Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
terapia com células‑tronco As células-tronco são assunto constante nos noticiá rios. Os cien- tistas analisam seus possíveis usos, e pessoas de todos os tipos – políticos, líderes religiosos, jornalistas, vítimas de enfermidades como doen ça de Parkinson, diabetes e artrite, e até mesmo ce- lebridades de Hollywood – começam a participar dessa discus- são. Embora sejam elas próprias indefinidas, as células-tronco são capazes de produzir descendentes que podem se diferenciar em tipos celulares especiais, como fibras muscula res, linfóci- tos, neurônios ou células ósseas. Portanto, poderiam ser usadas para regenerar tecidos deteriorados, substituir órgãos ou partes do corpo perdidos ou ainda minorar déficits bioquí micos. Essas perspectivas ressaltam a importância de compreender como di- ferentes tipos celulares adquirem suas funções especializadas e como, em um organismo multicelular, formam tecidos e órgãos de modo organizado. Em outras palavras, elas destacam a impor- tância de compreender o processo de desenvolvimento – desde os ovócitos fertilizados, passando pelo embrião até a vida adulta. A possibilidade da terapia com células-tronco também suscita importantes questões éticas. É preciso que as células-tronco se- jam obtidas por destruição de embriões? A vida embrionária deve ser sacrificada para prolongar e melhorar a vida adulta? É aceitá- vel produzir embriões apenas para obter células-tronco com fins Feto humano em fase avançada do desenvolvimento. terapêuticos? No mundo todo, populações e seus governos discu- tem essas questões, enquanto os cientistas con ti nuam a explorar as propriedades das células-tronco e seus possíveis empregos. As células-tronco são assunto constante nos noticiá rios. Os cien- terapia com células‑troncoterapia com células‑troncoterapia com células‑troncoterapia com células‑troncoterapia com células‑tronco tistas analisam seus possíveis usos, e pessoas de todos os tipos – políticos, líderes religiosos, jornalistas, vítimas de enfermidades tistas analisam seus possíveis usos, e pessoas de todos os tipos como doen ça de Parkinson, diabetes e artrite, e até mesmo ce- As células-tronco são assunto constante nos noticiá rios. Os cien- terapia com células‑tronco tistas analisam seus possíveis usos, e pessoas de todos os tipos como doen ça de Parkinson, diabetes e artrite, e até mesmo ce- tistas analisam seus possíveis usos, e pessoas de todos os tipos – políticos, líderes religiosos, jornalistas, vítimas de enfermidades – políticos, líderes religiosos, jornalistas, vítimas de enfermidades 22controle Genético do desenvolvimento animal c Perspectiva genética sobre o desenvolvimento c Atividade gênica materna no desenvolvimento c Atividade gênica zigótica no desenvolvimento c Análise genética do desenvolvimento em vertebrados p a n o r a m a Pe tit F or m at /P ho to R es ea rc he rs . 2 Fundamentos de Genética Drosophila foi um dos primeiros organismos-modelo para análise genética do desenvolvimento de animais. O desenvolvimento de um animal multicelular a partir de um ovócito fertilizado demonstra o poder da expres‑ são gênica controlada. É indispensável que os genes se‑ jam expressos meticulosamente ao longo do tempo para produzir a especialização das células, a organização des‑ sas células em tecidos e órgãos e a formação do corpo do animal. Portanto, o processo de desenvolvimento do animal depende da execução fi el de um programa ge‑ nético codifi cado no DNA do animal. Assim, não deve ser surpresa a enorme contribuição da genética para a compreensão desse processo. Estudos clássicos de anatomia e embriologia garanti‑ ram observações detalhadas sobre os eventos de desen‑ volvimento – a divisão do ovo fertilizado para formar um embrião, o movimento de células no embrião para formar tecidos primitivos e a subsequente diferenciação de células nesses tecidos para formar diferentes órgãos. Por motivos práticos, esses estudos clássicos concen‑ traram‑se em alguns tipos de animais, sobretudo em ouriços‑do‑mar, rãs e galinhas. Os ovos desses animais podem ser manipulados experimentalmente e seus em‑ briões desenvolvem‑se fora do corpo materno. Portanto, os embriologistas poderiam observar o desenvolvimento de um embrião em resposta a um tratamento experi‑ mental. Quando os geneticistas começaram a estudar o desenvolvimento, concentraram‑se em animais de fácil criação, sobretudo Drosophila e C. elegans. O objetivo era identifi car genes cujos produtos participam de impor‑ tantes processos do desenvolvimento. O método tradi‑ cional para um geneticista alcançar esse objetivo é cole‑ cionar mutações. Assim, por exemplo, se um geneticista quisesse estudar o desenvolvimento das asas de Drosophi‑ la, colecionaria mutações que alterassem ou impedissem a formação da asa. Testaria o alelismo entre essas muta‑ ções e determinaria sua posição no mapa cromossômico para defi nir e posicionar os loci genéticos importantes. Uma vez identifi cados esses loci, o geneticista combina‑ ria mutações representativas de cada locus em pares para verifi car se algumas das mutações são epistáticas em re‑ lação às outras. Esse teste de epistasia pode oferecer in‑ formações úteis sobre a contribuição de diferentes genes para o processo de desenvolvimento (Capítulo 4). Por fi m, para investigar a base molecular da ação gênica e para esclarecer o papel de cada produto gênico no de‑ senvolvimento, o geneticista clonaria genes in di vi duais e os estudaria com todo o arsenal de técnicas disponíveis – sequenciamento, blot de RNA e proteí na, RT‑PCR, mar‑ cador fl uorescente, produção de transgênicos e assim por diante (Capítulos 14 e 16). Graças a essa estratégia geral, os geneticistas aprende‑ ram muito sobre o desenvolvimento de Drosophila e C. elegans. Atualmente sabe‑se muito sobre o mecanismo de especialização celular, de formação de tecidos e órgãos e de delineamento da estrutura corporal. Esse conheci‑ mento também propiciou um arcabouço intelectual para guiar o estudo do desenvolvimento em outros animais, entre eles vertebrados, como o camundongo. Por sua vez, o estudo do camundongo ofereceu muitas informações sobre o processo de desenvolvimento em seres humanos. Antes de explorar esses tópicos, porém, é preciso exami‑ nar algumas características básicas do desenvolvimento de um dos principais modelos para estudo do controle genético do desenvolvimento, a Drosophila. Drosophila adulta desenvolve‑se a partir de ovócitos elipsoides com cerca de 1 mm de comprimento e 0,5 mm de largura em seu diâ me tro máximo (figura 22.1 a). Cada ovócito é circundado por um cório, uma estrutura resistente, semelhante a uma casca constituí da de subs‑ tâncias sintetizadas por células somáticas do ovário. A extremidade anterior é distinguida por dois fi lamentos que auxiliam a entrada de oxigênio no ovócito. O esper‑ matozoide entra no ovócito através de outra estrutura anterior, o micrópilo. As divisões celulares que sucedem a fertilização são rápidas – tão rápidas que não há tem‑ po para formação de membranas entre as células‑fi lhas. Consequentemente, o embrião inicial de Drosophila é, na verdade, uma única célula com muitos núcleos idên‑ ticos; essa célula é denominada sincício (figura 22.1 B). Após o 9o ciclo de divisão no sincício, os 512 núcleos criados migram até a membrana citoplasmática na pe‑ riferia do embrião, onde ainda se dividem mais quatro vezes. Além disso, alguns núcleos migram até o polo posterior do embrião. No 13o ciclo de divisão, todos os núcleos no sincício são separados por membranas celu‑ lares, criando uma camada única de células na superfí‑ cie do embrião. Essa camada única, denominada blasto‑ derma celular, dá origem a todos os tecidos somáticos do animal. A celularização dos núcleos no polo posterior cria as células polares, que dão origem à linhagem germi‑ nativa do adulto. Assim, nesse estágio muito inicial do desenvolvimento, as linhagens somática e germinativa do futuroadulto já foram separadas. A transformação do embrião de Drosophila em uma lar‑ va vermiforme leva cerca de um dia. Essa larva mastiga a casca do ovo e eclode, começando então a se alimen‑ tar com voracidade. Ela troca de pele duas vezes para se adaptar a aumentos de tamanho e depois, cerca de 5 dias após a eclosão, torna‑se imóvel, e a pele endurece, for‑ mando uma pupa. Durante os 4 dias subsequentes, muitos dos tecidos da larva são destruí dos, e conjuntos planos de células que foram sequestrados durante os estágios larva‑ res expandem‑se e diferenciam‑se em estruturas adultas como antenas, olhos, asas e pernas. Como o inseto adulto é denominado imago, esses conjuntos são denominados discos imaginais. Quando essa reorganização anatômica é concluí da, emerge do casulo pupal um animal radical‑ mente diferente capaz de voar e se reproduzir! Perspectiva genética sobre o desenvolvimento Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 3 Os materiais transportados para o interior do ovócito durante o ovocitogênese têm papel importante no de- senvolvimento embrionário. Eventos importantes ocorrem no desenvolvimento animal antes mesmo da fertilização do ovócito. Nesse perío do, materiais nutritivos e determinantes são transportados das células adjacentes para o ovócito, produzindo reservas de alimento e organizando o ovócito para seu desenvol‑ vimento subsequente – o equivalente molecular do amor materno. Esses materiais são gerados pela expressão de genes no sistema reprodutivo feminino, alguns expressos nos tecidos reprodutivos somáticos e outros apenas nos tecidos da linhagem germinativa. Em conjunto, esses ge‑ nes ajudam a formar ovócitos que podem dar origem a fiGura 22.1 Características básicas do desenvolvimento de Drosophila. a. Fotografia de ovócitos de Drosophila, com (acima) e sem (abaixo) o cório circundante. B. Desenvolvimento embrionário inicial em Drosophila. 