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Apostila-Literatura Infanto Juvenil

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
CENTRO DE EDUCAÇÃO ABERTA E A DISTÂNCIA
Clarice Fortkamp Caldin
Leitura e literatura
infanto-juvenil
Governo Federal
Presidência da República
Ministério de Educação
Secretaria de Ensino a Distância
Coordenação Nacional da Universidade Aberta do Brasil
Universidade Federal de Santa Catarina
Reitor | Alvaro Toubes Prata
Vice-reitor | Carlos Alberto Justo da Silva
Secretário de Educação a Distância | Cícero Barbosa
Pró-reitora de Ensino de Graduação | Yara Maria Rauh 
Müller
Pró-reitora de Pesquisa e Extensão | Débora Peres Menezes
Pró-reitora de Pós-Graduação | Maria Lúcia de Barros 
Camargo
Pró-reitor de Desenvolvimento Humano e Social | Luiz 
Henrique Vieira da Silva
Pró-reitor de Infra-Estrutura | João Batista Furtuoso
Pró-reitor de Assuntos Estudantis | Cláudio José Amante
Curso de Especialização em Gestão de Bibliotecas 
Escolares
Centro de Ciências da Educação | Wilson Schmidt
Chefe do Departamento | Angel Freddy Godoy Vieira
Coordenadora de Curso | Magda Chagas 
Coordenadora de Tutoria | Araci Isaltina de Andrade Hille-
sheim
Conselho Editorial
Clarice Fortkamp Caldin
Estera Muszkat Menezes
Magda Chagas
Projeto Gráfico
Coordenação | Laura Martins Rodrigues
Thiago Rocha Oliveira
Equipe | Maicon Hackenhaar de Araujo
Rafael de Queiroz Oliveira
Equipe de Desenvolvimento de Materiais
Laboratório de Novas Tecnologias | LANTEC/CED
Coordenação Geral | Andrea Lapa
Coordenação Pedagógica | Roseli Zen Cerny
Material Impresso e Hipermídia
Coordenação | Laura Martins Rodrigues
Thiago Rocha Oliveira
Diagramação |Thiago Rocha Oliveira, Grasiele Pilatti, 
Gregório Bacelar Lameira
Ilustrações | Tarik Assis Pinto, Maiara O. Ariño, Ângelo
Bortolini, Amanda Woehl, João Antônio A. Machado
Revisão gramatical | Clarice Fortkamp Caldin, Estera 
Muszkat Menezes, Magda Chagas
Design Instrucional
Coordenação | Isabella Benfica Barbosa
Designer Instrucional | José Paulo Speck Pereira
Copyright © 2010, Universidade Federal de Santa Catarina 
CIN/CED/UFSC
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, 
transmitida e gravada sem a prévia autorização, por escrito, 
da Coordenação do Curso de Especialização em Gestão de 
Bibliotecas Escolares.
Catalogação na fonte elaborada por 
Francisca Rasche - CRB 14/691
C146l Caldin, Clarice Fortkamp 
Leitura e literatura infanto-juvenil / 
Clarice Fortkamp Caldin. – Florianópolis : CIN/
CED/UFSC, 2010.
116 p. 
Inclui bibliografia.
UFSC. Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em 
Gestão de Bibliotecas Escolares na modalidade a 
distância. 
ISBN 978-85-62818-11-0 
1. Leitura. 2. Literatura infanto-juvenil. I. Título.
CDD (22.ed.) – 028
Sumário
Apresentação ....................................................... 7
1 Leitura .............................................................. 8
1.1 Definições..................................................................................12
1.2 Modalidades .............................................................................21
1.3 Estratégias ................................................................................28
1.4 Função poética ........................................................................33
Bibliografia Comentada ........................................................43
Síntese ........................................................................................44
2 Literatura infanto-juvenil .............................46
2.1 Características ........................................................................53
2.2 Funções ......................................................................................61
2.2.1 Função pedagógica ........................................................................62
2.2.2 Função social ....................................................................................66
2.2.3 Função terapêutica ......................................................................... 70
2.3 Histórico ....................................................................................75
2.4 A Literatura infanto-juvenil no Brasil ..............................87
2.5 Tipologia das histórias ...........................................................92
Bibliografia Comentada ..................................................... 108
Síntese ..................................................................................... 109
 Referências ....................................................... 110
 Currículo da Autora ........................................ 116
Apresentação
Bem-vindo à disciplina Leitura e literatura infanto-juvenil! 
Inserida na temática 4: Mediação e serviços em bibliotecas es-
colares, com 30 horas/aula, essa disciplina tem por objetivo 
otimizar suas competências e habilidades na gestão da leitura 
e da literatura infanto-juvenil.
Você gosta de ler? Aprecia a literatura infanto-juvenil?
Se a resposta for um enfático SIM, estudará com prazer as 
principais definições de leitura; conhecerá as diferentes mo-
dalidades e estratégias de leitura; enfocará o ato da leitura na 
biblioteca como uma função poética; observará as caracterís-
ticas e as funções da literatura infantil e juvenil; acompanhará 
a trajetória da literatura infanto-juvenil desde o século XVII 
até nossos dias; entenderá a tipologia das histórias.
Isso é apenas uma parte: o construto teórico. Mas a teoria 
é estéril sem a prática. Assim, espera-se que você aprenda a 
aplicar as estratégias de leitura no ensino infantil e funda-
mental para realizar atividades prazerosas de incentivo à lei-
tura, e a selecionar textos literários pelo viés da literariedade.
Gostou da proposta? Está animado? Então, vamos começar!
8 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
1 Leitura
Esse capítulo tem por objetivo propiciar ao aluno do 
Curso de Especialização em Gestão de Bibliotecas Es-
colares o entendimento do fenômeno da leitura, suas 
definições, modalidades, estratégias e a função poética. 
Essa compreensão é necessária para que a biblioteca 
atue como espaço incentivador do ato de ler.
9Leitura
Na sociedade ocidental, ao longo das eras, a leitura é en-
tendida de maneira diferente, de acordo com as necessidades 
humanas. A história da leitura perpassa pelo valor concedi-
do ao registro escrito como veículo da democracia (na pólis 
grega), da religião (na Idade Média), da economia (na Idade 
Moderna), da política (a partir da Revolução Francesa) e da 
educação (desde o século XIX).
Ao descrever as práticas de leitura no ocidente, Cavallo e 
Chartier (1998-1999) apontam as diferentes formas de ler da 
Antiguidade aos dias atuais. É baseado no livro História da 
leitura no mundo ocidental (cuja leitura recomendamos), or-
ganizado por esses dois historiadores, que se delineia o texto 
que segue.
Conquanto a leitura pública fosse uma prática da vida so-
cial grega a serviço da democracia ateniense (dos cidadãos 
livres, excluídos as mulheres e os escravos), da retórica, da 
escola e da preservação da memória, há relatos da leitura si-
lenciosa, como forma de entretenimento. Na Roma Antiga, a 
leitura ficava circunscrita aos sacerdotes e aos nobres, sempre 
referente ao sagrado ou ao jurídico, inspirada no modelo gre-
go, cujas bibliotecas eram despojos de guerra. 
Na Idade Média, o ideal de leitura era o da meditação, pre-
ferencialmente das Escrituras Sagradas, sempre mediada pelos 
processos de decifração dos textos (identificando as letras, sí-
labas, palavras e frases), pronunciação em voz alta (observan-
do a pontuação), correção do texto escrito (exigência necessá-
ria pela má qualidade de alguns manuscritos), comentário (do 
vocabulário, das figuras literárias), interpretação (do conteú-
do), e avaliação (das qualidades estéticas, morais e filosóficas 
do escrito);mesmo a leitura ligada ao lazer era concentrada, 
atenta e murmurada.
Já no século XII, em virtude do aumento da quantida-
de de obras disponíveis e do despontar das universidades, a 
meditação cedeu lugar à utilidade: aparecem os resumos de 
A pólis, ou Cidade-Estado, era o 
núcleo da vida social e política 
da Grécia Antiga, espaço do ci-
dadão para debate e participação 
nos assuntos e negócios comuns. 
A Idade Média, iniciada com o 
colapso do Império Romano Oci-
dental e marcada pelo feudalismo, 
teve a religião como preservadora 
da cultura clássica e o clero como 
representante intelectual. A Idade 
Moderna, período marcado pelo 
Renascimento artístico, foi palco 
da Revolução Comercial, passagem 
de uma economia estática para um 
capitalismo mercantil. A Revolução 
Francesa, no século XVIII, ao aca-
bar com a monarquia absolutista, 
propiciou a ascensão da burgue-
sia e dos governos liberais, cons-
titucionais e representativos. No 
século XIX e XX, com a difusão da 
educação primária gratuita, gene-
ralizada e obrigatória, a leitura foi 
fator decisivo para a educação das 
massas e, no século XXI, a leitura 
tomou novas feições em virtude 
das tecnologias; importa agora não 
apenas erradicar o analfabetismo, 
mas também diminuir o número 
dos iletrados informacionais.
10 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
doutrinas (tanto bíblicas, quanto aristotélicas) e a leitura dos 
originais é substituída por textos fragmentados e compila-
ções literárias. Dessa feita, estudantes e professores, seja pela 
dificuldade na compreensão dos autores, seja pela coerção 
econômica (o pergaminho e os copistas titulados eram uma 
despesa significativa), priorizavam as coletâneas, o emprésti-
mo de manuscritos, a reprodução de versões corrigidas pelas 
autoridades acadêmicas. A tendência à simplificação causou, 
então, um empobrecimento das matérias escolares, pois os flo-
rilégios não substituem a leitura da obra original, limitam a 
criatividade e transformam as coleções de citações (utilizadas 
fora do contexto) em deformações da fala do autor; enfim, de 
instrumentos de trabalho, passam à condição de um fim em si.
