Buscar

Boa-fé objetiva no Processo Civil

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 3, do total de 56 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 6, do total de 56 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 9, do total de 56 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Prévia do material em texto

Luiz Felipe Germani Ferreira 
 
 
 
 
 
BOA-FÉ OBJETIVA NO PROCESSO CIVIL 
 
 
 
 
 
 
 
 
Santa Maria 
2012 
 
 
 
 
 
 
 Luiz Felipe Germani Ferreira 
 
 
 
 
BOA-FÉ OBJETIVA NO PROCESSO CIVIL 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado ao Curso de Graduação em 
Direito da Faculdade de Direito de Santa 
Maria - FADISMA como requisito parcial 
para a obtenção do Grau de Bacharel em 
Direito. 
 
 
 
Orientador: Prof. Jair Pereira Coitinho 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Santa Maria 
2012
 
 
 
 
 
 
FACULDADE DE DIREITO DE SANTA MARIA – FADISMA 
CURSO DE DIREITO 
 
 
A COMISSÃO EXAMINADORA, ABAIXO ASSINADA, APROVA O TRABALHO DE 
CONCLUSÃO DE CURSO 
 
BOA-FÉ OBJETIVA NO PROCESSO CIVIL 
 
Elaborado por, 
Luiz Felipe Germani Ferreira 
 
COMO REQUISITO PARCIAL PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE 
BACHAREL EM DIREITO 
 
COMISSÃO EXAMINADORA: 
 
_________________________________________ 
Prof. Jair Pereira Coitinho - Orientador 
 
__________________________________________ 
Prof. Igor Andrei Cezne 
__________________________________________ 
Prof. Pietro Toaldo Dal Forno 
 
Santa Maria, Novembro de 2012 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Nosso caráter é o resultado da nossa conduta.” 
Aristóteles 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço aos meus familiares que sempre me auxiliaram em minhas 
conquistas e me ajudaram a superar os desafios da vida acadêmica. 
Também agradeço aos meus chefes, mestres, amigos e colegas que sempre 
me deram força e motivação para que eu busque meus objetivos. 
Ademais agradeço aos professores da instituição que foram fundamentais 
no meu desenvolvimento profissional e pessoal e especialmente ao professor Jair 
Coitinho, que me orientou e inspirou em escrever sobre o tema. 
Finalmente, agradeço a todos que compreenderam meu trabalho e 
auxiliaram na conclusão deste objetivo, seja ajudando de fato ou me trazendo sorte. 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
Este trabalho tem como objetivo elaborar um estudo teórico sobre o Princípio 
da Boa-fé Objetiva, examinando o instituto e buscando sua aplicação no campo do 
direito processual. Estuda-se a possibilidade de utilizar de forma ampliada a boa-fé 
objetiva no processo, com o intuito de vedar as atitudes abusivas e lesivas e valorar 
as condutas éticas. No primeiro capítulo são abordados os aspectos da boa-fé em si, 
analisando seus prismas, subjetivo e objetivo, e sua evolução histórica até a 
inserção no Direito brasileiro com a Constituição Federal de 1988. Ainda é 
caracterizada a boa-fé objetiva como princípio constitucional, derivando de outros 
princípios como a dignidade da pessoa humana. Por decorrer da Constituição, a 
boa-fé deve ser inserida no processo civil, que é instrumento de consecução dos 
objetivos políticos, sociais e jurídicos do Estado. Então, abordam-se formas de 
efetivar os escopos da jurisdição, como a ampliação dos poderes do juiz, a teoria da 
colaboração processual e, por conseguinte, a criação de deveres anexos para todas 
as partes processuais. Frisa-se que hoje em dia, este tema é muito importante para 
o direito, pois a sociedade através da Constituição consagrou a dignidade da pessoa 
humana como valor supremo, de modo que a coletividade não aceita mais um 
processo que não seja pautado na ética e na boa-fé. 
 
PALAVRAS-CHAVE: Boa-fé Objetiva. Constituição Federal. Processo 
Civil. Colaboração. 
 
 
 
 
 
 
RESUMEN 
 
Este trabajo tiene como objetivo elaborar un estudio teórico sobre el principio 
de buena fe objetiva, examinando el instituto y la búsqueda de su aplicación en el 
ámbito del derecho procesal. Se estudia la posibilidad de utilizar el formato ampliado 
de la buena fe objetiva en el proceso, con el fin de sellar las actitudes abusivas y 
perjudiciales y evaluar la conducta ética. El primer capítulo examina los aspectos de 
la buena fe en sí mismos, el análisis de sus prismas, subjetivos y objetivos, así como 
su evolución histórica de la inserción en la ley con la Constitución Federal de Brasil 
de 1988. También se ofrece la fe objetiva bueno como un principio constitucional, 
deriva de otros principios como la dignidad humana. En el transcurso de la 
Constitución, la buena fe debe ser insertada en el proceso civil, que es un 
instrumento para alcanzar objetivos políticos, estado social y legal. A continuación, 
discutir maneras de lograr los ámbitos de competencia, tales como la ampliación de 
los poderes del juez, la teoría de la colaboración de procedimiento y por lo tanto la 
creación de funciones inherentes a todas las partes procesales. Subraya que en la 
actualidad, este tema es muy importante para el Derecho, por la sociedad a través 
de la Constitución consagra la dignidad de la persona humana como valor supremo, 
por lo que la comunidad ya no acepta más un proceso que no está guiado por la 
ética y de buena fe. 
 
PALABRAS CLAVE: Buena fe objetiva. Constitución Federal. 
Procedimiento Civil. Colaboración. 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 8 
CAPÍTULO 1 - BOA-FÉ OBJETIVA .............................................................................. 9 
1.1 - Conceito dúplice da boa-fé .............................................................................. 10 
1.1.1 - Boa-fé Subjetiva ............................................................................................. 11 
1.1.2 - Boa-fé objetiva ............................................................................................... 13 
1.2 - Evolução Histórica ........................................................................................... 16 
1.3 - Boa-fé objetiva como Princípio Constitucional .............................................. 21 
1.4 - Funções da Boa-fé Objetiva ............................................................................. 24 
1.4.1 - Função Interpretativa (Hermenêutico-integrativa) ....................................... 25 
1.4.2 - Função Integrativa (criadora dos deveres anexos) ..................................... 27 
1.4.3 - Função Limitadora dos direitos subjetivos ................................................. 30 
CAPÍTULO 2 – BOA-FÉ OBJETIVA NO PROCESSO CIVIL ....................................... 37 
2.1 - Escopos da Jurisdição ..................................................................................... 38 
2.3 - Atuação do Juiz ................................................................................................ 41 
2.3.1 - Ampliação dos Poderes do Juiz ................................................................... 42 
2.3.2 - Vedação de condutas abusivas .................................................................... 43 
2.3 - Colaboração Processual .................................................................................. 44 
2.4 - Criação de Deveres Anexos no Processo ....................................................... 46 
2.4.1 - Deveres das Partes ........................................................................................ 47 
2.4.2 - Deveres do Juiz ............................................................................................. 48 
CONCLUSÃO ............................................................................................................. 51 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ......................................................................... 54 
 
8 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 O presente trabalho refere-se à utilização do princípio da boa-fé objetiva no 
processo civil, através de uma pesquisa de doutrina com o método dedutivo. 
Com este estudo busca-se uma “solução” para os atos abusivos e 
procrastinatórios que hoje em dia ainda estão presentes no processo civil. 
Sendo assim, examinar-se-á o princípio da boa-fé objetiva, pois este é um 
indicadorde padrões éticos na sociedade, e que poderia ser mais utilizado no 
âmbito processual como forma de valorizar as condutas éticas e combater as 
atitudes abusivas e lesivas. 
No primeiro capítulo tratar-se-á dos aspectos da boa-fé em si, analisando 
suas vertentes subjetiva e objetiva e sua evolução histórica até a positivação no 
Código Civil brasileiro de 2002. 
Ver-se-á os fundamentos que inserem a boa-fé no ordenamento jurídico por 
meio de uma análise da Constituição, pretendendo definir a boa-fé objetiva como 
princípio constitucional. Tratar-se-á também, sobre as funções para aplicação da 
boa-fé objetiva nas relações jurídicas. 
De modo que, após discorrer sobre os principais aspectos da boa-fé 
objetiva, no segundo capítulo objetiva-se pesquisar sobre sua possível inserção no 
campo processual civil. 
Buscar-se-á uma conexão entre os objetivos do processo com o princípio da 
boa-fé objetiva e formas de efetivá-lo no âmbito processual, analisando a atuação 
dos juízes, a teoria do processo cooperativo e a criação de deveres para todas as 
partes envolvidas no processo. 
Sendo assim, este trabalho tem como objeto analisar a possibilidade de uma 
maior utilização do princípio da boa-fé objetiva no âmbito processual civil, tendo 
como objetivo trazer à discussão acadêmica uma imaginável forma de melhorar o 
processo judicial através da ética e da boa-fé. 
9 
 
 
 
1 - BOA-FÉ OBJETIVA 
 
O ser humano tem em sua essência viver em sociedade, pois somente se 
unindo a outros homens ele consegue ser forte o suficiente para sobreviver no 
mundo. 
Na evolução da vida em sociedade, desenvolveram-se visões individualistas 
e coletivistas para regrar as relações sociais, sendo que, atualmente, prevalece a 
noção de função social. Além do mais, em decorrência da crise do sistema liberal e 
o consequente progresso do neoconstitucionalismo, a implantação desses valores 
sociais no meio do direito é imprescindível. 
Não significa que um ser humano, individualmente considerado, tenha 
perdido o seu valor, mas, sim, que sempre deve ser buscado o bem comum, com 
fundamento na pessoa humana. De modo, que não há mais espaço para atitudes 
antiéticas, contrárias ao padrão dos valores sociais, como argumenta Mariana Pretel 
(2009, p. 52). 
Consequentemente, aos poucos alguns valores sociais vêm sendo 
incorporados ao direito, tal como o princípio da boa-fé. 
Nas palavras de José Moacyr Nascimento (2011, p.1): 
Em razão do fenômeno recente e ainda inacabado – o 
neoconstitucionalismo - a quase totalidade dos sistemas jurídicos 
caracteriza-se pela prevalência do elemento ético, leal e probo, 
assegurando o acolhimento do que é lícito e a repulsa ao ilícito. A boa-fé é 
conceito moral que impõe conduta pautada na honestidade, na moralidade, 
na transparência, na cooperação, na confiança, na probidade, no intuito de 
não lesar, prejudicar e nem frustrar outrem. 
 
