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1 Ana Luiza Azevedo de Paula Clínica Médica Clínica médica TABAGISMO O tabagismo é reconhecido como uma doença crônica causada pela dependência à nicotina presente nos produtos à base de tabaco. De acordo com a Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), o tabagismo integra o grupo de transtornos mentais e comportamentais em razão do uso de substância psicoativa. Ele também é considerado a maior causa evitável isolada de adoecimento e mortes precoces em todo o mundo. O tabaco é uma planta (Nicotiana tabacum) cujas folhas são utilizadas na confecção de diferentes produtos que têm como princípio ativo a nicotina, que causa dependência.Há diversos produtos derivados de tabaco: cigarro, charuto, cachimbo, cigarro de palha, cigarrilha, bidi, tabaco para narguilé, rapé, fumo-de-rolo, dispositivos eletrônicos para fumar e outros. O tabagismo constitui fator de risco para o desenvolvimento dos seguintes tipos de câncer: leucemia mielóide aguda; câncer de bexiga; câncer de pâncreas; câncer de fígado; câncer do colo do útero; câncer de esôfago; câncer de rim e ureter; câncer de laringe (cordas vocais); câncer na cavidade oral (boca); câncer de faringe (pescoço); câncer de estômago; câncer de cólon e reto; câncer de traquéia, brônquios e pulmão. Além de estar associado às doenças crônicas não transmissíveis, o tabagismo também é um fator importante de risco para o desenvolvimento de outras enfermidades, tais como tuberculose, infecções respiratórias, úlcera gastrintestinal, impotência sexual, infertilidade em mulheres e homens, osteoporose, catarata, entre outras. PREVALÊNCIA Desde a introdução do tabaco na sociedade moderna, o tabagismo tem sido uma experiência predominantemente masculina. Porém, com os movimentos de liberação feminina e da maior integração das mulheres à lógica de produção capitalista durante as décadas de 60 e 70 do século XX, observou-se o incremento do tabagismo entre as mulheres. O ato de fumar foi associado ao glamour, tendo como exemplo grandes estrelas de Hollywoond como Marilyn monroe, que fazia o uso do produto, gerando uma grande influência em toda população. O panorama mundial revela alta frequência de dependência do tabagismo em ambos os sexos, tanto em países desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Atualmente, existem cerca de 1,3 bilhão de pessoas fumantes no mundo, sendo um bilhão aproximadamente do sexo masculino e o restante, em muito menor proporção, do sexo feminino. Dos homens fumantes, 35% estão em países desenvolvidos e 50% em países em desenvolvimento; em relação às mulheres fumantes, 22% estão em países desenvolvidos e 9% em países em desenvolvimento. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 2 Clínica Médica – Tabagismo Quanto às tendências das prevalências mundiais de tabagismo, observa-se, nos homens, uma lenta redução da prevalência de tabagismo, tanto em países desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Tal redução tem sido maior nos homens de classes sociais mais favorecidas. A tendência da prevalência nas mulheres é diferente daquela observada no sexo masculino. Com exceção de alguns países desenvolvidos como Austrália, Canadá, EUA e Reino Unido, onde já se evidencia redução do tabagismo no sexo feminino, nos demais, encontra-se, na sua maioria, tendência de aumento do tabagismo entre as mulheres. A idade é uma variável fundamental na epidemiologia do tabagismo. Assim como o uso de outras drogas aditivas, tende a se estabelecer durante a adolescência. Quanto mais precoce a idade do início, maior a probabilidade do indivíduo tornar-se dependente da nicotina. Como consequência , os adolescentes fumantes sofrem um expressivo risco de virem a desenvolver algum tipo de câncer relacionado ainda na vida adulta produtiva, com grande repercussão em termos de anos de vida perdidos para a sociedade. Fatores ambientais, sociodemográficos, comportamentais e pessoais estão relacionados ao uso de tabaco pelos adolescentes. O tabagismo na adolescência tem sido associado ao hábito de fumar dos pais, amigos e irmãos