O leitor humanista, por outro lado, selecionava o texto de-
sejado e o interpretava – tanto para alívio das pressões cotidia-
nas, quanto para resolver questões práticas. Escribas, gráficos e 
pintores de iluminuras eram contratados por empresários e co-
merciantes: cresce a economia da atividade editorial, que aten-
de a um público cada vez mais exigente – os intelectuais da Re-
nascença. Nesse período, proliferam as lojas dos livreiros, pois 
há uma demanda por folhas e cadernos que o humanista usará 
para copiar o texto original, uma vez que considera o escrever 
uma forma de leitura e a melhor maneira de apreciar os bons 
autores. Anotações criteriosas e referências cruzadas exigiram 
a criação de diversos aparatos para facilitar esse trabalho lite-
rário; assim é que no final do século XVI surge a roda de livros.
A invenção da imprensa no século XV, a Reforma Protes-
tante e a Contra-Reforma no século XVI, impulsionaram o co-
mércio livreiro, com a publicação de Bíblias, obras litúrgicas e 
panfletos de propaganda ou contrapropaganda confessionais. 
Muito embora o clima fosse religioso e não se estimulasse a lei-
tura popular, entre os artesãos, lojistas, pequenos comerciantes 
e as elites das aldeias, prevalecia o gosto pelos romances de ca-
Roda de livros
“Uma grande roda vertical, com en-
grenagens para fazer com que virasse 
lentamente e parasse sempre que ne-
cessário. Ela movia os livros colocados 
em pequenas estantes rotativas. [...] O 
humanista que fosse dono de tal apa-
relho poderia permanecer tranquila-
mente sentado, enquanto consultava 
uma biblioteca de textos.” (CAVALLO; 
CHARTIER, 1999, v. 2, p. 37-38).
11Leitura
valaria, principalmente na Espanha. Mesmo proibida pelas au-
toridades castelhanas, a literatura de ficção, tida como perigosa 
fuga da realidade, agrada a população não-letrada e mesmo os 
analfabetos dela desfrutam, pois a prática é da leitura oraliza-
da: um leitor lê em voz alta para um público de ouvintes.
E no século XVIII, na Europa central, sur-
giu o que foi chamado de febre de leitura, 
epidemia de leitura: o povo lê – telha-
dores, artesãos, criados, soldados, mu-
lheres, jovens, crianças. Muito embora 
fosse considerada uma “leitura selva-
gem”, quer dizer, não voltada para fins 
eruditos ou úteis, sem reflexão e, na 
maior parte, realizada em voz alta, 
tal leitura contribuiu para formar 
as identidades corporativa, social, 
cultural e política. Isso se evidencia, 
principalmente, pelo incremento, 
depois da Revolução Francesa, dos 
jornais, partilhados por toda a po-
pulação (lendo ou ouvindo) como 
veículo de informação e de cons-
cientização política. Paralelo a eles, disputam a preferência do 
público leitor os romances, as histórias policiais, os livros de 
cozinha, os contos de fadas, as fábulas e as histórias de aven-
turas. Esse fenômeno, que poderia ser chamado mais apropria-
damente de “revolução da leitura” foi possível graças à dimi-
nuição da jornada de trabalho, da eletricidade, de bibliotecas 
de empréstimo e das sociedades literárias não-comerciais, das 
reformas educacionais e da modernização do mercado edito-
rial. Essa “fúria” de leitura foi orientada e supervisionada pela 
ideologia da classe dominante, vista com certa reserva pelos 
mais conservadores, apresentou discretamente traços feminis-
tas, e suavizou as tensões sociais.
Figura 1: A Bíblia foi a primeira obra que Gutenberg produziu em série com 
sua máquina de tipos móveis (que ficou conhecida como “prensa de Guten-
berg”). Centenas de obras passaram a ser produzidas a partir de então, o 
que influenciou, ao lado de outros fatores, a alfabetização das classes mais 
baixas da população, em diversos países.
Ideologia
A palavra possui diferentes interpre-
tações. Uma delas é a seguinte: “Con-
junto articulado de idéias, valores, 
opiniões, crenças, etc., que expressam 
e reforçam as relações que conferem 
unidade a determinado grupo social 
(classe, partido político, grupo religio-
so, etc.) seja qual for o grau de consci-
ência que disso tenham seus portado-
res.” (FERREIRA, 1999, p. 1072).
12 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Você observou como a leitura sempre esteve presente nas 
sociedades letradas? Em voz alta, murmurada, silenciosa, pú-
blica, individual, pragmática, literária, meditada ou impen-
sada, a leitura participou da vida das elites e das massas ao 
longo dos séculos, preservando o conhecimento registrado e 
disseminando novas idéias.
Por esse motivo, a leitura tem sido objeto de muitas defini-
ções, atreladas ao contexto social. Na impossibilidade de listar 
todas, apresentaremos as mais significativas e pertinentes ao 
nosso estudo. É possível que você discorde de algumas, sur-
preenda-se com outras ou eleja uma como favorita. É possí-
vel, também, que resolva acrescentar novas definições às aqui 
elencadas. Isso significa que, qualquer que seja sua reação, 
você se envolveu! Em outras palavras: não ficou apático ao 
tema, não se comportou como mero espectador do texto, mas 
como participante na construção de uma definição da leitura 
– aquela que tocou sua sensibilidade, instigou seu intelecto e 
partiu de sua vivência profissional.
1.1 Definições
Quando falamos em leitura, pensamos em: decifrar o escrito 
(decodificar as palavras), entender o conteúdo (compreender o 
que o autor disse), interpretar o assunto (desvelar o texto), in-
formar-se (apropriar-se do acervo de conhecimentos da huma-
nidade), viajar no imaginário (por meio das personagens ficcio-
nais). Assim, associamos sempre a leitura à escrita. Mas é bom 
lembrar que, no cotidiano, fazemos leitura de gestos, olhares, 
paisagens, quadros, fotografias, música, tempo, espaço.
Talse dá porque a leitura tem múltiplos aspectos e inter-
faces. A informação (dados dotados de relevância e sentido, 
organizados e comunicados) pode estar registrada em diver-
sos suportes (papel, corpo humano, camadas de terra, vestí-
13Leitura
gios de civilizações desaparecidas, mapas, banco de dados, 
por exemplo).
A leitura, enquanto objeto de estudo, presta-se a uma 
abordagem multidisciplinar, cujo enfoque é dado dependendo 
da área do conhecimento. Destarte, a leitura é entendida como 
ato social, lingüístico, pedagógico, terapêutico, psicológico, 
cognitivo, neurológico, fenomenológico, entre outros.
De modo geral, quando discorremos sobre a leitura na es-
cola, o recorte é dado à leitura de material didático, com vis-
tas à assimilação de informações (extrair o sentido do texto) 
ou literário, objetivando o entretenimento (atribuir sentido 
ao texto). Quase sempre fica obliterado que tanto a leitura 
informacional quanto a leitura poética é muito mais do que 
um processo ascendente (em que a compreensão vai-se acu-
mulando gradativamente) ou um processo descendente (em 
que o leitor, com sua consciência imaginante, vai desvelando 
o texto apoiado no conhecimento prévio do mundo); a leitura 
é, acima de tudo, intencionalidade – quer dizer o leitor tem 
determinado objetivo a ser alcançado.
Intencionalidade é “a qualidade de estar dirigido para 
algo, ou de ‘ser’ acerca de algo, qualidade esta que é pos-
suída por muitos, se não todos, os estados conscientes.” 
Ou seja, “nossos pensamentos, crenças, anseios, sonhos e 
desejos são acerca de coisas.” Do mesmo modo, “as pa-
lavras que usamos para exprimir essas crenças, e outros 
estados mentais, são sobre coisas. A intencionalidade tor-
na-se, assim, uma característica da linguagem, e não uma 
peculiaridade metafísica ou ontológica do mundo mental.” 
(BLACKBURN, 1997, p. 206-207).
14 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Leffa (1996, p. 17) lembra que “a intencionalidade é uma 
característica exclusiva do ser humano”, pois uma máquina, 
conquanto possa “ser programada para resumir ou parafrasear 
um texto, detectar anomalias semânticas e até responder per-
guntas implícitas”, não tem a intenção de lazer, não tem a in-
tenção de obter informações, e não tem a intenção de realizar 
uma leitura crítica de obra literária.
O que significa isso? Que intencionalidade implica desejo, 
motivação. Aplicando-se a noção de intencionalidade à leitu-
ra, podemos dizer, então, que o ser humano lê quando se sen-
te motivado para tal, quando foi despertado nele esse desejo.
Como proceder, na escola e na biblioteca, para que o exer-
cício da leitura seja desejante?
Qual a responsabilidade dos professores e bibliotecários em 
propiciar o desenvolvimento da leitura intencional?
São perguntas que merecem resposta, não é mesmo? Mas 
essas respostas serão dadas por você que realiza esse curso co-
nosco, que partilha das preocupações acerca da leitura praze-
rosa, instigante, intencional. Aqui, serão apontados caminhos. 
Cabe a você a resolução de enveredar por eles, explorá-los, 
socializá-los. E lembrar, como Morais (1996) o fez, que o ato 
de ler oscila em torno de um desafio, um prazer pessoal e um 
problema social. Desafio, porque arte de ler tem sido reduzida 
a operações automatizadas, sem a reflexão necessária. Prazer 
pessoal, porque já foi comparada ao sonhar, ao pastar, e ao 
digerir por autores como Fernando Pessoa, Roland Barthes e 
Nietzsche. Um problema social, porque a demanda da socie-
dade é por pessoas leitoras e letradas e a leitura ainda é mal 
compartilhada, mesmo nos países desenvolvidos.
E então, vamos dar conta desse desafio? Vamos fazer da lei-
tura um prazer pessoal? Vamos diminuir esse problema social?
Veremos, a seguir, como diversos autores definem a leitura. 
Cada definição se apresenta como oportunidade para você re-
fletir, opinar e aplicar no seu local de trabalho.
