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COMENTÁRIOS SOBRE A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM TEMPOS DE COVID-19

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Especialista: Carlos Eduardo Ferreira de Souza 
 Disciplina: Direito Civil 
 carlosedufs 
 
 
COMENTÁRIOS SOBRE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA EM TEMPOS DE COVID-19 
(PEDINDO, DESDE JÁ, LICENÇA PARA FALAR) 
 
Na rua, um vírus mortal. Nas casas, muitos parceiros igualmente mortais. Essa é a realidade 
vivida por muitas mulheres, no Brasil e no Mundo. 
Talvez uma das maiores mentiras ou bobagens que ouvi durante a quarentena (e não poucas 
vezes) foi a seguinte: “esse vírus afeta a todos nós, de igual forma”. Ouvi dizer que não adianta ser 
rico ou pobre, preto, branco, amarelo, índio ou o que for, católicos, protestantes, candomblecistas, 
muçulmanos, dentre outros, homem ou mulher. 
De início, gostaria de registrar: não, não é igual e todas as diferenças apontadas e outra tantas 
permanecem mantendo os grupos vulneráveis (porque a sociedade os vulnerabiliza) em situações de 
extrema desvantagem. Hoje, contudo, quero falar sobre a última distinção: ser homem e ser mulher 
no contexto da pandemia. 
Utilizo o meio de comunicação que possuo para ser mais um na corrente daquelas e daqueles 
que tentam dar visibilidade à gravíssima situação enfrentada nesses tempos de isolamento, em que 
muitas mulheres são confinadas com seus algozes em casa, mas não pretendo em momento algum 
tentar roubar o lugar de fala, pois a melhor autora para qualquer discurso dessa natureza é e sempre 
será a mulher, já passado o tempo de aprender que “chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins, 
Marielles, malês”1, mas pretendo humildemente me unir como um daqueles a quem Bartlett chama 
de “amigos do feminismo” ou “potenciais simpatizantes [do feminismo]”2. 
No Brasil, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos aponta um aumento 
de 18%3 do número de denúncias registradas em razão da violência doméstica. No Mundo, o aumento 
também é previsto pela ONU4. E devo alertar: os casos são tão subnotificados quanto os da própria 
COVID-19, situação que já era denunciada em artigo da Revista Médica de Minas Gerais (UFMG)5, 
 
1 Samba Enredo da Mangueira do Carnaval do Rio de Janeiro de 2019. 
2 BARTLETT, K. Feminist Legal Methods. Havard Law Review, Cambridge, Massachusetts, Vol. 103:829, N. 04, p. 876, 
1990. 
3 BRASIL. Coronavírus: sobe o número de ligações para canal de denúncia de violência doméstica na quarentena. 
Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/marco/coronavirus-sobe-o-numero-de-
ligacoes-para-canal-de-denuncia-de-violencia-domestica-na-quarentena. Acesso em 11/05/2020. 
4 ONU. Chefe da ONU alerta para aumento da violência doméstica em meio à pandemia do coronavírus. Disponível 
em https://nacoesunidas.org/chefe-da-onu-alerta-para-aumento-da-violencia-domestica-em-meio-a-pandemia-do-
coronavirus/. Acesso em 11/05/2020. 
5 ALCANTARA, M. et al. Subnotificação e invisibilidade da violência contra a mulher. Revista Médica Minas Gerais 
(UFMG), Vol. 26:8, 2016. 
Especialista: Carlos Eduardo Ferreira de Souza 
 Disciplina: Direito Civil 
 carlosedufs 
 