5 4 3 2 1 Ovócito fertilizado Anterior Posterior Sincício multinucleado Blastoderma sincicial Citoplasma polar O ovócito fertilizado contém dois núcleos haploides (n), um do macho e outro da fêmea. Os dois núcleos haploides dividem-se uma vez, e os núcleos masculinos e femininos resultantes fundem-se para formar dois núcleos zigóticos diploides (2n). Os núcleos zigóticos dividem-se com rapidez e produzem uma única célula (sincício) com muitos núcleos. Após nove divisões nucleares, os núcleos migram para a periferia do sincício e formam o blastoderma sincicial. Na periferia, os núcleos dividem-se mais quatro vezes. Alguns núcleos migram até o citoplasma polar, onde formam as células polares, os progenitores da linhagem germinativa adulta. Membranas celulares formam-se ao redor dos núcleos e produzem o blastoderma celular, constituído de aproximadamente 4.000�células. Núcleo masculino (n) Células polares (precursoras das células da linhagem germinativa) Núcleo feminino (n) Núcleos zigóticos (2n) B. Blastoderma celular (� 4.000�células) ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA A. 1 mm Atividade gênica materna no desenvolvimento Co rt es ia d e Ke vi n H al ey , U ni ve rs ity o f M in ne so ta . pontos essenciais jj Em Drosophila, a se quência de desenvolvimento é ovócito, embrião, larva, pupa e adulto jj O embrião inicial de Drosophila é um sincício – muitos núcleos em uma célula jj As estruturas da Drosophila adulta desenvolvem‑se a partir de conjuntos de células denominados discos imaginais. 4 Fundamentos de Genética embriões depois da fertilização. Em algumas espécies, es‑ ses produtos gênicos maternos estabelecem o plano cor‑ poral básico do embrião, distinguindo a cabeça da cauda e o dorso do ventre. Portanto, esses materiais de origem materna estabelecem um sistema de coordenadas mole‑ culares para guiar o desenvolvimento do embrião. Para ilustrarmos como a atividade gênica materna influencia o desenvolvimento, concentremo‑nos nos processos em Drosophila. Genes d e e feito matern o As mutações em genes que contribuem para a formação de ovócitos saudáveis podem não influenciar a viabilida‑ de nem a aparência da fêmea que produz esses ovócitos. Na verdade, seus efeitos podem só ser observados na pró‑ xima geração. Essas mutações são denominadas mutações de efeito materno porque o fenótipo mutante na prole é causado por um genótipo mutante na mãe. Os genes identificados por essas mutações são deno‑ minados genes de efeito materno. O gene dorsal (dl) em Dro‑ sophila é um bom exemplo (figura 22.2). O cruzamento entre moscas homozigotas para mutações recessivas nes‑ se gene produz prole inviá vel. Esse efeito letal é estrita‑ mente materno. O cruzamento entre fêmeas mutantes homozigotas e machos de tipo selvagem homozigotos produz prole inviá vel, mas o cruzamento recíproco (machos mutantes homozigotos fêmeas de tipo selva‑ gem homozigotas) produz prole viá vel. Portanto, o efei‑ to letal da mutação dorsal só se manifesta se as fêmeas forem homozigotas para ela. O genótipo do macho é irrelevante. A caracterização molecular do gene dorsal revelou a base desse efeito materno. O gene dorsal codifica um fator de transcrição produzido durante a ovocitogêne‑ se e armazenado no ovócito. No início do desenvolvi‑ mento, esse fator de transcrição tem papel importante na diferenciação das partes dorsal e ventral do embrião. Quando está ausente, há diferenciação errada das par‑ tes ventrais como se estivessem na face dorsal, criando um embrião com duas superfícies dorsais. Essa condição letal não pode ser evitada por um alelo dorsal selvagem herdado do pai porque ele não é transcrito no embrião. A expressão do gene dorsal é, na verdade, limitada à li‑ nhagem germinativa da fêmea. Portanto, as mutações do gene dorsal são letais de efeito materno estrito. Conheça um caso em que o efeito materno de uma mutação pode ser mitigado por outros fatores em Resolva | Mutação de efeito materno no gene cinnamon. determinação dos eixos dorsoventral e anteroposterior Animais com simetria bilateral têm dois eixos corporais primários, um que separa costas e abdome (dorsal e ven‑ tral) e outro que separa cabeça e cauda (anterior e poste‑ rior). Esses dois eixos são estabelecidos bem no início do desenvolvimento, em algumas espécies até mesmo antes da fertilização. Em Drosophila, os processos de formação do eixo foram analisados geneticamente por coleção de mu‑ tações que afetam o desenvolvimento embrionário inicial. Nas décadas de 1970 e 1980, pesquisas generalizadas dessas mutações foram feitas por Christiane Nüsslein‑ Volhard, Eric Weischaus, Trudi Schüpbach, Gerd Jurgens e outros. Esses pesquisadores usaram mutágenos quí‑ micos para induzir mutações em cada cromossomo de fiGura 22.2 O efeito materno de uma mutação no gene dorsal (dl) de Drosophila. O fenótipo mutante é um embrião que não tem teci- dos ventrais; ou seja, é dorsalizado. Embrião mutante por efeito materno Embrião de tipo selvagem dl dl dl dl O gene cinnamon (cin) está localizado na extremidade esquer‑ da do cromossomo X em Drosophila. Animais homozigotos ou hemizigotos para mutação nesse gene só são anormais se a mãe for homozigota para a mutação. Na melhor das hipóteses, a anormalidade nesses animais mutantes de mães mutantes é a cor dos olhos castanho‑avermelhada – ou seja, eles têm olhos cor de canela; na maioria das vezes, porém, eles morrem duran‑ te a embriogênese. Uma fêmea cin/cin homozigota foi cruzada com um macho cin+ de tipo selvagem. Quase toda a prole era constituí da de fêmeas com olhos de cor normal. Os poucos machos nascidos tinham olhos cor de canela. Proponha uma explicação para esses resultados. A Leia a resposta do problema no material disponível on‑line. mutação de efeito materno no gene cinnamon resolva! D an ie l S t. Jo hn st on e C hr is tia ne N üs sl ei n- Vo lh ar d, C el l. 68 :2 01 -2 17 , 1 99 2. A fo to gr af ia é u m a co rt es ia d e Ch ris tia neN üs sl ei n- Vo lh ar d Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 5 Drosophila. Muitas mutações foram identificadas, entre elas mutações letais de efeito materno em genes como o dorsal. Análises moleculares e genéticas dessas mutações ofereceram muitas informações sobre os processos no desenvolvimento inicial de Drosophila. Formação do eixo dor soventral A diferenciação de um embrião de Drosophila ao longo do eixo dorsoventral depende da ação do fator de transcri‑ ção codificado pelo gene dorsal (figura 22.3). Essa proteí‑ na é sintetizada pela mãe e armazenada no citoplasma do ovócito. Por ocasião da formação do blastoderma, a proteí na dorsal entra nos núcleos na face ventral do em‑ brião, induzindo a transcrição de dois genes denomina‑ dos twist e snail (cujos extravagantes nomes [que signifi‑ cam torção e caracol] retratam seus fenótipos mutantes). Nesses mesmos núcleos, ela reprime os genes zerknüllt (palavra alemã que significa “amarrotado”) e decapenta‑ plegic (formado pelas palavras gregas que significam “15” e “golpe”). A indução e repressão seletivas desses genes causam a diferenciação das células ventrais em uma ca‑ mada embrionária primitiva de tecido denominada me‑ soderma. No lado oposto do embrião, onde a proteí na dorsal é excluí da dos núcleos, os genes twist e snail não são induzidos e zerknüllt e decapentaplegic não são repri‑ midos. Por conseguinte, essas células diferenciam‑se em outro tecido primitivo, a epiderme embrionária. Portan‑ to, a entrada do fator de transcrição dorsal nos núcleos ventrais e sua exclusão dos núcleos dorsais inicia a dife‑ renciação ao longo do eixo dorsoventral. Mas o que desencadeia o deslocamento da proteí na dorsal para os núcleos de apenas um lado do embrião? A resposta é uma interação entre duas proteí nas na superfí‑ cie ventral do embrião em desenvolvimento (figura 22.4). Uma proteí na, o produto do gene Toll (do alemão, “tufo”), é distribuí da uniformemente na superfície do embrião; essa proteí na está inserida na membrana plasmática que envolve o embrião. A outra proteí na, o produto do gene spätzle (do alemão, “pequenos pedaços”), é encontrada no espaço perivitelino, uma cavidade cheia de líquido entre a membrana plasmática e a membrana vitelina externa. fiGura 22.3 Determinação do eixo dorsoventral em Drosophila pela proteí na dorsal. Essa proteí na é um fator de transcrição que só atua nos núcleos na face ventral do embrião. Os genes twist, snail, zerknüllt e decapentaplegic são regulados por proteí na dorsal. 4 3 2 1 A proteína receptora Toll é distribuída de maneira uniforme na superfície da membrana plasmática do embrião. A proteína spätzle é distribuída em todo o espaço perivitelino. A protease easter cliva a proteína spätzle e produz um polipeptídio spätzle ativo. O polipeptídio spätzle interage com a proteína receptora Toll. O complexo polipeptídio Toll/spätzle desencadeia a entrada da proteína dorsal (laranja) nos núcleos na face ventral do embrião (roxo-escuro). Embrião Dorsal Ventral Membrana plasmática Núcleos do blastoderma Proteína spätzle Proteína Toll Protease easter Membrana vitelina Espaço perivitelino Polipeptídio spätzle ativo Complexo polipeptídio Toll/spätzle Proteína dorsal ET APA ET APA ET APA ET APA fiGura 22.4 Diferenciação do eixo dorsoventral em embrião de Drosophila. O corte transversal mostra a interação da proteí na receptora Toll ligada à membrana com um polipeptídio da proteí na spätzle que induz a diferenciação ao longo do eixo dorsoventral. A formação do polipep- tídio spätzle de interação ocorre no espaço entre a membrana plasmática e a membrana vitelina na face ventral do embrião. 3a 2a 1a 3b 2b 1b Os genes twist e snail são induzidos. Os genes zerknüllt e decapentaplegic são reprimidos.