflagrar de tiros. Gritavam irônicos: - "Avança, fraqueza do governo!" - A expedição caiu, de ponta a ponta. Foram obrigados a recuar.
No capítulo "A Luta", Euclides da Cunha considera alguns valores do Exército, mas critica a arrogância militar, protegida por armas portentosas que nada valiam no sertão. Os canhões não passavam pela caatinga e o excesso de munição era um fardo para os soldados. Os militares não conheciam a luta de emboscadas. Um único sertanejo era capaz de destruir um pelotão. A flora agressiva era amiga dos rebeldes, que em tocaias pelas depressões rochosas eram como guerreiros invisíveis. Grupos de cinqüenta jagunços subdivididos em dez homens atraíam os soldados pelo imbuzeiros e veredas. Os soldados se perdiam pelo caminho. Enlouqueciam. Mesmo quando estavam vencendo a batalha, fugiam apavorados.
A terceira expedição contra Canudos organizou-se no Rio de Janeiro. Para comandá-la foi escolhido o coronel Moreira César, um seguidor de Floriano Peixoto que havia esmagado a Revolução Federalista. Levou para Canudos 1.300 soldados, 15 milhões de cartuchos e muita artilharia pesada. Moreira César era temido por sua violência. E tinha sob suas ordens a melhor força do governo. Nessa hora, mesmo os jagunços mais valentes sentiram medo. 
"Então o conselheiro pregou naquela noite (...) para toda aquela jagunçada reunida. E disse: 'Olhem, ele vem combatente mas não atravessa o Vaza-Barris que ele morre. Podem ficar cientes. Não deixem esses republicanos tomarem o Belo Monte'. Aí todos se animaram, cataram logo de trincheira de todo jeito. Esperaram o bichão e deram logo o apelido de 'corta-cabeças'". Ioiô da Professora. 
Nas feiras, nas cidades, nas veredas, em todo lado Conselheiro tinha espias que vinham informar a todo momento a posição do exército. Os matutos, do alto das serras, se surpreendiam com os uniformes, as armas sofisticadas e a imponência militar. Estavam pela primeira vez diante da civilização. 
Contra Canudos, canhões e insanidade
Moreira César se dirigiu a Canudos pela estrada de Rosário. Passou pelo deserto de Angico e se instalou no Alto do Mário. Lá de cima, ele e os soldados, surpresos, avistaram Canudos. No dia 2 de março de 1897, dois tiros de canhão foram lançados em cima do vilarejo de Canudos. Em seguida, a cidade foi invadida. Ao comentar a terceira batalha, Euclides da Cunha desfaz a fama de estrategista de Moreira César. O Conselheiro, para o escritor, "foi um grande homem pelo avesso". Sua loucura o transformou num verdadeiro herói popular. A Moreira César, um epiléptico com rompantes suicidas, faltou o sopro divino. Não ultrapassou a loucura: invadiu o povoado de Canudos pisoteando crianças, matando velhos e mulheres, numa luta insana. Levou milhares de soldados ainda adolescentes a se destruir no meio da caatinga. 
"Quando Moreira César chegou em Canudos, entrou numa parte da rua, matou uma porção de gente, derrubou casas. Mas foi quando ele foi subir na rua, na ribanceira do rio, foi baleado. Uns dizem que foi um velho que tinha um clavinotão muito grande. Dizem que era desses velhos mandingueiros. Quando foi subindo, pegou o clavinote e o baleou." João de Régis. 
"Aí foi uma luta danada. Morreu tudo que foi comandante. Morreu Tamarindo, morreu Salomão, morreu Vilarino. Só não morreu Cunha Matos porque saltou num cavalo e saiu correndo pelos soldados, atravessou pela estrada e veio bater aqui".Ioiô da Professora. 
A derrota de Moreira César provocou uma revolução no Rio de Janeiro. Já não havia mais dúvida de que Conselheiro estava a serviço de forças poderosíssimas, que vinham restabelecer a velha ordem. A quarta batalha já não foi uma guerra, mas uma vingança selvagem. Do Rio de Janeiro chegaram 5 mil homens comandados pelo general Arthur Oscar. Uma parte veio por Monte Santo e a outra, comandada pelo general Savaget, entrou em Canudos por Jeremoabo. Na porta de Umburanas encontraram uma cena assustadora. O cadáver do coronel Tamarindo e de dois soldados recepcionavam o exército empalados numa estaca. O ministro da Guerra, general Machado Bittencourt, foi enviado ao local para resolver pessoalmente a questão. Levava reforço de três mil homens recrutados em todo o país para liquidar os "monarquistas". Euclides da Cunha chegou em Canudos em 16 de setembro. Era o final da luta, mas ele ainda pode sentir todo o seu barbarismo. 
Rendição jamais
Os poucos prisioneiros homens eram degolados, depois de se exigir deles, inutilmente, um "Viva a República". As águas do Vaza-Barris em pouco tempo eram uma lagoa de sangue. Pilhas de cadáveres serviam de trincheiras aos sertanejos. Os soldados incendiavam casas onde estavam velhos e crianças. E na mente do horrorizado Euclides crescia uma idéia: denunciar a barbárie e provar que Canudos não era um problema político, era uma questão social. Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a história, resistiu até o esgotamento (...) quando caíram seus últimos defensores, quando todos morreram. Eram apenas quatro: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados. (...)
Em 1902, numa choupana à beira do rio, em São José do Rio Pardo, Euclides da Cunha terminou seu livro, contando a verdadeira história sobre o extermínio de Canudos: uma luta desigual e vergonhosa, em que o exército brasileiro se cobriu de infâmia. O inimigo invencível afinal de contas não passava de gente sofrida das secas. Mulheres, velhos e crianças que resistiram até o fim, numa luta inglória. Negros e índios que buscavam criar um espaço em que pudessem ser admitidos como integrantes da nação.
Euclides da Cunha revelou que "sertão" é sinônimo de solidão do homem na terra, onde o abrigo da salvação está apenas nas poucas veredas. Ao criticar o beato, foi o primeiro que apregoou que a "terra é do homem, não é de Deus nem do diabo." E a frase atribuída a Antônio Conselheiro, "o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão" é uma profecia que ecoa por todo o deserto nordestino, desde bem antes do Conselheiro. E sobrevive na esperança e na alma do sertanejo.
Ensinar e Aprender
1) Com a proclamação da República, inicia-se um novo regime político no Brasil. Pesquisar as transformações sociais, políticase econômicas ocorridas nesse período. Organizar os alunos em grupos para elaborar o trabalho. 
2) Os Sertões (1902), um dos maiores épicos da literatura brasileira e latino-americana, consagra Euclides da Cunha como escritor e estudioso dos problemas brasileiros. Fazer coletivamente a cronologia da vida e da obra desse autor. 
3) Propor aos alunos, em duplas, que identifiquem no livro Os Sertões, na seção A Terra, 2º capítulo, a forma como Euclides da Cunha descreve a região de Canudos nos seguintes aspectos: solo, flora, fauna e clima. 