com maior idade. Baixo rendimento nos estudos, abandono da escola e trabalho remunerado, são fatores também conectados ao tabagismo na adolescência. Desajuste familiar, separação dos pais e moradia com outras pessoas que não os pais biológicos, a baixa auto-estima e a depressão são condições que aumentam a probabilidade da fixação do tabagismo entre os adolescentes. Deve-se assinalar ainda como facilitador para a iniciação a limitada percepção entre os adolescentes do risco decorrente do tabagismo. Medidas restritivas de comercialização e consumo do tabaco nos países desenvolvidos levaram a indústria do tabaco a direcionar seus esforços de venda para países mais pobres, onde havia perspectivas de crescimento do consumo e contínua reposição de fumantes. Os alvos principais de suas campanhas promocionais têm sido os adolescentes e jovens. NICOTINA E SUA AÇÃO NO ORGANISMO A nicotina é um alcalóide policíclico sendo o composto ativo do tabaco. É uma variação do composto chamado de pirrolidina. Esse composto consiste em um ciclopentano com um de seus carbonos substituídos por um nitrogênio. Alcalóides por sua vez são compostos cíclicos formados primordialmente por carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio. Encontrados geralmente em plantas. A nicotina é um dos alcalóides que mais preocupam pela sua capacidade de dependência por ser uma das mais acessíveis para a população, já que boa parte do poder viciante do cigarro vem da nicotina presente no tabaco. Além disso, muitas das substâncias presentes no cigarro, além do tabaco, agem como reforçadores do mesmo. A fumaça inalada a partir da queima do fumo atravessa a faringe, a laringe, traqueia e invade os brônquios, seguindo na direção dos alvéolos pulmonares – estruturas em forma de saco, altamente irrigadas por pequenos vasos sanguíneos – para que as trocas de oxigênio por gás carbônico possam ser efetuadas. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 3 Clínica Médica – Tabagismo Ao chegar aos alvéolos, as gotículas de nicotina entram em contato com a infinidade de vasos sanguíneos que os irrigam, atravessam suas paredes e caem na corrente sanguínea. Dependendo da profundidade da tragada, 70 a 90% da nicotina presente na fumaça é absorvida nos alvéolos. Ao cair no interior dos milhares de vasos capilares dos pulmões, a nicotina se mistura com o sangue já oxigenado, que será levado ao coração para ser bombeado para todo o organismo. O processo é tão rápido que a nicotina atinge o cérebro entre apenas seis e dez segundos. Os neurônios de várias regiões do cérebro. O sistema nervoso possui células especiais chamadas transportadoras, que levam substâncias como os hormônios e os neurotransmissores para locais específicos no cérebro. Esses elementos têm o poder de nos excitar ou relaxar e constituem as respostas naturais que damos aos estímulos do meio ambiente. A compulsão por cigarro pode começar depois de dias da primeira utilização. A nicotina estimula os receptores colinérgicos de nicotina no cérebro, liberando dopamina e outros neurotransmissores, o que ativa o sistema de recompensa do cérebro durante atividades prazerosas, de forma semelhante à da maioria das outras drogas viciantes ( Visão geral dos transtornos relacionados a substâncias). Dopamina, glutamato e ácido gama-aminobutírico (GABA) são mediadores importantes de dependência à nicotina. Conforme a repetição diária de tragadas aumenta, maior vai ser a necessidade de aumentar a quantidade de nicotina para que haja aligação com a quantidade receptores disponíveis, que aumenta gradativamente ocasionando o vício. Além disso, a nicotina aumenta a liberação de catecolaminas, causando vasoconstricção, acelerando a frequência cardíaca, causando hipertensão arterial e provocando adesividade plaquetária. A nicotina juntamente com o monóxido de carbono, provoca diversas doenças cardiovasculares. Também estimula no aparelho gastrointestinal a produção de ácido clorídrico, o que pode causar úlcera gástrica e desencadeia a liberação de substâncias quimiotáxicas no pulmão, que estimulará um processo que irá destruir a