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AULA 2 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA Prof.ª Lígia Maria Bueno Pereira Bacarin 2 INTRODUÇÃO Prezados cursistas, nesta aula, apresentam-se no âmbito dos Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), os “autismos” como um transtorno que não apresenta um modelo pronto, de fácil identificação ou classificação, mas sim que se caracteriza como um transtorno comportamental de causas neurológicas múltiplas. Assim, tal transtorno poderá ser identificado e diagnosticado com maior probabilidade de acertos clínicos e institucionais. Nesse sentido, retoma-se a compreensão que estabelece o princípio básico do TEA como um transtorno comportamental, pois só será possível detectar uma criança autista e encaminhá-la para um diagnóstico clínico ao se observar seu comportamento, principalmente nos seus primeiros cinco anos de vida. Salienta-se a necessidade da observação, pois não é rara a existência de autistas que não apresentam qualquer sinal físico de alteração, autistas com síndromes (enquadrando-se em uma gama variada delas) e autistas que não apresentam nenhuma síndrome. A desmistificação se apresenta nesse momento como uma das formas de se combater, nas mais diversas áreas profissionais que atuam com autismo, a percepção de que só há o diagnóstico de TEA se a criança apresentar alguma característica física que indique a presença de uma síndrome. Com a concepção de TEA com foco no comportamento da criança, existem características-alvo que auxiliam no estágio de observação e investigação: Dificuldade de interação social; Déficit quantitativo e qualitativo de comunicação social; Padrões de comportamento, atividades e interesses repetitivos e estereotipias. Nesse sentido, após a definição dessa tríade, o TEA se conceitua atualmente como um distúrbio complexo de desenvolvimento, comportamental, de etiologias múltiplas de graus variáveis e causas diversas. Isso significa que: Os comportamentos são comuns entre todos os indivíduos do TEA; O que muda é a intensidade das manifestações e a gravidade do acometimento. Tendo em vista tantos pormenores, a problemática que orientará este modulo é: quais são atualmente as características do TEA? E, a partir delas, quais os desdobramentos para o seu diagnóstico? 3 TEMA 1 – SINAIS DE ESPECTRO AUTISTA ASSOCIADO: FUNDAMENTO DA MUDANÇA CONCEITUAL Conforme o organograma a seguir, existem questionamentos que estão além da superfície da mera mudança terminológica: Figura 1 – Diferenciação entre TGD e TEA Considerando que o DSM é um manual de diagnóstico de transtornos mentais que ajuda tanto a nortear e a direcionar a avaliação de comportamento de seres humanos (sejam crianças, adolescentes ou adultos) como a orientar as práticas clínicas e institucionais de todos os profissionais envolvidos no tratamento do TEA, devemos analisar a nomenclatura apresentada na sua quinta edição, uma vez que a mudança não foi apenas nominal, mas conceitual. O termo espectro já carrega em si um questionamento: o que ele significa? O que esse termo significa no âmbito do autismo? Para desenvolver essas questões, tem-se como sinônimo analítico o termo sombra, utilizado pelo neurologista Clay Brites (C. Brites; L. Brites, 2018) para elucidar essa temática. Para esse pesquisador, a sombra não se refere ao sujeito propriamente dito, mas representa apenas uma imagem formada a partir da intensidade de suas características: suave, moderada ou severa. A relevância dessa analogia é considerar que a intensidade da “sombra” depende da forma como o objeto está posicionado em relação ao Sol. Isto é, existe uma continuidade entre poucos sintomas e muitos sintomas, por isso há crianças com quadros leves quando se faz o diagnóstico de TEA, sobretudo na faixa entre um ano e meio até dois anos de idade. Com as intervenções, o