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ÉTICA, RESPONSABILIDADE SOCIAL E AMBIENTAL AULA 1 Prof.a Olívia Resende 2 CONVERSA INICIAL Você já se perguntou como seria viver em uma sociedade na qual cada indivíduo faz o que bem entende, da maneira que pensa ser melhor para si próprio, ou faz apenas aquilo que lhe traz benefício sem pensar no outro ou nas consequências que suas atitudes trazem para a vida de outro indivíduo? Ou como seria uma sociedade em que as pessoas em suas atitudes e ações individuais pensem no coletivo, no outro, na comunidade, antes de fazer algo? Em uma sociedade com equidade e harmonia? Nesta aula, vamos discutir esses questionamentos na sociedade ao longo do tempo e o desenvolvimento de teorias que tentam contribuir para que a vida em comunidade seja boa para todos, com ética, moral e direitos de cada cidadão. Vamos começar? Bons estudos! CONTEXTUALIZANDO Para o convívio em sociedade, a Ética é um assunto importante e cada dia mais difundido e necessário. São frequentes as queixas acerca da falta de ética na sociedade, na política, nas empresas e até mesmo nos meios culturais e religiosos. Segundo Alencastro (1997), na sociedade contemporânea valorizam-se comportamentos que praticamente excluem qualquer possibilidade de cultivo de relações éticas, como o consumo. Para o autor, é fácil verificar que o desejo obsessivo na obtenção, possessão e consumo da maior quantidade possível de bens materiais é o valor central na nova ordem estabelecida no mundo e que o prestígio social é concedido para quem consegue esses bens. Na contramão de atitudes éticas que respeitem a individualidade, o companheirismo, entre outros, o sucesso material passou a ser sinônimo de sucesso social e o êxito pessoal devendo ser adquirido a qualquer custo. Prevalece o desprezo ao tradicional, o culto à massificação e mediocridade que não ameaçam e que permitem a manipulação fácil das pessoas. Por exemplo, em uma sociedade cada vez mais inserida em redes sociais através da internet, fica nítido o que o professor e autor Mário Alencastro afirmou em 1997, quando o acesso à internet estava começando no Brasil. Nessa sociedade hoje conectada, podemos perceber indivíduos 3 alienados, agressivos, que prezam o ter e muito pouco o ser, ostentando nas redes sociais, viagens, festas, coisas, fruto da busca por “curtidas”. Nesta aula, buscaremos refletir sobre a etimologia, o conceito e como se desenvolveram os estudos da ética ao longo dos tempos, apresentando os principais filósofos que se preocuparam com o assunto. Além disso, apresentaremos a sociedade contemporânea e suas transformações sob um olhar ético, analisando os atores sociais presentes, seus conflitos, interesses, valores e posicionamentos ideológicos e discutiremos os dilemas éticos. Para tanto, buscaremos responder as seguintes perguntas: O que é ética e o que é moral? O que é ser essencialmente humano? A ética faz diferença na vida dos indivíduos? Para responder a estas e outras perguntas, começaremos abordando a distinção entre ética e moral e alguns aspectos filosóficos e históricos sobre a ética. TEMA 1: ETIMOLOGIA, HISTORICIDADE E O CONCEITO DE ÉTICA O que quer dizer ética? Posso dizer que ética é igual à moral? A palavra ética pode ter duas origens distintas e são abordadas por diferentes autores. A primeira é a palavra grega “ethos”, com “e“ curto, que pode ser traduzida por “costume”. Em contrapartida, a segunda também se escreve “ethos”, porém, o “e” é longo e tem o significado de “propriedade de caráter”. As duas são importantes e contribuem para o que abordaremos nesta aula. Na Roma antiga, o termo foi traduzido do grego “ethos” para o latim “mos” (ou no plural “mores”), que expressa costume, dando origem à palavra 4 moral. A primeira que pode ser traduzida como costume, entende-se que serviu de base para a tradução latina de Moral. Já no que diz respeito à segunda, propriedade de caráter é o que de alguma forma orienta a utilização atual que tem a palavra Ética (MOORE,1975, p. 4). Percebe-se, portanto, que tanto “ethos” (caráter) quanto “mos” (costume) referem-se ao comportamento propriamente humano. Destarte, ética e moral, segundo sua etimologia e historicidade, estão relacionadas