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23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 1/15 Lição 06 A sociedade pela ótica da arte Começar a aula 1. Introdução A Sociologia e a Antropologia sempre se interessaram pelo estudo da arte, pois as expressões artísticas de um povo sempre revelaram aspectos importantes sobre sua visão de mundo, suas práticas e seus significados. Essa disposição dos pesquisadores em estudar as diversas manifestações artísticas de seu tempo, se deve à própria afirmação da arte como área estratégica de pesquisa da vida social, e por isso as investigações se multiplicam. Mais do que a discussão sobre a originalidade ou a representatividade da arte ou do objeto artístico, o objetivo das Ciências Sociais é promover o estudo da arte como acontecimento da vida social, inserida no contexto do corpo social e como expressão de uma realidade social, utilizando, para isso, as ferramentas de estudo e interpretação das Ciências Sociais. Nessa perspectiva, podemos perceber como a arte revela um olhar sobre a realidade e promove uma certa interpretação da sociedade e das relações humanas; um olhar que não se restringe ao científico e racional, mas que se permite transitar em outras esferas da vida e trazer à tona elementos ocultos à análise mais imediata. O objetivo desse tópico será trazer o universo da arte para dialogar com as questões sociais contemporâneas, refinando nosso olhar para o significado das expressões artísticas ao nosso redor e de sua força na mentalidade popular. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 2/15 2. Literatura e ideologia: Dostoievski No século XIX, a melhor maneira de comunicar publicamente uma ideia era através da Literatura. Não havia cinema, nem televisão, nem rádio; apenas jornais e livros impressos, e alguns escritores começaram a utilizar essas ferramentas para dialogar com o mundo, propondo ideias e gerando discussões públicas. Um desses escritores foi Fiódor Dostoiévski, um russo nascido em 1821, que provocou muitas discussões por causa das ideias expressas em seus livros e pela força humana de seus personagens. Sua obra mais conhecida é Crime e Castigo, publicada em 1866. Crime e Castigo, obra em que toda a intensidade e a complexidade de Dostoiévski está desenvolvida em seus personagens, gira em torno do crime cometido por Raskolnikov, motivado pelas ideias radicais de seu tempo. Assim, Dostoievski faz uso das ideias e das personalidades de sua época e de sua sociedade para construir sua obra de ficção; seu objetivo era promover uma discussão com seus leitores sobre as ideias correntes naquele período histórico e sobre as consequências de colocá-las em prática. Na década de 1860, havia uma ideia bastante difundida entre os intelectuais europeus, a de que existiam dois tipos de humanos: os ordinários e os extraordinários. Os homens extraordinários seriam um grupo de pessoas, com características especiais dadas pela natureza, que poderiam dispor da vida de terceiros (os homens ordinários) para realizar seus objetivos de conquista. Segundo o próprio personagem Raskolnikov, que explica essas ideias a outro personagem, Dostoievski foi um grande gênio da literatura, chamado por muitos de escritor-filósofo. Seus livros não eram apenas boas histórias com bons enredos, mas um mergulho investigativo e reflexivo na alma humana. https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image1-2-768x491.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 3/15 Quanto à minha divisão dos seres em ordinários e extraordinários, convenho que é um pouco arbitrária, mas ponho de parte a questão de egoísmo, que não faz nada ao caso. Simplesmente julgo que, no fundo, o meu pensamento é justo. Quero estabelecer o princípio de que a natureza divide os homens em duas classes: uma inferior, a dos ordinários, espécie de matéria, tendo por única missão reproduzir-se; a outra superior, compreendendo os homens que têm o dever de lançar no seu meio uma inovação. Os “homens extraordinários” são os que fazem a história; são os grandes imperadores, os grandes ditadores, aqueles que matam milhões em nome de seus sonhos megalomaníacos de conquistas imperiais, tanto que o grande exemplo de homem extraordinário citado pelo personagem é Napoleão Bonaparte, um exemplo historicamente muito próximo dos russos e que tentou dominar a Rússia. No entanto, a maioria dos homens são “ordinários”, ou seja, homens comuns, obedientes à lei e sem planos grandiosos de conquista material. Sofrimento