elastina, provocando o enfisema pulmonar. À medida que a droga vai sendo metabolizada, isto é, decomposta, os receptores começam a ficar vazios, e a vontade de fumar aumenta progressivamente: surge a crise de abstinência, Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 4 Clínica Médica – Tabagismo carregada de ansiedade e agitação, que só regride quando a fumaça chega outra vez aos pulmões e a primeira dose de nicotina atinge o cérebro. Com a ausência da nicotina, o cérebro do dependente recebe menos dopamina. Para compensar, o organismo produz mais noradrenalina. Por isso, quando alguém pára de fumar, fica nervoso ou irritado. Os danos ao organismo humano provenientes do tabagismo não afetam apenas as pessoas que fumam, mas atingem as não fumantes que vivem sob poluição pela fumaça de cigarros nos domicílios, nos ambientes de trabalho, de lazer, escolas e demais espaços públicos fechados. O Tabagismo passivo é a inalação da fumaça de derivados do tabaco, tais como cigarro, charuto, cigarrilhas, cachimbo, narguilé e outros produtores de fumaça, por indivíduos não fumantes, que convivem com fumantes em diferentes ambientes respirando as mesmas substâncias tóxicas que o fumante inala. A fumaça inalada pelos fumantes passivos ou involuntários é responsável por grande parte das doenças tabaco-relacionadas incidentes nestes indivíduos, em particular o câncer de pulmão. Esta poluição ambiental é decorrente da fumaça exalada pelo fumante (corrente primária ou principal), que corresponde a 25% do total, e por aquela resultante da queima da ponta do cigarro ou outro produto do tabaco (corrente secundária). A corrente secundária produzida pela combustão do cigarro entre as tragadas corresponde aos restantes 75% de fumaça de tabaco presente nos ambientes, sendo a mais importante fonte da poluição ambiental e com maiores concentrações de todos os componentes carcinogênicos do tabaco. Há dependência psicológica quando as pessoas fumam para alterar o seu humor ou evitar sintomas de abstinência; esta pode ocorrer 2 semanas depois do início do tabagismo e em até cerca de 25% dos adolescentes que experimentam o cigarro. A dependência física (ou seja, a ocorrência de sintomas de abstinência com a cessação) também ocorre em 2 semanas. As pessoas fumam para suprir a dependência de nicotina, mas simultaneamente inalam centenas de carcinógenos, gases nocivos e aditivos químicos, que fazem parte da fumaça do cigarro. Esses componentes são responsáveis pelas múltiplas consequências do tabagismo sobre a saúde. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 5 Clínica Médica – Tabagismo COMPLICAÇÕES Alcatrão é um composto de mais de 40 substâncias comprovadamente cancerígenas, formado a partir da combustão dos derivados do tabaco. Entre elas, o arsênio, níquel, benzopireno, cádmio, resíduos de agrotóxicos, substâncias radioativas, como o Polônio 210, acetona, naftalina e até fósforo P4/P6, substâncias usadas em veneno para matar rato. O monóxido de carbono (CO) tem afinidade com a hemoglobina (Hb) presente nos glóbulos vermelhos do sangue, que transportam oxigênio para todos os órgãos do corpo. A ligação do CO com a hemoglobina forma o composto chamado carboxihemoglobina, que dificulta a oxigenação do sangue, privando alguns órgãos do oxigênio e causando doenças como a aterosclerose. A aterosclerose é provocada pelo acúmulo de placas de gordura, colesterol e outras substâncias nas paredes arteriais, responsáveis por levar sangue e oxigênio ao corpo. Esse acúmulo causa o estreitamento das artérias, prejudicando o fluxo sanguíneo. Fumar prejudica praticamente todos os órgãos do corpo. O tabagismo é a principal causa de mortalidade prevenível em vários países.. Aproximadamente dois a cada três fumantes de longa data morrem prematuramente de uma doença diretamente média 10 a 14 anos de vida (7 min/cigarro). Os principais efeitos crônicos são o aumento da probabilidade de: • Doença Coronariana • DPOC • Câncer de pulmão DOENÇA CORONARIANA O cigarro é um dos maiores agressores do endotélio – parede de células que recobre os vasos sanguíneos. Essa agressão ao