•• Os genes twist e snail são reprimidos. O fator de transcrição é excluído dos núcleos na face dorsal. O fator de transcrição dorsal entra nos núcleos na face ventral (roxo-escura). Os genes zerknüllt e decapentaplegic são induzidos. As células ventrais diferenciam-se em mesoderma. As células dorsais diferenciam-se em epiderme. Ventral Dorsal Anterior Posterior ¨ ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA 6 Fundamentos de Genética Graças à ação de uma protease codificada por um gene denominado easter (porque foi descoberto no domingo de Páscoa), a proteí na spätzle é clivada e produz um po‑ lipeptídio que interage com a proteí na Toll. Entretanto, por causa de um padrão criado pelas células que circun‑ davam o ovócito dentro do ovário, a clivagem da proteí na spätzle só ocorre no espaço perivitelino na face ventral do embrião. Quando a proteí na Toll interage com o polipep‑ tídio spätzle gerado ventralmente, inicia uma cascata de eventos no embrião que, por fim, envia a proteí na dorsal para os núcleos embrionários. Nestes, a proteí na dorsal atua como fator de transcrição para regular a expressão dos genes twist, snail, decapentaplegic e zerknüllt. Assim, a proteí na Toll ligada à membrana atua como receptor para o polipeptídio spätzle determinante, e a interação física entre essas duas moléculas atua como sinal que desenca‑ deia um programa genético para a diferenciação do em‑ brião ao longo de seu eixo dorsoventral. Formação do eixo antero pos terior O eixo anteroposterior em Drosophila é criado pela síntese regional de fatores de transcrição codificados pelos genes hunchback e caudal (figura 22.5). Esses dois genes são trans‑ critos nas células nutridoras (nurse cells) da linhagem ger‑ minativa materna. Essas células especiais dão suporte ao fiGura 22.5 Determinação do eixo anteroposterior em Drosophila por RNA de origem materna. Esses RNA provêm dos genes hunchback, caudal, bicoid e nanos. Em cada ovócito ou embrião, a parte anterior está à esquerda e a parte posterior, à direita. Distribuição uniforme dos RNA hunchback e caudal por todo o ovócito. 1 Acúmulo de RNA bicoid e nanos em extremidades opostas do ovócito – RNA bicoid na parte anterior e RNA nanos na parte posterior. 2 Tradução local dos RNA bicoid e nanos no embrião. As proteínas resultantes difundem-se para formar gradientes, com concentração da proteína bicoid na região anterior e da proteína nanos na região posterior. 3 A proteína bicoid impede a tradução do RNA caudal na parte anterior do embrião; a proteína nanos impede a tradução do RNA hunchback na parte posterior do embrião. 4 O RNA hunchback é traduzido em proteína na parte anterior do embrião; o RNA caudal é traduzido em proteína na parte posterior do embrião. 5 A proteína hunchback (e bicoid) atua como fator de transcrição para regular os genes para diferenciação da região anterior do embrião; a proteína caudal atua como fator de transcrição para regular os genes para diferenciação da região posterior do embrião. 6 RNA hunchback No ovócito No blastoderma sincicial No blastoderma celular No embrião Determinação anterior Determinação posterior RNA caudal RNA nanosRNA bicoid Proteína nanosProteína bicoid Proteína caudalProteína hunchback Segmentos posterioresSegmentos anteriores ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 7 crescimento e desenvolvimento do ovócito. Os transcritos maternos dos genes hunchback e caudal são levados das cé‑ lulas nutridoras para o ovócito, onde são distribuí dos de maneira uniforme no citoplasma. Entretanto, os dois tipos de transcritos são traduzidos em diferentes partes do em‑ brião. O RNA hunchback só é traduzido na parte anterior, e o RNA caudal só é traduzido na parte posterior. Essa di‑ ferença de tradução produz gradientes de concentração das proteí nas codifi cadas por esses dois genes; a proteí na hunchback é concentrada na parte anterior do embrião, e a proteí na caudal é concentrada na parte posterior. Es‑ sas duas proteí nas ativam ou reprimem a transcrição dos genes cujos produtosparticipam da diferenciação do em‑ brião ao longo de seu eixo anteroposterior. O que limita a tradução do RNA hunchback à parte an‑ terior do embrião e do RNA caudal à parte posterior? Há participação de dois RNA de origem materna, um trans‑ crito do gene bicoid e o outro, do gene nanos. Esses dois RNA são sintetizados nas células nutridoras da linhagem germinativa materna e transportados para o ovócito. O RNA bicoid é ancorado na extremidade anterior do ovó‑ cito em desenvolvimento e o RNA nanos, na extremida‑ de posterior. Após a fertilização, cada tipo de RNA é tra‑ duzido localmente, e os produtos proteicos resultantes difundem‑se através do embrião para formar gradientes de concentração; a proteí na bicoid é concentrada na ex‑ tremidade anterior e a proteí na nanos é concentrada na extremidade posterior. A proteí na bicoid tem duas funções. Primeiro, atua como fator de transcrição para estimular a síntese de RNA a partir de vários genes, inclusive o hunchback. Esses RNA são, então, traduzidos em proteí nas que controlam a formação das estruturas anteriores do embrião. Segun‑ do, a proteí na bicoid impede a tradução de RNA caudal por ligação a se quências na região 3 não traduzida desse RNA. Assim, nos locais em que a proteí na bicoid é abun‑ dante (i. e., na parte anterior do embrião), o RNA caudal não é traduzido em proteí na. Por outro lado, nos locais em que a proteí na bicoid é escassa (i. e., na parte poste‑ rior do embrião), o RNA caudal é traduzido em proteí na. Portanto, a regulação da tradução do RNA caudal pela proteí na bicoid é responsável pelo gradiente de proteí‑ na caudal que se forma no embrião. Como a proteí na caudal é um ativador específi co de genes que controlam a diferenciação posterior, a parte do embrião que tem a máxima concentração de proteí na caudal dá origem às estruturas posteriores. Ao contrário da proteí na bicoid, a proteí na nanos não atua como fator de transcrição. Entretanto, assim como a proteí na bicoid, atua como regulador da tradução. A proteí na nanos é concentrada na parte posterior do embrião e nela se liga à região 3 não traduzida do RNA hunchback e provoca sua degradação. Consequentemente, a proteí na hunchback não é sintetizada na parte posterior do embrião. Em vez disso, sua síntese é restrita à parte ante‑ rior do embrião, onde atua como fator de transcrição e re‑ gula a expressão de genes que participam da diferenciação anteroposterior. Onde quer que a proteí na hunchback seja sintetizada, o embrião desenvolve estruturas anteriores. As proteí nas bicoid e nanos são exemplos de morfó‑ genos – substâncias que controlam os processos de de‑ senvolvimento de acordo com sua concentração. Os gradientes de concentração desses dois morfógenos são inversos; nos locais em que a proteí na bicoid é abundan‑ te, a proteí na nanos é escassa, e vice‑versa. Assim, o eixo anteroposterior em Drosophila é defi nido por altas con‑ centrações desses morfógenos nas extremidades opostas do embrião inicial. Atividade gênica zigótica no desenvolvimento A diferenciação de tipos celulares e a formação de órgãos dependem da ativação dos genes em determinados pa- drões espaciais e temporais. Os primeiros processos no desenvolvimento animal são controlados por fatores sintetizados pela mãe. No entan‑ to, em algum momento, há ativação seletiva dos genes do embrião e produção de novas substâncias. Esse proces‑ so é denominado expressão gênica zigótica, porque ocorre depois da fertilização do ovócito. A onda inicial de ex‑ pressão gênica zigótica é uma resposta a fatores sinteti‑ zados pela mãe. Em Drosophila, por exemplo, o fator de transcrição dorsal de origem materna ativa os genes zigó‑ ticos twist e snail. À medida que prossegue o desenvolvi‑ mento, a ativação de outros genes zigóticos desencadeia cascatas complexas de expressão gênica. Agora examine‑ mos como esses genes zigóticos levam adiante o processo de desenvolvimento. Mais uma vez, concentremo‑nos nos processos em Drosophila. pontos essenciais jj As proteí nas e RNA codificados por genes de efeito materno, como dorsal, hunchback, bicoid e nanos, são transportados para os ovócitos de Drosophila durante a ovocitogênese jj Os produtos gênicos de efeito materno participam da determinação dos eixos dorsoventral e anteroposterior em embriões de Drosophila jj Mutações recessivas em genes de efeito materno são expressas apenas em embriões produzidos por fêmeas homozigotas para essas mutações. 8 Fundamentos de Genética seGmentação do corpo O corpo de muitos invertebrados é constituí do de uma série de unidades adjacentes denominadas segmentos. A Drosophila adulta, por exemplo, tem cabeça, três segmen‑ tos torácicos e oito segmentos abdominais. No tórax e no abdome, cada segmento pode ser identificado segundo a coloração, o padrão de cerdas e os tipos de anexos fixa‑ dos a ele. Esses segmentos também podem ser identifica‑ dos no embrião e na larva (figura 22.6). Em vertebrados, não há um padrão segmentar tão evidente no adulto, mas é possível reconhecê‑lo no embrião pelo modo de crescimento das fibras nervosas do sistema nervoso cen‑ tral, pela formação dos arcos branquiais na cabeça e pela organização de massas muscula res ao longo do eixo an‑ teroposterior. Em uma fase mais avançada do desenvol‑ vimento, essas características se modificam e o padrão segmentar original torna‑se impreciso. Todavia, tanto em vertebrados quanto em muitos invertebrados, a segmen‑ tação é um aspecto essencial do plano geral do corpo. Genes homeó ticos O interesse no controle genético da segmentação ini‑ ciou‑se com a descoberta de mutações que transformam um segmento em outro. A primeira mutação desse tipo foi constatada em Drosophila em 1915, por Calvin Bridges. Ele a denominou bithorax (bx) porque afetava dois seg‑ mentos torácicos. Nesse mutante, o terceiro segmento to‑ rácico foi transformado, embora fracamente, no segun‑ do, criando uma mosca que tinha um pequeno par de asas rudimentares no lugar