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Psicologia Fenomenológica Apresentação da Disciplina (Módulo 0) Organização do material: Nesta disciplina, você entrará em contato a Psic ologia Fenomenológica, com ênfase nas possibil idades abertas pelo pensamento desenvolvido p elo filósofo Martin Heidegger (1989 – 1976) para a Psicologia. Apoiado na Fenomenol ogia de Edmund Husserl (1959 – 1938), ele questionou a ontologia metafísica e a tentativa de determinação substancial do ser da existência humana. Destacaremos sua compree nsão da existência humana, denominada Dasein (ser-aí). Através dessa quebra do paradigma metafísico, Heidegger abre caminho para novas perspectiva s de compreensão dos fenômenos humanos. Bu scaremos compreender o projeto da Fenomenol ogia de Husserl, ‘aplicado’ por Heidegger na inv estigação da existência humana. Em seguida, es tudaremos as implicações da compreensão da e xistência humana como Dasein para a Psicologi a. Com isso, entraremos em contato com a com preensão dos fenômenos psicológicos a partir d o enfoque da fenomenologia- existencial, na direção de compreender o lugar e as possibilidades de intervenção do psicólogo n essa abordagem. A descrição da existência realizada por Heidegg er torna- se fundamento da psicopatologia e da psicotera pia chamada Daseinsanalyse, primeiramente por Ludwig Binswanger (1881 – 1966), depois por Medard Boss (1903 – 1990). Será nosso objetivo nesta disciplina conhecer e compreender os pressupostos epistemológicos e ontológicos do pensamento fenomenológico- existencial para promover a identificação deste método e da concepção de homem que lhe é pe rtinente com o lugar e a função do psicólogo no trato com o fenômeno psicológico e na promoçã o de saúde. Este material poderá ser utilizado como orientaç ão para seu estudo e como complemento das at ividades realizadas nas aulas presenciais. O programa da disciplina está distribuído em 8 módulos, que devem ser estudados ao longo do semestre letivo. Os módulos 1 a 4 serão objeto de avaliação na NP1 e os 5 a 8 serão avaliados na NP2. Módulo 1: Introdução à Fenomenologia de Edmu nd Husserl Apresentação dos dados biográficos de Edmund Husserl Introdução ao método fenomenológico e à cons ciência intencional Bibliografia Básica: FEIJOÓ, A. (2011) “Husserl e a Fenomenologia”. A existência para além do su jeito, pg. 25-34. Módulo 2: Introdução à Fenomenologia Existenci al de Martin Heidegger e à Analítica Existencial O projeto fenomenológico de Heidegger A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I.B., pg.34-56 Módulo 3: A condição humana descrita pela fen omenologia existencial Temporalidade do Dasein. Angústia e finitude do Dasein Bibliografia obrigatória: SAPIENZA, B. (2015) En contro com a Daseinsanalyse, pg. 48-95. Módulo 4: Fenomenologia Existencial da História Pessoal A concepção de história pessoal (historiobiografi a) de Dulce Critelli Historiobiografia e Sentido da Vida na fenomenol ogia existencial Bibliografia básica: CRITELLI, D. (2012) História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. Módulo 5: A Daseinsanalyse de Ludwig Binswan ger Apresentação dos dados biográficos de L. Bins wanger Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswa nger Bibliografia básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “A obra fundadora de Ludwig Binswange r (1881-1966)”, cap. II.A, pg.64-101 Módulo 6: A Daseinsanalyse de Medard Boss Apresentação da Daseinsanalyse desenvolvida p or Medard Boss Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. (2011) A D aseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELIST A, P. (org.) Psicologia fenomenológico- existencial, pp. 139-158. Módulo 7: Compreensão e Ação clínica Concepção de Psicoterapia daseinsanalítica Ação e compreensão na clínica fenomenológico- existencial Bibliografia básica: JARDIM, L.E. Ação e Compr eensão na clínica fenomenológico- existencial. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 45 – 76. Bibliografia complementar: POMPÉIA, J. & SAPI ENZA, B. “A terapia e a era da técnica”. In: POM PÉIA, J. & SAPIENZA, B. Os dos nascimentos d o homem, pg. 123-140. Módulo 8: Processos psicoterapêuticos daseins analítico Compreensão dos fenômenos clínicos atuais Psicoterapia infantil fenomenológica existencial Bibliografia básica: FEIJOÓ, A. (2011) A clínica p sicológica na tonalidade do temor, cap. 3.3.2, pg . 155-195. Bibliografia complementar: FEIJOÓ, A. (2011) A clínica psicológica com crianças, cap. 3.1,4 p. 108-133. Em cada um dos módulos, haverá uma breve ap resentação do assunto, indicação de material pa ra leitura, atividades de estudo e exercícios de v erificação da aprendizagem. Lembre- se que a mera realização dos exercícios não per mitirá a aprendizagem dos temas. É imprescindí vel que você realize todas as atividades descrita s em cada módulo. O presente conteúdo, por se tratar da apresenta ção do curso, não inclui exercícios. Bibliografia A Bibliografia apresentada a seguir relaciona as obras consideradas importantes para o estudo d os temas. Em cada módulo, serão indicados os t rechos específicos que devem ser lidos. BÁSICA DASTUR, F. & CABESTAN, P. Daseinsanalyse: Fe nomenologia e Psicanálise. 1ª ed. Rio de Janeiro : Via Verita, 2015. EVANGELISTA, P. (org) Psicologia fenomenológic o-existencial – Possibilidades da atitude clínica fenomenológic a. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Via Verita, 2015. FEIJOÓ, A. M. L. C. A existência para além do s ujeito: A crise da subjetividade moderna e suas r epercussões para a possibilidade de uma clínica psicológica com fundamentos fenomenológico- existenciais. Rio de Janeiro: Via Verita, 2011. COMPLEMENTAR CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. POMPÉIA, J. A. & SAPIENZA, B. T. Na Presença do Sentido: Uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. 2ª ed. São Paulo: EDUC, 2013. POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Os dois nasci mentos do homem: Escritos sobre terapia e edu cação na era da técnica. Rio de Janeiro: Via Verit a, 2011. SAPIENZA, B. T. Do desabrigo à confiança: Das einsanalyse e terapia. São Paulo: Escuta, 2007. SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse : A obra Ser e tempo, de Heidegger, com funda mento da terapia daseinsanalítica. São Paulo: Es cuta, 2015. Além destas referências, é desejável que você re corra a outras fontes, caso queira se aprofundar em algum tópico específico do programa. É imp ortante que, em sua pesquisa, você recorra a fo ntes confiáveis. Indicamos a seguir alguns ender eços eletrônicos cuja consulta é recomendada: PEPSIC – PERIÓDICOS ELETRÔNICOS EM PSICOLOGIA - http://pepsic.bvs-psi.org.br/scielo.php PERIÓDICOS CAPES - www.periodicos.capes.gov.br BIBLIOTECA VIRTUAL EM SAÚDE – BVS – http://www.bvs-psi.org.br BIBLIOTECA DIGITAL DE TESES E DISSERTAÇ ÕES (USP) - http://www.teses.usp.br/ SITE DO CENTRO DE FORMAÇÃO E COORDEN AÇÃO DE GRUPOS EM PSICOLOGIA – http:// www.fenoegrupos.com SITE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DASEIN SANALYSE – http://www.daseinsanalyse.org/ Se você necessitar de informações adicionais pa ra ampliar seus conhecimentos, solicite- as do professor, nas aulas presenciais. Módulo 1: Introdução à Fenomenologia de Edmun d Husserl Apresentação dos dados biográficos de Edmund Husse rl Introdução ao método fenomenológico e à consciência intencional Apresentação dos dados biográficos de Edmund H usserl Bibliografia Básica: FEIJOÓ, A. (2011) “Husserl e a Fenomenologia” A existência para além do sujeito. Rio de Janeiro: Via Verita, pg. 25-34. Edmund Husserl nasce em Prossnitz, na Morá via; atual Prostejov, República Tcheca, em 8 de abril d e 1859, filho de comerciantesjudeus. Em 1876, inicia seus estudos universitários em Leipzig. Concentra- se na matemática, mas estuda também física, astrono mia, filosofia e psicologia com W. Wundt. Em 1882, d outora- se na Universidade de Viena com a tese O Cálculo das Variações. Em 1887, pouco antes de casar- se, defende a tese de habilitação Sobre o Conceito de Número: análise psicológica, na cidade de Halle. Essa trajetória culmina na Psicologia. Nessa época, a Psicologia era o estudo das faculdades mentais do ho mem. Até bem pouco tempo, era disciplina especulati va, filosófica. Quando Wundt funda o laboratório de p sicologia científica em 1879, começa sua trajetória de ciência aplicada. Husserl acompanhou de perto essa tr ansformação. A filosofia do fim do século XIX dividia- se entre duas vertentes: aqueles que defendiam uma ba se objetiva para o conhecimento e aqueles que o funda mentavam nas faculdades mentais. Os Naturalistas defendiam que a objetividade do conhecimento está na realidade objetiva, externa, “ fora” do sujeito. Conhecer a natureza significa saber mensurá- la, a fim de revelar suas leis universais. Essas leis univ ersais, as verdades universais, só são acessíveis atravé s de hipóteses. Para isso, esse modelo de conheciment o dispõe da metodologia de observação, mensuração e classificação. Como toda a realidade é objetiva, física, també m a consciência, da qual fala a Psicologia, deve ser fís ica. Husserl, como grande pensador, leva ao limite as bases desse pensamento para expor sua contradição: s e tudo pode ser reduzido à natureza física, também a c oncepção de que tudo pode ser reduzido à natureza fís ica é apenas mais um processo físico, incapaz de suste ntar-se como verdade universal. Do outro lado, os Psicologistas defendiam a m ente como fundamento último de todo conhecimento. Para eles, a objetividade é dada pelo sujeito “puro” ab strato. As leis objetivas, o real, são convenções subjeti vas explicáveis pelo psicólogo. Levando às últimas co nsequências essa fundamentação, também a Psicologi a mina o conhecimento objetivo e científico- natural, pois, para ela, tudo é processo psicológico. As ciências, como a matemática, tornam-se relativas. O pensamento de Husserl recebe impulso dess a “crise” insuperável, na tentativa de encontrar soluçã o. Para fundamentar o conhecimento verdadeiro – tarefa da filosofia – Husserl não poderá se apoiar nem no Naturalismo, ne m no Psicologismo. A Fenomenologia surge como crít ica à pretensão de cientificidade plena das ciências, ao recurso à dedução e à inferência como método de con hecimento (modelo hipotético) e à determinação psico física atribuída ao seu sujeito do conhecimento. (Feijo ó, 2011) Atividades recomendadas 1. Leia atentamente o texto indicado como bibliografia básica. 