4) Fazer um levantamento das características do sertanejo (vestes, tradições, religiosidade) da região de Canudos. Elaborar coletivamente um painel com desenhos, fotos de jornais, revistas, livros. Expor aos colegas da escola. 
5) Euclides da Cunha aponta a formação de duas sociedades distintas: uma no norte, outra no sul do Brasil (Os Sertões - seção: O Homem, 1º capítulo e 3º capítulo). Pesquisar os aspectos culturais (linguagem, vestuário, alimentação) dos povos dessas regiões, tendo em vista a diversidade climática. 
6) A partir da frase abaixo, discutir a questão da mestiçagem no Brasil. Sistematizar as conclusões. 
	"Não temos unidade de raça". Euclides da Cunha 
7) Resumir a biografia de Antonio Conselheiro, narrada por Euclides da Cunha (Os Sertões - seção: O Homem, 4º capítulo). No texto, apresentar os fatos mais significativos. 
8) Em 1897, a Guerra de Canudos tornou-se o acontecimento jornalístico de maior importância em todo o país. Recontar a história de Canudos, simulando um noticiário de rádio. Abordar os antecedentes, formação, crescimento e término do conflito. 
9) No livro Os Sertões - seção: A Luta, 3º capítulo - Expedição Moreira César, Euclides da Cunha descreve Canudos de forma panorâmica. Ler o texto e comentar suas impressões. 
10) "Canudos era a nossa Vendéia." (Os Sertões - Seção: A Luta, Preliminares, 4º capítulo). Estudar o significado dessa expressão. 
11) A Campanha contra Canudos teria sido "(...)na significação integral da palavra, um crime(...)". Euclides da Cunha. Comentar essa afirmativa. 
12) Ouvir a música Asa Branca, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Analisar a letra, verificando a variação lingüística e o significado do pássaro asa branca (pomba-rolinha) no sertão nordestino. 
Visitas para complementar o estudo:
Casa de Euclides da Cunha 
R. Zulmira Torres, s/n - Cantagalo Rio de Janeiro - RJ - Brasil CEP 28500-000 
Visitas: de 3ª a dom., das 13h00 às 22h00. 
Casa de Cultura Euclides da Cunha
R. Mal. Floriano, 105 São José do Rio Pardo - SP - Brasil CEP 13720-000 
Museu do Homem do Nordeste
Av. 17 de agosto, 2.187 - Casa Forte Recife - PE - Brasil 
Bibliografia
CALASANS, José.Canudos na literatura de cordel. São Paulo, Ática, 1984. 
CALASANS, José.Canudos: origem e desenvolvimento de um arraial messiânico. In: Revista da Acadêmia Brasileira de Letras da Bahia, nº 34. Salvador, 1987. 
100 ANOS de canudos. Nova escola. São Paulo: ano XII, n.105, p.16-17. 07/97. 
CITELLI, Adilson. Os Sertões de Euclides da Cunha. São Paulo: Ática, 1996 (Roteiro de Leituras). 
CHIAVENATO, Júlio José. As Meninas de Belo Monte. São Paulo: Página Aberta, 1993. 
CUNHA, Euclides da. Os Sertões. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982. 
CUNHA, José Guilherme da. Canudos: a luta. Salvador: Pé-de-Boi, 1991. 
FONTES, Oleone Coelho. O Treme-terra. Moreira César - a República e Canudos. Rio de Janeiro, Vozes, 1996. 
GALVÃO, Nogueira Walnice & GALOTTI, Oswaldo. Correspondência - Euclides da Cunha. São Paulo: Edusp, 1997. 
GAUDENZI, Trípoli Francisco Brito. Memorial de Canudos. Brasília: CEF, 1994. 
GUILHERME, Ricardo. O Conselheiro e Canudos. Fortaleza: Imprensa Universitária da Universidade Federal do Ceará, 1986. 
LEVINE, Robert M.. O Sertão prometido - o massacre de Canudos. São Paulo: Edusp, 1995. 
MACEDO, José Rivair & MAESTRI, Mário. Belo Monte - uma história da guerra de Canudos. São Paulo: Moderna, 1997. (polêmica) 
NUVENS, Plácido Cidade. Patativa e o universo fascinante do sertão. Fortaleza: Imprensa Universitária Federal do Ceará, s.d.. 
OLAVO, Antonio. Paixão e guerra no sertão de Canudos. Salvador: Portfolium, 1993. 
QUEIROZ, Suely R. R. de. A Abolição da escravidão. São Paulo: Brasiliense, 1982. (Tudo é história). 
VENTURA, Roberto. A Nossa Vendéia: Canudos, o mito da Revolução Francesa e a formação da identidade cultural no Brasil (1897-1902). In: Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, n. 31, a.1990. 
VILLA, Marco Antônio. Canudos - o povo da terra. São Paulo: Ática, 1995. 
VILLA, Marco Antônio. Canudos. São Paulo: Brasiliense, 1996. (Tudo é história, 142). 
Filmografia
Deus e o Diabo na Terra do Sol (Brasil, 1964) Direção: Gláuber Rocha. Elenco: Othon Bastos, Maurício do Valle, Yoná Magalhães. 
Desejo (Brasil, 1990) Direção: Wolf Maia, Denise Sarraceni. Elenco: Vera Fischer, Tarcísio Meira, Guilherme Fontes. 
Discografia
Asa Branca (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira) Intérprete: Luiz Gonzaga Disco: Música Popular Brasileira Gravadora: Abril S.A. Cultural e Industrial. 
Endereços Eletrônicos
Associação de Estudos Euclidianos - Vida e obras do escritor Euclides da Cunha  
Materiais disponíveis na Videoteca
 " Os Sertões de Euclides da Cunha " / documentário (2002) 		Fita 82
Produção da Globo News que reconstitui a viagem de Euclides, ao escrever a sua famosa obra. Dividido em :
Capítulo 1 – A Terra (22’)
Capítulo 2 – O Homem (24’)
Capítulo 3 – A Guerra (24’)
Capítulo 4 – A Volta(22’)
 " Canudos – Uma História Sem Fim " / documentário (1996) 		52’ Fita 107
Documentário especial produzido pela TVE/BA , que resgata uma parcela da história de Canudos, que culminou com o extermínio da quase totalidade dos seguidores de Antônio Conselheiro e com a morte de centenas de soldados. No programa, as filmagens de Canudos, a Guerra no Céu do Sertão, do cineasta Sérgio Rezende, para o que foi construída uma gigantesca cidade cenográfica, abrigando cerca de oito mil figurantes e 100 atores . O documentário traz ainda depoimentos de pessoas da região que mantiveram vivas, através da tradição oral, algumas peculiaridades do cotidiano do povoado. 
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CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE (1902-1987)
Se houvesse um único eixo em torno do qual girasse a poesia brasileira, poderíamos dizer que, no século XX, na fase mais madura e exemplar do destino poético do país, CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE seria esse sol luminoso. 