em 2016, corroborada pela recente notícia publicada pela Revista Veja, em 29/04/20206. 
Não podemos aceitar, naturalizar ou minimizar alguns fatos noticiados: a mulher que sofreu 
múltiplas agressões físicas, foi privada da chave de casa e de seu celular, bem como ameaçada de 
esfaqueamento por seu marido (sim, que lhe prometeu amar e respeitar) precise escrever SOS, ap. 
203 com batom em uma toalha e arremessar de sua varanda7 para não ser ainda mais espancada e 
morta dentro de sua casa, que deveria ser nosso porto seguro. 
É inconcebível que mais Marias (Julieta Riera e tantas outras)8 sejam agredidas com 
palavras, socos e chutes, asfixiadas e arremessadas de suas varandas ao encontro da morte, ou 
mesmo que se arremessem “voluntariamente” para escapar das agressões de seus namorados9. Todas 
estas histórias são assustadoramente verídicas. Em ambas, gritos de socorro e de pavor. De onde 
vem ajuda? Quem intervirá? Silêncio: a resposta. 
O silêncio que a sociedade ecoa e perpetra no dia a dia de milhares ou milhões de mulheres, 
no Brasil e no mundo, na morte de Marielle, na criação ilusória de mitos, heróis, Messias, que pedem 
em rede nacional que o assassinato seja minimizado e que não tratam da forma devida os 
assassinatos, de corpo e de alma, de tantas outras mulheres. 
A quarentena é triste e difícil para aqueles que não podem ver os amigos, as famílias, ir a 
festas, eventos ou mesmo que perderam seus empregos e imploram por um auxílio ínfimo e que 
nunca chega, mas ainda pior é ser aquela que além de tudo isso, porque os fatos não se excluem, 
precisa ser mulher vítima de violência doméstica de qualquer tipo. No lugar de lives (tão importantes 
quanto qualquer outra forma de arte e de amor), xingamentos e ofensas. No lugar de um abraço 
daqueles que nos acompanham nessa triste fase da humanidade, socos e empurrões; a tortura ; a 
morte. 
Nos acalmemos (ou não), pois em um desgoverno que nos rege de palácios no Planalto 
Central existem mulheres, poucas, mas existem. Provejam as vozes dessas mulheres, de Aldir Blanc, 
ouçam as Maitês, as Terezas, as Anas, as Julianas e Beatrizes. Não! Parece que carregar cemitério 
 
6 CASTRO, L. Subnotificação e gatilhos: o drama da violência doméstica na quarentena. Revista Veja, São Paulo. 
Disponível em: https://veja.abril.com.br/brasil/subnotificacao-e-gatilhos-o-drama-da-violencia-domestica-na-
quarentena/. Acesso em 11/05/2020. 
7 G1 SC; NSC TV. Mulher vítima de violência escreve pedido de socorro com batom em toalha e joga pela varanda em 
SC. G1, Santa Catarina. Disponível em: https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2020/04/20/mulher-vitima-de-
violencia-escreve-pedido-de-socorro-com-batom-em-toalha-e-joga-pela-varanda-em-sc.ghtml. Acesso em 11/05/2020. 
8 CLARIN POLICIALES. Femicidio de Julieta Riera: el acusado de tirarla del octavo piso es el hijo de una ex jueza. Diario 
Clarín, Buenos Aires. Disponível em: https://www.clarin.com/policiales/femicidio-julieta-riera-acusado-tirarla-octavo-
piso-hijo-ex-jueza_0_KsxW78aDj.html. Acesso em 11/05/2020. 
9 CARVALHO, D. Câmera registra mulher se jogando do 3º andar de prédio para se livrar de agressão do namorado; 
assista. G1, Teresópolis. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/mogi-das-cruzes-suzano/noticia/2018/10/31/camera-
registra-mulher-se-jogando-do-3o-andar-de-predio-para-se-livrar-de-agressao-do-namorado-assista.ghtml. Acesso em 
11/05/2020. 
Especialista: Carlos Eduardo Ferreira de Souza 
 Disciplina: Direito Civil 
 carlosedufs 
 
de mortes, da Cultura ou não, das milhares de residências, muitas vezes sustentadas por mulheres 
artistas do nosso país, não é função de ninguém, de nenhuma esfera, de nenhuma instância. 
O que se quer é falar de VIDA, ser leve. 
Ora, isso também queremos, mas não sei se podemos: o vírus mata, a violência doméstica 
também – tortura e assassina. 
E agora? Quem poderá nos defender? Gostaria, do fundo do meu coração, de ter essa 
resposta, mas tudo de que disponho é de uma mão, de um ombro e de uma rede social, que coloco 
(todos eles) à disposição daquelas que precisarem e de quem puder contribuir. 
Se puder deixar algumas sugestões, são essas: fiquemos unidos, protejamos quem está do 
nosso lado (uma amiga, uma vizinha, uma parente) e falemos, mas falemos muito sobre isso; sobre 
aquilo que precisa ser falado. 
E ressalto: o vírus, tal como todo resto, não é igual para todos (e pode ser muito desigual). 
 
O Passei Direto é uma plataforma de difusão de conhecimento e confere aos seus especialistas 
ampla liberdade de publicação. Então, a eles, minha sincera gratidão. 
O presente texto é opinião dada pelo autor, com base em informações jornalísticas e acadêmicas.

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