das pequenas estruturas de equilíbrio denominadas halteres (figura 22.7). Mais tarde, outras mutações transformadoras de segmento foram encontradas em Drosophila – por exemplo, Antennapedia (Antp), mutante que transforma parcialmente as antenas na cabeça em pernas, que normalmente crescem a par‑ tir do tórax. Essas mutações passaram a ser denominadas mutações homeó ticas, porque fazem com que uma parte do corpo se pareça com outra. A palavra “homeó tico” é de‑ rivada do termo homeose, cunhado por William Bateson para se referir aos casos em que “algo foi modificado e se tornou semelhante a outra coisa”. Assim como muitas outras palavras criadas por Bateson, esse termo tornou‑se corrente no vocabulário da genética moderna. Os fenótipos bithorax e Antennapedia são conse‑ quência de mutações em genes homeó ticos. Vários desses ge‑ nes já foram identificados em Drosophila, nas quais formam dois grandes agrupamentos em um dos autossomos (figu‑ ra 22.8). O complexo bithorax, geralmente designado BX‑C, é constituí do de três genes, Ultrabithorax (Ubx), abdominal‑A (abd‑A) e Abdominal‑B (Abd‑B); o complexo Antennapedia, de‑ signado ANT‑C, é constituí do de cinco genes, labial (lab), proboscipedia (pb), Deformed (Dfd), Sex combs reduced (Scr) e Antennapedia (Antp). A análise molecular desses genes mostrou que todos codificam fatores de transcrição héli‑ ce‑volta‑hélice com uma região conservada de 60 aminoá‑ cidos. Essa região, denominada homeodomínio, participa da ligação do DNA. O BX‑C foi o primeiro dos dois complexos gêni‑ cos homeó ticos a ser analisado geneticamente. A aná‑ lise desse complexo começou no fim da década de 1940 com o trabalho de Edward Lewis. Estudando mu‑ tações em BX‑C, Lewis mostrou que a função do tipo selvagem de cada parte do complexo é restrita a uma região específica no animal em desenvolvimento. Mais tarde, análises moleculares reforçaram e aperfeiçoa‑ ram essa conclusão. O estudo do ANT‑C começou na década de 1970, principalmentegraças ao trabalho de fiGura 22.6 Segmentação em Drosophila nos estágios de (a) blas- toderma, (B) larva e (c) adulto do desenvolvimento. Embora os seg- mentos não sejam visíveis no blastoderma, as células já estão com- prometidas com a formação dos segmentos: H, segmento da cabeça; T, segmento torácico; A, segmento abdominal. H C. B. A. T1 T2 T3 A1 A3 A4 A5 A6 A7 A8 T1 A2 T3 A2 A4 A6 A8 T2H? A1 A3 A5 A7 H T1 T2 T3 A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7 A8 Blastoderma Larva Adulto fiGura 22.7 O fenótipo de uma mutação bithorax em Drosophila. Haltere parcialmente transformado em asa. Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 9 Thomas Kaufman, Matthew Scott e seus colaboradores. Com o auxílio de uma combinação de análises genéti‑ cas e moleculares, esses pesquisadores mostraram que a expressão dos genes do ANT‑C também apresenta es‑ pecificidade regional. Entretanto, os genes do ANT‑C são expressos mais anteriormente que os genes do BX‑C. Curiosamente, o padrão de expressão dos genes do ANT‑C e do BX‑C ao longo do eixo anteroposterior corresponde exatamente à ordem dos genes ao longo do cromossomo (Figura 22.8); a razão disso ainda não está clara. Ao que parece, a via de desenvolvimento se‑ guida por cada célula depende apenas do conjunto de genes homeó ticos expressos dentro dela. Como os ge‑ nes homeó ticos têm esse papel essencial na seleção das identidades segmentares de células in di vi duais, com fre‑ quência são denominados genes seletores. As proteí nas codificadas pelos genes homeó ticos são fatores de transcrição de homeodomínio. Essas proteí nas ligam‑se a se quências reguladoras no DNA, inclusive a algumas nos próprios complexos bithorax e Antennape‑ dia. Por exemplo, as proteí nas UBX e ANTP ligam‑se a uma se quência no promotor do gene Ubx – uma suges‑ tão de que os genes homeó ticos podem se autorregular e regular um ao outro. Outros alvos gênicos dos fatores de transcrição de homeodomínio foram identificados, entre eles alguns que codificam outros tipos de fatores de transcrição. Portanto, os genes homeó ticos parecem controlar uma cascata reguladora de genes‑alvo que, por sua vez, determinam as identidades segmentares de célu‑ las in di vi duais. Entretanto, os genes homeó ticos não es‑ tão no topo dessa cascata reguladora. Suas atividades são controladas por outro grupo de genes expressos em uma fase anterior do desenvolvimento. Genes d e segmentação A maioria dos genes homeó ticos é identificada por muta‑ ções que alteram o fenótipo da mosca adulta. Entretanto, essas mesmas mutações também têm efeitos fenotípicos nos estágios embrionário e larvar. Esse achado sugeriu que outros genes participantes da segmentação pode‑ riam ser descobertos pelo rastreamento de mutações causadoras de anomalias embrionárias e larvares. Nas dé‑ cadas de 1970 e 1980, Christiane Nüsslein‑Volhard e Eric Wieschaus fizeram esses rastreamentos (ver Marcos da genética | Mutações que rompem a segmentação em Dro‑ sophila, no material suplementar disponível on‑line. Eles encontraram todo um novo conjunto de genes necessá‑ rios para segmentação ao longo do eixo anteroposterior. Nüsslein‑Volhard e Wieschaus classificaram esses genes de segmentação em três grupos com base em fenótipos mu‑ tantes embrionários. 1. Genes gap. Esses genes definem re giões segmentares no embrião. Mutações nos genes gap determinam a au‑ sência de todo um conjunto de segmentos corporais contíguos; ou seja, eles criam uma lacuna anatômica ao longo do eixo anteroposterior. Quatro genes gap foram bem‑caracterizados: Krüppel (do alemão, “muti‑ lado”), giant, hunchback e knirps (do alemão, “anão”). Cada um deles é expresso em re giões características no embrião inicial sob o controle dos genes de efeito materno bicoid e nanos. Os genes gap codificam fatores de transcrição. 2. Genes pair‑rule (genes de paridade segmentar). Esses genes de‑ finem um padrão de segmentos no embrião. Os genes pair‑rule são regulados pelos genes gap e expressos em sete bandas, ou listras, alternadas ao longo do eixo ante‑ roposterior, dividindo o embrião em 14 zonas distintas ou parassegmentos (figura 22.9). Algumas mutações em genes pair‑rule produzem embriões com apenas metade dos parassegmentos observados no tipo selvagem. Em cada mutante, há ausência de parassegmentos alterna‑ dos, embora os parassegmentos ausentes não sejam os mesmos em diferentes mutantes pair‑rule. Os exemplos Ubx lab pb Dfd Scr Antp abd-A Abd-B BX-C T1 T2 T3 A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7 A8 ANT-C fiGura 22.8 Genes homeó ticos no complexo bithorax (BX-C) e no complexo Antennapedia (ANT-C) de Drosophila. As re giões do corpo em que cada gene é expresso são indicadas. fiGura 22.9 O padrão de sete listras de expressão de RNA do gene pair‑rule fushi tarazu (ftz) em um blastoderma do embrião de Droso‑ phila. O RNA foi detectado por hibridização in situ com uma sonda específica para ftz. A parte anterior está à esquerda; a parte dorsal, no topo. Outros genes de paridade segmentar mostram outro padrão de sete listras. 0,1 mm Co rt es ia d e M at th ew S co tt , H ow ar d H ug he s M ed ic al In st it ut e. 10 Fundamentos de Genética de genes pair‑rule são fushi tarazu (que significa “falta algo” em japonês) e even‑skipped. Em mutantes fushi ta‑ razu, faltam os parassegmentos ímpares; em mutantes even‑skipped, faltam os parassegmentos pares. Os genes pair‑rule também codificam fatores de transcrição. 3. Genes de polaridade segmentar. Esses genes definem os com‑ partimentos anterior e posterior de segmentos in di vi‑ duais ao longo do eixo anteroposterior. Mutações nos genes de polaridade segmentar causam a substituição de parte de cada segmento por uma cópia espelhada de um hemissegmento adjacente. Por exemplo, mutações nos genes de polaridade segmentar gooseberry causam a substituição da metade posterior de cada segmento por uma cópia espelhada do hemissegmento anterior adjacente. Muitos genes de polaridade segmentar são expressos em 14 bandas estreitas ao longo do eixo an‑ teroposterior. Assim, eles aperfeiçoam o padrão seg‑ mentar criado pelos genes pair‑rule. Dois dos genes de polaridade segmentar mais bem‑estudados são engrailed e wingless; engrailed codifica um fator de transcrição, e wingless codifica uma molécula sinalizadora. Esses três grupos de genes formam uma hierarquia reguladora (figura 22.10). Os genes gap, que são ativados regionalmente pelos genes de efeito materno, regulam a expressão dos genes pair‑rule que, por sua vez, regulam a expressão dos genes de polaridade segmentar. Conco‑ mitante a esse processo, os genes homeó ticos são ativa‑ dos sob o controle dos genes gap e pair‑rule para conferir identidades exclusivas aos segmentos que se formam ao longo do eixo anteroposterior. As interações dos produ‑ tos de todos esses genes aperfeiçoam e estabilizam os li‑ mites do segmento. Desse modo, o embrião de Drosophila é progressivamente subdividido em unidades de desen‑ volvimento cada vez menores. formação d e órGãos Quando muitos tipos diferentes de células são organi‑ zadas com um propósito específico, formam um órgão. Coração, estômago, rim, fígado e olho são exemplos de órgãos. Uma das características notáveis de um órgão é que se forma em uma parte específica do corpo. O de‑ senvolvimento de um coração na cabeça ou de um olho no tórax de uma mosca, por exemplo, seria totalmente anormal, e nós ficaría mos nos perguntando o que saiu errado. É claro que a formação anatomicamente correta dos órgãos está sob controle genético rigoroso. fiGura 22.10 Cascata de expressão gênica para causar segmentação em embriões de Drosophila. 