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1 LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA E AS FALHAS EM SUA APLICAÇÃO Clarissa Machado1, Cristiane Fiuza1, Dalva Erdens1, Luciene Gondim1, Odair Santos1 e Reijane Nery1 RESUMO: A Constituição Federal de 1988 demonstra a importância da legislação ambiental brasileira dedicando-lhe um capítulo inteiro, dando ao poder público a tarefa de garantir a preservação para as gerações atuais e futuras. Contudo, a legislação ainda é precária e há falhas em sua aplicação. A Lei Federal 9.605/98, conhecida como a Lei Ambiental mais atual e principal, inovou apontando responsabilidade das pessoas jurídicas e das pessoas físicas, entretanto as penas aplicadas são sanções leves. Por meio de revisão bibliográfica e de estudo de campo, este estudo se propôs a apontar as “falhas” na aplicação da legislação ambiental brasileira e discutir a problemática ambiental relacionada à sobreposição do interesse privado sobre o público. Por meio desta pesquisa, busca-se esclarecer à sociedade de que é preciso exigir uma mudança do Poder Estatal, uma vez que questão fundamental afeta o bem-estar de todos e o desenvolvimento econômico mundial. PALAVRAS-CHAVE: legislação ambiental brasileira, exploração ambiental, fiscalização ambiental, Ibama, auto de infração. ABSTRACT: The Federal Constitution of 1988 demonstrates the importance of Brazilian environmental legislation by dedicating an entire chapter to it, giving the public power the task of ensuring preservation for present and future generations. However, legislation is still precarious and there are flaws in its application. Federal Law 9.605 / 98, known as the most current and main Environmental Law, innovated pointing out responsibility of legal entities and individuals, however, the penalties applied are slight sanctions. Through a bibliographical review and field study, this study aimed to point out the "failures" in the application of Brazilian environmental legislation and to discuss the environmental issue related to the overlapping of 1 Graduandos em Bacharelado em Direito pela Faculdade Batista Brasileira, 3º semestre noturno, turma B. 2 private interest over the public. Through this research, it is sought to clarify to the society that it is necessary to demand a change of the State Power, since fundamental question affects the well-being of all and the world economic development. KEYWORDS: brazilian environmental legislation, environmental exploration, environmental enforcement, ibama, 1 INTRODUÇÃO Desde o início da humanidade que o homem modifica a natureza a fim de adequá-la às suas necessidades. Nas idades médias e modernas, especialmente na fase da Revolução Industrial, séc. XVIII, ocorreram grandes impactos no meio ambiente. O início do enfrentamento e regulamentação do problema ecológico pelos legisladores iniciou-se ainda no período pós-guerra (1934-1945), quando a humanidade começou a perceber que a proteção ao meio ambiente é um determinante de sua própria sobrevivência. Contudo, as questões ambientais passaram a ser observadas com mais cuidado pelos governantes na década de 1970. Atualmente, o Brasil possui uma legislação ampla no que tange às leis ambientais brasileiras, sendo destinado um capítulo inteiro da Constituição Federal de 1988 ao meio ambiente, dando ao poder público a tarefa de garantir a preservação para as gerações atuais e futuras. No entanto, a legislação ainda é precária, carecendo passar por um processo de reformulação para que não ocorram falhas na sua aplicação. A principal e atual lei do meio ambiente é a Lei Federal 9.605/98, conhecida como a Lei Ambiental. Uma de suas maiores inovações foi apontar responsabilidade das pessoas jurídicas e das pessoas físicas, apresentando consequências no caso de violação a alguns de seus artigos. Entretanto, geralmente, são aplicadas apenas as sanções leves, 3 como pequenas taxas, que pouco influenciam no orçamento das grandes empresas, tornando-se assim, mais vantajoso burlar o sistema, pois o lucro gerado em cima de ações ilegais é mais significativo que suas punições. Segundo Bruch (2019, p.1), um dos autores do Relatório sobre o Estado de Direito Ambiental da ONU, a implementação das leis ainda é fraca e falta rigor no cumprimento das leis ambientais no país. O referido autor critica a incapacidade do país de frear e punir com rigor