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Virginia Axline - Dibs em Busca de Si Mesmo

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(Eezo íÌoione cD. A"rúiL
TMto'' 
,o\X/w
chcll4l oogvro
Verdadeiro e eeneroso como a própria vida Dibs.mostra
a venmra mnquistada na âvenÈurosa buscâ da grârurdade clo
viver e do enconcar-s€.
É um convire para entender e amar â criança que con-
d";;;àü;;;'.;i; um de nós e senÌir a grandiosidade
a" or"Lúa" no mistério cósmico que nos une às monLa-
ìr',ï. 
""'.i"i. 
i" +**, as árvores aoi passariúos e a rodos
ôs ânimais. às criâncas, sos jovens. aos aduìtos num 48ryán_
;"ïfi;:i;;;;*ì ; "um aproÍLrndamento 
de nossa origi'
nalidade pessoal."-'-l .i*iil".i" relarada neste livro é indüível' impossi-
vcl de suËmeter_se a uma descri(ão, mâs as pessoas que se
oêrmitirâm atinsir a ests ra do humano senrem e compte_
í.-ì. i.,"tt'"''o* ,q"i Íoram escolÀjdos A.ela" portanro'
r alegria de conEecer e aoar esle Dibs e todos os lJÉs clo
hundo.
CÍRCULO DO LIVRO SÂ'
Crira PoÍtt 741 3
Seo Paulo, Brasil
Ediçào júte8Íâl
Tltulo do oriÂirul: Dib3 h sedch ot selÌ
a-nvrilht ô I9o4 bvVj4iúâM Â!rne
' ir;ducào: céliá Soúe, LiúaÉs
La6ut dá c6!r: Yae Tâkedl
Liençá.ditoiial Pám o CÍKulo dÔ-Livlo S A
por cortesi. dá Livrúiá fuú Ed'Ìor'
Verda perEitid. alenâs áos só{io'3 do Cír'ulo
Composto !€la Linorn Ltdd
lopre$o € dcôdemddo €m ohcnâe propru3
$m222321!9
Rio de Jan€iro, julho de r97l'
Célia Soares Linhares
86 88 89 87
Púlogo
Esta é a história de uma criança em busca de si mesma.
atÌavés do proctsso psicoterípico. Foi todã ela vlvida na suâqütenbcdâd€ por uma p€ssoa idênrica â nós _ um menino
chÂmado Urbs. Ënquanto essâ cÌisnça desabrocbâva no es-lorço de enconrrâÍ as íorças da vida. crescia dentro dela urn
novo conceito púprio - a inusirada e ir:cessante descobertade que. d€ntro delâ, existian uma estarura e sabedoía que
se expandiam e se contraÍam semelhanres à" ;i;; d;;srio DÌluenciâdas peÌo soj e pelas nuvens.,
, 
Dibs experjmentou profì,ndamente o complexo ptoces
so de,crescimento_ nâ busca do precioso prese;re d; vida,
ljlid.:. " si próprio pelos raios de sot de sua, esperançase petas chuvÂs de suÂs mágoas. Vagarosamente, e por tenra.
trv.s 
,mtdrifâcetadas, Dibs.descobriu que a segurança de seumundo nAo esrâva cenrralüada no cón rexto ï rcunstancial,ys ql'f 9 nrçleo estabilizadoÍ que ete procurava com rat
ht€nsrdade linha protundas raízes dentro de si mesmo.
Porque Dibs expr€ssa umâ linguagem que desafia a
comprac€ncÍa cle murtos de nós, e porque ansiou e lutou para
conquÌstar sua idenridade trumana dúna de uma mi#o e
Iug.r neste mundo, suâ hhrória romou_se a história de cada
pessoa.à procum de seu autêntico caminho. Atravgs de sua
experiência numa sala de ludoterapia, .. "", IâÌ, .; ;;escola. sua personslidade desenvoÌveu*e e eftiqueceu de
düeÌenÌ€s maneiras a vida daqueles que riveram o privilégio
de côDLêcâlÕ
lxttoìlação
Estâ é a hisúriá do desabrochar de uma personalidade
forte e saudáveÌ, em umâ criança ant€tiormente marcada poÌ
profundos traumatismos.
Quando esta nartativa começa, Dibs vinha freqüentân.
do a escoìa há quase dois anos. Nào íalava de modo algum.
a principio. Álgumas vezes, sentava-se. mudo e imóvel, du-
rante todâ a mâúã ou eÌ€âtinhâva ao redoÌ da sala âbsoÌto
em si mesmo e desligado das outras crianças e da professora.
Outtas vezes, tbha violentos acessos de raiva. Os proÍesso-
Ìes, o psicólogo e o pediatra da escola estavam dolorosamen-
te conÍusos com ele. Seria Dibs um retardado mental? Teria
seu cérebro sofrido alguma Iesão quando de seu nascimento?
Ni.nguém sabia.
O livto oÍetece, inicialnente, uma visão daquilo que a
autoÌa úâma "â busca de si m$mo", e, neste caso, pateti-
camente empreendida por ufn pequ€no ser humâno atormen-
tado. No fioâI, Dibs coÍìsegse emergir como uma pessoâ bri-
lhante e talentosa, um verdadeito lider, como resultado da
tespeitosa e extaordinária habilidade clínica da Dra. Axline.
A âurora iá é ÍarÌrosa em todo o murdo da psicologiâ
pot suas contribuições patâ â teoriâ € prática da ludoterapia
infantil. Seu livro Plrl, /he/apJ: the i/thet drkatuícs ol child"
áool tem merecidamente conqústado o mais âmplo aplauso
e aceitação.
Dibs: en busca de sí nesrzo é um livÌo agradável e Íâs"
cinante pâÌa qualquer leitor. S€rá lido com prazer e especial
ptoveito por todos os pais que estão intetessados nas mara-
vilhâs do desenvolvimento Ínental de seus Íilhos. Também
os estudiosos dâ inÍância e da natureza normaÌ e anormal da
vida rnental nele encontraÌão vívidos ensinamentos.