e dor seriam características inatas de suas consciências fracas e seu espírito pobre, e por isso deveriam estar à disposição dos intentos dos homens “extraordinários”. Para Dostoiévski, essa ideia era absurda e socialmente tóxica, pois desvalorizava a vida de uns e supervalorizava a vida de outros, que se impunham e se justificavam por suas ideologias. Para criticar essa ideologia desumanizante, Dostoiévski cria o personagem Raskolnikov, que encarna essas ideias e as coloca em prática, sofrendo as consequências dessa escolha. Segundo Luiz Felipe Pondé (2004), a raiz ideológica dessa atitude de desvalorização da vida está nos escritos de Maquiavel e nos feitos de Napoleão, que acreditavam que se pode matar algumas centenas de pessoas para se obter alguns benefícios para outras centenas, ou para se estabilizar uma comunidade. A vida humana é posta em segundo plano, em favor de um suposto ‘bom resultado’ social. A proposta de Raskolnikov leva a uma consequência terrível, onde existiriam uns poucos homens excelentes e uma grande parcela de homens banais e descartáveis, e foi justamente isso que levou a humanidade a aceitar a liderança de homens como Hitler, Stálin, Pol Pot e outros líderes insanos que, na luta pelo poder, eliminam qualquer um que se oponha aos seus objetivos. Na década de 1860, na Rússia, essas ideias ficaram conhecidas como niilismo e fizeram parte do contexto histórico e social em que Crime e Castigo foi escrito. Dostoievski sabia que essas ideias circulavam entre os jovens e que muitos se identificavam com elas. Muitos escritores políticos radicais publicavam nessa época, e Chernichevski talvez fosse um dos mais influentes. De acordo com Pondé (2003, p. 219), o livro O que deve ser feito, de Chernichevski, a obra que mais marcou os últimos quarenta anos do século XIX na Rússia. Esse livro é uma espécie de agenda do que o intelectual russo deveria fazer para criar um novo mundo, ao operar a transposição do projeto socialista moderno para a Rússia. Não é à toa que Joseph Frank o aponta como o livro de cabeceira de Lênin. Chernichevski dá, nessa obra, como já apontamos, toda a agenda da modernização, a agenda dos indivíduos ‘extraordinários’, a agenda da destruição da tradição – o primeiro passo do revolucionário –, pois, enquanto isso não for feito, o indivíduo permanece assombrado pelo passado. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 4/15 Mais do que uma preocupação estética ou artística com sua obra, Dostoievski se preocupava com seu impacto social, pois temia que as ideias radicais de sua época ganhassem força e levassem as pessoas a uma revolução social, com muita violência e derramamento de sangue, em nome de ideologias políticas. E isso de fato aconteceu, na Revolução Russa de 1917, quando as ideias revolucionárias socialistas ganharam força e milhões de pessoas foram mortas, em nome do triunfo de uma ideologia política e econômica radical. Joseph Frank (2003), estudioso e biógrafo de Dostoievski, especula que um dos objetivos dessa obra foi atentar para o fato de que as perigosas ilusões dos radicais podem afetar apersonalidade humana em geral, levando pessoas comuns a cometerem atos violentos em nome de ideologias. Foi assim que Dostoievski enxergou a sociedade e a expressou pela ótica da arte. 3. Marcel Duchamp e o que é arte Marcel Duchamp (1887-1968) foi um famoso pintor e escultor francês, que ficou mais conhecido por seus questionamentos quanto ao conceito de arte. Alguns críticos de arte argumentam que Duchamp fazia parte do dadaísmo, movimento artístico que promoveu uma ruptura com os modelos tradicionais de arte, usou diferentes formas de expressão, diferentes conceitos e diferentes materiais na composição das obras de arte, o que para muitos leigos pareciam conteúdos e temas sem lógica. Utilizando objetos industriais prontos e elementos do cotidiano, produzidos apenas com a finalidade utilitária e comercial, ou seja, sem uma finalidade artística, Duchamp os transformou em obras de arte, e com isso questionou sobre o verdadeiro conceito de arte. Sua obra de arte intitulada “A fonte” (1917), era constituída de um mictório de louça, datado e assinado como qualquer outra obra de arte, e foi submetido à avaliação de uma banca de críticos de arte com o objetivo de ser aceita numa exposição. “A fonte” não foi aceita pelos críticos para participar da exposição, mas essa atitude de Marcel Duchamp deu origem ao questionamento sobre o que é arte; também gerou o questionamento do porquê a obra de arte precisa ser reconhecida por críticos de arte para ser considerada arte. A obra A fonte, de Marcel Duchamp, em que ele assina sob o pseudônimo de R. Mutt https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image3-2.