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94 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Unidade III 7 AVALIAÇÃO DE SISTEMAS E AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL Freitas et al (2011) reconhece a importância da avaliação em larga escala quando esta é conduzida por uma metodologia adequada e traz informações sobre o desempenho dos alunos, as condições de trabalho dos professores e o funcionamento das escolas de uma rede. Cita como exemplo o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), cujo objetivo é traçar séries históricas do desempenho dos sistemas e assim possibilitar a verificação de tendências ao longo tempo com a finalidade de reorientar políticas públicas. Explica que no Brasil predominam as avaliações no nível da federação e dos estados, mas alerta que há uma ilusão de que avaliações de larga escala possam avaliar também a escola e os professores. Por isso defende que [...] avaliações de redes de ensino seriam mais eficazes se planejadas e conduzidas no nível dos municípios pelos conselhos municipais de educação. A unidade deve ser o município e não a federação ou o estado. Isso não impede estes últimos de conduzirem suas avaliações de escala, mas não com o propósito de avaliar uma escola ou suas salas de aula. Os conselhos deveriam regular os processos de avaliação das redes de educação básica, estruturando uma política de avaliação global para o município (FREITAS et al, 2011, p.47). O autor justifica que, dessa maneira, a construção da matriz de avaliação pode ser feita a partir da realidade das salas de aula para verificar o que os professores realmente ensinam e a eficácia desse método. A partir desses procedimentos, o autor considera que os resultados das avaliações de rede serão mais úteis ao corpo docente, uma vez que sua elaboração ocorreu em um processo negociado e legitimado pela prática em sala de aula. Podemos compreender, com base na proposta apresentada, a preocupação de Freitas et al em buscar a coerência nas avaliações. Cabe-nos, contudo, ressaltar o cuidado que se deve ter para não se perder de vista a coesão no desenvolvimento do currículo e a aplicação em todo o país dos conteúdos essenciais do seu núcleo comum, para garantir que todos os estudantes tenham acesso aos conhecimentos historicamente acumulados. Se couber somente aos municípios decidir o que ensinar e quando ensinar, corre-se o risco de perder a consistência daquilo que se ensina, o que já ocorre, em certa medida, posto que não há um currículo nacional, oficial; o que existe são parâmetros e diretrizes mais gerais. Freitas et al descrevem que, depois de concluída essa primeira etapa, a fase seguinte refere-se à elaboração de testes para os alunos com base na matriz de referência preparada pelos professores e 95 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL especialistas da rede. O autor sugere a utilização da TRI (Teoria da Resposta ao Item), pela possibilidade que apresenta na elaboração de escalas de desenvolvimento dos alunos. Explica que esta técnica permite um mapeamento da turma, mostrando ao professor o nível de desempenho de seus alunos por grau de dificuldade ao longo da escala. Segundo o autor, essa informação possibilita ao professor avaliar seu trabalho em determinada sala de aula, como também pode ser utilizada pelo professor do ano seguinte para direcionar seu plano de ação. Reproduzimos a seguir um exemplo desse processo, utilizado pelo autor, com dados de uma turma de 1ª série do Ensino Fundamental. Tabela 2 – Proficiência em Matemática no início do ano Proficiência em Matemática no início do ano Turma Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4 Nível 5 Nível 6 1 1 10 1 4 0 0 16 2 4 9 6 5 0 0 24 3 1 4 13 4 0 0 22 4 3 4 5 11 0 0 23 5 2 7 6 1 0 0 16 6 1 2 5 3 0 0 11 7 1 0 6 16 2 0 25 8 0 2 5 14 1 0 22 9 0 0 2 12 8 0 22 10 3 4 6 3 0 0 16 Total 16 42 55 73 11 0 197 Fonte: Freitas (2011). Tabela 3 – Proficiência em Matemática no final do ano Proficiência em Matemática no final do ano Turma Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4 Nível 5 Nível 6 1 0 0 7 8 1 0 16 2 0 4 11 9 0 0 24 3 0 2 5 9 6 0 22 4 0 0 6 13 4 0 23 5 0 0 10 6 0 0 16 6 0 2 6 2 1 0 11 7 0 0 0 3 22 0 25 8 0 0 2 8 11 0 21 9 0 0 0 6 13 3 22 10 0 1 5 4 6 0 16 Total 0 9 52 68 64 3 196 Fonte: Freitas (2011). 96 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Freitas et al explicam que, comparando as últimas linhas das duas tabelas que se referem aos totais de alunos em cada nível, é possível perceber sua movimentação no decorrer do ano, conforme o exemplo a seguir: Tabela 4 – Proficiência em Matemática comparada entre início e fim do ano: visão geral da escola Proficiência em Matemática comparada entre início e fim do ano: visão geral da escola Nível 1 Nível 2 Nível 3 Nível 4 Nível 5 Nível 6 Total início 16 42 55 73 11 0 197 Total Fim 0 9 52 68 64 3 196 Fonte: Freitas (2011). O autor enfatiza que estes resultados devem ser utilizados pela própria escola e pelo professor para revisão das estratégias de ensino e não para fomentar competições entre professores e escolas, tampouco para ser usado como base para bonificação salarial por mérito. Defende que “o controle social sobre o professor deve ser responsabilidade do coletivo da escola, no processo de avaliação institucional” (FREITAS et al, 2011, p. 53). Quanto à questão da elaboração e aplicação das avaliações, Freitas et al reafirmam que, sendo estes processos de responsabilidade dos municípios, fica mais fácil controlá-los e, com isso, diminuem os erros de aplicação, que são aqueles problemas inesperados e enganos que ocorrem durante os procedimentos dos testes de campo. Ressalta também que outro lado positivo neste processo é a interpretação dos dados por profissionais das escolas da rede, cujo envolvimento favoreceria a compreensão dos problemas encontrados. Por exemplo, se, de 30 alunos, 12 erraram a mesma questão, tal erro pode ser considerado indicador da necessidade de maior exploração do conteúdo de ensino não compreendido por meio de uma investigação pelo professor sobre o que levou tais alunos a determinada reposta e, a partir dessas pistas apontadas por eles, será possível compreender sua linha de raciocínio e, assim, elaborar técnicas mais eficazes de ensino. Entendemos que é essa característica de investigador de como a aprendizagem ocorre que diferencia o professor de outras pessoas ou profissionais que também transmitem conhecimentos e informações, o que não quer dizer que efetivamente ensinam. Embora o autor recomende a internalização da prática de avaliações de desempenho pelas redes locais, cita a importância de algumas técnicas mais sofisticadas como a de “análise por envoltória de dados”, que tem como objetivo “obter uma visão global do desenvolvimento das escolas e encontrar uma fronteira sem que se imponha de fora para dentro um padrão de desempenho único”. Para ele, este padrão deve ser criado com base nas diferenças que existem entre as escolas de uma determinada rede de ensino. “Práticas bem sucedidas em algumas escolas podem ser localizadas e socializadas entre elas, sem propósito de competição” (FREITAS et al, op. cit. 2011, p. 53). As ideias voltadas para a avaliação pelas redes de ensino locais vêm ao encontro do princípio da gestão participativa, do desenvolvimento da autonomia e do incentivo à proatividade proporcionando o empoderamento das escolas e redes. 97 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL 7.1 Aspectos políticos implicados na avaliação externa de escolas Segundo Freitas et al, a “regulação” é inerente a toda política pública, levando em conta o significadogenérico da palavra. Porém, o autor ressalta que o termo “regulação” foi arquitetado no berço das políticas públicas neoliberais. Assim, passou-se a incorporar o discurso para denotar uma mudança na ação do estado com a função de avaliador sem intervir no mercado, o que é considerado um risco, posto que a lei do mercado é regulada por interesses específicos das empresas em aumentar seu capital e não pelo interesse público e social. Santos (2001) lembra que devemos estar atentos para não sermos convencidos da “bondade dos presentes processos de globalização” que pregam a morte do Estado para justificar a aceleração do desenvolvimento econômico das nações de terceiro mundo. Em sua visão o que ocorre, de fato, é que o Estado se fortalece somente para atender aos interesses das grandes redes de empresas nacionais e internacionais, em detrimento do cuidado com as populações que vêm enfrentando cada vez mais dificuldades de subsistência. O autor explica que as políticas regulatórias desejam transferir o poder de regulação do Estado para o mercado por meio da privatização de áreas estratégicas do serviço público. Alerta que, com a privatização desses serviços, o estado transfere seu controle para organismos de regulação do mercado. Com a privatização, o governo perde progressivamente sua capacidade de intervenção nestes serviços, que passam a ser afetados somente pelas leis de mercado e, neste sentido, Freitas et al reafirmam que não se pode discutir o conceito de regulação de forma abstrata, mas é preciso relacioná-lo ao tipo de política pública implementada, senão corremos o risco de analisar essa “regulação” de forma superficial, sem entender o seu conteúdo. Uma grande preocupação do autor é a de que o modelo neoliberal de privatização dos serviços públicos seja incorporado e aceito como o único possível em nossa sociedade e