A ciânça descrita neste üvto era, â princípio, muito
excêntricâ. Entretânto, psicólogos e psiquiatras têm, desde
há muito, recoúecido que aspe.tos novos dos ptocessos tí
picos e normais do desenvolvimenro da saúde menral podem
ier obridos pelo esrudo de dÍerentes e exageradas Íormas
de comporramento que aparecem em indivÍduos atípicos.
Pode ser observado que, hisroricamente, a moderna psicolo-
8iâ muiro deve às análj"e' deLalhadas de casos singuJares.
Neles podem ser incluidos os primeiro" rrabalhos de Freud
e Morton Prince.
Não hí dúvida de que um dos grandes pÍoblemas desta
era t€€nológica, catactenzaáa por gtand€s aglomerados ur-
banos, é a compreensão autêhtica das técnicas que possibili
tam mudanças duráveis na personalidade e no comportamen-
to. Dibs: en basca de si meskto, cot'ío esEtdo d^ orgànlz^ção
mehtâl e da modi{icâção de atitudes, é importante nesse mn-
texto. As pessoas que vierem â leÌ e compreender este livÍo
jâmais poderão acreditar novamente qu€ o crescim€nto psi-
cológico do homem, o sucesso nâ escoÌâ, ou a aquisição de
cornplexas Labilidades possam ser conquistadas pela mera
repetição seneralizâda ou pelo reforço de simples modelos
de Ìeação.
OutÌa idéia enÍatizada neste livro é a de que o trata-
menro verdadeiramente proÍundo e efetivo de uma criança
com distúrbios Lende a'aiudar, de rnaneira real, a saúde
mental de seus pais. É o reverso da informaçào tão diÍun-
dida de que o riatamento ctínico bem-sucedido dos pÂ's Ìe-
presenta,'freqüenremente, a melhor Íorma de rerapia para
umâ cÍiançâ mm problemas emocionais.
Mas âcimâ de tudo, Diás: en basca àe sì mesmo é uma
leitura deliciosa! Tão empolgante paÌa mim como âs histó-
rias de detetive de primeiÌa calegoÌia.
Leonard Carmichael
Vâshington, D.C.
Cra hora do almoço, hora de ir para casa, e as crianças
circulavam com seu barulho habiLual. zigue,âgleando para
zoanlar seus casacos e chapéus. Todas, menos Dibs Ele re-
ftaÍa até o canto da saia, è lá pe.manecia agachado cabeça
baixa, braços dobrados e Íirmemente cruzados sobre o peito'
ianorando'o rnundo à sua volta Os professores aguardavam
È..".." *r comDortâmenlo habirual na hora de ir para
casa. Miss Tane e Hedda aiudavanr as outras crianças quando
se Íazia necessário e, disfarçadamente, observavam Dibs
Uma a urna, as outrâs cdânças iarn deixando a escola,
à medida oue suas mães as chamavaÍn Quando as proÍesso'
ms ficavan a sós coú Dibs, rrocavam rdpidos olhare' entre
si e o olbavam premido conrra a parede
- Sua veit - À4iss Jane 
dizia. e carninhava calrna-
nente oara fora da sala.
-' Varnos, Dibs. tsrá na hora 
de voltar pa.a casa LsLâ
oa hora do almoço - Hedda Íalava corn 
paciência.
Dibs não fazia nenh,:m moúmento. Sua resistência erâ
totâl e úeia de tensão.
- Vou aiudálo a 
vesdr o cãsaco - Hedda dizia âpro-ximando-se dele vasârosamenrc, levandoìhe o agasalho
Ele nem sequer olhava para cima. Comprimia-se contra
a oarede e cobria a cabeça com os braços.- 
- Por favor, Dibs Sua 
mãe logo es(ìrd aqui
Ela chegava sempre atrasada, provavelmente espetando
ou", b,t"bã do chaóéu e do casrio iá ri\esse terminado e
due. então, Dibs pudisse seÂui-la pàciÍ;camelre.' Hedda aproximava+e ;Âis dè Dibs e. inclinando-se. bâ-
tiâ com €ârinho em seu ombro,
- Vamos, Dibs, você sabe 
que é hoÌa de ir - repetiâ
cenrilmente.- 
Como um monsrrinho ele a agredia: e'boÍeteando-a.
áÌránhando-â, tentâído moÍdêla, gritando esúidentemente
Capltalo I
10 11
- Nâo vou para casá. Não vou parr cd5.r. Nâo voupatâ casâ. - Erâ o mesmo clamor rodoì o, dias.
- Eu sei - Hedda insi,ria. -À4.rs vo(è rem oue irpará câsa almoçâr. Vocè quer ser gra-de e Íone, não i ver-
dâde?
Dibs ficara pasivo, de repenre. Abandonava a aritude
de Ìura mn,ru Hedda. Deixava que eìa cotocasse seus braços
dentro das mangas do casaco e o âboroasse.
- Vocé voltará ânìanhã - diziâ-the Hedda.Qu,ndo_ sua màe o ch,mava. Dibs seguia com eta, com
o rosro manchado de ìágrinas e uma expre-*ào de razió nele
estampada.
Quando a batalha era rrai< lonsd e a m:e chesâv, antes
que-esrivesse terminada. o moror;.ia eru enviado"para apa.
nhálo. Era um homem muiro alro e lone. Enrravi. tornava
Dibs nos braço. e carreg sem dirigir um,
palavra ; ninguén. tm derermin,:d:s o.r,io.', O;U"".r.r..
râva-o e grirâva. doÍniìado pela Íüria. Em ourraq, tornava+e
,ubitamenre rilencio,o. inene. derrorado. O homem nunca
tdlâ!r 
"com 
o gàroro. Pareria serlhe ;ndiferenLe se ele ìurava
e vocüeráva ou se permanecja submisso.