a uma realidade essencialmente humana, construída de forma social nas relações entre os seres humanos, norteando toda a vida em sociedade, desde o nascimento até a morte. “Ética é a investigação geral sobre aquilo que é bom” (MOORE, 1975). Podemos também expor a definição de Motta (1984) sobre a ética, que para o autor pode ser entendida como um bloco de valores que conduz o comportamento humano na sociedade, com fins de garantir o bem-estar geral. Segundo Cortella (2007), ética é um conjunto de valores e princípios que as pessoas usam para decidir três grandes questões importantes, que são: quero, devo e posso. Ética é o conjunto de valores apropriados para cada indivíduo, a fim de definir essas questões e os princípios da sociedade, sendo esses valores religiosos ou não, por meio de padronizações. Portanto, segundo a etimologia e historicidade das palavras ética e moral, ambas estão relacionadas a uma realidade essencialmente de percepção da conduta humana, suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal. Mas mesmo que haja uma relação entre ética e moral, essa relação não iguala as duas terminologias, sendo ética diferente de moral. A moral que aqui abordamos tem sua base na obediência a normas, mandamentos, costumes e tabus, em uma dimensão um pouco mais religiosa. E a ética busca dar fundamento ao bom modo de viver, entre humanos em sociedade. No estudo da filosofia clássica com relação à etimologia da palavra ética, vemos que essa terminologia não se resumia ao conceito de moral (entendida 5 como "costume" ou "hábito", vindo do latim “mos”, ou do plural “mores”), pois investigava a fundamentação teórica para encontrar o melhor modo de viver e conviver em sociedade, ou seja, procurava um melhor estilo de vida dentro da sociedade, tanto na vida pessoal quanto na vida pública. A filosofia moral ou a ética nasce quando, além das questões sobre os costumes, também se busca compreender o caráter de cada pessoa, isto é, o senso moral e a consciência moral individuais” (CHAUI, 2008, p.310). Assim, o estudo da ética incluía diversas disciplinas que não eram contempladas no estudo da física, da retórica, da dialética nem da estética e da lógica. Portanto, a ética ganhava abrangência nos mais diversos campos filosóficos, os quais hoje conhecemos como: psicologia, pedagogia, antropologia, sociologia, entre outros. São áreas que estão direta ou indiretamente ligadas à nossa maneira de viver e ao nosso estilo de vida. Devemos ter cuidado para não confundir ética com lei, mesmo que, geralmente, a lei encontre na ética suas bases e seus princípios. Com a moral e a ética instaurou-se também o direito, que são as regras obrigatórias de determinada sociedade. Para entendermos melhor, vamos analisar as relações entre a Ética, a Moral e o Direito, determinando a ação do indivíduo. Figura 1 – Relações entre a Ética, a Moral e o Direito Fonte: Adaptado do site da UFRGS. Disponível em <http://www.ufrgs.br/bioetica/fundamen.htm> Acesso em 13/04/2016. ÉTICA MORAL DIREITO AÇÃO JUSTIFICATIVA NORMA POR ADESÃO REGRA OBRIGATÓRIA 6 Pense por um momento no local onde você trabalha: alguém fundou essa empresa (e esse alguém pode ter sido você mesmo, caso seja autônomo ou empresário), que hoje atende uma série de clientes, lida com diversos fornecedores e consegue gerar receita. Essa receita paga salários que serão usados para comprar outras coisas e pagar por outras contas, gerando receita também para outras pessoas. Assim,no local em que você trabalha, existe a preocupação ética de todos os envolvidos no processo? Ou seja, o que justifica a ação? Ou apenas a preocupação moral, por adesão? Ou apenas se cumprem as leis do direito, as regras obrigatórias? Tanto a ética e a moral quanto o direito estão intimamente ligados à ação do indivíduo. Adiante, entenderemos um pouco mais das caraterísticas e focos da ação ética. Leitura obrigatória Para aprofundar seus estudos, faça a leitura indicada a seguir: SILVA, R. N. da. Ética e paradigmas: desafios da psicologia social contemporânea. In: PLONER, KS. et al., org. Ética e paradigmas na psicologia social. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008. pp. 39 a 45. TEMA 2: ASPECTOS FILOSÓFICOS E HISTÓRICOS SOBRE A ÉTICA Dentro dos aspectos filosóficos e históricos sobre a ética, podemos entender que surgem teorias éticas em diferentes sociedades como resposta aos dilemas das relações entre as pessoas. Segundo Mário Alencastro (2013), na condição de indivíduos, os humanos realizam sua existência na convivência com os outros, pois, já ao nascerem encontram-se sempre diante de uma comunidade já constituída, e para seu desenvolvimento não podem dispensar o apoio dessa comunidade (ALENCASTRO, 2013, p. 29). 7 Assim, o estudo da ética não é novo, sua historicidade é marcada por fatores importantes, através dos quais se percebem diversas condições morais em inúmeros dados do passado, com forte apelo na contemporaneidade. Alencastro (2013) afirma que, já na Grécia Clássica, Sócrates (470-399 a.C.) afirmava que a pergunta “como devemos viver nossas vidas?” era a principal questão a ser respondida pela filosofia. Assim, um dos pontos fundamentais da historicidade da ética está na Grécia Antiga, com as teorias dos séculos IV e V a.C. Continue a leitura para saber mais sobre elas! Pólis, cidade-estado A pólis foi uma importante forma de organização, conhecida como cidade-estado, e que motivou entre os gregos a formação de experiências políticas e sociais das mais diversas. O surgimento da pólis marca um dos mais importantes aspectos do desenvolvimento da civilização grega. Nas pólis, os cidadãos viviam e participavam de forma ativa na vida das pessoas, dando início a uma dimensão mais clara de sociedade, que seria a base da civilização ocidental, sendo um modelo das antigas cidades gregas. Marcou o início da organização política, desde o período arcaico até o período clássico. O que significava naquela época, para o grego, viver em uma pólis? Segundo Moraes (2012), significava poder conviver com os outros da maneira mais livre possível. O cidadão grego que vivia na pólis não deveria se ocupar com a sua sobrevivência. Por outro lado, viver em uma pólis significava, positivamente, viver entre iguais. Isso indica que ninguém estava obrigado a prestar reverência a ninguém, que ninguém necessita colocar-se a serviço de ninguém, a não ser em época de guerra. Isso fazia com que todos os assuntos fossem tratados por meio do diálogo e da persuasão. Essas duas condições são até hoje dificílimas de serem satisfeitas em qualquer época histórica. Os sofistas Foram os sofistas que quebraram com a tradição pré-socrática dos filósofos da natureza e iniciam ataques e críticas aos costumes e tradições até então praticados na sociedade ateniense. Para eles, o ser humano não deve se moldar a padrões externos de beleza, de comportamento, de crenças. O 8 homem só deve se moldar a sua própria personalidade, ou seja, a sua liberdade. Para os sofistas, a moral e a lei somente serviam para bloquear o livre desenvolvimento do homem. Os sofistas foram os primeiros a defender a filosofia do relativismo, negando a existência da verdade absoluta. Além disso, também criticavam tudo aquilo que não era natural ao ser humano. Para eles, a existência das leis e do Estado eram algo completamente antinatural ao homem e, portanto, deveria ser destruído. Para os sofistas, o que existe são opiniões boas e más, melhores e piores, mas jamais falsas e verdadeiras. Assim, a ética também não é absoluta e, sim, relativa, segundo a qual, o valor mais elevado para qualquer cidadão era atingir o prazer supremo. Os sofistas consideravam que a ética não passava de mera convenção social. Sócrates Sócrates é considerado o “pai da ética”, pois revelou uma necessidade de se refletir, de forma sistemática, sobre conceitos que antes eram dados de forma automática, como o bem, a virtude a justiça. Para Sócrates, a identidade entre os interesses individuais e os comunitários era o caminho para a felicidade. Defendia a moderação dos apetites, a busca pelo conhecimento e a bondade como um dom que merecia ser valorizado. Sócrates trouxe à tona os ideais de uma cidade que fosse moralmente perfeita. Isso incluía harmonia entre os diversos interesses, tanto individuais quanto coletivos. Assim, entendia que os princípios éticos que deveriam reger as instituições eram aqueles que continham elevados valores de cidadania. Os sofistas