Outros, certamente, como João Cabral de Melo Neto e Manuel Bandeira, poderiam compartilhar com ele o mesmo lugar privilegiado. Mas Drummond é aquele caso raro que, como Fernando Pessoa, une sua grandiosa obra à capacidade de se tornar fundamental para todos os tipos de leitores, do adolescente a descobrir o mundo ao erudito mais rigoroso, do porteiro de um prédio ao alto executivo de uma empresa e, desse, ao poeta em busca de conhecimentos... 
Ele já foi visto como uma espécie de Baudelaire de nossa poesia moderna, querendo-se dizer com isso que o itabirano e cidadão do Rio de Janeiro levou nossa poesia às mais pertinentes questões existenciais e filosóficas do mundo contemporâneo, à vida urbana, à sociedade de massa, às reflexões sociais etc., criando uma poesia acentuadamente brasileira e universal, sem qualquer resquício de uma caricatura nacional.
 Fonte: Fundação Biblioteca Nacional
Carlos Drummond de Andrade nasce em Itabira, Minas Gerais, em 31 de outubro de 1.902. Pertencia a uma família de fazendeiros em declínio.
Confidência do itabirano
Alguns anos vivi em Itabira 
Principalmente, nasci em Itabira. 
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. 
Noventa por cento d ferro nas calças. 
Oitenta por cento de ferro nas almas. 
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.A vontade de amar, que me paralisa o trabalho 
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes. 
E o hábito de sofrer, que tanto me diverte, 
É doce herança itabirana.
De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço: 
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval; 
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas; 
este orgulho, esta cabeça baixa... 
Tive ouro, tive gado, tive fazendas. 
Hoje sou funcionário público. 
Itabira é apenas uma fotografia na parede. 
Mas como dói!
Estuda em Belo Horizonte, e com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo (RJ). Com a insistência da família diploma-se em Ouro Preto em farmácia. 
Com outros escritores funda "A Revista", que mesmo pouco duradoura, foi importante canal para afirmação do modernismo em Minas Gerais.
Ingressando no serviço público em 1934 muda-se para o Rio de Janeiro, tornando-se chefe de gabinete de Gustavo Capanema, ministro da Educação.
Desde 1.954 colaborou como cronista no jornal "Correio da Manhã" e a partir de 1.969 no "Jornal do Brasil". 
Tenta pela poesia tradicional resolver sua angústia, mas não consegue, vivendo sempre em conflito, reconhecendo sua fraqueza, finalmente consegue fugir pela ironia. As obras de Carlos Drummond são citadas como uma expressão pessoal numa linha de aperfeiçoamento em que a originalidade e a unidade se configuram e se confirmam a cada passo. 
Poema das sete faces
Quando nasci, um anjo torto 
desses que vivem na sombras 
disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida.
As casas espiam os homens 
Que correm atrás das mulheres 
A tarde fosse azul. 
Não houvesse tantos desejos.
O bonde cheio de pernas: 
Pernas brancas pretas e amarelas 
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração
Porém meus olhos 
não perguntam nada.
O Homem atrás do bigode 
É sério simples e forte 
Quase não conversa 
Tem poucos, raros amigos 
O homem atrás dos óculos e do bigode
Meu Deus, por que me abandonaste 
se sabias que eu não era Deus 
se sabias que eu era um fraco.
Mundo mundo vasto mundo 
se eu me chamasse Raimundo 
seria uma rima, não seria uma solução 
mais vasto é meu coração
Eu, não devia te dizer 
mas essa lua 
mas esse conhaque 
botam a gente comovido como o diabo.
Drummond se apresenta como que aquém e além do movimento modernista, tirando deste menos recurso do que de estrutura. 
Torturado pelo passado, assombrado pelo futuro mostra-se o homem do ponto de vista céptico e melancólico, porém quando ironiza os costumes e a sociedade asperamente satírico entrega-se a comunicação estética. Em A Procura da Poesia o poeta faz uma anti-poema, em busca da palavra. Tentando procurar a poesia, ultrapassando seus limites 
. A Procura da Poesia
Não faças versos sobre acontecimentos. 
Não há criação nem morte perante a poesia 
Diante dela, a vida é um sol estático 
não aquece nem ilumina 
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo, 
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica. 
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro. 
são indiferentes 
Nem me reveles teus sentimentos, 
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem. 
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.
Não cantes tua cidade, deixa-a em paz. 
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem: rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma 
O canto não é a natureza 
nem os homens em sociedade. 
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam
A poesia (não tires poesia das coisas) 
elide sujeito e objeto
Não dramatizes, não invoques, 
não indagues. Não percas tempo em mentir 
Não te aborreças 
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante, 
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família. 
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.
Não recomponhas 
tua sepultada e merencória infância 
Não osciles entre o espelho e a 
memória em dissipação 
Que se dissipou, não era poesia 
Que se partiu, cristal não era.
Penetra surdamente no reino das palavras. 
Lá estão os poemas que esperam ser escritos. 
Estão paralisados, mas não há desespero 
há calma e frescura ma superfície intata 
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. 
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. 
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam. 
Espera que cada um se realize e consuma 
com seu poder de palavra 
e seu poder de silêncio
Não forces o poema a desprender-se do limbo. 
Não colhas no chão o poema que se perdeu. 
Não adules o poema. Aceita-o. 
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no 
espaço.
Chega mais parto e contempla as palavras 
cada uma 
tem mil faces secretas sob a face neutra 
e te pergunta, sem interesse pela resposta 
pobre ou terrível, que lhe deres: 
Trouxeste a chave?
Repara: 
ermas de melodia e conceito, 
elas se refugiaram na noite, as palavras. 
Ainda úmida e impregnadas de sono, 
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.
Essa identidade vale-se do trabalho poético e da relação com outros seres, com o amor, ainda que amargo. 
Restos
O amor, o pobre amor estava putrefato. 
Bateu, bateu à velha porta, inutilmente. 
Não pude agasalhá-lo: ofendia-me o olfato. 
Muito embora o escutasse, eu de mim era presente.
O Quarto em desordem
Na curva perigosa dos cinqüenta 
derrapei neste amor. Que dor! que pétala 
sensível e secreta me atormenta 
e me provoca à síntese da flor
que não sabe como é feita: amor 
na quinta-essência da palavra, e mudo 
de natural silêncio já não cabe 
em tanto gesto de colher e amar
a nuvem que de ambígua se dilui 
nesse objeto mais vago do que nuvem 
e mais indefeso, corpo! Corpo, corpo, corpo
verdade tão final, sede tão vária 
a esse cavalo solto pela cama 
a passear o peito de quem ama.
Suas obras foram traduzidas para o espanhol, inglês, francês, alemão, sueco. Drummond é considerado o poeta mais influente na literatura brasileira contemporânea. 