que deixemos de lado a crença de que é possível realizar mudanças dentro das instituições criadas pelo próprio estado. Ressalta que há duas grandes políticas públicas: [...] as chamadas neoliberais e as que chamaríamos democráticas e participativas. Ainda que esta característica não seja suficiente para esgotar as diferenças dessas políticas, para os nossos propósitos é a que mais nos interessa. Isto, porque, nas políticas neoliberais, a mudança é vista como parte de ações gerenciais administradas dentro de um “centro pensante”, técnico [...], enquanto que a tendência das políticas participativas é gerar envolvimento da ponta do sistema. E é nos momentos em que o serviço público é administrado por políticas participativas que se abre a possibilidade para incrementar tanto a qualidade do serviço público como a organização dos seus trabalhadores, de forma a criar condições para a contrarregulação (FREITAS et al, 2011, p. 56). Freitas et al defendem que as mudanças precisam acontecer dentro dos espaços institucionais, que precisam de alguma forma de “regulação”, no sentido amplo do termo. E acrescenta que, se não houver uma crença nesta possibilidade da luta institucional para melhoria do sistema, não há mais nada a ser 98 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III dito e seriam necessárias outras estratégias. Porém, uma vez que se admite a perspectiva de mudança pela luta por dentro das instituições, será necessária alguma forma de “regular” como alicerce para todas as políticas públicas, mesmo que não agradem a todos. Para aprofundar a discussão sobre essa temática, o autor faz a seguinte análise: [...] durante os dez últimos anos, estivemos criticando as políticas neoliberais e seus efeitos. Foi um trabalho notável se examinado em perspectiva. Neste mesmo tempo, as políticas democráticas e participativas ocuparam espaços em vários lugares (municípios, estados, federação). Os resultados destas políticas permanecem ainda como tema de avaliação. É compreensível que tivéssemos investido na crítica do neoliberalismo, mas uma vez tendo avançado nesta, faz-se necessário que nos debrucemos sobre os resultados das políticas que a ela se contrapõem. Tal objetivo não pode ser realizado a partir de um esforço pessoal isolado, mas é temática para grupos de pesquisa e esforços coletivos sistemáticos para o qual deve ser convocada a comunidade científica compromissada com as políticas públicas progressistas. Nosso objetivo, aqui, é tão somente provocar este debate (FREITAS et al, 2011, p. 57). O autor passa então a discutir alguns resultados e efeitos produzidos na prática naqueles lugares do país que investiram em políticas democráticas e participativas. Freitas et al lembra que as políticas neoliberais sempre foram acusadas, com razão, de serem implementadas com autoritarismo, ou seja, de forma unilateral, muito diferente das políticas progressistas identificadas por seu formato de gestão democrática e participativa. Devido a essa conquista, mesmo que ainda pouco abrangente, é que o autor dirige suas reflexões para a questão das conquistas alcançadas por essas políticas participativas e democráticas, tanto na qualidade dos serviços educacionais prestados aos alunos como na organização dos trabalhadores da educação, alertando que [...] em algumas redes públicas de ensino administradas por políticas participativas, avolumam-se as queixas no sentido de que os investimentos em condições de trabalho e qualificação do professor têm dificuldades para se espelharem na melhoria do atendimento aos alunos, medido pelas taxas de reprovação, evasão e desempenho cognitivo. Há indícios de que o nível socioeconômico ainda continua definindo a apropriação do conhecimento, sem que a escola consiga gerar mais equidade (FREITAS et al, 2011, p. 57-58). A partir de um estudo desenvolvido em 34 escolas de uma rede pública de ensino, Freitas et al demonstram, por meio de comparação entre o nível socioeconômico médio da escola e a porcentagem de alunos reprovados, que à medida que o nível socioeconômico aumenta, diminui o nível de reprovação na rede. Esse resultado, afirma o autor, contraria o objetivo das políticas, uma vez que a população mais pobre continua sendo alvo da reprovação. E acrescenta que o que surpreende nos relatos dos gestores é a falta de sintonia entre a melhoria nas condições de trabalho e a transposição desta melhoria para a formação dos alunos. Ressalta, porém, que não tem a intenção de demonstrar com a apresentação desses 99 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL dados, que os esforços foram em vão. Sua finalidade é de “alertar para o fato de que as administrações progressistas não podem conviver com tais resultados sob pena de vermos fortalecidas as teses privatistas e neoliberais” (FREITAS et al, 2011, p. 59). Reproduzimos o gráfico a seguir, no qual o autor analisa a dispersão dos resultados entre as escolas desta mesma rede. Informa-nos que, para esse estudo, foram considerados também dados da própria rede, coletados por um censo local realizado à mesma época de sua pesquisa. Explica que foi utilizada a técnica DEA (Análise por Envoltória de Dados) por favorecer um resultado mais preciso. IET IE P 3 3 2,5 2,5 2 2 1,3 1,3 1 1 0,5 0,5 0 0 Figura 15 Neste gráfico, o autor mostra que das 34 escolas apenas 4 podem ser consideradas próximas do ponto de eficiência máxima, no cruzamento dos valores “1”, em que se percebe que todas as outras vão se distanciando. Esses dados indicam, segundo Freitas et al, uma eficiência menor da gestão e/ou de resultados. A seguir, reproduzimos tabelas contendo dados relevantes, organizados neste trabalho e discutidos pelo autor, que analisa os resultados encontrados numa rede de ensino gerida por uma administração progressista. A primeira tabela compara a média de alunos reprovados nesta rede seguindo uma linha sequencialde dois anos antes e um ano depois dos dados. Observe: Tabela 5 Média anual de reprovação na rede 2001 2002 2003 2004 18,0% 17,6% 15,3% 15,3% Fonte: Freitas et al (2011). Freitas et al chamam atenção para o fato de que, embora o índice de reprovação tenha sido atenuado no decorrer dos anos, não houve uma alteração substancial na realidade escolar, que apresenta uma estagnação nos dois últimos anos, reconhecidamente o período em que houve um maior investimento nas condições de trabalho da rede. 100 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Na discussão desse resultado, o autor faz uma importante observação sobre o questionamento mais comum de que tais dados “são apenas medições do desenvolvimento cognitivo do aluno e não de seu desenvolvimento global. Mas quem defenderia que o desenvolvimento cognitivo não devesse caminhar junto com o global?” (FREITAS et al, 2011, p. 61). O autor relata que, no mesmo ano em que os dados foram coletados (2003), foi feito um levantamento com 63% dos professores desta rede sobre alguns aspectos das condições de trabalho. Os resultados foram os que seguem: 1 - 68% dos professores trabalhavam nessa rede havia mais de dez anos e 11% na faixa de 6 a 9 anos, com um total de 79% cuja experiência era superior a 10 anos de rede. 2 - As questões relativas a condições de trabalho obtiveram as seguintes respostas: Tabela 6 Item Não Sim, mas não foi grave Sim, e foi grave Não respondeu Insuficiência de recursos pedagógicos 35% 46% 12% 7% Insuficiência de recursos financeiros 34% 46% 9% 4% Falta de professores na rede 36% 37% 20% 7% Rotatividade de professores na rede 61% 26% 4% 9% Fonte: Freitas et al (2011). A próxima tabela apresenta questões relativas à presença na escola: Tabela 7 Item Não Sim, mas não foi grave Sim, e foi grave Não respondeu Faltas de professores às aulas 42% 45% 6% 7% Falta de alunos às aulas 44% 37% 12% 7% Interrupção de atividades escolares 68% 20% 5% 7% Fonte: Freitas et al (2011). Em relação à satisfação com o salário, o resultado foi o seguinte: Tabela 8 Item Não Sim Não respondeu Satisfação salarial 82% 15% 3% Fonte: Freitas et al (2011). 101 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL A questão sobre a formação continuada revela que: Tabela 9 Item Sim Não Não respondeu Participou de algum curso de formação 53% 44,6% 4,4% Tabela 10 Item Menos de 20 horas 20 a 40 horas Mais de 40 horas Não respondeu Número de horas de formação 38,2% 15,7% 24,1% 22% Fonte: Freitas et al (2011). A partir da análise destes resultados, o autor verifica que: 1 – O quadro de professores é experiente; a percepção deles é de que não se reportam insuficiências de recursos pedagógicos ou financeiros; que alunos e seus professores estão em seus respectivos lugares e não faltam ou tem interrupções excessivas em seu trabalho. A formação continuada estava presente. 2 – A questão salarial que motivava a insatisfação apontada foi resolvida no ano seguinte (2004), colocando os professores da rede entre os que têm salários mais elevados entre os municípios brasileiros, o que já encontrava à época em negociação. Entretanto, as condições de remuneração não eram más, mesmo antes dessa alteração salarial, já que havia possibilidade de participação em projetos remunerados que acresciam até 12 horas a mais em ganhos. Com as alterações, cerca de 40% das horas pagas ao professor foram reservadas para preparação de aulas e qualificação. Nem por isso os resultados de reprovação em 2004 modificaram-se (FREITAS et al, 2011, p. 62-63). Para ilustrar alguns problemas gerados no cotidiano escolar que precisam de intervenções pontuais para romper com uma conduta profissional nociva, Freitas et al lançam mão de estudos qualitativos realizados por Oliveira (2005), que colheu dezenas de depoimentos nesta mesma rede de ensino, entre 2000 e 2004. Reproduzimos a seguir as falas selecionadas pelo autor que chamam a atenção pela superficialidade de seu conteúdo: — Eu duvido que os problemas das escolas vão acabar com os professores se reunindo para conversar, montar livrinho, fazer propaganda [para o governo]. [...] Tem professora aqui que não quer dar aula, quer fazer curso... 