2. Faça uma pesquisa bibliográfica sobre a vida e a ob ra de Edmund Husserl. 3. Acompanhe o exercício abaixo: Husserl (1859 – 1938) foi o iniciador da fenomenologia. Sua formaçã o acadêmica iniciou- se na matemática, passou pela psicologia filosófica e desembocou na filosofia. A fenomenologia é filosofia. Sobre a fenomenologia elaborada por Husserl, está c orreto afirmar: I – Busca um fundamento seguro para as ciências human as, as ciências naturais e a filosofia. II – Tem como lema o retorno “às coisas mesmas”, que si gnifica um retorno à pesquisa empírica e à experiment ação. III – A palavra “fenomenologia” é composta por “fenôme no”, que significa “aquilo que aparece”, e “logos”, q ue significa “sentido imanente”. IV – Foi formulada desde 1900 como um modelo de atendi mento psicoterápico, que visa a compreensão do outro . V – Concebe o mundo como existindo em si mesmo e con cebe um método (“método fenomenológico”) para co nhecer a realidade que se esconde por trás das aparê ncias. Estão corretas apenas as afirmações: A) I, II, III, IV e V. B) I, II, IV e V. C) I e III. D) II, IV. E) I e III. Se você leu atentamente os textos e compreendeu o im pulso husserliano à Fenomenologia, foi capaz de ident ificar a alternativa E como correta. A afirmação II indi ca como “retorno às coisas mesmas” o retorno à empir ia, por isso está incorreta. A proposta da fenomenologi a é retornar aos fenômenos no seu aparecer na correla ção intencional, isto é, na relação consciência- objeto. A afirmação IV apresenta a fenomenologia co mo um método psicoterápico, o que está errado, pois s urgiu como filosofia primeira, no esforço de fundamen tação de todas as ciências. A afirmação V fala de uma “realidade por trás da aparência”. Para a fenomenologi a, o que aparece é o que é tal como é. Introdução ao método fenomenológico e à consciên cia intencional Bibliografia Básica: FEIJOÓ, A. (2011) “Husserl e a Fenomenologia” A existência para além do sujeito. Rio de Janeiro: Via Verita, pg. 25-34. A ascensão das Ciências Humanas amplia a cri se das ciências. Qual seria a validade (verdade univers al) das descobertas da antropologia, da sociologia ou mesmo da psicologia? A psicologia, num esforço para assegurar a verdade de suas afirmações, recorre ao mé todo científico- natural de investigação. O teste de medição de inteligê ncia desenvolvido por Alfred Binet (1857 -1911) é um exemplo disso; determina- se a inteligência como mensurável e cria- se um instrumento para a medir. Husserl, por outro lado, identifica a carência d e fundamentos das ciências- naturais. É o Naturalismo, descrito anteriormente. Seu objetivo é, então, inaugurar um novo fundamento par a a lógica, para a teoria do conhecimento e para a psic ologia: uma ciência originária, primeira. A chave para a fenomenologia vem dos estud os com Franz Brentano (1838 – 1917). Opondo- se a Wundt, Brentano propõe que os atos mentais são experienciáveis, de modo que a psicologia, através da intuição (observação), é ciência empírica. Brentano apresenta os atos psíquicos como int encionais. Resgata esse conceito da filosofia de Aristót eles. Na tradução latina da filosofia aristotélica, intenti o significa dirigir- se a... (Devemos tomar muito cuidado para não confu ndir este conceito com a ideia comum de “intenção”, q ue significa desejo, motivação, etc.) Desta ideia, Huss erl desenvolve o a priori da correlação: consciência é consciência de... e todo objeto só é enquanto visado p or uma consciência. Intencionalidade significa que tod a consciência é de algo e todo algo só é enquanto refer ido à consciência que se tem dele. Nessa formulação, Husserl lança mão de um as pecto da Psicologia de Brentano que será característic o da fenomenologia e de toda psicologia fenomenológ ica que nela se inspira: consciência é ato, não é um rec eptáculo. Com o conceito de intencionalidade, Husserl s upera o Psicologismo, que prioriza o Sujeito na relaçã o Sujeito- Objeto, e o Logicismo e Naturalismo, que priorizam o mundo objetivo e natural, o Objeto na relação Sujeito - Objeto. Para a fenomenologia, Sujeito e Objeto são int imamente relacionados, indissolúveis. Por isso, Feijoó (2011) afirma que Com a noção de intencionalidade, portanto, escapa- se das articulações metafísicas a partir da fenomenol ogia e encontram- se possibilidades outras de se tratar o fenômeno psíqu ico, sem perder a possibilidade de se falar em sentido s e significados psíquicos de maneira rigorosa. (p.33) A Fenomenologia surge como tentativa de elab oração de uma ciência rigorosa, capaz de fundamentar as várias ciências. Por isso, Husserl a chama de Ciênc ia Primeira. O princípio de intencionalidade da consci ência rege que toda consciência é consciência de algo e que todo algo só é tal como aparece na consciência. “Consciência”, entretanto, não é um recipiente vazio q ue se preenche; é um ato. O objeto ao qual se dirige e que surge na relação intencional é sempre significativo. Entretanto, nós não experienciamos essa relaçã o íntima entre o nosso ver e a coisa vista, entre nosso s entir e a coisa sentida, entre nosso perceber e a coisa p ercebida. Husserl chama de atitude natural a nossa pos tura cotidiana de encontrar objetos “fora”, no mundo, como se existissem em si mesmos. A atitude natural p ode ser descrita como aquela que consiste em pensar q ue o sujeito está no mundo como algo que o contém o u como uma coisa entre as demais. As ciências naturai s operam sobre essa crença de que existem objetos em si no exterior, que podem ser observados, investigado s e descritos a partir de suas propriedades imanentes. A atitude natural é a atitude ingênua. A fenomenologia busca superar a atitude ingên ua suspendendo a crença na realidade da existência e m si do mundo exterior, resgatando a consciência com o condição de aparição do mundo. Essa etapa do méto do fenomenológico chama- se epoché e pode ser caracterizada como a colocação e ntre parênteses da realidade independente da consciên cia, para que a investigação fenomenológica se volte p ara a fenomenalização dos fenômenos, isto é, seu apar ecer na correlação intencional. Pela redução fenomeno lógica, a consciência se mostra consciência constituint e de mundo. Atividades recomendadas 1. Leia atentamente o texto indicado. 2. Procure artigos de Psicologia Fenomenológica em r evistas científicas que apresentem as bases filosóficas fenomenológicas. Preste atenção a como as ideias filos óficas são “aplicadas” na pesquisa e 3. Acompanhe o exercício abaixo: Leia atentamente a seguinte afirmação de Husserl: Mostra- se, pois, por toda a parte, esta admirável correlação e ntre o fenômeno do conhecimento e o objeto de conhe cimento. Advertimos agora que a tarefa da fenomenol ogia, ou antes, o campo das suas tarefas e investigaçõ es, não é uma coisa tão trivial como se apenas houves se que olhar, simplesmente abrir os olhos. (Husserl, 1 907/1990, p.33) [Referência bibliográfica: Husserl, E. A Ideia da Fen omenologia. Trad.: Artur Morão. 1a ed. 1907. Lisboa: Edições 70, 1990.] Sobre esta citação está correto afirmar: I – A passagem se refere à intencionalidade da consciênc ia, que pode ser descrita como a propriedade de toda consciência ser referida a um objeto e todo objeto só s er enquanto referido a uma consciência. II – Através desta concepção, sujeito cognoscente e objet o conhecido deixam de ser entidades separadas e se r evelam co-originários. III – A fenomenologia é uma tarefa pois exige que se saia da atitude natural em relação ao mundo para poder c onhecer sua constituição. IV – O fenomenólogo precisa do método fenomenológico p ara conhecer as intenções da consciência, isto é, o qu e a motiva. Estão corretas: A) I, II e IV, apenas. B) I e II, apenas. C) II, III e IV, apenas. D) I, II e III, apenas. E) II e III, apenas. Se você leu os textos indicados e compreendeu os con ceitos apresentados, foi capaz de identificar que as afir mações I, II e III apresentam corretamente a intencion alidade da consciência, a correlação intencional (que s upera a dualidade Sujeito- Objeto) e a fenomenologia como tarefa, respectivame nte. A afirmação IV está incorreta, pois define intencio nalidade (intentio) como motivação, deturpando o sent ido desse termo na fenomenologia, que é “dirigir- se a...”