Veja um pouco da sua poesia voltada para as causas sociais, na esperança de ver um mundo melhor. No título do poema já notamos a dicotomia que o poeta vive entre objetivo e subjetivo, razão e emoção. O poeta puro ( vou de branco) , perambula pela cidade observando a sociedade. Só, encontra na poesia espaço para colocar suas observações do mundo cinzento. Tem nojo ao ver o homem passivo ser devorado pelos acontecimentos. Ao nascer uma flor, surge uma esperança de uma sociedade sem distorções sociais. 
A Flor e a Náusea
Preso à minha classe e a algumas roupas, 
vou de branco pela rua cinzenta. 
Melancolias, mercadorias espreitam-me. 
Devo seguir até o enjôo? 
Posso, sem armas, revoltar-me? 
......................................................... 
O tempo pobre, o poeta pobre 
fundem-se no mesmo impasse 
Em vão me tento explicar, os muros são surdos 
Sob a pele das palavras há cifras e códigos. 
O sol consola os doentes e não os renova 
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
Vomitar esse tédio sobre a cidade, 
Quarenta anos e nenhum problema 
resolvido, sequer colocado. 
Nenhuma carta escrita nem recebida. 
Todos os homens voltam para a casa. 
Estão menos livres mas levam jornais 
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.
.......................................................... 
Sua cor não se percebe. 
Suas pétalas não se abrem. 
Seu nome não está nos livros. 
É feia. Mas é realmente uma flor.
Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde 
e lentamente passo a mão nessa forma insegura 
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se 
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico. 
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio. 
A poesia de Drummond é objetiva, o que nos leva a uma interpretação objetiva,por separar sua vida particular da poesia, dedica seu estado de alma a ela, porém daí surge a estranheza de toda a poesia, refletindo angústia, tensão dramática, conflitos. Trabalha as várias faces de uma poesia, enfocando a timidez do eu-lírico, denunciando os problemas sócio-politicos, a meditação do destino humano, as suas raízes ancestrais, o amor e a própria arte poética.
 Seu estilo é variado, trabalhando todas as formas, como versos curtos e longos, próximos da prosa, versos metrificados e livres; versos rimados , como afirma Antônio Houaiss, "Carlos Drummond é o mais poderoso usuário da rima em português moderno", versos brancos; formas fixas, como o soneto, e formas livres. O poeta atualiza arcaísmos e inventa neologismos, usa uma linguagem culta e com vocabulário coloquial. Além do uso marcante, da repetição, como em "No Meio do Caminho".
 Escreveu seu último poema em 31 de janeiro de 1987 - Elegia a um Tucano Morto - que passa a integrar Farewell, último livro organizado pelo poeta. Faleceu a 17 de agosto de 1987 devido a problemas cardíacos.
 Também publicou vários livros de prosa, provando ser um notável cronista. Como símbolo da poesia brasileira, o ano de 2.002 foi declarado o "Ano de Drummond". 
Principais obras: 
Alguma Poesia (1930), Brejo das Almas (1934), Sentimento do Mundo (1940), José (1942), A Rosa do Povo (1945), Novos Poemas (1948), Claro Enigma (1951), Viola de Bolso (1952), Fazendeiro do ar (1954), A Vida Passada a Limpo (1959), Lição das Coisas (1962), Boitempo (1968), Menino Antigo (1973), As Impurezas do Branco ( 1973), Discurso da Primavera e Algumas Sombras ( 1978), A Paixão Medida (1980), Corpo (1984), Amar se Aprende Amando (1985), O amor Natural ( 1992).
Materiais disponíveis na Videoteca
 " Arquivo N - Drummond " / documentário (2002) 22’ 			Fita 30
Produção da Globo News que recupera uma entrevista dele feita por sua filha Maria Julieta, mostra o poeta recitando alguns de seus poemas, apresenta uma entrevista com o neto do autor, Pedro Drummond, e trechos do documentário holandês "Amor Natural", baseado nos poemas eróticos de Drummond.
 " Carlos Drummond de Andrade – 100 Anos " / documentário (2002) 23’ Fita 30
Produção da Globo News da Série Painel, realizada para comemorar os 100 anos do nascimento do poeta.
 " Programa Starte Especial " / documentário (2002) 			22’ Fita 30
Produção da Globo News da Série Starte, realizada durante a comemoração dos 100 anos do nascimento do poeta.
O programa aborda a poesia e a imagem do poeta, avesso à exposição, conversando com três atores que então interpretavam o escritor: Marcos França, no espetáculo "O Homem por trás dos óculos", Carlos Gregório, no documentário "Poeta das Sete Faces", e Vinícius de Oliveira, no monólogo "Jovem Drummond". A atração também fala sobre a estátua de Drummond, colocada na avenida Atlântica, em Copacabana, no Rio de Janeiro.
 " Carlos Drummond de Andrade " / programa informativo (2002) 	17’ Fita 30
Produção do Canal Futura, da Série Sala de Notícias, que registra os 100 anos do nascimento do poeta.
 " CDA- A Partilha da Poesia " / documentário (2002) 			52’ Fita 11
Co-produção da RTP( Rádio e Televisão Portuguesa) e TV Cultura , faz um resgate da vida e da obra de CDA, uma referência quase obrigatória para muitos dos autores dos países de língua portuguesa no mundo. Em meio a depoimentos de amigos, intelectuais, artistas e estudiosos como Mário Chamie, Affonso Romano de Sant’Anna, Maria Bethânia e outros, o documentário apresenta imagens do poeta, além de alguns poemas narrados por ele. Mostra ainda as influências do Rio de Janeiro – onde passou a maior parte da sua vida – nos seus poemas que refletem as grandes inquietações de nosso tempo, como guerra e injustiça.
 " Conexão Roberto D’ Avila " / entrevista (1984) 			40’ Fita 11
Entrevista realizada no Clube Marimbas, em Copacabana – RJ, bairro onde o poeta morou a maior parte da sua vida. Drummond conversa sobre a velhice, a eleição de Tancredo Neves e a frustração do povo brasileiro com a sua morte, o inconformismo da sua poesia e sua paixão pelo Rio de Janeiro.
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Ariano Suassuna (1927-)
Advogado, professor, teatrólogo e romancista, nasceu em Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, PB, em 16 de junho de 1927. 
 	Contava pouco mais de três anos de idade quando seu pai, que governava o Estado no período de 1924 a 1928, foi assassinado no Rio de Janeiro em conseqüência da cruenta luta política que se desencadeou na Paraíba às vésperas da Revolução de 1930. Nesse mesmo ano, D. Rita Vilar Suassuna, que se vira obrigada pela alta de segurança reinante em seu Estado a mudar-se para Pernambuco, transferiu-se com os nove filhos do casal para o sertão paraibano, indo instalar-se na Fazenda Acahuan, de propriedade da família, e depois na vila de Taperoá, onde Ariano Suassuna fez os estudos primários. 