defendiam o relativismo, Sócrates, ao contrário, defendia a ideia de valores eternos. Suas pesquisas iniciais giraram em torno do núcleo da alma humana. Para ele, todas as pessoas tinham a obrigação de procurar o conhecimento, pois dotadas de conhecimento acerca do bem e do mal, buscam fazer o bem, sendo justas umas com as outras e vivendo em sociedades regidas pelos valores éticos. Platão Platão foi adepto de Sócrates e mestre de Aristóteles, sendo um dos principais filósofos gregos da Antiguidade. Defendia o bem como valor supremo 9 e afirmava que as pessoas deveriam ir em busca da razão, desprezando seus instintos e paixões. Em uma época de mudanças, entre os valores antigos e um novo mundo que emergia, Platão conseguiu absorver e gerar uma riqueza de ideias sem igual. Abordava os mais diversos temas, com a força da paixão e da criatividade artística sem levar muito em conta a lucidez da razão. Para o filósofo, a sociedade então vigente deveria ser reorganizada e o poder confiado aos sábios, evitando, portanto, que a ignorância prevalecesse e corrompesse as almas, sendo assim dominadas pelos instintos e paixões. Aristóteles Na medida em que seu mestre Platão trabalhava com construções sociais imaginárias, utópicas, por projeções sobre qual o melhor futuro para a humanidade, Aristóteles tratou das coisas reais, dos sistemas políticos existentes na sua época. Assim, os revolucionários e doutrinários da sociedade perfeita foram inspirados por Platão, já os grandes juristas e pensadores políticos, mais inclinados à ciência e ao realismo, foram influenciados por Aristóteles. Como Platão, Aristóteles apresentou a necessidade de “reorganizar a sociedade”. Deste modo, a ética e a política caminhariam sempre juntas. Para Aristóteles, o homem tem por finalidade a busca pela felicidade e apresentou a questão do valor supremo da felicidade. Para tal, o indivíduo deveria seguir sua própria natureza, evitando os exageros, caminhando pela justa medida, uma vez que nenhuma pessoa consegue ser feliz sozinha. Leitura obrigatória Continue ampliando seus conhecimentos com a leitura do capítulo 1 – Ética, do livro indicado a seguir. Esse capítulo também servirá de base para os estudos dos outros temas desta aula. ALENCASTRO, M. Ética Empresarial na prática: liderança, gestão e responsabilidade corporativa. Curitiba: Intersaberes, 2013. pp. 25-55. Disponível a seguir: http://ava.grupouninter.com.br/tead/hyperibook/IBPEX/548.php 10 Saiba mais Entenda um pouco mais dos aspectos filosóficos e históricos sobre a ética com os vídeos a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=809bdDKp1BA https://www.youtube.com/watch?v=tL36cKPQzsw https://www.youtube.com/watch?v=kkHJce9-oLE TEMA 3: ÉTICA E MORAL SOCIAL, ÉTICA E VALORES HUMANOS Iniciaremos este tema expondoa anedota que a professora Andréa Vieira Zanella escreveu em seu artigo intitulado Reflexões sobre a pesquisa em psicologia, método(s) e “alguma” ética. A professora expõe a seguinte pergunta: “por que o frango cruzou a estrada?” e nos apresenta respostas, advindas de interlocutores variados espacialmente e temporalmente. Para Zanella (2008), assim respondem: ■ Professora primária: “Porque queria chegar do outro lado da estrada”. ■ Poliana: “Porque estava feliz”. ■ Platão: "Porque buscava alcançar o bem”. ■ Aristóteles: “É da natureza dos frangos cruzar a estrada”. ■ Nelson Rodrigues: “Porque viu sua cunhada, uma galinha sedutora, do outro lado”. ■ Marx: “O atual estágio das forças produtivas exigia uma nova classe de frangos, capazes de cruzarem a estrada”. ■ Moisés: “Uma voz vinda do céu bradou ao frango: “Cruza a estrada!” E o frango cruzou a estrada e todos se regozijaram”. ■ Maquiavel: “O frango cruzou a estrada. A quem importa o porquê? Estabelecido o fim de cruzar a estrada, é irrelevante discutir os meios que usou para isso”. ■ Darwin: “Ao longo de grandes períodos de tempo, os frangos têm sido selecionados naturalmente, de modo que, agora, têm uma predisposição genética a cruzarem estradas”. 11 ■ Einstein: “Se o frango cruzou a estrada ou a estrada se moveu sob o frango, depende do ponto de vista. Tudo é relativo”. ■ Kant: “O frango seguiu apenas o imperativo categórico próprio dos frangos. É uma questão de razão prática”. ■ ACM: “Estava tentando fugir, mas já tenho um dossiê pronto, comprovando que aquele frango pertence a Jorge Amado. Quem o pegar vai ter que se ver comigo!”