O princípio da boa-fé é um valor inerente ao ser humano, pois para se 
adaptar a viver em sociedade tem de haver cooperação e lealdade. 
Como diria STOCO (2002, p. 37) 
Estar de boa-fé e agir de boa-fé constituem estados inerentes ao ser 
humano. Ele nasce puro, ingênuo e absolutamente isento de maldade ou 
perversidade. Em sua gênese, vai se transformando segundo influência dele 
sobre si próprio e da sociedade em que vive sobre ele, podendo manter sua 
condição original ou assumir comportamentos decorrentes da influência e 
da sua conversão. 
 
10 
 
 
 
Portanto, a boa-fé é um valor inerente do ser humano, que se relaciona com 
a subjetividade da pessoa em ser honesta, leal, proba. Porém, a sociedade, como 
um todo, é que definirá os padrões de comportamento a serem seguidos em 
conformidade com a boa-fé, e que, por conseguinte, deverão ser regulados pelo 
direito. 
Sendo assim, ao analisar a boa-fé no âmbito jurídico, percebem-se diversas 
visões, seja por um prisma subjetivo ou objetivo, como princípio ou cláusula geral 
(PRETEL, 2009, p. 17). Logo, em razão desta dificuldade de conceituação, faz-se 
necessário primeiramente diferenciar a boa-fé objetiva da boa-fé subjetiva, antes de 
traçar um breve desenvolvimento histórico sobre a boa-fé objetiva. 
1.1 - Conceito dúplice da boa-fé 
Primeiramente, cabe salientar a existência de dois conceitos dentro do 
princípio da boa-fé, como demonstrar-se-á a seguir pelo entendimento de alguns 
doutrinadores, para depois analisar-se especificadamente a boa-fé subjetiva e a 
objetiva. 
Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p.9) concorda com a duplicidade de 
conceitos da boa-fé: “Em que pese a existência de entendimentos no sentido de que 
a boa-fé é um conceito único que se manifesta de diversas formas, é predominante 
o pensamento que o instituto apresenta duas vertentes: a subjetiva e a objetiva.” 
Basicamente, a boa-fé subjetiva é relacionada à índole do agente, ou seja, 
tem a ver com seus valores pessoais no seu agir, enquanto a boa-fé objetiva refere-
se aos valores da sociedade no agir da pessoa, um padrão de comportamento ético. 
Mariana Pretel (2009, p.19-20) explica resumidamente a diferença que existe 
entre a boa-fé subjetiva e a objetiva: 
 
Em princípio, poder-se-ia dispor que a boa-fé subjetiva se refere a dados 
psicológicos, elementos internos, os quais conduzem o sujeito a uma 
ignorância do caráter ilícito de suas condutas, relacionando-se com a ideia 
de crença errônea; enquanto que, a boa-fé objetiva se vincula a elementos 
externos, normas de conduta, que determinam a forma de agir de um 
indivíduo, conforme os padrões de honestidade socialmente reconhecidos. 
 
Este também é o entendimento de Miguel Reale (2003): 
11 
 
 
 
Em primeiro lugar, importa registrar que a boa-fé apresenta dupla faceta, a 
objetiva e a subjetiva. Esta última – vigorante, v.g., em matéria de direitos 
reais e casamento putativo – corresponde, fundamentalmente, a uma 
atitude psicológica, isto é, uma decisão da vontade, denotando o 
convencimento individual da parte de obrar em conformidade com o direito. 
Já a boa-fé objetiva apresenta-se como uma exigência de lealdade, modelo 
objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever que 
cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como 
obraria uma pessoa honesta, proba e leal. Tal conduta impõe diretrizes ao 
agir no tráfico negocial, devendo-se ter em conta, como lembra Judith 
Martins Costa, “a consideração para com os interesses do alter, visto como 
membro do conjunto social que é juridicamente tutelado”. Desse ponto de 
vista, podemos afirmar que a boa-fé objetiva se qualifica como normativa de 
comportamento leal. A conduta, segundo a boa-fé objetiva, é assim 
entendida como noção sinônima de “honestidade pública”. 
 
Deste modo, pode se concluir que uma pessoa pode agir acreditando que 
sua conduta é correta, em conformidade com a boa-fé subjetiva, mas ao mesmo 
tempo, estar agindo de modo contrário à boa-fé objetiva, aos valores impostos pela 
coletividade como padrão de conduta, como expõe Nelson Rosenvald (2009, p. 
458). 
Assim, evidenciado o conceito que diz que existem duas vertentes da boa-fé, 
que a pessoa com um único ato pode estar de acordo com uma vertente e com a 
outra não, passa-se a analisar agora a boa-fé subjetiva. 
 
1.1.1 - Boa-fé Subjetiva 
A boa-fé subjetiva tem a ver com a vontade do sujeito, ou seja, à crença de 
estar agindo de modo correto, honesto, e está, destarte, essencialmente relacionada 
ao intuito de obrar do sujeito. 
Neste sentido explica Judith Martins Costa (2000, p. 411): 
 
A expressão boa-fé subjetiva denota o estado de consciência ou 
convencimento individual de obrar (a parte) em conformidade ao direito 
(sendo) aplicável, ao campo dos direitos reais, especialmente em matéria 
possessória. Diz-se ‘subjetiva’ justamente porque, para a sua aplicação, 
deve o intérprete considerar a intenção do sujeito na relação jurídica, o seu 
estado psicológico ou íntima convicção. Antitéticaà boa-fé subjetiva está a 
má-fé, também vista subjetivamente como a intenção de lesar a outrem. 
 
12 
 
 
 
Deste modo, Mariana Pretel (2009. p.21) sintetiza a subjetividade desta 
vertente da boa-fé na frase: “Diz-se, que na boa-fé subjetiva, o sujeito está “em” ou 
“de” boa-fé.” 
Percebe-se que na boa-fé subjetiva tem de ser levada em conta a intenção 
intrínseca psicológica do sujeito, se ele crê estar agindo de modo correto. De 
maneira que, se for verificado que o obreiro tenha agido erroneamente em razão de 
desconhecimento, pode até ser perdoado e seu ato jurídico valer normalmente 
(ROSENVALD, 2009, p. 458). 
Assim, corrobora Mariana Pretel (2009, p. 20): 
Sob este prisma, há a valoração da conduta do agente, uma vez que agiu 
na crença, analisando-se a convicção na pessoa que se comporta conforme 
o direito. O manifestante da vontade crê que sua conduta é correta, tendo 
em vista o grau de conhecimento que possui de um ato ou fato jurídico. Há 
a denotação de ignorância, crença errônea, ainda que escusável. 
 
Portanto, verifica-se que há de ser levado em conta o real entendimento que 
o obreiro tem do ato lesivo que praticou, pois se havia desconhecimento, não há que 
se falar em contrariedade à boa-fé subjetiva. 
No estudo de NEGRÃO (2005, p. 68 apud LEONARDO, 2006, p.9) pode se 
constatar este entendimento: 
Ela se subsume na circunstância do desconhecimento de uma dada 
ocorrência, de um vício que torne ilegítima a aquisição de um determinado 
direito ou posição jurídica. É o estado de justificativa pelo não conhecimento 
de circunstância ou fato que interfere na esfera jurídica alheia, torna 
ilegítima a aquisição do direito ou posição jurídica. Na boa-fé subjetiva, o 
manifestante da vontade crê que sua conduta é correta, tendo em vista o 
grau de conhecimento que possui de um ato ou fato jurídico. Para ele há um 
estado de consciência ou aspecto psicológico a ser considerado. 
 
Por outro lado, ao verificar a intenção do agente, pode ser constatada a má-
fé, que seria a vontade de lesar a outra parte, agindo propositalmente contra os 
valores prezados pela boa-fé. Sendo assim, o juiz, ao comprovar a existência do 
dolo do agente, deve compelir tais atos jurídicos. 
Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 10) explicita sobre a configuração da 
má-fé: 
13 
 
 
 
 A conduta contrária à boa-fé subjetiva é a má-fé, calcada na ideia de dolo, 
que consiste na consciência e vontade de praticar um ato contrário ao 
Direito ou, de qualquer forma, lesar outra parte. Assim, a conduta daquele 
que age em desconformidade à boa-fé subjetiva é adjetivada por “má-fé”. 
Importante ressaltar que para a configuração da má-fé, é imprescindível a 
prova do dolo. Daí dizer-se que a boa-fé se presume, enquanto a má-fé 
deve ser provada. 
 
Neste sentido, Antônio Manuel da Rocha e Menezes Cordeiro (2001 apud 
Mariana Pretel, 2009, p.21), instrui como o Juiz deverá julgar ao analisar a má-fé na 
intenção do agente: 
Perante uma boa-fé puramente fática, o juiz, na sua aplicação, terá de se 
pronunciar sobre o estado de ciência ou de ignorância do sujeito. Trata-se 
de uma necessidade delicada, como todas aquelas que impliquem juízos de 
culpabilidade e, que, como sempre, requer a utilização de indícios externos. 
Porém, no binômio boa-má fé, o juiz tem, muitas vezes, de abdicar do 
elemento mais seguro para a determinação da própria conduta. [...] Na boa-
fé psicológica, não há que se ajuizar da conduta: trata-se, apenas de decidir 
do conhecimento do sujeito. [...] O juiz só pode promanar, como qualquer 
pessoa, juízos em termos de normalidade. Fora a hipótese de haver um 
conhecimento direto da má-fé do sujeito – máxime por confissão – os 
indícios existentes apenas permitem constatar que, nas condições por ele 
representadas, uma pessoa, com o perfil do agente, se encontra, numa 
óptica de generalidade, em situação de ciência ou ignorância. 
 
Sendo assim, demonstra-se que a boa-fé subjetiva refere-se à ciência do 
sujeito ao agir, e, que, portanto, o Juiz deve analisar não somente o resultado da 
conduta, mas o real conhecimento do agente. 
 