Hrvia quase dois anos que Dibr Íreqüenta\a essa es
col, parric!ì,r. Os proÍe*ores haviam tentado por todos os
meios €stâbelecer relações com ele, suscitar-lhe-uma respos-
ta. Mas haviam sido tenrrrivas repeLidas e Írusradas. Ete
patecia decidido a manÌer-se isoìado das pessoa,. Peìo menos
era o que Hedda pensara. Seu proÂÍe(ro na escola era evi
dente. Quando começou a Íreqiienrrila, n:o ÍaÍava nada e
ìamais se arriscâva a sair de sua cadeira Durante roda a ma-
nhã permanecia sentado, mudo, imóvel. Decorridas várias
semanjs. principioJ a levrnrar-se e ensdriúâr âo redoÌ da
sala, pa-ecendo perceber algumas coisa. à 
"ua 
votLâ. euando
alguém se aproximava. Dibs ptecipiLava+e como uma bota
no chão e não mÁ se movia. Nunca olhava direramenr€ bârá
os ollos de uma pessoa. Jamais re,pondia quando aìguéni lhe
Sua assiduidade era peúeira. Todos os dias sua mâe orr7ìi pará a escoìJ de cano. Ou eta mesma o conduzia, aus
tem e siJencioso. ou o mororista carregava.o. colocando-o jun-
ro à porLa. denlo da e.coÌa. O merino jâmais sÍirâva ou
chorava no caminho prra o colégio. Deixado bem na entra.
dâ. Dibs 
"ìi 
permaìecij chorami-gando e esperando aré que
rlsuém viesse e.o ìevasse para a sâÌa de Âutt. euando usiva
agasâLho. nao esboçavá nenhum movimenro para riráJo. Uma
Í2
das professoras curnprimentavâ-o, tirava,lhe o casaco e dei-
xaÌâ-o pronto pata Íazer o que desejasse. Logo as ourras
cdanças ocupâv.ah-se diligentemente com atividãdes em gru-
pos ou com nabalhos individuais. Dibs pa(sjva o lempo en-
garinhando ao 'edor dâ sata. escondendo*e sob a, meias ou
ârrás do piano. oìhâFdo livÌos duranLe hora,.
__. Havia alguma coisa em relâção âo cornpoÌtamenro de
Dibs que impedia. os proÍessores de classifúá,lo, sesuÌâ e
rotineirarnente, e deixálo seguL seu caminLo. Suas aiirudes
erâm rão parâdoxrir: Às vezes. apresenrava indícios de re.
lardâmenro mental em grau exrremo. Ourrrr vezes reali/dva
certas arjvidades mm ranta rapidez e rrrnqüilidâde. que e\;
denciava possuir. de Íato. um ntvet de ;nrËtigencia sìrper:or.
se desconÍiava que o esLavam oìhando, jínedlaramen,; ,eco_
lhia+e à <ua concha. Duranre ? maior Dale d
Linhava em rola da .alà e"preirando por bâL\" d, ;*,, 6,-
lan(âqdo-se para a trenre e para rrás. masr;gando um Iado
da mão, chuoando o polegar è deiLando-"e de"bruços. rígido.
no chao. quando qualquei profesora ou cotega ,.nr,", ì-e-
Io paÌticipar de;lguma arividade. Era ele uma criança soìi
tdria. num murdo que cerÌamenLe lhe parecia Í'io e ho.ril.
_ \ão raras vezes. era âcomerido pãr acexos de raiva,
na horÀ de ir paÌa câsâ. ou quando rentavam obriga-lo a Íâ-
zerulso que ele nào queria. Õ, professore. ri-hanidecidido,
havia bxranre rernpo. que sempie o convidariam para parri-
crpar.do grupo. ma. iamais renuridìì irrporlhe quaìquer
aLi\ idade. â nào ser que rosse absoluLâm€Die necess;rio.'
" OÍereciam-lhe üvros. brinquedos. quebra.cabeças; en-Íim. rodo tipo de material que lhe pude*e inreressar. Dibx
nunca lecebid riada direLamenre de alguém. Se o objero rosse
colocado na mesa ou no chão perro ãele, apanhava-o depois
de cerro Ìempo e o eraminava cuidado.amenre. Nunca ãei
xava de aceitar um livro. Olhava atentamente as páginas es-
ditâs "como se pudesse let", como Hedda Íreqüìúemente
dizia.
- - Em nuiÌas ocasiões, umd proÍessora sentavâ-se perro
dele e lia uma esrória ou Íala,r.lhe sobre aìguma coisã, en-
quanÌo Dibs deirava a cabeça no chão, ser-s< mover, mas
jamais olhava para cima ou demonstrava um inreresse evi
dente. Miss Jene ocupara*e dele da seguinre maneira: erpli
cava-lhe muitas misas. enquanro segurava os objero, na mão,
demonsrrando o que exp;ha. À. vezes, o as,unto era imá.
e o pÌincípio d^ âção íÍ]€,gnétic ; outtas, uma pedra inte-
rcssante. Ela conversava sobre qualquer assunto qìe julgasse
1J
capaz de despertar-lhe o inreresse: confessava em vdrias opor_
runidader que se sentia coÍno umâ rola, como se esliv;sse
falando sozinha: entretânro. pequenos deralhes, como â ari_
rude atenra do menino, davamJhe â nítida inDressao de ouê
eÌe esrava ouvindo. Álém disso. pergunrava+e Íreqüentemàn-
Ìe o que era teriâ a Derder.
Os proÍessores istavam inreiÌamente Írustrados e,n re-
lrção a n]bs. Á psicóloga da escola o havia observado e ren.
tado lesta-lo lirras vezes. mas ele não esrava pronro parâ ser
tesudo. O pediatra da escola, depois de exam;nâJo àirer,as
vezes. desisriu desanimado. Dibs predispós-se conrra o më-
dico de ialeco b!Ânco e não o deixavâ aproximar-se. Recuavâ
ate trcâÌ com âs cosrÂs conrra a parede e colocava as mãos
prra_cimâ 'pronLas para arranhar", pronras para lurar se
ârguem t€ntâsse aproxjmrr-se.
^ - 
F]e é. um ripo esLranho - dìsse o pedjaLra. _
Quem pode sÂber? ReLardado menral? psicólico? Lesão ce-
rebral? Quem pode se aproximar o suficienr€ para descobrir
as causas de sua esÌrânha condutá?