quadro pode evoluir a tal ponto que a criança não apresente mais os sintomas detectados anteriormente. Então, tal qual a sombra do Sol, esse espectro se modifica conforme uma série de determinações e possibilita a mudança nos traços do TEA que a criança tem. Espectro ou transtorno? TGD TEA Diferentes graus de comprometimento 4 Quanto às causas do TEA, observa-se que os estudos ainda não são conclusivos, porém existem vários relatos de anormalidades orgânicas, neurológicas, biológicas, além de fatores genéticos, imunológicos e perinatais, achados bioquímicos e neuro-anatômicos relacionados ao autismo. Nesse sentido, As várias patologias associadas com os TID suportam a hipótese de que as manifestações comportamentais que definem este complexo de sintomas podem ser secundárias a uma grande variedade de insultos ao cérebro. A heterogeneidade desses distúrbios pode ser devida a etiologias distintas ou a uma combinação de fatores, tais como etiologia, predisposição genética e fatores ambientais (Gadia; Tuchman; Rotta, 2004, p. 86). Importante observar que muitas crianças apresentam outros transtornos, como por exemplo TDAH, com sinais de espectro autista associados, mas isso não é o TEA. Ou seja, não é o quadro principal, mas o autismo vem associado a esse transtorno. Nesse sentido, a mudança de nomenclatura também foi importante para reforçar que esses traços também precisam de intervenção, sobretudo porque muitas crianças ficavam sem abordagem direcionada para as suas características autísticas, porque apresentavam um quadro muito leve e secundarizado em relação ao quadro principal. Ao se constatar cientificamente o prejuízo que essa perspectiva equivocada acarretou aos sujeitos, percebe-se a importância de se detectar o grau do espectro para se poder fazer uma intervenção. Todavia, [...] mesmo quando distúrbios autistas são diagnosticados adequadamente, isto é, utilizando critérios diagnósticos apropriados, há uma variação considerável no perfil sintomático, dependendo da etiologia subjacente. O diagnóstico de autismo requer uma apreciação clínica cuidadosa: avaliações de linguagem e neuropsicológica, bem como exames complementares (por exemplo, estudos de cromossomas incluindo DNA para X-frágil e estudos de neuroimagem ou neurofisiologia, quando apropriados) podem ser necessárias em casos específicos, para permitir identificar subgrupos mais homogêneos, de acordo com o fenótipo comportamental e a etiologia. Somente assim conseguiremos obter uma compreensão da patofisiológica desses distúrbios e estabelecer intervenções e prognósticos mais específicos (Gadia; Tuchman; Rotta, 2004, p. 86). Contraditoriamente, ao se abranger os traços que compõem o TEA, percebeu-se o aumento considerável e marcante da frequência de TEA na população. Dentre as hipóteses sobre as causas desse aumento, uma das mais aceitas na comunidade cientifica é que ocorreu um salto de qualidade no conhecimento dos profissionais que realizam os diagnósticos, ou seja, hoje se 5 detecta um maior número de traços e mais cedo, o que abre um diagnóstico mais preciso e consequentemente um aumento no índice oficial de casos. Considerando que o DSM-4 classificava de outra forma o autismo, percebe- se que ainda prevalece uma confusão entre a compreensão atual do TEA e a forma anterior como o autismo ou os autismos eram analisados. Observe o organograma a seguir. Figura 1 – Organograma Percebe-se pela pirâmide da Figura 1 que a caracterização do autismo hierarquizava os indivíduos, porém não apresentava um elo que justificasse esse ranqueamento para além dos sintomas neurológicos. Para melhor compreensão da mudança entre o DSM-4 e o DSM-5, retoma-se o conceito conforme a metodologia elaborada pela Associação de Amigos do Autista (AMA). Percebe-se que na definição atual do conceito, o autismo é uma síndrome, ou seja, um