5 4 3 2 1 0 h Horas após a fertilização Anterior Posterior Genes de efeito materno A polaridade anteroposterior inicial do embrião é estabelecida pelos produtos de genes de efeito materno como bicoid e nanos. Genes gap kni hb kni gtKr Genes pair-rule Genes de polaridade segmentar Genes homeóticos Gradientebicoid gradiente nanos ~2 h ~3 h ~5 h ~10 h gt A expressão dos genes gap subdivide o embrião em zonas largas. Os genes pair-rule, como fushi tarazu (mostrado aqui), são expressos em sete bandas, que ainda subdividem o embrião ao longo do eixo anteroposterior. Os genes de polaridade segmentar, como engrailed (mostrado aqui), são expressos em 14 bandas estreitas ao longo do eixo anteroposterior. Os genes homeóticos, como Ultrabithorax (mostrado aqui em laranja), são expressos em regiões específicas ao longo do eixo anteroposterior. Esses genes, junto com os genes pair-rule e de polaridade segmentar, determinam as identidades de segmentos individuais no embrião em desenvolvimento. ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 11 Os geneticistas obtiveram informações sobre a natu‑ reza desse controle a partir do estudo de outro gene em Drosophila. Esse gene é denominado eyeless por causa do fenótipo de moscas mutantes para ele (figura 22.11). O gene eyeless de tipo selvagem codifica um fator de trans‑ crição de homeodomínio cuja ação ativa uma via de de‑ senvolvimento com a participação de vários milhares de genes. A princípio, são ativados vários genes reguladores subordinados. Então, seus produtos desencadeiam uma cascata de processos que criam tipos celulares específicos no olho em desenvolvimento. O papel do gene eyeless foi demonstrado pela sua ex‑ pressão em tecidos que normalmente não formam olhos (figura 22.12). Walter Gehring e colegas fizeram isso pela criação de moscas transgênicas nas quais o gene eyeless foi fundido a um promotor que poderia ser ativado em tecidos específicos. A ativação desse promotor causou a transcrição do gene eyeless fora de seu domínio normal de expressão. Por sua vez, isso levou à formação de olhos em localizações anormais, como asas, pernas e antenas. Esses olhos adicionais (ou ectópicos) eram anatomicamente bem‑desenvolvidos e funcionais; na verdade, seus fotor‑ receptores respondiam à luz. Um achado ainda mais notável é que um homólogo do gene eyeless em mamíferos, denominado Pax6, também produz esses olhos adicionais quando é inserido em cro‑ mossomos de Drosophila. Gehring e colaboradores usaram o homólogo de eyeless do camundongo para transformar Drosophila e obtiveram o mesmo resultado que o obtido com o próprio gene eyeless. Isso mostrou que o gene do ca‑ mundongo, que também codifica uma proteí na do home‑ odomínio, é funcionalmente equivalente ao gene de Dro‑ sophila; ou seja, regula a via de desenvolvimento do olho. No entanto, quando o gene de camundongo é inserido em Drosophila, produz olhos de Drosophila, não olhos de camun‑ dongo. Os olhos de Drosophila surgem porque os genes que respondem ao comando regulador do gene de camundon‑ go inserido são genes normais de Drosophila que, obviamen‑ te, especificam a formação de um olho de Drosophila. Em camundongos, as mutações no homólogo do gene eyeless reduzem o tamanho dos olhos; por esse motivo, o fenótipo mutante é denominado Small eye. Um homólogo de eyeless e Small eye também foi encontrado em seres humanos. As mutações nesse gene causam aniridia, uma síndrome de defeitos oculares na qual há diminuição ou ausência da íris. A descoberta de genes homólogos que controlam o desenvolvimento ocular em diferentes organismos tem grandes implicações evolutivas. Sugere que a função des‑ ses genes é muito antiga, datando do ancestral comum de moscas e mamíferos. Talvez os olhos desse organismo ancestral não fossem mais que um simples aglomerado de células fotossensíveis organizadas graças aos efeitos reguladores de um gene eyeless primitivo. Durante a evo‑ lução, esse gene continuou a regular o processo cada vez mais complexo de desenvolvimento ocular, de maneira que hoje olhos tão diferentes quanto os de insetos e de mamíferos ainda são formados sob seu controle. O texto Resolva | Cegueira da caverna desafia você a pensar sobre a situação genética em organismos com perda perma‑ nente da capacidade de formar olhos. fiGura 22.11 O fenótipo de um mutante eyeless em Drosophila. fiGura 22.12 Olho extra produzido pela expressão do gene eyeless de tipo selvagem de Drosophila na antena de uma mosca. Olho extra Co rt es ia d e W al te r G eh rin g, U ni ve rs itä t B as el , S uí ça . O gene eyeless de Drosophila e o gene Pax6 de camundon‑ go são os reguladores mestres do desenvolvimento ocular. A análise da se quência demonstrou que esses dois genes são ho‑ mólogos – ou seja, eles são derivados de um gene que estava presente no ancestral comum de moscas e mamíferos. Outros animais com olhos também parecem ter um derivado desse gene. Alguns animais que vivem em cavernas, como o peixe cego da caverna, perderam a capacidade de formar olhos. Que hipótese você proporia para explicar a ausência de olhos nesses animais? Como você poderia testar essa hipótese? A Leia a resposta do problema no material disponível on‑line. Cegueira da caverna resolva! 12 Fundamentos de Genética especificação d e tipos celulares As células dos órgãos diferenciam‑se de maneiras especí‑ ficas. Por exemplo, algumas células tornam‑se neurônios, enquanto outras se tornam células de suporte neuronal. Os mecanismos que regulam essa diferenciação foram analisados pelo estudo de situações muito simples com a participação de alguns tipos celulares. Uma dessas si‑ tuações ocorre no desenvolvimento do olho de Drosophila (figura 22.13). Cada um dos grandes olhos compostos de Drosophila origina‑se como lâminas planas de células em um disco imaginal. A princípio, todas as células nessa lâmina epi‑ telial têm aparência igual, mas, na fase avançada do está‑ gio larvar, forma‑se um sulco perto da margem posterior do disco. À medida que esse sulco se desloca em sentido anterior através do disco, desencadeia uma onda de divi‑ sões celulares na sua esteira. As células recém‑divididas diferenciam‑se em tipos celulares específicos e formam as 800 facetas in di vi duais do olho do adulto. Cada faceta é constituí da de 20 células. Oito são neurônios fotorre‑ ceptores destinados a absorver luz; quatro são cones que secretam uma lente para focalizar a luz nos fotorrecep‑ tores; seis são células da bainha que proporcionam iso‑ lamento e sustentação; e as duas células remanescentes formam pelos sensoriais na superfície do olho. Portan‑ to, uma série altamente padronizada de facetas intrica‑ damente diferenciadas desenvolve‑se a partir do que era uma lâmina plana de células idênticas. O que é responsá‑ vel por essa transformação? Gerald Rubin e colaboradores tentaram responder a essa pergunta colecionando mutações que perturbam o desenvolvimento ocular. A pesquisa suscitou o conceito de que a especificação de tipos celulares em cada fa‑ ceta depende de uma série de interações célula a cé‑ lula. Isso é ilustrado na diferenciação das oito células fotorreceptoras, designadas R1, R2,... R8 (figura 22.14). Em uma faceta totalmente formada, seis fotorrecepto‑ res (R1‑R6) são organizados em um círculo ao redor dos outros dois (R7, R8). Uma das células centrais, R8, é a primeira a se diferenciar na faceta em desenvolvimento. Seu surgimento é seguido pela diferenciação das células periféricas R2 e R5, depois por R3 e R4, e R1 e R6; por fim, a segunda célula central, R7, diferencia‑se em um fotorreceptor. Esse último processo foi estudado em muitos detalhes. Rubin e colegas mostraram que a diferenciação da célu‑ la R7 depende da recepção de um sinal da célula R8 já diferenciada. Para receber esse sinal, a célula R7 tem de sintetizar um receptor específico, uma proteí na ligada à membrana codificada por um gene denominado sevenless (sev). As mutações nesse gene abolem a função do recep‑ tor e impedem a diferenciação da célula R7 em neurô‑ nio; em vez disso, diferencia‑se em cone. O sinal para o receptor R7 é produzido por um gene denominado bride of sevenless (boss) expresso especificamentena superfície da célula R8. O contato entre a célula R8 diferenciada e a célula R7 indiferenciada possibilita a interação do sinal R8, ou ligante, como é tecnicamente conhecido, com o receptor R7 para ativá‑lo. Essa ativação induz uma cas‑ cata de mudanças na célula R7 que, por fim, provocam sua diferenciação em um neurônio fotorreceptor. Prova‑ velmente, essa diferenciação é mediada por um ou mais fatores de transcrição em genes no núcleo de R7. Assim, o sinal da célula R8 é “transduzido” para o núcleo de R7, onde altera o padrão de expressão gênica. Portanto, a análise do desenvolvimento ocular em Drosophila mostra que a indução, o processo de determinar o destino de uma célula indiferenciada por um sinal de uma célula diferenciada, pode ter papel importante na especificação de tipos celulares. fiGura 22.13 Desenvolvimento do olho de Drosophila. O deslocamento do sulco morfogenético em direção à parte anterior do disco imaginal do olho-antena é seguido por uma onda de divisões celulares. As células recém-divididas começam a se diferenciar em tipos específicos. O detalhe mostra a diferenciação dos fotorreceptores (R1-R8) e cones que formam cada omatídio (faceta) do olho composto. Anterior Anterior Células recém-divididas Omatídio maduro com 8 células fotorreceptoras e 4 cones Posterior Posterior Disco imaginal da antena Disco imaginal do olho Sulco morfogenético (desloca-se em sentido posteroanterior) C R8 R1 R2 R3R4 R5 R6 R7 C C CR8 R1 R2 R3R4 R5 R6 R7 C CR8 R1 R2 R3R4 R5 R6 R8 R2 R3R4 R5R8R8 R2R5 Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 13 A proteí na codifi cada pelo gene sev é uma tirosino‑ quinase – ou seja, uma proteí na que fosforila re sí duos de tirosina em outras proteí nas. Depois que é ativa‑ da por contato com o ligante BOSS, a proteí na SEV fosforila outras proteí nas dentro da célula R7. Essas proteí nas intracelulares são efetores em direção 3 do fiGura 22.14 Determinação do