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 5/15 Duchamp foi o criador do conceito de ready made, que é o transporte de um elemento da vida cotidiana, a princípio não reconhecido como elemento artístico, para o campo das artes. A partir disso, o conceito de arte sofreu diversas reconfigurações; alguns passaram a defender que a ideia que cerca um objeto artístico valeria mais do que o próprio objeto, pois o objetivo do objeto artístico (um quadro, uma escultura, um filme, etc.) seria comunicar uma ideia, gerar uma reflexão. Nesse caso, não importa se o objeto é produzido pelo artista (uma escultura, por exemplo) ou comprado de uma indústria (o mictório, por exemplo); o que importa é a mensagem que o artista quer transmitir. Assim, o artista se torna dono da ideia que cerca a obra e do conceito de arte nela impregnado, mesmo não sendo o criador do objeto. Para Marcel Duchamp o importante não era apenas pintar ou esculpir, mas inovar, com o intuito de estimular o pensamento crítico das pessoas e fazê-las refletir sobre o significado da existência ao seu redor. 4. Picasso e a insanidade da guerra “O que é que você acredita que seja um artista? Um imbecil que só tem olhos, se for pintor; ouvidos, se for músico; ou uma lira em todos os andares do coração, se for poeta; ou, mesmo, se for boxeur, somente músculos? Muito pelo contrário. O artista é, basicamente, um ser político, constantemente alerta perante os dilacerantes, ardentes ou doces acontecimentos do mundo, moldando-se inteiramente à sua imagem. Como seria possível desinteressar-se dos outros homens, e em virtude de que uma vida que eles nos trazem tão abundantemente? Não, a pintura não foi feita para decorar as habitações. É um instrumento de guerra, ofensivo e defensivo, contra o inimigo”. O século XIX e o começo do século XX foram marcados por profundas mudanças históricas, que afetaram drasticamente a vida nas sociedades e os padrões sociais. Mudanças como a industrialização, a urbanização crescente e o aprofundamento das diferenças entre alta burguesia e proletariado, reforçaram as bases do capitalismo e as inovações tecnológicas se tornaram constantes. A obra Guernica, de Pablo Picasso. https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image4-3-768x334.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 6/15 A invenção da fotografia, na década de 1830, liberou as artes plásticas para produzirem arte que não fosse figurativa, ou seja, que não reproduzisse a realidade com perfeição, como numa fotografia. Refletindo essas mudanças complexas e suas contradições, as ansiedades e aspirações das pessoas dessa época, muitos movimentos artísticos surgiram, principalmente na Europa, dando espaço de expressão para as angústias e questões desse novo momento histórico. Assim, os movimentos e as tendências artísticas, tais como o Expressionismo, o Cubismo, o Futurismo, o Abstracionismo, o Surrealismo, entre outros, expressaram as perturbações sociais e psicológicas do homem contemporâneo. O Expressionismo, por exemplo, surge como expressão das emoções humanas, traduzindo em traços e cores vibrantes os sentimentos e os anseios do homem moderno, como as mudanças nos hábitos cotidianos, a miséria nas grandes cidades, a solidão e as angústias da vida urbana. Já no Cubismo, há uma despreocupação em representar realisticamente as formas de um objeto, tendo como objetivo representar, em um único plano, um mesmo objeto visto de vários ângulos. Com o tempo, o Cubismo mudou para sempre a forma de ver a realidade e interpretar as formas. Por conta da revolução técnico-científica da industrialização, muitos pintores, entre eles o famoso Pablo Picasso, começaram a criar novas maneiras de fazer sua arte. Começavam a surgir as ideias cubistas e as pessoas começavam a enxergar as coisas com olhares diferenciados. O quadro Guernica, de Pablo Picasso, foi produzido em 1937 e figurou numa exposição em Paris dominada pela apresentação de obras de arte dos países totalitários, como Alemanha, Itália e União Soviética que, diferentemente dos movimentos artísticos modernos, essas ditaduras traziam obras marcadas pela utilização de elementos clássicos e neoclássicos em suas composições. O estilo de Picasso seria uma contraposição estética aos modelos artísticos