conjunto de sintomas que o caracterizam como uma doençaque causa transtorno de neurodesenvolvimento e, como consequência, alterações comportamentais. O salto de qualidade na compreensão se encontra em entender que essas características não são estanques e assimétricas, porém, necessariamente são pertinentes à mesma síndrome porque se caracterizam sempre por desvios qualitativos na comunicação, na interação social e no uso da imaginação1. Entretanto, entende-se que podem coexistir três grupos de situações que dificultam o diagnóstico clínico: 1Estes três desvios, que ao aparecerem juntos caracterizam o autismo, foram chamados por Lorna Wing e Judith Gould, em seu estudo realizado em 1979, de “Tríade”. A Tríade é responsável por um padrão de comportamento restrito e repetitivo, mas com condições de inteligência que podem variar do retardo mental a níveis acima da média (Mello, 2007, p. 15). 1 - Autismo Clássico 2 - Sindrome de Rett 3 - Transtorno desintegrativo da Infância 4 - Transtorno Global do Desenvolvimento não específico 5 - Síndrome de Asperger O topo da pirâmide, o Grau 1, caracterizaria o grau mais severo, e o Grau 5, o mais leve. Todavia, essa caracterização não existe mais e, a partir do DSM 5, a compreensão se transformou. 6 O TEA pode ser a síndrome principal, que coexiste com traços ou aspectos de outras síndromes secundárias; O TEA pode ser a síndrome secundária, pois apenas alguns traços ou aspectos se fazem presentes em relação a uma outra síndrome principal; O TEA pode ser a única síndrome, porém, com espectros variados conforme cada indivíduo. Tomando por base a análise conceitual elencada, o DSM-5 apresenta a seguinte classificação do TEA: Figura 2 – Classificação Observa-se que o Autismo Clássico, o Transtorno Desintegrativo da Infância e o Transtorno Global do Desenvolvimento não específico foram dissolvidos nessa nova classificação do DSM-5. TEMA 2 – CONSEQUÊNCIA PARA O DIAGNÓSTICO A PARTIR DO DSM-5 Se por um lado a mudança na classificação de autismo ou autismos facilitou a identificação da síndrome a partir da categorização como suave, moderado ou severo, por outro lado essa transformação requer um maior tempo de observação e investigação para definir o espectro em que classifica o grau da criança com TEA. Essa é a primeira consequência decorrente da nova maneira de se diagnosticar o TEA. Por exemplo, é comum que nos deparemos com diagnósticos precipitados que definem um sujeito com traços de TEA como portador de Deficiência Intelectual — ou, como também pode ser denominado, com retardo mental. Mello (2007, p. 13-14) explica que o “autismo se diferencia do retardo mental porque, Severo Moderado Leve 7 enquanto no primeiro a criança apresenta um desenvolvimento uniformemente defasado, no autismo o perfil de desenvolvimento é irregular”. Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 29) apresentam uma interessante analogia para explicar o espectro autista: Quando jogamos uma pedrinha em um lago de água parada, ela gera várias pequenas ondas que formam camadas mais próximas e mais distantes do ponto no qual a pedra caiu. O espectro autista é assim, possui várias camadas, mais ou menos próximas do autismo clássico (grave), que poderia ser considerado o centro das ondas, o ponto onde a pedra atingiu a água. Esse espectro pode se manifestar nas pessoas de diversas formas, mas elas terão alguns traços similares, afinal todas as ondulações derivam do mesmo ponto. A analogia apresentada no excerto acima demonstra que o autismo possui diferentes manifestações, e para que os equívocos nos diagnósticos se tornem menos frequentes, há necessidade de que os profissionais que atuam com o TEA, cada qual em sua área, apropriem-se do conhecimento científico acerca do desenvolvimento das pesquisas e dos estudos sobre o tema. Para que se possa precisar a maior abrangência das