endotélio interfere a produção de uma substância protetora conhecida como óxido nítrico e faz como que as artérias fiquem mais vulneráveis ao acúmulo de gordura. Há também uma interferência no mecanismo de contração e relaxamento, o que resulta numa maior dificuldade para o sangue circular. A doença arterial coronariana (DAC) é o resultado da obstrução das artérias coronárias - os vasos sanguíneos que irrigam o músculo do coração. O conjunto de artérias coronárias constitui a circulação coronária. As artérias coronárias podem ser obstruídas por placas de gordura que vão se depositando em seu interior, causando a aterosclerose. Denomina-se isquemia miocárdica a má irrigação do músculo cardíaco decorrente de obstrução da circulação coronária. A isquemia miocárdica que ocorre durante um episódio de angina é temporária: um estado em que a irrigação do músculo cardíaco não é suficiente para suprir suas necessidades para a intensidade de trabalho que realiza. A isquemia cessa com a suspensão da atividade física que desencadeou a angina e retorna a um patamar de atividade cardíaca mais baixa ou com uso de nitroglicerina sublingual, que dilata as artérias coronárias e diminui o trabalho cardíaco. A doença coronariana pode ser assintomática. Dentre os sintomas da patologia estão: Dores locais: peito. Também é comum: ataque cardíaco, falta de ar ou suor Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 6 Clínica Médica – Tabagismo CÂNCER DE PULMÃO Como todos os outros tecidos e órgãos do corpo, o pulmão é composto por células. Normalmente, estas células se dividem e se reproduzem de forma ordenada e controlada. Quando ocorre uma disfunção celular que altera esse processo, o organismo produz excesso de tecido, dando origem ao tumor. Se o tumor for maligno, o seu crescimento não só comprime, mas também invade e destrói tecidos sadios à sua volta. Além disso, as células tumorais podem se desprender do tumor de origem e se espalhar por meio da corrente sanguínea ou dos vasos linfáticos para outras partes do corpo, dando origem a novos tumores (metástases). O câncer de pulmão é o segundo mais comum em homens e mulheres no Brasil (sem contar o câncer de pele não melanoma). O tabagismo e a exposição passiva ao tabaco são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de câncer de pulmão. A exposição à poluição do ar, infecções pulmonares de repetição, deficiência e excesso de vitamina A, doença pulmonar obstrutiva crônica (enfisema pulmonar e bronquite crônica), fatores genéticos e história familiar de câncer de pulmão favorecem ao desenvolvimento desse tipo de câncer. Idade avançada: a maior parte dos casos afeta pessoas entre 50 e 70 anos. O câncer de pulmão, geralmente, é classificado pela aparência que tem quando observado no microscópio. São dois tipos principais: • Câncer de pulmão de células pequenas - representam de 10 a 15% doscasos. Crescem rapidamente e costumam migrar para órgãos distantes do pulmão. • Câncer de pulmão de células não pequenas - representam 80 a 85% dos casos. Está dividido em três subtipos, sendo o mais comum o adenocarcinoma, que tende a crescer mais lentamente. Cada tipo de câncer de pulmão cresce e se espalha de forma diferente e, portanto, é tratado de acordo com suas características. O risco de ocorrência e de morte pela doença aumenta quanto maior a intensidade da exposição ao tabagismo. A mortalidade por câncer de pulmão entre fumantes é cerca de 15 vezes maior do que entre pessoas que nunca fumaram, enquanto entre ex-fumantes é cerca de quatro vezes maior. Os sintomas geralmente não ocorrem até que o câncer esteja avançado, mas algumas pessoas com câncer de pulmão em estágio inicial apresentam sintomas. Os mais comuns são: • Tosse persistente • Escarro com sangue • Dor no peito • Rouquidão • Piora da falta de ar • Perda de peso e de apetite • Pneumonia recorrente ou bronquite Nos fumantes, o ritmo habitual da tosse é alterado e aparecem crises em horários incomuns. Se há suspeita da doença, seu médico pode solicitar alguns exames, tais como: • Exames de imagem - o raio-X de tórax, em complemento com a tomografia computadorizada, são testes iniciais para investigar o câncer de pulmão. • Biópsia - é a retirada de uma pequena amostra do tecido suspeito para ser analisada em laboratório. Só esse procedimento garante o diagnóstico definitivo. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 7 Clínica Médica – Tabagismo DPOC A doença pulmonar obstrutiva crônica, ou DPOC, é a obstrução da passagem do ar pelos pulmões provocada geralmente pela fumaça do cigarro ou de outros compostos nocivos. A doença se instala depois que há um quadro persistente de bronquite ou enfisema pulmonar. O primeiro causa um estado permanente de inflamação nos pulmões, enquanto o segundo destrói os alvéolos, estruturas que promovem trocas gasosas no órgão. A DPOC responde por cerca de 20% das mortes relacionadas com o tabagismo. O tabaco é a causa mais comum, respondendo por 61% de todas as mortes por doença pulmonar. O tabagismo prejudica os mecanismos de defesa local das vias respiratórias e, particularmente nas pessoas geneticamente susceptíveis, tende a acelerar o declínio da função pulmonar. A tosse e a dispneia aos esforços são comuns. Sinais e sintomas: • Tosse, Pigarro, Falta de ar e fadiga, Catarro em excesso. BRONQUITE Bronquite é uma inflamação dos brônquios, canais que conduzem o ar inalado até os alvéolos pulmonares. Ela se instala quando os minúsculos cílios que revestem o interior dos brônquios param de eliminar o muco presente nas vias respiratórias. Esse acúmulo de secreção faz com que eles fiquem permanentemente inflamados e contraídos, provocando, principalmente, tosse. A bronquite pode ser aguda ou crônica. A diferença consiste na duração e agravamento das crises, que são mais curtas (uma ou duas semanas) na bronquite aguda, enquanto, na crônica, não desaparecem, pioram pela manhã e se manifestam por três meses ou mais durante pelo menos dois anos consecutivos. ENFISIMA PULMONAR O enfisema é uma irritação respiratória crônica, de lenta evolução, quase sempre causada pelo fumo, embora outros agentes (poeira, poluentes, vapores químicos) também possam provocá-lo. No enfisema, os alvéolos transformam-se em grandes sacos cheios de ar que dificultam o contato do ar com o sangue, uma vez que foi destruído o tecido por onde passavam os vasos. Alguns fatores hereditários também podem contribuir para o aparecimento do enfisema. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 8 Clínica Médica – Tabagismo TRATAMENTO Tanto a orientação baseada em evidências como o tratamento medicamentoso são eficazes para o tratamento e a dependência do tabagismo; a combinação do aconselhamento com o tratamento farmacológico é mais eficaz do que qualquer intervenção isolada. Estudos de meta-análise revelaram que o aconselhamento dado por qualquer profissional de saúde aumenta as taxas de cessação do tabagismo (FIORE et al., 2008a; GORIN; HECK, 2004;). O tabagismo tem muitas características das doenças crônicas. Assim, a abordagem ideal baseada em evidências para o tratamento de fumantes, sobretudo aqueles que não estão prontos para parar de fumar ou os que ainda não consideraram a possibilidade de parar de fumar, deve ser orientada pelos mesmos princípios que norteiam o tratamento de doenças crônicas. O acompanhamento para cessação do tabagismo embasa-se principalmente na abordagem cognitivo-comportamental, que combina intervenções cognitivas com treinamento de habilidades comportamentais. Os dois principais componentes dessa abordagem são: (1)Detecção de situações de risco de recaída (2)Desenvolvimento de estratégias de enfrentamento. AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO CONTÍNUO DO ESTADO DE TABAGISMO • Utilização de diferentes intervenções baseadas em evidências (ou associações) para diferentes pacientes e com base nas experiências prévias e preferências em relação ao tratamento. • Incentivar a abstinência temporária e a redução do consumo para os pacientes que não conseguem parar de fumar, reforçando que a abstinência é o objetivo final • Apesar da redução do consumo poder aumentar a motivação para cessação total (particularmente quando combinada a tratamento