102 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III No horário da aula, é lógico, porque professor para enrolar está sozinho, a Secretaria ainda dá incentivo... [...] É para melhorar a sala de aula? Não é, é só interesse pessoal (Vice-diretora efetiva, depoimento dado em 2003). — Olha, muda o governo e cada um vem querer deixar suas marcas, mas eu acho que nunca vai privilegiar os professores, não é possível. Eu acumulo com o Estado, não dá para ficar nesta lenga-lenga de ficar conversando, é só exploração nesta prefeitura. Agora me inventaram aquelas duas horas que a gente tem que ficar discutindo o que fazer com o aluno que não aprende direito, que não lê [...]. Publicaram no Diário Oficial que agora todo mundo vai fazer projeto político-pedagógico. Essa é boa, o projeto da escola que sempre foi escrito pela orientadora pedagógica e pela diretora, agora os professores vão ter que escrever ele também? Dar mais trabalho, entuchar a gente de trabalho é exploração... (professor de 5ª série, depoimento dado em 2003). — Eu faço o que dá, não me estresso, não me desgasto não. Na escola ou você cumpre as formalidades ou você ensina. Não to nem aí que o aluno aprendeu, se deixou de aprender. Me pagam muito pouco para cuidar de filho dos outros. Faço o que posso, faço o que me pagam. Se me pagam pouco, ensino pouco. Se me pagam justo, ensino o justo (professora efetiva de séries iniciais, depoimento dado em 2003) (FREITAS et al, 2011, p. 64). Freitas et al esclarecem que estes depoimentos não representam o que essa rede de ensino pensa. No entanto, ressalva que [...] enquanto houver professores pensando assim, o poder público não pode cruzar os braços à espera de que haja uma “conscientização” espontânea do serviço público, pois cada um desses profissionais tem sob sua responsabilidade dezenas de crianças. O poder público está obrigado a “regular” para criar as condições institucionais que alterem este quadro e não pode apenas confiar no voluntarismo ou na boa vontade. Este é um problema que as políticas participativas precisam enfrentar: como lidar com uma parcela do serviço público que não se engaja na luta pela melhoria de suas condições de trabalho, não se sensibiliza pelo aumento da qualidade dos serviços oferecidos aos alunos e nem se envolve com práticas que maximizem sua própria organização (FREITAS et al, 2011, p. 64). O autor destaca que nas falas utilizadas como exemplo não há referências pelos profissionais às lutas nas quais tivessem se engajado para modificar a realidade por eles descrita, tanto sobre as questões salariais como as que se referem às condições de trabalho; aparece somente a constatação das dificuldades em que se apoiam para justificar suas condutas. Freitas et al concluem que: “em alguns casos é quase uma torcida para que os problemas não sejam resolvidos, permitindo que sua posição continue justificada, autorizando soluções individualistas” (FREITAS et al, 2011, p. 64-65). 103 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Acreditamos na relevância desta pesquisa realizada por Freitas et al para uma conscientização maior dos agentes educacionais que atuam nas escolas e também daqueles que atuam mais diretamente na mobilização da sociedade para os interesses educacionais, como é o caso das associações de professores que precisam defendersalários, planos de carreiras e condições de trabalho, como também deveriam defender, com a mesma intensidade, a ética e o compromisso com o serviço público. Porém, é importante observar que essa parte da pesquisa que ouviu o ponto de vista dos professores, por ser de questões abertas, portanto, de características qualitativas, oferece alguns limites para a análise. Ou seja, como é inviável a tabulação completa da fala dos professores, a tendência do pesquisador é optar por um determinado ponto para o estudo qualitativo, e, neste caso, foi o lado negativo que chamou mais atenção. A escolha dos exemplos negativos pode ser reveladora de algumas práticas, mas, como o próprio autor destaca, não representam a maioria. No entanto, certamente geram um grande mal estar naqueles bons profissionais que podem representar a maioria, assumindo, por vezes, uma culpa generalizada pela conduta de alguns. O que também pode levar um observador externo a interpretações unilaterais e reducionistas de todos os problemas que interferem no desempenho escolar. Sentimos falta nesta pesquisa de questionamentos em relação ao acompanhamento dos pais à rotina escolar dos filhos. Será que havia, à época, uma preocupação da rede de ensino no sentido de orientar as famílias sobre o seu papel no fortalecimento do trabalho escolar? É claro que não nos referimos ao ensino, mas à importância cultural dada a ele pelas famílias. Acreditamos que, como não foram relevantes as faltas dos professores nem dos alunos, faltou conhecer o papel que a família exerce nesse contexto, ou seja, saber se os filhos têm horário de estudo em casa, se a escola passa tarefa regularmente e, ainda, o que a escola faz para obter resultados melhores. Não foi revelado também se, entre as escolas localizadas nas áreas mais pobres economicamente, houve algum resultado mais positivo ou mais próximo ao das escolas localizadas em áreas mais abastadas. Seria interessante descobrir algumas razões que levam à diferenciação de resultados na própria rede, em realidades semelhantes. O fato dos alunos com mais condições financeiras obterem resultados melhores pode ser explicado por pelo menos dois fatores: um deles se deve ao capital cultural escolarmente rentável já adquirido pelos alunos no seio familiar e social em que convivem, fornecendo-lhes uma posição privilegiada no ponto de partida inicial; o outro fator se refere a um grau maior de valorização da escola pelas famílias e estudantes como meio de ascensão social e econômica. Embora saibamos que os aspectos citados não sejam suficientes para explicar a dispersão nos resultados, eles devem ser levados em conta, principalmente para descobrir meios mais eficazes de orientação e acompanhamento às famílias que apresentam um maior distanciamento cultural em relação à escola. Por isso defendemos o trabalho em rede, intersetorial, por proporcionar uma visão sistêmica dos problemas que interferem no cotidiano escolar e das soluções possíveis internas e externas à escola. Estão surgindo atualmente iniciativas de trabalho em rede. Citamos como exemplo o Projeto Ponte (ROBERTI; PAIVA, 2011), um projeto que visa ao aumento da permanência escolar e se apoia no tripé da garantia do direito à educação escolar de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, a 104 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III saber: inserção, atendimento e acompanhamento na escola e nos outros serviços da rede de proteção como a saúde, a segurança e a assistência social. O Projeto Ponte defende o princípio da responsabilidade compartilhada, ou seja, para que a escola consiga cumprir o seu papel específico, que é ensinar, cabe à sociedade organizada garantir à criança e ao adolescente os outros direitos constitucionais, uma vez que para os idealizadores desse trabalho a não violação dos direitos à educação depende, em boa medida, da não violação dos demais direitos, como os citados. Com essas experiências, talvez possamos descobrir outras causas e soluções para os problemas educacionais. Senão, continuaremos explicando os resultados ruins somente utilizando exemplos de maus profissionais que, infelizmente, existem em todas as áreas, embora, geralmente, em pequenas proporções. Estes realmente devem sofrer uma intervenção direta e eficaz da administração pública. 