consequências do DSM-5 para o diagnóstico do TEA, torna-se necessário o resgate de outro grupo de conceitos que acompanham a elaboração desses diagnósticos antes da mudança paradigmática. Esses conceitos são, conforme a OMS (2007): Deficiência: toda e qualquer perda, falta ou alteração de estrutura ou função, qualquer que seja sua causa Incapacidade: restrição, consequente de deficiência, da habilidade de desempenhar uma atividade funcional comum para o ser humano Desvantagem: decorrente de deficiência e/ou incapacidade que impede o sujeito de desempenhar um papel que esteja de acordo com idade, sexo, fatores sociais e culturais. A análise dos conceitos remete a uma determinação de prioridades no nível de importância desses conceitos ao se estudar TEA. Ou seja, um conceito decorre do outro. A Figura 3 esquematiza essa reflexão: 8 Figura 3 – Prioridades Com a análise do organograma apresentado na Figura 3, infere-se que, para o diagnóstico do TEA, é preciso considerar a patogênese: Fatores genéticos e ambientais têm sido associados à etiologia e fisiopatologia do TEA, indicando etiologia multifatorial. [...] O TEA tem sido associado a alterações no sistema imunológico e a diversos distúrbios metabólicos, a exemplo da elevação do estresse oxidativo e deficiências relacionadas à mutilação, anormalidades na função mitocondrial, além da baixa desintoxicação de metais pesados do organismo. Outros pesquisadores que estudaram cuidadosamente a cadeia transportadora de elétrons (CTE) nas células imunológicas sugerem que cerca de 80% dos autistas exibem algum grau de anormalidade em seu mecanismo. Esses distúrbios biológicos podem ter como causa défices nutricionais. Contudo, em relação às outras patologias, a amplitude e a profundidade dessas deficiências nutricionais, assim como as ineficiências ou disfunções bioquímicas, podem afetar o funcionamento do sistema nervoso e levar ao agravamento do transtorno. A identificação da presença desses distúrbios é importante por permitir a triagem, tratamento e possivelmente estratégias de prevenção e pode permitir a identificação de biomarcadores e tratamentos direcionados para as anormalidades metabólicas, pois o fenótipo é diverso (Lázaro, 2016, p.19). TEMA 3 – A DIFERENÇA ENTRE TRANSTORNOS ESPECÍFICOS DE LINGUAGEM E TEA Para a superação dos equívocos nos diagnósticos, não basta apenas a preocupação com as mudanças nas terminologias. O importante é estabelecer um referencial teórico e metodológico que embase a detecção precoce do TEA na infância. MUDANÇAS CONCEITUAIS • DEFICIÊNCIA • de doença à síndrome MUDANÇAS CONCEITUAIS • INCAPACIDADE • de causa afetiva à cognitiva MUDANÇAS CONCEITUAIS • DESVANTAGEM • de base psicogênica à base biológica MUDANÇAS CONCEITUAIS • PREVALÊNCIA • de quadros raros a quadros frequentes MUDANÇAS CONCEITUAIS • TERAPÊUTICAS • de tratamentos antipsicóticos ao tratamento de sintomas-alvo • de psicoterapia de base analítica a abordagens pedagógicas com base cognitivo-comportamental 9 Nesse sentido, um dos equívocos mais cometidos acontece durante a avaliação de uma criança que apresenta um quadro grave de atraso de fala ou de linguagem em geral: o profissional — tanto da área clínica, que faz o diagnóstico, como da área institucional, que faz a avaliação cognitiva — pode chegar a uma conclusão equivocada, pois os espectros do TEA possuem algumas características que podem se confundir com Transtornos Específicos de Linguagem (Specific Language Impairment – SLI), tais como: Transtorno Semântico Pragmático, Transtorno de Aprendizagem não Verbal (TANV), entre outros. Um Transtorno Específico de Linguagem, na definição de Befi-Lopes (2004, p. 989), é definido como [...] um acometimento da linguagem onde não existe perda auditiva, alteração no desenvolvimento cognitivo e motor da fala, síndromes, distúrbios abrangentes do desenvolvimento, alterações neurossensoriais, lesões neurológicas adquiridasou qualquer outra patologia que justifique essa dificuldade. 