fotorreceptor R7 de um omatídio (faceta) no olho composto de Drosophila. a. Organização dos oito fotorre- ceptores (1 a 8) e quatro cones (C) em um omatídio. B. Sinalização entre a célula R8 diferenciada e a célula R7 presuntiva. A proteí na bride of sevenless (BOSS) na célula R8 é o ligante para a proteí na receptora sevenless (SEV) na superfície da célula R7. A ativação desse receptor inicia uma cascata de sinalização na célula R7 que induz sua diferenciação. Os geneticistas podem estudar o desenvolvimento em vertebrados pela aplicação do conhecimento obtido com o estudo de modelos invertebrados, por análise de mu- tações em modelos vertebrados como camundongos e por exame da diferenciação de células-tronco. Grande parte do conhecimento sobre o controle gené‑ tico do desenvolvimento provém do estudo de modelos invertebrados. Os geneticistas gostariam de aplicar e es‑ tender seu conhecimento aos vertebrados. O objetivo fi nal seria aprender sobre o controle genético do desen‑ volvimento em sua própria espécie. Uma estratégia para alcançar esse objetivo é usar as informações obtidas pelo estudo de genes de invertebrados para identifi car genes importantes para o desenvolvimento de vertebrados. Ou‑ tra é estudar espécies de modelos vertebrados com técni‑ cas semelhantes às que são usadas em invertebrados. HomóloGos em verteBrados d e Genes d e inverteBrados Depois de isolar e sequenciar um gene, os pesquisado‑ res podem buscar em bancos de dados de se quências de DNA os genes homólogos em outros organismos. Se as se‑ quências do gene forem razoavelmente bem conservadas Análise genética do desenvolvimento em vertebrados R8 R7 R2R5 R6 R1 R3R4 C C CC Célula R7 Determinação de R7 Cascata sinalizadora Proteína SEV (receptora) Proteína BOSS (ligante) Célula R8 A. B. R8 R7 R2R5 R6 R1 R3R4 C C CC Célula R7 Determinação de R7 Cascata sinalizadora Proteína SEV (receptora) Proteína BOSS (ligante) Célula R8 A. B. sinal BOSS. Por fi m, elas ativam fatores de transcrição para estimular a expressão dos genes participantes da diferenciação da célula R7 como fotorreceptor. Para entender melhor a interação BOSS‑SEV, leia Problema resolvido | Efeitos das mutações durante o desenvolvi‑ mento ocular. pontos essenciais jj Os genes zigóticos são ativados após fertilização em resposta a produtos gênicos maternos jj Em Drosophila, os produtos dos genes de segmentação regulam a subdivisão do embrião em uma série de segmentos ao longo do eixo anteroposterior jj A identidade de cada segmento corporal é determinada pelos produtos de genes nos complexos gênicos homeó ticos bithorax e Antennapedia jj A formação de um órgão pode depender do produto de um gene regulador mestre, como o gene eyeless em Drosophila jj Em Drosophila os tipos celulares específicos diferenciam‑se após o estabelecimento de identidades segmentares jj Os processos de diferenciação podem exigir um sinal produzido por uma célula e um receptor produzido por outra célula. 14 Fundamentos de Genética ao longo da evolução, esse procedimento será eficaz mesmo em espécies com parentesco distante. Por isso, foi possível identificar genes de várias espécies de verte‑ brados homólogos aos genes de Drosophila e C. elegans. A identificação de um gene em vertebrado torna possível, portanto, fazer muitos tipos de análises experimentais, inclusive ensaios da expressão gênica em nível de RNA e proteí na. Uma das aplicações mais expressivas dessa técnica mostrou que os vertebrados contêm homólogos dos ge‑ nes homeó ticos de Drosophila. Esses genes denominados Hox foram identificados inicialmente pela sondagem de Southern blots do DNA genômico de camundongo e do ser humano com segmentos dos genes homeó ticos de Drosophila. Em seguida, os fragmentos de DNA com hibri‑ dização cruzada foram clonados, mapeados com enzimas de restrição e sequenciados. Os resultados de todas essas análises estabeleceram que camundongos, seres huma‑ nos e muitos outros vertebrados examinados até agora têm 38 genes Hox em seus genomas. Em geral, esses ge‑ nes estão organizados em quatro agrupamentos, cada um deles com 120 kb; em camundongos e seres humanos, cada agrupamento está localizado em um cromossomo diferente. Parece que os quatro agrupamentos de genes Hox foram criados pela quadruplicação de um agrupa‑ mento primordial bem no início da evolução dos verte‑ brados, provavelmente há 500 a 600 milhões de anos. Os genes em cada agrupamento Hox são transcritos no mesmo sentido, e sua expressão prossegue de uma extremidade à outra do agrupamento, tanto espacial (em sentido anteroposterior no embrião) quanto temporal‑ mente (do início ao fim do desenvolvimento). Portanto, há um paralelo estreito com os perfis de expressão dos genes ANT‑C e BX‑C de Drosophila. Estudos comparati‑ vos indicam que os genes Hox têm papéi s importantes na identificação de re giões específicas em muitos tipos diferentes de embriões de vertebrados. camundonGo | mutações por inserção aleatória e mutações kn ockout Gene‑específicas Não é possível estudar o controle genético do desenvol‑ vimento em vertebrados com a mesma minúcia que em invertebrados como Drosophila. Existem, obviamente, li‑ mitações técnicas e logísticas. Os vertebrados têm ciclos de vida comparativamente longos, o custo da criação é elevado e é difícil obter e analisar cepas mutantes, sobre‑ tudo aquelas que têm importância no desenvolvimento. Apesar dessas deficiên cias, os geneticistas conseguiram avançar na análise genética do desenvolvimento em algu‑ mas espécies de vertebrados, sobretudo o camundongo. Um grande número de loci responsáveis por doen ças genéticas foi identificado no camundongo, e alguns de‑ les participam dos processos de desenvolvimento. Muitos desses loci foram descobertos por meio de projetos em andamento de coleção de mutações espontâneas. Esse trabalho exige a criação de um número muito grande de camundongos e a análise das diferenças fenotípicas, proBlema Em Drosophila,a interação das proteí nas SEV e BOSS envia sinais para que as células R7 se diferenciem como fotorreceptores nos omatídios dos olhos compostos; quando essa interação não ocorre, as células R7 diferenciam-se em cones. As proteí nas SEV e BOSS não parecem ser necessárias em nenhum outro processo de desen- volvimento na mosca. (a) Preveja os fenótipos das moscas homo- zigotas para mutações recessivas com perda de função nos genes sev ou boss. (b) Preveja o fenótipo de uma mosca heterozigota para uma mutação dominante com ganho de função que ativa constitu- tivamente a proteí na SEV. (c) Suponha que uma cópia dessa mu- tação sev com ganho de função dominante tenha sido introduzida em uma mosca homozigota para mutação recessiva com perda de função no gene boss. Qual seria o fenótipo dessa mosca? fatos e conceitos 1. Uma mutação com perda de função de um gene abole a função dessa proteí na que é produto do gene. 2. Uma mutação com ganho de função em um gene dota o produ- to desse gene de uma nova função. 3. Uma proteí na com atividade constitutiva desempenha sua fun- ção permanentemente. análise e solução Esse problema concentra-se em um evento do desenvolvimento no olho de Drosophila – diferenciação da célula fotorreceptora R7. Uma etapa essencial no processo que leva a esse evento é a sinali- zação entre a molécula ligante BOSS, localizada na membrana da célula R8 já diferenciada, e o receptor SEV, localizado na membrana da célula R7 ainda indiferenciada (ver Figura 22.14). A inatividade de uma dessas proteí nas impede o “prosseguimento” do sinal. (a) Portanto, mutações com perda de função recessivas nos genes sev e/ou boss serão responsáveis, em moscas, pela falta de fotorrecep- tores R7 nos omatídios dos olhos. (b) No entanto, seria espera- do que uma mutação com ganho de função dominante que ativa constitutivamente a proteí na SEV causasse diferenciação de R7. (c) Além disso, essa diferenciação seria esperada mesmo se a mosca fosse homozigota para uma mutação com perda de função recessi- va no gene boss, porque a função de BOSS é irrelevante com uma proteí na SEV ativada constitutivamente. Efeitos das mutações durante o desenvolvimento ocular proBlema resolvido Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 15 além da avaliação da transmissão genética de quaisquer diferenças. Esse é um trabalho dispendioso e meticuloso que só recebe apoio em algumas unidades do mundo. Uma vez detectada, uma mutação pode ser mapeada nos cromossomos, depois o gene mutante pode ser identifi‑ cado e analisado em nível molecular. As técnicas de in‑ dução de mutações por inserção de se quências de DNA conhecidas em genes aceleraram esse processo. É muito mais fácil mapear e analisar as mutações por inserção do que as mutações espontâneas, já que elas foram marca‑ das pelo DNA inserido. Além disso, como o agente de inserção – um transpóson ou um retrovírus inativado – geralmente não é tão específico em relação à posição no genoma em que se localiza, essas técnicas são mui‑ to indiscriminadoras no que diz respeito aos genes que sofrem mutação. Portanto, muitos genes relevantes para um processo de desenvolvimento em estudo podem ser “atingidos” por uma inserção e identificados em seguida. Os geneticistas que estudam camundongos também inventaram procedimentos para causar a mutação de genes específicos. Nesses procedimentos, discutidos no Capítulo 16, a integridade de um gene é desorganizada por uma inserção dirigida especificamente para esse gene. Essa desorganização, conhecida como mutação knockout, pode ajudar o pesquisador a determinar o papel do gene normal durante o desenvolvimento. Por exemplo, camun‑ dongos homozigotos para uma mutação knockout no gene Hoxc8 desenvolvem um par extra de costelas posterior às costelas normais; também apresentam dedos em garra nas patas anteriores. O fenótipo de costela extra nesses ca‑ mundongos mutantes é reminiscente das transformações