. Módulo 2: Introdução à Fenomenologia Existencial de Martin Heidegger e à Analítica Existencial O projeto fenomenológico de Heidegger A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I. B., pg.34-56 O livro de Heidegger, Ser e Tempo, publicado em 1927, tem como tarefa a elaboração da fenomenol ogia como filosofia. E filosofia é, para ele, perguntar p elo SER, isto é, o que é a realidade?, quem somos nós ?, tal como feito por toda a história ocidental. O métod o fenomenológico exige que se suspendam os pressup ostos. Assim, Heidegger “coloca entre parênteses” as definições de SER legadas pela tradição filosófica. Pre cisa perguntar ao SER mesmo o que é. Para isso, com eça seu perguntar pelo “ente que compreende ser”, qu e é o homem. Isto é, a existência é por ele assumida nã o como animal racional, nem como psiquismo, mas co mo abertura para coisas, si mesmo e outros serem. So mente o homem pergunta o que é o mundo?, o que são as coisas?, o que sou eu? A tradição filosófica também deixou definições sobre o que é o homem. As várias abordagens psicológicas s ão exemplos disso; todas elas definem o que é o huma no. Mas a fenomenologia é obrigada a colocar todas e ssas definições em suspensão. Com isso, Heidegger pergunta ao homem pelo seu ser, que seria o primeiro passo na colocação da pergunta p elo sentido de SER em geral. O livro Ser e Tempo torn a - se, assim, uma analítica existencial. Heidegger reserva a este o termo Dasein, “ser-aí”, para diferenciá- lo dos demais entes. Traduzindo ao pé da letra, Da significa aí. Sein significa Ser. Dasein é ser-aí. Mas, Heidegger visa descrever não os homens concretos, mas o ser dos homens. Daí a distinção da fe nomenologia existencial entre ôntico – que é dos entes históricos, “concretos” (“existenciário ” ) – e ontológico, que se refere ao ser dos entes (“existenc ial”). (DASTUR & CABESTAN, 2015, p.40). A analítica do Dasein (ou “analítica existencial”) é um a descrição de aspectos essenciais da existência huma na. Heidegger chama esses aspectos de “existenciais”, para diferenciar da palavra “categorias”, usada na filo sofia para descrever as propriedades do ser de tudo o q ue não é humano. Ser e Tempo defende que o humano não é com o as demais coisas do mundo, pois 1) seu ser está sem pre em jogo (ou seja, é uma questão em aberto) e 2) D asein compreende ser (ou seja, é abertura para ser de c oisas, outros e si mesmo). Medard Boss e Ludwig Binswanger, que desen volvem a Daseinsanalyse, fundamentam os fenômenos encontrados na clínica nos “existenciais” descritos po r Heidegger em Ser e Tempo. Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa do texto indicado, atenta ndo para a apresentação da obra de Heidegger e sua i mportância para a Psicologia. 2) A partir da leitura, considere as relações possíveis e ntre a filosofia e a psicologia. 3) Diferencie a análise existenciária da análise existen cial no contexto fenomenológico-existencial. 3) Acompanhe o seguinte exemplo de exercício: Sobre o Dasein, Heidegger escreve que “é próprio des te ente que seu ser se lhe abra e manifeste com e por meio do seu próprio ser, isto é, sendo. A compreensão do ser é em si mesma uma determinação do ser do Da sein. O privilégio ôntico que distingue o Dasein está e m ser ele ontológico.” (1927, p.38) Nessa afirmação estão presentes dois conceitos essenc iais para a compreensão da fenomenologia- existencial e para a implicação das descrições de Hei degger para as ciências do homem. A saber, tratam- se dos conceitos de “ontológico” e “ôntico”, que sign ificam, respectivamente: a) “ontológico” é a constituição do aparelho psíquico d o s e r - aí, enquanto “ôntico” se refere às representações que o preenchem. b) “ontológico” é a constituição essencial do ser- a í , e n q u a n t o ô n t i c o r e f e r e - se aos modos concretos possíveis em que essa constitu ição se manifesta cotidianamente. c) “ontológico” significa que se refere ao ser do ser- aí, enquanto “ôntico” ao ser dos objetos. d) “ontológico” significa a possibilidade de conscien t i z a ç ã o d o s e r - aí sobre si mesmo, enquanto “ôntico”, ao modo irrefle tido em que as pessoas vivem. e) “ontológico” é sinônimo de “fenomenológico”, en quanto “ôntico”se refere às abordagens não- fenomenológicas. Se você leu os textos e compreendeu a diferença entre ôntico e ontológico, assinalou a resposta B como a co rreta, pois nela está expresso que “ontológico” se refer e à constituição essencial do Dasein, enquanto “ôntico ” se refere aos modos concretos de ser. Assim, dizemo s que o ser-no-mundo é ontológico – c o n s t i t u t i v o d e t o d o s e r - n o - mundo –, enquanto ser um existente neste contexto his tórico-social, nesta família, etc., é ôntico. A constituição ontológica da existência (Dasein) Bibliografia Básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “Analítica existencial e Daseinsanalyse”, cap.I. B., pg.34-56 O conceito de Dasein se refere à constituição ontológica do ser que nós somos, costumeiramente ch amados de “humanos”. Porém, Heidegger não utiliza o termo “ser humano” ou “homem” pois são termos q ue carregam significados não fenomenológicos acumu lados ao longo da história do Ocidente. “Humano”, po r exemplo, deriva de “húmus”, terra fértil, articulando- s e c o m a t r a d i ç ã o j u d a i c o - cristã de definição de homem. Por isso, Heidegger res erva o termo Dasein para indicar o ser que somos. (Cf. DASTUR & CABESTAN, 2015, p.34) No §9 de Ser e Tempo Heidegger escreve: “O ente que temos a tarefa de analisar somos nós mesmos . O ser deste ente é sempre cada vez meu. Em seu ser, isto é, sendo, este ente se comporta com o seu ser.” (1 9 2 7 , p . 77) Isso significa que não há uma “essência” ou “natur eza” para além dos modos concretos de existência. O l ivro Ser e Tempo é uma descrição fenomenológica – l i v r e d e p r e s s u p o s t o s – da constituição ontológica do Dasein. Essa constituiç ão é formada pelos “existenciais”, que são os caracter es ontológicos do Dasein. Resumindo a concepção de Dasein de Ser e Te mpo, podemos afirmar que o homem é um ser que é aí , n o m u n d o ( s e r - n o - mundo). E ser no mundo significa ser sempre uma rela ção significativa consigo mesmo, com os outros e com coisas (mesmo que essas relações estejam implícitas). A analítica do Dasein revela que o homem é ontologi c a m e n t e n o - m u n d o e c o m - o s - outros. Ser e Tempo não se detém nas descrições dos d iversos modos concretos em que nos relacionamos co m os outros, pois não é essa a tarefa de Heidegger. Sendo inacabado, o Dasein é ontologicamente possibilidade, ele se realiza em possibilidades. Isso si gnifica que ninguém nasce pronto, mas precisa se reali zar. Heidegger chama esse existencial de cura ou cuid ado (Sorge, em alemão). O “realizar- se” é sempre situado em relação aos demais e à signifi catividade compartilhada. Não sendo pronto e acabad o, o Dasein precisa sempre realizar- se como uma possibilidade; ao Dasein sempre está falt ando algo. Heidegger diz que ele é sempre culpado. A palavra culpa, em alemão, é Schuld, que sig nifica também débito. Sendo inacabado, a existência e stá sempre em dívida consigo mesma de realizar- se. A única possibilidade que encerra a culpa e que só pode ser vivida por cada qual singularmente é sua pró pria morte. O Dasein se relaciona constantemente com essa sua própria possibilidade. Entretanto, essa possib ilidade nunca é vivenciada por cada um, pois, quando acontece, não estamos mais aí para vivenciá-la. Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa dos textos indicados, ate ntando para a concepção de Dasein neles presente. 2) Responda: Essa concepção de existência (Dasein) p ode fundamentar uma compreensão de fenômenos des cobertos no trabalho do psicólogo? Justifique sua resp osta. 3) Acompanhe o exercício a seguir: Escreve o daseinsanalista Pompeia (2004): Poder existir é uma oportunidade que se renova a cad a instante. Pode ser que vivamos só este momento ou por mais alguns dias, anos, até mais de cem anos. Po de, não tem de ser assim, apenas pode. A vida não é u m direito nosso, pois pode ser arrebatada a qualquer momento; não é um dever nosso, pois não nos é dada como condição de necessidade, mas é uma contingênc ia. Assim, existir emerge como projeto. A partir desse con texto, a afirmação correta abaixo é: A) O determinismo encontra-se aí na condição de ser- para-a-morte. B) A experiência humana da vida é, originariamente, fixada num dado tempo e num dado espaço. C) A relação entre o homem e sua existência depende do modo como ele enfrenta sua condição de mortal. D) A existência só pode ser compreendida a partir de uma análise cronológica dos eventos que permeiam a vida de cada homem. E) O horizonte existencial do homem é infinito e indet erminado. A afirmação A apresenta o ser-para-a- morte como uma condição determinística. Está incorre ta, pois embora a morte seja uma possibilidade certa, e la não impõe determinação alguma à existência. Como cada qual lida com a mortalidade (e não com a morte em si) é uma questão pessoal, social e cultural e possí vel, indeterminada. A afirmação B está incorreta, pois não é possível fixar um tempo ou espaço para a vida. Essas questões perm anecem em aberto – possíveis – enquanto a existência existir. Na afirmação C lemos que a relação de cada um com s ua existência depende de como enfrenta sua condição de mortal. Devemos lembrar que enfrentar a condição de mortal é sinônimo de enfrentar a própria existência. Assim, como cada qual lida com sua vida está, sim, re lacionado com como cada qual lida com a possibilidad e de sua impossibilidade. E isso a cada instante. É a al ternativa correta. Vejamos por que as demais estão inc orretas. A afirmação D apresenta que devemos fazer uma análi se cronológica dos eventos da vida para compreender a existência. Está errado, pois a cronologia é secundári a para o Dasein. Os eventos passados adquirem sentid o a partir do projeto em que o Dasein está lançado. Iss o ficará mais claro quando estudarmos a temporalidad e do Dasein. A afirmação E apresenta que o horizonte existencial c omo infinito. Está errada, pois o horizonte existencial de todos nós é a morte, que é um acontecimento certo com data incerta. Cada Dasein lida com a possibilidad e de sua impossibilidade – horizonte finito – à sua maneira. 