com reposição de nicotina), os fumantes devem ser lembrados que reduzir o número de cigarros pode não melhorar os resultados em relação à saúde, pois fumantes inalam mais fumaça (e assim mais toxinas) por cigarro, para manter a ingestão de nicotina quando reduzem o número de cigarros utilizados por dia. ORIENTAÇÃO BASEADA EM EVIDÊNCIAS Os esforços de orientação iniciam-se com 5 A: • Perguntar em cada consulta se o paciente usa tabaco e registrar a resposta. • Aconselhar todos os fumantes a parar de fumar em uma linguagem clara, forte, personalizada e imparcial. • Avaliar a disposição do fumante de parar nos próximos 30 dias, destacando os benefícios da cessação para os fumantes que não pretendem parar de fumar nos próximos 30 dias. • Auxiliar os que desejam tentar parar de fumar com orientações breves e tratamento medicamentoso. • Agendar o acompanhamento, de preferência após a primeira semana da data fixada para a interrupção do tabagismo e então mais tarde para prevenir recorrências. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 9 Clínica Médica – Tabagismo Para os fumantes dispostos a parar, os médicos devem trabalhar com o paciente de modo a deteriminar uma data para a cessação, de preferência em 2 semanas, e enfatizar que a abstinência total é melhor do que a redução. As experiências pregressas de cessação de tabagismo podem ser revisadas para identificar o que ajudou e o que não ajudou e os desencadeantes do tabagismo, ou desafios na cessação, devem receber planejamento prévio. Por exemplo, o uso de álcool está associado à recaída, assim, a restrição ou abstinência de álcool devem ser discutidas. Adicionalmente, a cessação é mais difícil quando outros fumam em casa; deve-se incentivar os cônjuges e outras pessoas fumantes na residência a fumar fora de casa ou parar completamente. Os médicos devem reforçar sua disponibilidade e assistência para apoiar a tentativa de parar de fumar. Além do aconselhamento breve fornecido pelo médico do fumante, programas de aconselhamento podem ajudar. Geralmente empregam-se terapias cognitivo- comportamentais, que são oferecidas por vários programas de saúde. As taxas de sucesso são mais elevadas com os programas de autoajuda. É importante ressaltar que tais técnicas, utilizadascomo importantes ferramentas para o trabalho cognitivo dos usuários, não representam solução protocolar e mágica para um indivíduo “robotizado”. É essencial verificar como ele se sente quando tenta usar cada técnica, do ponto de vista das emoções e sentimentos. Para que a técnica funcione, a pessoa deve ser incentivada a usá-la, escolhendo as modalidades em que percebe uma resposta mais satisfatória e apropriando- se delas, e reconhecer que tipo de sentimento surge em cada circunstância, aprendendo a como lidar com ele. As abordagens para cessação de tabagismo são classificadas como: (1) Mínima (ou Breve) A abordagem mínima (breve) é definida como o contato profissional-usuário inferior a 3 minutos para cada encontro. Embora não seja considerada a forma ideal de atendimento, mostrou-se que ela pode produzir resultados significativos e, pela maior disponibilidade dos profissionais para realizarem este tipo de abordagem na prática clínica, o impacto final no âmbito de saúde pública é potencialmente substancial. Ela é especialmente interessante para profissionais de saúde que apresentam dificuldades no acompanhamento do indivíduo, como aqueles trabalhadores de Pronto Atendimentos e Triagens (BRASIL, 2001; ZWAR et al., 2011). A abordagem mínima é resumida no mnemônico Paap: perguntar e avaliar, aconselhar e preparar o fumante para a cessação, sem haver um acompanhamento posterior. (2) Básica A abordagem básica é definida como o contato profissional-usuário entre 3 e 10 minutos de duração para cada encontro. Um pouco mais prolongada, é mais indicada por apresentar maiores taxas de sucesso para cessação definitiva do tabagismo que a anterior (abordagem mínima/ breve). Uma diferença importante desta abordagem é a previsão de um acompanhamento do indivíduo, essencial para o feedback entre profissional e tabagista em cessação