A infância passada no sertão familiarizou o futuro escritor e dramaturgo com os temas e as formas de expressão artística que viriam mais tarde constituir seu universo ficcional ou, como ele próprio o denomina, seu “mundo mítico”. Não só as estórias e casos narrados e cantados em prosa e verso foram aproveitados como suporte na plasmação de suas peças, poemas e romances. Também as próprias formas da narrativa oral e da poesia sertaneja foram assimiladas e reelaboradas por Suassuna. Suas primeiras produções - publicadas nos suplementos literários dos jornais do Recife, quando o autor fazia os estudos pré-universitários no Colégio Osvaldo Cruz singularizavam-se pelo domínio dos ritmos e metros cristalizados na poética nordestina. 
Em 1946, ao ingressar na Faculdade de Direito do Recife, Ariano Suassuna ligou-se ao grupo de jovens escritores e artistas que, tendo à frente Hermilo Borba Filho, Joel Pontes, Gastão de Holanda e Aloísio Magalhães, acabavam de fundar o Teatro do Estudante Pernambucano. Em 1947, escreveu sua primeira peça, Uma mulher vestida de sol, que obteve o primeiro lugar em concurso de âmbito nacional promovido pelo TEP (Prêmio Nicolau Carlos Magno). No ano seguinte, especialmente para a inauguração da Barraca, o palco itinerante do TEP, escreveu Cantam as harpas de Sião, peça totalmente refundida anos depois com o título de O desertor de Princesa. A esses dois ensaios iniciais seguiu-se a peça Os homens de barro (1949), em que as inquietações espirituais exacerbaram os processos expressionistas empregados na primeira versão de Cantam as harpas de Sião. As mesmas inquietações estiveram presentes em duas outras peças, Auto de João da Cruz, que recebeu o Prêmio Martins Pena em 1950, e Arco desolado (menção honrosa no concurso do IV Centenário da Cidade de São Paulo, 1954). 
Após formar-se na Faculdade de Direito, em 1950, passou a dedicar-se também à advocacia. Mudou-se de novo para Taperoá, onde escreveu e montou a peça Torturas de um coração, em 1951. No ano seguinte, voltou a residir em Recife. São dessa época O castigo da soberba (1953), O rico avarento (1954) e o Auto da Compadecida (1955), peça que o projetou em todo o país e que seria considerada, em 1962, por Sábato Magaldi “o texto mais popular do moderno teatro brasileiro”. Encenado, em 1957, pelo Teatro Adolescente do Recife no Festival de Teatros Amadores do Brasil realizado no Rio, o auto conquistou a medalha de ouro da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Sucesso permanente de público e de crítica, o Auto da Compadecida está hoje incorporado ao repertório internacional, traduzido e representado em espanhol, francês, inglês, alemão, polonês, tcheco, holandês, finlandês e hebraico. 
Em 1956, Ariano Suassuna abandonou a advocacia para tornar-se professor de Estética na Universidade Federal de Pernambuco. No ano seguinte, foi encenada a suapeça O casamento suspeitoso, em São Paulo, pela Cia. Sérgio Cardoso, e O santo e a porca; em 1958, foi encenada a sua peça O homem da vaca e o poder da fortuna; em 1959, A pena e a lei, premiada dez anos depois no Festival Latino-Americano de Teatro. 
Em 1959, em companhia de Hermilo Borba Filho, fundou o Teatro Popular do Nordeste, que montou em seguida a Farsa da boa preguiça (1960) e A caseira e a Catarina (1962). No início dos anos 60, interrompeu a bem-sucedida carreira de dramaturgo para dedicar-se às aulas de Estética na UFPe. 
Foi membro fundador do Conselho Federal de Cultura (1967) e nomeado, pelo Reitor Murilo Guimarães, diretor do Departamento de Extensão Cultural da UFPe (1969). Ligado diretamente à cultura, iniciou em 1970, em Recife, o “Movimento Armorial”, interessado no desenvolvimento e no conhecimento das formas de expressão populares tradicionais. Convocou nomes expressivos da música para procurarem uma música erudita nordestina que viesse juntar-se ao movimento, lançado em Recife, em 18 de outubro de 1970, com o concerto “Três Séculos de Música Nordestina do Barroco ao Armorial” e com uma exposição de gravura, pintura e escultura. 
Entre 1958-79, dedicou-se também à prosa de ficção, publicando o Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971), laureado com o Prêmio Nacional de Ficção conferido em 1972 pelo Instituto Nacional do Livro; e história d’O rei degolado nas caatingas do serão/Ao sol da onça caetana (1976), classificados por ele de “romance armorial-popular brasileiro”. 
Considerado um intelectual que alia erudição a um extraordinário poder de comunicação popular, conforme atesta o sucesso de suas criações no teatro, literatura, televisão e cinema.
Criador do Movimento Armorial, o paraibano Ariano Suassuna expressa, no conceito dessa empreitada intelectual, a filosofia que define sua obra: “O Armorial é a criação de uma arte brasileira erudita baseada na raiz popular de nossa cultura”.
Essa criativa junção, regida pelo talento de Suassuna, deu origem à peça teatral mais popular da história do teatro brasileiro: “O Auto da Compadecida”, transportada recentemente para a televisão e o cinema por Guel Arraes, com novos recordes de audiência e de público.
Por que “Auto”? Define o dicionário Aurélio: “Auto, do latim Actu (...) - Composição dramática originária da Idade Média, com personagens alegóricos como os pecados , as virtudes, etc., e que se caracteriza pela simplicidade da construção, ingenuidade da linguagem, caracterizações exacerbadas e intenção moralizante, podendo, contudo, comportar elementos cômicos e jocosos”.
Os elementos descritos no Aurélio estão todos presentes na obra de Suassuna.
Escrito em 1955, “O Auto da Compadecida” tornou-se, de pronto, um clássico do teatro nacional. Foi a primeira peça montada, há 41 anos, pelo Curso de Arte Dramática da Universidade Federal do Ceará, com esplêndida direção de José Maria B. de Paiva.
O “Auto” narra as hilárias aventuras de João Grilo e Chicó, dois nordestinos pobres em permanente luta pela sobrevivência. Pobre porém esperto, João Grilo consegue levar a melhor sobre ricos, poderosos e religiosos cooptados pelo poder. Morto por um cangaceiro, o personagem usa sua esperteza para vencer o próprio diabo e obter as benesses de Cristo, contando para tanto com a poderosa intercessão da Compadecida, que, na mais recente versão cinematográfica, ganhou uma interpretação antológica da atriz Fernanda Montenegro.
O estilo da “Compadecida” (como o texto é familiarmente chamado pelo público) cumpre os princípios do Armorial, entrelaçando a cultura popular nordestina com a cultura medieval e do começo do Renascimento na Europa. Ariano sempre faz questão de enfatizar: “Tive uma influência marcante da poesia dos nossos cantadores e das peças de mamulengos”.
Personagens como João Grilo e Chicó, tão comuns na realidade do Nordeste brasileiro, estão também presentes na italiana Commedia dell´Arte, em clássicos espanhóis como o “Dom Quixote”, de Cervantes, e nos autos do português Gil Vicente. São universais, como assegurava o professor e crítico literário José Carlos Lisboa: “É o regional atingindo o universal, através do lúdico”. Entre outras preciosas contribuições de Ariano para o teatro estão: “O Santo e a Porca”, “O Casamento Suspeitoso” e “A Pena e a Lei” (premiada no Festival Latino-Americano de Teatro).