4) Realize os exercícios deste módulo, anotando as dú vidas que surgirem durante a resolução. Busque respo stas às suas dúvidas na bibliografia indicada ou atravé s de novas pesquisas bibliográficas. Caso suas dúvidas p e r s i s t a m , a p r e s e n t e - as ao professor nas aulas presenciais. Módulo 3: A condição humana descrita pela fenom enologia existencial Temporalidade do Dasein. Angústia e finitude do Dasein Temporalidade do Dasein. Bibliografia básica: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, como fundamento da terapia daseinsanalítica. São Pa ulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95. O conceito de temporalidade é um conceito- chave na fenomenologia existencial. Heidegger escolh e-o para diferenciá- lo do conceito de tempo, que na tradição filosófica e n o nosso uso comum já ficou associado ao tempo crono lógico, o tempo do relógio. O tempo cronológico é um a sequência linear e infinita de “agoras”, que se inicia no passado e caminha em direção ao futuro. A modo d e ser temporal do Dasein é outro. Heidegger se depara com essa questão quando se pergunta pela possibilidade de ser todo do Dasein. Ser todo significa: como o Dasein se completa? Dasei n se completa quando realizou todas as suas possibilid ades. Neste caso, o Dasein só seria todo quando deixa de ser. Porém, deixando de ser, não realiza essa possib ilidade. O Dasein que somos pode, por outro lado, exp erimentar- se como ser finito. É o que Heidegger chama de “decis ão antecipadora” da morte. Devemos tomar cuidado c om estaideia, pois não significa que o Dasein imagina a sua morte, menos ainda que a procure. Significa que o Dasein se assume como um ser finito, isto é, que nã o pode tudo e que "tem" um tempo limitado para ser. Ao fazer isso, abre- se para sua facticidade, isto é, para o ente intramundan o junto ao qual já se encontra. Numa interpretação mai s livre, podemos dizer que o Dasein reconhece a singu laridade e finitude da situação na qual se encontra. O Dasein existe, então, sendo em relação com o que ele ainda não é, mas pode ser. Um sapateiro, por exemplo, encontra seus instrumentos como instrumen tos para o conserto do sapato, que ainda não está cons ertado, mas “pode” estar. Do mesmo modo, o ser-no- mundo se compreende a partir de possibilidades (futur as) próprias. Antecipa-se a si mesmo. Ao antecipar- se (futuro) presentifica seu mundo, no qual já estava. Um sapateiro, antecipando o consertar e antecipando- se como sapateiro, encontra- se com seu mundo naquela situação. Porvir (o termo q ue Heidegger usa para se referir ao futuro, protegendo -o das significações já cristalizadas), ser- sido (o termo que Heidegger usa para se referir ao pas sado, pelo mesmo motivo) e presentificação acontece m juntos; não há separação entre passado, presente e f uturo. Por isso, a analítica do Dasein distinguirá dois modos de temporalização do Dasein: o próprio e o im próprio. Resumidamente, na temporalização imprópria o ser-no-mundo “vem a si”, compreende- se, a partir do que lhe acontecerá. Dessa forma, esquiv a-se do peso do ter-que- ser, que a antecipação da morte desvela, esperando alg o. Na temporalização própria, Dasein vem a si mesmo como ser finito, lançado e responsável por ser. Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa dos textos indicados, ate ntando para a questão da temporalidade do Dasein. 2) Responda: a questão da temporalidade do Dasein é importante para a psicologia? Justifique sua resposta. 3) Acompanhe o seguinte exemplo de exercício: Leia atentamente o trecho extraído do livro DUBOIS, C. Heidegger: Introdução a uma Leitura. (Rio de Jane iro: Jorge Zahar Ed, 2004) e o poema XIX de Mario Q uintana, publicado no livro A Rua dos Cataventos (19 40), e considere as afirmações abaixo. I – Ambos os textos se referem à antecipação da morte. Heidegger utiliza o conceito ser-para-a- morte, enquanto Quintana refere- se a ela como “a Prometida”. II – Com o conceito de ser-para-a- morte, Heidegger se refere à condição mortal do hom em. I I I – A finitude do Dasein é o que desvela para si que é su bstituível na sua existência. I V – No poema de Mario Quintana, a morte é apresentada como “a Prometida”, o que, do ponto de vista da fen omenologia existencial, revela uma tendência suicida latente de seu Dasein. Estão corretas: a) I e II, apenas. b) II e III, apenas. c) III e IV, apenas. d) I, II e IV, apenas. e) I, II e III, apenas. Se você leu atentamente a bibliografia indicada, pô de reconhecer que a afirmação I está correta, pois, de a cordo com a citação de Dubois, a antecipação da mort e revela o ser-para-a- morte constitutivo da existência. No poema de Mario Quintana essa ideia é expressada, em linguagem poéti ca, como a Prometida, uma possibilidade que o acomp anha desde sua infância e que um dia acontecerá. Para Heidegger, desde que lançado na existência, o Dasein é ser-para-a- morte. Assim, a afirmação II também está correta. Em Ser e Tempo, a possibilidade da morte aparece como a única na qual ninguém pode ser substituído po r outrem. A antecipação da morte singulariza o Dasein , portanto, revelando que sua existência está sob seu e ncargo exclusivamente. A afirmação III vai de encont ro com essa ideia, pois sugere que o ser-para-a- morte revela que cada um é substituível na sua existên cia. Equivocada também está a afirmação IV. A fenome nologia- existencial trabalha com fenômenos, buscando encontr ar neles seu sentido. A ideia de tendências latentes é u ma hipótese teórica, que não condiz com o fenômeno. O fenomenólogo não tem base fenomenológica para ta l inferência. Pelo contrário, pois no poema Mario Qui ntana transmite um júbilo por reconhecer sua finitude, que torna os momentos de sua vida únicos e irrepetíve is. Angústia e finitude do Dasein Bibliografia básica: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heidegger, como fundamento da terapia daseinsanalítica. São Pa ulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95. As considerações de Heidegger acerca da tempo ralidade se desdobram na finitude do Dasein. Como vi mos, a finitude não coincide com a morte. “Antecipaç ão da morte” não significa imaginar- se morrendo. Até o contrário. Antecipação da morte si gnifica assumir- se como um ser único, insubstituível, destinado a ser. Existir é tarefa. Essa ideia de Heidegger se faz present e no Existencialismo de Sartre através da ideia de que o homem é condenado a ser livre. O conceito de temporalidade, como já vimos, e xpressa o modo mais originário da existência de lidar com tempo; mais precisamente, de lidar com o próprio tempo. Embora Dasein lide cotidianamente com o te mpo como uma sequência infinita de agoras (tempo cr onológico), seu tempo mais original é aquele que reco nhece sua finitude. Lançada na facticidade, a existênci a é um intervalo entre dois nadas. O nada se manifesta na angústia. É a dissoluçã o do mundo, que revela ao Dasein seu ser como cuida do. Como cuidado, existir é tarefa que só se completa quando o Dasein realiza sua derradeira possibilidade. Heidegger lembra que a possibilidade da impossibilid ade não pode ser confundida com a morte biológica. N uma passagem de Ser e Tempo, comenta que a morte b iológica pode interromper possibilidades, assim como tardar a chegar. A temporalidade do Dasein traz muitas implica ções para a compreensão dos fenômenos que interessa m ao psicólogo. A primeira e mais radical é de que a e xistência humana não pode ser compreendida como u m desenvolvimento linear do passado em direção ao f uturo. Isto abre um forte debate com as psicologias ex plicativas. O pensamento natural- científico faz coincidir o sentido do fenômeno com su a causação temporalmente anterior. Ao observar um fe nômeno psicológico, não se interessa por o que ele rev ela (seu sentido), mas imediatamente pergunta por que se dá dessa maneira, buscando sua resposta na sequen cia temporal. Se for preciso indicar uma ênfase na temporalidade pa ra a fenomenologia existencial, será o futuro, que Hei degger chama de porvir exatamente para diferenciar d as significações já cristalizadas de futuro. O porvir é uma possibilidade de ser si mesmo que o Dasein assume como sua. A partir dessa possibil idade advém a si a sua história e os entes pertinentes. Em outras palavras, eu sou o que posso ser. É por isso que as psicologias humanistas, que se inspiram na fen omenologia- existencial (Não confundamos Psicologia Humanista c om Daseinsanalyse!!!), enfatizam os projetos do ser h umano, ao invés de buscar explicações em seu passad o. O conceito de temporalidade traz grandes repe rcussões na psicopatologia. Os primeiros psicopatolog istas fenomenológicos (Jaspers, Minkowski) elaborara m descrições das vivências psicopatológicas tendo em vista a temporalidade. Por exemplo, a depressão é um encurtamento no porvir, de modo que para o deprimid o vem a ser apenas a perpetuação da dor e da tristeza. Talvez a mais importante implicação seja a no va ênfase dada aos conceitos de angústia e morte na pr ática clínica. A Daseinsanalyse coloca esses conceitos como centro de sua preocupação, reconhecendo nos fe nômenos “psicológicos” modos de lidar com a própriafinitude, antecipada, e com a angústia, enquanto perd a de mundo e de si mesmo. Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa do texto indicado, atenta ndo para a questão da finitude do Dasein. 