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CONTROLE DA CALEMIA*1 Introdução A concentração sérica de potássio (calemia) nem sempre reflete seu equilíbrio, mas é influenciada por fatores que alteram o balanço interno (como a distribuição do potássio através das membranas celulares entre os compartimentos intra e extracelular), assim como o balanço externo (como a ingesta e excreção de potássio). O ajuste efetivo dos balanços interno e externo em indivíduos normais em resposta à aporte ou perdas excessivas de potássio geralmente mantêm a calemia dentro de valores normais. Contudo, alterações na concentração de potássio podem ocorrer em uma grande variedade de circunstâncias clínicas e tem graves efeitos neuromusculares, principalmente devido a alterações no potencial de membrana. A interpretação correta da concentração sérica de potássio requer conhecimento de ingesta e fontes de perda excessiva possíveis, assim como o estado da função renal e equilíbrio ácido- básico. O elemento químico O potássio é o elemento químico representado pelo símbolo K, com número atômico 19, e massa atômica 39,0983. Foi inicialmente isolado da potassa. O potássio elementar é um metal alcalino maleável prateado-esbranquiçado que oxida rapidamente em contato com o ar e é altamente reativo com a água, gerando calor suficiente para incandescer o hidrogênio circulante. Este elemento ocorre na natureza como um sal iônico, encontrado dissolvido na água marinha, e como parte de diversos minerais. O potássio é um íon necessário para o funcionamento de todas as células vivas, e portanto, presente em todos os tecidos vegetais e animais. * Seminário apresentado pelo aluno FRANCISCO DE OLIVEIRA CONRADO na disciplina BIOQUIMICA DO TECIDO ANIMAL, no Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no primeiro semestre de 2010. Professor responsável pela disciplina: Félix H. D. González. 2 Composição corporal O potássio é o principal cátion intracelular em mamíferos, enquanto que o sódio é o principal cátion extracelular. Normalmente, a concentração de sódio no fluido extracelular (FEC) é de aproximadamente 140 mEq/L, e a concentração de potássio no ECF de 4 mEq/L. Esta relação é inversa no fluido intracelular (FIC), na qual a concentração de sódio é de aproximadamente 10 mEq/L e a de potássio 140 mEq/L. Em estudos experimentais com em cães, valores de referência encontrados para as concentrações de sódio e potássio no músculo esquelético foram 8,4 a 13,7 e 139 a 142 mEq/L, respectivamente. Figura 1. Esquema percentual das concentrações de potássio e sódio no meio intracelular. O conteúdo corporal total de potássio em humanos é de aproximadamente 50 a 55 mEq/kg de peso corporal, e quase todo o potássio é prontamente intercambiável. Em um estúdo com depleção de potássio em cães, o valor de potássio intercambiável encontrado foi de 47,1 mEq/kg de peso corporal. Quase 95% do potássio corporal está localizado no interior das células, sendo sua maior parte (de 60 a 75%) localizada no músculo. O conteúdo de potássio em cães e gatos normais é de aproximadamente 400 mEq/kg. Os 5% restantes do potássio corporal estão localizados no FEC. A distribuição do potássio é associada com a remoção ativa de sódio do interior das células, mantida por uma bomba sódio-potássio dependente de energia (Na+, K+-ATPase) presente nas membranas celulares. 3 Importância no organismo O potássio é um elemento, e um eletrólito, essencial para o crescimento e manutenção corporal. Ele é necessário para a manutenção do equiíbrio hídrico entre as células e os fluídos corporais, e também desempenha papel fundamental na resposta nervosa a estímulos na contração muscular. Além disso, algumas enzimas celulares requerem potássio para que funcionem adequadamente, como a piruvato quinase, que transfere o grupo fosfato do fosfoenolpiruvado para o ATP, na fosforilação durante a glicólise. Como soluto, o potássio intracelular é crucial para a manutenção do volume celular normal. A concentração de potássio intracelular também é importante para o crescimento celular normal, já que é necessário para o funcionamento de enzimas responsáveis pela síntese de proteínas, ácidos nucléicos e glicogênio. Nos ruminantes, participa do sistema de tamponamento ruminal, favorecendo a proliferação de microorganismos ruminais, principalmente bactérias celulolíticas. A manutenção da concentração de potássio extracelular entre limites estreitos é crítica para evitar os efeitos deletérios e possivelmente fatais da hipercalemia na condução cardíaca. Em humanos, a concentração sérica de potássio é inversamente correlacionada com o déficit de potássio corporal total. Do mesmo modo, em cães com depleção de potássio induzida por restrição na dieta, o conteúdo de potássio muscular mostrou forte correlação com a sua concentração sérica. Durante a translocação do potássio entre o FEC e o FIC, contudo, a concentração sérica pode se alterar sem que haja mudança no conteúdo total de potássio corporal. Uma das mais importantes funções do potássio no organismo é seu papel na geração e manutenção do potencial de membrana celular. O potencial de membrana celular em repouso A relação normal entre as concentrações de potássio no FEC e no FIC é mantida por uma Sódio-Potássio-Adenosina-Trifosfatase (Na+, K+-ATPase) presente nas membranas celulares. Esta enzima bombeia íons sódio para fora e íons potássio para dentra da célula em uma proporção 3:2 Na/K, fazendo com que a concentração intracelular de potássios seja muito maior do que a extracelular. Como resultado, íons potássio difundem para fora da célula seguindo seu gradiente de concentração. Contudo, a membrana celular é impermeável para a maior parte dos ânions intracelulares (proteínas e fosfatos orgânicos, por exemplo). Portanto, desenvolve-se carga negativa no interior das células enquanto o potássio é difundido para o exterior, e cargas positivas se acumulam fora da célula. Consequentemente, uma diferença potencial é gerada através da membrana celular. 4 O sódio é o principal cátion extracelular, e ele penetra na célula de forma relativamente lenta seguindo os gradientes de concentração e elétrico, já que a permeabilidade da membrana para o potássio é cem vezes maior do que para o sódio. A difusão de íons potássio continua até que o FEC adquira carga positiva suficiente para impedir o efluxo de potássio. A proporção das concentrações de potássio intra e extracelular é o principal determinante do potencial de membrana celular em repouso. O potencial de ação de membrana O limiar do potencial de membrana celular é atingido quando a permeabilidade pelo sódio se eleva ao ponto em que o influxo de sódio excede a saída de potássio, mantendo um estado de despolarização e desenvolvendo um potencial de ação. A habilidade de células especializadas em desenvolver um potencial de ação é crucial para condução cardíaca normal, contração muscular, e transmissão do impulso nervoso. A excitabilidade de um tecido é determinada pela diferença entre os potenciais em repouso e o limiar de ação (quanto menor a diferença, maior a excitabilidade). Figura 2. Efeitos das variações da concentração de potássio no plasma sobre o potencial de membrana em repouso do músculo esquelétco. A hipercalemia faz com que o potencial de membrana se torne menos negativo, o que diminui a excitabilidade pela inativação dos canais rápidos de Na+. A hipocalemia hiperpolariza o potencial de membrana, reduzindo, assim,