. ■ Sócrates: “Tudo o que sei é que nada sei”. ■ Dorival Caymmi: “Eu acho (pausa)... — Amália, vai lá ver pra onde vai esse frango pra mim, minha filha, que o moço aqui tá querendo saber”. Nesta anedota que a Professora Andréa escreveu, fica claro que diante de uma ação, pessoas em diferentes lugares e tempos, pensam diferente. Assim como vimos, questões éticas são discutidas a séculos e hoje a discussão ainda é forte. Com acesso à internet e mídias sociais, os indivíduos julgam as situações conforme o que acreditam, dentro do que lhes é colocado em distintas situações. Cabem aqui algumas perguntas: Nos dias atuais, fala-se muito em ética. Você sabe por quê? Há distinção entre ética e moral? A ética e/ou moral afetam nosso cotidiano? Pode-se entender a ética como uma reflexão sobre o agir humano e abarca a moral, pois lhe é mais ampla. A ética existe como referência para os indivíduos que vivem em uma determinada sociedade, possibilitando que a sociedade possa se tornar cada vez mais humana. Assim, o indivíduo deve possuir um senso ético, pois como humanos, vivemos em comunidade e somos continuamente avaliados e julgados por nós mesmos e pelos outros, a fim de identificar em nossas ações atitudes boas ou más, certas ou erradas, justas ou injustas. A moral é a regulação dos valores e comportamentos considerados legítimos por uma determinada sociedade, um povo, uma religião, tradição cultural etc. Estabelece os valores efetivos a serem seguidos por determinada 12 sociedade. É, portanto, provisória, muda com o passar do tempo, pois os costumes e hábitos de um povo mudam também (SIMON, 2009). As relações dos indivíduos na sociedade, são reguladas por um conjunto de normas, leis, costumes e hábitos. Mas o que é esse conjunto de normas, leis, costumes e hábitos? Podemos afirmar que esse conjunto de regras é a moral. As sociedades mudam constantemente e, historicamente, podemos observar que uma sociedade sucede a outra. Da mesma maneira, as morais concretas de uma sociedade, se sucedem umas às outras. Por exemplo, na sociedade feudal, que tinha como perspectiva de horizonte ético a salvação da alma e a preparação para a vida eterna e cujas explicações baseavam-se na religião e na fé, cede lugar à sociedade moderno-burguesa, cujos valores fundamentais são ligados a questões materiais e cujas explicações têm como fundamento o próprio homem, concebido como ser dotado de racionalidade, e capaz de autodeterminar-se sem interferência externa. A moral pode variar em determinado tempo e lugar. As regras morais são determinadas pelas formas como as pessoas organizam sua convivência e conforme estabelecem as condições de sobrevivência e trabalho. As normas morais podem estar estabelecidas de forma escrita, ou podem aparecer como costumes arraigados na cultura, por exemplo, as decisões de um indivíduo baseando-se única e exclusivamente em normas preestabelecidas, tais como não ultrapassar o sinal vermelho, não se atrasar em seus compromissos, não furar fila, não estacionar na vaga preferencial. São tidas como uma decisão ou ato moral, que geralmente são os deveres que o sujeito deve cumprir em seu dia a dia. De acordo com Vasquez (2000): “A função social da moral é a de regular as ações dos indivíduos nas suas relações mútuas, ou as do indivíduo com a comunidade, visando a preservar a sociedade no seu conjunto ou, no seio dela, a integridade de um grupo social”. Cada indivíduo, comportando-se moralmente, se sujeita a determinados princípios, valores ou normas morais, sendo que o indivíduo não pode inventar os princípios ou normas nem modificá-los por exigência pessoal. O normativo é algo estabelecido e aceito por determinado meio social. Na sujeição do 13 indivíduo a normas estabelecidas pela comunidade se manifesta claramente o caráter social da moral (VASQUEZ, 2000). O comportamento moral é tanto comportamento de indivíduos quanto de grupos sociais humanos. Mesmo quando se trata da conduta de um indivíduo, a conduta tem consequências de uma ou outra maneira para os demais, sendo