segmentares observadas nas mutações homeó ticas em Dro‑ sophila. Assim, o gene Hoxc8 de camundongo parece par‑ ticipar do estabelecimento da identidade dos tecidos ao longo do eixo anteroposterior e também nos dedos. A análise genética do desenvolvimento em camundon‑ gos vem fornecendo pistas sobre o desenvolvimento de nossa própria espécie. Por exemplo, mutações em pelo menos dois genes diferentes de camundongo simulam o desenvolvimento de assimetrias esquerda–direita anor‑ mais em seres humanos. Normalmente, seres humanos, camundongos e outros vertebrados apresentam estruturas assimétricas ao longo do eixo esquerda–direita do corpo. O tubo cardía co sempre faz uma alça à direita, e fígado, estômago e outras vísceras são desviados para esquerda ou direita, afastando‑se da linha mediana. Em in di ví duos mutantes, essas assimetrias características não são observa‑ das, talvez por causa de um defeito nos mecanismos que estabelecem o plano corporal básico. Portanto, o estudo desses tipos de camundongos mutantes pode ajudar a es‑ clarecer a posição dos órgãos em seres humanos. es t udos com células‑tronco d e mamíferos As células que chegam à diferenciação terminal no cor‑ po humano – linfócitos, neurônios, fibras muscula res, e assim por diante – geralmente não se dividem. Quando células desse tipo morrem, é preciso subs ti tuí ‑las, ou ocorre atrofia do tecido a que pertencem. A reposição ocorre quando células não especializadas presentes no tecido dividem‑se e produzem células que, em seguida, diferenciam‑se no tipo celular especializado. Esses pre‑ cursores não especializados de células especializadas são denominados células‑tronco. Por exemplo, a medula óssea no fêmur de um ser humano contém células indi‑ ferenciadas que podem substituir vários tipos de células do sangue. Essas células‑tronco hematopoé ticas mantêm o suprimento de linfócitos, hemácias e plaquetas do sis‑ tema circulatório. Os tecidos de alguns órgãos, como o coração, parecem ter pouquí ssimas células‑tronco; con‑ sequentemente, têm limitada capacidade de regenerar o material perdido ou danificado. Outros tecidos, como o revestimento intestinal e a pele, têm grandes populações de células‑tronco, que substituem com vigor as células diferenciadas perdidas. Por serem encontrados em or‑ ganismos desenvolvidos, esses tipos de células‑tronco são denominados células‑tronco adultas. As células‑tronco também são encontradas em orga‑ nismos em desenvolvimento. Na verdade, durante os primeiros estágios do desenvolvimento, todas as células, ou a maioria delas, têm propriedades de células‑tronco. As células retiradas de um embrião de camundongo, por exemplo, podem ser cultivadas in vitro e transplan‑ tadas em outro embrião de camundongo, no qual irão se dividir e contribuir para a formação de muitos tipos de tecidos e órgãos. Portanto, as células‑tronco embrioná‑ rias (CTE) têm enorme potencial de desenvolvimento; ou seja, são pluripotentes – capazes de se desenvolver de mui‑ tas maneiras. Derivadas de tecido embrionário ou adulto, as célu‑ las‑tronco oferecem uma oportunidade de estudar os me‑ canismos participantes da diferenciação de tipos celulares especiais. As células‑tronco podem ser obtidas de vários mamíferos, entre eles camundongos, macacos e seres hu‑ manos. Podem ser cultivadas in vitro e examinadas para ava‑ liar a diferenciação durante o crescimento em cultura ou depois do transplante para um organismo hospedeiro. As células‑tronco em cultura podem ser tratadas de várias ma‑ neiras para identificar o que estimula seu desenvolvimento em um sentido específico. Técnicas moleculares, entre elas as tecnologias de chip gênico, possibilitam que os pesquisa‑ dores determinem que genes as células expressam à me‑ dida que se revelam seus programas de desenvolvimento. Como as células‑tronco embrionárias têm máximo po‑ tencial de desenvolvimento, são ideais para esse tipo de análise. Essas células geralmente são derivadas da massa celular interna de embriões criados porfertilização in vi‑ tro. As células isoladas dessa massa são plaqueadas sobre uma camada de “células alimentadoras” (feeder cells) sem atividade mitótica, que oferecem fatores de crescimento para estimular a divisão. Para as CTE de camundongo em cultura, o tempo de duplicação é de aproximadamente 12 horas; para as CTE humanas, é de cerca de 36 horas. Uma população de células clonais é aquela que provém de uma única célula progenitora. 16 Fundamentos de Genética As CTE começam a se diferenciar quando são trans‑ feridas de culturas de células alimentadoras para cultu‑ ras de suspensão supridas com meio apropriado. Nessas condições, elas formam corpos embrioides, que são agrega‑ dos multicelulares constituí dos de células diferenciadas e indiferenciadas. Em algumas espécies, os corpos em‑ brioides assemelham‑se aos embriões iniciais. As células nesses corpos podem diferenciar‑se em tipos de células especializadas derivadas de cada uma das três camadas primárias de tecido – ectoderma, mesoderma e endo‑ derma. Por exemplo, elas podem formar neurônios, que são derivados do ectoderma; células muscula res lisas ou células cardía cas de contração rítmica, derivadas do me‑ soderma; ou células das ilhotas pancreá ticas, derivadas do endoderma. A observação desse processo em diferen‑ tes linhagens celulares – por exemplo, em linhagens nas quais houve mutação de determinados genes – pode tor‑ nar possível analisar a rede genética de interações impli‑ cadas na diferenciação de vários tipos celulares. A questão de obtenção e análise de CTE humanas é, sem dúvida, controversa. As linhagens de CTE humanas em uso atualmente foram obtidas de embriões doados por pessoas que procuraram ajuda médica para ter filhos por fertilização in vitro. Habitualmente, esse processo produz muito mais embriões do que são usados para ge‑ rar crianças. Um casal pode então decidir doar os embri‑ ões não usados para pesquisa. A retirada de CTE exige a destruição dos embriões. Algumas pessoas consideram aceitável a destruição de embriões iniciais; para outras, isso é imoral. As controvérsias acerca dessa prática leva‑ ram alguns governos a suspender ou restringir o apoio financeiro para pesquisas com células‑tronco embrioná‑ rias humanas. A discussão sobre o financiamento de pesquisa com células‑tronco embrionárias humanas intensificou‑se com a perspectiva de uso das CTE humanas na cura de doen ças causadas pela perda de tipos celulares específi‑ cos, como o diabetes melito (no qual há perda das células das ilhotas pancreá ticas) e a doen ça de Parkinson (na qual há perda de alguns tipos de neurônios em determi‑ nada região do encéfalo). A terapia com CTE também foi proposta para o tratamento de incapacidades como as resultantes de lesão medular. A ideia é transplantar cé‑ lulas derivadas de CTE para tecidos doentes ou lesados e deixar que essas células regenerem as partes perdidas ou lesadas do tecido. Os experimentos com camundongos e ratos sugerem que essa estratégia poderia ser eficaz em seres humanos. Entretanto, ainda há muitos problemas técnicos a resolver. Por exemplo, ainda não é possível obter culturas puras de determinado tipo celular dife‑ renciado. Quando se desenvolvem em cultura, as CTE humanas se diferenciam em muitos tipos de células; o isolamento de um tipo – por exemplo, células cardía cas – é um desafio técnico descomunal. Os proponentes da terapia com células‑tronco huma‑ nas também precisam resolver outros tipos de problema. As células derivadas de cultura in vitro poderiam divi‑ dir‑se de maneira descontrolada e formar tumores depois de transplantadas em um hospedeiro, ou poderiam ser eliminadas pelo sistema imune do hospedeiro. Para evi‑ tar esse último problema, os pesquisadores propuseram o transplante de células geneticamente idênticas às cé‑ lulas do hospedeiro, que poderiam ser criadas pelo uso de uma das células somáticas do hospedeiro para gerar a população de CTE. Uma célula somática do hospedeiro poderia ser fundida a um ovócito enucleado obtido de uma doadora (não necessariamente o hospedeiro). Se o ovócito geneticamente alterado, que é diploide, se divi‑ disse para formar um embrião, seria possível isolar célu‑ las desse embrião para criar uma linhagem de CTE, que então poderiam fornecer material geneticamente idênti‑ co para retransplante no hospedeiro. A produção de CTE por transferência do núcleo de uma célula somática para um ovócito enucleado é deno‑ minada clonagem terapêutica. Também seria possível obter células‑tronco por indução da reversão de células somá‑ ticas a um estado indiferenciado. Experimentos recentes efetuados nos EUA e no Japão indicam que essa técni‑ ca pode ser viá vel. Células cutâ neas diferenciadas foram induzidas a se tornarem células pluripotentes por trans‑ formação genética por uma mistura de quatro genes clo‑ nados. Entretanto, alguns dos genes usados nesses expe‑ rimentos estão associados à formação de tumor quando são expressos impropriamente. Assim, é necessário fazer mais pesquisas antes que se possam usar células pluripo‑ tentes induzidas na terapia com células‑tronco. clonaGem reprodutiva A clonagem terapêutica é diferente da clonagem reprodutiva, que visa à produção de um in di ví duo completo por trans‑ ferência do núcleo de uma célula somática de doador para um ovócito enucleado, seguida pela transformação do ovócito em uma cópia geneticamente idêntica do doador. Em 1997, os pesquisadores no Roslin Institute, na Escócia, produziram o primeiro mamífero clonado – uma ovelha que recebeu o nome de Dolly (ver texto introdutório do Capítulo 2). Dolly foi criada por substituição do núcleo de um ovócito pelo núcleo de uma célula retirada do úbere de uma ovelha adulta. É claro que o núcleo transplanta‑ do continha todas as informações genéticas necessárias para orientar o desenvolvimento de Dolly, embora fosse originado de uma