15Leitura
Comecemos por Marcel Proust. Sabe quem foi ele? Um pa-
risiense que entre 1871 e 1922, frequentou a sociedade bur-
guesa da Terceira República Francesa1. De saúde frágil, afas-
tou-se dos salões da época para dedicar-se à escrita da obra 
em treze volumes Em busca do tempo perdido, considerada 
por alguns uma autobiografia, por outros um ensaio à memó-
ria e ao tempo, mas tida por todos como uma grande realiza-
ção literária. Quando sair de férias, porque não leva consigo 
um dos volumes e aprecia sua escrita magistral? Pois bem, 
esse literato escreveu também um ensaio sobre a leitura, um 
trabalho que merece ser examinado, haja vista que discorre 
sobre a importância da leitura na infância:
[...] o que as leituras da infância deixam em nós é a ima-
gem dos lugares e dos dias em que as fizemos. Não esca-
pei ao seu sortilégio: querendo falar delas, falei de outras 
coisas diferentes de livros, porque não é deles que elas me 
falaram. Mas talvez as lembranças que elas me trouxeram 
tenham elas mesmas sido despertadas nos leitores, condu-
zindo-os pouco a pouco – retardando-se nesses caminhos 
floridos e enviezados – a recriar em seu espírito o ato psi-
cológico original chamado Leitura, com força suficiente 
para poder seguir agora como que dentro dele mesmo as 
reflexões que me restam a apresentar. [...] Na medida em 
que a leitura é para nós a iniciadora cujas chaves mági-
cas abrem no fundo de nós mesmos a porta das moradas 
onde não saberíamos penetrar, seu papel na nossa vida é 
salutar. (PROUST, 1991, p. 24-25, 35, grifo do autor).
Você observou que na citação a leitura é descrita como um 
ato psicológico e considerada uma disciplina que favorece a 
saúde? Você concorda com essa definição e descrição? Por quê?
Passemos a Jean-Paul Sartre, outro parisience. Nascido em 
1905 e falecido em 1980, foi novelista, teatrólogo, filósofo 
existencialista e premiado com o Nobel de Literatura em 1964. Figura 2: Marcel Proust (1871-1922).
1 A Terceira República (1870-1940), foi 
criada após a captura e o exílio de Na-
poleão III (sobrinho de Napoleão Bona-
parte) e a derrota francesa na guerra 
franco-prussiana.
16 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Você já leu algum livro dele? Se não, recomendamos que o 
faça, principalmente Que é a literatura?, de onde extraímos 
essa definição de leitura:
[...] a leitura é um pacto de generosidade entre o autor 
e o leitor; cada um confia no outro, conta com o outro, 
exige do outro tanto quanto exige de si mesmo. Essa con-
fiança já é, em si mesma, generosidade; ninguém pode 
obrigar o autor a crer que o leitor fará uso da sua liberda-
de; ninguém pode obrigar o leitor a crer que o autor fez 
uso da sua. É uma decisão livre que cada um deles toma 
independentemente. Estabelece-se então, um vaivém dia-
lético; quando leio, exijo; o que leio, então, desde que mi-
nhas exigências sejam satisfeitas, me incita a exigir mais 
do autor, o que significa: exigir do autor que ele exija 
mais de mim mesmo.[...] devemos lembrar que o escritor, 
como todos os artistas, procura dar a seus leitores certa 
afeição a que se costuma chamar prazer estético e que, de 
minha parte, eu preferiria designar como alegria estética. 
(SARTRE, 2004, p. 46, 47). 
A leitura, se entendida como um pacto, um contrato en-
tre duas ou mais pessoas, não pode ser forçada. Você notou 
o destaque à liberdade e ao prazer da leitura? O que pensa 
sobre isso? Está disposto a apresentar a leitura na biblioteca 
da escola como um acordo de generosidade, de cumplicidade, 
não apenas entre o escritor e os leitores, mas também entre 
professor e alunos, bibliotecário e usuários da biblioteca?
Vejamos o que pensa outro francês: Maurice Merleau-Pon-
ty, que teve vida curta (1908-1961), mas ativa: estudou filoso-
fia, lecionou Psicologia da criança e Pedagogia na Universi-
dade Sorbonne e Filosofia no Collège de France, foi editor da 
revista Tempos Modernos (que pretendiasuscitar entusiasmo 
pela reconstrução da Europa) e participou ativamente da cor-
rente de pensamento chamada fenomenologia2.
Figura 3: Jean-Paul Sartre (1905-1980).
2 “Uma corrente da filosofia que não 
faz distinção entre o papel atuante 
do sujeito que conhece [...] e a influ-
ência do objeto conhecido. [...] Para a 
fenomenologia não existe objeto em 
si destacado de uma consciência que 
o conhece. O objeto é um fenômeno”. 
(CARMO, 2000, p. 21, grifo do autor).
17Leitura
A fenomenologia se preocupa com o cotidiano, é uma fi-
losofia que rejeita o dualismo mente/corpo e prioriza a ex-
periência. Assim, é sob uma abordagem fenomenológica que 
Merleau-Ponty (2002, p. 35, 35) define a leitura:
A leitura é um confronto entre os corpos gloriosos e im-
palpáveis de minha fala e da fala do autor. [...] Mas esse 
poder de ultrapassar-me pela leitura, devo-o ao fato de 
ser sujeito falante, gesticulação lingüística, assim como 
minha percepção só é possível por meu corpo. Essa man-
cha de luz que se marca em dois pontos diferentes sobre 
minhas duas retinas, vejo-a como uma única mancha à 
distância porque tenho um olhar e um corpo ativo, que 
tomam diante das mensagens exteriores a atitude conve-
niente para que o espetáculo se organize, se escalone e se 
equilibre. Do mesmo modo, passo direto ao livro através 
da algaravia, porque montei dentro de mim esse estranho 
aparelho de expressão que é capaz não apenas de inter-
pretar as palavras segundo as acepções aceitas e a técni-
ca do livro segundo os procedimentos já conhecidos, mas 
também de deixar-me transformar por ele e dotar-se por 
ele de novos órgãos. 
Você percebeu a importância que Merleau-Ponty concedeu 
ao corpo? Segundo ele, a leitura é corporal, posto que per-
passa pelo corpo do autor e do leitor; é uma disputa sobre a 
primazia no texto literário entre autor ou leitor; há um en-
trelaçamento entre a visão e a percepção. Medite um pouco 
sobre essas afirmações do filósofo. Compare com a Declaração 
dos direitos da criança leitora (e algumas disposições sobre as 
crianças e a literatura), disponível em: < www2.estacio.br/gra-
duação/pedagogia/literarte/ Literarte06/artigos.htm>. 
Passemos agora a um literato alemão: Wolfgang Iser (1926-
2007). Esse teórico da Estética da Recepção3 se volta para 
o estudo das atividades imaginativas e perceptivas do leitor 
frente ao texto literário e define o processo da leitura como:
Figura 4: Maurice Merleau-Ponty 
(1908-1961).
3 Iniciado na Universidade de Constan-
ça, sul da Alemanha, em 1967, o mo-
vimento literário conhecido como Es-
tética da Recepção se preocupou com 
a recepção da literatura e seus efeitos 
no leitor.
18 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
[...] interação dinâmica entre texto e leitor. Pois os signos 
lingüísticos do texto, suas estruturas, ganham sua fina-
lidade em razão de sua capacidade de estimular atos, no 
decorrer dos quais o texto se traduz para a consciência do 
leitor. [...] O autor e o leitor participam portanto de um 
jogo de fantasia; jogo que sequer se iniciaria se o texto 
pretendesse ser algo mais do que uma regra de jogo. É 
que a leitura só se torna um prazer no momento em que 
nossa produtividade entra em jogo, ou seja, quando os 
textos nos oferecem a possibilidade de exercer as nossas 
capacidades. (ISER, 1999, v.2, p. 11). 
Iser defende: a interação entre texto e leitor (cabe ao leitor, 
estimulado pelo texto, atualizá-lo pelos atos de sua consciên-
cia imaginante); o ponto de vista em movimento (o leitor apre-
ende o texto em fases consecutivas da leitura na medida em 
que se movimenta dentro dele); os correlatos de consciência 
produzidos pelo ponto de vista em movimento (o texto per-
mite que o leitor, por meio de suas memórias e expectativas, 
agrupe os signos textuais, identifique suas relações e produza 
um novo sentido; a leitura é um jogo (deve produzir prazer no 
momento em que o leitor converte o livro em objeto estético).
Você entendeu? Vamos dizer o mesmo em outras pala-
vras: o texto literário não é completo em si mesmo; é elabo-
rado pelo autor com vazios que permitem a intromissão do 
leitor; assim, além do registro da reação do autor ao mundo, 
necessita da experiência do leitor que, ao interpretá-lo, in-
fere novos sentidos ao lido; na medida em que o leitor se 
envolve com o texto, ele desenvolverá uma atitude estética.
Figura 5: Wolfgang Iser (1926-2007).
19Leitura
Ficou mais fácil? Que tal apresentar a leitura na biblioteca 
como um jogo? Concorda que as crianças e os jovens aprecia-
riam muito mais a leitura por prazer do que a leitura por dever?
Agora, examinemos o que pensa um professor brasileiro a 
respeito da leitura: Ezequiel Theodoro da Silva. Esse educador 
está bem vivo e atuante em prol do desenvolvimento da leitu-
ra no Brasil e, provavelmente, não gostaria que citássemos sua 
idade. Preocupado inicialmente com a leitura como a decodifi-
cação de símbolos e, depois, com a compreensão do texto, em 
seus últimos trabalhos defende a leitura como a interpretação 
do texto. Assim é que afirma: “A leitura é uma forma de en-
contro entre o homem e a realidade sócio-cultural” e ler é “um 
modo de existir no qual o indivíduo compreende e interpreta a 
expressão registrada pela escrita e passa a compreender-se no 
mundo.” (SILVA, 1981, p. 41, 45). 
Atento à realidade educacional brasileira, o Autor aponta a 
leitura como essencial para o ser humano situar-se no mun-
do, compreender o mundo e participar ativamente no mundo. 
Seu direcionamento a respeito da interpretação do texto escri-
to volta-se para a criticidade como fundamental no processo 
educativo e, então, prioriza a leitura de textos informativos, 
conquanto não despreze a leitura de textos ficcionais. 
E você? Considera o ato de ler um processo dinâmico? 