7.2 Avaliação institucional e de sala de aula Freitas et al consideram que o papel da avaliação institucional é o de fazer a mediação entre a avaliação de sistema (externa) e a avaliação de sala de aula dirigida pelo professor, por acreditar que essa é a forma mais coerente de se utilizar os resultados, validá-los e descobrir formas de melhoria para os problemas apontados. O autor ressalta que [...] o simples envio ou disponibilização de dados em um site não terá um mecanismo seguro de reflexão para esses. Os dados podem até ter legitimidade técnica, mas lhe faltará legitimidade política. [...] a avaliação em larga escala de redes de ensino precisa ser articulada com a avaliação institucional e de sala de aula (FREITAS et al, 2011, p. 65). Freitas et al explicam que, no Brasil, há uma tendência de se utilizar os resultados da avaliação de sistema para avaliar a sala de aula e a escola. Cita como exemplo a Prova Brasil, que publica os resultados de todas as escolas e os envia para essas com a recomendação de que sejam analisados pelos profissionais e que sejam elaboradas propostas para melhorar as práticas de ensino e aprendizagem. Contudo, isto não ocorre como o esperado, visto que os dados não são “reconhecidos” por essas escolas, o que limita sua utilização. Em função disso o autor reforça que [...] a avaliação de sistema é um instrumento importante para monitoração das políticas públicas e seus resultados devem ser encaminhados, como subsídio, à escola para que, dentro de um processo de avaliação institucional, ela possa consumir estes dados, validá-los e encontrar formas de melhoria [...] Explicar o desempenho de uma escola implica ter alguma familiaridade e proximidade com o seu dia a dia o que não é possível para os sistemas de avaliação em larga escala realizados pela federação ou pelos estados, distantes da escola (FREITAS et al, 2011, p. 65-66). Freitas et al defende que haja “uma negociação ampla e responsável com toda a comunidade escolar em torno do seu projeto pedagógico, e das suas demandas, incluindo um sistema de monitoramento de qualidade público construído coletivamente” (FREITAS et al, 2011, op. cit. p. 66). Dessa forma, acredita 105 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL que a escola cumprirá sua função de atender ao direito da população a um serviço público de qualidade e será capaz de desenvolver mecanismos de contrarregulação para impedir ou amenizar os efeitos das políticas públicas neoliberais. Reproduzimos a seguir uma ilustração utilizada pelo autor para explicar a relação necessária entre as três formas de avaliação identificadas nesse trabalho: a avaliação de redes, a avaliação institucional e a avaliação do professor em sala de aula. Avaliação de redes Avaliação Institucional da escola Avaliação em sala de aula Figura 16 – Relações entre os níveis de avaliação e a avaliação institucional Para garantir o sucesso na aplicação desse modelo, Freitas et al lembram que, além da avaliação institucional, torna-se necessária a elaboração de um conjunto de medidas para fazer o acompanhamento longitudinal do desempenho das crianças na rede de ensino. Ressalta que esse sistema não deve substituir a avaliação feita na escola pelo professor; seu objetivo será o de estabelecer linhas de comparação entre as escolas de uma mesma rede de ensino para favorecer a reflexão durante o processo de avaliação institucional das escolas. O autor destacaque existem maneiras justas para se estabelecer estas linhas de comparação como levar em conta o desempenho do aluno e a realidade da escola em que ele está inserido. Entendemos que a realidade da escola a que se refere compreende os fatores internos e externos à instituição escolar que interferem positiva ou negativamente em seus resultados. A partir dessa reflexão, Freitas et al defendem que a avaliação institucional, ao lado de um sistema de monitoramento de desempenho dos alunos, deve “criar as condições necessárias para mobilizar a comunidade local das escolas na construção da sua qualidade e na melhoria de sua organização” (FREITAS et al, 2011, p. 68). Reforça que também cabe a esta comunidade pressionar aqueles servidores públicos resistentes “a assumir o verdadeiro espírito de serviço público onde o atendimento indiferenciado é uma pedra fundamental” (FREITAS et al, 2011, p. 68). Podemos compreender que esse é um dos exemplos apontados por Freitas et al de contrarregulação, dentro dos princípios de uma gestão democrática e participativa em que a comunidade local terá condições de fazer com que os servidores públicos pensem sobre “a ética de suas condutas, sobre a responsabilidade na denúncia da falta de condições de trabalho e sobre a responsabilidade do bom uso das condições de trabalho quando elas são atendidas” (FREITAS et al, 2011, p. 68). Assim sendo, esta mesma comunidade “poderá pressionar o próprio poder público a investir nas condições de funcionamento da escola e em seus profissionais” (FREITAS et al, 2011, p. 68). 106 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Observação Uma ferramenta que vem sendo utilizada com bastante propriedade por alguns sistemas de ensino é á análise estratégica da situação, a análise FOFA (Forças, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças), que consiste em fazer um diagnóstico da escola e seu entorno para se descobrir como usar os pontos fortes (internos) e as oportunidades (externas) para minimizar os pontos fracos (internos) e neutralizar as ameaças (externas) (CECIP, 2009, p. 68). Lembrete Para que a avaliação institucional produza os efeitos de melhoria da qualidade do ensino é necessária a participação efetiva de todos os segmentos da comunidade escolar. Neste livro, Freitas et al apresentaram uma proposta para a avaliação educacional seguindo os princípios de uma educação emancipatória. Para se colocar em prática estes princípios, propõe a participação efetiva dos profissionais da escola na condução da avaliação institucional que deve integrar os dados da avaliação de redes e das avaliações internas para se obter uma linha de comparação que possa nortear o plano de ação da escola na melhoria da qualidade do ensino. Além dos esforços internos, propõe a organização e união dos profissionais do ensino com toda a comunidade escolar para cobrarem a responsabilização do poder público em defesa da melhoria da estrutura escolar, das condições de trabalho e salários. Saiba mais As publicações institucionais a seguir podem propiciar uma inter- relação com os conteúdos da unidade: BRASÍLIA. Progestão: como desenvolver a avaliação institucional da escola. Módulo IX. CONSED, 2001. Reimpressão: São Paulo, 2005. BAHIA. Programa para gestores escolares: gerenciando a escola eficaz: conceitos e instrumentos. Salvador: Secretaria de Educação da Bahia, Fundação Luís Magalhães, 2000. 107 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Observação A solução do problema da oferta de uma educação pública de qualidade passa pela compreensão do que pensam e fazem os profissionais do ensino que trabalham diretamente com a escola. Apresentamos a seguir o recorte de uma avaliação institucional realizada pela Supervisão de Ensino de uma Escola da Rede Estadual de um município do interior do estado de São Paulo, a partir de Relatório de Avaliação Institucional de Roberti et al (2009), como resposta a problemas detectados em uma escola, cuja solução envolvia a participação ampla dos diversos segmentos da instituição escolar. Acreditamos que este exemplo poderá auxiliar a compreensão da teoria aplicada à prática e suscitar novas elaborações para aprimorar a construção de avaliações cada vez mais assertivas. Justificativa O projeto de Avaliação Institucional (AI) da “EE Vida Nova” deu-se em razão dos problemas recorrentes da escola, esclarece a autora, ora nas questões estruturais ora nas questões relacionais, para os quais não houve soluções satisfatórias, culminando em sucessivas reclamações na ouvidoria e plantões de atendimento ao público da Diretoria de Ensino, feitas por diversos agentes escolares: professores, alunos, pais e membros da comunidade. Esta AI visou identificar os pontos fortes e os pontos fracos da escola com vistas ao fortalecimento de práticas bem sucedidas e à busca de solução, por todos os integrantes da equipe escolar, para os problemas apresentados. Metodologia Paiva (2011) explica que este trabalho iniciou-se em abril de 2010 por meio de reuniões com a equipe gestora, professores, alunos, funcionários e uma carta explicativa aos pais. Utilizou instrumentos de pesquisa com questões abertas e fechadas. Os professores e funcionários responderam a questões abertas sobre pontos fortes e fracos da escola, cabendo-lhes também uma autoavaliação com questões fechadas sobre todas as dimensões do trabalho escolar. Os alunos fizeram uma avaliação dos professores a partir de um questionário com questões sobre a prática de ensino. Os pais responderam a questões abertas relativas ao seu grau de satisfação com a escola. A participação desses últimos foi por amostragem. A autora destaca que é muito importante que a equipe gestora incorpore a prática da AI na escola e que retome este processo pelo menos uma vez por ano, aperfeiçoando os instrumentos utilizados e periodicamente avalie o cumprimento das metas estabelecidas no plano de ação para superação dos problemas. Paiva concluiu este projeto apresentando à equipe escolar o resultado da AI com a finalidade de que juntos analisassem estrategicamente, à luz da pesquisa realizada e documentos institucionais, as circunstâncias que favoreciam a ocorrência dos problemas elencados e planejassem formas de 108 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III superação desses, visando à utilização de recursos potenciais internos e externos ao ambiente escolar. Resultados Apresentamos a seguir os resultados da avaliação institucional da Escola Estadual “Vida Nova”. A visão dos professores e funcionários Pontos fortes da escola Paiva relata que os resultados, apresentados nos gráficos a seguir, foram categorizados de acordo com a frequência em que o mesmo tema foi citado pelos respondentes e que as questões pontuais, com menor ocorrência, foram listadas e apresentadas à época à equipe escolar. Principais ocorrências: pontos fortes 41 36 31 26 21 16 11 6 1 -4 Ní ve l d e s ati sfa çã o c om a dir eç ão Ní ve l d e s ati sfa çã o c om o tra ba lho da ... De sem pe nh o d oc en te (re lac ion al e.. . Int ere sse do s a lun os Am bie nt e d e t rab alh o Re cu rso s f ísi co s e m ate ria is Figura 17 – Principais ocorrências: pontos fortes Na análise desse resultado a autora avalia que [...] embora o nível de satisfação com a equipe gestora possa ser considerado alto, não se trata de uma unanimidade, visto que dentre o total de respondentes 109 