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descontinuidade de f, pois na˜o existe lim x→af(x), seja qual for a ∈ X. 7. Definamos g : R → R pondo g(x) = 0 se x e´ irracional, g(0) = 1 e g ( p q ) = 1 q quando p/q e´ uma frac¸a˜o irredut´ıvel na˜o-nula, com q > 0. Se escrevermos g1 = g|Q e g2 = g|(R−Q), teremos, para todo a ∈ R, lim x→ag1(x) = 0 (veja o §2 do Cap´ıtulo VI) e lim x→ag2(x) = 0, porque g2 ≡ 0. Segue-se imediatamente que, para todo nu´mero real a, tem-se lim x→ag(x) = 0. Conclu´ımos, assim, que g e´ cont´ınua nos nu´meros irracionais e descont´ınua nos racionais. (Seria imposs´ıvel obter uma func¸a˜o f : R → R cujos pontos de descontinuidade fossem exatamente os nu´meros irracionais. Veja o Exerc´ıcio 18 deste cap´ıtulo.) 8. Seja h : R→ R definida por h(x) = x+ x |x| se x 6= 0, h(0) = 0. Enta˜o o u´nico ponto de descontinuidade de h e´ o ponto 0. 9. Seja K ⊂ [0, 1] o conjunto de Cantor. Definamos uma func¸a˜o ϕ : [0, 1] → R do seguinte modo: pomos ϕ(x) = 0 para todo x ∈ K. Se x /∈ K, pomos ϕ(x) = 1. O conjunto dos pontos de descontinuidade de ϕ e´ K. Com efeito, sendo A = [0, 1] − K um aberto no qual ϕ e´ constante (e, portanto, cont´ınua), segue-se que ϕ : [0, 1] → R e´ cont´ınua em cada ponto a ∈ A. Por outro lado, como K na˜o possui pontos interiores, para cada k ∈ K podemos obter uma sequ¨eˆncia de pontos xn ∈ A com lim xn = k. Enta˜o limϕ(xn) = 1 6= 0 = ϕ(k). Logo ϕ e´ descont´ınua em todos os pontos k ∈ K. Dizemos que f : X → R possui uma descontinuidade de pri- meira espe´cie no ponto a ∈ X quando f e´ descont´ınua no ponto a e, ale´m disso, existem os limites laterais lim x→a+ f(x) e limx→a− f(x). (Caso a seja ponto de acumulac¸a˜o de X somente de um lado, exigimos apenas que o limite lateral correspondente exista.) Uma descontinuidade a ∈ X da func¸a˜o f : X→ R e´ chamada de segunda espe´cie quando a ∈ X ′+ e lim x→a+ f(x) na˜o existe ou [SEC. 2: DESCONTINUIDADES 231 enta˜o quando a ∈ X ′− mas na˜o existe o limite a` esquerda de f no ponto a. Exemplos. 10. Nos Exemplos 7 e 8 acima, temos descontinuidades de pri- meira espe´cie. No Exemplo 7, em cada ponto de descontinuidade a, existem os limites laterais, que sa˜o iguais pore´m diferentes do valor f(a). No Exemplo 8, o limite a` esquerda e´ −1 e o limite a` direita e´ +1 no u´nico ponto de descontinuidade. Nos Exemplos 6 e 9, os pontos de descontinuidade sa˜o todos de segunda espe´cie. 11. Um exemplo conhecido de descontinuidade de segunda espe´cie e´ o da func¸a˜o f : R→ R, definida por f(x) = sen(1 x ) para x 6= 0. Seja qual for o valor atribu´ıdo a f(0), o ponto 0 sera´ uma des- continuidade de segunda espe´cie para f, pois na˜o existe lim x→0+ f(x) nem lim x→0− f(x). 12. Ja´ f(x) = 1 1+ e1/x (x 6= 0), f(0) = 0, define uma func¸a˜o f : R → R cuja u´nica descontinuidade e´ o ponto 0. Aı´ o limite a` direita e´ zero, enquanto o limite a` esquerda e´ 1. Trata-se, portanto, de uma descontinuidade de primeira espe´cie. 13. Se tomarmos g(x) = sen ( 1 x ) 1+ e1/x para x 6= 0 e g(0) = 0, teremos uma func¸a˜o g : R→ R com uma u´nica descontinuidade no ponto 0. Aı´ temos lim x→0+ g(x) = 0, enquanto limx→0− g(x) na˜o existe. O ponto 0 e´, portanto, uma descontinuidade de segunda espe´cie na qual existe o limite a` direita, mas o limite a` esquerda, embora tenha sentido (0 e´ ponto de acumulac¸a˜o a` direita para o domı´nio de g), na˜o existe. 