 1.1.2 - Boa-fé objetiva 
A boa-fé objetiva, diferentemente da boa-fé subjetiva, baseia-se em critérios 
objetivos para analisar a conduta, menosprezando o estado psicológico e a vontade 
do agente (LEONARDO, 2006, p.10). 
A boa-fé lealdade, como também é chamada a boa-fé objetiva, pauta-se na 
honestidade, lealdade e probidade com a qual o sujeito condiciona o seu 
comportamento (PRETEL, 2009, p.22). 
Portanto, trata-se de uma regra deontológica, um dever de se manter leal ao 
acordo realizado ou a conduta praticada, para evitar o abuso da confiança alheia, 
agindo em consonância com a ética. Não se opõe à má-fé e também não guarda 
14 
 
 
 
qualquer relação no fato da noção que o sujeito possui da realidade (PRETEL, 2009 
p.22). 
Neste sentido, Judith Martins Costa (2000, p. 411) discorre sinteticamente 
sobre o conceito da boa-fé objetiva: 
por 'boa-fé objetiva' se quer significar - segundo a conotação que adveio da 
interpretação conferida ao § 242 do Código Civil alemão, de larga força 
expansionista em outros ordenamentos, e, bem assim, daquela que lhe é 
atribuída nos países da common law - o modelo de conduta social, 
arquétipo ou standard jurídico, segundo o qual 'cada pessoa deve ajustar a 
própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria um homem reto: 
com honestidade, lealdade, probidade'. Por este modelo objetivo de conduta 
o status pessoal e cultural dos envolvidos, não se admitindo uma aplicação 
mecânica do standard, de tipo meramente subsuntivo. 
 
Ainda, Mariana Pretel (2009, p.22) define o conceito da boa-fé objetiva como 
um dever de se manter conforme os padrões de comportamentos criados pelos 
valores da coletividade: 
Caracteriza-se como um dever de agir, um modo de ser pautado pela 
honradez, ligada a elementos externos, normas de conduta, padrões de 
honestidade socialmente estabelecidos e reconhecidos. 
Na verdade, trata-se de uma técnica que permite adaptar uma regra de 
direito ao comportamento médio em uso em uma dada sociedade num 
determinado momento. Parte-se de um padrão de conduta comum, do 
homem mediano, num determinado caso concreto, levando em 
consideração os aspectos e acontecimentos sociais envolvidos. Traduz o 
estabelecimento de verdadeiros padrões de comportamento no caso 
concreto. É a sinceridade que deve nortear todas as condutas humanas, 
negociais ou não negociais. Em outras palavras, o sujeito deve ajustar sua 
própria conduta ao arquétipo da conduta social reclamada pela ideia 
imperante. 
 
Portanto, verifica-se a noção objetiva da boa-fé, relacionada à confiança 
geral, fundada no arquétipo de comportamento coletivo e reciprocidade de deveres 
(ROSENVALD, 2009, p. 458-459). 
Deste modo, diz-se, na boa-fé objetiva, que o sujeito age "de acordo" com a 
boa-fé, pois está agindo conforme elementos externos impostos como padrões de 
conduta pela sociedade (PRETEL, 2009, p.23). 
Flávio Alves Martins (2000, p. 104), expõe que a boa-fé objetiva não é 
contrária à má-fé ou ao dolo, mas haverá ausência de boa-fé quando não se 
15 
 
 
 
proceder em conformidade com os padrões sociais de conduta, qualquer que seja o 
motivo da desconformidade. 
Neste mesmo sentido, são as palavras do professor Igor Cezne (2007, p. 
255): 
A antítese da boa-fé objetiva não é a intenção de prejudicar o outro (má-fé), 
mas sim a exteriorização de um comportamento ímprobo, egoísta e 
reprovável, ou seja, em descompasso com os parâmetros da ética 
obrigacional, consistindo na violação dos chamados deveres anexos de 
conduta. 
 
Entretanto, a boa-fé objetiva não se restringe aos valores éticos da 
sociedade, ela se conecta ao ordenamento jurídico, devendo o juiz usar os meios 
necessários para zelar pela manutenção da confiança existente entre as pessoas, 
sejam elas partes de um contrato, litigantes ou participantes de qualquer relação 
jurídica(PRETEL, 2009, p.22). 
Ademais, vale destacar, que o instituto da boa-fé não repercute somente no 
âmbito obrigacional dos contratos, mas em qualquer relação jurídica, pois atribui ao 
juiz um maior poder, cabendo-lhe adequar a aplicação judicial à realidade social, 
analisando especificadamente cada caso concreto (PRETEL, 2009, p.24). 
De acordo com a lição de Couto e Silva (2008, p. 42): 
O princípio da boa-fé endereça-se sobretudo ao juiz e o instiga a formar 
instituições para responder aos novos fatos, exercendo um controle 
corretivo do Direito estrito, ou enriquecedor do conteúdo da relação 
obrigacional, ou mesmo negativo em face do Direito postulado pela outra 
parte. A principal função é a individualizadora em que o juiz exerce atividade 
similar a do pretor romano, criando o "direito do caso". O aspecto capital 
para a criação judicial é o fato de a boa-fé possuir um valor autônomo, não 
relacionado com a vontade. (...) 
 
Portanto, o princípio da boa-fé por ser baseado em critérios objetivos, 
permitiu ao juiz não seguir estritamente o que consta em lei, podendo aplicar os 
valores éticos da sociedade conforme a singularidade de cada caso concreto 
(AMARAL, 2009). 
Esta liberdade concedida ao juiz é justificada no interesse coletivo de 
cooperação, promovendo valores constitucionais como o solidarismo, e, 
incentivando o sentimento da justiça social e a repressão a todas as condutas que 
16 
 
 
 
importem em desvio aos padrões comportamentais de honestidade e lisura. 
(ROSENVALD, 2009, p. 459). 
Pode-se observar, com base na evolução histórica que será exposta a 
seguir, que o desenvolvimento da sociedade e do direito evidenciou alguns valores 
sociais, que só poderão ser alcançados ao ser concedida uma certa liberdade ao 
juízes para julgar conforme os princípios éticos da sociedade. 
 
1.2 - Evolução Histórica 
Sinteticamente, pode se afirmar que a expressão de boa-fé tem origem no 
direito romano, em que já se percebia um conceito dúplice, com a diferenciação da 
“bona fides” e da “fides bona” (PRETEL, 2009, p.17) 
Especifica-se tal diferenciação nas palavras de Mariana Pretel (2009, p.17): 
Se, por um lado, analisava-se a crença de um sujeito para avaliar se este 
procedia conforme os ditames legais, por outro, todas as relações eram 
fundadas na confiança e o juiz, dentro do processo formulário, era remetido 
a critérios de decisão éticos, sociais e de equidade. 
 
Para resolver as lides nas relações jurídicas romanas, a jurisprudência 
estabeleceu a bonae fidei iudicia como a ação apropriada, de modo, que 
possibilitava ao juiz não só verificar a conformidade com a lei e com a obrigação 
firmada, mas também analisar os deveres impostos pela fides bona (NUNES, p.5). 
Ademais, Judith Martins Costa (2000, p. 120) aduz que a boa-fé que surgiu 
com o processo da bonae fidei iudicia, que conferiu ao magistrado, nas hipóteses 
em que não havia texto expresso em lei, o poder para decidir de acordo com as 
circunstâncias concretas. Portanto, o juiz deveria julgar segundo os ditames da boa-
fé. 
Todavia, no período da Idade Média, houve um atraso na utilização da boa-
fé objetiva. Com o domínio então exercido pela Igreja Católica, a boa-fé começou a 
se traduzir como a ausência de pecado, dentro do contexto dos ideais cristãos 
(PRETEL, 2009, p.17). 
17 
 
 
 
Gustavo Henrique Schneider Nunes (2012, p.5) em seus estudos corroborou 
com tal afirmação: 
Tal interpretação era procedida em razão de o Direito Canônico ter laços 
morais e éticos muito mais estreitos do que os traçados pelo Direito 
Romano. Tanto é assim que quem procedesse com negligência voluntária 
ou habitual, ou seja, que não procedesse de maneira cuidadosa no decorrer 
da relação jurídica estaria cometendo pecado. 
 
Portanto, verifica-se que, sob a influência da religião, o Direito Canônico teve 
outra abordagem sobre a boa-fé, tratando-a como a ausência de pecado, isto é, a 
crença subjetiva de que a conduta é desprovida de pecado. No entanto, mesmo 
diminuindo a abrangência da boa-fé, é no Direito Canônico que a boa-fé passa a ser 
conceitualmente unificada e define-se como princípio geral do Direito (MARTINS-
COSTA, 2000, p. 131). 
Na modernidade, o princípio da boa-fé foi considerado apenas em sua parte 
subjetiva, pois com a elevação dos valores liberais e individualistas impostos pela 
burguesia, o princípio da boa-fé foi inteiramente absorvido pelo dogma da autonomia 
da vontade. Os contratos faziam lei entre as partes e a vontade destas era a lei 
absoluta, afastando o Estado de qualquer interferência, como afirma Mariana Pretel 
(2009, p. 17-18). 
Na época do surgimento das codificações, a boa-fé objetiva ainda foi 
desprezada, porque estes sistemas eram totalmente fechados e vigorava somente o 
que constava na lei (PRETEL, 2009, p.18). 
Neste período a interpretação jurídica tinha forte influência da escola 
exegética, que privilegiava os aspectos gramaticais e lógicos dos códigos escritos, e 
acreditava ter na lei todas as respostas para os fatos jurídicos. 
Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 15) demonstra algumas codificações 
que trouxeram a boa-fé subjetiva, mas não deram enfoque à boa-fé objetiva: 
 
Neste ínterim, algumas legislações trouxeram previsão acerca do tema, tais 
como as Ordenações Afonsinas (1446), o Código de Civil Francês (1804), o 
Código Comercial brasileiro (1850), e o Código Civil português (1867). 
Todos estes estatutos se limitaram a uma previsão da boa-fé subjetiva e, 
sobretudo, em sede de relações contratuais. Ademais, dado o predomínio 
da Escola Exegética e o positivismo jurídico, os dispositivos supracitados 
tiveram pouca relevância. 
18 
 
 
 
