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Alterações cerebelares Alguns sintomas apresentados em pessoas com disfunção cerebelar: tremor, incoordenação motora, dificuldade de marcha, disartria e nistagmo. Esses sintomas dependem das partes do cerebelo acometidas. A ataxia é o principal sinal de doença cerebelar; caracteriza- se por vários graus de dissinergia, dismetria, ausência de coordenação agonista–antagonista e tremor. A ataxia pode afetar os membros, o tronco ou a marcha. A doença cerebelar também pode causar hipotonia, astenia ou lentidão de movimento, além de desvio dos membros estendidos. A doença com acometimento das conexões do cerebelo no tronco encefálico causa anormalidades indistinguíveis da doença cerebelar propriamente dita. Quando a ataxia cerebelar é causada por disfunção das conexões do cerebelo no tronco encefálico, geralmente há outros sinais relativos ao tronco encefálico. -Dissinergia: o distúrbio básico na doença cerebelar é a dissinergia. Normalmente, a ação dos vários músculos participantes de um movimento é coordenada e harmoniosa, sendo a força, o momento e a sequência de ativação da contração apropriados para que o movimento seja uniforme e exato. A dissinergia é o comprometimento dos mecanismos normais de controle que organizam e regulam as contrações dos diferentes músculos e grupos musculares participantes para garantir a uniformidade e a coordenação apropriada do movimento. Dessa forma, o movimento será realizado de maneira arrítmica, inconstante, inábil e desorganizada. -Dismetria: esse distúrbio é caracterizado por erros na avaliação da distância e na medida da distância, velocidade, potência e direção de movimento. A disfunção cerebelar causa perda da colaboração normal entre agonista e antagonista. Quando o movimento é feito além do necessário para alcançar o alvo, recebe o nome hipermetria e, quando o movimento é inferior a distância do alvo, recebe o nome hipometria. A hipermetria é a mais comum. O movimento pode ser muito lento ou muito rápido com força excessiva ou insuficiente. O paciente com dismetria não faz um movimento em linha reta entre dois pontos, mas desvia-se irregularmente do trajeto pretendido. -Coordenação agonista -antagonista: um distúrbio da inervação recíproca leva à perda da capacidade de interromper a contração. A sequência trifásica agonista–antagonista– agonista normal de atividade é perturbada por um pico de atividade do agonista demasiado longo ou curto ou por um pico de atividade do agonista que persiste durante a atividade do antagonista. O prejuízo da capacidade de fazer movimentos sucessivos e de interromper uma ação e, logo em seguida, fazer o movimento diametralmente oposto causa disdiadococinesia, perda dos movimentos de controle e fenômeno de rebote. -Tremor: o tipo mais comum de tremor cerebelar é o tremor de intenção (ativo, cinético ou terminal) ausente em repouso, mas que se torna evidente durante o movimento intencional. Também pode haver tremor postural dos membros estendidos, sem que o paciente tente alcançar um alvo. Com frequência, o tremor cerebelar acomete os músculos proximais; quando intenso, pode acometer não só os membros, mas também a cabeça ou mesmo todo o corpo. Os tremores e outros movimentos provavelmente são consequência de doença das vias eferentes cerebelares ou de suas conexões com o núcleo rubro e o tálamo (vias denteadorrubrais e denteadotalâmicas ou PCS) e, às vezes, são denominados tremor eferente cerebelar. O tremor rubral está presente em repouso, mas agrava-se com o movimento e provavelmente é consequência de uma lesão dos tratos eferentes cerebelares. -Hipotonia (flacidez muscular): a hipotonia com diminuição da resistência ao movimento passivo, é observada com frequência na doença cerebelar. A disfunção cerebelar diminui os impulsos eferentes tônicos dos núcleos do cerebelo, o que causa perda da facilitação cerebelar para o córtex motor. Os músculos são flácidos e assumem atitudes artificiais; as partes do corpo podem ser movimentadas passivamente até posições de flexão ou extensão extrema. Os reflexos de estiramento apresentam-se normais ou diminuídos na doença limitada ao cerebelo. Por vezes, os reflexos tendinosos são “pendulares. Os reflexos pendulares são causados por hipotonicidade muscular e ausência do controle normal do reflexo. A lesão cerebelar pode diminuir o movimento pendular normal do braço afetado ao caminhar. O balanço do braço também pode diminuir em distúrbios extrapiramidais e na hemiparesia leve. No teste de balanço dos ombros, a lesão cerebelar