crimes como os assassinatos de ativistas. A participação da sociedade civil organizada é muito importante para o desenvolvimento sustentável e preservação ambiental, na cobrança de uma aplicação mais severa da lei, de uma educação e ressocialização ambiental e de se proteger o meio ambiente. A partir dessas considerações, visa-se responder a seguinte pergunta: Quais as principais falhas da legislação ambiental brasileira? O presente trabalho tem por finalidade apontar as “falhas” na aplicação da legislação ambiental brasileira e demonstrar que a problemática ambiental está relacionada à sobreposição do interesse privado sobre o público. Para tanto, busca esclarecer à sociedade de que é preciso exigir uma mudança do Poder Estatal, uma vez que a proteção e o melhoramento do meio ambiente é uma questão fundamental, que afeta o bem-estar de todos e o desenvolvimento econômico no mundo inteiro. Para evolução deste trabalho, foi realizada, inicialmente, uma pesquisa bibliográfica elaborada a partir de materiais já publicados relativos ao assunto. Segundo Marconi e Lakatos (2011, p.57), a pesquisa bibliográfica é o levantamento de toda a bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita. A sua finalidade é fazer com que o pesquisador entre em contato direto com todo o material escrito sobre um determinado assunto, auxiliando o cientista na análise de suas pesquisas ou na manipulação de suas informações. 4 Em seguida foi realizada uma pesquisa de campo no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), órgão responsável pela fiscalização ambiental, por meio de levantamento e análise de dados, a fim de observarmos como ocorre a aplicação e fiscalização da legislação ambiental atual e quais as principais dificuldades encontradas. Segundo Marconi e Lakatos (2011, p.69), a pesquisa de campo é uma forma de levantamento de dados no próprio local onde ocorrem os fenômenos, através da observação direta, entrevistas e medidas de opinião. 2 EXPLORAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL Na época do descobrimento, o Brasil possuía recursos naturais em quantidade, o que acabava resultando na exploração local sem limites desses recursos, além de servir de fonte de riquezas para abastecer Portugal. Em todos os tipos de exploração natural daquele período, havia uma devastação das áreas exploradas, por exemplo, no plantio de cana de açúcar e de café. Entretanto, Portugal também influenciou, de forma positiva, na questão referente à preocupação com o meio ambiente no Brasil. A legislação portuguesa acabou servindo como base para o início da tutela ambiental no Brasil. Foi na fase colonial que surgiu a introdução e o desenvolvimento da legislação ambiental no país. Atualmente, o país continua se preocupando com o seu desenvolvimento, através da utilização dos recursos naturais disponíveis, porém, desde a colonização e com o intuito de desbravar o país, foi tudo feito à revelia da natureza. Como salienta um biólogo do MMA, ligado a ações da Convenção da Diversidade Biológica,“O modelo tradicional de exploração de recursos naturais no Brasil é extrativista, predatório e colonialista” (DIAS, 2002, p.19). 5 3 LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA Na década de 1970, mais precisamente em 1972, as questões ambientais passaram a ser discutidas de forma mais atuante e a Conferência de Estocolmo acarretou uma série de interesses sobre a questão ambiental, quando a situação não era muito favorável, devido, sobretudo, à parcialidade do Estado Democrático de Direito, criando, nesta época, mecanismos para a proteção do meio ambiente. A Política Nacional do Meio Ambiente, lei ambiental criada em janeiro de 1981, foi a mais importante do gênero, além de ser um grande marco no âmbito da proteção ambiental, pois reconhece a importância do meio ambiente para a vida e para a qualidade dela, submetendo ao poluidor a obrigação de compensar e/ou indenizar os prejuízos ambientais que forem causados por ele. Essa lei criou a obrigatoriedade dos estudos de avaliação do impacto no ambiente, tornando-se um avanço para um país em desenvolvimento. O crime ambiental foi tipificado com a edição da Lei de Crimes Ambientais, Lei 9.605/98, que prevê as sanções penais e administrativas em matéria ambiental. Nos dias de hoje, o Brasil tem um abrangente sistema institucional, voltado para a gestão do meio ambiente. A legislação ambiental, que está em vigor, passou por certas transformações que surgiram a partir de um processo histórico que envolveu contextos econômicos, políticos e sociais, atrelados às diferentes concepções de meio ambiente em cada período. A 1ª Conferência da ONU sobre o meio ambiente, que aprovou a Declaração Universal do Meio Ambiente, determinou que os recursos naturais, como a água, o ar, o solo, a flora e a fauna, sejam conservados para beneficiar as gerações futuras. 