objeto de sua aprovação ou reprovação. Mas, os atos individuais que não têm consequência alguma para os demais indivíduos não podem ser objeto de uma qualificação moral. O campo da ética é um pouco mais amplo do que isso. A ética procura estabelecer uma reflexão sobre o agir humano que ultrapassa o simples cumprimento do que está escrito. Saiba mais Leia a notícia a seguir sobre os atentados que ocorreram em Paris em novembro de 2015, e tente relacionar com os conteúdos lidos até agora. http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2015/11/1706236-policia-francesa- registra-tiroteio-e-explosao-em-paris.shtml TEMA 4: ÉTICA, MORAL, DIREITO E SEUS DILEMAS Atuamos em sociedade conduzidos por uma reflexão sobre o que é certo ou errado, ou sob algo que nos obriga constantemente a agir corretamente e que nos pune em caso de deslizes? Em outras palavras, é a ética ou a lei que orientam as nossas ações corretas? (ALENCASTRO, 2013, p.45) Antes de respondermos a estes questionamentos, precisamos entender alguns conceitos. São nas relações sociais que ideias e normas se desenvolvem em sintonia com uma necessidade social. Para Vasques, a função social da moral consiste na regulação das relações entre os homens visando manter e garantir uma determinada ordem social, ou seja, regular as ações dos indivíduos nas suas ações mútuas ou as do indivíduo com a comunidade, visando preservar a sociedade no seu conjunto e a integridade de um grupo social. Segundo Oliveira e Azevedo, os valores morais são aqueles ligados à natureza do comportamento moral dos homens. Um comportamento 14 moralmente aceitável é definido por um código de conduta de grupo. Esse código muitas vezes está implicitamente gravado na memória coletiva em função da cultura, do meio e da história de um povo. Outras vezes, esse código de comportamento está também estabelecido nas leis de uma nação. Kohlberg (1969) acredita que o desenvolvimento moral é baseado primariamente num raciocínio moral e segue uma série de estágios. Já o direito garante o cumprimento do estatuto social em vigor através da aceitação voluntáriaou involuntária da ordem social juridicamente formulada, ou seja, o direito garante a aceitação externa da ordem social. A moral tende a fazer com que os indivíduos harmonizem voluntariamente, de maneira consciente e livre, seus interesses pessoais com os interesses coletivos (VÁSQUEZ, p.69, 2000). No que se refere à ética, esta tem um caráter mais generalizado do que a moral e o direito, sendo empregada para justificar e legitimar as normas morais e jurídicas, bem como criticá-las em caso de não estarem adequadas às reais necessidades da sociedade. Sendo assim, ela sempre indaga sobre o que é o certo, o bom e o obrigatório, preocupando-se em desenvolver e fundamentar tais conceitos, tomando-os como princípio geral, retirando ao assim proceder os juízos normativos. Figura 2– Nível do plano normativo Podemos entender de maneira mais simples, fazendo uma analogia com círculos concêntricos, conforme mostra o professor Mário Alencastro. Por exemplo, a discussão sobre a idade penal e a corrupção que são assuntos de Direito Moral Ética 15 natureza ética mais abrangente, mas que têm implicações no campo da moral e do direito. O que podemos perceber é que com o avanço da liberdade individual e das conquistas do homem, há, hoje, uma geração muito preocupada com os seus direitos em detrimento dos seus deveres. Os valores individuais são importantes para que o indivíduo adote uma postura, e entende-se que valores são um conjunto de procedimentos, atitudes, e até mesmo visão de mundo (influenciados ou não pela cultura, herança familiar e meio) que faz o indivíduo agir e interagir com o mundo em que vive. Araújo (2002) define valores como sendo as qualidades presentes nas coisas e que pode ser essencial para a existência dessas coisas. Podem ser acidentais, secundárias e muitas vezes as próprias coisas em si. São valores, uma vez que são essenciais para a existência, não só do homem, mas para a existência do universo. Assim, os valores éticos são determinantes para as atitudes humanas, cabendo ao direito a ação sobre atitudes que não condizem com o que a sociedade necessita. Saiba mais Entenda