Concede espaço para que a criança e o adolescente executem 
a leitura como uma compreensão do mundo? Permite e incen-
tiva a crítica dos textos?
Na leitura, devemos levar em conta os fatores não-cogniti-
vos (emoções, atitudes, interesses, personalidades) que inter-
ferem na interpretação do escrito. Mas os fatores cognitivos 
são importantes também! Compreender um texto exige certas 
habilidades e competências que a escola desenvolve: 
a) o conhecimento lingüístico: pronúncia correta da lín-
gua vernácula, reconhecimento do vocabulário, uso das 
20 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
regras de sintaxe, processamento do texto (agrupamen-
to das letras em palavras, das palavras em frases, das 
frases em parágrafos, a fim de construir significados);
b) o conhecimento textual: a estrutura narrativa (o porquê 
e o tempo da história, as personagens, o cenário, a com-
plicação e a resolução da trama); a estrutura expositiva 
(ênfase nas idéias e não nas ações, causa e efeito dos 
acontecimentos relatados na história); a estrutura des-
critiva (relação de qualidades ou características de algo 
ou alguém).
Isso é o que ensina a professora titular da Universidade Es-
tadual de Campinas, Doutora em Lingüística Aplicada, Angela 
Kleiman, que atua nos seguintes temas: leitura, formação do 
professor de língua materna e letramento. Mas ela aponta ou-
tro fator:
A compreensão de um texto é um processo que se ca-
racteriza pela utilização de conhecimento prévio: o leitor 
utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento ad-
quirido ao longo de sua vida. É mediante a interação de 
diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento 
lingüístico, o textual, o conhecimento do mundo, que o 
leitor consegue construir o sentido do texto. E porque o 
leitor utiliza justamente diversos níveis de conhecimento 
que interagem entre si, a leitura é considerada um pro-
cesso interativo. (KLEIMAN, 1999, p. 13, grifo da autora).
Você notou que o conhecimento do mundo tem papel fun-
damental na compreensão do texto? Que as vivênciasauxi-
liam na elaboração dos significados? Entretanto, esse fato foi 
obliterado por algumas teorias da leitura, que criaram alguns 
modelos de leitura. É o que veremos a seguir.
1.2 Modalidades
21Leitura
Modelo pode ser entendido como o que serve para ser imi-
tado, e é imitado porque se mostrou bom ou útil. Modalidade, 
a seu turno, significa um aspecto ou uma maneira diferente 
das coisas. Ocorre, entretanto, que certas modalidades acabam 
virando modelos, ou seja, a visão de um indivíduo transforma-
se em visão de muitos, e a percepção individual é partilhada 
de modo entusiasta. Tem-se, então, um originador de idéias 
e os seguidores que propagam o pensamento de seu mestre. 
Quando um modelo perdura por muito tempo (resiste às argu-
mentações contrárias), diz-se que ele é clássico.
Determinados modelos clássicos de leitura partem da psi-
cologia organísmica, quer dizer, tem o ser humano como um 
organismo adaptável a diferentes ambientes. Outros, são me-
canicistas, baseados em uma visão positivista do homem.
Silva (1981) lista alguns:
a) com base na teoria dos fatores subjacentes da leitura: 
parte do pressuposto que o ato de ler exige o agrupa-
mento de células cerebrais, consideradas subsistemas;
b) fundamentado em considerações neurológicas: a leitura 
depende de transmissões sinápticas adequadas; 
c) como um rol de competências acionadas sincronica-
mente no momento da leitura: percepção da palavra, 
compreensão do lido, reação às idéias apresentadas, as-
similação do texto;
d) como um elenco de habilidades do intelecto humano: a 
leitura é o resultado do cruzamento entre as operações 
e os produtos do intelecto, que vão desde o conheci-
mento e informações até o pensamento crítico;
e) credita valor à velocidade da leitura: apresenta a agili-
dade como uma função da flexibilidade do leitor e da 
natureza do texto;
Sinapse
A sinapse é uma região de contato 
muito próximo entre a extremidade de 
um neurônio e a superfície de outras 
células. As membranas das células que 
fazem sinapses estão muito próximas, 
mas não se tocam. Há um pequeno es-
paço entre as membranas celulares (o 
espaço sináptico ou fenda sináptica). 
Nesses espaços são liberadas substân-
cias químicas, que funcionam como 
comunicadores, que vão desencadear o 
impulso nervoso.
22 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
f) tem a leitura como um processo seletivo da mente do 
autor: memória, pistas gráficas, imagem perceptual, es-
colhas semânticas, decodificação e sentido;
g) classifica os níveis cognitivos da compreensão, dispon-
do-os hierarquicamente: reconhecimento, memória, re-
organização, inferência, avaliação e apreciação;
h) enfoca a competência de leitura: verifica a habilidade 
global de leitura e a correlação entre leitura oral e si-
lenciosa.
Para Silva (1981), tais modelos de leitura são reducionistas 
e se preocupam apenas com a quantificação e o controle do 
ato de ler; separam sujeito e objeto como se a mente humana 
reagisse da mesma forma que o computador. Ele, entretan-
to, concebe a leitura como um fenômeno, e, assim, apresenta 
um modelo com ênfase na dimensão psicológica do ato de ler. 
Para tanto, esquematiza uma estrutura fenomenal, em que os 
elementos da comunicação deixam de ser apenas o emissor, a 
mensagem e o receptor, mas se configuram como uma supe-
restrutura em que contam uma multiplicidade de elementos 
significativos, organizados, dinâmicos, relacionais entre si e à 
existência humana.
Eis a estrutura fenomenal – a situação de comunicação da 
leitura, como a entende Silva (1981):
a) estrutura do sujeito (emissor): o ser humano é um ser-
no-mundo-com-os-outros, sua experiência é intersub-
jetiva, histórica e cultural;
b) estrutura da mensagem: a mensagem é a expressão de 
um sujeito, estruturada por um código lingüístico e 
porta significados;
23Leitura
c) estrutura do código: entendido como um campo de co-
municação, o código representa o mundo, é um sistema 
que permite a reconstrução;
d) estrutura do mundo: para a fenomenologia, o mundo é 
histórico e cultural, portanto, humano; destarte, o ato 
de ler é vivido por um sujeito que se imbrica no mundo, 
que realiza o diálogo existencial.
O modelo de leitura, na concepção de Silva (1981), não 
pode seguir padrões funcionalistas, experimentais ou natura-
listas; há que se basear em uma visão fenomenológica, o que 
implica ser direcionado a um determinado tipo de leitura: a 
crítica, geradora de significados. Segundo ele, é esse tipo de 
leitura, questionadora, que deve ser implementada na escola, 
visto que gera a expressão – a criação de um novo texto.
Vimos que Silva (1981) considera o ato de ler como parte 
integrante da vida humana; tal se dá porque o homem intera-
ge com o mundo por meio de significados sígnicos, em dife-
rentes tipos de linguagem (oral, escrita, musical, corporal, en-
tre outras). Além disso, advoga: o mundo cultural conta com 
o código escrito, o que leva o homem da condição de ouvinte 
à condição de leitor; a apreensão da leitura propicia a inserção 
nas sociedades letradas; a leitura é um objeto do discurso e, 
como tal, inesgotável na ação de atribuição de significados; a 
presença do ato de ler no projeto humano admite a intencio-
nalidade – o direcionamento para o objeto, com vistas seja à 
compreensão (do mundo, de si), seja à interpretação (descon-
textualizar um texto para recontextualizá-lo). 
Conclui seu pensamento com as palavras: o ato de ler 
“sempre envolve apreensão, apropriação e transformação de 
significados, a partir de um documento escrito” e “leitura sem 
compreensão e sem recriação do significado é pseudoleitura.” 
(SILVA, 1981, p. 96).
24 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Reflita um pouco sobre os modelos clássicos de leitura e 
sobre o modelo fenomenológico. Reparou como os modelos 
clássicos priorizam apenas os fatores cognitivos?
Segundo Pinto e Richter (2009), existem três modelos 
básicos de leitura, embasados por fatores cognitivos: o 
modelo descendente, defendido por Goodman; o modelo 
ascendente, defendido por Gough; e o modelo interativo, 
defendido por Rumelhart.
Examinemos cada um deles.
O primeiro modelo, descendente, implica o processamento 
de predições progressivas sobre pequenas unidades do texto, 
em contraste com o conhecimento prévio do leitor. Significa 
que o leitor vale-se de seu conhecimento prévio para interpre-
tar o texto e que, na verdade, é o leitor quem constrói o texto 
a partir de adivinhações e hipóteses que vai desenvolvendo ao 
longo da leitura.
O segundo modelo, ascendente, advoga que a leitura é 
linear: parte das letras para sons, palavras, sentenças e, no 
fim, para significado. Significa dizer que as letras devem ser 
consideradas individualmente pelo leitor que, dessa maneira, 
partindo das partes para o todo, terá condições de assinalar o 
significado de cada uma, depois, de pequenas unidades textu-
ais, e culminar com a compreensão de todo o texto. 
O terceiro modelo, interativo, salienta a importância de uti-
lizar de forma simultânea ou de forma alternada os modelos 
precedentes. Significa aceitar a idéia de um leitor maduro, há-
bil, que trafega com tranqüilidade pelo texto, ora partindo do 
geral para o particular, ora do particular para o geral. A com-
preensão, nesse caso, advém da percepção e da cognição do 
25Leitura
leitor ativadas pelo movimento da retina, e termina com sua 
idéia sobre a intenção do autor do texto. 
A pesquisa de Pinto e Richter (2009) oferece, como su-
gestão, a aplicação intercalada dos três modelos de leitura, 
levando em conta o conhecimento prévio, o conhecimento 
lingüístico, o vocabulário e os esquemas mentais do leitor, e, 
também, os aspectos formais do texto.
Mas o assunto não se esgotou. Vamos adiante!
Kato (1990, p. 40), em uma abordagem psicolingüística, es-clarece que o leitor que privilegia o processo descendente é 
aquele “que apreende facilmente as idéias gerais e principais 
do texto, é fluente e veloz”, mas, por outro, lado “faz excessos 
de adivinhações, sem procurar confirmá-las com os dados do 
texto, através de uma leitura ascendente.”