2) A partir das leituras, como você articula finitude e s ingularização? 3) A angústia é frequentemente entendida como um se ntimento. Confronte a noção vulgar de angústia com a noção heideggeriana. 4) Responda: a questão da finitude do Dasein é import ante para a psicologia? Por que? 5) Acompanhe o seguinte exemplo de exercício: Leia o trecho de Kierkegaard, que inspira a compreen s ã o f e n o m e n o l ó g i c o - existencial sobre a angústia desenvolvida por Heidegg er em Ser e Tempo, e responda. A angústia é a possibilidade da liberdad e, só esta angústia é, pela fé, absolutame nte formadora, na medida em que conso me todas as coisas finitas, descobre toda s as ilusões. E nenhum Grange Inquisido r dispõe de tão horripilantes tormentos c omo a angústia, e nenhum espião sabe i nvestir sobre o suspeito com tanta astúci a, justo no momento em que está mais de bilitado, ou sabe preparar armadilhas, e m que este ficará preso, tão insidiosame nte como a angústia, e nenhum juiz saga z consegue examinar, sim, ‘ex- animar’ [desalentar], o acusado como a angústia, que não o deixa escapar jama is, nem nas diversões, nem no barulho, n em no trabalho, nem de dia nem de noite . (p.164) [Referência bibliográfica: KIERKEGAA RD, S. (1944/2011) O Conceito de Angú stia. Petrópolis, RJ: Vozes.] Sobre a angústia na Fenomenologia Existencial é corr eto afirmar: I – Assim como na citação, Heidegger afirma que não há como escapar da angústia, nem mesmo “nas diversõe s, nem no barulho, nem no trabalho, nem de dia nem d e noite” pois a angústia é constitutiva do Dasein (ont ológica). I I – A angústia rompe com a familiaridade do mundo, pro duzindo estranhamento. A fenomenologia existencial busca reconduzir quem vivencia essa estranheza a alg uma familiaridade. I I I – Para a fenomenologia existencial, a psicoterapia aux ilia na profilaxia da angústia, evitando que ela irromp a. Estão corretas somente: A) I, apenas. B) II, apenas. C) III, apenas. D) I e II, apenas. E) II e III, apenas. Se você leu atentamente os textos indicados na bibl iografia, não deve ter tido dificuldades para compreen der a citação de Kierkegaard. Ele escreve sobre o mes mo fenômeno da angústia, descrito por Heidegger, por ém, com outra linguagem. Tanto para Kierkegaard qua nto para a Heidegger, a angústia – que é o rompimento com a familiaridade com o mund o – é uma possibilidade intrínseca à existência. Portanto, não há como escapar dela. Portanto, as afirmações I e II estão corretas. A afirmação III sugere que há um mo do de fugir da angústia; no caso, a psicoterapia. Dado que é uma possibilidade intrínseca, não há como a evit ar. Também não há porque a evitar, dado que a angústi a revela a cada um que sua existência está sob sua res ponsabilidade. Módulo 4: Fenomenologia Existencial da História Pessoal A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli Historiobiografia e Sentido da Vida A concepção de história pessoal (historiobiografia) de Dulce Critelli Bibliografia básica: CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. A filósofa Dulce Critelli fundamenta suas refle xões nas filosofias de Martin Heidegger e Hannah Are ndt, que, por sua vez, fornecem importantes compreen sões para psicologia fenomenológica existencial. Para a autora, ambos os pensadores são complementares, m as há uma diferença notável entre eles no que tange ao sentido da filosofia. Enquanto para Heidegger a filoso fia exige descomprometimento com a vida cotidiana, p ara a ex- aluna de Heidegger radicada nos EUA, a filosofia é a c apacidade de avaliar a vida e de modificá- la. Para Arendt, a filosofia mantém uma relação íntima com a ação. Segundo Critelli (2012), “Quando pensa mos, transformamos nossas crenças e, consequenteme nte, transformamos nosso jeito de viver.” (p.17) Por ação, Arendt se refere à condição humana. Existir é ser iniciador. Fiel ao princípio fenomenológic o existencial de suspensão radical de quaisquer a prior i que substancializam a existência, Arendt concebe o s er-no-mundo-com-os- outros como ação e palavras. A ação inicia algo novo mundo. Seu sentido vai se desvelando nas repercussõe s, consequências e desdobramentos. Por isso, o sentid o de todo gesto humano depende dos outros. Nas pala vras de Critelli (2013), Nossos atos e palavras não são autosignificant es. Se eles ganham impulso nas nossas intenç ões, raramente as realizam. De um lado, porq ue à medida que se destinam aos outros (por c ondição humana, iniciadores como nós), eles podem interferir neles e modificar seu sentido . De outro lado, porque o sentido e o significa do de nossos atos e palavras sé se completam pelos efeitos e consequências que provocam. (p.36) Assim, a existência, que é concomitantemente singular (eu sou) e plural (no mundo com os outros), p ode perder a autoria de sua história. Como atora dos p róprios gestos, seus significados podem ser transforma dos pelos outros. A fala é a capacidade de explicitar o sentido intencionado, preservando a autoria da ação. Essas reflexões são muito importantes para a p sicologia fenomenológica existencial, pois esta suspen de as noções de psiquismo, sujeito e indivíduo, reconh ecendo o outro como existência singular e plural, no mundo com os outros, constitutivamente estando em j ogo a autoria de sua biografia. Atividades Recomendadas 1. Leia os textos indicados, prestando atenção para a h istória da fenomenologia e da fenomenologia- existencial nos contextos clínicos. 2. A Historiobiografia é uma “abordagem terapêutico- pedagógica” (CRITELLI, 2012, p. 12) Por que? Responda recorrendo ao livro. Há relaçõ es possíveis entre a prática psicológica e tal abordage m? Se sim, quais? Indique-as. 3. Logo no começo do livro, Critelli (2012, p. 11) indica três questões fundamentais: “Quem sou eu? ”, “Qual é o sentido da vida?”, “Que sentido eu faço n ela?” Reflita sobre como a Psicologia tem lidado com essas questões. 4. Acompanhe o exercício abaixo: Leia as duas frases de Critelli e, considerando a relaç ão entre elas, indique a alternativa correta: “Os homens experimentam uma necessidade ontológi ca de compartilhar seus conhecimentos, suas descobe rtas, seus sentimentos e pensamentos" POIS, "para os homens, tudo o que chamamos de real é aber to e sustentado pelo viver em conjunto.” (p.26) Assinale a alternativa correta: A) As duas asserções são verdadeiras e a segunda é u ma justificativa correta da primeira. B) As duas asserções são verdadeiras e a segunda não é uma justificativa correta da primeira. C) A primeira asserção é uma proposição verdadeira e a segunda, uma proposição falsa. D) A primeira asserção é uma proposição falsa e a se gunda, uma proposição verdadeira. E) Tanto a primeira como a segunda são proposições f alsas. Se você acompanhou o texto acima e leu o texto indic ado pôde compreender que a existência humana é coe xistência, isto é, acontece com-os-outros-no- mundo. Terá assinalado a alternativa A como correta. Para Arendt o existir é político. Sendo assim, ser- aí e mundo são dois polos do mesmo fenômeno, que é o existir com outros. Portanto, ambas as afirmações es tão corretas e a segunda é uma justificativa correta da primeira. Historiobiografia e Sentido da Vida Bibliografia básica: CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. A filósofa Dulce Critelli nomeia Historiobiogr afia a “abordagemterapêutico- pedagógica que tem por intenção a redescoberta do se ntido da vida através da compreensão da história pess oal.” (p. 12) Esse termo é composto por história e biografia, ap ontando para dois aspectos fundamentais do existir hu mano. História significa tanto o “conjunto de conheci mentos relativos ao passado da humanidade” (HOUAI SS, 2013), quanto uma narrativa. Esses dois sentidos d e articulam na existência humana. Somos seres históri cos, isto é, lançados em contextos significativos histór icos compartilhados já dados, e biográficos, isto é, que constituímos nossa história pessoal ao longo do existi r. Por isso, quem é alguém só pode ser dito quando já f oi; a todo momento nossas ações podem inaugurar no vos sentidos, que reverberam no já vivido. A todo o momento é possível uma reflexão sob re a história que está em andamento. Isso é necessário, pois existir é estar em risco de perder o próprio ser (a autoria da própria vida) nas interpretações do senso co mum. Também é fundamental para cuidar das possibil idades porvindouras, realizando a possibilidade huma na de lançar- se em direção ao que ainda não é, mas pode ser (POM PEIA, 2012), cuidando para que a vida seja melhor. Critelli (2012) indica três “guias de viver”: 1) Relatos, 2) Historietas e 3) Histórias. Diferenciam- se pela abrangência temporal e pela complexidade de cada um. A identidade pessoal se costura pelos fios de ssas formas de narrativa. Referências Bibliográficas CRITELLI, D. História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. São Paulo: EDUC, 2012. POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Os dos nascime ntos do homem: Escritos sobre terapia e educação na era da técnica. Rio de Janeiro: Via Vérita, 2011. Atividades Recomendadas 1. Leia os textos indicados, prestando atenção para a h istória da fenomenologia e da fenomenologia- existencial nos contextos clínicos. 2. Critelli (2012) indica três “guias de viver” no livro História Pessoal e Sentido da Vida – Historiobiografia. Pesquise oque significa cada um de sses termos? 3. Referindo- se à sua biografia, recolha um relato, uma historieta e uma história pessoais. 