sobre os avanços alcançados e as dificuldades encontradas (BRASIL, 2001). A abordagem básica é resumida no mnemônico Paapa: perguntar e avaliar, aconselhar, preparar e acompanhar. (3) Intensiva A abordagem intensiva (também denominada específica) é definida como o contato profissional-usuário superior a 10 minutos de duração para cada encontro. É a abordagem mais indicada, sempre que factível, por apresentar as maiores taxas de sucesso para cessação definitiva do tabagismo. Uma meta- análise concluiu que a chance de se alcançar a abstinência do tabaco, em comparação a nenhum contato profissional-usuário, é 1,3 vezes para a abordagem mínima/ breve (< 3 minutos), 1,6 vezes a abordagem de baixa intensidade/básica (3-10 minutos), e 2,3 vezes para a abordagem de alta intensidade/intensiva (> 10 minutos). A abordagem intensiva é resumida, tal qual a abordagem básica, no mnemônico Paapa: Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 10 Clínica Médica – Tabagismo perguntar e avaliar, aconselhar, preparar e acomp Essas abordagens levam em conta o tempo investido no contato entre a pessoa e o profissional de saúde – respectivamente menor que 3 minutos, entre 3 e 10 minutos, e maior que 10 minutos (BRASIL, 2001; FIORE et al., 2008a). A abordagem intensiva mostrou-se mais eficaz que as demais. Por outro lado, a abordagem mínima, com seus efeitos apenas modestos para o indivíduo, apresenta potencial substancial em termos de saúde pública e, por isso, não deve ser menosprezada pelos profissionais de saúde (ZWAR et al., 2011). FÁRMACOS PARA CESSAÇÃO DE TABAGISMO Fármacos eficazes e seguros para a cessação do tabagismo são vareniclina, bupropiona SR e 5 tipos de terapias de reposição de nicotina nas formas de chiclete, adesivo, inalatória e spray nasal . O uso de medicamentos tem um papel bem definido no processo de cessação do tabagismo, que é o de minimizar os sintomas da síndrome de abstinência à nicotina, facilitando a abordagem intensiva do tabagista. Medicamentos não devem ser utilizados isoladamente, e sim em associação com uma boa abordagem. É fundamental que o tabagista se sinta mais confiante para exercitar e por em prática as orientações recebidas durante as sessões da abordagem intensiva O mecanismo de ação da bupropiona é aumentar a liberação cerebral de noradrenalina e dopamina. Vareniciclina atua no receptor de nicotina- acetilcolina (a subunidade α-4β-2), onde atua como agonista parcial, bloqueando os efeitos da nicotina. O efeito da vareniclina é atenuar os sintomas da abstinência de nicotina e diminuir os efeitos prazerosos do tabagismo se o paciente recair. A vareniclina é a monoterapia mais eficaz disponível para a cessação do tabagismo. Combinações de diferentes produtos de reposição de nicotina são mais eficazes do que cada produto isoladamente e são comparáveis em termos de eficácia à vareniclina. Por exemplo, a combinação do adesivo de nicotina a um fármaco de ação mais curta de reposição de nicotina (p. ex., pastilha, goma, spray nasal ou inalador) é mais eficaz do que a monoterapia. Quando utilizado em associação o adesivo de nicotina ajuda a manter concentrações contínuas e o uso de chiclete, pastilha, inalador ou spray nasal possibilita ao paciente elevar as concentrações de nicotina em repostas aos desejos imediatos. Administrar a terapia de reposição de nicotina na dose de cerca de 1 mg por cigarro fumado por dia. Os pacientes que utilizam o adesivo de nicotina devem continuar a usá-lo mesmo que tenham uma recaída e fumem. Os fumantes poderiam temer se tornarem dependentes da nicotina após a utilização de produtos de nicotina para cessação do tabagismo, entretanto esta dependência raramente persiste. Uma questão importante é que o potencial de dependência de um fármaco está relacionado com a velocidade com que chega ao cérebro. Como nenhum dos produtos de reposição de nicotina fornece nicotina para o cérebro em qualquer velocidade próxima à do tabagismo fornece (8 a 10 segundos), os produtos de reposição são menos viciantes. O fármaco de escolha é orientado pela familiaridade do médico com o fármaco, preferência do