Pode se concluir que a interpretação restrita ao constante na lei e os ideais 
da classe burguesa, que buscava apenas a liberdade econômica, acabou por adiar o 
desenvolvimento da boa-fé objetiva, o que apenas ocorreu no direito alemão 
(PRETEL, 2009, p.18). 
A codificação alemã foi o maior avanço para o desenvolvimento do conceito 
da boa-fé objetiva. Após a 1ª Guerra Mundial, a doutrina e jurisprudência germânica 
incumbiram-se de lograr concretude ao princípio da boa-fé (PRETEL, 2009, p.18). 
O Código Alemão, BGB (Bürgerliches Gesetzbuch), adotou a distinção entre 
a boa-fé, reconhecendo a concomitância do instituto em seus conceitos objetivo e 
subjetivo (PRETEL, 2009, p.30). 
O ordenamento jurídico alemão distinguia nitidamente a boa-fé objetiva da 
subjetiva, com emprego de terminologias distintas. Treu und Glauben é a expressão 
alemã designativa da vertente objetiva da boa-fé, enquanto para a subjetiva, utiliza-
se o termo guter Glauben, ambos com previsão expressa no BGB (LEONARDO, 
2006, p.15). 
Conforme a tradução de MENEZES CORDEIRO (2001, p. 223, apud 
LEONARDO 2006, p.15), pode-se verificar os principais dispositivos que regem a 
boa-fé objetiva no BGB: 
Dois parágrafos consagram a aplicação geral Treu und Glauben e, portanto, 
merecem destaque – são eles: o § 157, do BGB, segundo o qual “os 
contratos interpretam-se como o exija a boa fé, com consideração pelos 
costumes do tráfego”, e o § 242, do mesmo repositório legal, que dispõe 
que “o devedor está adstrito a realizar a prestação tal como o exija a boa fé, 
com consideração pelos costumes do tráfego”. 
 
Como conclui Mariana Pretel (2009.p.32): 
O direito alemão passou a buscar uma nova adequação à vida, mormente 
com a atuação conjunta dos magistrados, tornando-se, por conseguinte, um 
instrumento para o cumprimento da função social a que é precipuamente 
destinado. 
 
Assim, baseado no direito alemão, o conceito da boa-fé começou a ser 
difundido nos demais ordenamentos jurídicos e, consequentemente, no brasileiro. 
19 
 
 
 
No ordenamento jurídico pátrio, a Constituição Federal de 1988 foi o passo 
fundamental para a caracterização da duplicidade de conceitos da boa-fé, pois 
consagrou princípios como o da dignidade da pessoa humana dentre os 
fundamentosda República e gerou uma reinterpretação de todo o direito civil e 
processual civil (PRETEL, 2009, p.18). 
O professor Igor Cezne (2007, pg 249) corrobora neste sentido, ao afirmar 
que: 
De qualquer forma, a substancial mudança de paradigma, deixando de lado 
os ranços liberais, ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 
1988, que pôs em evidencia a pessoa humana como fundamento da 
República brasileira de maneira a garantir-lhe especialmente os valores da 
dignidade e da igualdade material. 
 
Portanto, a partir da promulgação da Magna Carta em 1988, a boa-fé 
objetiva já era aceita e podia ser vista na doutrina e jurisprudência. No entanto, a 
boa-fé em seu prisma objetivo somente foi positivada com o advento do Código de 
Defesa do Consumidor no ano de 1990 e posteriormente no Novo Código Civil de 
2002 (PRETEL, 2009, p. 35). 
Deste modo, percebe-se que a inserção da boa-fé objetiva no ordenamento 
jurídico brasileiro não foi novidade, mas sim, a positivação através do sistema 
legislado. (CEZNE 2007, pg 254). 
Neste sentido, lembra Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p.18) que o 
Código do Consumidor teve efetivamente os primeiros dispositivos que positivaram a 
boa-fé objetiva: 
foi no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) que a boa-fé foi 
positivada como princípio norteador das relações jurídicas tuteladas por 
esta lei. Ainda que limitado às relações consumeristas, o artigo 4º, inciso III, 
dispõe como princípio da política nacional de relações de consumo, a 
harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e 
compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de 
desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os 
princípios nos quais se funda a ordem econômica (artigo 170, da 
Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações 
entre consumidores e fornecedores. 
Ainda, o artigo 51, inciso IV, desta mesma lei, expressa que são nulas de 
pleno direito as cláusulas que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a 
equidade. 
 
20 
 
 
 
Deste modo, percebe-se que a boa fé objetiva foi efetivamente consagrada 
no ordenamento jurídico pátrio no Código de Defesa do Consumidor, pois provinda 
dos preceitos constitucionais, essa espécie de boa-fé passou então a ser 
empregada para interpretações contratuais, integração de obrigações firmadas, 
revelando-se essencial, para que fosse garantido que as partes de um negócio 
jurídico obrassem com lealdade perante outrem no cumprimento dos contratos 
consumeristas. (AMARAL, 2009). 
Mais de uma década após a entrada em vigor do Código de Defesa do 
Consumidor, surgiu o novo Código Civil brasileiro no ano de 2002, positivando o 
princípio da boa-fé objetiva, ao prever, por exemplo, no artigo 422, que: “Os 
contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em 
sua execução, os princípios de probidade e boa fé” (NUNES, 2012, p.10). 
Judith Martins Costa (2004, p. 44-45), sobre o Código Civil de 2002, afirma 
que foi utilizado o princípio da boa-fé tanto em sua forma subjetiva quanto na 
objetiva, como regra de conduta. De modo, que a boa-fé objetiva no campo 
obrigacional passou a derivar desta expressividade legal, e não somente da 
Constituição Federal como princípio implícito. 
Miguel Reale ao projetar o Novo Código Civil baseou-se em três grandes 
paradigmas, a eticidade, a socialidade e a operabilidade. Sendo que a boa-fé 
objetiva é a maior demonstração da eticidade, assegurando às pessoas relações 
jurídicas sob um comportamento suportável, aceitável em determinado tempo e 
lugar (ROSENVALD, 2009, p. 459). 
Hoje em dia, a boa-fé vem sendo observada sob os seus múltiplos ângulos, 
significando que, como princípio, opera, concomitantemente, como postulado ético 
basilar da ordem jurídica e critério de aplicação das normas existentes (PRETEL, 
2009, p.18). 
Assim, conclui Mariana Pretel (2009, p.38): 
A boa-fé objetiva, por derradeiro, muito mais importante do que se encontrar 
positivada, caracteriza-se como princípio constitucional e como cláusula 
geral. Trata-se de um reconhecido valor, que modifica a hermenêutica dos 
operadores do direito em todas as áreas. 
 
21 
 
 
 
1.3 - Boa-fé objetiva como Princípio Constitucional 
Primeiramente, vale salientar que existe uma distinção entre os princípios 
constitucionais, entre explícitos e implícitos, sendo que o primeiro é positivado na 
própria Constituição e legitimado pelo poder constituinte, ao passo que o segundo, 
apesar de emanar do ordenamento jurídico, decorre da interpretação dos valores 
insculpidos na Constituição, o que gera um esforço maior para sua concretização, 
segundo ensinamento de Luiz Flávio Gomes (2010). 
Neste mesmo sentido, Judith Martins Costa (2000, p. 319-320) aduz que os 
princípios no ordenamento jurídico pátrio, podem se encontrar expressos, 
consignados na legislação, ou inexpressos (implícitos), devendo ser estabelecidos 
pelo intérprete ao analisar racionalmente o sistema normativo em seus valores. 
Mariana Pretel (2009, p.44) também conceitua esta diferença, pois diz que: 
Existem doutrinadores que procedem a uma distinção entre os princípios 
positivos do direito e princípios gerais do direito. Os primeiros seriam 
aqueles que já pertencem à linguagem do direito, enquanto estes, os que 
seriam valorados segundo as análises descritivas da ciência jurídica, 
descobertos no ordenamento positivo (existem independentemente de 
expressão nas normas legais, porque nelas não se esgotam). 
 
Na elaboração da Constituição Nacional de 1988, percebe-se a valoração 
dos princípios com a função de balizar todo o ordenamento jurídico, pois além de 
expor textualmente diversos princípios, também dispôs reconhecer outros princípios 
abrigados em seu ordenamento, uma vez que o artigo 5º, em seu parágrafo 2º, diz 
que "os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros 
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados 
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte." (PRETEL, 2009, 
p. 48-49). 
Portanto, verifica-se que no ordenamento jurídico pátrio são admitidos tanto 
os princípios positivos do direito quanto os princípios gerais do direito (implícitos), 
presentes na Constituição. 
Deste modo, para se perceber a existência de alguns princípios deve ser 
feita uma interpretação ampla do ordenamento, analisando os objetivos políticos, 
sociais e jurídicos insculpidos na Constituição. (NASCIMENTO, 2011, p.1). 
22 
 
 
 
Pois bem, ao se analisar a Constituição brasileira em seu preâmbulo e no 
seu primeiro artigo pode-se verificar que o Brasil é um Estado Democrático de 
Direito, cujo paradigma é a garantia dos direitos fundamentais observados nos 
princípios constitucionais (COSTA, GOMES, 2012, p.14). 
Ainda, Patricia Ayub da Costa e Sérgio Alves Gomes (2012, p.15), defendem 
o conceito de Estado Democrático de Direito ao considerar que este supera os 
modelos de Estado Liberal e Social, que se preocuparam exclusivamente com o 
interesse individual ou com os aspectos sociais, e não conseguiram resguardar a 
dignidade da pessoa humana. Porquanto, o homem na sociedade deve ser 
respeitado em sua singularidade, com o Estado buscando garantir todas as 
dimensões dos direitos fundamentais inerentes à dignidade da pessoa. 
Também, José Moacyr Nascimento (2011, p.1), ao analisar o preâmbulo da 
Constituição, afirma que o Estado Democrático de Direito instituído deve assegurar 
os valores que devem nortear a conduta social: “o exercício dos direitos sociais e 
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e 
a justiça.” 
Mariana Pretel (2009, p.55) assevera que os princípios estabelecidos com a 
Constituição de 1988, sejam explícitos ou implícitos, consagraram uma abertura do 
sistema jurídico brasileiro, promovendo a modificação de valores fundamentais, com 
a substituiçãodo indivíduo pela pessoa, sendo a dignidade da pessoa humana 
vértice de todo o direito, público ou privado. 
Decorrendo dos princípios constitucionais mencionados, principalmente do 
princípio da dignidade da pessoa humana, pode-se enxergar o princípio da boa-fé, 
pois, ainda que não esteja previsto na Constituição, pode-se constatá-lo quando a 
Carta Magna exige comportamento leal, probo, digno, que se espera do homem 
médio. (COSTA, GOMES, 2012, p. 16) 
José Moacyr Nascimento (2011, p. 1) aduz que o princípio da boa-fé pode 
ser relacionado ao ditame constitucional que estabelece como objetivo fundamental 
da República a construção de uma sociedade solidária, na qual o respeito comum 
seja um elemento essencial a qualquer relação jurídica. Pois se presume o homem 
23 
 