. Aquela nào era uma escoJa para retardados menrais ou
problemas emocionais. Na realidade, era uma
escolâ parriorláÌ. desrinâda exclusivamente a crJanças de rrès
a sete snos de.idade. in*alada numa antJga e beÍa mansâo,
na parle mais luxuosa do lado lesrc de Nova york. Tinha
um, úadiçâo que atÍâíâ os pâh de cÌianças especiâlmenre in.
rerrgenÌe9 e socLávels,
Para marriculdlo, a mãe de Dibs persuÂdiu a diÍerora
e usou sua influència arravés do consúo de diretores. Sua
úa contribuía generosamente prra a mânurenção da escola.
Em.razão des-sas pressões. Dibs Íoi admitido'no grupo de
Os proÍessores haviam sugerido reperidas vezes que
Dibs necessirava de ajuda profiisional. À 
'""p*1, du Ja.efa sempr€ â mesrnâl
- Dêemlhe mais temoolQuase dois anos havi# demrrido e, embora Dibs rives.
se apresenrado algum progresso, os proÍessores senriam que
aquilo não erâ suÍicienre. Parecialheì iniusro d€ixar â siruâ.
ção prolongÂr-se poÍ mais t€mpo. Podiam âDenas esoerâr oue
ele saísse de sua concha. Quúdo discuriam sobre o garóro
- e não havia dia em que não o Íizessem -, rerminavâmsempre senriDdo-se perplexos e desaÍiados pela criança. Áfi
nal de contas, Dibs tinlra somente cjnco anos de idaie. po.
derìa ele, no verdade, esrar conscienre do mur:do que o cir-
14
cundava e manter rudo lrancado denúo de si? prreciâ leÌ
os,r,vros que examinâva. Isso. diziam de si para si, era ridi.
culo. Como poderia uma criança ler se nào sábia exoresar_*
verbrtmenre? Poderia tal criança, tão mmplexa, ier consi-
derada ÌeraÌdada mental? Seu componamenìo nào conÍirma-
vã tal hrpóÌese.seÌi ele um ÂulisÌâ? Eskria em conraro
mm a realidade? Muito ÍreqüentemeDre páreciâ que seu mun-
do era uma_ârro7 reatÍdade. um rormento de inÍelicidades.
,-, ,,.p1,4. Dibs era.um renomado cienr;stÀ _ britÊanre,roctos drziam -. mas ninguém na esmìâ jamâis o vira. Dibsrrnna uma rÌmã mars novâ. Suâ mãe düia que Dororhy era"nuiLo inteìigenLe' e uma .criança p..f.i,;;.. Èh;;; Ë
quenrava a melma escoÌa. Cerra vez, Hedds encontroìr.a em
compan]Ìra da mãe no Central Park. Dibs não esLava con
etâs. Hedda decÌaÌou aos profes<ores que. em sua opiniáo,
â -perÍeita Doroúy nào passava de ,iín, .pifiutt, *;Ínu-oa Ëskva srmpaflcamenre inreressada em Dibs e admida
ser tendenciosa sua avaìiaçao sobre Dororhy. Sua fé ern Dibi
lrbertaria de sua pÌjsão demedo e ó.li;
. A equipe de proÍessores decidiu. Íiralmente, tornar uma
ãútude em Ìelrção a Dibs. AÍguns pais i, (umeçavam a Ìe.
:limar dg sua presença na escota _ sobrerudo depois queere árfanhou umâ crianca,
Foi nessa altura doi acontecimenros que me convidaram
paÍa pârtropar.de umÂ_ Ìeudão dedicada aos problemas de.
r.)jbs. como psicóloga clínica. ten_ho_me especiaiizado no rra_
oatno com cÌÍanç$ e seus pais. A primeira vez que ouvi Íalar
sobre Dibs -foi nessâ reunião, e o que aqui escrevi me íoiÌelatado pelos prcÍessores, psicólogo e pediatra da escola.
Peclrram-me que observasse o garolo e â mãe. e enLão emi-
rrsse uma opinião para a equipe docenrc e adminislrrtiva do
colé8ro. anre.s que decjdissem dispensáJo e regisrráJo como
um de seus l.acassos_
. O encontro foi na escola. Ouvi com inrcresse todas as
obs€Ìvações. Hquei,iiìpressionadâ com o impâclo que a per_
lonandacte.de ltibs haviâ causado naquelas pessoas. SenLiãm-
s€ ÌÌustÌadas e desatìrdas conrinìrâmente pelo seu compor_
lÂiTil,o e:ï'j'h:. Sua Íirmeza rirnirava+e i uma antagónicac nost reJe(âo às tr€ssoas que poderiam aproximar_se muito
dcle, sua evidente. ìnfelicidade preocupavì aquelas pessoas
3cnsrve,s, que seníâm sua rÌiste deDÌessão
,- Tive um encontro com sua mãe na semsnâ passadâ
- disse-m€ M;ss Jane. - Comuniqueilfie qo., moito p--
15
vd\erlmen,e. devercmo\ de,risj to d, e,coìd. porque ienriÌoster ierto o que podíânoç pam aiLdd-to. nra"
mãyimo estorço -ão bâsÍ,. Eìa ficou mui,o trusrrada. t\4ds eìa
e urra pesso, muì,o díÍicit de de,cre,er. .oncordo, c n dei-xÀr-ro( chânar uÌa pricotoga cÌrnic,r e renrar. rai( uÌìâ ver,avilia-ro. rdle:lb€ sobre voc;. Ao,ies.e, em
.a.om \ocè,obre Dibs. e deira. que o ob.ene aoui Deooi<
l,:ill r* * não,prdé$emo, mânrè.ro cono,co: the "us;.escola rom i-rernaro p,ra.,ir.cas 
""_ná-ná,\. u,Íe qìre eÌr e o ÍÌarido jj aceiraram o íaro de que
.Dr9. è um Íerdrd,rdo menrat ou provavetme-r. ,.rn ,tgu;_,
lesão cerebral.