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL houve um grupo que elogiou o trabalho da diretorae vice-diretora e o outro o trabalho da coordenação, demonstrando, naquele momento uma falta de integração da equipe gestora, percebida pela equipe escolar. É alto também o reconhecimento pelo grupo da qualidade e empenho do trabalho docente. O interesse do aluno aparece em menor escala, mas aparece como ponto positivo o que já pode ser considerado um diferencial, para esta escola, uma vez que é comum a reclamação dos professores da maioria das escolas sobre a falta de interesse dos alunos (PAIVA, 2010, p. 13). Principais ocorrencias: pontos fracos 35 30 25 15 5 0 10 20 Re cu rso s f ísic os e m ate ria is Fal ta de en tro sam en to en tre di reç ão e. .. Ind isc ipl ina de al un os e v an da lism o Éti ca pr ofi ssi on al Pro ble ma s n a r ela ção co m a c om un ida de Sa las su pe rlo tad as Fal ta de pr ofe sso res Figura 18 – Principais ocorrências: pontos fracos Na análise dos pontos fracos, percebe-se que os mais citados referem-se ao problema do estacionamento e à falta de cortinas e ventiladores na sala de aula. Tais questões, como descreve a autora, envolvem a Gestão Participativa (APM, Conselho de Escola, Grêmio Estudantil) e de Recursos Financeiros. O segundo ponto fraco, com maior ocorrência, foi a percepção dos professores e funcionários da falta de integração entre a equipe gestora que embora seja apreciada por suas qualidades individuais, identificadas nos pontos fortes, precisa, como recomenda Paiva, fortalecer as relações interpessoais para ser identificada como uma equipe integrada de trabalho. 110 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III A visão dos pais de alunos 14 12 10 8 6 4 0 2 Dedicação dos professores Não gostam de nada Da direção Do ensino supletivo Figura 19 - Principais ocorrências: o que os pais mais gostam na escola Paiva explica que a participação dos pais neste processo de Avaliação Institucional foi imprescindível, posto que a supervisão escolar havia identificado um distanciamento dos pais causado pela descrença na solução dos problemas da escola. Nestes dados, considerando-se as categorias e a frequência das respostas, aparece como positivo o nível de reconhecimento pelos pais dos professores que são para eles mais dedicados e mais qualificados, o que de fato representa 37% dos respondentes. É preocupante o fato de que 26% dos pais que participaram dessa avaliação não veem nenhum ponto forte, podendo significar que podem ter aproveitado essa oportunidade para demonstrar a sua insatisfação com a escola. Esse resultado, entre outros aspectos, revela a importância de se ouvir com mais frequência os diferentes segmentos da escola para juntos encontrarem e construírem formas de superar os problemas que se apresentam (PAIVA, 2010, p. 13). A seguir, apresentamos os resultados sobre o que os pais não gostam na escola. Da mesma forma que nos gráficos anteriores, as respostas foram categorizadas de acordo com a frequência com que a mesma questão apareceu. A autora ressalta que, na apresentação dos resultados à equipe escolar, foram apresentadas também as ocorrências menos frequentes, sintetizadas em tabelas. 111 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Principais ocorrências O que os pais não gostam na escola – 2 38 33 28 23 18 13 8 3 Indiscíplina e vandalismo Falta excessiva de professores Quando os alunos são dispensados mais cedo A qualidade da merenda Figura 20 – Principais ocorrências: o que os pais não gostam na escola De acordo com Paiva, a maneira como os pais percebem a indisciplina e o vandalismo possivelmente intensifica sua visão negativa da escola como um todo, o que faz com que uma boa parte deles não veja nada de bom. Uma ação necessária, segundo a autora, é mostrar aos pais o que já vem sendo feito para o enfrentamento deste problema e por meio de reuniões, palestras e fóruns procurar novas alternativas, internas e externas, bem como articular ações com a rede de proteção social e as políticas públicas no sentido de reduzir riscos e aumentar as oportunidades. Selecionamos algumas das principais sugestões apontadas pelos pais para resolver os problemas da escola. São elas: • Que os professores faltem menos. • Que a escola tenha alguém capacitado para lidar com os adolescentes. • Que a escola tenha mais professores substitutos. • Que a escola tenha mais projetos como cursos técnicos para os alunos, ou consiga bolsas para estes cursos. • Que a escola forneça um calendário de aulas e provas aos alunos. • Que sejam passadas mais atividades para se fazer em casa. • Que os professores exijam mais dos alunos. • Que a sala de informática passe a funcionar. • Que sejam aplicados simulados equiparados aos da escola particular. 112 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Dentre as sugestões apontadas pela autora, destacamos a seguinte orientação: [...] uma das maneiras de se tornar efetiva a gestão participativa é transformar sugestões em planos de ação, colocá-los em prática e tornar públicos os seus resultados. Das sugestões anteriores, algumas dependem mais de ajustes internos, tanto no âmbito pedagógico como relacional, possíveis por meio da mediação de conflitos e conciliação de ideias para onde devem convergir todos os esforços para ações bem sucedidas que, certamente, irão repercutir no êxito escolar. Outras questões dependem de políticas de governo, mas isto também é uma competência a ser desenvolvida na sala de aula por meio da conscientização dos alunos e comunidade sobre as fragilidades e necessidades da escola, incentivo ao protagonismo e elaboração de projetos de intervenção na realidade (PAIVA, 2010, p. 17). Outro aspecto importante da AI promovida foi a autoavaliação dos professores a respeito das várias dimensões do trabalho docente. Para elaborar este instrumento, a autora partiu das contribuições dos professores da escola, colhidas em reuniões de HTPC (Horário de Trabalho Coletivo) a respeito de como deve ser uma boa aula e também dos referenciais teóricos e legais sobre as atribuições docentes. Pode ser considerado de grande utilidade para análise e reflexão sobre a prática docente, uma vez que abrange as principais dimensões do trabalho pedagógico na sala de aula e na escola. Vejamos os resultados: Quadro 12 – Autoavaliação dos professores quanto às dimensões do trabalho docente Plenamente satisfatório 54% Domínio do conteúdo de ensino. Relacionamento interpessoal. Pontualidade/assiduidade. Atendimento ao prazo de entrega de documentos escolares. Bom 37% Diversidade da aula, dinâmicas de ensino. Planejamento da aula. Gestão do tempo e organização do ensino. Recuperação contínua, atendimento aos diferentes ritmos de aprendizagem. Regular 8% Elaboração e participação em projetos de ensino. Participação na APM, Conselho de Escola e formação/orientação de Grêmio Estudantil. Insatisfatório 0,2% Participação na APM, Conselho de Escola e formação/orientação de Grêmio Estudantil. Comentários “A sala de aula sempre traz um desafio, por isso sempre tento fazer o melhor.” “Preocupo-me em criar vínculos e formar cidadãos críticos e responsáveis.” “Percebi um progresso no relacionamento interpessoal.” “Por trabalhar em mais escolas tenho pouco contato com os pais, gostaria de participar mais da escola.” Fonte: Paiva (2010). 113 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Esse quadro, segundo Paiva, é um indicativo de que há um autoconceito bastante positivo dos professores em relação ao desenvolvimentoda aula, relacionamento interpessoal e compromisso com a escola. Podemos verificar que somente uma pequena parcela admitiu ter problemas com o trabalho participativo no âmbito pedagógico e institucional. A autora salienta que esse modelo de autoavaliação pode indicar a necessidade de formação em serviço e de intervenções pontuais. Sugere que haja um feedback da equipe gestora para cada professor após a devolução do instrumento, seja por escrito ou por meio de diálogos reflexivos sobre como o professor se vê e como é visto por toda a equipe escolar. 7.3 Avaliação do aluno em relação ao trabalho do professor Com relação à elaboração da avaliação dos alunos em relação ao trabalho do professor, a autora ressalta: [...] o instrumento utilizado nesta avaliação foi apresentado aos professores em reunião de HTPC dois meses antes da sua realização, com o objetivo de aprimorar as questões com a contribuição do grupo e ao mesmo tempo informá-los sobre os pontos em que seriam avaliados. Houve uma boa receptividade do grupo, principalmente em relação ao fato de terem a oportunidade de opinar sobre o formato das questões que passou por algumas modificações para facilitar a compreensão dos alunos a partir das considerações dos professores. O objetivo desta avaliação foi informar aos próprios professores e equipe gestora sobre o ponto de vista do aluno em relação ao desenvolvimento da aula como contribuição para a formação em serviço e o aprimoramento da prática de ensino. Caberá ao professor confrontar o seu autoconceito em relação à atuação em sala de aula com a percepção do aluno de suas diversas turmas. Por isso nesta primeira abordagem não houve a preocupação de quantificar dados gerais da escola, o que pode ser realizado numa etapa seguinte, se isto for considerado relevante pela equipe escolar (PAIVA, 2010, p. 19). A forma como foi formulada e conduzida essa AI nos remete ao que citamos anteriormente sobre o pensamento de Freitas et al: as mudanças precisam acontecer dentro dos espaços institucionais, que precisam de alguma forma de “regulação” no sentido amplo do termo. Vale lembrar que o autor acrescenta que, se não houver uma crença nesta possibilidade da luta institucional para melhoria do sistema, não há mais nada a ser dito, e seriam necessárias outras estratégias. Este modelo de AI apresentado por Paiva favorece uma forma de regulação interna a partir da percepção dos problemas e da busca de soluções para esses e por meio da coleta de informações em várias fontes. Observação A avaliação do trabalho do professor pelo aluno pode ser útil à reflexão do professor sobre sua prática sob a perspectiva de responsabilidade compartilhada. 