 
 
como parte integrante de uma comunidade, e não um ser isolado, cuja vontade tem 
de ser respeitada, porém, sujeita a limites externos. 
Neste sentido, dispõe Patricia Ayub da Costa e Sérgio Alves Gomes (2012, 
p. 18) sobre a procedência do princípio da boa-fé no conceito do Estado 
Democrático de Direito e nos demais princípios expressos na Carta Magna: 
Portanto, no paradigma de um Estado Democrático de Direito (art. 1º, caput, 
da CF) fundamentado na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), 
cujos objetivos são construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, 
CF); promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, 
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV, CF) que 
rege suas relações internacionais pelos princípios da igualdade entre os 
Estados (art. 4º, V, CF); defesa da paz (art. 4º, VI, CF); solução pacífica dos 
conflitos (art. 4, VII, CF); cooperação entre os povos para o progresso da 
humanidade (art. 4º, IX, CF) só pode ser regido pelo princípio da boa-fé 
objetiva, pois é esse princípio que fundamenta o comportamento desse 
modelo de Estado. 
 
Compreende-se que tais valores que figuram na Constituição são postulados 
éticos que demonstram que o Estado deve garantir os valores humanos. Decorre-se 
daí a afirmação de que a boa-fé objetiva move a sociedade, porquanto, para se viver 
em harmonia social, é preciso que os indivíduos se respeitem, que tenham 
comportamento leal e isso decorre do princípio da boa-fé objetiva. (COSTA, 
GOMES, 2012, p. 18) 
Com os novos valores constitucionais, a autonomia da vontade e o 
individualismo cederam lugar às regras deontológicas da boa-fé, haja vista, que ao 
se conferir que todas as relações jurídicas devem ser norteadas pela lealdade e 
confiança, percebe-se que a “boa-fé atua como uma luz irradiante para a 
interpretação constitucional, premissa básica da ordem jurídica.” (PRETEL, 2009, p. 
54). 
Portanto, o princípio da boa-fé objetiva deve ser considerado princípio 
constitucional, cabendo aos Juízes a função de aplicá-lo aos casos concretos, na 
busca da efetivação da dignidade da pessoa humana e demais princípios inerentes 
à convivência harmônica em sociedade. (COSTA, GOMES, 2012, p. 19). 
 Conforme Mariana Pretel (2009, p. 56), pode se afirmar que a Constituição, 
ao promover a boa-fé como postulado ético inspirador do ordenamento, seja como 
24 
 
 
 
norma infraconstitucional ou regra de interpretação, conferiu força normativa e 
aplicabilidade imediata ao princípio, expandindo-o para todas as áreas do direito. 
Desta maneira, vale lembrar que o princípio da boa-fé objetiva positivado no 
Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor, foi legitimado pela Constituição, 
pois, ali, implicitamente, emanando dos valores do Estado Democrático de Direito, 
está o princípio da boa-fé objetiva. (COSTA, GOMES, 2012, p. 19). 
Pois, como ressalta Mariana Pretel (2009, p. 47): 
toda interpretação constitucional se assenta no pressuposto da 
superioridade hierárquica da Constituição sobre os demais atos normativos, 
entende-se então que são os valores supremos que garantem a validade de 
toda a legislação do Estado. 
 
Neste sentido, conclui Diego Martins Silva do Amaral (2009): 
O princípio boa-fé objetiva se estabelece em uma regra ética, em um 
grande dever de guardar fidelidade à palavra dada ou ao comportamento 
praticado, na idéia de não fraudar ou abusar da confiança alheia, o respeito 
e a obrigação. Como já argumentado anteriormente, não surgiu com o 
Código Civil de 2002 ou mesmo com o Código de Defesa do Consumidor, 
mas, ao contrário, passou por uma lenta e gradativa evolução, desde os 
tempos romanos, passando pelo direito alemão, sendo que, pelo legislador 
constituinte de 1988 foi reconhecida e erguida à condição de princípio, 
adquirindo o status de fundamento ou qualificação essencial da ordem 
jurídica. Isto significa dizer que atua como postulado ético inspirador de toda 
ordem jurídica e que, por fim, sempre deverá ser aplicado no caso concreto. 
Nos dias atuais, não há como não se reconhecer a sua incidência em todos 
os temas de direito civil, direito processual civil e direito do consumidor. 
 
Portanto, compreende-se que a boa-fé objetiva é um vértice de todo o 
ordenamento jurídico com seu fundamento na própria Constituição, sendo 
configurado como princípio (implícito), de modo que, toda a legislação 
infraconstitucional e a interpretação jurídica têm de ser pautados em seus valores 
éticos. 
Isto posto, passar-se-á a analisar as funções da boa-fé objetiva, ou seja, a 
maneira de aplicar este princípio no campo das relações jurídicas. 
 
1.4 - Funções da Boa-fé Objetiva 
Os doutrinadores ao analisarem as cláusulas da boa-fé objetiva que foram 
positivadas no Código Civil de 2002 definiram as funções da boa-fé para atuar no 
25 
 
 
 
regramento das relações jurídicas. Entre essas funções, pode se perceber a 
interpretativa (hermenêutico-integrativa) relacionada ao artigo 113, a integrativa 
(criadora dos deveres anexos), conforme artigo 422, e a limitadora de direitos 
subjetivos que decorre do exame do artigo 187. 
Neste sentido, corrobora Nelson Rosenvald (2009, p. 459), ao discorrer 
sobre a multifuncionalidade da boa-fé objetiva: 
A boa-fé é multifuncional. Para fins didáticos, é interessante delimitar as três 
áreas de operatividade da boa-fé no Código Civil de 2002. Desempenha 
papel de paradigma interpretativo na teoria dos negócios jurídicos (art. 113); 
assume caráter de controle, impedindo o abuso do direito subjetivo, 
qualificando-o como ato ilícito (art. 187); finalmente, desempenha atribuição 
integrativa, pois dela emanam deveres que serão catalogados pela 
reiteração de precedentes jurisprudenciais (art.422). 
 
José Moacyr Nascimento (2011, p.1) salienta que essa tripartição 
metodológica foi construída para a área contratual, em consequência da positivação 
da boa-fé objetiva que foi realizada no código civil. No entanto, afirma que é possível 
e necessário deslocá-la para o campo do direito processual. 
Portanto, observando-se que o princípio da boa-fé objetiva insere-se no 
âmbito jurídico e social por diversas formas, torna-se necessário individualizar e 
especificar cada uma de suas funções. 
 
1.4.1 - Função Interpretativa (Hermenêutico-integrativa) 
A primeira das funções da boa-fé é a que se denomina como interpretativa, 
pois, por decorrer de um princípio geral do direito, gera a todos os interpretes do 
direito o dever de interpretar as relações jurídicas com base nos paradigmas éticos 
sociais previstos pela boa-fé objetiva. 
A interpretação, no âmbito jurídico, significa atribuir, extrair, esclarecer o 
sentido das normas ou dos negócios realizados entre as partes, com a finalidade de 
resolver os casos concretos. (DIMOULIS, 2007, p. 172) 
Ao interpretar a relação jurídica, o operador do direito, tem a boa-fé objetiva 
como um referencial, para poder extrair do objeto de questão, o sentido moral 
adequado à sociedade. (AMARAL, 2009) 
26 
 
 
 
Deste modo, interpretar a lei ou o contrato de acordo com os preceitos da 
boa-fé objetiva será sempre adequá-los aética, tendo em vista que o Código Civil 
traz a eticidade como paradigma. (PRETEL, 2009, p. 74) 
Esta função, em que a boa-fé objetiva serve para orientar toda a 
interpretação dos negócios jurídicos, especialmente dos contratos, está prevista no 
artigo 113 do Código Civil (LEONARDO, 2006, p. 31), no qual está expresso que “Os 
negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de 
sua celebração.” 
Assim, ainda que a doutrina tenha definido a função interpretativa da boa-fé 
objetiva com base no artigo 113 do Código Civil, ela não se prende ao Direito 
Obrigacional, tampouco aos Contratos, entretanto, aplica-se a todo e qualquer ato 
jurídico, e não somente nos negócios jurídicos. (LEONARDO, 2006, p. 31). 
Neste sentido, Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 31) relembra sobre o 
caráter principiológico da boa-fé objetiva que deve balizar todo o ordenamento: 
Aliás, dada sua natureza de princípio geral do Direito, como axioma que 
permeia todas as relações jurídicas (e não somente as contratuais), deve 
ser parâmetro interpretativo em qualquer relação que tenha vínculo jurídico, 
independente de finalidade econômica manifesta no ato. 
 
Portanto, esta função da boa-fé é exercida através da interpretação, onde se 
procura o melhor sentido de uma determinada manifestação em algum ato jurídico. 
Até visa elucidar a manifestação jurídica que esteja obscura, como cita Gustavo 
Henrique Schneider Nunes (2012, p. 17): “existindo uma lacuna ou até mesmo uma 
expressão confusa, dificultando a tarefa do intérprete, deve-se socorrer da boa-fé 
objetiva.” 
Assim, pode-se evidenciar que o recurso interpretativo da boa-fé é a fórmula 
do intérprete do direito garantir a finalidade econômico-social de todos os negócios 
jurídicos, cabendo ao Juiz não permitir que a lei ou o contrato atinja uma finalidade 
contrária aos valores éticos da coletividade. (PRETEL, 2009, p. 76). 
Logo, conclui Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 31): “sempre que se 
mostrar necessário interpretar algum ato jurídico, deve-se, sempre, favorecer uma 
interpretação que privilegie a boa-fé ética.” 
27 
 
 
 
Além do mais, deve-se destacar que a interpretação conforme a boa-fé, 
ainda levando em consideração seu status de princípio geral do Direito, também 
deve orientar o Legislador na elaboração da Lei. “Mutatis mutandis, o feitor da Lei, 
em seu labor, deve sempre ter em conta o padrão de conduta que se espera do 
homem médio; deve primar pela probidade e retidão, incentivando sempre o 
comportamento dotado de tais predicativos.” (LEONARDO, 2006, p. 32). 
Assim, resta demonstrado uma das principais funções da boa-fé objetiva, 
qual seja balizar todas as interpretações jurídicas garantindo o entendimento das 
relações contratuais e legais no Direito em conformidade com os padrões éticos da 
sociedade. 
 