dos regimes ditatoriais, o que fez da exposição uma arena ideológica de questionamento político. Inicialmente, Picasso escolhera como tema de sua obra “o pintor e seu modelo”, mas após a notícia sobre o bombardeio da cidade de Guernica, o artista alterou seu projeto; baseado no massacre ocorrido, Picasso pintou um grande painel, que seria símbolo não só da destruição e da dor, mas o marco da sua obra e do seu estilo. Segundo contam alguns historiadores de arte, apesar de não se saber se o fato realmente ocorreu, ao ser perguntado por um general nazista se fora ele, Picasso, que tinha feito aquilo, referindo-se ao painel Guernica, Picasso prontamente respondeu: “não fui eu que fiz, foram vocês”. Você sabia? Guernica se tornou um manifesto contra o ditador espanhol Francisco Franco, que em julho de 1936 deu o golpe de Estado contra o governo espanhol e, no ano seguinte, bombardeou a cidade espanhola de Guernica, com ajuda da Alemanha nazista. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 7/15 Guernica, uma tela em óleo de Pablo Picasso, grandiosa em todos os aspectos, a obra registra o horror sentido pelo artista diante das fotos que retratavam o bombardeio sofrido pela cidade de Guernica, antiga capital basca, durante a Guerra Civil Espanhola, em 26 de abril de 1937. Em Guernica, lê-se os destroços de uma contemporaneidade sem datas, marcada pela descontinuidade e incerteza. Produzida em tons de preto, branco e cinza, com alguns traços amarelos, a obra traduz os sentimentos intensos do pintor ante a destruição da cidade e da morte dos homens e animais. Mesmo afixada na parede, a tela não parece imóvel, mas dá movimento aos seres e coisas, sobrepostos uns aos outros, expressando dor e desordem. Nessa perspectiva, a obra de artese torna uma arma de conscientização humana sobre os horrores da guerra e sobre a má intenção de ditadores, que tomam o poder em nome da ordem e derramam muito sangue para cumprirem seus objetivos. 5. Protesto e cultura da periferia As periferias das grandes cidades, chamadas no Brasil de favelas, sempre tiveram uma grande potência de expressão artística. Mergulhados nos problemas e contradições dos ambientes urbanos, os artistas das periferias sempre expressaram sua relação com a sociedade, expondo também suas experiências, suas maneiras de ver o mundo e de interpretar a realidade. Uma das expressões artísticas mais relevantes desse cenário é o rap, (sigla para Rhythm And Poetry – ritmo e poesia) estilo musical surgido no distrito nova-iorquino do Bronx. No entanto, apesar do rap ter surgido nos Estados Unidos, num contexto de periferia de Nova Iorque, o estilo musical ganhou adeptos no mundo todo. Segundo Loureiro (2016) De fato, se por aqui (Brasil) o rap sofreu influência do rap estadunidense, este não deixou de ser experimentado em conexão com a particularidade do contexto social, cultural e artístico em que respiravam os jovens das periferias brasileiras. É importante notar que a difusão do rap para além das fronteiras dos Estados Unidos também se refere à propagação entre subalternos de algo que cativa, diz respeito e faz sentido. Uma rede comunicacional de periferia para periferia forjada sobre a experiência comum que normalmente conjuga exploração de classe e opressão étnico-racial. A esse respeito, lembro aqui de Tony Mitchell, organizador de um trabalho que traz informações de outros doze estudiosos do rap e do hip- hop em 25 países de cinco continentes. Mitchell acentua que a análise da ocorrência do rap no mundo não deve ignorar sua manifestação – muitas vezes numa dimensão comunitária e fora do campo de cobertura dos grandes veículos de comunicação – como expressão da realidade social de oprimidos de contextos variados, ou seja, como canal capaz de associar apropriações e sincretismos que transcendem a simples assimilação musical, linguística e cultural do rap estadunidense. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 8/15 Nessa perspectiva, o rap se tornou um modo de comunicar uma experiência social urbana, que se repete em praticamente todas as grandes cidades do mundo. Assim, moradores de periferias ao redor do mundo identificam no rap uma linguagem comum de luta contra a opressão, ou apenas uma forma de expressão cultural surgida nos guetos e que expressa a ótica de seus moradores. Das periferias de São Paulo, por exemplo, surgiu a mais famosa banda de rap nacional, os Racionais MC’s, que com suas letras diretas e socialmente conscientes, denunciam as enormes desigualdades econômicas, a violência policial, a corrupção das instituições sociais, gerando reflexão entre os moradores da periferia sobre seu lugar na sociedade. Segundo Maria Rita Kehl (1999), estudiosa da cultura da periferia, O tratamento de “mano” não é gratuito. Indica uma intenção de igualdade, um sentimento de fratria, um campo de identificações horizontais, em contraposição ao modo de identificação/dominação vertical, da massa em relação ao líder ou ao ídolo. As letras são apelos dramáticos ao semelhante, ao irmão: junte-se a nós, aumente nossa força. Fique esperto, fique consciente – não faça o que eles esperam de você, não seja o “negro limitado” (título de uma das músicas de Brown) que o sistema quer, não justifique o preconceito dos “racistas otários” (título de outra música). A força dos grupos de rap não vem de sua capacidade de excluir, de colocar-se acima da massa e produzir fascínio, inveja. Vem de seu poder de inclusão, da insistência na igualdade entre artistas e público, todos negros, todos de origem pobre, todos vítimas da mesma discriminação e da mesma escassez de oportunidades. (...) Toda a combatividade afirmada pelos Racionais está relacionada à recusa em mascarar a injustiça social e ao papel do rap no que diz respeito à reflexão política. A palavra é a arma que se empunha e a perspectiva de luta deve ser coletiva: “Eu sou apenas mais um rapaz latino-americano/ Apoiado por mais de 50 mil manos”. Nesse caso, o rap é uma conscientização de uma situação de opressão e exploração, experimentada coletivamente por todos os habitantes das periferias do mundo; é também um diálogo direto da periferia com o resto da sociedade, denunciando atitudes e preconceitos que perpetuam essa divisão social. Segundo Oliveira et al (2013), no artigo Vozes periféricas: expansão, imersão e diálogo na obra do Racionais MC’s, O CD que projetou os Racionais MC’s para todo o Brasil foi Sobrevivendo no inferno, com letas marcantes e combativas, questionando a realidade social. https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image6-2-768x767.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 9/15 Edy Rock, integrante dos Racionais MC’s, afirma em entrevista à revista Raça que o CD Sobrevivendo no inferno, lançado em 1997, “é a foto da periferia, da favela, do dia a dia nosso e de muita gente que a gente conhece”. As palavras do rapper remetem-nos à proposta de construir um “retrato” da periferia, realidade compartilhada por uma comunidade da qual fazem parte os próprios integrantes dos Racionais. Nesse sentido, o CD apresenta-se permeado por uma abordagem crítica acerca da sociedade e sua relação com os habitantes da periferia, com especial atenção para a posição do negro. A representação que se constrói da vida na favela é a de um “campo minado”, em que imperam a desumanização e a violência generalizada. O tema da violência é central na obra dos Racionais MC’s, pelo constante abuso de autoridade da polícia nas favelas; no entanto, denunciam também a violência que transcende seu sentido mais óbvio e midiático, que é a violência social, imposta de cima para baixo, como consequência das profundas desigualdades na sociedade. 5.1. Funk Carioca Numa pesquisa feita em 1987, por Hermano Vianna (1990), aconteciam cerca 600 bailes funk por fim de semana no Rio de Janeiro, atraindo um público de um milhão de pessoas; esses números colocavam o baile funk, já naquela época, como a principal opção de diversão entre os cariocas. Desde então, o funk carioca veio ganhando cada vez mais espaço nas festas e rádios ao redor do Brasil e do mundo, e hoje é uma das referências musicais mais presentes na cultura brasileira. Palombini (2009), falando sobre a história do funk carioca e suas origens, argumenta que A música que hoje conhecemos como funk carioca não deriva diretamente do funk norte- americano, mas de uma variedade de hip-hop conhecida como Miami bass. O nome “funk” aderiu à música em função de sua gestação na cena dos bailes funk cariocas dos anos oitenta, movidos a funk e rap norte-americanos. Estes, por sua vez, constituem um desenvolvimento dos bailes black cariocas dos anos setenta, movidos a soul e funk norte-americanos. De acordo com a jornalista Lena Frias, os bailes black do Rio costumavam atrair, a cada fim de semana, de quinhentos mil a um milhão e meio de jovens negros ou identificados com a negritude — isto é, com a pobreza — dos subúrbios do Rio de Janeiro para dançar ao som de James Brown e outros soul brothers em grandes festas promovidas por equipes de som que chegavam a congregar quinze mil pessoas. Como a house de Chicago, o funk carioca resulta da apropriação criativa de tecnologia barata por não-músicos para a produção de música destinada a setores marginalizados da população: jovens negros habitantes de regiões urbanas economicamente muito deprimidas do Rio de Janeiro no final dos anos oitenta. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=0610/15 Objeto de constante preocupação da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, essas manifestações populares da periferia sofreram proibições oficiais a partir do ano 2000, com a aprovação da Cláusula 6 da Lei 3410 de 29 de maio de 2000, que determinava ficarem “proibidos a execução de músicas e procedimentos de apologia ao crime nos locais em que se realizam eventos sociais e esportivos de qualquer natureza”. Araújo (2009) faz a seguinte recapitulação histórica sobre as mudanças que foram acontecendo: Esta lei foi revogada e substituída pela Lei 5265 de 18 junho de 2008, ainda mais repressiva, reprimindo também as raves. No entanto, em 22 de setembro de 2009, a Lei 5265 foi revogada pela Lei 5544, assinada pelos deputados Marcelo Freixo e Paulo Melo, através da qual os bailes funk e as raves cessaram de estar sujeitos a legislação discriminatória. Ainda em 22 de setembro, a Lei 5543, de Marcelo Freixo e Wagner Montes, determinou que: (1) o funk [carioca] é um movimento cultural e musical de caráter popular; (2) o poder público deve garantir a realização de seus eventos — festas, bailes e encontros — sem quaisquer regras discriminatórias diferentes daquelas que regem outros eventos da mesma natureza; (3) as questões relativas ao funk devem ser tratadas preferencialmente no âmbito das organizações públicas de cultura; (4) fica proibido todo o tipo de discriminação e preconceito, seja de natureza social, racial, cultural ou administrativa, contra o movimento funk e seus integrantes; (5) os artistas do funk são agentes da cultura popular e, como tal, seus direitos devem ser respeitados. O funk carioca gerou expressões artísticas bastante diferentes do rap paulista, com temáticas diferentes e estilos musicais diferentes; o fato é que ambos agregaram milhões de pessoas ao redor do Brasil e modificaram a cena da música brasileira, penetrando em todas as outras camadas sociais e ajudando, inclusive, a animar as festas de classe média alta das grandes cidades, como relata o funk Som de preto, de Amilcka e Chocolate: É som de preto, de favelado Mas quando toca ninguém fica parado O nosso som não tem idade, não tem raça e não tem cor Mas a sociedade pra gente não dá valor Só querem nos criticar pensam que somos animais... 6. Os muros e paredes como obras de arte Pichação, tecnicamente falando, é o ato de escrever ou rabiscar em muros, fachadas de prédios, asfalto ou monumentos, usando tinta em spray aerosol, estêncil ou rolo de tinta. Na perspectiva dos significados sociais, pichação é uma forma de expressão humana muito antiga, encontrada, por 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 11/15 exemplo, nos muros de cidades do império romano, contendo desde poesias até xingamentos e propaganda política. Nos ambientes urbanos da atualidade, a pichação pode conter frases de protesto ou insulto, assinaturas pessoais ou mesmo declarações de amor; também é muito utilizada como forma de demarcação de territórios entre grupos rivais, às vezes gangues de traficantes em certas localidades. No Brasil, a pichação é considerada vandalismo e crime ambiental, nos termos do art. 65 da Lei 9.605/98 (Lei dos Crimes Ambientais); no entanto, a pichação brasileira é reconhecida mundialmente como um fenômeno artístico legítimo, por suas letras possuírem um desenho singular e reconhecível. Já o grafite é uma forma de expressão bem mais elaborada e de maior interesse estético, que nas últimas décadas vem despertando a atenção dos moradores das cidades e provocando polêmicas nas políticas governamentais, ganhando espaço no circuito das artes e suscitando pesquisas acadêmicas. Alguns o interpretam como arte, enquanto outros a veem como poluição visual, mas o fato é que os grafites já fazem parte do nosso cotidiano. Atualmente, o grafite é socialmente aceito como forma de expressão artística contemporânea, e tende a ser feito em locais permitidos ou mesmo destinados à sua realização. Um grafiteiro que ganhou bastante notoriedade e se transformou num artista plástico mundialmente famoso foi Jean Michel