3.1 Diagnóstico para os Transtornos Específicos da Linguagem Segundo Chevrie-Muller (2007), o diagnóstico do Distúrbio Específico de Linguagem é multidisciplinar e caracteriza-se por um método de exclusão, ou seja, deve-se descartar a possibilidade de qualquer outra patologia antes de se afirmar que a criança apresenta exclusivamente um distúrbio de linguagem. Para essa autora, a avaliação de linguagem precisa ser averiguada em suas modalidades expressivas e receptivas, bem como quanto aos seus diferentes aspectos: fonológico, lexical, morfossintático, semântico e pragmático. Chevrie-Muller (2007) afirma que esse exame permitirá classificar o distúrbio quanto ao tipo e avaliar sua gravidade, tendo por referência o desenvolvimento normal que seria esperado para a idade da criança. Por sua vez, Jakubowicz (2003) comenta sobre a dificuldade de se diferenciar um Distúrbio Específico de Linguagem de um simples atraso quando a criança é ainda pequena. Segundo a autora, na França é comum que o diagnóstico seja confirmado somente na idade de cinco anos. 3.1.2 Características do Distúrbio Específico de Linguagem Considerando os estudos de Tourrette (2014, p. 220), têm-se que as características do Distúrbio Específico de Linguagem incluem: 10 1. Dificuldade de linguagem expressiva e/ou receptiva, sendo a compreensão normalmente melhor do que a expressão. 2. Atraso na aquisição das primeiras palavras. 3. Falha na discriminação dos fonemas. 4. Frases mal elaboradas (algumas vezes sem artigos, preposições ou concordância verbal). 5. Fonologia, semântica, sintaxe e pragmática são atingidas em graus diferentes. Uma criança pode ter mais dificuldade para produzir os fonemas da língua, enquanto outra tem mais dificuldade para construir frases gramaticalmente corretas. Importante: uma mesma criança pode apresentar mais problemas em relação à fonologia num momento e em relação à semântica num outro momento, ou seja, o quadro nem sempre é estável. Antes do DSM-5 essas confusões eram mais constantes e frequentes. Atualmente, com o aumento do número de pesquisas, as metodologias para definição desses transtornos são mais precisas. Hoje existem escalas, avaliações multidisciplinares, entre outros recursos que auxiliam os profissionais a diagnosticarem com maior precisão. Bishop (1987, p. 159) afirma que o Distúrbio Específico de Linguagem é “uma dificuldade persistente para adquirir e desenvolver a fala e a linguagem. Aparentemente a criança possuiu todas as condições para falar, mas ela não consegue ou apresenta muita dificuldade neste processo”. Durante muito tempo, quando descartada a hipótese de problemas auditivos, esse distúrbio foi interpretado como sinal de falta de estímulos ou como indicativo de transtornos mais globais no desenvolvimento, como o TEA e a Deficiência Intelectual. Para Bishop (1987), o distúrbio específico de linguagem pode gerar consequências para o processo de aprendizagem da escrita e leitura. As crianças afetadas geralmente não conseguem se alfabetizar na idade prevista e demonstram sérias dificuldades para acompanhar as atividades em sala de aula, pois não conseguem compreender a relação entre o som e a escrita. A aquisição e o desenvolvimento da linguagem oral são determinantes para o aprendizado da leitura e escrita. 