4. Acompanhe o exercício abaixo: Uma psicóloga fenomenológica atendia em seu consul tório uma menina. A menina enrolou uma massinha at é formar uma cobra. No momento seguinte, pega um i nstrumento e começa a cortar a cobra em vários peda ços. Sua primeira reação foi de interpretar à luz das c oncepções psicanalíticas. Mas, antes disso, perguntou à menina, que lhe respondeu: “a cobra estava se sent indo sozinha, então estou lhe dando amigos.” (situaçã o adaptada de FORGHIERI, 2000) Considerando a c ompreensão da condição humana desenvolvida por C ritelli (2012) e a Historiobriografia está correto afirm ar: [Referência bibliográfica: FORGHIERI, Y. C. Psicolo gia Fenomenológica: fundamentos, método e pesquisa . São Paulo: Ed. Pioneira Thomson, 2000.] A) O senso comum fundamenta e referenda a compree nsão dessa psicóloga. B) Os atos são autossignificantes. O fenomenólogo pr ecisa ir às coisas mesmas, isto é, à observação dos at os da menina. C) A palavra é a possibilidade de explicitar as intençõ es. A menina pôde, ao dizer o que fazia, explicitar o se ntido do cortar. D) O desvelamento do verdadeiro sentido do cortar de pende da reflexão da psicóloga. A reflexão (termo que recebe um significado específico na Historiobiografia) é a capacidade de articular o que aparece com as int erpretações teóricas. E) A psicóloga precisa realizar uma Historiobiografia da menina, isto é, pedir que ela conte de sua história e de sua biografia. Se você leu atentamente os textos indicados, pôde ver que a alternativa correta é a C. Para responder esta qu estão, é necessário ter clareza sobre o que é a Historio biografia desenvolvida por Critelli, que mostra que as alternativas D e E estão erradas. A alternativa A está i ncorreta, pois a interpretação inicial da psicóloga esta va (de acordo como enunciado!) fundamentada na psi canálise. A alternativa B está errada pois “ir às coisas mesmas” é desvelar o sentido dos fenômenos. Para iss o, é necessário articular os significados das ações da m enina com a enunciação de suas intenções. Módulo 5: A Daseinsanalyse de Ludwig Binsw anger Apresentação dos dados biográficos de L. Binsw anger Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Binswa nger Bibliografia básica: DASTUR, F. & CABESTAN, P. (2015) “A obra fundadora de Ludwig Binswan ger (1881-1966)”, cap. II.A, pg.64-101 Apresentação dos dados biográficos de L. Bi nswanger Ludwig Binswanger (1881 – 1966) é da terceira geração de psiquiatras em s ua família responsáveis pelo sanatório de Bellev ue. Após formar- se em medicina, faz residência psiquiátrica na clí nica de Burghözli, chefiada por Eugen Bleuler (q ue cunha a esquizofrenia), sob supervisão de Ca rl Jung. A psiquiatria dessa época era ou organicista, ou psicanalítica (Freud). Em Burghözli, a psicanálise florecia, sendo Bleuler um importante dissemina dor das ideias de Freud e Jung, então, important e entusiasta. Durante a residência Binswanger a profunda seus estudos na psicanálise, o que o le va a iniciar correspondência com Freud que perd ura até falecimento deste. Mas o interesse pela p sicanálise e a proximidade com seu fundador nã o impedem que Binswanger, desde cedo, questio ne o naturalismo da psicanálise. Encontra funda mentação para sua crítica primeiro na fenomenol ogia de Husserl e sua concepção de consciência intencional e, em seguida, na descrição da exist ência empreendida por Heidegger em Ser e tem po. Daí a ser o primeiro a desenvolver uma Dase insanalyse voltada para o sofrimento existencial ( não “psíquico”) manifesto na psicopatologia. Da analítica existencial, Binswanger recolhe a no ção de ser-no- mundo, a fim de buscar uma compreensão dos modos de ser psicopatológico como modificação nessa estrutura. Ou seja, na experiência psicopa tológica, mundo estrutura- se diferentemente que na experiência saudável. O início da influência de Heidegger em sua obra se faz notar a partir de 1930, quando publica o ar tigo Sonho e Existência. Esse artigo, cuja traduç ão para o francês foi prefaciada por Michel Fouc ault, encontra- se traduzido para o português1. Nele, Binswange r discute a experiência onírica, tema tão caro à p sicanálise, contrapondo à hipótese freudiana gen ética e simbólica a ideia de que o sonhar é um m odo de existir. Cabe ao investigador fenomenólo go compreender a experiência manifesta no son ho e, principalmente, o “espaço afinado” que nel e se apresenta. Isto é, o sonho revela o mundo e spacial e temporal peculiar ao sonhador. Como a firmam DASTUR & CABESTAN (2015, p. 72), “É o tema que o Dasein se dá no sonho que é importante, não o que ele simboliza, e é, então o conteúdo desse drama, dessa ação que é o so nho, que constitui seu elemento decisivo.” O son ho não é produzido por uma subjetividade, como propunha Freud, mas um acontecimento, uma vi sitação; “vem a mim um sonho”. Do filósofo pré- socrático Heráclito Binswanger retoma a oposiçã o entre mundo privado (idion) e mundo comum (k oinon). Em vigília, a existência compartilha com os demais um mesmo mundo (koinon), ao passo que dormindo, está solitário (idios). Essa oposiçã o se articula à compreensão de Binswanger da e xperiência psicopatológica como envolvimento c om o mundo próprio em detrimento da experiênci a compartilhada. Ao contato cotidiano com o sofrimento psicopatol ógico, Binswanger acrescenta uma preocupação epistemológica e metodológica com a psiquiatria, que deveria, na sua concepção, fundamentar- se numa visão clara e correta sobre a existência, que o discurso científico não é capaz de fornece r. Nota de rodapé 1. BINSWANGER, Ludwig. O sonho e a existênci a. Nat. hum., São Paulo , v. 4, n. 2, p. 417-449, dez. 2002 .Disponível em <http:// pepsic.bvsalud.org/scielo.php? script=sci_arttext&pid=S1517-243020020002000 07&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 22 jan. 2016 . Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa do texto indicado, a tentando para a questão do sonhar na Daseinsa nalyse de Binswanger. 2) Lembre de um sonho seu, transcreva- o e a n a l i s e - o de acordo com a proposta de Binswanger. Ou seja, preste atenção ao que se manifesta, à tonal idade afetiva do mundo manifesto e à ação dese mpenhada no sonho. 3) Acompanhe o seguinte exemplo de exercício: Explicam DASTUR & CABESTAN (2015): Ludwig Binswanger foi o primeiro entre os psiqui atras a se interessar pela fenomenologia. É na cr ítica ao psicologismo à qual se dedica Husserl no primeiro tomo de suas Investigações Lógicas, p ublicadas em 1900, e em sua definição da consci ência em termos de intencionalidade e de sentid o, que ele encontrou pela primeira vez os motivo s de se opor ao naturalismo e ao biologismo de F reud. (p.64) Sobre esse contexto de surgimento da Daseinsa nalyse de Binswanger está correto afirmar: I – De Husserl, Binswanger recolhe a noção de que consciência e objeto são um todo indivisível, ou seja, a existência e seu mundo formam uma total idade indissociável. II – Binswanger critica a falta de fundamentação epi stemológica da psiquiatria de sua época, que se apoiava na biologia e/ou na psicanálise. III – Binswanger visa complementar a psicanálise fre udiana com aquilo que ela carece: a descrição d a corporeidade da existência. Estão corretas: A) I, somente. B) II, somente. C) III, somente. D) I e II, somente. E) II e III, somente. Se você leu atentamente o texto indicado e a apr esentação neste módulo pôde identificar que a af irmação I apresenta corretamente a influência da fenomenologia de Husserl de Binswanger. Huss erl apresenta a consciência como intencional, ist o é, os atos de consciência são sempre referidos e complementados pelo objeto intencional que o s completa e realiza. As bases epistemológicas d a psiquiatria da época cindem sujeito e objeto, d e modo a procurar a causa da experiência psicop atológica na natureza (biologismo) ou no psiquis mo (psicologismo). É disso que trata a afirmação II, que está, portanto, correta. A afirmação III est á incorreta, pois a Daseinsanalyse de Binswange r não assume como objetivo a complementação da psicanálise freudiana. Seu objetivo é, outrossi m, fornecer bases epistemológicas sólidas para a psiquiatria, que ele ele encontra nas fenomenol ogias de Husserl e Heidegger. Noções básicas da Daseinsanalyse de L. Bins wanger A primeira fase daseinsanalítica da psiqui atria de Binswanger apoia- se na analítica existencial de Ser e tempo, de He idegger, conforme discutido acima. O primeiro m arco desse trabalho é o artigo “Sonho e Existênci a”, que discute os fenômenos de ascensão e que da como modos de a existência especializar-se. Em 1942 o psiquiatra publica sua principa l obra, Formas fundamentais e conhecimento do Dasein, na qual enuncia sua “visão de homem”. Recorre à analítica existencial de Heidegger, ma s substitui o cuidado como essência do Dasein p ela relação dual Eu- Tu (descrita por Martin Buber). 