114 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Exatas Prof. X 5 4 3 2 1 0 1. Do mi na o co nte úd o q ue en sin a. 2. Dá ex pli ca çõ es cla ras . 3. Su as au las sã o i nte res san tes . 4. Inc en tiv a o al un o a fa zer pe rgu nta s e tir ar. .. 5. Dá au las co m en tus ias mo . 6. É p on tua l. 7. Fal a s ob re a i mp ort ân cia da m até ria qu e... 8. Faz us o d e d ife ren tes in str um en tos pa ra. .. 9. É j ust o n a a tri bu içã o d e n ota s. 10 . R ela cio na os co nte úd os de en sin o a s... 11. Pr oc ura aj ud ar os alu no s q ue te m. .. 12 . P roc ura le va nta r o s c on he cim en tos ... 13 . R esp on de de m od o p aci en te as pe rgu nta s... Concordo plenamente Concordo Discordo Figura 21 Paiva lembra que, no momento da análise dos resultados, é importante levar em conta o peso relativo da avaliação que os alunos fazem de determinados aspectos da prática docente, visto que esse julgamento passa por variáveis como: sexo, gênero, nível de desempenho do aluno, área de conhecimento avaliada e interesse e aptidões do aluno nesta área, nível de complexidade e abstração da disciplina etc. Cita como exemplo a questão que aborda a relação do conteúdo com a realidade. Neste tópico, a autora lembra que, em algumas disciplinas, como códigos e linguagens e área de humanas, há mais possibilidades de aproximação com o cotidiano pela frequência na prática diária. Já na área de exatas, embora isto também seja possível e recomendável, há alguns conteúdos específicos que possuem usos mais abstratos e complexos que são ensinados como base para conhecimentos futuros. Compara os resultados de um mesmo professor em diferentes turmas e descobre algumas diferenças quantitativas nas respostas. Explica que essas diferenças podem significar o nível de proximidade ou empatia do professor com determinada turma. Segundo Paiva, o professor de cada disciplina terá mais condições de avaliar os dados do que um observador externo e de utilizar os resultados como ponto de partida para novas abordagens de aproximação com os alunos, principalmente para saber o que eles pensam e o que esperam da aula. 115 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Seria muito interessante, após dar um feedback do seu resultado para a turma, que os professores também pudessem avaliá-los, não para classificá-los mas para estabelecer um vínculo de compromisso com eles. No caso do “Professor X”, a autora pontua que os resultados demonstram que este professor precisa conhecer melhor as expectativas dos seus alunos em relação à matéria ou mesmo saber se compreenderam a importância desta disciplina para o seu currículo ou quais os seus conhecimentos prévios e, a partir disso, descobrir como tornar as aulas mais interessantes, além de rever seus critérios e instrumentos avaliativos. Há mais de um critério de avaliação? Há mais de um instrumento para cada critério? Qual a periodicidade das provas: semanal, quinzenal, mensal? O mais importante, conclui a autora, é que a AI se torne uma cultura na escola e que os instrumentos sejam aprimorados com o auxílio daqueles que vão utilizá-los. Ressalta que, para garantir a eficácia na aplicação do instrumento de avaliação, é importante considerar os estudos na área da metodologia de pesquisa científica. Cita como sugestão a aplicação da metodologia QFD (Desdobramento da Função Qualidade), utilizada originalmente em empresas. Esta forma de avaliação consiste em identificar, por meio de um instrumento aberto, as necessidades e expectativas dos respondentes em relação às questões que gostariam que fossem abordadas. Após a tabulação, as respostas devem ser organizadas e agrupadas por similaridade. A partir daí, é possível elaborar o questionário fechado com perguntas que toda a comunidade escolar gostaria de responder. Observação Os resultados da Avaliação Institucional servem para identificação dos pontos fortes e fracos da escola com vistas à elaboração de um plano de ação participativo para a melhoria do ensino. A autora relata que em outubro de 2010 os resultados da Avaliação Institucional foram apresentados à equipe escolar da EE “Vida Nova” por meio de uma reunião de trabalho com o objetivo de estimular a reflexão sobre esses para planejar intervenções na realidade de forma pró-ativa. Esse trabalho demonstra que há iniciativas consistentes praticadas nas redes de ensino, alicerçadas em conceitos teóricos e metodológicos. Este é um de muitos trabalhos que demonstram a seriedade na atuação cotidiana de profissionais do ensino. O exemplo da AI citado vem ao encontro dos pressupostos defendidos por Freitas et al sobre a importância da participação da sociedade na construção de um ensino de qualidade. O autor explica que a participação defendida por ele não visa, de forma alguma, expor a comunidade escolar à crítica, para que com isso aprimore as suas práticas, pois, se assim fosse, estaria propondo a omissão do poderpúblico com o sistema de ensino. Defende o que denomina qualidade negociada, na qual a comunidade escolar, conhecendo a realidade da instituição, seus problemas e necessidades, cobra dos governos melhores condições de trabalho e, ao mesmo tempo, demanda dos profissionais de ensino um trabalho de qualidade para as crianças e jovens que precisam do bom funcionamento do sistema educacional. 116 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III O autor destaca a importância do trabalho do professor quando se refere à avaliação da aprendizagem em sala de aula e o papel fundamental deste profissional no desenvolvimento de uma autoestima positiva em crianças e jovens. Aponta caminhos para a elaboração e a utilização dos resultados das avaliações pelo coletivo escolar e responsabiliza o poder público pelos processos de avaliação em larga escala, assim como sinaliza, com exemplos, como esses processos podem ser conduzidos para atenderem às necessidades das escolas. Ao propor transformações no campo da avaliação, Freitas et al defendem que [...] é necessário correr alguns riscos de modo a recuperar a capacidade de indignação frente ao que está posto e expressar algum movimento que se oponha à inércia e ao conformismo. Muitos reagirão a este esforço de reverter a rota usual, convencidos de que está é a única maneira de caminhar. Evidentemente sem correr riscos. Mas quais as consequências de usarmos os mesmos caminhos todos os dias sem nos interessarmos em saber para onde eles nos conduzem? Afinal, quem definiu serem estes os caminhos certos e colocou as placas de sinalização para evitar os acidentes de percurso? (FREITAS et al, 2011, p. 70). Para justificar sua proposta de mudanças na avaliação em um contexto dinâmico e participativo, o autor cita Paulo Freire que, com uma linguagem poética, defende a busca por melhores horizontes. Se é possível obter água cavando o chão; se é possível enfeitar a casa; se é possível crer desta ou daquela forma; se é possível nos defendermos do frio e do calor; se é possível desviar leitos de rios, fazer barragens; se é possível mudar o mundo que não fizemos, o da natureza; por que não mudar o mundo que fazemos, o da cultura, o da história, o da política? (FREIRE, 2000, apud FREITAS et al, 2011, p. 70). Nesse mesmo sentido, Freitas et al (2011) defende que também podemos mudar a direção da avaliação, se ela estiver se contrapondo aos direitos das crianças e dos jovens à educação, e lembra que não devemos esperar que as respostas às questões escolares venham apenas dos políticos, mas que cada educador repense sua atuação no dia a dia, na sala de aula e na escola. E acrescenta que, “caso os políticos venham em nossa ajuda, eles serão bem-vindos, caso contrário, seguiremos nosso caminho exigindo do poder público, mas exigindo também de nós mesmos” (FREITAS et al, 2011, p. 70). 