1.4.2 - Função Integrativa (criadora dos deveres anexos) 
Além da função interpretativa, a boa-fé também possui a função integrativa, 
que consiste na criação de deveres anexos ao negócio jurídico, independente da 
vontade das partes, adequando o negócio aos parâmetros de eticidade da 
sociedade. 
Nelson Rosenvald (2009, p. 459) afirma que através da análise do art.422 do 
Código Civil pode-se enxergar a função integrativa da boa-fé. Em que a boa-fé serve 
como uma fonte criadora de deveres jurídicos para as partes, além de auxiliar na 
interpretação dos negócios jurídicos. Esta função serve para garantir os deveres de 
proteção e cooperação com os interesses da outra parte, propiciando a realização 
do negócio jurídico com a finalidade desejada e a função social-econômica 
adequada. 
Mariana Pretel (2009, p. 76) explica que integrar neste caso, significa 
”completar, inteirar, integralizar, determinar de forma explícita.” Sendo que integrar 
uma lei ou um negócio jurídico é completar o seu teor de acordo com os ditames do 
ordenamento jurídico, criando deveres anexos para determinados casos concretos. 
Podendo concluir-se que a relação jurídica é definida pela vontade das partes 
integrada com a boa-fé objetiva. 
A função integrativa também permite que as eventuais lacunas existentes no 
ordenamento jurídico sejam colmatadas por normas concretas que promovam “a 
28 
 
 
 
lealdade, transparência, informação, probidade e quejandos, afinando-se 
plenamente com a concepção da boa-fé lealdade e valores constitucionais.” 
(NASCIMENTO, 2011, p. 1). 
Com a integração, há uma atuação positiva da boa-fé como verdadeira fonte 
de direito, criando direitos e deveres, ditos secundários, acessórios ou anexos, que 
mais do que regras morais de confiança e lealdade na relação jurídica, devem ser 
regras jurídicas que se inserem no ordenamento. (PRETEL, 2009, p. 77). 
Outro modo de perceber que os deveres anexos têm como fonte a 
integração, é que eles não decorrem diretamente da vontade principal das partes e 
nem diretamente da Lei regente específica. Destarte, a função integrativa da boa-fé 
objetiva estabelece deveres, obrigações, não existentes de forma explícita no 
contrato ou na Lei imediata. (NASCIMENTO, 2011, p.1). 
Antes de se escrever sobre os deveres anexos, deve-se elucidar sobre os 
demais deveres das obrigações, e, neste sentido, ao discorrer sobre a boa-fé 
objetiva nos contratos, expõe Igor Cezne (2007, p. 258): 
Por deveres principais devemos entender aqueles relacionados ao objeto da 
relação e que irá determinar o próprio tipo de contrato, ou seja, é o cerne da 
relação. Já os deveres secundários são divididos em dois tipos. O primeiro 
– deveres secundários meramente acessórios da obrigação principal – é 
aquele que assegura a obrigação principal (ex. na compra e venda o dever 
de transportar, embalar, ou conservar); o segundo – deveres secundários 
com prestação autônoma – é decorrência da obrigação principal (ex: 
Indenização por mora ou cumprimento defeituoso). 
 
Além do mais, os deveres principais da obrigação decorrem da vontade 
explícita das partes ao celebrarem determinado contrato. 
Por outro lado, os deveres anexos não têm como fonte a vontade das partes, 
tampouco se originam na Lei ou em alguma previsão contratual. Com efeito, esses 
deveres decorrem da função integrativa da boa-fé objetiva e, ainda que implícitos, 
impõem-se a ambas as partes do negócio jurídico independentemente de suas 
vontades. (LEONARDO, 2006, p. 36). 
Neste sentido, aduz Nelson Rosenvald (2009, p. 459) sobre a não 
voluntariedade das partes sobre os deveres anexos: 
29 
 
 
 
Todavia, outros deveres se impõem na relação obrigacional, completamente 
desvinculados da vontade de seus participantes. Trata-se dos deveres de 
conduta, também conhecidos na doutrina como deveres anexos, deveres 
instrumentais, deveres laterais, deveres acessórios, deveres de proteção e 
deveres de tutela. 
 
Ainda, Nelson Rosenvald, (2009, p. 459) corroborando que os deveres 
laterais são destinados a ambas as partes do negócio: 
Os deveres de conduta são conduzidos ao negócio jurídico pela boa-fé, 
destinando-se a resguardar o fiel processamento da relação obrigacional 
em que a prestação se integra. Eles incidem tanto sobre o devedor quanto 
sobre o credor, mediante resguardo dos direitos fundamentais de ambos, a 
partir de uma ordem de cooperação, proteção e informação, em via de 
facilitação do adimplemento, tutelando-se a dignidade do devedor e o 
crédito do titular ativo. 
 
Destarte, diante desta característica criadora de deveres laterais, impostos 
aos sujeitos da relação jurídica sem considerar a volitividade, pode-se chamar esta 
função decorrente da boa-fé, de ativa ou positiva. (LEONARDO, 2006, p. 37). 
Assim sendo, assevera Mariana Pretel (2009, p. 78), que os deveres anexos 
de prestação autônoma são uma forma de satisfazer os interesses da coletividade, 
pois impõem, para cada caso concreto, deveres de conduta baseados na ética social 
a ambos os integrantes da relação jurídica. A autora ainda exemplificaalguns 
deveres anexos, que são “os deveres de lealdade, cooperação e colaboração, 
informação (aviso e esclarecimento), previdência e segurança, prestação de contas, 
proteção e cuidado, entre outros.” (PRETEL, 2009, p. 78). 
Nesta mesma banda, aduz Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 36): 
Portanto, ao passo que a boa-fé impõe uma conduta de cooperação e de 
lealdade entre as partes de uma obrigação, ela tem a função criadora de 
deveres laterais, paralelos à prestação principal. É nesta esteira que se 
inserem os seguintes deveres: de informação, de cuidado, de aviso, de 
prestar contas, de colaboração e cooperação, de proteção e de segredo, 
dentre outros. 
 
Assim, porquanto a boa-fé objetiva pode criar deveres implícitos que 
completam as relações jurídicas com base na lealdade, confiança e cooperação, 
abrangendo requisitos para harmonia social, independentemente da vontade das 
30 
 
 
 
partes, por outro lado, ela também pode limitar certos direitos subjetivos e minorar 
algumas manifestações de vontade, como será visto adiante. 
1.4.3 - Função Limitadora dos direitos subjetivos 
 
Outra função da boa-fé objetiva é limitar os direitos subjetivos das partes. 
Com os novos axiomas promovidos na Constituição, colocando a pessoa em 
primeiro lugar, o Estado passou a ter legitimidade para interferir nas relações 
privadas, procurando diminuir as desigualdades entre as partes. Por conseguinte, 
através da boa-fé objetiva o Estado busca garantir a finalidade econômico-social do 
contrato ao limitar a liberdade dos contratantes. (CEZNE, 2007, p. 257). 
Esta função da boa-fé pode ser chamada de “negativa”, pois ela limita o 
exercício de posições jurídicas e restringe o exercício do titular de um determinado 
direito. (LEONARDO, 2006, p. 34). 
Salienta Mariana Pretel (2009, p. 86), que a função controladora pode ser 
encontrada no artigo 187 do Código Civil, o qual contempla a previsão legal do ato 
abusivo, assim dispondo: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao 
exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou 
social, pela boa-fé e pelos bons costumes”. 
Analisando tal artigo, pode se perceber que a boa-fé e os bons costumes de 
acordo com os seus fins sociais e econômicos, impõem limites ao exercício dos 
direitos. (PRETEL, 2009, p. 87). 
Neste sentido, expõe Cesar Augusto Luiz Leonardo (2006, p. 32-33): 
A boa-fé objetiva também limita o exercício de posições jurídicas, da 
seguinte forma. O Direito atribui direitos, deveres, faculdades e ônus às 
pessoas. Todavia, o titular de uma posição jurídica, ao exercê-la, não o 
pode fazer de qualquer forma, mas deve sempre respeitar aos limites 
estabelecidos por ela mesma e pelo Direito (entendido como todo o 
Ordenamento Jurídico) e, por via de consequência, à boa-fé, dada a sua 
condição de proposição jurídica. É dizer: os direitos subjetivos não são 
absolutos, devendo ser exercidos conforme sua finalidade econômica e 
social, sem desrespeitar os preceitos decorrentes da boa-fé objetiva. 
 
31 
 
 
 
Brunela Vincenzi (2003, p. 164) afirma que a aplicação da função corretiva 
da boa-fé objetiva além de limitar o exercício de direitos subjetivos nas relações 
contratuais também pode controlar o exercício de posições jurídicas exercidas numa 
relação processual: poderes, faculdades, ônus, direitos potestativos e deveres. 
Corroborando tal afirmação de que a função controladora pode ser exercida 
sobre qualquer manifestação de vontade em uma relação jurídica, é a citação de 
Gustavo Henrique Schneider Nunes (2012, p. 15): 
A boa-fé tem por escopo controlar todas as manifestações de vontade, 
limitando-as ao exercício de direitos daí decorrentes. Não mais se aplica o 
entendimento de que tudo que não estiver proibido no contrato ou na lei 
torna-se, por via de consequência, permitido. Essa visão ultrapassada dava 
azo a inúmeras falcatruas, sempre em prejuízo da parte mais vulnerável da 
relação jurídica. 
 
Ainda, neste sentido, pode-se citar Brunela Vincenzi (2003, p. 165): 
Essas várias posições jurídicas podem ocorrer em relações jurídicas as 
mais diversas, nas quais se observa a necessidade de aplicação da regra 
objetiva para coibir exercícios inadmissíveis na relação contratual (veja-se, 
por exemplo, o direito à resilição contratual imotivada ou à rescisão por 
inadimplemento nos casos de adimplemento substancial), ou na relação 
jurídica processual (que, de maneira exacerbada, impedem ou alongam o 
tempo necessário para realização do direito material.) 
 