11 TEMA 4 – O TRANSTORNO INVASIVO DO DESENVOLVIMENTO (TID) O TEA apresenta características observáveis (conhecidas cientificamente como fenótipos) que se enquadram no TID, uma vez que este inclui singularidades em três graus: social, da comunicação e do comportamento. Para entender melhor o TEA, é importante que tenhamos uma melhor definição da categoria de TID, uma vez que O TID não-autístico compreende duas categorias bem definidas, incluindo critérios operacionalizados (transtornos desintegrativo e síndrome de Rett) e uma categoria residual maior (TID-SOE). As pesquisas atuais estão tentando identificar grupos dentro da categoria de TID-SOE. Há algumas propostas de categorias com base clínica (TDMC; EPD; transtorno de prejuízo multidimensional e crianças esquizoides) e algumas categorias que estão relacionadas com hipóteses de um déficit etiológico primário, que poderia levar ao fenótipo comportamental (transtornos do aprendizado não verbal, SSP, transtornos de vinculação). É importante notar que nem todos os indivíduos que preenchem critérios de transtornos do aprendizado não verbal, SSP ou transtorno de vinculação preencherão critérios de TID. No entanto, esses critérios globais têm sido úteis no planejamento terapêutico. (Mercadante; Van Der Gaag; Schwartzman, 2006, p. 13) Figura 4 – Diagrama das categorias do Transtorno Invasivo de Desenvolvimento Fonte: Mercadante; Van Der Gaag; Schwartzman, 2006, p. 19. Conforme análise realizada pelo Dr. Jair de Jesus Mari (2019) para a ONG Autismo & Realidade, observa-se que 12 Nova edição do DSM trouxe uma nova estrutura de sintomas, e a tríade de sintomas que modela déficits de comunicação separadamente de prejuízos sociais do DSM-IV, que foi substituído por um modelo de dois domínios composto por um domínio relativo a déficit de comunicação social e um segundo relativo a comportamentos/interesses restritos e repetitivos. Além disso, o critério de atraso ou ausência total de desenvolvimento de linguagem expressiva foi eliminado do DSM-5, uma vez que pesquisas mostraram que esta característica não é universal, nem específica de indivíduos com TEA. Isto é, para Mari (2019), a reorganização dos subdomínios aumenta a clareza e continua a fornecer sensibilidade adequada, ao mesmo tempo que melhora a especificidade necessária por meio de exemplos de diferentes faixas de idade e níveis de linguagem. Figura 5 – Níveis de gravidade no TEA – DSM5 Fonte: Cornel, 2013. 13 TEMA 5 – A TRÍADE COMPORTAMENTAL PRIORIZADA NA AVALIAÇÃO Quando se avalia o comportamento de uma criança, três grandes alterações de comportamento são priorizadas. Figura 6 – Níveis de gravidade Essas três grandes alterações de comportamento observáveis no processo de diagnóstico do TEA podem estar presentes ao mesmo tempo em uma mesma criança ou não. Do mesmo modo, o TEA pode apresentar nenhuma dessas alterações e, em outros casos, pode apresentar quadros de alucinação, de psicose, entre outros comportamentos. Ou seja, as alterações podem aparecer todas ou apenas alguns delas em crianças com TEA. Com isso, muitas vezes essas alterações de comportamento não são passíveis de separação durante o processo avaliativo, e, ao se produzir o diagnóstico de TEA, elas precisam aparecer para que também sejam tratadas. O TEA carece de um Diagnóstico Diferencial: Com o grupo dos transtornos específicos do desenvolvimento: o Transtornos do desenvolvimento do aprendizado o Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade Fora do grupo dos transtornos de desenvolvimento: o Esquizofrenia o Transtorno Desafiador de Oposição Alterações de comportamento Hiperatividade motora Alterações de conduta: comportamento disruptivo Ansiedade e Depressão 14 Prezados cursistas, neste módulo foram elencados elementos para o aprofundamento dos pressupostos básicos do TEA, tomando por base a compreensão do TEA como uma síndrome pertencente ao grupo dos Transtornos Globais do Desenvolvimento. Para sintetizar esse debate, faz-se necessário retomar as questões que orientaram a trajetória neste módulo: Quais são atualmente as características do TEA? A partir delas, quais os desdobramentos para o diagnóstico do TEA? Infere-se que muitas das características observadas no TEA também são vistas em outros distúrbios de desenvolvimento e em certas