Pode-se dizer, então, que esse tipo de leitor vale-se exaus-
tivamente do conhecimento prévio, não se atendo muito na 
informação fornecida pelo texto.
Quanto ao leitor que utiliza o processo ascendente, que 
constrói o significado com “base nos dados do texto, fazendo 
pouca leitura nas entrelinhas, que prende detalhes detectando 
até erros de ortografia”, mas que, “ao contrário do primeiro 
tipo, não tira conclusões apressadas”, Kato (1990, p, 40-41) 
chama de leitor “vagaroso e pouco fluente”, com “dificuldade 
de sintetizar as idéias do texto por não saber distinguir o que 
é mais importante do que é meramente ilustrativo ou redun-
dante.”
Assim, Kato (1990, p. 41) põe em evidência um terceiro tipo 
de leitor, que nomeia de “maduro”, posto que “usa, de forma 
adequada e no momento apropriado, os dois processos com-
plementarmente”. 
Claro está que, nesse último caso, esse leitor já é proficien-
te e tem um histórico de leituras. Não se trata do leitor inicial, 
para quem as dificuldades de decodificação, entendimento do 
26 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
texto e atribuição de sentidos ao texto se apresentam como 
desafios.
De qualquer maneira, os modelos descendente, ascendente 
e interativo, conquanto apresentem pontos positivos, são alvo 
de crítica. Vejamos o porquê. 
Martins e Niza (2009) esclarecem que o modelo descen-
dente é criticado porque carece de explicações sobre: como 
são realizadas e testadas as predições do leitor, porque os tem-
pos de leitura são maiores nas predições do que no reconheci-
mento de palavras, o comportamento de leitores experientes, 
e a importância concedida à via visual no processo da leitura. 
Além disso, mostram que o modelo ascendente também apre-
senta problemas, pois, além da falta de flexibilidade (considera 
a linguagem escrita uma decodificação da linguagem oral, e 
a leitura, a transformação dos grafemas em fonemas), esque-
ce que o contexto influencia a leitura. Dessa feita, existiria 
apenas uma estratégia de leitura para atingir o significado 
do texto, o que implica dizer que são desprezadas as relações 
semânticas entre as palavras. Por outro lado, o modelo intera-
tivo, mesmo assumindo a intermediação entre os dois primei-
ros, não pode ser chamado de completo, haja vista que não 
explica as fases iniciais de aprendizagem da leitura.
Assim, as Autoras apresentam modelos de aprendizagem 
da leitura baseados em estágios, os quais tentam caracterizar 
as várias fases de aquisição da leitura na infância. O primeiro 
desses modelos divide a aprendizagem da leitura em quatro 
estágios: a) adivinhas lingüísticas (reconhecimento de pala-
vras partícipes do vocabulário visual, por meio da percepção 
visual e pela leitura de algumas palavras tendo como base o 
contexto extra-linguístico); b) rede de discriminação (tenta-
tiva de leitura de palavras cuja base principal é o contexto, 
seguida da primeira letra da palavra que funciona como ín-
dice gráfico); c) decodificação seqüencial (leitura de palavras 
Grafema
“É a unidade fundamental ou mínima 
de um sistema de escrita.” (WIKIPEDIA, 
2009).
Fonema
“É a unidade mínima no sistema de 
sons de uma língua.” (BLACKBURN, 
1997, p. 156).
27Leitura
por meio de decodificação e correspondência entre letras e 
sons, privilegiando as palavras irregulares com antecipações 
baseadas no contexto em que estas aparecem); d) decodifica-
ção hierárquica (a decodificação e a correspondência entre as 
letras e os sons levam em conta os valores posicionais das le-
tras). Surgiram outros modelos, na mesma linha dos estágios, 
mas tanto o primeiro quanto os últimos também são alvo da 
crítica, pois estudos recentes detectaram que a aquisição da 
leitura permite vários percursos, várias estratégias. Tais estra-
tégias, pela flexibilidade embutida e consentida, permitem que 
a criança chegue à compreensão do texto e que venha, então, 
ser um bom leitor. (MARTINS; NIZA, 2009).
Lembra o que Leffa (1996), falou a respeito da intenciona-
lidade de ler? Esqueceu? Então volte algumas páginas e veri-
fique a importância do desejo e da motivação no exercício da 
leitura. Por isso, ele afirma que os modelos ascendente e des-
cendente conduzem a definições restritas da leitura porque o 
primeiro se prende à extração pura e simples do significado do 
texto e o segundo, à atribuição de significado ao texto. Ambos 
valorizam ou o texto ou o leitor e esquecem que a intenção 
de ler se prende a determinados objetivos que somente serão 
atingidos se o leitor interagir com o texto. Em outras palavras: 
os fatores não-cognitivos se fazem presentes na leitura, pois a 
mesma é transcendental e intersubjetiva. 
Você percebeu a preocupação dos educadores com os mo-
delos de leitura? Temos certeza de que essa também é uma 
preocupação sua! No meio de tantos, qual escolher? Leia de 
novo esse subtópico, reflita sobre ele, converse com seus pa-
res, verifique qual modelo utilizam, se estão obtendo bons re-
sultados, que sugestões oferecem.
 Lembre-se de que você, como leitor adulto, já dispõe de 
uma bagagem de experiência e se encontra em situação de 
vantagem em relação à criança, cujas vivências são incipien-
28 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
tes, mas que interferem no processo de aprendizagem da lei-
tura. Por esse motivo, as teorias apresentadas o ajudarão a 
conduzir esse processo e a valer-se de estratégias de leitura 
que permitam à criança extrair os significados do texto, atri-
buir significados ao texto e interagir com o texto. É o que 
estudaremos a seguir.
1.3 Estratégias
Estratégia, em sentido estrito, refere-se à arte militar que 
trata das operações e movimentos de um exército para vencer 
o inimigo. Na rotina diária, usamos o termo como meio de 
aproveitar determinadas condições para atingir certos objeti-
vos. Ora, é certo que estamos empenhados em uma guerra: 
vencer o desânimo que afeta crianças e jovens quando se de-
frontam com a dificuldade da leitura. Mas é certo também que 
canalizamos nossos esforços no sentido de, dia-a-dia, paulati-
namente, pacientemente, esperançosamente, desbloquear es-
sas frustrações e inseri-los no rol de pessoas leitoras.
Não é apenas o educador que se vale de estratégias da lei-
tura. O leitor faz uso delas. Sempre. Qualquer leitor: desde a 
criança em fase de alfabetização, até o leitor proficiente.
Comecemos com o leitor aprendiz. 
Kato (1990), baseada em várias pesquisas, mostra que as 
crianças no início da aprendizagem da leitura valem-se de:
a) estratégias de inferência: operam com segmentos de 
palavras conhecidas, e, por dedução, concluem as ca-
deias de letras. Usam o raciocínio.
b) ilustração como texto: não diferenciam a função do 
texto e a função da ilustração. É a fase pictográfica.
29Leitura
c) valor icônico à escrita: acreditam que objetos grandes 
são representados por palavras grandes. É a etapa pré-
silábica.
d) análise e síntese: pelo crescimento do léxico visual e da 
familiaridade com os segmentos mais freqüentes da lín-
gua, fazem previsões mais significativas; a decodifica-
ção do estímulo visual não necessita da mediação foné-
tica ou fonológica. É a leitura sem vocalização.
Entretanto, lembra Kato (1990, p. 11-12):
Vimos até aqui que as pesquisas e teorias especulativas 
sobre a aquisição da escrita supõem etapas seqüenciais 
caracterizadas por diferentes concepções e por diferentes 
comportamentos. Mas há evidências também que apontam 
para a possibilidade de haver: a) regressões de comporta-
mentos e b) superposições de concepções. Assim, umalei-
tura mais linear e menos preditiva pode ocorrer mesmo em 
leitores altamente proficientes, quando o grau de novidade 
do texto ou sua complexidade estrutural diminuem sua le-
gibilidade e exigem, para sua compreensão, operações de 
análise-síntese a nível de unidades menores do que o leitor 
está acostumado a utilizar. Há momentos em que até a 
vocalização ou a subvocalização se faz necessária.
Ora, isso significa que não apenas a criança, mas também o 
adulto, ao se deparar com uma palavra nova, pode aproximar a 
escrita da fonética, mesmo tendo consciência de que esse não é 
o caso na língua pátria. Um outro fenômeno que pode ocorrer 
é a troca de uma letra por outra, baseada no uso da situação 
átona; é o caso, por exemplo, de escrever ou ler previlégio em 
vez de privilégio. Tal se dá porque o leitor não tem certeza da 
forma correta da palavra e generaliza a hipótese de que o som 
de i é equivalente à letra e. Assim, mesmo nós, adultos, educa-
30 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
dores, temos de nos policiar para não cairmos em regressões ou 
superposições de concepções.
Outro fator que merece análise é o mencionado por Fer-
reiro (1991, p. 64-65): “Estamos tão acostumados a conside-
rar a aprendizagem da leitura e escrita como um processo de 
aprendizagem escolar” que “se torna difícil reconhecermos que 
o desenvolvimento da leitura e da escrita começa muito antes 
da escolarização” e “os educadores são os que têm maior difi-
culdade em aceitar isso”, mas “felizmente, as crianças de todas 
as épocas e de todos os países ignoram esta restrição”, pois 
“nunca esperaram completar 6 anos e ter uma professora à 
sua frente para começarem a aprender. Desde que nascem são 
construtoras de conhecimento” e “no esforço de compreender o 
mundo que as rodeia, levantam problemas muito difíceis e abs-
tratos e tratam, por si próprias, de descobrir respostas para eles.”
Assim, as crianças se valem de estratégias de apren-
dizagem: as informações retiradas do seu cotidiano são 
interpretadas por meio de um esquema conceitual que 
constroem a fim de transformar tais informações em co-
nhecimento. Dessa maneira, as crianças, mesmo fora do 
controle sistemático da escola, podem aprender a leitura 
e a escrita. Tal se dá porque acoplamos o conhecimento 
subjetivo ao objetivo. É como se, desde a infância, cons-
truíssemos esquemas para representar o mundo percebido.