1 Elabora, assim, uma fenomenologia do amor, q ue, a seu ver, é o fundamento do ser si- mesmo do Dasein. Explicam Dastur & Cabestan (2015): Encontram- se repetidas vezes alusões a essa difere nça fundamental de ponto de vista, send o o ponto de partida da análise existencia l de Heidegger a Jemeingkeit, a qualidad e do que é sempre a cada vez meu, ao p asso qie o da antropologia biswanguerian a é a Ursrigkeit, a nostridade. (p.80) Em razão dessa diferença, o pensamento de Binswanger distancia- se de Heidegger e retorna à fenomenologia de H usserl, mais precisamente à questão da consciên cia interna do tempo. A análise fenomenológica da consciência do tempo empreendida por Husserl mostra que t empo não é algo objetivo, cronológico, externo à consciência. A consciência do tempo diz respeito à articulação a cada momento do que já foi objet o da consciência (e permanece como retido – “retenção”) e o que é antecipado (“protenção”). Dito em termos menos precisos, passado e futur o estão presentes a cada momento. Binswanger retoma essa análise husserliana para considerar modificações estruturais na consciência de temp o na psicopatologia. Por exemplo, no melancólic o o futuro é vivenciado como já vivido; “a proteçã o está infiltrada de momentos retentivos.” (DAST UR & CABESTAN, 2015, p. 92). No maníaco, retenções e protenções cedem lugar ao instante atual, de modo a vivenciar som ente o presente, a momentaneidade. No esquizof rênico, a estrutura temporal esfalece- se, aniquilando a experiência vivida. Binswanger é fenomenológico na concep ção de realidade que subjaz às análises da psico patologia. Para ele, “o mundo real reside apenas na pressuposição constantemente prescrita de q ue a experiência continuará constantemente a se desenrolar segundo o mesmo estilo constitutivo. ” (BINSWANGER, 1993, apud DASTUR & CABE STAN, 2015, p. 90) Ou seja, mundo é uma trama de sentido que tende a permanecer a mesma. Mas, na experiên cia psicopatológica, esse apoio se perde. Notas de rodapé 1. Sobre o cuidado, ver o Módulo 3 e sua respect iva bibliografia: SAPIENZA, B.T. Encontro com a Daseinsanalyse: A obra Ser e tempo, de Heid egger, como fundamento da terapia daseinsanalí tica. São Paulo: Escuta, 2015, Pg. 48-95. Atividades recomendadas: 1) Faça uma leitura criteriosa do texto indicado, a tentando para a questão do sonhar na Daseinsa nalyse de Binswanger. 2) Procure em revistas científicas artigos que rec orram à psicopatologia de Binswanger. 3) Acompanhe o seguinte exemplo de exercício: João é estagiário num hospital psiquiátrico e part icipa do acolhimento de uma paciente que acaba de ser internada, Ana. Ela está muito abatida e v isivelmente muito triste. João pergunta a respeito dela, que lhe responde que a tristeza que está s entindo nunca cessará. “Eu tinha que feito as pa zes com minha mãe antes de ela morrer”, diz, “a gora ela nunca vai me perdoar. Nem eu vou me perdoar.” Ao longo da anamnese que segue Joã o descobre que a mãe de Ana morreu há 8 anos. Recorrendo ao pensamento de Binswanger para compreender o sofrimento dessa paciente, João i dentifica que: A) Trata- se de um caso de psicopatologia, pois o sofrimen to de Ana está desproporcional ao fato que o cau sa. B) Trata- se de um caso de psicopatologia, pois Ana está s ofrendo por algo que aconteceu há muito tempo. C) É necessário identificar a culpa inconsciente q ue causa esta tristeza por meio do método livre a ssociativo. D) Para a fenomenologia, não existe melancolia, nem melancólicos. E) O futuro de Ana está tingido por uma vivência passada. Se você estudou a bibliografia indicada e leu o te xto acima, terá identificado que as análises de Bi nswanger buscam descrever a experiência temp oral psicopatológica. É um modo de temporalizar - se que configura a experiência psicopatológica. No caso acima, o futuro de Ana é vivenciado co mo já determinado que seu sentimento não mud ará, pois ela sente que nunca se perdoará. Trata- se de um modo de constituição temporal da reali dade que antecipa o futuro com vivências passa das. A alternativa que exprime essa compreensã o é a E. Módulo 6: A Daseinsanalyse de Medard Boss Apresentação da Daseinsanalyse desenvolvida por Medard Boss Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 139 – 158. Medard Boss (1903 – 1990) é o psiquiatra suíço que realizará mais plenamente a interlocução entre a analítica existencial (ontológica)de Heidegger e a prática clínica. Ele se forma médico em Zurique e logo inicia análise didática com Freud (1925) para se tornar psiquiatra psicanalista. Faz residência na clínica de Bulghözli, chefiada então por Eugen Bleuler (que conceitua a esquizofrenia, cunhando esse termo), na mesma época em que Carl Jung trabalha lá. É nessa clínica que ele entra em contato com o pensamento de Binswanger, que vai ao encontro de sua própria sensação de que as ciências do homem erram ao pressupor uma cisão entre existência e mundo (sujeito e objeto). Como já visto, isso era para Binswanger “o verdadeiro câncer da ciência”. A II Guerra é ocasião para Boss ler Ser e tempo, de Heidegger, e iniciar troca de correspondências que levará a uma amizade pessoal. As cartas, assim como protocolos dos encontros realizados na casa de Boss em Zollikon foram publicados sob o título Seminários de Zollikon (Petrópolis: Vozes, 2009) e fornecem ao estudioso da psicologia fenomenológico-existencial referências muito importantes. Segundo Boss, Heidegger viu no contato com o psiquiatra a possibilidade de que a fenomenologia da condição humana pudesse contribuir para as formas de cuidado com a existência. Apoiando-se na ontologia fundamental de Ser e tempo, Boss assume como tarefa entender o que e como acontece a relação psicoterapêutica sem recorrer a hipótese. Ou seja, assume da fenomenologia a suspensão (epoché) como passo necessário para que os fenômenos se mostrem tal como são. Como Boss é psiquiatra e psicanalista, ele suspende os pressupostos médicos e psicanalíticos a fim de conhecer a relação que se estabelece entre médico/psicanalista e paciente. É disso que tratam suas principais obras, como Psicanálise e Daseinsanalyse (1957), Fundamentos Existenciais da Medicina e da Psicologia (1971): uma refundação na fenomenologia existencial dos fenômenos clínicos e dos modos de ser-sadio e adoecer da existência. Atividades Recomendadas 1. Leia os textos indicados, prestando atenção para a história da fenomenologia e da fenomenologia- existencial nos contextos clínicos. 2. Pesquise na bibliografia e pela internet sobre os autores Binswagner e Boss. Descreva a abordagem aos fenômenos psicológicos chamada de Daseinsanalyse. 3. Acompanhe o exercício abaixo: A fenomenologia-existencial inicia-se em 1927, com a publicação de Ser e Tempo. Surge como filosofia, mas tem enorme repercussão nas ciências humanas, tornando-se fundamento para a compreensão dos fenômenos humanos. Na psicologia, essa influência se verifica em: a) A ênfase na descrição da vivência do outro. b) Uma nova formulação de aparelho psíquico. c) Um novo método de mensuração do comportamento humano. d) Um método de explicação da relação da consciência com o inconsciente. e) O aperfeiçoamento do método científico-natural de pesquisa na psicologia. Se você leu atentamente os textos e compreendeu a contribuição da obra de Heidegger para a psicologia, pôde reconhecer a alternativa A como correta. A alternativa B propõe que a fenomenologia-existencial realiza uma nova formulação do aparelho psíquico. Isso está incorreto, pois esta abordagem compreende os fenômenos psicológicos à luz do conceito de existência como ser-no-mundo. O mesmo vale para a afirmação D, pois a compreensão da existência como ser-no-mundo torna desnecessários os conceitos de consciente e inconsciente teorizados por Freud. A afirmação C está incorreta, pois considera a mensuração dos comportamentos como influenciada pela fenomenologia. A idéia da mensuração como garantia da certeza do conhecimento está presente nas ciências naturais, de modo que há psicologias que mensuram o comportamento. Por esse mesmo motivo, a afirmação E está incorreta. Indicação dos existenciais pertinentes ao Dasein Bibliografia Básica: EVANGELISTA, P. A Daseinsanalyse de Medard Boss. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 139 – 158. A descrição fenomenológica da existência como ser-no-mundo possível é o fundamento da psicologia fenomenológico-existencial (Daseinsanalyse). O psicólogo que fundamenta o seu trabalho nesta abordagem está interessado em compreender junto ao(s) outro(s) como é seu mundo e como se lança nesse que é o seu mundo, resgatando sua condição ontológica de ser-possível. Assim, Boss recorre a processos psicoterapêuticos próprios e de supervisionandos para pesquisar o que acontece na relação entre terapeuta e paciente costumeiramente chamado de “cura”. Esse termo tem forte viés médico e significa, nesse contexto, remissão de sintomas. Na Daseinsanalyse, “cura” significa o resgate da liberdade para dispor de si, podendo aceitar e recusar solicitações dos entes que vêm ao encontro. Ou seja, os modos de ser-doente são momentos de restrição na vida da existência, nos quais se encontra impedida de assumir possibilidades existenciais. Exemplos disso são os chamados sintomas histéricos tão discutidos pela psicanálise. Enquanto a teoria de Freud os explica como resultantes do acúmulo de energia sexual e consequente descarga, a fenomenologia existencial não pode recorrer a uma explicação que hipotetize o funcionamento psíquico como um aparelho hidráulico. Assim, pergunta quais são os modos de ser, as possibilidades existenciais que se realizam e como se realizam nesses chamados sintomas histéricos. Uma mulher que, andando na rua, vê um homem a quem se sente atraída e suas pernas se paralisam é alguém que sente, ao mesmo tempo, atração e repulsa, isto é, motivação para aproximar-se e distanciar-se. A paralisaria é o modo como realiza esses movimentos opostos simultaneamente. Incapaz de assumir seu desejo, pois em seu mundo o que é do âmbito do sensual e do sexual é vivido como pecaminoso, não deixa essas possibilidades existenciais serem. Vale lembrar que os sintomas não são interpretados como entidades diferentes que se instalam no paciente. São modos de ser, isto é, modos de realizar possibilidades existenciais, com a especificidade de que tais possibilidades não são abertamente assumidas como próprias. Para tecer suas análises, Boss recorre à descrição fenomenológica da existência realizada em Ser e tempo por Heidegger, que apresenta os existenciais, ou seja, a constituição ontológica da existência. Os existenciais indicam modos de a existência acontecer, sendo que se dão no mundo, à luz de possibilidades concretas. Em outras palavras, Heidegger descreve a existência como ser-no-mundo, ser-com-outros, finitude, espacialidade, temporalidade, etc., conforme já visto no livro de SAPIENZA (2015). Como cada existência é com outros, como especializa-se, como são seus mundos varia para cada um. Com análises assim, Boss cuida para que a experiência do paciente possa se manifestar sem o recurso a teorias hipotéticas, cumprindo, assim, o imperativo fenomenológico de voltar às coisas mesmas. 