Embora sua obra considerada mais importante seja “O Romance d´A Pedra do Reino” e, em paralelo, o autor Paulo Autran faça coro a um grupo de artistas que elegeu “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto, como a obra maior do teatro brasileiro, nenhum outro texto conseguiu tanta empatia com o público como “O Auto da Compadecida“, seja no teatro, na televisão, ou em suas três adaptações cinematográficas.
Suassuna considera a versão de Guel Arraes como a melhor abordagem de seu mais comunicativo texto para as telas. Mas, no final da década de 80, quando o cinema brasileiro dava sinais de cansaço como se já antevesse o golpe de misericórdia que lhe seria capciosamente brandido pelo governo Collor, Renato Aragão conseguia levar multidões às salas exibidoras com “Os Trapalhões no Auto da Compadecida”, até hoje a produção mais ambiciosa do humorista cearense.
Só Jorge Amado e Nelson Rodrigues, em inúmeras versões cinematográficas de suas criações, conseguiram fazer tanto sucesso no cinema quanto Ariano Suassuna, este último, ressalte-se, em torno de um único texto.
Considerado o Cavaleiro Andante (numa clara alusão a Dom Quixote) da cultura popular brasileira, Suassuna rejeitou a Bossa Nova (pela influência do “jazz”), o Tropicalismo (pelo uso de guitarras elétricas) e o pernambucano “mangue-beat”, por sua fusão de “rock” e maracatu. Também rejeitou o Prêmio Sharp somente por ele ter nome internacional.
Eleito há 13 anos para a Academia Brasileira de Letras, o talentoso paraibano, radicado em Recife, é criticado por alguns pela sua fulgurante liberdade de mesclar erudição, e até temas orientais, com o que existe de mais importante em nossa cultura popular. Sobre isso, já declarou o professor, teatrólogo e romancista: “Eu era cobrado por não escrever como Graciliano Ramos e Guimarães Rosa. Eu jamais escreveria um romance travado como o de Graciliano”.
Os livros de Ariano são cheios da poesia e da linguagem do sertão nordestino, tão universais na força telúrica quanto seus congêneres da literatura em todas as épocas. Exatamente como a sua genialidade pôde captar em toda a sua mítica dimensão. 
Obras :
 TEATRO: Uma mulher vestida de sol (1947; publicada em 1964); Cantam as harpas de Sião, ou O desertor de Princesa (1984); Os homens de barro (1949); Auto de João da Cruz (1950); Torturas de um coração, peça para mamulengos (1951); O castigo da soberba, entremês popular (1953): O rico avarento, entremês popular (1954); Auto da Compadecida (1955; publicada em 1957); O casamento suspeitoso (1957; publicado em 1961); O santo e a porca (1957; publicada em 1964); O homem da vaca e o poder da fortuna, entremês popular (1958); A pena e a lei (1959; publicada em 1971); Farsa da boa preguiça (1960; publicada em 1973); A caseira e a Catarina (1962); O santo e a porca. O casamento suspeitoso (1974). 
FICÇÃO: Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta (1971); História d’O Rei Degolado nas caatingas do sertão (1977). 
OUTRAS: É de tororó, em colaboração com Capiba e Ascenso Ferrera (1950); Ode (1955); Coletânea da poesia popular nordestina (1964); Iniciação à estética, teoria literária (1975); O Movimento Armorial (1974); Seleta em prosa e verso (contendo quatro peças inéditas). Organização, estudo e notas do prof. Silviano Santiago (1975). 
Material disponível na Videoteca
 " Ariano Suassuna" / especial (1997) 45’ 			 Fita 102
Aula-Espetáculo dada na UnB em 1997 , com participação do músico Antônio José Madureira .
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OSWALD DE ANDRADE (1890-1954)
Mesmo para pesquisadores sofisticadamente especializadosas várias facetas da figura de Oswald permanecem obscuras. As fissuras realizadas pela sua obra no quadro acadêmico da vida cultural brasileira são vistas, geralmente, como lances imprevistos e momentâneos de uma intuição privilegiada. Daí a necessidade de se chamar atenção, por exemplo, para a lista das obras fundamentais do pensamento e da literatura ocidentais lidas e anotadas pelo escritor; para as suas pacientes e renovadas tentativas de reescrever seus livros. Muita lenda e anedota têm corrido sobre a figura humana e a personalidade literária do escritor Oswald de Andrade. Ora rasgados elogios às suas descobertas geniais, reconhecidas como fruto da intuição e imaginação fabulosas, ora críticas ao gosto pela improvisação e pela surpresa. Esta exposição não almeja um panorama frio sobre a vida de mais um escritor modernista. Antes pretende divulgar ângulos e facetas desconhecidas ou pouco exploradas deste escritor ao longo da história do Modernismo: o criador atento a melhor estruturação do seu texto; o homem de negócios planejando lucros e administrando à sua maneira seus bens; o pai carinhoso; o político engajado no partido que lhe pareceu no momento atender aos anseios de reestruturação social, etc. 
José Oswald de Sousa Andrade nasceu em São Paulo em 1890. Presenciar a virada do século, aos 10 anos, foi marcante, como relembra o poeta já adulto: "Havíamos dobrado a esquina de um século. Entrávamos em 1900... " . São Paulo despertava para a industrialização e a tecnologia. Abria-se um novo mundo urbano, que Oswald logo assimilaria fascinado: o bonde elétrico, o rádio, o cinema, a propaganda com sua linguagem-síntese...
Oswald tinha 22 anos quando fez a primeira de várias viagens à Europa (1912), onde entrou em contato com os movimentos de vanguarda. Mas só depois de dez anos empregaria as técnicas desses movimentos. De qualquer forma, divulgou o Futurismo e o Cubismo. O terceiro casamento, com Tarsila do Amaral, em 1926, forjou o casal responsável pelo lançamento da Antropofagia. Mário os chamava de "Tarsiwald"... Com Tarsila voltou à Europa algumas vezes. A crise de 29 abalou as finanças do escritor. Vem a separação de Tarsila e uma nova relação: Patrícia Galvão (Pagu), escritora comunista. Oswald passou a participar de reuniões operárias e ingressou no Partido Comunista. Casou-se mais uma vez, depois de separado de Pagu, até que, já com 54 anos, conheceu Maria Antonieta d'Alkmin. Permaneceram juntos até a morte do poeta, em 1954.