Leffa (1996, p. 35) explicita:
31Leitura
Na interação com o meio, o indivíduo vai percebendo que 
determinadas experiências apresentam características co-
muns com outras. Um almoço em casa com a família pode 
ser diferente de um almoço com um executivo impor-
tante, mas há entre um e outro uma série de elementos 
comuns que tipicamente caracterizam o acontecimento 
como almoço: a hora, o uso de talheres, a ingestão de 
alimentos, etc.
Os esquemas são estruturas abstratas, permeadas de variá-
veis que caracterizam determinados acontecimentos aos quais 
inferimos valor. Dessa feita, não são estáticos, mas dinâmicos, 
mutáveis, admitindo subesquemas que se entrelaçam, como 
uma rede. Isso significa dizer que, de acordo com a experiência 
do indivíduo, certos fatos ou certas ações se configuram ora 
como figura, ora como fundo, ou seja, têm maior ou menor 
importância em sua vida. Levando para o campo da leitura, 
podemos dizer que a compreensão de um texto depende das 
variáveis contidas em um texto e de como realizamos a ligação 
entre elas. Se as variáveis forem ambíguas para o leitor, ele fica-
rá desorientado e acionará os esquemas para por em ordem seu 
pensamento. Como faz isso? Buscando informações adicionais:
a) no título;
b) na sequência das frases;
c) no contexto do assunto;
d) nas suas inferências.
32 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
O leitor maduro aciona com mais facilidade os esquemas, 
trafega com desenvoltura entre um e outro, realiza inferên-
cias com base em suas lembranças e expectativas. O leitor 
inciante, por outro lado, apresenta algumas dificuldades, 
seja em virtude de pouco conhecimento prévio, seja pela 
impossibilidade de elaborar hipóteses. Falta, a esse último, 
a capacidade de avaliar a relevância, pertinência ou o sen-
tido dos dados apresentados. Assim, nem sempre consegue 
transformar os dados do texto em informações significati-
vas. Por conseguinte, não extrai significado do texto, não 
atribui significado ao texto, não interage com o texto.
A criança, se não tiver o necessário conhecimento lingüís-
tico, textual e do mundo, enfrentará sérias dificuldades em 
se tornar leitora assídua, pois a construção dos esquemas se 
apresentará como uma tarefa penosa. Quando a família não 
incentiva o diálogo, a troca de experiências (sensíveis, leito-
ras), a criança pode se atemorizar ante um texto complexo, 
não se atrevendo mesmo a formular suposições de sentido, 
pois há o risco de ser ridicularizada. Por outro lado, a criança 
que recebe estímulos no lar, sente-se mais segura para organi-
zar os esquemas de compreensão de um texto, não se intimi-
dando ante os possíveis erros de interpretação.
O que pode a escola fazer para ajudar a criança com dificul-
dade em utilizar estratégias de leitura? O educador deve lem-
brar-se de que obstáculos menores são mais facilmente venci-
dos e que cada obstáculo superado gera confiança em superar 
outros que se apresentarem. Assim, propiciar textos com níveis 
gradativos de complicações, que façam parte das vivências da 
33Leitura
criança, que ativem o intelecto 
e instiguem o imaginário é um 
bom começo. Para isso, nada 
melhor do que a leitura literária, 
ou seja, urge destacar a função 
poética da leitura.
1.4 Função poética
Função é uma ação pecu-
liar, uma missão. O poético está 
sempre associado ao belo, ao 
deleite, à fruição, à expressão 
conceitual-sensorial-afetiva. As-
sim, a função poética da leitura 
é aquela atividade especial cuja 
finalidade é deleitar; consiste na 
imbricação das idéias contidas 
no texto com a sensibilidade e experiências emotivas do leitor. 
Isso implica dizer: a leitura poética é aquela que permite ao 
texto literário exprimir o universal de cada um. Tal se dá por-
que a função poética da leitura é voltada para textos ficcio-
nais, e a ficção permite a plurissignificação, a inferência de-
corrente de lembranças e expectativas, o ajuste dos esquemas 
que organizamos para entender o lido, as múltiplas estratégias 
de compreensão e interpretação da escrita. 
Podemos ainda dizer que a leitura poética é benfazeja, pois 
nela contam nossas vivências psíquicas, intelectuais, corporais 
e lúdicas, indissociáveis no ser humano, que é uno. Um exem-
plo disso é a passagem em que Proust (1982, p. 30) recorda 
a maneira carinhosa de sua mãe ler em voz alta e modulada, 
junto ao seu leito quando menino:
Figura 6: O diálogo e a troca de experiências ajudam as crianças a interpretar 
os textos que leem.
34 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
[...] dava toda ternura natural, toda a ampla doçura que 
exigiam, àquelas frases que pareciam escritas para a sua 
voz e que, por assim dizer, cabiam inteiras no registro de 
sua sensibilidade. Para atacá-las no devido tom, sabia en-
contrar o acento cordial que lhes preexiste e que as ditou, 
mas que as palavras não indicam: graças a ele, amortecia 
de passagem toda rudeza nos tempos dos verbos, dava 
ao imperfeito e ao pretérito perfeito a doçura que há na 
bondade, a melancolia que há na ternura, encaminhava 
a frase que ia findando para aquela que ia começar, ora 
acelerando, ora retardando a marcha das sílabas para fa-
zê-las entrar, embora diferissem de quantidade, num rit-
mo uniforme e insuflava àquela prosa tão comum uma 
espécie de vida sentimental e contínua.
Você, provavelmente, já leu em voz alta para alguma crian-
ça. Preocupou-se em demonstrar ternura, doçura, sensibilida-de, cordialidade, bondade? Fez, da prosa comum, um relato 
gostoso, ritmado, partilhado? Passou a mão pelos cabelos da 
criança, tocou de leve seu rosto, sorriu para ela enquanto a 
leitura a fazia viajar pelos caminhos do imaginário? 
Lembre-se: o afeto e o toque são componentes impres-
cindíveis na leitura poética solidária. O prazer de ler e o pra-
zer de ouvir perpassam pela corporeidade da leitura, pela 
aceitação do outro no nosso campo de presença, pelo des-
centramento.
Mas a leitura poética permite, ainda, o envolvimento do lei-
tor com as personagens literárias. Mesmo que a criança prefira 
ler sozinha, o texto literário, sendo obra de arte, permite inci-
tações, instiga a imaginação e possibilita a identificação com 
as personagens ficcionais. O efeito estético que a experiência 
35Leitura
da leitura produz é tal que, ao terminar o livro, o leitor sente-
se apaziguado, revigorado, confortado. A presença marcante 
da personagem ficcional – o corpo do outro – garante que des-
frutamos de companhia, que, por alguns momentos que sejam, 
saímos do centro e permitimos a invasão do outro em nossos 
pensamentos, dividimos com ele nossas angústias e anseios 
secretos. É essa intercorporeidade e esse descentramento que 
permitem que a leitura, mesmo a solitária, seja terapêutica.
Claro está que, para que isso aconteça, o ato da leitura 
deve ser um exercício de liberdade. Liberdade para ler o que 
quiser, como quiser e quando quiser. Você lembra dos dez di-
reitos imprescritíveis do leitor apontados por Pennac (1998)? 
Eles foram apresentados a você na disciplina Novos rumos da 
biblioteca escolar.
Vamos recordá-los? Vá até a próxima página.
Você acrescentaria mais algum direito à criança leitora? 
Qual? Não sabe? Não se apresse. Reflita um pouco. Conse-
guiu? Ótimo!
Volte, agora, algumas páginas e releia a definição de Sartre 
sobre a leitura. O tema da liberdade é o núcleo central do pen-
samento sartriano. De fato, para o filósofo, o sentido da obra 
não está contido nas palavras de um livro, pois o leitor tem a 
liberdade de inferir a significação que quiser; por outro lado, o 
autor tem a liberdade de apresentar no texto o que lhe apraz, 
apostando no envolvimento do leitor e sabendo da possibili-
dade de o mesmo contestar o escrito.
36 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Os dez direitos imprescritíveis do leitor O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível)
O termo bovarismo vem da personagem Madame Bovary, de Gustave Flaubert: jovem provin-
ciana que, por meio das leituras, tinha acesso à vida glamurosa e intensa da corte. Sonhava 
acordada. Não é bom sonhar? Fugir do cotidiano? Identificar-se com o herói ou o vilão da 
história? Por instantes, ser o outro?
O direito de ler uma frase aqui e outra ali
Não é gostoso folhear um livro, e, ao acaso, parar em uma de suas páginas, ler uma frase, um 
parágrafo? É como se fôssemos a uma loja e, displicentemente, passeássemos entre as 
prateleiras repletas de novidades e apanhássemos nas mãos um objeto aqui, outro ali, anteci-
pando o prazer da compra. Pois é. Com os livros acontece o mesmo. Em uma livraria, fazemos 
muito isso: folheamos, lemos alguns trechos, até decidir pela compra desse ou daquele título. 
Permita à criança essa exploração saborosa na biblioteca de sua escola!
O direito de calar
Nem sempre estamos dispostos a compartilhar nossos pensamentos, a externar o que 
achamos desse livro ou desse autor. Às vezes ler é um momento de intimidade, um instante 
que o leitor deseja compartilhar com o autor e mais ninguém.
O direito de ler em qualquer lugar
Onde está escrito que a leitura deva ser somente em sala de aula? Ou na biblioteca? Ou no 
quarto? Por que não pode ser no jardim de casa? Ou na sacada do apartamento? Ou no 
banheiro?
O direito de ler em voz alta
O prazer de ouvir o som da própria voz, de verbalizar o escrito, de externar o encanta-
mento – sua biblioteca propicia isso? Você transforma a Hora do Conto em um exercício 
lúdico, um espaço de expressão?
O direito de reler
O direito de não ler
Como nós, às vezes a criança não está com vontade de ler. Forçá-la a isso seria transformar 
a leitura em um ato penoso e desagradável.