14. Sem apelar para o Ca´lculo, e´ fa´cil dar exemplos de des- continuidade de segunda espe´cie na qual um dos limites laterais 232 [CAP. VII: FUNC¸O˜ES CONT´INUAS existe. Basta considerar f : R → R definida por f(x) = 0 se x ≤ 0, ou se x > 0 e´ racional, enquanto f(x) = 1 para x > 0 irracional. Existe lim x→0− f(x) = 0 mas na˜o existe limx→0+ f(x). Logo, 0 e´ uma descontinuidade do tipo procurado. Teorema 9. Uma func¸a˜o mono´tona f : X→ R na˜o admite des- continuidades de segunda espe´cie. Demonstrac¸a˜o. Dado a ∈ X, como f e´ mono´tona, se a+ δ ∈ X (respectivamente a − δ ∈ X) enta˜o f e´ limitada no conjunto [a, a+ δ] ∩ X (respectivamente [a− δ, a] ∩ X). Logo existem os limites laterais que fac¸am sentido no ponto a, pelo Teorema 12 do Cap´ıtulo VI. Teorema 10. Seja f : X→ R mono´tona. Se f(X) e´ um conjunto denso em algum intervalo I, enta˜o f e´ cont´ınua. Demonstrac¸a˜o. Para cada a ∈ X ′+ seja f(a+) = lim x→a+ f(x). Analogamente, se a ∈ X ′− , escrevamos f(a−) = lim x→a− f(x). Para fixar as ide´ias, suponhamos f na˜o-decrescente. Tomemos a ∈ X. Se tem sentido falar em f(a+), isto e´, se a ∈ X ′+ , mostrare- mos que f(a) = f(a+). Com efeito, f(a+) = inf{f(x); x > a}. Sabemos que a < x ⇒ f(a) ≤ f(x). Logo f(a) ≤ f(a+). Ad- mitamos que seja f(a) < f(a+). Como existem pontos x ∈ X com x > a, vemos que em f(X) ha´ pontos f(x) ≥ f(a+). Assim sendo, todo intervalo I contendo f(x) deve conter pelo menos o intervalo (f(a), f(a+)), no qual na˜o ha´ pontos de f(X) pois x ≤ a ⇒ f(x) ≤ f(a) e a < x ⇒ f(a+) ≤ f(x). Isto con- tradiz que f(X) seja denso num intervalo I. Por conseguinte, f(a) = f(a+). De modo ana´logo ver´ıamos que f(a−) = f(a) para todo a ∈ X ′− . Logo f e´ cont´ınua. Corola´rio. Se f : X → R e´ mono´tona e f(X) e´ um intervalo, enta˜o f e´ cont´ınua. Exemplo 15. Seja f : R→ R dada por f(x) = x, se x e´ racional, e f(x) = −x, se x e´ irracional. Enta˜o f e´ uma bijec¸a˜o de R sobre [SEC. 2: DESCONTINUIDADES 233 R que e´ cont´ınua apenas no ponto 0. Isto se da´ porque f na˜o e´ mono´tona. Continuaremos escrevendo f(a+) = lim x→a+ f(x) e f(a−) = limx→a− f(x). Teorema 11. Seja f : X → R uma func¸a˜o cujas descontinuida- des sa˜o todas de primeira espe´cie. Enta˜o o conjunto dos pontos de descontinuidade de f e´ enumera´vel. Antes de demonstrar o Teorema 11, definamos uma func¸a˜o σ : X→ R, pondo, para cada x ∈ X, σ(x) = max{|f(x) − f(x+)|, |f(x) − f(x−)|} se x ∈ X ′+ ∩ X ′− . Se x ∈ X ′+ ou x ∈ X ′− apenas, poremos, respectivamente, σ(x) = |f(x) − f(x+)| ou σ(x) = |f(x) − f(x−)|. Finalmente, se x for um ponto isolado de X, poremos σ(x) = 0. A func¸a˜o σ e´ definida quando f na˜o possui descontinuida- des de segunda espe´cie. Seu valor σ(x) chama-se salto de f no ponto x. Note-se que se a ≤ f(x) ≤ b para todo x ∈ X, enta˜o 0 ≤ σ(x) ≤ b − a. O fato mais importante sobre σ e´ que σ(x) > 0 se, e somente se, x ∈ X e´ uma descontinuidade de f. Demonstrac¸a˜o do Teorema 11. Para cada n ∈ N, seja Dn = { x ∈ X;σ(x) ≥ 1 n } . O conjunto dos pontos de descon- tinuidade de f e´ D = ∞⋃ n=1 Dn . Basta pois mostrar que cada Dn e´ enumera´vel. Afirmamos que, para todo n ∈ N, Dn so´ possui pontos isolados. Com efeito, seja a ∈ Dn . Sendo f des- cont´ınua no ponto a, temos a ∈ X ′. Suponhamos a ∈ X ′+ . Por definic¸a˜o de f(a+), dado n, existe δ > 0 tal que a < x < a+ δ, x ∈ X ⇒ f(a+) − 1 4n < f(x) < f(a+) + 1 4n · Assim, para cada 234 [CAP. VII: FUNC¸O˜ES CONT´INUAS x ∈ (a, a+ δ)∩X, vale σ(x) ≤ 1 2n · Se, pore´m tivermos a /∈ X ′+ , escolhemos δ > 0 tal que (a, a + δ) ∩ X = ∅. Em qualquer hipo´tese, para todo a ∈ Dn existe um intervalo (a, a + δ) tal que (a, a + δ) ∩ Dn = ∅. De modo semelhante encontramos, para cada a ∈ Dn , um intervalo aberto (a − δ ′, a) tal que (a − δ ′, a) ∩ Dn = ∅. Isto mostra que nenhum ponto de Dn e´ ponto de acumulac¸a˜o. Em outras palavras, todo ponto de Dn e´ isolado. Segue-se que Dn e´ enumera´vel. (Veja o Corola´rio 2 do Teorema 8, Cap´ıtulo V.) Corola´rio. Seja f : X → R mono´tona. O conjunto dos pontos de descontinuidade de f e´ enumera´vel. Com efeito, pelo Teorema 9, as descontinuidades de f sa˜o todas de primeira espe´cie. 3 Func¸o˜es cont´ınuas em intervalos O teorema seguinte estabelece matematicamente o princ´ıpio bastante plaus´ıvel de que uma func¸a˜o cont´ınua definida num intervalo na˜o pode passar de um valor para outro sem passar por todos os valores