6 Na atualidade, entretanto, o modelo de desenvolvimento que é feito no país destaca maior importância ao crescimento econômico, enquanto as questões socioambientais são colocadas em segundo plano. Essas ações caracterizam-se pela sobreposição dos interesses privados e das questões econômicas frente ao interesse público. Assim, caso alguma norma prejudique a economia e aquisição de capital, o direito ambiental é posto em segundo plano e é dada uma menor importância a este, tal teoria é salientada por Marion (2013). O direito à preservação ambiental é o bem jurídico que a legislação brasileira visa proteger. Essa proteção está relacionada a diversos fatores históricos. O ambiente é responsável pela manutenção da vida, por isso é necessário que exista essa proteção, visto que este não possui vontade própria. Quem é dotado de vontade própria é o homem que, ao se deparar com a disponibilidade dos recursos naturais, acaba utilizando os elementos de forma, muitas vezes, incorreta. Alterações do clima, extinção de animais, elevação do nível do mar e da temperatura acenderam o alerta para a problemática ambiental. Meios de comunicação informam, a todo tempo, sobre a importância da preservação das espécies, dos rios, dentre outras situações, não só no Brasil como no Mundo todo. Em 1988, a Constituição da República Federativa do Brasil, também chamada de Constituição Cidadã, é promulgada ampliando uma série de conceitos e princípios, dentre eles a defesa do meio ambiente, Esta Constituição foi a primeira a utilizar o termo Meio Ambiente. As constituições que a precederam jamais se preocuparam com a proteção do ambiente de forma específica ou global. Em nenhuma delas, sequer uma vez, foi empregada a expressão Meio Ambiente, revelando total inadvertência ou até despreocupação com o próprio espaço em que vivemos. A Constituição de 1988, criando um capítulo próprio voltado para a questão ambiental, demonstrou um maior interesse e mudança de postura 7 dos próprios entes federados e municípios quando da edição de suas constituições ou leis orgânicas. O avanço de nossa Constituição foi fundamental para o Direito Ambiental. A partir dela, passamos a ter as mais garantias de proteção ao Meio Ambiente. Após sua promulgação, a legislação ambiental ordinária sofreu modificações de profundidade, procurando sempre aperfeiçoar os instrumentos de defesa ambiental. O Brasil trouxe para o ordenamento jurídico normas que protegem os elementos essenciais à vida do ser humano. Tanto as leis, quanto a Constituição Federal, deram um tratamento diferenciado às questões ligadas ao meio ambiente, objetivando que as futuras gerações se beneficiem e garantam a sobrevivência da espécie. Episódios, como o ocorrido em Brumadinho, Minas Gerais acabam mostrando as deficiências na gestão ambiental que só serão resolvidas com controle e fiscalização eficazes. Para que as instituições de defesa ambiental sejam fortalecidas, garantindo a aplicação da lei, é necessário controle e fiscalização, por parte do governo. Caso não sejam tomadas atitudes de fortalecimento dos órgãos de gestão ambiental, é provável que ocorra uma sucessão de desastres. A legislação ambiental brasileira é contemporânea e está atrelada aos parâmetros internacionais de preservação ambiental. Com relação aos acidentes ambientais, o problema maior é a aplicabilidade e efetividade da legislação. A legislação ambiental brasileira possui alguns problemas como: normas municipais, estaduais e federais se contradizerem em alguns momentos, como nos índices permitidos de poluentes, área mínima de preservação etc, o que causa o conflito de órgãos ambientais existentes no Brasil. Assim, torna-se necessária uma reforma estrutural que comece pela base de nosso regimento normativo, com a cooperação dos entes federados, posto que a matéria ambiental é de competência comum a todos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios. 