8 AVALIAÇÃO E PESQUISA EDUCACIONAL: DADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS Com base no estudo de Gatti (2004), abordaremos a seguir uma questão importante na formação de profissionais comprometidos com a melhoria da qualidade da educação, relacionada ao lugar que ocupam os estudos quantitativos na análise e compreensão dos problemas do campo educacional. Gatti aborda os estudos quantitativos em educação no Brasil a partir de 1970 e sua importância para o pensamento reflexivo no campo educacional, apontando a importância 117 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL do estudo dos métodos de pesquisa que combinam abordagens quantitativas e qualitativas na formação de educadores. Segundo Gatti, com exceção das avaliações de rendimento escolar, ainda há poucos estudos quantitativos na área da pesquisa educacional no Brasil. Sobre a importância desses estudos, cita como exemplo a questão do analfabetismo, que só pode ser compreendido e discutido para definição de políticas por meio da análise dos dados sobre sua extensão e distribuição no país e variáveis como gênero, idade, condição socioeconômica, região geográfica, entre outras. Outro problema apontado é a pouca utilização do banco de dados existentes sobre educação, pela dificuldade dos educadores em lidar com dados demográficos e medidas de modo geral. Da mesma forma, aponta a dificuldade de leitura crítica e consciente dos trabalhos que utilizam dados quantitativos, o que gera, segundo a autora, dois problemas: a crença em qualquer dado dependendo da confiabilidade de quem os cita ou a rejeição total desses dados como se nada revelassem da realidade, principalmente por questões ideológicas. Essa constatação nos remete aos constantes choques de opinião entre o discurso do governo e sua aceitação e confiabilidade pelo corpo docente; há sempre uma desconfiança em relação à manipulação dos dados para a defesa de novos programas e paradigmas educacionais. A autora faz uma importante observação sobre a utilização dos métodos quantitativos, considerando-os sob dois aspectos: o primeiro é quanto ao alcance que se tem a partir de números, frequência e medidas, delimitado por algumas de suas propriedades, ou seja, não é possível fazer todas as operações com eles; o outro aspecto é em relação à elaboração de boas perguntas pelo pesquisador para favorecer as boas análises que guiarão suas interpretações, conduzindo-o assim por uma abordagem epistemológica do problema (GATTI, 2004). A autora afirma que as combinações dos dados quantitativos com os dados de origem qualitativa podem favorecer a compreensão dos fatos, eventos e processos, mas alerta que as duas abordagens demandam uma boa dose de reflexão pelo pesquisador, para dar sentido ao material levantado e analisado. A importância dessa combinação de dados quantitativos com os qualitativos nos remete à fala inicial da autora sobre a falta, nos cursos de formação superior, no campo educacional, de conteúdos disciplinares sobre métodos de pesquisas. Ao analisarmos seus argumentos tomamos a defesa da valorização ou incorporação destes conteúdos no currículo dos cursos superiores para educadores, mestres e doutores em educação. A seguir, apresentamos o percurso seguido pela autora para discorrer sobre os estudos quantitativos em educação no Brasil, por meio dos seguintes títulos: 118 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Quadro 13 IV - Analfabetismo, percurso escolar e frcasso escolar I - Sem tradição sólida II - A abordagem quantitativa: significado e condições III - Visitando alguns trabalhos V - Fluxo escolar / análise de cortes: outra metodologia VI - A questão do letramento: uma discussão recente VII - Políticas de educação básica VIII - Financiamento da Educação / Municipalização IX - Fatores sociais e educação X - Os jovens e a educação XI - Avaliação Educacional XII - Temas variados / estudos amostrais menores Fonte: Gatti (2004). I – Sem tradição sólida Gatti (2004) cita os estudos publicados por Gouveia (1980) e Di Dio (1974), que mostram o quanto a pesquisa educacional era escassa e mesmo incipiente até meados do século passado. Os autores apontam que 71% dos estudos não utilizavam dados quantitativos e os outros 39% os utilizavam, mas o faziam, em sua maioria, por meio de análises descritivas de tabelas; poucos se utilizavam de correlações e raríssimos empregavam análise multidimensional. Para exemplificar, apresentamos algumas conclusões sobre esses estudos: 1. A esmagadora maioria das investigações é histórica ou se refere a estudos descritivos, levantamentos e outros enfoques não experimentais. 2. O instrumento de medida preferido é o questionário. 3. Quando são empregadas técnicas estatísticas, trata-se usualmente de percentagens e coeficientes de correlação (DIDIO, 1974 apud GATTI, 2004). 119 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Segundo a autora, esse atraso histórico em pesquisa e estudos de dados quantitativos torna difícil o entendimento sobre o que os dados disponíveis atualmente podem nos oferecer. Considera também o fato de que os estudos quantitativos na área educacional, que são realizados com mais substância e rigor metodológico, são feitos por pesquisadores de outras áreas como economistas, físicos, estatísticos, sociólogos, psicólogos etc. “Com isto, interpretações e teorizações nem sempre incorporam as discussões em pauta no campo das reflexões sobre educação” (GATTI, 2004, p. 14). E isso explica em parte porque tais pesquisas, mesmo que ofereçam contribuições relevantes, não recebem adesão nos meios educacionais porque suas constatações não dão conta de explorar os complexos eventos que interferem no cotidiano escolar, internos e externos, ou porque encontram adeptos quando focam a responsabilidade do sucesso escolar apenas na família. Observação A escolha da abordagem quantitativa ou qualitativa ou a combinação de ambas depende do objeto do estudo e das perguntas que queremos responder. A vovó na janela Claudio de Moura Castro “Cada sociedade tem a educação que quer. A nossa é péssima, antes de tudo, porque não fazemos a nossa parte”. Em uma pesquisa internacional sobre aprendizado de leitura, os resultados da Coreia pareciam errados, pois eram excessivamente elevados. Despachou-se um emissário para visitar o país e checar a aplicação. Era isso mesmo. Mas, visitando uma escola, ele viu várias mulheres do lado de fora das janelas, espiando para dentro das salas de aula. Eram as avós dos alunos, vigiando os netos, para ver se estavam prestando atenção nas aulas. A obsessão nacional que leva as avós às janelas é a principal razão para os bons resultados da educação em países com etnias chinesas. A qualidade do ensino é um fator de êxito, mas, antes de tudo, é uma consequência da importância fatal atribuída pelos orientais à educação. Pesquisadores americanos foram observar o funcionamento das casas de imigrantes orientais. Verificou-se que os pais, ao voltar para casa, passam a comandar as operações escolares. A mesa da sala transforma-se em área de estudo, à qual todos se sentam, sob seu controle estrito. Os que sabem inglês tentam ajudar os filhos. Os outros – e os analfabetos – apenas vigiam. Os pais não se permitem o luxo de outras atividades e abrem mão da TV. No Japão, é comum as mães estudarem as matérias dos filhos, para que possam ajudá-los em suas tarefas de casa. Fala-se do milagre educacional coreano. Mas fala-se pouco do esforço das famílias. Lá, como no Japão, os cursinhos preparatórios começam quase tão cedo quanto a escola. Os alunos mal saem da aula e têm de mergulhar no cursinho. O que gastam as famílias pagando professores particulares e cursinhos é o mesmo que gasta o governo para operar todo o sistema. Cada sociedade tem a 120 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III educação que quer. A nossa é péssima, antes de tudo, porque aceitamos passivamente que assim seja além de não fazer nossa parte em casa. Não podemos culpar as famílias pobres, mas e a indiferença da classe média? Está em boa hora para um exame de consciência. Estado, escola e professores têm sua dose de culpa. Mas não são os únicos merecendo puxões de orelha. Fonte: CASTRO, C. de M. A vovó na janela. Revista Veja. São Paulo, n. 1.879, 10 nov. 2004. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/101104/ponto_de_vista.html>. Acesso em: 30 mai. 2013. Com a ilustração mostrada, pretendemos demonstrar o aspecto unilateral de alguns estudos, sem querer, no entanto, desqualificá-los, uma vez que temos por certa a importância que tem o papel da família na educação. Por outro lado, refletindo diretamente no campo educacional, entendemos que este requer pesquisas que analisem seus aspectos multidimensionais. Dentre os mais importantes, podemos destacar a profissionalização do magistério, que precisa aprender constantemente para ensinar e aprender a ensinar, principalmente aqueles alunos cujas famílias são desprovidas de capital cultural escolarmente rentável e financeiro e, por isso, não orientam como seria desejável seus filhos e não dispõem de recursos para pagar cursinhos ou professores particulares. II – A abordagem quantitativa: significado e condições Sobre as condições necessárias para um adequado tratamento dos dados quantitativos, Gatti defende que o pesquisador precisa ter um amplo e profundo conhecimento da área na qual os problemas se encontram, do contexto em que eles foram produzidos, da sua forma de medida e coleta, ou seja, entender que os dados pesquisados são recursos que devem ser submetidos a uma leitura teórico-crítica dos seus resultados, analisando-os como indicadores das questões tratadas e não verdades por si mesmos. A autora reforça essa ideia ao afirmar que o pesquisador deve submeter os dados a uma análise criteriosa e não se submeter a eles. Conforme postulam os autores Falcão et al “a quantificação abrange um conjunto de procedimentos, técnicas e algoritmos destinados a auxiliar o pesquisador a extrair de seus dados subsídios para responder à(s) pergunta(s) que esse estabeleceu como objetivo(s) de seu trabalho” (FALCÃO et al, apud GATTI, 2004, p. 14). Dentre as diversas formas utilizadas na obtenção de quantificações, a autora distingue três tipos de dados: Quadro 14 Categóricos → Os dados são colocados em classes e verificam sua frequência, permitem agrupamentos segundo alguma característica como exemplificado a seguir: Ordenados → São chamados de ordenados quando estão numa forma que mostra sua posição relativa segundo alguma característica, por exemplo: Métricos → Este tipo de dado consiste em observações sobre características que podem ser mensuradas e demonstradas numa escala numérica, por exemplo: • contagem de pessoas de acordo com o sexo; • leitura preferida: livros ou revistas ou jornal ou nenhum; • o último nível escolar cursado: nenhum/fundamental/médio/superior. • a ordem de chegada de carros em uma corrida: primeiro, segundo etc.; • ordenação de alunos por um professor segundo sua opinião sobre desempenho, do melhor ao pior: o primeiro colocado, o segundo, o terceiro etc. • os graus de temperatura; • notas em uma escala definida. Fonte: Gatti (2004). 