O direito de não terminar um livro
Nem sempre é preguiça ou falta de tempo. Simplesmente pode ser: o livro não agradou. Por 
que, então, continuar a leitura?
O direito de ler qualquer coisa
O que seria do vermelho se todos gostassem do amarelo? Pois é, com a leitura isso também é 
verdade: o livro que acho ótimo, outros podem não gostar. Se considero um texto como não 
literário, classificando-o como literatura de massa, não é razão para impedir sua leitura. Às 
vezes, os gibis despertam o prazer de ler. Com o tempo, a criança procurará textos mais 
densos.
O direito de pular páginas
Quem, durante sua vida leitora, não pulou as páginas de uma narrativa longa demais? 
Permitir que a criança “elimine” trechos cansativos da leitura facilita seu entendimento 
acerca da leitura por prazer e da leitura por dever. Qual tipo de leitura você acha que ela 
prefere?
Agora, a situação se inverte. O livro despertou tamanho interesse que a criança deseja lê-lo 
mais e mais vezes. Quase sabe a história de cor. Mesmo assim, sente prazer na repetição. Cabe 
lembrar: cada leitura é ímpar e permite novas descobertas, novos encantamentos.
37Leitura
Os dez direitos imprescritíveis do leitor O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível)
O termo bovarismo vem da personagem Madame Bovary, de Gustave Flaubert: jovem provin-
ciana que, por meio das leituras, tinha acesso à vida glamurosa e intensa da corte. Sonhava 
acordada. Não é bom sonhar? Fugir do cotidiano? Identificar-se com o herói ou o vilão da 
história? Por instantes, ser o outro?
O direito de ler uma frase aqui e outra ali
Não é gostoso folhear um livro, e, ao acaso, parar em uma de suas páginas, ler uma frase, um 
parágrafo? É como se fôssemos a uma loja e, displicentemente, passeássemos entre as 
prateleiras repletas de novidades e apanhássemos nas mãos um objeto aqui, outro ali, anteci-
pando o prazer da compra. Pois é. Com os livros acontece o mesmo. Em uma livraria, fazemos 
muito isso: folheamos, lemos alguns trechos, até decidir pela compra desse ou daquele título. 
Permita à criança essa exploração saborosa na biblioteca de sua escola!
O direito de calar
Nem sempre estamos dispostos a compartilhar nossos pensamentos, a externar o que 
achamos desse livro ou desse autor. Às vezes ler é um momento de intimidade, um instante 
que o leitor deseja compartilhar com o autor e mais ninguém.
O direito de ler em qualquer lugar
Onde está escrito que a leitura deva ser somente em sala de aula? Ou na biblioteca? Ou no 
quarto? Por que não pode ser no jardim de casa? Ou na sacada do apartamento? Ou no 
banheiro?
O direito de ler em voz alta
O prazer de ouvir o som da própria voz, de verbalizar o escrito, de externar o encanta-
mento – sua biblioteca propicia isso? Você transforma a Hora do Conto em um exercício 
lúdico, um espaço de expressão?
O direito de reler
O direito de não ler
Como nós, às vezes a criança não está com vontade de ler. Forçá-la a isso seria transformar 
a leitura em um ato penoso e desagradável.
O direito de não terminar um livro
Nem sempre é preguiça ou falta de tempo. Simplesmente pode ser: o livro não agradou. Por 
que, então, continuar a leitura?
O direito de ler qualquer coisa
O que seria do vermelho se todos gostassem do amarelo? Pois é, com a leitura isso também é 
verdade: o livro que acho ótimo, outros podem não gostar. Se considero um texto como não 
literário, classificando-o como literatura de massa, não é razão para impedir sua leitura. Às 
vezes, os gibis despertam o prazer de ler. Com o tempo, a criança procurará textos mais 
densos.
O direito de pular páginas
Quem, durantesua vida leitora, não pulou as páginas de uma narrativa longa demais? 
Permitir que a criança “elimine” trechos cansativos da leitura facilita seu entendimento 
acerca da leitura por prazer e da leitura por dever. Qual tipo de leitura você acha que ela 
prefere?
Agora, a situação se inverte. O livro despertou tamanho interesse que a criança deseja lê-lo 
mais e mais vezes. Quase sabe a história de cor. Mesmo assim, sente prazer na repetição. Cabe 
lembrar: cada leitura é ímpar e permite novas descobertas, novos encantamentos.
38 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
A leitura poética, portanto, é um contrato de liberdade 
entre autor e leitor. Como tal, não deve imposta nem co-
brada. A leitura poética é aquele momento especial em que 
o corpo do texto se entrelaça com o corpo do leitor, a fala 
do autor se mescla à fala do leitor; dá-se quando o primeiro 
instiga esse último a transformar as significações conhe-
cidas em novas significações. Em outras palavras: o objeto 
estético, a experiência da leitura, enseja a dimensão criativa 
do leitor, pois existe o que chamamos de sobre-significação 
da expressão literária.
Na leitura poética é como se acendesse uma faísca. Vejo e, 
de repente, percebo. Como bem disse Merleau-Ponty (2002, p. 
33): 
ponho-me a ler preguiçosamente, contribuo apenas com 
algum pensamento – e, de repente algumas palavras me 
despertam, o fogo pega, meus pensamentos flamejam, 
não há mais nada no livro que me deixe indiferente.
O momento em que o fogo pega é o do descentramen-
to: o autor sai do centro e permite a intromissão do leitor; 
é a relação de cumplicidade entre ambos. Isso significa que 
a fala literária do escritor teve força suficiente para mover a 
capacidade criadora do leitor. Dessa feita, a leitura poética é 
uma retomada: a universalidade estética permite que cada um 
retome a operação expressiva à sua maneira. Por esse motivo, 
é transcendente.
Isso nos remete aos vazios iserianos do texto literário. Se-
gundo Iser (1996-1999), os espaços vazios dos textos literários 
permitem uma comunicação entre texto e leitor. Assim, o não-
dito no texto (o que o autor ocultou) estimula o leitor, mas tal 
39Leitura
se dá porque o dito (o que o autor mostrou) permite essa esti-
mulação. Ou seja, a potência encantatória da literatura instiga 
o leitor e, assim, a leitura poética é um processo interativo. 
Mas é também uma atividade sintética, pois exige do leitor ir 
além dos dados textuais, reconfigurando-os de maneira que se 
forme um novo texto. E isso o leitor faz com prazer, como se 
participasse de um jogo. 
Tal prazer, de acordo com a concepção iseriana (e também 
barthesiana), não é um elemento do texto, é criado pelo lei-
tor no momento em que o mesmo se envolve com a escrita 
literária. Cabe mencionar que a fruição da literatura tem sido 
objeto de discórdia entre os teóricos. 
Segundo Barthes (1999, p. 9, grifo do autor): 
Se leio com prazer esta frase, esta história, ou esta pala-
vra, é porque foram escritas no prazer (este prazer não 
está em contradição com as queixas do escritor). Mas e o 
contrário? Escrever no prazer me assegura – a mim, escri-
tor – o prazer de meu leitor? De modo algum. Esse leitor, 
é mister que eu o procure (que eu o “drague”), sem saber 
onde ele está. Um espaço de fruição fica então criado. 
Não é a “pessoa” do outro que me é necessária, é o es-
paço: a possibilidade de uma dialética do desejo, de uma 
imprevisão do desfrute: que os dados não estejam lança-
dos, que haja um jogo. 
O espaço poético, então, permite a fruição da linguagem, 
a leitura desbravadora, a ruptura de mensagens enclausuradas 
no pensamento do escritor, a fenda no texto. Podemos mesmo 
dizer que o espaço poético é a fenda do texto, o corte que o 
leitor faz pelo viés de sua subjetividade.
Essa apropriação “irresponsável” do texto pelo leitor – o 
prazer do texto – é condenada por alguns críticos. Fontes 
(2009, p. 149) lembra a fala de Pierre Bourgeade no Colóquio 
sobre a situação da literatura, em 1976:
Figura 7: Roland Barthes (1915-1980).
40 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
A noção de prazer está na moda; o prazer e o desejo [...]. 
Creio que seria perigoso, para nós, aceitar a noção de pra-
zer, que, segundo penso, já é falsa para o escritor, e ainda 
mais para o leitor: porque essa noção de prazer, no fundo, 
é a noção sobre a qual se baseia a crítica subjetivista, a 
crítica mais reacionária; é a noção que justifica tudo.
A citação mostra o impacto causado pelo livro de Barthes 
(cuja primeira edição, em francês, data de 1973). De fato, o 
debate a respeito do prazer do texto, na época, tinha a ver 
com questões políticas e ideológicas: era o embate entre a di-
reita burguesa, subjetivista (que defendia os valores de prazer 
e beleza do texto), e a esquerda, marxista, intelectualista, (que 
combatia o deleite textual, pois achava que o mesmo poderia 
ser veículo de pensamentos perigosos). 
Entretanto, o texto barthesiano advogava que acreditar no 
prazer do texto como sendo uma idéia da direita é uma “mito-
logia”, é “o velho mito reacionário do coração contra a cabeça, 
da sensação contra o raciocínio” e, dos dois lados, persiste “a 
idéia bizarra de que o prazer é coisa simples, e é por isso que 
o reivindicam ou o desprezam”, mas o prazer “não depende de 
uma lógica do entendimento e da sensação”, de fato, “é uma 
deriva, qualquer coisa que é ao mesmo tempo revolucionária e 
associal e que não pode ser fixada por nenhuma coletividade, 
nenhuma mentalidade, nenhum ideoleto.” (BARTHES, 1999, p. 
32, 33, grifo do autor).
E Fontes (2009, p. 153, grifo do autor) afirma que:
esse equívoco reapareceu, nos últimos tempos, em con-
textos pedagógicos. [...] Há uma diferença, entretanto, e 
significativa: na escola, quem reivindica o direito ao pra-
zer do texto são as correntes mais progressistas e mais – 
para usar o estereótipo – à esquerda. Justamente aquelas 
que procuram inovar e transformar a rotina dos velhos 
métodos de leitura. 