um pouco mais dos conceitos de ética, moral e direito num exemplo aplicado à administração pública. Assista ao vídeo a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=NVdgp7XZl2w TEMA 5: A VERDADE, A RESPONSABILIDADE, A LIBERDADE E OS VALORES ÉTICOS O filósofo contemporâneo espanhol Fernando Savater expõe em seu livro intitulado Ética para meu filho, a seguinte questão: o que é ética? Aqui, vamos trabalhar sobre a verdade, a responsabilidade, a liberdade e os valores éticos de uma forma gostosa na leitura de um breve trecho da resposta do autor para seu filho adolescente. “Há ciências que estudamos por simples interesse de saber coisas novas; outras, para adquirir uma habilidade que nos permita fazer ou utilizar alguma coisa; a maioria, para conseguir um trabalho e ganhar a vida com ele. 16 Se não sentirmos curiosidade nem necessidade de realizar esses estudos, poderemos prescindir deles tranquilamente. Há uma infinidade de conhecimentos muito interessantes, mas sem os quais podemos nos arranjar muito bem para viver. Eu, por exemplo, lamento muito não ter nem ideia de astrofísica ou de marcenaria, que dão tanta satisfação a outras pessoas, embora essa ignorância nunca me tenha impedido de ir sobrevivendo até hoje. E você, se não me engano, conhece as regras do futebol, mas é bem fraco em beisebol. Não tem maior importância, você desfruta os campeonatos mundiais, dispensa olimpicamente a liga americana e todo o mundo sai satisfeito. O que eu quero dizer é que certas coisas, podem ser apreendidas ou não, conforme a vontade da pessoa. Como ninguém é capaz de saber tudo, o remédio é escolher e aceitar com humildade o muito que ignoramos. É possível viver sem saber astrofísica, marcenaria, futebol e até mesmo sem saber ler e escrever: vive-se pior, decerto, mas vive-se. No entanto, há outras coisas que é preciso saber porque, por assim dizer, são fundamentais para nossa vida. É preciso saber, por exemplo, que saltar de uma varanda do sexto andar não é bom para a saúde; ou que uma dieta de pregos (perdoem-me os faquires!) e ácido prússico não nos permitirá chegar à velhice. Também não é aconselhável ignorar que, se dermos um safanão no vizinho cada vez que cruzarmos com ele, mais cedo ou mais tarde haverá consequências muito desagradáveis. Pequenezas desse tipo são importantes. Podemos viver de muitos modos, mas há modos que não nos deixam viver. Em resumo, entre todos os saberes possíveis existe pelo menos um imprescindível: o de que certas coisas nos convêm e outras não. Certos alimentos não nos convêm, assim como certos comportamentos e certas atitudes. Quero dizer, é claro, que não nos convêm se desejamos continuar vivendo. Se alguém quiser arrebentar-se o quanto antes, beber lixívia poderá ser muito adequado, ou também cercar-se do maior número possível de inimigos. Mas, de momento, vamos supor que preferimos viver, deixando de lado, por enquanto, os respeitáveis gostos do suicida. Assim, há coisas que nos convêm, e o que nos convém costumamos dizer que é “bom”, pois nos cai bem; outras, em compensação, não nos convêm, caem-nos muito mal, e o que não nos convém dizemos que é “mau”. Saber o que nos convém, ou seja, distinguir entre o bom e o mau, é um conhecimento que todos nós tentamos adquirir – todos, sem exceção – pela compensação que nos traz. 17 Como afirmei antes, há coisas boas e más para a saúde: é necessário saber o que devemos comer, ou que o fogo às vezes aquece e outras vezes queima, ou ainda que a água pode matar a sede e também nos afogar. No entanto, às vezes as coisas não são tão simples: certas drogas, por exemplo, aumentam nossa energia ou produzem sensações agradáveis, mas seu abuso contínuo pode ser nocivo. Em alguns aspectos são boas, mas em outros são más: elas nos convêm e ao mesmo tempo não nos convêm. No terreno das relações humanas, essas ambiguidades ocorrem com maior frequência ainda. A mentira é, em geral, algo mau, porque destrói a confiança na palavra – e todos nós precisamos falar para viver em sociedade – e provoca inimizade entre as pessoas; mas às vezes pode parecer útil ou benéfico mentir para obter alguma vantagem, ou até para fazer um favor a alguém. Por exemplo, é melhor dizer ao doente de câncer incurável