Talob.ervarão .uvirou uma exptos;o em Hedda.
- , ,- I l.r preiere acredira- que eìe e ur rera-d;do n en-
'4,. oo que admrrir que râtve7 ete scja erocionalrnenre oerrurbrdo e qÌre ratvez <eia eta a respon,jveÌ _ e*clan.,l
. - rrârece que rào sonoç rapJ/es de çer basLante ôhiê
t'vos em relâção a Dibs. pen,o q," ricr-o..om 
"le 
p., Íâ;iotempo e",tremo, muiro pelo pouco orogre..o qu" eÌ" cor.segl'ru. r\ao poderDmos e^puì.j-lo. pol Iá Íora n;o harerianaor qu€ o detendessem. Não renos sido capazec de discurìrsobre urbs sem tic€r.Ìror enlolvidos en nos,a. prrjprias rca-(oes_ emocronars reÌacionadas a ele e às atirude. àe seus ozis..c nao estrmos mes_mo _cenos de que nosso julga,Denro sàbreseus pals seJâ 
'usrjticado., ,- Esr-o_u co,ìvencidâ de que ele esrá pre<res a desa.bÌochar - H.-dda prognorticou. _ \ão acredito que poxa
segurâI suâs deÍesas pot mais temoo.
Havia. obr iamenre. alguma cáisa ressa criança que ca-trvâvâ.os inJeresses e sentimenros a. t"a*. p"aà ,Érii, 
"conpriyâo daquehs.que rubaÌhavam na *-ì; ;;; ;;r;';r:,uro. ruoe senrÍr o mDácro de sua peroonaìidade. pude sin.uÌ e compreender a consciência opre.sna de nossas limira-(oe( pir, enrndermos. em rermos claros e precisos, o. in-ríncados ÍnrÍèrios de uma personalidade. pude âdrriraÌ o
respeÍto por esse rnenino. que lran(parecia nâ reuniiio.
, , EsLava decidida que verià Dibs em uma sérje de sessòeq
oe rudoterâpra - se seus pai. mncordassem. Não rinh,nos
nenhuÌnâ manerra de saber o que poderia ser ainda acres.
centado á hrsrolra de l)'hr
, rncontÌâva-me diâ e do derconhecido, onde uma luz
baìra escondia as linhas da reatidade e a
vern de,ncerre/as.obre o amanhá. Nada se podja afirrar.nem negar. Sem o, hmpeio" da e"idË.ci, i;eq,í,o;;l J;-
rronLJva-me com o mhrérío daouete ,er. nur"ra aLirucle de
resoeiro. e de humjrdade. Sabja ô. " ,. ,..,;; à";;;;,'".ì;propor(,onrm , m e,pJço crescenre para iutgamenà. ;rcoe-
rentc., e acu,rções.renderc;ov,. exprc*as ao sabor da* emo_
coe, Ne.s,i armo.t.-r..quatoucr corclusjo de.iniriva rraz en\(u, Doro,r.arnbrgujdJde t- aj que o. bencÍicios da dúrida
podem,obris€, nos.a retìerir methor .obre o, ubjerivos e li-Írlleç dâ aváJiacão.lumána. O e" cirame-ro ou â anpìjâção
r-rerjor do ser huráno .áo pode ser medjdopo' ourr/ pessoa. O proresso do desenvotvinenro pessoat srj
se tor-a compreersível j luz da experiência or<ipria do pro-
cumlse e enconÌriÌìe. onde. eFrão. de diÍeren,è, m.,ne;,s,
ê senrÍdr â po,içào arial da aurocorsciencia. { païir de,;;
rrase. esponrancdmenre. aí€iÌa-.e qLe cada penonatidade Le-nha seu 
.mundo, muìro .parLicurar de signiÍicacOes. geradona rntes dade de sua hisLória. mesÍno náo se dispoúo de
eremenros prra e\plicdr â, razòe, de ,er de c,rdJ u;.
, .lJenrro de mín. rrazia, da reuniào, um serrimenLode lesperro e de an(jedjde de enconrrar Dibs. Hj\ ja 
"idocon-tsgudr por uma imp_a.ièncíâ coníjanLe e por Ìrnj s i*
râção de procuràr aiudá 1o em sua busca. Não abandoraria
mos âs esperânças. TentaÌíamos umâ vez mâis. Destïánca_
lí,rlos as,qorras de no,,a. resposras aré aqui inadequadasâ seus problemas. Desconhecemos a, .e.eiraJpro-ta., 
"tabo-Ìadas pám dr5solwr os btoquejos nenra;.. Cremos que mri
ras de nossas iÍnpressões sâo fr.'gen. Compreendemo; o \alor
da obierivid,de dâ caìma do esiudo orde1ado. s;Á;jr];,;;;
a pesguisa.ë uma Ías.inan,e coÌb:nado de inruiç:o. €sDe-
curaçao, subtehvidade. imaginaçâo. e.peranças e sonhos mes
Capitalo II
t6
\7
clados com dados coletados objetivamenle e submetidos à
realidade da ciênciâ matemática. Um elemento isolado não
basta. O conhecinento da complexa causaÌidade aiuda-nos a
construir a ìonga estrada que no< conduz à verdade
Decidi què me nanreria dispon'vel para arender Dibs
Iria à escola observá'lo no gtupo dos oüttos meninos E ten-
taria vè-lo 'ozinho por algum rempo Depoi'. mnrersaria
com sua nãe, e caso tivéss€mos sua aquiescêncía, narcaría-
mos os dias pâÌâ âs entrevistâs na sala de ludotetapia do
Centro de Oiientaçao Infântil. Lá, teÍíamos novos ângulos
para lidar com sua probÌenática.