8 4 FALHAS NA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL BRASILEIRA De acordo a primeira avaliação global do Estado de Direito Ambiental, divulgada no início deste ano, a pouca aplicação das leis é uma tendência que está agravando os problemas ambientais, embora o número de leis e agências ambientais tenha crescido em todo o mundo nas últimas quatro décadas. Conforme o novo relatório da ONU, referente ao Meio Ambiente, apesar de um aumento da legislação ambiental, em vigor desde 1972, a incapacidade de implementar e de fazer cumprir a legislação ambiental é um dos maiores desafios para reverter a mudança do clima, reduzir a poluição e evitar a perda generalizada de espécies e habitats. Para Boyd (2019), Relator Especial da ONU sobre Direitos Humanos e Meio Ambiente, esse novo e convincente relatório soluciona o mistério de entender por que problemas como a poluição, diminuição da biodiversidade e mudança do clima persistem, apesar da proliferação de leis ambientais nas últimas décadas. A menos que o Estado de Direito Ambiental seja fortalecido, leis aparentemente rigorosas estão fadadas a falhar e o direito humano fundamental a um meio ambiente saudável não será usufruído. A ajuda e os orçamentos nacionais não levaram ao estabelecimento de agências e órgãos ambientais capazes de aplicar as leis e regulamentos de forma eficaz apesar de terem auxiliado dezenas de países a assinarem mais de 1.100 acordos ambientais desde 1972 e a elaborarem muitos dispositivos legais na área ambiental. A falta de coordenação entre asagências governamentais, a fraca capacidade institucional, a falta de acesso à informação, a corrupção e o sufocamento do engajamento civil, foram identificados pelos autores como alguns dos fatores para a baixa implementação do Estado de Direito Ambiental. 9 “Temos um conjunto de leis, regulamentos e agências para governar nosso meio ambiente de forma sustentável”, declarou Joyce Msuya (2019, p.78), Diretora Executiva Interina da ONU Meio Ambiente, na primeira avaliação global do Estado de Direito Ambiental, divulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU). Complementou, ainda: Agora é essencial que haja vontade polít ica para assegurar que nossas leis trabalhem pelo planeta. Essa primeira avaliação global sobre o Estado de Direito Ambiental ressalta o trabalho daqueles que ficaram do lado certo da história — e de quantas nações se tornaram mais fortalecidas e seguras Apesar das dificuldades para esta implementação, foram identificadas várias conquistas do direito ambiental desde 1972, inclusive a adoção do direito constitucional a um meio ambiente saudável por 88 países, sendo que outras 65 nações incorporaram a proteção ambiental em suas constituições. E, também, mais de 350 cortes ambientais foram criadas em mais de 50 países e mais de 60 países contam com dispositivos legais sobre o direito dos cidadãos à informação ambiental. De acordo o Diretor de Programas Internacionais do Instituto de Direito Ambiental, Carl Bruch, (2019, p.88): […] a comunidade internacional pode fazer mais. Com frequência, o apoio de doadores se concentra em áreas específicas, o que resulta em programas sólidos em algumas áreas ambientais e outras com nenhum financiamento ou atenção. Essa abordagem fragmentada pode minar o Estado de Direito Ambiental ao não fornecer consistência na implementação e aplicação das leis e ao enviar mensagens conflitantes à comunidade regulamentada e ao público. Muitas dessas leis ainda têm que se enraizar na sociedade e, na maioria dos casos, a cultura de conformidade ambiental é fraca ou inexistente. O aumento a resistência às leis ambientais, que tem sido mais evidenciada nos casos de assédio, ameaças, prisões arbitrárias e assassinatos de defensores ambientais, tem atenção especial no relatório, pois a crescente violência é muito preocupante. Entre 2002 e 2013, 908 pessoas — incluindo agentes florestais, inspetores governamentais e 10 ativistas locais — foram mortos em 35 países e, só em 2017, 197 defensores ambientais foram assassinados. Joan Carling (2019, apud BRANNIGAN, 2019, p.1), ativista de direitos indígenas e defensora ambiental das Filipinas, afirmou que: A criminalização e os crescentes ataques aos defensores ambientais constituem claras violações ao Estado de Direito Ambiental e uma afronta aos direitos, papéis e contribuições dos povos indígenas e da