fumante e experiência prévia (positiva ou negativa) e contraindicações. Apesar da eficácia comprovada, os fármacos para cessação do tabagismo são utilizadas por < de 25% dos fumantes que tentam parar. As razões para que os fumantes não usem fármacos de cessação como uma tentativa de parar de fumar são a baixa cobertura dos planos de saúde, as preocupações com os efeitos adversos, a segurança de fumar e utilizar simultaneamente reposição de nicotina, e o desânimo do paciente por causa das tentativas malsucedidas anteriores de parar de fumar. Os tratamentos ainda em investigação para cessação de tabagismo incluem os fármacos cistina, bromocriptina e topiramato. Estudou-se a terapia com vacina e descobriu-se que é ineficaz. Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 11 Clínica Médica – Tabagismo Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 12 Clínica Médica – Tabagismo Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 13 Clínica Médica – Tabagismo Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 14 Clínica Médica – Tabagismo Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 15 Clínica Médica – Tabagismo Ana Luiza Azevedo de Paula Medicina 16 Clínica Médica – Tabagismo TABAGISMO X SISTEMA IMUNE A agressão causada por essas substâncias afeta intensamente o trato respiratório, podendo ocasionar lesão, metaplasia ou morte celulares, alémde inflamação local e sistêmica. As células epiteliais são conhecidas por sua função de barreira protetora contra o ambiente externo, mas existe crescente evidência de que também participem da modulação da resposta imune, além dos macrófagos, neutrófilos e linfócitos. As células relacionadas à resposta imune secretam algumas substâncias que desencadeiam o processo inflamatório e outras que controlam a inflamação. São conhecidos como causadores da inflamação o fator de necrose tumoral-alpha (TNF-� – Tumor necrosis factor), o interferon-gamma (IFN-�) e as interleucinas 1, 2, 6, 8, 12, 16, 18 (IL1, IL2, IL6, IL8, IL12, IL16 e IL18); já as interleucinas 4, 5, 10, 13 e 19 (IL4, IL5, IL10, IL13 e 19) estão relacionadas à resposta anti-inflamatória pela produção de anticorpos e exercem proteção contra infecção. Além de interferir na função imune, essas mudanças nas células epiteliais podem causar remodelamento no trato respiratório com um aumento no número de células caliciformes e hipertrofia de células mucosas, culminando em aumentoconsiderável na produção de muco. Além disso, as células ciliadas também sofrem alterações em decorrência da exposição à fumaça do cigarro, como aumento de cílios anormais e diminuição da frequência do batimento ciliar. A soma dessas alterações resulta em prejuízo do transporte mucociliar. O transporte mucociliar é um importante mecanismo de defesa do trato respiratório porque aprisiona e expele os agentes agressores. O funcionamento adequado desse mecanismo depende da estrutura, frequência e sincronia do batimento ciliar, além da quantidade e qualidade da secreção brônquica. Alguns estudos têm mostrado que tabagistas crônicos apresentam transporte mucociliar diminuído. Entretanto, um estudo prévio de nosso laboratório mostrou que este mecanismo pode se recuperar em 15 dias sem exposição tabagística. Assim, verificam-se os malefícios causados pelo tabagismo nos mecanismos de defesa do hospedeiro, como o sistema imune e o transporte mucociliar. Desta forma, a principal intervenção no tratamento e prevenção destas consequências, é a cessação tabagística . Artigo: https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/87308/r odrigues_fmm_me_prud.pdf;jsessionid=CF2FAE380FA75F 49EA26A95CF6E8F860?sequence=1 Fontes : https://www.inca.gov.br/tabagismoT http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s1806- 37132004000800002&script=sci_arttext https://www.inca.gov.br/tabagismo/tabagismo-passivo https://www.ufrgs.br/telessauders/documentos/protocolos_resumo s/pneumologia_resumo_tabagismo_TSRS_20160321.pdf http://conitec.gov.br/images/Consultas/Relatorios/2019/Relatorio_ Vareniclina_Tabagismo_CP31_2019.pdf
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