Canto de Regresso à Pátria
Minha terra tem palmares 
Onde gorjeia o mar 
Os pássaros daqui 
Não cantam como os de lá 
Minha terra tem mais rosas 
E quase que mais amores 
Minha terra tem mais ouro 
Minha terra tem mais terra 
Ouro terra amor e rosas 
Eu quero tudo de lá 
Não permita Deus que eu morra 
Sem que volte para lá 
Não permita Deus que eu morra 
Sem que volte para São Paulo 
Sem que veja a Rua 15 
E o progresso de São Paulo
Nenhum outro escritor do Modernismo ficou mais conhecido pelo espírito irreverente e combativo do que Oswald de Andrade. Sua atuação intelectual é considerada fundamental na cultura brasileira do início do século. A obra literária de Oswald apresenta exemplarmente as características do Modernismo da primeira fase. 
Em Pau-Brasil, põe em prática as propostas do manifesto do mesmo nome. Na primeira parte do livro, "História do Brasil", Oswald recupera documentos da nossa literatura de informação, dando-lhe um vigor poético surpreendente.
Na segunda parte de Pau-Brasil - "Poemas da colonização" -, o escritor revê alguns momentos de nossa época colonial. O que mais chama a atenção nesses poemas é o poder de síntese do autor. No Pau-Brasil há ainda a descrição da paisagem brasileira, de cenas do cotidiano, além de poemas metalingüísticos.
A poesia de Oswald é precursora de um movimento que vai marcar a cultura brasileira na década de 60: o Concretismo. Suas idéias, recuperadas também na década de 60, reaparecem com roupagem nova no Tropicalismo. 
Memórias Sentimentais de João Miramar chama a atenção pela linguagem e pela montagem inédita. O romance apresenta uma técnica de composição revolucionária, se comparado aos romances tradicionais: são 163 episódios numerados e intitulados, que constituem capítulos-relâmpago - tudo muito influenciado pela linguagem do cinema - ou, mais precisamente, como se os fragmentos estivessem dispostos num álbum, tal qual fotos que mantêm relação entre si. Cada episódio narra, com ironia e humor, um fragmento da vida de Miramar. "Recorte, colagem, montagem", resume o crítico Décio Pignatari.
O material narrativo segue esta ordem: infância de Miramar, adolescência e viagem à Europa a bordo do navio Marta; regresso ao Brasil, motivado pela morte da mãe; casamento com Célia, e um romance paralelo com a atriz Rocambola; nascimento da filha; divórcio e morte de Célia; falência de Miramar.
Em 1937 publicou-se O Rei da Vela, peça que focaliza a sociedade brasileira dos anos 30. Pelo seu caráter pouco convencional, só foi levada a cena trinta anos depois, integrando o movimento tropicalista
Obras: 
Poesia: Pau-Brasil (1925); Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade (1927); Cântico dos cânticos para flauta e violão (1945); O escaravelho de ouro (1945). 
Romance: Os condenados (trilogia) (1922-34); Memórias sentimentais de João Miramar (l924); Serafim Ponte Grande (1933); Marco Zero - a revolução melancólica (1943).
Teatro: O homem e o cavalo (1934); A mona (1937); O rei da vela (1933).
Além disso, publicou os manifestos que já conhecemos: Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924); Manifesto Antropófago (1928). Escreveu ainda artigos e ensaios.
Materiais disponíveis na Videoteca :
 " Miramar Andrade " / documentário(1991) 		46’ 				Fita 69
Produção da TV Cultura. O título é uma alusão ao pseudônimo do escritor. O documentário reconstitui a essência das idéias de Oswald, resgatando os momentos mais expressivos de sua obra com depoimentos de importantes intelectuais e familiares. Conta com um material iconográfico cedido pela família e reproduz, através de animação e “designers” eletrônicos, trecho da prosa e da poesia do autor. O programa traz clipe dos dois manifestos do escritor, interpretados por Arnaldo antunes, Alzira Spíndola e Itamar Assumpção. Quase todos os poemas são declamados pleo próprio Oswald, em gravações raras.
 " O Homem do Pau Brasil / filme (1982) 	105’ 	 Fita 108
Mostra a trajetória de Oswald de Andrade. Direção de Joaquim Pedro de Andrade.
Atenção : Sugerimos também os materiais disponíveis no Capítulo Semana de Arte Moderna
MANUEL BANDEIRA (1886-1968)
Projeto Releituras
Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho nasceu no Recife no dia 19 de abril de 1886, na Rua da Ventura, atual Joaquim Nabuco, filho de Manuel Carneiro de Souza Bandeira e Francelina Ribeiro de Souza Bandeira.  Em 1890 a família se transfere para o Rio de Janeiro e a seguir para Santos - SP e, novamente, para o Rio de Janeiro. Passa dois verões em Petrópolis. 
Em 1892 a família volta para Pernambuco. Manuel Bandeira freqüenta o colégio das irmãs Barros Barreto, na Rua da Soledade, e, como semi-interno, o de Virgínio Marques Carneiro Leão, na Rua da Matriz.
A família mais uma vez se muda do Recife para o Rio de Janeiro, em 1896, onde reside na Travessa Piauí, na Rua Senador Furtado e depois em Laranjeiras. Bandeira cursa o Externato do Ginásio Nacional (atual Colégio Pedro II). Tem como professores Silva Ramos, Carlos França, José Veríssimo e João Ribeiro. Entre seus colegas estão Sousa da Silveira e Antenor Nascentes. 
Em 1903 a família se muda para São Paulo onde Bandeira se matricula na Escola Politécnica, pretendendo tornar-se arquiteto. Estuda também, à noite, desenho e pintura com o arquiteto Domenico Rossi no Liceu de Artes e Ofícios. Começa ainda a trabalhar nos escritórios da Estrada de Ferro Sorocabana, da qual seu paiera funcionário.  
No final do ano de 1904, o autor fica sabendo que está tuberculoso.  abandona suas atividades e volta para o Rio de Janeiro. Em busca de melhores climas para sua saúde, passa temporadas em diversas cidades: Campanha, Teresópolis, Maranguape, Uruquê, Quixeramobim. 
"... - O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo
e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino."
Em 1910 entra em um concurso de poesia da Academia Brasileira de Letras, que não confere o prêmio. Lê Charles de Guérin e toma conhecimento das rimas toantes que empregaria em Carnaval.
Sob a influência de Apollinaire, Charles Cros e Mac-Fionna Leod, escreve seus primeiros versos livres,em 1912.
A fim de se tratar no Sanatório de Clavadel, na Suíça, embarca em junho de 1913 para a Europa. No mesmo navio viajam Mme. Blank e suas duas filhas. No sanatório conhece Paul Eugène Grindel, que mais tarde adotaria o pseudônimo de Paul Éluard, e Gala, que se casaria com Éluard e depois com Salvador Dali.
Em virtude da eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914, volta ao Brasil em outubro. Lê Goethe, Lenau e Heine (no sanatório reaprendera o alemão que havia estudado no ginásio). No Rio de Janeiro, reside na rua Nossa Senhora de Copacabana e na Rua Goulart.
Em 1916 falece sua mãe, Francelina. No ano seguinte publica seu primeiro livro: A cinza das horas, numa edição de 200 exemplares custeada pelo autor. João Ribeiro escreve um artigo elogioso sobre o livro. Por causa de um hiato num verso do poeta mineiro Mário Mendes Campos, Manuel Bandeira desenvolve com o crítico Machado Sobrinho uma polêmica nas páginas do Correio de Minas, de Juiz de Fora.