sociedade civil na proteção do meio ambiente. Esse relatório capta a falta de responsabilização, de uma governança ambiental forte e do respeito aos direitos humanos para a sustentabilidade do nosso meio ambiente. A participação de uma sociedade civil informada favorece uma melhor tomada de decisões pelo governo, ações ambientais mais responsáveis por parte das empresas e um direito ambiental mais eficaz. Essas metas também podem ser atingidas através de produção periódica de relatórios sobre a qualidade ambiental dos países, inclusive, sobre a qualidade do ar e da água. Infelizmente, de acordo com o Índice de Democracia Ambiental, apenas 20 dos 70 países avaliados são classificados como sendo “bom” ou “muito bom” na produção de relatórios periódicos, abrangentes e atuais do “Estado do Meio Ambiente”. Os dados sobre a poluição gerada por instalações industriais na Índia, Tailândia e Uganda só podem ser obtidos por meio de contatos pessoais. Algumas boas práticas são apresentadas nos relatórios, inclusive inovações aplicadas em países em desenvolvimento que, muitas vezes, enfrentam os mesmos desafios dos países desenvolvidos, mas com menos recursos. Podemos reforçar alguns pontos-chave através da diversidade geográfica. O desenvolvimento e a promoção do Estado de Direito Ambiental é um desafio para todos os países e é também uma prioridade crescente. É preciso atribuir prioridade máxima ao fortalecimento do Estado de Direito Ambiental para que as metas de centenas de leis, regulamentos e políticas nacionais que regem o meio ambiente em todo o mundo sejam alcançadas. 11 5 PROBLEMAS RELATIVOS À FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL – Pesquisa de Campo Por mais completa que seja a legislação ambiental brasileira, a sua aplicação é dificultada por diversos motivos. Segundo Gonçalves (2007), um fator a ser considerado é a existência de uma fiscalização deficiente, a nível estadual e federal, seguida do desinteresse das partes administrativas municipais em exercerem sua função normativa. Esse mesmo entendimento e apresentado por Costa (2000, p.7): A despeito dos esforços de alguns órgãos estaduais, as dificuldades encontradas em função das escassas condições para fiscalização e controle de todas as atividades poluidoras vêm colaborando para minimizar a pressão e as exigências sobre as atividades produtivas. São características do sistema, a falta de recursos, a demora na apreciação dos processos e a fraca fiscalização. Os dados desse estudo foram coletados no âmbito de uma pesquisa mais ampla sobre a problemática da fiscalização e aplicação das sanções relativas à legislação ambiental. A pesquisa de campo no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) consistiu em um levantamento e análise das principais atividades de fiscalização ambiental exercidas pelo órgão e a efetividade dessas ações. 5.1 Atividades de Fiscalização do IBAMA A fiscalização ambiental é um conjunto de atos da administração pública com o intuito de prover a responsabilização ambiental ao administrado, decorrente de suas condutas e atividades que transgrediram as normas. Segundo o Instituto, o procedimento para apuração das infrações ambientais pode ser organizado em quatro etapas: detecção, ação fiscalizatória, julgamento e execução das sanções. As estratégias para a execução das etapas detecção e ação fiscalizatória são definidas no Plano Nacional de Proteção Ambiental (Pnapa). O procedimento de planejamento do Pnapa é composto das seguintes etapas: avaliação das infrações ambientais; elaboração do diagnóstico de delitos ambientais 12 (DDI); estabelecimento de diretrizes; elaboração das propostas de ações; reunião para consolidação das ações; apresentação da proposta do Pnapa para o Conselho Gestor; aprovação da Presidência e publicação da portaria do Pnapa. De 1.367 operações de fiscalização planejadas no Pnapa para o ano de 2017, foram realizadas 1.003 operações, sendo 486 de flora, 182 de fauna, 159 de pesca, 152 de qualidade ambiental, 17 de licenciamento, 07 de patrimônio genético, conforme dados coletados no Sistema de Cadastro, Arrecadação e Fiscalização (Sicafi). O Ibama atuou em todos os biomas brasileiros, dentro do poder de polícia ambiental, monitorando e combatendo os ilícitos ambientais considerados prioritários, de competência federal e condizentes com as diretrizes emanadas pelo Ministério de Meio