Basquiat. No final dos anos 1970 e início dos 80, Basquiat despertou a atenção da imprensa nova-iorquina, principalmente pelas mensagens poéticas que deixava nas paredes dos prédios abandonados de Manhattan. Basquiat ganhou o rótulo de neo- expressionista e foi reconhecido como um dos mais significativos artistas do final do século XX. Um dos mais famosos grafiteiros da atualidade é conhecido pelo pseudônimo Banksy. Suas obras foram produzidas nos muros de cidades da Inglaterra desde o começo dos anos 2000, propagando- se por muitas outras cidades ao redor do mundo, como países da Europa, América Latina e até o muro que separa Israel da Palestina. Em matéria da revista Superinteressante (2016), percebemos seu impacto no mundo da arte e nos ambientes urbanos de vários países: Jean Michel Basquiat foi um grafiteiro que teve sua obra supervalorizada pelos críticos de arte, principalmente pelo famoso artista pop Andy Warhol, e seus grafites se tornaram famosos. https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image7-1-768x576.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 12/15 Banksy tornou-se o anônimo mais famoso dos últimos anos. Seu trabalho mudou o olhar sobre a arte de rua. Com spray, faz críticas políticas, à sociedade e à guerra, mas sempre com um humor sombrio e uma sacada. Também se especializou em ações espetaculares, como na vez em que pôs um boneco vestido de prisioneiro de Guantánamo dentro da Disneylândia. “Não é sobre o hype, não é sobre o dinheiro”, Banksy diz em seu documentário. Mas, mesmo idealista, anônimo e contra o sistema, Banksy está inserido no mundo da arte. “Ele é parte de uma geração que olhou para fora do sistema convencional de galerias, no jeito de exibir uma obra”, observa Gill Saunders, curadora do museu Victoria & Albert, em Londres, que tem 4 peças suas. A arte de Banksy é uma prova de que a arte não se restringe mais aos museus e às galerias de arte, aos ambientes restritos e elitizados da classe média alta, e suas diversas expressões ganharam as ruas e marcaram os muros, levando as pessoas a uma reflexão sobre a sociedade global em que vivemos e suas contradições. Dois artistas que representam muito bem a arte brasileira ao redor do mundo são os Gêmeos. Gustavo e Otávio Pandolfo (1974) nasceram em São Paulo e desenvolveram um modo único de se expressar através do grafite, criando uma identidade visual própria e reconhecível em qualquer lugar do mundo. Em conexão com a cultura Hip Hop e seu universo imaginativo, OSGÊMEOS deixaram sua marca nos muros e construções de diversas cidades do mundo. Soldier throwing flowers mostra um cidadão de rosto coberto atirando um ramo de flores, ao invés de um objeto de guerra, e é uma provocação aos que recorrem à violência para alcançar seus objetivos. Obra de OSGÊMEOS produzida em alguma construção ao redor do mundo. 7. Matrix e o aprisionamento da realidade https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image8.jpeg https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image9.png 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 13/15 social Na virada do século XX, uma obra cinematográfica ganha as atenções da crítica e dos intelectuais ao redor do mundo. Utilizando recursos tecnológicos inovadores e conceitos diversos de filosofia e física quântica, Matrix (1999, direção: Lilly Wachowski e Lana Wachowski) trouxe muitas discussões sobre a humanidade para a tela do cinema; entre elas a discussão sobre nossa escravidão em relação a um sistema de governo das máquinas. Logo no início do filme, quando o protagonista e hacker Neo vai entregar um objetoa outro personagem, ele o retira de dentro do livro Simulacros e Simulação, do filósofo e sociólogo francês Jean Baudrillard. Segundo Baudrillard (1991), a pós-modernidade é a “era do simulacro“, em que o mundo real é substituído por uma versão simulada da realidade. Ou seja, vivemos numa simulação tão parecida com a realidade, que não conseguimos distinguir entre ilusão e verdade. Para Baudrillard, as definições que criamos para dar significado à realidade são tão artificiais, que artificializam a relação que estabelecemos com as pessoas e as coisas. É o que ele chama de Hiper- realidade. Isso se dá porque os ambientes urbanos nos impedem de termos contato com a natureza, nos aprisionando em apartamentos, shoppings, escolas, empresas; nosso intelecto e nossas emoções são formatados pelas mídias de massa e redes sociais, nossos desejos são capturados pela publicidade e nossa espiritualidade