célula diferenciada. Desde a criação de Dolly, os cientistas produziram muitos outros animais por clonagem reprodutiva – camundongos, gatos, vacas e ca‑ bras. Portanto, as células diferenciadas parecem ter o po‑ tencial genético de guiar o desenvolvimento. Às vezes, porém, animais produzidos por clonagem reprodutiva têm anormalidades do desenvolvimento e a vida encurtada. Com fre quência, há atraso do crescimen‑ to. Essa ausência de vigor sugere que os núcleos somáti‑ cos usados na clonagem reprodutiva são diferentes dos núcleos zigóticos produzidos por fertilização comum. Talvez os núcleos somáticos tenham acumu lado muta‑ ções ou sofrido alterações associadas ao imprinting gené‑ tico ou à inativação cromossômica – metilação de alguns Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 17 nucleo tí dios, acetilação de histonas, e assim por diante. Seria preciso reverter essas alterações para que um nú‑ cleo somático atuasse como núcleo zigótico. Em vista dos problemas encontrados na clonagem reprodutiva de ani‑ mais, a comunidade científica internacional não consi‑ dera segura a clonagem reprodutiva de seres humanos e, por isso, há amplo consenso de que não deve ser tentada. alterações Genéticas na diferenciação das células imunes d e verteBrados Embora as evidências de clonagem reprodutiva sugiram que as células diferenciadas podem ter o mesmo conteú‑ do de DNA que um ovócito fertilizado, conhecemos al‑ guns tipos de células vertebradas diferenciadas que não têm. Essas células são componentes do sistema que pro‑ tege animais contra infecção por vírus, bactérias, fungos e protistas – o sistema imune. Em mamíferos, nos quais se concentrou a maior parte das pesquisas, o sistema imune se constitui de vários tipos diferentes de células, todas derivadas de células‑tronco residentes na medula óssea. Essas células‑tronco divi‑ dem‑se e produzem mais células de seu próprio tipo, além de precursores de células imune especializadas. Duas classes importantes de células imunes especializa‑ das participam diretamente do combate aos patógenos invasores.Os plasmócitos B produzem e secretam proteí‑ nas denominadas imunoglobulinas, também conhecidas como anticorpos, e as células T citotóxicas produzem proteí‑ nas que se projetam de suas superfícies e atuam como receptores para diversas substâncias. Tanto os anticorpos das células B quanto os receptores das células T são ca‑ pazes de reconhecer outras moléculas – por exemplo, os materiais estranhos introduzidos por um patógeno – por um mecanismo tipo chave e fechadura. A molécula estra‑ nha, denominada antígeno, é a chave que se encaixa com precisão na fechadura formada pelo anticorpo da célula B ou o receptor da célula T (figura 22.15). Essa especifi‑ cidade é a base da capacidade de defesa de um animal contra patógenos. No entanto, como existem muitos pa‑ tógenos em potencial diferentes, um animal tem de ser capaz de produzir muitos tipos diferentes de anticorpos e receptores de células T para combater infecções. Os anticorpos e os receptores de células T são proteí‑ nas, e as proteí nas são codificadas por genes. Portanto, para produzir a grande série de anticorpos e receptores de células T necessários para combater todos os patóge‑ nos possíveis, poderia parecer que um animal precisaria ter um número enorme de genes – um número excessi‑ vo até mesmo para caber em um genoma grande como o nosso. Essa situação confundiu os geneticistas durante anos. No último quarto do século 20, porém, os pesqui‑ sadores descobriram como um animal poderia produzir um grande número de diferentes anticorpos e receptores de células T graças à recombinação de pequenos elemen‑ tos genéticos em genes funcionais. O potencial codifica‑ dor alcançado com essas combinações de segmentos gê‑ nicos é estarrecedor. Com uma pequena quantidade de DNA dedicado às funções do sistema imune, um animal é capaz de produzir centenas de milhares, se não milhões, de anticorpos e receptores de células T, cada um deles com uma diferente capacidade de se ligar a uma molécu‑ la estranha de um organismo invasor. Para compreender o funcionamento desse sistema de recombinação, concentremo‑nos na produção de anti‑ corpos. Cada anticorpo é um tetrâmero constituí do de quatro polipeptídios, duas cadeias leves idênticas e duas cadeias pesadas idênticas, unidas por pontes dissulfeto (figura 22.16). As cadeias leves têm cerca de 220 aminoá‑ cidos e as cadeias pesadas, cerca de 445 aminoá cidos. fiGura 22.15 Estrutura tridimensional de um complexo antígeno–anticorpo. A figura só mostra um dos dois sítios de ligação de antígeno de um anticorpo típico. O antígeno (verde) é a enzima lisozima. O sítio de ligação de antígeno do anticorpo é formado pelas porções amino- terminais de uma cadeia leve (amarela) e uma cadeia pesada (azul). Um re sí duo glutamina que se salienta da lisozima no local de ligação do anticorpo é mostrado em vermelho. A estrutura é ba sea da em dados de difração por raios X. D e Am it et a l., S ci en ce 2 33 :7 47 , C op yr ig ht © 1 98 6 th e Am er ic an A ss oc ia tio n fo r t he A dv an ce m en t o f S ci en ce . A fo to gr af ia é u m a co rt es ia d e R. J. P ol ja k. 18 Fundamentos de Genética Toda cadeia, leve ou pesada, tem uma região va riá vel ami‑ noterminal, dentro da qual a se quência de aminoá cidos varia nos diferentes tipos de anticorpos que um animal produz, e uma região constante carboxiterminal, dentro da qual a se quência de aminoá cidos é idêntica em todos os anticorpos de determinada classe. As cadeias leves e pesadas de um anticorpo são codifi‑ cadas por diferentes loci no genoma. Em seres humanos, existem dois loci de cadeia leve, o locus kappa (k) no cro‑ mossomo 2 e o locus lambda (l) no cromossomo 22, e há um locus de cadeia pesada, localizado no cromossomo fiGura 22.16 Estrutura de uma molécula de anticorpo. O detalhe mostra a interação de fechadura e chave entre o anticorpo e o antígeno que ele reconhece. Regiões variáveis Regiões variáveis Regiões constantes Regiões constantes COOH COOH COOH HOOC Antígeno S S S S H2N NH2 H2N NH2 Cadeia pesadaSítio de ligação do antígeno S S S S Cadeia leve Ca de ia pe sa da Ca de ia lev e 1�segmento de gene Cκ 5�segmentos de genes Jκ DNA genômico em célula-tronco embrionária DNA rearranjado em plasmócito maduro Transcrito de RNA primário Recombinação somática para unir o segmento de gene Lκ3 Vκ3 ao segmento de gene Jκ4�por deleção do DNA entre eles mRNA maduro Processamento de RNA Transcrição Produto polipeptídico primário Cadeia leve kappa madura 40�segmentos de genes Lκ Vκ funcionais Sequência não codificadora longa 1 2 4 Tradução 5 Retirada do peptídio líder 3 Região variável Região constante COOH COOH A A A A H2N H2N COOH 3'5' 3'5' CκJκ5Jκ4Jκ3Jκ2Jκ1Vκ40Lκ40Vκ3Lκ3Vκ2Lκ2Vκ1Lκ1 ET APA ET APA ET APA ET APA ET APA 14. Cada um desses loci é constituí do de uma longa série de segmentos de gene. Concentremo‑nos no locus kappa para compreendermos como esses segmentos são orga‑ nizados e como são recombinados em se quências codi‑ ficadoras lógicas para produzir diferentes polipeptídios. Um polipeptídio kappa é codificado por três tipos de segmentos de gene: 1. Um segmento de gene L k V k , que codifica um peptídio líder e os 95 aminoá cidos aminoterminais da região va‑ riá vel da cadeia leve kappa; o peptídio líder é retirado da fiGura 22.17 Controle genético das cadeias leves kappa de anticorpo humano. Cada cadeia leve kappa é codificada por um gene montado a partir de diferentes tipos de segmentos de gene no locus kappa da imunoglobulina (IGK) no cromossomo 2. Essa montagem ocorre durante a diferenciação de plasmócitos B do sistema imune. Capítulo 22 Controle Genético do Desenvolvimento Animal 19 cadeia leve kappa por clivagem depois de guiar o polipep‑ tídio nascente através da membrana do retículo endo‑ plasmático em um plasmócito sintetizador de anticorpos. 2. Um segmento de gene J k , que codifica os últimos 13 aminoá cidos da região va riá vel da cadeia leve kappa; o símbolo J k é usado para esse segmento de gene porque o peptídio que ele codifica junta o peptídio aminoter‑ minal codificado pelo segmento L k Vk a um peptídio carboxiterminal codificado pelo próximo tipo de seg‑ mento de gene. 3. Um segmento de gene C k , que codifica a região cons‑ tante da cadeia leve kappa. Em seres humanos, o locus kappa contém 76 segmentos de gene L k Vk (embora apenas 40 sejam funcionais), cinco segmentos de gene J k e um só segmento de gene C k . Os segmentos de gene J k estão entre os segmentos de gene L k V k e o segmento de gene C k . Nas células da linhagem germinativa, os cinco segmentos J k são separados dos seg‑ mentos L k V k por uma se quência não codificadora longa, e do segmento de gene C k por outra se quência não codifi‑ cadora de aproximadamente 2 kb (figura 22.17). Durante o desenvolvimento de determinada célula B, o gene da cadeia leve kappa que será expresso é montado a partir de um segmento L k V k , um segmento J k e um só segmento C k por um processo de recombinação somática. Qualquer um dos 40 segmentos de gene L k V k funcionais pode ser unido a qualquer um dos cinco segmentos J k nesse pro‑ cesso; o DNA entre os segmentos unidos é simplesmente deletado (figura 22.18). O evento de união é mediado por sítios denominados se quências sinalizadoras de recombi‑ nação (RSS), que são adjacentes a cada segmento de gene. Esses sítios são constituí dos de repetições com 7 ou 9 pares de bases separadas por espaçadores com 12 ou 23 pares de bases. As repetições nas RSS em posição imediatamente 3 a um segmento de gene L k V k são complementares às repe‑ tições nas RSS em posição imediatamente 5 a um segmen‑ to de gene J k . Quando essas repetições se emparelham, um complexo proteico pode catalisar a recombinação entre elas, unindo o segmento L k V k ao segmento J k . As proteí nas 1 e 2 do gene ativador
Compartilhar