doenças psiquiátricas. O que distingue o autismo são o número, a gravidade, a combinação e a interaçãode problemas, os quais resultam em danos funcionais importantes. O autismo é um conjunto de déficits, e não uma ou outra característica. Conforme Júlio-Costa e Moreira Antunes (2017), o autismo é um dos transtornos neuropsiquiátricos com maior influência genética e, na prática, isso significa que, na maior parte dos casos, os sintomas são expressos precocemente e se manifestam durante toda a vida. Para os autores: Saber identificar essas características é a base do diagnóstico do TEA, pois este é essencialmente clínico. Ele depende do conhecimento do profissional e da capacidade de descrever os sintomas atuais e do histórico de desenvolvimento. Em razão disso, propomos um passo a passo da avaliação diagnóstica. Mas qual seria a função do diagnóstico, se não dar um norte para a família, principalmente sobre as intervenções necessárias para a criança? Assim a penúltima parte do livro aborda um modelo de intervenção focado nos pais e outros programas com maior base científica para o TEA. Por fim, tendo ciência da quantidade de informações falsas divulgadas sobre o autismo, fechamos o livro com a discussão sobre esses mitos e o que a ciência fala sobre eles. Este livro é fruto de muito trabalho e da vontade de garantir o que há de melhor para as crianças com TEA e suas famílias (Júlio-Costa; Moreira Antunes, 2017, p. 36). Nesse sentido, infere-se ao desta aula que, embora definido por uma tríade principal de sintomas, o fenótipo dos pacientes com TEA pode variar muito, abrangendo desde indivíduos com deficiência intelectual (DI) grave e baixo desempenho em habilidades comportamentais adaptativas até indivíduos com quociente de inteligência (QI) normal, que levam uma vida independente. Esses indivíduos também podem apresentar uma série de outras comorbidades, como hiperatividade, epilepsia, distúrbios de sono e gastrintestinais. 15 Leitura complementar Texto de abordagem teórica JÚLIO-COSTA, A.; ANTUNES, A, M. Transtorno do espectro autista na prática clínica. São Paulo: Pearson Clinical Brasil, 2017. (Coleção Neuropsicológica na Prática Clínica) As autoras desenvolvem uma sistematização detalhada da avaliação, do diagnóstico e da intervenção do TEA. O protocolo de avaliação, adotado pelas autoras, foca os sintomas do TEA. Texto de abordagem prática BRITES, L.; BRITES, C. Como saber do que seu filho precisa? São Paulo: Gente, 2018. Os neurologistas desenvolveram nessa obra uma metodologia de sete pilares para que os pais e responsáveis pelas crianças com TEA possam se organizar cotidianamente. Saiba mais BACKES, B.; ZANON, R. B.; BOSA, C. A. A relação entre regressão da linguagem e desenvolvimento sócio comunicativo de crianças com transtorno do espectro do autismo. CoDAS, v. 25, n. 3, p. 268-273, 2013. As autoras abordam as consequências da relação entre regressão da linguagem e desenvolvimento sócio comunicativo de crianças com TEA. 16 REFERÊNCIAS BEFI-LOPES, D. M. Avaliação, diagnóstico e aspectos terapêuticos nos distúrbios específicos de linguagem. In: FERREIRA, L. P.; BEFI-LOPES, D. M.; LIMONGI, S. C. O. Tratado de Fonoaudiologia, São Paulo, p. 987-1000, 2004. BISHOP, D. M. V; EDMUNDSON, A. Language impaired 4 years old: distinguishing transient from persistent impairment. Journal of Speech and Hearing Disorders, v. 52, p. 156-173, 1987. BRITES, L.; BRITES, C. Como saber do que seu filho precisa? São Paulo: Gente, 2018. CHEVRIE-MULLER, C. Troubles spécifiques du développement du langage (TSDL): « dysphasies de développement ». In: CHEVRIE-MULLER, C.; NARBONA, J. Le langage de l’enfant. Aspects normaux et phonologiques. Issy- les-moulineaux: Masson, 2007. p. 361-419. CORNEL, A. E. M. V. Impacto do diagnóstico. In: OMARI, C. et al. 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