Buscivamos uma soluçào para Dibs e .abíanos que essa
exoetiência adicional seriâ âpenas um pequ€no vislumbre na
viáa íntima dessa ctiânça. Ignorávâmos o que isso podeda
sieniÍicar pàra ele. Procrrariamos apanhar o fjo da meada
que poderia de'embaraçar o carreteì de sua hisL<iria pessoal
para auxiÌiar nossa compreensão
Enquanro desciâ â tdsr River Drive, pensâva nas vd-
ria. crianças que ha'ia conhecido - algumas inÍelizes eÍtusradas na tentâtiva de âuto_Ìealizâção, outras mais te_
nazes que, ape\âr dos mesmos obsrriculos parr desabtochar
*r. p*-r, conrinuavam a ìuta com redobrada coragem
Expre*ando seus senlimentos, pensaÍnenros. sonLos e espe_
ranças, novos horizontes abriram*e pa'a cada um de*es
pequeninos. Álguns superavam seus pavores e ansiedades lu-
ìanão conua oìundo, que por muitâs razões lhes era insu-
portável. Ourros haviam emergido com renovada {otça e
iapacidade para enhenLar seu anbienre muito ma;s con5tru-
tivâmente. Outros, ainda, forarn incapazes de resistit ao im- .
oacto de seu ultraianre desrino. E nào há expli.açào simples
Da-a rão drâmdLicos desenconrros Afirmar que a crian(a toi
ieieirada ou não-aceira nâda sianif'c, em termos de enten-
dimento de seu mundo interior. \4uito freqüenLe
terrnos valem apenas como convenientes rótulos que funcio- ;
nam corno álibiì para desculpar nossa ignorância Devemos I
conar clichè', inrerpreraçõei rápida. e explica(óe( Se, de
{aro. queremos aprõxi.a'-o. ãa verdade. devemos olhrr L
.,"r".i"-"'t" a. mzòes de no55o comoortamento.
lrei à escol.r amanhà bem cedo, decidi Teteíonârei Para
a mãe de Dibs e mãrcaÌei um encontro com ela em sua
casa o mais cedo possível. Na próxima quintr ÍeiÍa iá come-
carei as sessòer dè ludoreropia com Dibs. Ê onde rudo hso
irá terminat? E se ele não mnseguir quebrar as paredes que
tão tigidâmente consruiu ao redor de si 1nesmo? Estâ, sem
18
I
dúvida, seria uma possibilidade. Mâs não erâ a dominante.
Animava-me a certeza de que daria àquele garoto meu apoio
para que empreendesse a aventura de decifrar+e. Cada ser
humano tem seu próprio carninho. Eo que pode representar
gtande aiuda para uma criança poderá ter baixa ou nenhuma
Íuncionalidade corn outra. Mas hão d€sistimos {âcilmente.
Nunca classificamos "sem esperançaí', sem
tentar umâ vez rnais. Alguns julgam ser desonesto man-
teÍ â espeÍânçâ quando não há evidências que a estimulem.
Ma5 não espemmos um miìagre. tsraros buscando com-
preensão, acrediLando que o verdadeiro enLendimenro nos
conduzirá ao portão dos camiúos mais efetivos para esti-
mularmos a pe'soa a desenvolver-se e :rilizar <uas capaci-
dades mais positivamente. Prepâramo-nos sempre pâra p€r-
sistir nâ investigação das causas, lutando para ilumirar a
fantástica selva de nossa ignorância.
Nâ mânhã seguinte, cheguei à escola antes dos alunos.
As saìas ocupadas pelas tutmas do maternal e iardim da in-
fância eram claras e alegres, com equipamento apropriado e
- Ás cdanças chegarão daqui a pouco - disse MissJane. - Estou muito intere.sada em sâber sLà opiniâo ,obre Dibs. Espero que posa ajudri-lo. A preocupação que
csse garoto me inspita assemelha+e a uma angústia de mor-
tê. Você sabe, quândo â criançâ é realmente retaÌdadâ men-
trl, há uma consciência global em seu cornpoúamento que
rc evidencia em seus interesses e âções. Mâs, e Dibs? Nuncâ
aabemos em que esrado de ânimo ele se encontÌâ, emborâ
c.têjâmos c€rtos de que não esboçará nenhum sorriso. Ja'
mris algurn de nós o viu soÌÌindo. Jamais alguém percebeu
um at de Íelicidade, ainda que remota, a ilurninarlhe o ros'
È0. Isso nos levâ â crer que seu ptoblema vai além de um
Ètsrdamehto m€Dtali envolve a esfera aÍetiva. Veja, estão
chcgando algurnas Giânçâs âgoÌâ,
Em poucos minutos o colégio estava repleto de cian-
ç.s. Quase todas expressavam no rosto a feliz expectativa
rntc o novo dia escolar que iniciâvâm. Depois dâ enüada,
lhavem os chapeus e agasalhos, dependurando'os cada urn em
rcu própÌio cabide. PareciaÍn descontrâídos e cercados de
coníofto naquele ambiente. Cumprimentavam se enrre si e
ror proÍessores. com espontaneidade. Alguns se aproxima-
laln de mim Fara conversar. Perguniâram nìeu nome e poÌ
quc astavâ em suâ escolâ.
À pÌimeirâ atividade das cíanças Íoi baseada na livre
19
esco.lha _cda .uma buscava os brinquedos que nâis a
âLÌalam, urvertÍrm-se e conversavam iunros com muiLa na-
turalidade.
.Foi enrâo que Dibs chegou. Sua mâe levou-o aré den-
tro d! clásse. Num relance. percebi-a falardo apressadamen-
te com Mrss Jane para. em segr.rida. despedir*e. Inene, Dibs
a1i permâneceu. Usava casaco e gorro de ìà cinzâ. Mi.s lane
pergunrou-lhe se gostaria de rirar o agasalho. Nada "res
Era um garorc bem crescido para sua idade. Sua Íace
esrava muiro._odlida. Tinha os cabetos negros e cacheados.
òeus braços ttacidos pareciam pendurados em seu ombro.
