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1 Jéssica N. Monte – Turma 106 Gastroenterologia DOENÇA CELÍACA INTRODUÇÃO A doença celíaca é uma causa comum de má absorção de um ou mais nutrientes, induzida pelo consumo de proteínas presentes no trigo, centeio e cevada. Já recebeu outras várias designações, como espru não tropical, espru celíaco, doença celíaca do adulto e enteropatia sensível ao glúten. A prevalência da doença é maior em grupos como crianças com baixa estatura, diabéticos do tipo I e pacientes com queixas dispépticas. O início dos sintomas pode ser observado a qualquer momento, desde o primeiro ano de vida até a oitava década. QUADRO CLÍNICO Um pequeno número de indivíduos apresenta sintomas clássicos e manifestações relacionadas com a má absorção de nutrientes. Um número muito maior de indivíduos apresenta doença celíaca atípica, com manifestações que não estão obviamente relacionadas com a má absorção intestinal. A maioria dos indivíduos apresenta doença celíaca silenciosa: essas pessoas são essencialmente assinto- máticas, apesar da histopatologia do intestino delgado e da sorologia serem anormais. Os sintomas da doença celíaca podem se tornar evidentes pela primeira vez quase em qualquer idade durante todo o transcorrer da vida adulta. A apresentação clínica da doença celíaca clássica inclui diarreia crônica, vômitos, irritabilidade, anorexia, emagrecimento com comprometimento variável do estado nutricional, déficit de crescimento, dor e dis- tensão abdominal, diminuição do tecido celular subcutâneo, palidez por anemia ferropriva e atrofia da musculatura glútea (indica desnutrição severa). Já o padrão não-clássico ou atípico da doença celíaca se apresenta mais tardiamente e as manifestações digestivas estão ausentes ou, quando presentes, são pouco relevantes. A apresentação clínica inclui baixa estatura, anemia ferropriva refratária, artralgia ou artrite, constipação intestinal, hipoplasia do esmalte dentário e osteoporose. FISIOPATOLOGIA A fisiopatogenia é complexa e envolve o sistema imune inato e adaptativo em indivíduos geneticamente suscetíveis, além de fatores ambientais. Existe associação clara da doença com a gliadina, um componente importante do glúten que está presente no trigo, na cevada e no centeio. A gliadina induz o aumento na permeabilidade intestinal em todos os indivíduos. Porém, em pacientes celíacos, esse aumento é muito maior e mais prolongado. 2 Jéssica N. Monte – Turma 106 Gastroenterologia Além disso, o componente imunológico na patogênese da doença celíaca envolve respostas imunes tanto inatas quanto adaptativas. Verifica-se a presença de anticorpos séricos como os anticorpos IgA antigli- adina, antiendomisiais e antitransglutaminase tecidual. O endomísio é o tecido conjuntivo que reveste a musculatura lisa do intestino delgado. Já a transglutami- nase é a enzima responsável pela deaminação do glúten na mucosa. Fatores genéticos também estão envolvidos. A incidência alcança 10% entre parentes de primeiro grau de pacientes com a doença. Todos os pacientes com doença celíaca expressam o alelo HLA-DQ2 ou HLA-DQ8, apesar de apenas uma pequena minoria das pessoas que expressam DQ2/DQ8 sofrer da doença. DIAGNÓSTICO A genotipagem HLA-DQ2/DQ8 não deve ser utilizada rotineiramente. É indicada em casos de histologia positiva discordante da sorologia, pacientes em dieta isenta de glúten, suspeita de doença celíaca refra- tária e em pacientes com síndrome de Down. A ausência de DQ2/DQ8 descarta a possibilidade de diagnóstico da doença. A pesquisa de anticorpo antiendomisial tem uma sensibilidade e especificidade de 90 a 95%. A pesquisa de anticorpos é utilizada com frequência para identificar pacientes com a doença. Os paci- entes com esses anticorpos devem ser submetidos à biópsia duodenal. Nos casos em que forem detectados anticorpos IgA antiendomisiais ou anti-transglutaminase tecidual nos exames sorológicos, eles devem desaparecer após o início de uma dieta sem glúten. A deficiência seletiva de IgA é a imunodeficiência humana mais comum, acometendo os celíacos de 10 a 15 vezes mais em relação à população em geral. Está presente em cerca de 1 a 8% dos pacientes com a doença celíaca. Devido a isso, deve-se dosar IgA total durante a triagem da doença celíaca. Diante de caso de deficiência de IgA, deve-se dosar os anticorpos antitransglutaminase IgG e antiendo- misio IgG, pois esse grupo de pacientes poderá apresentar exames sorológicos falso-negativos para IgA. 3 Jéssica N. Monte – Turma 106 Gastroenterologia É necessária uma biópsia do intestino delgado para se estabelecer o diagnóstico de doença celíaca. Deve ser efetuada uma biópsia em pacientes que apresentam sin- tomas e achados laboratoriais sugestivos de má absorção ou defici- ência de