aumenta a amplitude e a duração da oscilação do braço, embora os movimentos possam ser irregulares e arrítmicos. -Disartria: é o comprometimento da fala. A articulação pode ser lenta, atáxica, arrastada, com prolongamento das vogais, espasmódica ou explosiva em decorrência da dissinergia dos músculos da fonação. Um tipo escandido de disartria é especialmente característico de doença cerebelar. A fala escandida da esclerose múltipla e a fala em staccato da ataxia de Friedreich (AF) provavelmente são consequências da disfunção cerebelar. A disartria pode ser manifestação isolada de infarto cerebelar paravérmico. -Nistagmo: o nistagmo são oscilações rítmicas, repetidas e involuntárias de um ou ambos os olhos conjugadamente, nos sentidos: horizontal (de um lado para o outro), vertical (de cima para baixo) ou rotatório (movimentos circulares). Com frequência, o nistagmo indica o acometimento das vias vestibulocerebelares. As anormalidades oculares costumam ser consequência do acometimento das conexões do cerebelo com outros centros, e não de real disfunção cerebelar. Na lesão de um hemisfério, os olhos em repouso podem ser desviados 10° a 30° em direção ao lado não afetado. Quando há tumor do ângulo pontocerebelar, o nistagmo é grosseiro ao se olhar para o lado da lesão e fino e rápido ao se olhar para o lado oposto (nistagmo de Bruns). Outros distúrbios da motilidade ocular observados na doença cerebelar são desvio, dismetria ocular, flutter ocular, opsoclonia, reação de inclinação ocular e intrusões sacádicas. Observação: “Crises cerebelares” é um termo antiquado que designa episódios de rigidez de descerebração por disfunção do tronco encefálico causada pelo efeito de massa de lesões expansivas no cerebelo. -Síndromes cerebelares: a doença cerebelar pode afetar todo o cerebelo ou apenas uma parte específica dele. Existem duas síndromes cerebelares bem definidas: uma síndrome da linha média (verme) e uma síndrome lateral (hemisférica). Síndrome do verme: os sintomas importantes são anormalidades da estática e da marcha, que variam do leve alargamento da base ao caminhar na doença leve (ataxia da marcha) à total incapacidade de se sentar ou caminhar na doença grave. Síndrome dos hemisférios cerebelares: causa ataxia apendicular, distúrbio da coordenação dos membros ipsilaterais, mais intensa no braço do que na perna. As manifestações clínicas primárias da disfunção do lobo FN ou de suas conexões são distúrbios do equilíbrio; nistagmo, muitas vezes posicional; e outras anormalidades do movimento extraocular. Não há ataxia do membro. A tabela resume as manifestações clínicas de doença dessas partes do cerebelo. -Síndrome da linha média: o verme é importante no controle de estruturas axiais, ou daquelas com inervação bilateral; as lesões do verme afetam principalmente as funções da linha mediana, como a marcha e a coordenação da cabeça e do tronco. Um paciente com doença leve do verme tem ataxia da marcha. A base é alargada, a marcha em tandem é especialmente difícil e pode haver descompensação ao virar o corpo. O teste de Romberg é negativo – o desequilíbrio não se agrava muito com os olhos fechados. Na disfunção acentuada do verme, pode haver distúrbios posturais e locomotores grosseiros de todo o corpo. Não há lateralização e pode haver tendência à queda para trás ou para a frente. A disfunção do vermecausa pequena ou nenhuma anormalidade dos membros, sobretudo dos membros superiores, embora todos os movimentos coordenados possam ser mal executados. O tônus muscular e os reflexos são normais. Pode haver nistagmo, mas geralmente não é acentuado. Também pode haver dismetria ocular, nistagmo de rebote e anormalidades de perseguição. As lesões do verme podem causar nistagmo com batimento ascendente. A disartria é frequente. Às vezes há postura anormal com rotação ou inclinação da cabeça. As causas comuns de síndrome cerebelar da linha média são degeneração cerebelar alcoólica e meduloblastoma. O álcool intoxica de preferência o verme e causa uma síndrome característica de ataxia da marcha com preservação dos membros. Esses pacientes podem não ter ataxia demonstrável dos membros inferiores em decúbito dorsal, mas ser totalmente incapazes de caminhar. Os meduloblastomas são mais frequentes no verme do cerebelo. -Síndrome hemisférica: quando há lesão de um hemisfério do cerebelo, as manifestações são apendiculares em vez de axiais. Os déficits hemisféricos cerebelares são unilaterais e ipsilaterais à lesão, já que as vias não são cruzadas (ou, melhor dizendo, são duplamente cruzadas). Há