é capturada pela religião. Assim, criamos uma versão simulada da realidade. E nossos smartphones se tornaram nosso controle remoto, onde produzimos nossas vidas na virtualidade. A trilogia Matrix dialoga profundamente com o estilo de vida pós-moderno, com o hinduísmo, com o budismo, e outras interpretações de mundo, criando uma aventura cibernética, cheia de efeitos especiais inovadores para a época, onde a humanidade foi dominada por máquinas dotadas de inteligência artificial. Os humanos são cultivados em cativeiro pelas máquinas e seus pensamentos são produzidos por programas de computador, que criam a ilusão de realidade. Buscando entender o que de fato a Matrix é, o protagonista Neo estabelece um diálogo com seu mestre Morpheu: O mundo à nossa volta é real ou apenas uma construção mental de nosso cérebro? Matrix nos fez pensar a realidade a partir de outros parâmetros e a questionar a natureza das coisas. https://cead.uvv.br/conteudo/wp-content/uploads/2018/10/image10.jpeg 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 14/15 Morpheu: Você acredita no destino, Neo? Neo: Não. Não gosto de pensar que não controlo minha vida. Morpheu: Sei exatamente o que quer dizer. Vou te dizer por que está aqui. Você sabe de algo. Não consegue explicar o quê. Mas você sente. Você sentiu a vida inteira: há algo errado com o mundo. Você não sabe o que, mas há. Como um zunido na sua cabeça te enlouquecendo. Foi esse sentimento que te trouxe até mim. Você sabe do que estou falando? Neo: Da Matrix. Morpheu: Você deseja saber o que ela é? Neo: Sim. Morpheu: A Matrix está em todo lugar. À nossa volta. Mesmo agora, nesta sala. Você pode vê-la quando olha pela janela ou quando liga a sua televisão. Você a sente quando vai para o trabalho, quando vai à igreja, quando paga seus impostos. É o mundo que foi colocado diante dos seus olhos para que você não visse a verdade. Neo: Que verdade? Morpheu: Que você é um escravo, Neo. Como todo mundo, você nasceu em cativeiro. Nasceu em uma prisão que não pode ver, cheirar ou tocar. Uma prisão para a sua mente. Talvez isso lhe pareça um pouco distante da “realidade”, mas você já pensou sobre a natureza da sociedade em que vivemos? Já pensou sobre as motivações de suas escolhas? Você se sente aprisionado em certas rotinas da vida? Aprisionado a certas obrigações sociais? Se a sua resposta foi sim para alguma dessas perguntas, talvez o filme Matrix possa lhe ajudar a investigar a realidade que lhe cerca e as verdadeiras motivações de suas escolhas. 8. Conclusão Espero que este tópico tenha lhe ajudado a pensar a realidade social a partir da arte. Como vimos, muitos artistas pensaram o mundo em que viviam e a realidade social que os cercava, desenvolvendo obras que dialogassem com o público e gerassem reflexões sobre o tipo de sociedade que construímos. As obras de arte têm a capacidade de provocar sensações e reflexões nas pessoas, abrindo-lhes a possibilidade de pensar o mundo a partir de outras óticas. Abra-se para a arte e deixe-a flexibilizar seus pensamentos e seus dogmas, produzindo uma realidade mais interessante para você e para as pessoas ao seu redor. 23/04/2020 A sociedade pela ótica da arte https://cead.uvv.br/graduacao/conteudo.php?aula=a-sociedade-pela-otica-da-arte&dcp=estudos-socioantropologicos&topico=06 15/15 9. Referências ARAÚJO, Samuel. Mensagem eletrônica de 2 set. 2009 à lista de discussão Etnomusicologia-BR. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/263785620_Soul_brasileiro_e_funk_carioca>. Acesso em 10 de julho de 2018. BAUDRILLARD, Jean. Simulacros e Simulação. Lisboa: Ed. Relógio D’água, 1991. FRANK, Joseph. Os Anos Milagrosos – Dostoiévski 1865 a 1871. São Paulo: Edusp, 2003. KEHL, Maria Rita. RADICAIS, RACIAIS, RACIONAIS: A GRANDE FRATRIA DO RAP. Revista São Paulo em perspectiva, 13(3) 1999. LOUREIRO, B. R. de C. Arte, cultura e política na história do rap nacional. Revista do instituto de estudos brasileiros n. 63 – abr. 2016. Disponível em: <http://www.redalyc.org/html/4056/405645350013/index.html>. Acesso em 10 de julho de 2018. OLIVEIRA, Leandro Silva de; SEGRETO, Marcelo; CABRAL, Nara Lya S. C. Vozes periféricas: expansão, imersão e diálogo na obra dos Racionais MC’s. Rev. Inst. Estud. Bras., São Paulo, n. 56, p. 101-126, jun. 2013. PALOMBINI, Carlos. 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Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-i1t-MF5MuA>. Acesso em: 10 de julho de 2018.
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