a verdade sobre seu estado, ou deve-se enganá-lo para que ele viva suas últimas horas sem angústia? A mentira não nos convém, é má, mas às vezes parece acabar sendo boa. Procurar briga com os outros, como já dissemos, em geral é inconveniente, mas devemos consentir que violentem uma garota diante de nós sem interferir, sob pretexto de não nos metermos em confusão? Por outro lado, quem sempre diz a verdade – doa a quem doer – costuma colher a antipatia de todo o mundo; e quem interfere ao estilo Indiana Jones para salvar a garota agredida tem maior probabilidade de arrebentar a cabeça do que quem segue para casa assobiando. O que é mau às vezes parece ser mais ou menos bom e o que é bom tem, em certas ocasiões, aparência de mau. Haja confusão! [...] Resumindo: ao contrário de outros seres, animados ou inanimados, nós homens podemos inventar e escolher, em parte, nossa forma de vida. Podemos optar pelo que nos parece bom, ou seja, conveniente para nós, em oposição ao que nos parece mau e inconveniente. Como podemos inventar e escolher, podemos nos enganar, o que não acontece com os castores, as abelhas e as formigas. De modo que parece prudente atentarmos bem para o que fazemos, procurando adquirir um certo saber-viver que nos permita acertar. Esse saber-viver, ou arte de viver, se você preferir, é o que se chama de ética.” Assim, podemos perceber que quando se fala em comportamento humano,no que diz respeito às escolhas a serem feitas entre o bem e o mal, o certo e o errado, o permitido e o proibido, há o envolvimento de questões 18 éticas, morais e de direitos que devemos nos atentar, fazendo com que a verdade, a responsabilidade a liberdade e os valores, sejam cerceados pelos três conceitos. Saiba mais Para complementar seus estudos, leia o artigo A liberdade em Jean- Paul Sartre: responsabilidade, angústia e má-fé, disponível a seguir: https://colunastortas.wordpress.com/2015/08/20/a-liberdade-em-jean- paul-sartre-responsabilidade-angustia-e-ma-fe/ TROCANDO IDEIAS Muito bem! Chegou o momento de trocar ideias com seus colegas de turma no fórum desta disciplina. Para a discussão de hoje, acesse o Ambiente Virtual de Aprendizagem e responda as seguintes questões, retiradas do livro de Alencastro: 1. Os grupamentos humanos têm mesmo a necessidade de adotarem regras de conduta para poderem sobreviver? 2. Há mesmo lugar para a ética nas atividades práticas cotidianas? Há espaço para a ética, por exemplo, no mundo dos negócios? 20 SÍNTESE Estudamos neste material didático alguns aspectos da ética, da moral e do direito. Entende-se que a convivência em sociedade deve ocorrer em ordem. Para tanto, devem existir regras, leis e normas que regulem o relacionamento humano e sirva de orientação quanto ao que é certo ou errado, justo ou injusto, lícito ou ilícito, permitido ou proibido. Vários filósofos se preocuparam com a Ética, tendo sido Sócrates o que deu início a uma reflexão sistemática da virtude e da justiça. Fechamos com o filósofo contemporâneo Fernando Savater, que aborda a verdade, a liberdade e os valores éticos com uma resposta para seu filho adolescente. REFERÊNCIAS ALENCASTRO, M. A importância da Ética. UNESP, 1997. Disponível em: <http://www.feis.unesp.br/Home/departamentos/fitotecniatecnologiadealimentos esocioeconomia716/antoniolazarosantana/a-importancia-da-etica-soc-e- etica--2014.pdf> Acesso em 03/12/2015. __________. Ética Empresarial na prática: liderança, gestão e responsabilidade corporativa. Curitiba: Intersaberes, 2013. BITTAR, C.E.B.; ALMEIDA, G.A. Curso de Filosofia do Direito. 8ª ed. rev. aum. São Paulo: Atlas, 2010. CHAUI, M. Convite à filosofia. 13ª ed. São Paulo: Ática, 2008. CORTELLA, M. S. Qual é a tua obra?: inquietações propositivas sobre gestão, liderança e ética. Petrópolis: Vozes, 2007. ÉTICA EMPRESARIAL. Entrevista com Maria do Carmo Whitaker (2007). Disponível em: <http://www.eticaempresarial.com.br/site/pg.asp?pagina=detalhe_artigo&codigo 21 =190&tit_pagina=ENTREVISTAS&nomeart=n&nomecat=n> Acesso em 18/11/2015 LEITE, F. T. Manual de Filosofia Geral e Jurídica – das origens a Kant. 2ª ed. rev. amp. Rio de Janeiro: Forense, 2008. MOORE, G.E. Princípios éticos. 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