Percebe-se que, toda manifestação de vontade que gere efeitos jurídicos 
deve ser analisada para saber se ela se harmoniza ou não com o princípio da boa-fé 
objetiva. Ao passo que, havendo excessos, a boa-fé age para contornar ou adequar 
o ato aos padrões de conduta estabelecidos. (NUNES, 2012, p. 15). 
Neste contexto, cita-se Mariana Pretel (2009, p. 87-88): 
a boa-fé atua no sentido de contenção da visão individualista, de conceder 
um novo perfil à autonomia privada, conduzindo os direitos subjetivos a 
limites equilibrados, dentro do contexto da função social, da solidariedade e 
da dignidade da pessoa humana. 
 
A função controladora da boa-fé visa impedir práticas abusivas que se 
desvirtuem dos ditames éticos, podendo até interferir na autonomia de vontade, 
considerando nula algumas cláusulas contratuais. Ou seja, deve ser controlada toda 
32 
 
 
 
manifestação que contrarie o padrão ético da boa-fé, que busca atribuir lealdade e 
honestidade a todas as relações. (NUNES, 2012, p.17) 
Deste modo, o titular de um direito que o exerce ultrapassando os limites 
impostos pelo fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, pratica 
abuso de direito. (LEONARDO, 2006, p. 34). 
O legislador pátrio qualifica o abuso de direito como ato ilícito, ao inserir o 
artigo 187 no capítulo referente aos atos ilícitos no Código Civil de 2002. No entanto, 
deve-se salientar que no ato abusivo, o indivíduo não desrespeita as normas 
específicas individualmente, mas sim os valores que serviram de fundamento para 
as normas em geral. (PRETEL, 2009, p.88). 
Neste sentido Mariana Pretel (2009, p. 89) expõe sobre os limites do 
indivíduo ao exercer seus direitos: 
Todo indivíduo deve exercitar os seus direitos nos limites estabelecidos pelo 
conteúdo do próprio direito (limites internos) ou por disposições que 
decorrem da proteção dispensada a terceiros e da colisão de direitos 
(limites externos). Em outras palavras, pode se afirmar que, além dos limites 
que derivam da própria natureza do direito (objeto e conteúdo), existem 
outros, derivados da boa-fé e da função social (tal qual já fora deveras 
explanada a teoria dos deveres anexos, que decorrem da boa-fé). 
 
Nesta mesma esteira, a boa-fé também serve para limitar atos ilícitos, que 
não podem ser vistos ao se verificar apenas a conformidade do ato com a norma 
aparente, mas que devem ser analisados conforme os valores de todo o 
ordenamento e toda a conduta do agente. Esta análise abrangente da função 
limitadora da boa-fé pode ser relacionada com o instituto da teoria dos atos próprios, 
que impõe uma conduta coerente, não contraditória. (LEONARDO, 2006, p. 34). 
Outrossim, Mariana Pretel (2009, p. 85-86) explicita a teoria dos atos 
próprios: 
segundo a qual a ninguém é lícito fazer valer um direito em contradição com 
a sua conduta anterior interpretada objetivamente segundo a lei, segundo 
os bons costumes e a boa-fé, ou quando o exercício posterior se choque 
com a lei, os bons costumes e a boa-fé, sendo que o seu efeito é impedir 
que a parte que tenha violado os deveres, exija o cumprimento pela outra 
parte, ou se valha do seu próprio inadimplemento para se beneficiar de 
disposição contratual ou legal. 
 
33 
 
 
 
Dessa forma, devem ser analisados os pressupostos para a aplicação da 
referida teoria, haja vista que para a incidência desta regra, não basta verificar tão 
somentea contradição, até porque o ordenamento prevê situações em que a 
incoerência é lícita, e muitas vezes decorrem da própria natureza ou finalidade do 
instituto. (LEONARDO, 2006, p. 34). 
Assim, SCHREIBER (2005, p. 124 apud LEONARDO, 2006, p. 34-35) ensina 
que a proibição do fato próprio pressupõe: 
a) um factum proprium, ou seja, uma conduta inicial; b) a legítima confiança 
de outrem na conservação do sentido objetivo desta conduta; c) um 
comportamento contraditório com este sentido objetivo, que viola a 
confiança criada pelo fato próprio; e, por fim d) um dano ou, no mínimo, um 
potencial de dano a partir da contradição. 
 
Nesta senda, verifica-se que a finalidade deste instituto da boa-fé não é 
condenar toda e qualquer conduta contraditória, haja vista que a contradição muitas 
vezes é possível; esta teoria visa resguardar a confiança legítima criada pelo ato 
próprio, que seria frustrada diante de um comportamento incoerente. (LEONARDO, 
2006, p. 35). 
A função controladora da boa-fé, além proibir o abuso de direito, também 
proíbe condutas contraditórias que abalem a legítima confiança das partes. Tais 
condutas contraditórias podem ser vistas de forma melhor ao analisarmos os 
institutos que derivam desta teoria dos atos próprios, quais sejam o “venire contra 
factum proprium”, a “regra tu quoque”, a “suppresio/surrectio”, a “exceptio doli”, 
dentre outros. (LEONARDO, 2006, p. 35). 
 
Primeiramente, Menezes Cordeiro (2007, p. 745 apud NASCIMENTO, 2011, 
p. 1), conceitua o venire contra factum proprium: 
Venire contra factum proprium postula dois comportamentos da mesma 
pessoa, lícitos em si e diferidos no tempo. O primeiro – o factum proprium – 
é, porém, contrariado pelo segundo. (...) Há venire contra factum proprium, 
em primeira linha, numa de duas situações: quando uma pessoa, em termos 
que, especificamente, não a vinculem, manifeste a intenção de não ir 
praticar determinado acto e, depois, o pratique e quando uma pessoa, de 
modo, também, a não ficar especificamente adstrita, declare pretender 
avançar com certa actuação e, depois, se negue. 
 
34 
 
 
 
Judith Martins Costa (2000, p. 471), apoiada nos ensinamentos de Menezes 
Cordeiro, dispõe sobre os elementos fundamentais do venire contra factum 
proprium: 
O seu fundamento técnico-jurídico – e daí a conexão com a boa-fé objetiva 
– reside na proteção da confiança da contraparte, a qual se concretiza, 
neste específico terreno, mediante a configuração dos seguintes elementos 
, objetivos e subjetivos: a) a atuação de um fato gerador de confiança, nos 
termos em que esta é tutelada pela ordem jurídica; b) a adesão da 
contraparte – porque confiou – neste fato; c) o fato de a contraparte exercer 
alguma atividade posterior em razão da confiança que nela foi gerada; d) o 
fato de ocorrer, em razão da conduta contraditória do autor do fato gerador 
da confiança, a supressão do fato no qual fora assentada a confiança, 
gerando o prejuízo ou iniquidade insuportável para quem confiara. 
 
Portanto, não é razoável que uma pessoa pratique determinado ato ou 
conjunto de atos e, em seguida, adote uma conduta oposta, seja no âmbito privado 
ou nas relações processuais. (VIANA, GAGLIANO, 2012, p. 6). 
Também, seguindo a teoria dos atos próprios pode-se ver os institutos do tu 
quoque, surrectio, supressio e exceptio doli, todas com o objetivo de proteger a 
confiança legítima contra atos incoerentes. 
A expressão Tu quoque pode vir da célebre frase “Tu quoque, Brutus, fili 
mi!”, historicamente atribuída ao imperador romano Júlio César, ao constatar que foi 
traído pelo seu filho Brutus. (VIANA & GAGLIANO, 2012, p. 9). 
Ou seja, a locução “Tu quoque” que pode ser traduzida como "tu também" 
tem a ver com traição, pois está relacionada aos casos em que o sujeito exige da 
outra parte algo que também foi por ele descumprido ou negligenciado. (MEZZOMO, 
2006, p. 1). 
Deste modo, a regra tu quoque tem a função de coibir abusos de 
contrariedade ou aproveitamento da própria torpeza ou ilicitude, na relação de 
contraprestações própria dos contratos bilaterais. (MARTINS-COSTA, 2000, p. 464). 
Judith Martins Costa (2000, p. 465) explica sobre a função da regra tu 
quoque relacionada a boa-fé objetiva ao visar manter a harmonia nas relações 
contratuais: 
É justamente nesta perspectiva que se verifica a relação entre o sinalagma 
e a regra do tu quoque, considerado como especificação da boa-fé objetiva. 
Se o sinalagma traduz, como é bem verdade, a existência e a configuração 
dos deveres contrapostos, que devem manter posição de relativo equilíbrio 
35 
 
 
 
entre si, a violação de uma das prestações nele implicadas caracteriza 
justamente uma violação ao sinalagma que está na estrutura essencial dos 
contratos bilaterais. Como melhor explicita Menezes Cordeiro, se assim 
ocorrer, os deveres contrapostos revelados pelo sinalagma nos contratos 
bilaterais “perderiam a identidade e o sentido que os define”. Em 
consequência, se o ordenamento não tutelasse a inserção sistemática 
expressa na regra do tu quoque, estaria a alterar “toda a harmonia da 
estrutura sinalagmática, atingindo, com isso, a outra prestação, razão pela 
qual conclui: “A justificação e medida do tu quoque estão, pois, nas 
alterações que a violação primeiro perpetrada tenha provocado no 
sinalagma”. 
 
Deste modo, conforme este instituto, a parte que continuamente violou uma 
regra não pode invocar esta mesma regra em seu favor. (MEZZOMO, 2006, p. 1). 
Sendo assim, percebe-se que por meio do tu quoque, visa-se evitar ações 
injustas que perturbem o equilíbrio que deve reger a dinâmica das relações jurídicas, 
inclusive da relação jurídica processual. (VIANA e GAGLIANO, 2012, p. 9). 
A supressio ou “Verwirkung” da doutrina alemã consiste na redução do 
conteúdo obrigacional ou perda de um direito pela inércia de uma das partes em 
exercer seu direito ou faculdades por um razoável lapso temporal, gerando na outra 
parte legítima expectativa. (MEZZOMO, 2006, p. 1). 
Menezes Cordeiro (2007, p. 378 apud SANTOS, 2008, p. 207) define a 
supressio: 
Supressio é a expressão proposta para traduzir Verwirkung, isto é, a 
situação em que incorre a pessoa que, tendo suscitado noutra, por força de 
um não-exercício prolongado, a confiança de que a posição em causa não 
seria actuada, não pode mais fazê-lo, por imposição da boa-fé. 
 