Ambiente (MMA). Dentro das ações consideradas estratégicas, foram priorizadas as de combate ao desmatamento ilegal da floresta Amazônica, sobretudo nas áreas mais críticas localizadas nos estados doPará, Mato Grosso, Rondônia e Amazonas. A ação mais contundente refletiu diretamente na diminuição da taxa do desmatamento ilegal no bioma Amazônico, que apontaram redução de 16% nas taxas de desflorestamento ao comparar os períodos de 2016 que foi de 7.893 km2 com o período de 2017 que foi de 6.624 km2. Dentre as dificuldades encontradas para a obtenção de resultados no combate ao desmatamento, segundo o órgão, estão a carência de recursos humanos com formação específica para fiscalizar, o aumento da prática de infrações ambientais em razão da conjuntura econômica e a falta de empenho dos órgãos ambientais estaduais em exercitar as suas competências legais e o contingenciamento orçamentário ocorrido no primeiro semestre do ano. Além disso, o Ibama destacou a ocorrência de diversos ataques às estruturas e equipamentos, como a queima de viaturas por parte de organizações criminosas que exercem a exploração ambiental ilegal, sobretudo de madeira e minérios. 13 5.2 Tempo médio para conclusão de um Auto de Infração Outro fator importante que pode influenciar diretamente a eficácia da legislação ambiental é o tempo médio até o julgamento final das infrações pelo órgão. Para este cálculo, considerou-se o tempo decorrido entre a autuação e o julgamento dos Autos de Infração (AI) que foram julgados em última instância. O tempo médio de referência apurado com base nos dados registrados no período 2005-2012 era de 5 anos e 7 meses. Em 2017, dados os primeiros passos do processo de reestruturação da área responsável pelo processo sancionador ambiental, registrou-se a redução do tempo médio que passou para 3 anos e 6 meses. 5.3 Aplicação de multas decorrentes da atividade de fiscalização O Ibama utiliza o Sistema de Cadastro, Arrecadação e Fiscalização (Sicafi). Lá são realizados o cadastramento, o controle, o processamento e a cobrança de todos os débitos da Autarquia. O Sistema Eletrônico de Informações (SEI) também é usado para a condução dos processos administrativos de cobrança e constituição de créditos relativos a obrigações com o Ibama. Esgotado o prazo para cobrança de crédito de multa ambiental sem que a obrigação tenha sido cumprida, o Ibama encaminha o processo administrativo à unidade da Procuradoria-Geral Federal na unidade descentralizada de domicílio do devedor para que efetuem a inscrição na Dívida Ativa da União e promovam a respectiva execução Os dados aqui apresentados foram extraídos do Sicafi e representam os pagamentos associados a autos de infrações realizados até 31 de dezembro de 2017. 14 QUADRO 1 – Percentuais de recolhimento de multas e Autos de Infrações (AI) lavrados. Fonte: Dados do Sistema de Cadastro, Arrecadação e Fiscalização (Sicafi) referentes aos pagamentos efetuados até 2017 Segundo Acórdão 482/2012-TCU-Plenário, diversos fatores contribuem para uma baixa arrecadação de multas ambientais: i) o elevado valor das sanções cominadas em abstrato e efetivamente impostas; ii) a postergação dos pagamentos pelo recurso a medidas judiciais que suspendem a exigibilidade do crédito; iii) a ausência de instrumentos jurídicos que estimulassem o pagamento dessas obrigações; iv) o não aperfeiçoamento do processo sancionador ambiental pela ausência do instrumento de conversão de multas; v) um cenário de retração econômica; e vi) a demora na conclusão de processos administrativos de constituição de créditos decorrentes de multas em razão do subdimensionamento dos recursos humanos e materiais dedicados ao processo de trabalho correlato. 6 CONCLUSÃO Nas últimas décadas, a noção de cidadania ambiental passou a fazer parte da agenda pública nacional e internacional e das constituições dos estados democráticos de direito como uma expansão dos direitos humanos fundamentais que se expressa no direito de viver e usufruir de um ambiente limpo e saudável. A Constituição de 1988 dedicou atenção especial a esse tema, com um capítulo próprio voltado para a questão ambiental. A legislação ambiental brasileira é elaborada e considerada por vários autores como sendo bastante avançada, mas, este fato por si só não garante a proteção 15 ambiental, pois, os interesses empresariais e governamentais são defendidos como se fossem