O autor perde a irmã, Maria Cândida de Souza Bandeira, que desde o início da doença do irmão, havia sido uma dedicada enfermeira, em 1918. No ano seguinte publica seu segundo livro, Carnaval, em edição custeada pelo autor.  João Ribeiro elogia também este livro que desperta entusiasmo entre os paulistas iniciadores do modernismo.
O pai de Bandeira, Manuel Carneiro, falece em 1920. O poeta se muda da Rua do Triunfo, em Paula Matos, para a Rua Curvelo, 53 (hoje Dias de Barros), tornando-se vizinho de Ribeiro Couto.  Numa reunião na casa de Ronald de Carvalho, em Copacabana, no ano de 1921, conhece Mário de Andrade. Estavam presentes, entre outros, Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda e Oswaldo Orico. 
Inicia então, em 1922, a se corresponder com Mário de Andrade.  Bandeira não participa da Semana de arte Moderna, realizada em fevereiro em são Paulo, no Teatro Municipal.  Na ocasião, porém, Ronald de Carvalho lê o poema "Os Sapos", de Carnaval. Meses depois Bandeira vai a São Paulo e conhece Paulo Prado, Couto de Barros, Tácito de Almeida, Menotti del Picchia, Luís Aranha, Rubens Borba de Morais, Yan de Almeida Prado.  No Rio de Janeiro, passa a conviver com Jaime Ovalle, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Prudente de Morais, neto, Dante Milano. Colabora em Klaxon. Ainda nesse ano morre seu irmão, Antônio Ribeiro de Souza Bandeira.
Em 1924 publica, às suas expensas, Poesias, que reúne A Cinza das Horas, Carnaval e um novo livro, O Ritmo Dissoluto. Colabora no "Mês Modernista", série de trabalhos de modernistas publicado pelo jornal A Noite, em 1925. Escreve crítica musical para a revista A Idéia Ilustrada. Escreve também sobre música para Ariel, de São Paulo.
A serviço de uma empresa jornalística, em 1926 viaja para Pouso Alto, Minas Gerais, onde na casa de Ribeiro Couto conhece Carlos Drummond de Andrade.  Viaja a Salvador, Recife, Paraíba (atual João Pessoa), Fortaleza, São Luís e Belém. No ano seguinte continua viajando: vai a Belo Horizonte, passando pelas cidades históricas de Minas Gerais, e a São Paulo. Viaja a Recife, como fiscal de bancas examinadoras de preparatórios. Inicia uma colaboração semanal de crônicas no Diário Nacional, de São Paulo, e em A Província, de Recife, dirigido por Gilberto Freyre. Colabora na Revista de Antropofagia.
1930 marca a publicação de Libertinagem, em edição como sempre custeada pelo autor. Muda-se, em 1933, da Rua do Curvelo para a Rua Morais e Vale, na Lapa. É nomeado, no ano de 1935, pelo Ministro Gustavo Capanema, inspetor de ensino secundário.
Grandes comemorações marcam os cinqüenta anos do poeta, em 1936, entre as quais a publicação de Homenagem a Manuel Bandeira, livro com poemas, estudos críticos e comentários, de autoria dos principais escritores brasileiros. Publica Estrela da Manhã (com papel presenteado por Luís Camilo de Oliveira Neto e contribuição de subscritores) e Crônicas da Província do Brasil.
Recebe o prêmio da Sociedade Filipe de Oliveira por conjunto de obra, em 1937, e publica Poesias Escolhidas e Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Romântica.
No ano seguinte é nomeado professor de literatura do Colégio Pedro II e membro do Conselho Consultivo do Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Publica Antologia dos Poetas Brasileiros da Fase Parnasiana e Guia de Ouro Preto.
Em 1940 é eleito para a Academia Brasileira de Letras, na vaga de Luís Guimarães Filho. Toma posse em 30 de novembro, sendo saudado por Ribeiro Couto. Publica Poesias Completas, com a inclusão da Lira dos Cinqüent'Anos (também esta edição foi custeada pelo autor). Publica ainda Noções de História das Literaturas e, em separata da Revista do Brasil, A Autoria das Cartas Chilenas.
Começa a fazer crítica de artes plásticas em A Manhã, em 1941, no Rio de Janeiro. No ano seguinte é nomeado membro da Sociedade Filipe de Oliveira. Muda-se para o Edifício Maximus, na Praia do Flamengo.  Organiza a edição dos Sonetos Completos e Poemas Escolhidos de Antero de Quental.
Nomeado professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia, em 1943, deixa o Colégio Pedro II. Muda-se, em 1944, para o Edifício São Miguel, na Avenida Beira-Mar, apartamento 409. Publica Obras Poéticas de Gonçalves Dias, edição crítica e comentada. No ano seguinte publica Poemas Traduzidos, com ilustrações de Guignard.
Recebe o prêmio de poesia do IBEC por conjunto de obra, em 1946.  Publica Apresentação da Poesia Brasileira e Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos.
Em 1948 são reeditados três de seus livros: Poesias Completas, com acréscimo de Belo Belo; Poesias Escolhidas e Poemas Traduzidos.  Publica Mafuá do Malungo (impresso em Barcelona por João Cabral de Melo Neto) e organiza uma edição crítica das Rimas de João Albano.  No ano seguinte publica Literatura Hispano-Americana e traduz O Auto Sacramental do Divino Narciso de Sóror Juana Inés de la Cruz.
A pedido de amigos, apenas para compor a chapa, candidata-se a deputado pelo Partido Socialista Brasileiro, em 1950, sabendo que não tem quaisquer chances de eleger-se. No ano seguinte publica Opus 10 e a biografia de Gonçalves Dias. É operado de cálculos no ureter.  Muda-se, em 1953, para o apartamento 806 do mesmo edifício da Avenida Beira-Mar.
No ano de 1954 publica Itinerário de Pasárgada e De Poetas e de Poesia. Faz conferência no Teatro Municipal do Rio de Janeiro sobre Mário de Andrade. Publica 50 Poemas Escolhidos pelo Autor, em 1955.  Traduz Maria Stuart, de Schiler, encenado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em junho, inicia colaboração como cronista no Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, e na Folha da Manhã, de São Paulo. Faz conferência sobre Francisco Mignone no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Traduz Macbeth, de Shakespeare, e La Machine Infernale, de Jean Cocteau, em 1956. É aposentado compulsoriamente, por motivos da idade, como professor de literatura hispano-americana da Faculdade Nacional de Filosofia.
Traduz as peças June and the Paycock, de Sean O'Casey, e The Rainmaker, de N. Richard Nash, em 1957.  Nesse ano, publica Flauta de Papel. Em julho visita para a Europa, visitando Londres, Paris, e algumas cidades da Holanda. Retorna ao Brasil em novembro. Escreve, até 1961, crônicas bissemanais para o Jornal

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