Ainda, concluem Salomão Viana e Pablo Stolze Gagliano (2012, p. 7): 
Na supressio, malgrado o direito não tenha sido extinto pela decadência e 
nem se possa falar em prescrição, o que há é, metaforicamente, um silêncio 
ensurdecedor, ou seja, um comportamento omissivo tal - no que se refere 
ao exercício de um direito - que um movimento posterior, tendente a 
exercitar aquele direito, soa incompatível com as legítimas expectativas até 
então geradas pelo silêncio. 
 
A surrectio, ao contrário da supressio, representa uma ampliação do 
conteúdo obrigacional. São institutos correlatos em que a atitude de uma das partes 
36 
 
 
 
gera na outra a expectativa de direito ou faculdade não pactuada. (MEZZOMO, 
2006, p. 1). 
 Neste sentido define Menezes Cordeiro (2007, p. 821 apud SANTOS, 2008, 
p. 210): 
No que tange à surrectio, para que a mesma reste configurada exige-se um 
certo lapso de tempo, por excelência variável, durante o qual se actua uma 
situação jurídica em tudo semelhante ao direito subjectivo que vai surgir; 
requer-se uma conjunção objectiva de factores que concitem, em nome do 
Direito, a constituição do novo direito; impõe-se a ausência de previsões 
negativas que impeçam a surrectio. 
 
Judith Martins Costa (2000, p. 460-461) ainda define a exceptio doli na 
relação com a boa-fé: 
A Boa-fé paralisa o direito a invocar a exceptio non adimpleti contractus nas 
hipóteses em que se configura a representação refletida no adágio 
turpitudinem suam allegans non auditur ou equity must come with clean 
hands, como expressa lapidarmente o direito inglês. Estevem amparado na 
chamada teoria dos atos próprios, segundo a qual se entende que ninguém 
é lícito fazer valer um direito em contradição com a sua anterior conduta 
interpretada objetivamente segundo a lei, segundo os bons costumes e a 
boa-fé. O seu efeito primordial é impedir que a parte que tenha violado 
deveres contratuais exija o cumprimento pela outra parte, ou valha-se do 
seu próprio incumprimento para beneficiar-se de disposição contratual ou 
legal. 
 
Quanto aos fundamentos da teoria dos atos próprios exposta acima, José 
Moacyr Nascimento (2011, p. 1) resume didaticamente: 
a função negativa e limitadora da boa-fé objetiva colima, em epítome, 
resguardar a confiança, que por vezes foi sedimentada por atos próprios 
daquele que irá violá-la. É que a própria concepção de incoerência 
conclama dois paradigmas alimentados pelo próprio agente violador: o 
primeiro paradigma advém de atos, gestos, palavras e intenções que o cria; 
após isso, o segundo paradigma em confronto com primeiro fazer surgir a 
incongruência e a desconfiança. 
 
Portanto, de acordo com a teoria dos atos próprios, conclui-se que os 
paradigmas, se isolados no espaço e tempo, não são necessariamente injustos, 
ilícitos, imorais; a contradição só é abusiva se a justaposição dos atos gere a quebra 
da confiança legítima estabelecida. (NASCIMENTO, 2011, p. 1). 
Assim, observa-se as funções da boa-fé objetiva, vendo-se, ainda, no 
próximo capítulo, a possibilidade de sua aplicação no âmbito do processo civil. 
37 
 
 
 
2 – BOA-FÉ OBJETIVA NO PROCESSO CIVIL 
 
Ao analisar as funções da boa-fé objetiva que foram cunhadas pela doutrina 
com base nas cláusulas dispostas no Código Civil de 2002, pode-se perceber que 
elas podem ser adaptadas ao processo civil, tendo em vista que este também regula 
relações entre partes que necessitam de lealdade, confiança mútua e eticidade. 
Essencialmente, o bem-estar dos indivíduos que compõem a sociedade é 
responsabilidade do Estado, e havendo conflitos e desordens entre as pessoas, 
cabe ao Estado por meio do sistema processual eliminar tais conflitos, devolvendo à 
sociedade a paz desejada. Desta forma, ao utilizar o processo mediante o exercício 
da jurisdição o Estado busca atingir seus objetivos sociais, políticos e jurídicos. 
(CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO, 2010, p. 41). 
Atualmente, tendo em vista que o Estado tem como fundamento os direitos 
sociais, um de seus principais objetivos é promover a concretização dos valores 
humanos, seja como pacificadora dos conflitos sociais através de sua função 
jurisdicional ou para advertir os encarregados do sistema, quanto à necessidade de 
fazer do processo um meio efetivo para a realização da Justiça. Portanto, o bem-
comum é a finalidade primordial do Estado contemporâneo, que no caso da 
jurisdição é a pacificação de forma justa. (CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO, 2010, 
p. 31) 
O objetivo principal que o Estado visa obter, através do processo, é a 
pacificação dos conflitos sociais com justiça, como expõe (CINTRA-GRINOVER-
DINAMARCO, 2010, p. 41): 
Seja ao legislar ou ao realizar atos de jurisdição, o Estado exerce o seu 
poder (poder estatal). E, assim como a jurisdição desempenha uma função 
instrumental perante a ordem jurídica substancial (para que esta se 
imponha em casos concretos) – assim também toda a atividade jurídica 
exercida pelo Estado (legislação e jurisdição, consideradas globalmente) 
visa a um objetivo maior, que é a pacificação social. É antes de tudo para 
evitar ou eliminar conflitos entre pessoas, fazendo justiça, que o Estado 
legisla, julga e executa (o escopo social magno do processo e do direito 
como um todo). 
 
38 
 
 
 
Além do mais, a jurisdição tem como escopo tutelar as relações jurídicas 
com base nos princípios constitucionais, sendo o processo instrumento para 
concretizar objetivos políticos e sociais do Estado. 
 
2.1 - Escopos da Jurisdição 
Vale ressaltar, que os escopos são os fins almejados com a utilização da 
jurisdição pelo Estado. O processo, instrumento que é da jurisdição, deve seguir 
fundamentos pré-estabelecidos, com objetivos definidos, para pacificar de modo 
justo e educativo. (VINCENZI, 2003, p. 49). 
Brunela Vincenzi (2003, p. 49), expõe sobre as técnicas que devem ser 
buscadas para o processo ser justo em conformidade com os objetivos da 
Constituição: 
A grande meta do processualista contemporâneo passa a ser a realização 
dos escopos sociais e políticos da jurisdição, utilizando-se de técnicas e 
institutos processuais que permitam o exercício das garantias 
constitucionais pelas partes. Como ensina Dinamarco, para tanto “é preciso, 
além do objetivo puramente jurídico da jurisdição, encarar também as 
tarefas que lhe cabem perante a sociedade e perante o Estado como tal”. 
 
Entretanto, ainda que o processo deva seguir técnicas para sua melhor 
utilização, ele não pode ser um fim em si mesmo, “ele deve ser instrumento capaz 
de tutelar os direitos materiais em vigor e não ir de encontro com os valores da 
sociedade.” (CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO, 2010, p. 42) 
Verifica-se que o processo não é apenas instrumento técnico, mas 
principalmente ético. E significa, também, que é intimamente influenciado por fatores 
históricos, sociólogos e políticos que estão insculpidos na Constituição, de modo 
que, para o melhor entendimento do processo como fenômeno jurídico e de seus 
princípios, o processualista deve utilizar como instrumento a Carta Magna. (CINTRA-
GRINOVER-DINAMARCO, 2010, p. 85). 
Neste sentido, “A própria Constituição incumbe-se de configurar o direito 
processual não mais como mero conjunto de regras acessórias de aplicação do 
direito material, mas, cientificamente, como instrumento público de realização da 
justiça.” (CINTRA-GRINOVER-DINAMARCO, 2010, p. 86) 
39 
 
 
 
Ainda, sob a abordagem dos escopos da jurisdição, a serem efetivados 
através do processo, verifica-se a garantia constitucional do devido processo legal, 
pois, as garantias do acesso à Justiça, do contraditório e da tutela adequada e 
tempestiva traçam os limites para o exercício das posições subjetivas no processo, 
isso, “porque pretender a tutela mais célere e adequada do direito material em crise 
é zelar, também, para a realização dos escopos da jurisdição.” (VINCENZI, 2003, p. 
48). 
Assim, pode-se observar que a Constituição, além das garantias 
processuais, consagrou o direito fundamental a um Estado solidário; mais 
especificamente, em seu artigo 3º, inciso I que diz que “constituem objetivos 
fundamentais da República Federativa do Brasil: construir uma sociedade livre, justa 
e solidária”. (VINCENZI, 2003, p. 49-50). 
De tal modo, que o processo além de garantir todos os princípios do devido 
processo legal para cumprir seus escopos fundamentais, também deve zelar por 
uma sociedade solidária. (VINCENZI, 2003, p. 50). 
Desta forma, Brunela Vincenzi (2003, p. 50) explica o significado de 
solidariedade no âmbito processual: 
Solidariedade, mais do que um ideal político, para o restrito aspecto que ora 
se enfoca, é cooperação, lealdade e respeito – sem importar em 
desigualdades substanciais no procedimento. São, na verdade, normas de 
conduta social que não podem ser alijadas da relação jurídica processual. 
 
Consequentemente, ao considerar as garantias individuais do processo 
contidas na Constituição, há sempre de se levar em consideração a norma contida 
no artigo 3º, inciso I, do qual se extrai a regra máxima da solidariedade entre as 
pessoas, garantida e respeitada pelo Estado. (VINCENZI, 2003, p. 50). 
Deste modo, conclui-se que atualmente o Direito é direcionado para a vida 
da sociedade e para solucionar os problemas sociais. Assim assevera Brunela 
Vincenzi (2003, p. 50) que o processo deve estar ligado com os problemas sociais e 
os direitos materiais: 
Não pode ser considerado instrumento diverso do sistema social; deve 
conectar-se com ele, sentir seus anseios, prevenir e solucionar

Outros materiais