mais importantes do que o cumprimento da legislação ambiental. Como salienta um biólogo do Ministério do Meio Ambiente, relacionado com ações da Convenção da Diversidade Biológica, "O modelo tradicional de exploração de recursos naturais no Brasil é extrativista, predatório e colonialista" (Dias 2002). O Brasil ainda enfrenta desafios para colocar em prática políticas que protejam o meio ambiente. Segundo Maran (2018), do Departamento de Ciências Ambientais (DCam) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), isso se deve, principalmente, a problemas encontrados na área de fiscalização. A falta de infraestrutura e de profissionais com formação específica para a fiscalização das questões ambientais se torna um empecilho na resolução das demandas jurídico- ambientais de forma rápida e precisa. […] As questões ambientais clamam por maior estruturação e pela capacitação de pessoal. Precisamos de peritos judiciais bem preparados, pois as demandas são muitas e os experts não conseguem atendê-las com rapidez e precisão. As perícias demoram para acontecer, e também é difícil encontrar profissionais competentes e capacitados para as mais variadas questões ambientais. Diante ao exposto, percebe-se que o problema da legislação ambiental brasileira não está na falta de normativos jurídicos, mas na falta de aplicabilidade deles. Uma fiscalização insuficiente ou falha promove a impunidade, o índice baixo de arrecadação das multas e a demora na resolução dos processos ambientais estimulam a desobediência a legislação ambiental. Para Leila Pose, advogada especialista em gestão ambiental e membro da Comissão de Direito Ambiental do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), a legislação ambiental brasileira é contemporânea e está alinhada aos parâmetros internacionais de preservação ambiental. [...] o problema não é a legislação, e sim a sua aplicabilidade e efetividade. Estamos falando do controle e da fiscalização exercidos pelos órgãos ambientais, que como é sabido, quase sempre não possuem estruturas adequadas para atender à demanda do Estado brasileiro.(apud BARBOSA, 2019) 16 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Vanesa. Afrouxar Lei Ambiental? O urgente recado da tragédia da Vale para o Brasil. Brumadinho escancarou deficiências na gestão ambiental que só se resolverão com controle e fiscalização eficazes, afirmam especialistas. Revista Exame. Ed. Fev. 2019, Publicada em 10 fev. 2019. BRANNIGAN, Niamh; ZANDONAI, Roberta. Crescem as leis para proteger o meio ambiente, mas há falhas graves de implementação. Desenvolvimento Sustentável. Nações Unidas Brasil. Disponível em: https://nacoesunidas.org/crescem-as- leis-para-proteger-o-meio-ambiente-mas-ha-falhas-graves-de-implementacao-diz-relatorio/ Acesso em: 28 abril 2019 BRUCH, Carl; BOYD David; MSUYA, Joyce. Environmental Rule of Law - First Global Report. United Nations Environment Programme. Unites States: UNO: 2019 Disponível em: https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/27279/ Environmenta l _rule_of_law.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 04 abril 2019. COSTA, A. B. Desenvolvimento sustentável e regulação ambiental no setor petróleo: aspectos da legislação ambiental no Brasil. Disponível em: http://lasa.international.pitt.edu/Lasa2000/daCosta.PDF . Acesso em: 05 abril2019 Dias, Bráulio F. de Souza. 2002. "Biosegurança, bioética e biodiversidade", in Fábio Feldman (org.), Rio+10: uma década de transformações. Rio de Janeiro: Instituto de Estudos da Religião - ISER. GONÇALVES, L. F. T. O direito ambiental como instrumento de gestão da empresa contemporânea. 2007. 188 f. Dissertação (Mestrado em Direito Empresarial) – Faculdade de Direito Milton Campos, Nova Lima, 2007. MARAN, Celso. Problemas encontrados na fiscalização impedem o Brasil de proteger melhor o meio ambiente. Disponível em: 17 http://www.fai.ufscar.br/noticia/problemas-encontrados-na-fiscalizacao-impedem-o- brasil-de-proteger-melhor-o-meio-ambiente.html. Acesso em: 28 abril 2019. MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e trabalhos científicos. 7. ed. – 6. reimpr. São Paulo: Atlas: 2011. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 482/2012-TCU-Plenário. Relator: Ministro Raimundo Carreiro. Brasília, 07 de março de 2012. Diário Oficial de União, 10 de mar. 2012.
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