121 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Por meio desse estudo, a autora enfatiza mais de uma vez que o tratamento desses dados e das medidas criadas, que podem ser as citadas ou outras inventadas, “não podem ser tomadas como sendo a própria natureza das coisas” (GATTI, 2004, p. 14). Alerta que a tradução dos dados numérica ou categorial de fatos, eventos, fenômenos, só terá valor racional e teórico quando confrontada com a dinâmica da observação dos fenômenos. Lembrete O pesquisador precisa conhecer a área e o contexto em que os problemas ocorrem e a forma como os dados foram produzidos e coletados. Assim haverá menos riscos de revelações deturpadas da realidade (GATTI, 2004). III – Visitando alguns trabalhos Neste artigo, a autora discorre sobre as pesquisas com dados quantitativos realizadas nos últimos trinta anos no Brasil e a diversas formas de análises utilizadas. Gatti fez um levantamento em todos os números publicados a partir de 1970 e selecionou os seguintes periódicos: • Revista Brasileira de estudos pedagógicos (Inep/MEC); • Cadernos de Pesquisa (Fundação Carlos Chagas); • Educação e Realidade (UFRS); • Educação e Sociedade (Cedes/Unicamp); • Revista Brasileira de Educação (ANPEd); • Estudosem Avaliação Educacional (Fundação Carlos Chagas); • Ensaio (Fundação Cesgranrio). Em uma análise apreciativa desses trabalhos, a autora procura demonstrar a utilização necessária da teoria e da interpretação qualitativa na composição dos dados, bem como a importância dos dados numéricos e o conhecimento pelo pesquisador das técnicas de análise para determinadas questões, como veremos a seguir nos estudos sobre o analfabetismo no Brasil. IV – Analfabetismo, percurso escolar e fracasso escolar Uma grande parte dos estudos sobre analfabetismo e problemas de fluxo escolar trabalha com dados populacionais, sendo assim de natureza demográfica. Tais estudos permitem dois tipos de análises, a saber: 122 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Análises do estado, da situação geral, ou associada a determinados fatores relacionados a problemas sociais/educacionais por meio de agrupamento de dados, pelo cálculo de taxas ou indicadores simples ou mais complexos. Análises de movimento, que propiciam perspectivas sobre ocorrências ao longo de certo período de tempo (um ano, vários anos, décadas etc.) evidenciando a dinâmica dos eventos (GATTI, 2004, p. 15). Em relação aos estudos em educação que trabalham com dados populacionais, a autora destaca os trabalhos de Alceu R. Ferrari, pelo fato de este autor utilizar dados do censo brasileiro sobre os problemas do analfabetismo e fluxos escolares e, também, por suas preocupações metodológicas e com teorias educacionais. Ferrari demonstra “a importância de se evitar o empirismo, o maior risco, sem dúvida, na utilização de fontes estatísticas” (FERRARI, 1979 apud GATTI, 2004, p. 16). Gatti lembra também que o autor considera a mediação teórica imprescindível para se passar do dado para o indicador. A autora selecionou três trabalhos de Ferrari, realizados nos anos 1985, 1988, e 2002, por terem sido feitos em diferentes momentos da história educacional no Brasil. Defende que estes trabalhos são fontes confiáveis por apresentarem uma reflexão crítica dos sistemas educacionais e por proporem ações no âmbito da educação. Em seu artigo “Analfabetismo no Brasil: tendência secular e avanços recentes”, Ferrari (1985, apud GATTI, 2004) faz uma comparação entre as experiências do Mobral em relação ao declínio dos índices de analfabetismo no Brasil na década de 1970, os dados das PNAD 1977 e 1982 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e do Censo Demográfico de 1980. Com isso, o autor analisa o que denomina como tendência secular (de 1872 a 1980) dos índices de analfabetismo no nosso país e em algumas das suas regiões. Aborda a questão das desigualdades educacionais regionais e suas origens históricas e, por meio da comparação dos dados de naturezas diversas, busca a compreensão sobre o que denomina processo de produção do analfabetismo e a relação existente entre o analfabetismo e o Ensino Fundamental. Em suas conclusões, questiona as contradições das políticas oficiais de oferta do ensino público, que, embora o assegurassem por lei, tornando-o obrigatório no país, não impediu uma grande exclusão de alunos, tanto daqueles que não o frequentaram na idade própria quanto dos que foram excluídos pela reprovação, dispositivo institucional de classificação que alimentou outra forma de exclusão, a evasão escolar. Gatti destaca a interessante correlação feita pelo autor entre reprovação, evasão e contradição com a oferta do ensino público, que passou a ser obrigatório e gratuito a partir de 1971 com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 5.692/71). Para ilustrar, citaremos um recorte da lei no qual é possível observar a diferença entre intencionalidade e realização dos objetivos. Cabe-nos refletir: onde estão as contradições? Onde foi que erraram? Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. 123 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 AVALIAÇÃO EDUCACIONAL Capítulo I: Do Ensino de 1º e 2º graus Art. 8º A ordenação do currículo será feita por séries anuais de disciplinas ou áreas de estudo (...) Art. 14. A verificação do rendimento escolar ficará, na forma regimental, a cargo dos estabelecimentos, compreendendo a avaliação do aproveitamento e a apuração da assiduidade. Capítulo II: Do Ensino de 1º Grau Art. 20. O ensino de 1º grau será obrigatório dos 7 aos 14 anos, cabendo aos Municípios promover, anualmente, o levantamento da população que alcance a idade escolar e proceder à sua chamada para matrícula. Parágrafo único. Nos Estados, no Distrito Federal, nos Territórios e nos Municípios, deverá a administração do ensino fiscalizar o cumprimento da obrigatoriedade escolar e incentivar a frequência dos alunos. Brasília, 11 de agosto de 1971; 150º da Independência e 83º da República. Fonte: BRASIL. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1971. Disponível em: <http://www.prolei.inep.gov.br/prolei/>. Acesso em: 30 mai. 2013. Uma primeira análise nos leva a acreditar que, a partir de 1971, o país começou a caminhar para a democratização do ensino, garantindo seu acesso pela obrigatoriedade, mas, dentro da mesma lei que inclui, há uma pedra de tropeço: a reprovação no sistema seriado e, em consequência desta, a evasão. A seguir, veremos outros eventos citados por Gatti que nos levam a compreender as implicações do modelo educacional e social praticado no país na efetivação dos ideais de oferta e garantia do ensino público. Gatti se reporta novamente ao estudo de Alceu Ferrari sobre a oferta da pré-escola no Brasil, em que o autor parte da evolução da matrícula e dos índices de atendimento de 1968 a 1986 para comparar a participação do setor público e do privado nessa evolução. Para discutir a relação público/ privado e a questão da qualidade do atendimento pré-escolar, o autor utiliza dados censitários brutos, taxas de escolarização, taxas de incremento e dados de renda familiar, as políticas do Conselho Federal de Educação no setor, questões de renda e pré-escola. Em suas análises, revela que não há nada que indique que a educação pré-escolar oferecida pelos poderes públicos diminuiu as desigualdades escolares e sociais. Observa, em suas conclusões, que os resultados “casam muito bem com o próprio projeto social do período da ditadura militar — projeto autoritário, seletivo, excludente”. (FERRARI, 1988, apud GATTI, 2004, p. 16). Veremos, adiante, alguns exemplos dos motivos que podem explicar a ineficácia da educação pré- escolar oferecida até então, conforme o estudo citado, com base em dados estatísticos. 124 Re vi sã o: V irg ím ia B ila tt o / L uc as K at er - D ia gr am aç ão : E ve rt on M ar tin s- 0 8/ 08 /2 01 3 Unidade III Quanto à questão do analfabetismo e letramento, Ferrari (2000, apud GATTI, 2004) sintetiza os dados historicamente, situando a origem do analfabetismo nos problemas políticos, desde o período imperial. Estuda as tendências conceituais ao longo desse período, ou seja, do primeiro censo ocorrido em 1872 até o censo de 2000. Por meio deste último, classifica a população em diferentes níveis de letramento e aponta que, apesar da queda progressiva da taxa do número de analfabetos no Brasil em algumas regiões, verifica-se o aumento persistente desse número em termos absolutos até 1980. O censo de 2000 apontou uma queda do analfabetismo, mas os mesmos dados revelaram que naquele ano ainda havia milhões de brasileiros analfabetos, o que o autor define como uma “forma extrema de exclusão educacional, geralmente secundada por outras formas de exclusão social”. O mesmo censo mostrou que, em relação aos níveis de letramento,
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