41Leitura
 Assim, há que se deixar de lado a política e a ideologia e se 
concentrar no essencial: despertar o prazer de ler, apresentar 
o ato de ler como um gozo. Tenha em mente que a função 
poética da leitura permite que autor e leitor usufruam do fe-
nômeno estético, compartilhem da fantasia, brinquem com o 
texto. Mas essa função alcança outro patamar. É o que des-
tacam Yunes e Pondé (1988, p. 41): a “leitura, para a criança, 
bem mais do que um meio de evasão ou de socialização, é um 
modo de representação do real” e, “desse modo, o texto ajuda-
a a reelaborar o real, sob a forma do jogo e da ficção.” 
Assim, a leitura poética permite não apenas sonhar (eva-
são) e compartilhar idéias (socialização), mas também uma 
transposição dos elementos da realidade para o universo 
ficcional (representação do real), uma composição, um fin-
gimento, uma invenção da realidade (reelaboração do real 
sob a forma do jogo e da ficção).
Isso não é pouco! Muito mais do que decifrar o código es-
crito, entender a “mensagem” do livro (fundir-se com o autor) 
ou dele se dissociar (pelo processo de interpretação), a leitura 
poética é uma recriação. Implica atividade imaginante, ebuli-
ção das emoções e sensações, identificação com as persona-
gens ficcionais, reflexão sobre o real. Como uma brincadeira 
estimulante, produz a catarse4: a harmonia dos humores cor-
porais, das emoções e paixões, do prazer proporcionado pela 
expressão artística. De fato, a leitura poética tem esse mister: 
provoca, instiga, perturba. Mas, em seguida, produz o balan-
ço necessário ao bem-estar, transformando a perturbação em 
alegria serena. É lúdica.
4 O conceito de catarse, bem como sua 
relação com a leitura, serão aprofun-
dados na seção 2.2.3 Função terapêu-
tica, deste livro.
42 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
Mesmo sendoum jogo, não prescinde de um texto coeren-
te, de tessitura leve, porém não apenas ornamental. O discurso 
literário, conquanto privilegie a apreensão criativa do texto, 
não dispensa o uso correto da gramática, da sintaxe, do voca-
bulário, enfim. É que o mostra Vásquez Rodriguez (2000), na 
Declaração dos direitos da criança leitora:
Artigo 4: Nós crianças não somos estúpidos. E discorda-
mos daqueles que nos tratam como incapazes. Daí exi-
girmos da parte dos adultos uma linguagem normal sem 
diminutivos ridículos e sem frases de efeito.
Artigo 9: Nós crianças, exigimos nos livros preferencial-
mente feitos para nós, imagens menos óbvias e menos 
bobas. Não queremos em nossos livros ilustrações supér-
fluas. Parágrafo: é mentira que dos livros só as imagens 
nos interessam.
Artigo 13: A nós crianças encanta-nos a ação e o movi-
mento. Gostamos do que salta e pula, e do que sonha e 
brilha. [...] um livro que nos atrai é aquele que pode fazer 
parte de nossas brincadeiras. Parágrafo: Somos fantásti-
cos, mas por excesso de realismo.
Artigo 20: Nós crianças gostamos de encontrar nos livros 
que lemos palavras raras, desconhecidas, sonoras, miste-
riosas. Por isso mesmo são ofensas para nós os “glossá-
rios” e “vocabulários” postos ao final ou abaixo dos tex-
tos. Declaramos que nós crianças não somos retardados 
ou incapazes de entender a língua. Os “Dicionários para 
crianças” não têm valor para nós.
Assim, um livro permeado de eufemismos, com finais pre-
visíveis, e recheado de ilustrações desnecessárias, não cativa a 
criança. Ela exige um texto com o mesmo cuidado estilístico e 
gramatical que é ofertado ao adulto. Ora, isso implica dizer: a 
43Leitura
leitura poética mostra a capacidade que o texto tem de sedu-
zir e encantar. Em outras palavras: tem força suficiente para 
envolver o leitor com a literatura, sem a intervenção de outros 
recursos lúdicos como a narração, a dramatização, o desenho 
após a história, brincadeiras, representações plásticas e musicais 
a partir do conteúdo do livro – o que Perrotti (2009, p. 135) 
chama de “tecnologia da leitura” e “nova pedagogia da leitura.”
Isso não significa condenar sumariamente o uso de tais 
atividades posteriores à leitura literária. O que se condena é 
seu uso constante, como se fosse obrigatório valer-se sempre 
delas para que a leitura seja prazerosa, como se o projeto de 
recepção do texto literário infantil e juvenil estivesse vincula-
do a folguedos exteriores à escritura. Ora, isso seria diminuir o 
potencial fruidor do texto em si, da leitura em si.
Para concluir: a elaboração de um esquema conceitual, o 
conhecimento prévio e as estratégias de leitura, presentes na 
leitura poética, concedem a essa o mesmo status que a leitura 
informativa, didática ou curricular. Por esse motivo, deve ser 
incentivada nas escolas e na biblioteca. Está fazendo isso?
Bibliografia Comentada
AGUIAR, Vera Teixeira de; MARTHA Alice Áurea Penteado 
(Org.). Territórios da leitura: da literatura aos leitores. São Paulo: 
Cultura Acadêmica; Assis: ANEP, 2006.
O livro é uma coletânea de pesquisas apresentadas no Sim-
pósio Travessias: o leitor, a leitura e a literatura, que inte-
grou o IX Congresso Internacional da Associação Brasileira 
de Literatura Comparada (ABRALIC), no ano de 2004, em 
Porto Alegre. Apresenta reflexões sobre: a literatura como 
manifestação cultural, a melhor maneira de avaliar uma 
44 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
obra literária, o fazer poético, o feminino na narrativa, a le-
gitimação do livro infantil, a percepção do contexto da obra 
literária, o papel do leitor no processo da leitura, a leitura 
da literatura na escola, a presença do escritor nas aulas de 
literatura, as livrarias e escolas como espaços de mediação 
da leitura, a importância da leitura de textos poéticos, os 
caminhos da leitura literária no Brasil, e o caráter dinâmico 
da biblioteca na escola.
TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 
2009.
Acusa a falta de leitura de romances, contos e poemas en-
tre os alunos dos cursos de Graduação em Letras das uni-
versidades, futuros professores de Português. Isso, como 
conseqüência, afeta os alunos dos ensinos fundamental e 
médio, que carecem do contato maior com o texto literário, 
desconhecendo, assim, seu poder de conexão com o mundo 
real. Apresenta a obra literária como necessária ao proces-
so educacional, como veículo de formação cultural do in-
divíduo, como potência encantatória e como um caminho 
à reflexão. 
Síntese
A leitura é um processo intencional, com objetivo e moti-
vação; é um desafio, um prazer pessoal (mas ainda um pro-
blema social). É também considerada ato linguistico, psico-
lógico, cognitivo, neurológico, fenomenológico, pedagógico, 
terapêutico, corporal, descentrado. A função poética da lei-
tura admite a liberdade de inferências, o diálogo com o texto, 
a fruição literária, a reflexão; desperta o pensamento criador; 
permite a brincadeira com as palavras e as imagens; é trans-
cendente.
46 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
2 Literatura infanto-juvenil
Esse capítulo tem por objetivo apresentar informações 
e reflexões em torno da literatura infanto-juvenil. As-
sim, o aluno do Curso de Especialização em Gestão de 
Bibliotecas escolares perceberá a necessidade de apri-
morar suas leituras desse gênero literário para melhor 
atender os usuários.
47Literatura infanto-juvenil
A literatura, como produto cultural, permite vários enten-
dimentos. Observa-se que a sociedade, ao fazer um julgamen-
to de valor sobre textos literários e não-literários, legitima as 
normas e os valores segundo seu quadro de referências, sen-
do, portanto, histórica e, assim, parcial. E, como os valores 
e os modelos são mutáveis, o texto pode, em um contexto e 
momento diferentes, ser considerado ou não literário. Assim 
é que os estudiosos dessa área do conhecimento manifestam 
cautela em expressar seus pontos de vista ao conceituar a arte 
literária, ajuizando algumas hipóteses, tímidas assertivas e 
muitos exemplos. 
Wellek e Warren ([197-], p. 21, 22, 23,) afirmam não haver 
muita clareza no distinguir Literatura do que não é Literatura, 
mas por definição primeira, Literatura poderia ser “tudo o que 
se encontra em letra de forma” ou tudo o que se encontra 
“nos grandes livros”, porém uma e outra mostram-se inefi-
cazes; o próprio termo Literatura é insuficiente, limitado “à 
literatura escrita ou impressa”, excluindo a oral. Para os Auto-
res, a linguagem literária é conotativa, expressiva e persuasi-
va. Contudo, concordam que a linguagem cotidiana possui as 
mesmas características. A diferença repousa na quantidade do 
uso dos recursos de linguagem que, na Literatura, são explo-
rados de forma deliberada e sistemática; uma distinção mais 
nítida dá-se ao considerar como texto literário as obras nas 
quais predomina a função estética. 
Um outro teórico, Todorov (1980, p. 11, 16), confessa a di-
ficuldade de “decidir entre o que é literatura e o que não o é”, 
ao afirmar não existir de fato um abismo entre a obra literária 
e produções não literárias, visto que essa fronteira levantada 
entre elas é uma convenção da sociedade; concebe o texto li-
terário, entretanto, como “linguagem sistemática que chama a 
atenção sobre si própria.” Segundo ele, o texto literário é, aci-
48 Leitura e Literatura 
Infanto-Juvenil
ma de tudo, ficção, e os gêneros literários são possibilidades 
do discurso humano.
A mesma problemática da natureza da Literatura é aborda-
da por Culler (1999, p. 27, 35-40), ao argumentar que tanto as 
narrativas literárias quanto as narrativas da História utilizam o 
narrar, tanto os relatos psicanalíticos quanto as obras filosófi-
cas adotam a metáfora, o quer torna difícil “a distinção entre 
o literário e o não-literário; contudo apresenta

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