Miss Jane r írou-Ìhe o sobrerudo e o boné. Dibs parecia não
querer colaborár. Foi ,inda a professora q*rn g,ir.a., *",
aperrecnos no armárro,
- Bem. eis Dibs - disse t\4iss Jane nÌrmquaDto se aproximâva de mim. _ Como ele nunca tira o
casâco e o gorro por si mesmo. rós o Íâzemos. jâ rorineira_
menre. ternos tenlado repeÌidas vezes e-tro<íJo com as ou.
tras,criân(as__em algurna atividade; ou sugerimoçlhe uma
rarera espedrrca pára que a e)Lecure. Mas Dibs rejeiLâ rodas
âs iossâl of.eng. Esta 'nanhâ. quando o dei\armos sozinho,vocè poderá observar sua condura. Taìvez manrenha.se ali
po1 muiro e muito Ìempo. Taì"e, movimente+e de uma es-
colha para ourra. Tüdo depende de como esÌeiâ.e senrindo.
Na verdade. com cerrâ lreqüêncij. eìe parece saìtar de un
Irnnquedo parâ ourro, como se n:o tivesse nenhuma capaci_
dacle cte- concentrar a âtenção. Mas, em outras ocasÌõeo.
uxâ.se duranre longo p€ríodo numa atividade oue lhe iõ_
,,Miss.Jane voltou-se para atender ourras crianças. Como olhar discrero observava Dibs. Tenrava d;sÍarçai o Íoro
, Dib" mn_rinuara em pé. Lenra e cautelosamenre r irou-
se oe,rrente., Levântou oq brâços num gesto de de,espero e
logo depoÍs cteixou-os cájr novamenre. Virou-se. e Íicou numa
posíção que âlaÌsâvâ o ângulo de sua visão. p;deria veÌ-;;
se prestâsse atençào. Suspirou. mordeu o" Iábios e conLiruou
. .Um dos garorinhor da ÌLrrmd correu oara ele, convi-
drndo-o
- Ei, Dibs! Venha brincaÌ!Dibs lançou-se sobre o garoto. E ele o teria esmurrado,
20
se não Íosse a lapidez do menino Ìecuando pâra üás, de
imediato.
- Gato, gato, gato - gÌitou o 
pequeno.
Miss Jâne âcoireu, sugeÌindo ao menino que Íosse brin-
car no outro lado da classe.
Movimentando*e em direção à patede, Dibs aproxi-
mou-se de uma mesinha, sobre a qual estavam pedrâs, con-
chas, pedaços de câÌvão e outÍos mineÌâis. Parou €, muito
devagar. apaúou primeiro urn obieto, depois ouLro. Cor
reu os dedinhos em voha deleg. roçou.os em seu queixo,
cheirou-os e finalrnente provou'os com a línguâ. Então, reco.
locou-os em seus lugares clidadosâmente. Num relancear de
olhos captou minhâ pteseíça e com a velocidade de um re-
lârnpago desviou â diÌeção do olhat. Abaixou-se recurvado
sob a nesa; ali sentou-s€ numâ tentativa de esconder-se.
Às outras cianças trouxeram suas cadeitiúas pam for-
mat um círculo em volta de ufna dâS pro{essoras. Eta a hora
em que cada um mostrâvâ âos outros o qìre tÌouxera pârâ
a escola e nârrâva algumas coisas irnportant€s Farâ el€s. A
pro{essoÌa complementavâ á conveÌsâ com umâ estóÌia. Can-
tavam algumas canções.
Dibs não estâvâ muito afastado. Continuava quieto em
seu esconderijo. De sua localização estratégica, poderia ouvir
tudo o que falavam e ver o que mostÌavârn, desde que lhe
interessasse. Teria ele ptevisto essa atividade do grupo quan'
do se acocotou debaixo da mesa? Era dilícil de dizer. Ele
permaneceu ali ate que o círculo se dissoheu e seus paai-
cipantes Íoram se dedicat a outras atividad€s. Erìtão, busóu
um outro entÌetenimento,
Engatinhou em volta da sala, conservaÀdo-se próximo
à parede. De quando ern quando, pârâvâ para exâminâÌ di'
versâs coisas que encontfava.
Chegando próximo ao peitoril de uma janela, onde es-
tavam um aquário e urn viveiro, Dibs ergueu+e Íixando neles
o olhâr perscrutádor. EÍ'L:o, esricou a ÍÍlào/inha e procurou
tocar um dos bichinhos. O contaro eÌa leve e rripido. Ele
ficou ú pot meia hora, parecendo absorvido nessa obser-
vação.
'Sua trajetóriâ em voltâ da sala era interrompida a todo
instante pelo exane de un objeto, que, no entanto, não lhe
câtivâva o interesse por muito tempo, sendo logo substituído
' tnfim. quando chegou ao recánto dos li!ros, D;bs pâs-
sou a mão sobr€ cada urn dos que estâvam sobre a mesa,
2t
escolheu um, apânhou ulna câdeirâ, e arrastando-a cruzou â
sâla em dir€ção â um canro, sentou-se nelâ, de frente para
r patede. Abriu o livro nas páeinas iriciais e caìramènre
examirou cada folha, virando-as cuidadosamenre. Esraria ele
Iendo? Esraria pelo menos compreendendo as iìusrraçóes)
Uma das professoras aproximou-se dele.
- Ah! sim - comentou. - Você está olhando o livrodos pássaros. Que tal se conversássemos sobre eles? - per-guntoulbe suâve e câÌinhosamenre.
Artemessando corn vioìênciâ para longe o livro, Dibs
respondeu com seu eloqüenre silèncio. E aLirou-se ao châo,
ígido como um cadáveì. para baixo, imovel.
- Desculpe-me - Íalou a proÍessora. \ão queriâabonecèlo, Dibs. - Ela apanhou o livro, colocando.o de
novo sobre a mesa, caminhando em minha direção.
- Isso é ÌotineiÌo - €xplicou,rne. - Já apÌendemosa não perruÌbdJo. Mas eu queria que vocè vi$e.