nutrientes, bem como teste de anticorpo antitransglutami- nase positivo. A biópsia de intestino delgado é realizada durante a endoscopia di- gestiva alta (EDA). Devem ser realizadas múltiplas biópsias, totali- zando 6 a 8 da segunda e terceira porção do duodeno. O diagnóstico da doença celíaca requer a presença de alterações histológicas características na biópsia do intestino delgado, junto com uma resposta clínica e histológica imediata após a instituição de uma dieta sem glúten. As alterações clássicas visualizadas na biópsia duodenal/jejunal res- tringem-se à mucosa e incluem: Aumento no número de linfócitos intraepiteliais (não retornam aos valores normais mesmo após o tratamento); Ausência ou altura reduzida das vilosidades; Aspecto cuboide e núcleos que não exibem mais uma orientação basal nas células epiteliais superfi- ciais; Aumento no número de linfócitos e plasmócitos na lâmina própria. Apesar de serem característicos da doença celíaca, esses aspectos não são diagnósticos, pois um as- pecto semelhante também pode ser visualizado em outras doenças. No entanto, um aspecto histológico característico que se normaliza após o início de uma dieta sem glúten estabelece o diagnóstico de doença celíaca. A aparência endoscópica é normal na maioria das vezes, mas pode haver apagamento de pregas duo- denais. Esse achado não é específico, pois pode estar presente em outras patologias como a enterite eosinofílica. Durante o exame endoscópico, o diagnóstico pode ser suspeitado pela presença de pregas com aspecto serrilhado. 4 Jéssica N. Monte – Turma 106 Gastroenterologia CLASSIFICAÇÃO DE MARSH As alterações patológicas clássicas da doença celíaca no intestino delgado são categorizadas de acordo com a Classificação de Marsh: Estádio 0 – doença pré-infiltrativa: mucosa normal. Estádio 1 – doença infiltrativa: infiltração linfocitária intraepitelial superior a 20 por cada 100 enterócitos. Estádio 2 – doença hiperplástica: proliferação das criptas intestinais. Estádio 3 – doença destrutiva: atrofia parcial ou total das vilosidades intestinais e hipertrofia das criptas. Estádio 4 – doença hipoplástica: hipoplasia da constituição do intestino delgado. TRATAMENTO O tratamento atual consiste na retirada completa e definitiva do glúten da alimentação. Mais de 90% dos pacientes que exibem achados característicos da doença respondem à restrição completa de glúten da dieta. A doença celíaca é considerada refratária quando há doença compatível com a doença celíaca que não responde à retirada do glúten por pelo menos 6 meses, permanecendo com sintomas graves e provo- cando atrofia das vilosidades, considerando que todas as outras causas de atrofia tenham sido descar- tadas. A causa mais comum de persistência de sintomas em um paciente que satisfaz todos os critérios para o diagnóstico de doença celíaca é a ingestão continuada, consciente ou de maneira inadvertida, de alimen- tos que contenham glúten. DOENÇA CELÍACA X SENSIBILIDADE AO GLÚTEN NÃO-CELÍACA https://pt.wikipedia.org/wiki/Linf%C3%B3citos https://pt.wikipedia.org/wiki/Enter%C3%B3cito https://pt.wikipedia.org/wiki/Hiperplasiahttps://pt.wikipedia.org/wiki/Criptas_de_Lieberk%C3%BChn https://pt.wikipedia.org/wiki/Atrofia https://pt.wikipedia.org/wiki/Vilosidade_intestinal https://pt.wikipedia.org/wiki/Hipoplasia 5 Jéssica N. Monte – Turma 106 Gastroenterologia DOENÇAS ASSOCIADAS A doença celíaca está associada à dermatite herpetiforme. Quase todos os pacientes com dermatite herpetiforme exibem alterações histológicas no intestino delgado compatíveis com a do- ença celíaca, mas em geral com uma distribuição muito mais leve e menos difusa. A maioria dos pacientes com dermatite herpetiforme relata sin- tomas gastrintestinais leves ou ausentes. Por outro lado, relativa- mente poucos pacientes com doença celíaca apresentam derma- tite herpetiforme. A doença celíaca está associada também com diabetes mellitus tipo 1, deficiência de IgA, síndrome de Down e síndrome de Turner. COMPLICAÇÕES A complicação mais importante da doença celíaca é o surgimento de câncer. A incidência de neoplasia tanto gastrintestinal quanto não gastrintestinal, bem como a do linfoma intesti- nal, apresenta-se elevada entre pacientes com doença celíaca. A possibilidade da existência de linfoma deve ser considerada sempre que: 1) Um paciente com doença celíaca, que até então vinha evoluindo muito bem com uma dieta sem glúten, não consegue mais responder à restrição de glúten; 2) Um paciente que se apresenta como características clínicas histológicas compatíveis com doença celíaca não responde a uma dieta sem glúten. Outras complicações incluem o surgimento de ulceração intestinal independente de linfoma, espru refra- tário e espru colagenoso.
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