perturbação dos movimentos especializados dos membros, com ataxia, dismetria, dissinergia, disdiadococinesia e hipotonia que afetam mais o braço e a mão do que a perna e o pé. Os movimentos distais são mais afetados do que os proximais, e os movimentos finos mais do que os grosseiros. Os movimentos são irregulares e pode haver tremor de intenção ou outras hipercinesias em caso de acometimento do núcleo denteado ou de suas vias eferentes. A postura e a marcha não são comprometidas tão intensamente quanto na síndrome do verme, mas ocorrem anormalidades. Pode haver oscilação e queda em direção ao lado da lesão. O paciente pode ser capaz de ficar de pé sobre uma perna só usando o pé contralateral, mas não o ipsilateral. Ele pode ser incapaz de inclinar o corpo em direção ao lado acometido sem cair. Com frequência, as anormalidades assemelham-se às de uma lesão vestibular unilateral. Durante a marcha pode haver instabilidade, com desvio ou rotação na direção do lado acometido. Pode haver desvio e hipermetria em direção ao lado acometido. O nistagmo é comum, geralmente horizontal, mas às vezes rotatório. De modo geral, é mais proeminente quando se olha para o lado da lesão. As causas comuns de síndrome hemisférica cerebelar são astrocitoma cerebelar, esclerose múltipla e acidente vascular cerebral com acometimento da parte lateral do bulbo. -Disfunção cerebelar difusa: alguns distúrbios afetam o cerebelo de maneira difusa e causam anormalidades medianas e hemisféricas bilaterais. Os pacientes podem apresentar nistagmo, ataxia da marcha e do tronco, além de incoordenação apendicular. As causas incluem síndromes de ataxia espinocerebelar (AEC) hereditária, fármacos (sobretudo fenitoína), toxinas e degeneração cerebelar paraneoplásica. -Ataxia sensorial: é consequência de doença do nervo periférico que afeta principalmente as fibras sensoriais; doença dos gânglios da raiz posterior ou das colunas posteriores da medula espinal; interrupção das vias proprioceptivas no tronco encefálico; ou doença do lobo parietal. A incoordenação por ataxia sensorial pode ser muito semelhante à ataxia cerebelar. Na ataxia cerebelar, não importa muito se os olhos do paciente estão abertos ou fechados. Na ataxia sensorial, o desempenho não é normal com os olhos abertos, mas piora notoriamente com os olhos fechados. Parte do tremor na ataxia sensorial é causada por correções voluntárias dos desvios, guiadas pela visão, em relação ao trajeto pretendido. Outras anormalidades: Doenças do sistema extrapiramidal: podem comprometer o controle motor por causa de rigidez, acinesia ou bradicinesia, ausência de espontaneidade e perda de movimentos associados. Lesão do trato corticospinal: pode causar abalos e movimentos desajeitados, perda do controle motor e baixa integração de movimentos especializados. Distúrbios hipercinéticos do movimento: podem causar irregularidade do momento e da excursão de movimentos sucessivos. Anormalidades proprioceptivas: podem comprometer o desempenho motor. Com frequência, a causa da doença cerebelar é multifatorial. Uma boa regra geral é evitar tirar conclusões sobre o significado de “sinais cerebelares” diante de algum grau relevante de fraqueza, espasticidade, rigidez ou perda da sensibilidade. Quando o exame não mostra outras anormalidades, a incoordenação motora e a inabilidade de movimento geralmente são causadas por doença cerebelar. Ataxia do lobo frontal: é o distúrbio da coordenação causado por disfunção do lobo frontal contralateral; pode assemelhar-se a déficits por anormalidades do hemisfério do cerebelo ipsilateral. A ataxia do lobo frontal é causada por doença das fibras frontopontocerebelares no trajeto até a sinapse nos núcleos da ponte. As lesões do lobo frontal podem causar outras anormalidades, como hiper-reflexia, aumento do tônus e reflexos patológicos, ao passo que lesões puramente cerebelares geralmente causam hipotonia, reflexos diminuídos ou pendulares e ausência de reflexos patológicos. A pressão de massa cerebelar sobre o tronco encefálico pode causar achados no trato corticospinal e confundir o quadro clínico. A ataxia de Bruns é um distúrbio da marcha observado principalmente em lesões do lobo frontal. Síndrome de mutismo cerebelar (síndrome da fossa posterior): é caracterizada por diminuição da fala que progride para mutismo, labilidade emocional, hipotonia e ataxia. É comum depois da ressecção de um tumor mediano da fossa posterior em crianças, sobretudo meduloblastoma. A disartria pode ser uma sequela.
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