1. Leia os textos indicados, prestando atenção para a história da daseinsanalyse e como fundamenta o trabalho do psicólogo. 2. Pesquise na bibliografia e pela internet artigos escritos na abordagem fenomenológico-existencial. 3. Acompanhe o exercício abaixo: Leia o trecho abaixo, extraído do livro Psychoanalysis and Daseinsanalysis, de Medard Boss. Há boas razões para supor que a ‘análise do dasein’ de Martin Heidegger é mais apropriada para uma compreensão do homem do que os conceitos que as ciências naturais introduziram na medicina e na psicoterapia. [...] Se o pensamento daseinsanalítico de fato se aproximar mais da realidade humana do que o pensamento científico natural, poderemos encontrar algo que até hoje não encontramos na teoria sobre a psicoterapia: uma compreensão do que estamos realmente fazendo (e por que estamos o fazendo dessa maneira) quando tratamos um paciente psicanaliticamente, estando tal compreensão baseada em intuições sobre a essência do ser humano. (Boss,p.29) A compreensão de homem “mais apropriada” à qual Boss faz menção é a descrita por Heidegger através dos “existenciais”. Os “existenciais” são: a) os aspectos co-originários do ser-aí, tais como ser- no-mundo, ser-com-os-outros, cuidado, abertura, clareira, ser-para-a-morte. São determinações ontológicas. b) os momentos em que o ser-aí se sente angustiado por saber que vai morrer, c) as situações em que o ser-aí descobre sua finitude, o que o leva a tomar decisões. d) os aspectos concretos que determinam cada situação fáctica do ser-aí. e) os momentos em que o dasein se apercebe de si mesmo como abertura para a significância. Se você leu atentamente os textos, pôde compreender o que são os existenciais descritos por Heidegger e como aparecem na psicologia fenomenológico- existencial. São os aspectos constitutivos co- originários da existência. Identificou, portanto, a alternativa A como a correta. A afirmação B associa os existenciais com momentos de angústia e a C, com momentos de possível singularização do ser-aí. Estão incorretas. A alternativa D identifica os existenciais a ‘aspectos concretos’, como se fossem exteriores ao ser-no-mundo, determinando-o. A alternativa E também está incorreta, pois associa os existenciais a ‘momentos’. 4) Realize os exercícios deste módulo, anotando as dúvidas que surgirem durante a resolução. Estas dúvidas devem ser motivo de novas pesquisas bibliográficas, na tentativa de saná-las. Caso elas persistam, apresente-as ao professor, nas aulas presenciais. Módulo 7: Compreensão e Ação clínica na perspect iva fenomenológico-existencial Concepção de Psicoterapia daseinsanalítica Ação e compreensão na clínica fenomenológico- existencial Concepção de uma Psicoterapia daseinsanalítica Bibliografia básica: JARDIM, L.E. Ação e Compreensão na clínica fenomenológico-existencial. In: EVANGELISTA, P. (org.) Psicologia fenomenológico-existencial, pp. 45 – 76. Bibliografia complementar: POMPÉIA, J. & SAPIENZA, B. “A terapia e a era da técnica”. In: POMPÉIA, J. & SAPIENZA, B. Os dos nascimentos do homem, pg. 123-140. Do ponto de vista dos procedimentos, a psicoterapia daseinsanalítica acontece como aquela que a inspirou, a psicanalítica. Medard Boss defende o uso do divã, a análise de sonhos, a relação terapêutica como foco do processo. (Evangelista, 2015) Mas a fundamentação é outra. A Daseinsanalyse assume que terapeuta e paciente são existências e que o paciente, que procura o psicólogo, encontra-se restrito na liberdade para assumir certas possibilidades existenciais. Tais restrições manifestam-se como modos de ser que incomodam o paciente, pois ele não se reconhece neles. Ademais, considera-os “sintomas”, “problemas”, “desajustamentos” e espera que o psicólogo possa os eliminar, restaurando os modos de ser anteriores ao surgimento dos mesmos. No modelo científico-natural, causal, de pensamento, caberia ao psicólogo investigar a etiologia dos incômodos para, de posse das causas, planejar e implementar uma intervenção. Esse é o modo de proceder da Era da Técnica, que visa a produção no menor tempo possível. Uma psicoterapia que correspondesse a esse modo de ser produziria efeitos planejados pelo terapeuta, isto é, conduziria o paciente ao modo de ser concebido pelo psicólogo como o melhor para ele. O paciente, por sua vez, coloca-se passivo nesse processo, no sentido de que recebe orientações e, enfim, o tratamento. Pompeia & Sapienza explicam que, numa época em que toda experiência é controlada, o que o paciente espera é conseguir controlar, dominar, o sofrimento que o está controlando e dominando. (Pompeia & Sapienza, 2011) Não é esse objetivo do processo psicoterapêutico. A ação do psicólogo deve ser pensada como ação clínica. Ação clínica aproxima-se do sentido etimológico de técnica (tekhné), que significa o deixar vir à luz algo que permanecia oculto. Ou seja, a ação clínica não conta antecipadamente com resultados, pois o futuro não pode ser controlado pela existência. A ação clínica como tekhné propicia o surgimento de algo que pode ou não vir a acontecer, cria um terreno fértil em que pode ou não vir à luz novo modo de ser da existência. Que modos podem vir à luz? Cada existência precisa ouvir-se, aproximar-se do que o incomoda, ao invés de tentar eliminá-lo a todo custo, dominando-o. Pompeia & Sapienza (2011) jogam com o sentido etiológico de “dominar”, que é o termo em latim domus, que significa casa. Ao invés de dominar o que aflige, o convite da terapia daseinsanalítica é aproximar-se, deixar-se sentir em casa, com o o que aflige, a fim de escutar seu sentido e, quiçá, experimentar novos modos de ser mais livres. Isso ocorre por meio da compreensão. Aproximando-se do mundo do paciente, este e o psicoterapeuta buscam compreender o sentido do que se passa consigo. Essa compreensão já é a ação clínica, pois é a experiência de aproximar-se de si e deixar o sentido, que permanece oculto, aparecer. Atividades recomendadas 1. Leia os textos indicados. 2. Pesquisa na internet artigos que se referem à prática do psicólogo como ação clínica. Verifique que nesta disciplina falamos de ação clínica na psicoterapia, mas esse modo de estar com o outro ocorre em outras modalidades de prática do psicólogo. 3. Acompanhe o exercício abaixo: Ana é encaminhada à psicoterapia após passar por um clínico geral, que hipotetiza que suas queixas somáticas são de fundo “emocional”. Ela queixa-se de dores no abdome e afirma ter certeza de que um tumor aí cresce, mas os exames clínicos nada revelam. O psicoterapeuta que a atende é daseinsanalista. Sendo assim, sobre esse processo psicoterapêutico está correto afirmar que: I – O sentido do processo é libertação, no sentido do verbo grego analysein, que significa desamarrar, destecer tramas, soltar. A principal meta da terapia de Ana, como de todo paciente, é reconduzi-la à capacidade de amar e confiar. II – O processo terapêutico é conduzido por livre associação, o que significa pedir que Ana fale livremente sobre seus sentimentos de culpa e angústia. Estes temas existenciais são o foco da Daseinsanalyse. III – A situação terapêutica (terapia individual) é de encontro de dois Dasein (ser-aí), estabelecendo um aí compartilhado de um ser-aí (Ana) com outro (terapeuta), onde Ana e os entes de seu mundo podem vir à luz. IV – As intervenções do terapeuta são ação clínica, ou seja, objetivam que o paciente confronte seus medos e angústias. Estão corretas somente: A) I, II e III. B) II, III e IV. C) III e IV. D) I e III. E) I, II, III e IV. Se você leu atentamente os textos indicados e a apresentação acima terá identificado que a afirmação I está correta, pois o sentido da psicoterapia daseinsanalítica é resgate da liberdade. Cabe ao psicoterapeuta atitude de ação clínica, que significa estar com o paciente de modo a desobstruir a compreensão do que se passa consigo, propiciando aproximação do sentido do existir. A afirmação II está incorreta, pois a Daseinsanalyse não indica focos temáticos do processo psicoterapêutico. A afirmação III está correta, pois, segundo Jardim (2015), terapeuta e paciente compartilham um “aí”, uma clareira de mundo em que os entes dos mundos do paciente podem vir à luz e serem indagados quanto aos seus significados. A afirmação IV está incorreta, pois ação clínica significa agir abrindo possibilidades, não produzindo efeitos de antemão determinados. Portanto, a alternativa correta é D. Ação e compreensão na clínica fenomenológico- existencial A partir da caracterização de psicoterapia acima, a concepção de fenomenologia enquanto um arcabouço teórico não se sustenta e esta passa a ser entendida como uma postura do terapeuta que favorece ao paciente revelar-se como fenômeno. A postura do terapeuta exige, portanto, a escuta atenta e um demorar-se nas situações relatadas, visando
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