Dibs, ainda ígido, virou a cabeça â fim de poder veÌ
a professora. Fingíamos nâo o estar observando. Finalmen-
te, levantou+e e. de novo. caminhou vagarosamenLe em
voÌta da dasse. tm sua passâgem, ia peeando rÌa\cos de rin-
ra. lápis de cores. porcòes de argiia, prego.. marrelo, diÍe-
rentes pedaços de madeira. rambor, címbalo<. Um axjs o
outro. Escolhia-os e os âbandonava, de imediato. As ó:Lras
criarças. envolvida' em suas LareÍas, pareciam ignorar sua
pÌesença. Dibs evitara qualquer conraro Íisico iom eìa, e
elas o deiravarn em paz.
Chegou a hora de brincar ao ar livre.
.- Nunca sabemos se ele irá ou não. Também nisso. é
realmente imprevisível - disse-me uma das proÍe.soras. hora dorecreio Íoi, então, anunciada. E Dibs Íoi
consultado se gostaÌia ou não de iÌ.
- Não vou - disse rum tom seco e pesado.Eu disse que achava que ia sair, pois esravâ lindo o
dia. Vesti meu casaco-
- Dibs vai 
* disse ele de reoente.
A professora vestiu-lhe o âsÁalho. Com o caminhar
tôpego e vacilânte, dirigiu+e ao pário de rccÌeação. Suâ
coordenação de movimentos era deÍiciente e Ìeveladorã de
que Dibs estava amarrado, Íísica e emocionalm€nte.
Âs crianças brincavam na caixa de arcia e nos balan-
ços, nâs baÌtas de ginástica e nas bicicletas, de bola, luta,
esconde-esconde. Como corriam, deslizavâm, tÌepavam e pu-
Iavam! Mâs Dibs, não. Saiu para um cânto afastado, apã-
22
nhou um pequeno bastão, agachou-se e começou â arÌanhâr
pa_ra a írenre e para nár o chào coberto de derriÍos. para
a lrente e p?râ Ì-rás. PaÌa Lrds e pâra a frenre. Iraçardo vin_
cos nâ suie'ra. Sem olhar para qualquer pessoa. Olhos no
baíão e Íixos no châo. Curvado em sua ividade solirária.
Silencioso. Recolhido. Dstante.
, Decidimos que. quando as criancas votrassem para a
cJasse e Liressem seu período de repouso, levaria Dibs oara
a sala d€ brinquedos, no final do corredor. Se ele,e'djs.
pusesse a i. comigo.
Quando a_professora Ìocou o sino. todas as crianças
entraram-. Aré Dibs. Miss Jane âiudou-o a rirâr o casa;o.
tre deu.the o gorro. dessá vez. A professoro mlomu uma
música suâlc e rebxante na radioìâ. Cadâ criança apanhou
<,Fu cohhàgzinho. órju-o sobre o piso para o;e.í;do de
descanso. Dibs também pegou o siu e ãe"enroìãu-o, coto-
gndo-o sob I mesa da biblioteca, tonge das ourras crianças.
uerÌou-se debru(âdo e com o polegar na boca, descansando
O que esuria ete pensando sobre seu soti-
táno pequeno mundol Quais seriam seus sentirnenro5? por
que ele se comporLava dessa maneira? eue aconreceu a essa
criança paÌa crusar râì espécie de atânamenro das pessoas?
Iroderíâmos capÌar seu mjsrério?
Depois de âlgurls minutos de repouso, a criançada le_
vanrou-se e. guardou .eu pequeno acolihoado.
Djbs enrolou o seu.e Ìecolocou-o no lugar correro. na pra-
teleira. As crhn(as foram divididas em g.upos Ínenores. úm
deles rrabrlhaÌia com mâdeira. O ourro pinraria ou brincaria
com argila.
Dibs permaneceu junto à porta. Atravessei a sata e per-
guntei-lhe se goíaria de viÌ iomigo para uma satinha de
brinquedos. ExpÌiquei.lhe que Íicata em seu colégio, no Íim
do Dail Esrendiìl-e miúa mão. EIe hesiLou púr um momen-
to. e, depois, sesurou.a, sem dizer uma paìavra. Juntos ca-
mrnnarnos. uurÀnLe o percurso. escuravâ-o murmurando pa_
levrâs que nao consegui enrender. Nào the pergunrei o {uenavla drto, cstav, cunosa para conhecer sua reâcâo, Esrav,
3urpresa pelo Íato de ele ter aceiro o convite de uma pessoa
csttanhâ_e com elâ rer saído de sua sala sem olh", p".ã t.ar.
Scnti o forte ãpeÌro enquanto ele seeurava Ìninhaìão. Es-
trva tenso, emborâ quisesse ir.
No {inal do }ali, sob a e<cada de rrjs. havia uma pe-
quena sala de.ignada como sah de tudorerapia. Era um arn-
blcnr€ sóbrio. sem grandes ârrarivos. um pouco moróron,
23
pela sLâ íaìrd de cores e decoração. Peìa janela estreiLa, al-
guns raios de soì penerravam, mâ! o rêcinÌo airda Íicavr
escuro, âté mesmo quando as luzes estavam acesas. As pate-
des eram de um mârrcm esquálido, cor de couro escuro,
com difeÌentes manchas, já lavadas aqui e ali. Âlgumas rnar-
cas tinËarn rambém nódoas de rinta, q:e se uniam à nística
superfície dos remendos de ges'o. O piso. recoberro por um
Ìinrjleo casranho. apresenrava-se Ìiscâdo pela recenre pas5À-
gem de esiregões. Pairava no ar urn cheiio de barto úinido,
de areia molhada e de LinLa. velhas de aquarela. Os brin-
quedos eoconrrârâm.se ra mesa, e,palhados no piso e em
algunas prare)eiras que circundavam â srìâ. No;hão havij
uma casa de bonecas. Os compârtimentos eram modesta-
mente mobiliados com peças Íorres e simpìe,. Uma Íamilia
de bonequinhos em Í.enr" I casa. I'odos aÌi
amontoados: mãe, pai, filhos e filhas e também um bebê.
PÌ6ximo, âindâ estâva ufna caixa âberra cont€ndo outras mi-
nìaturas de bonecas e aìgun, animaizinhos de borracha, como
um.avalo, um ìe)o, um cachorro, um qJro, um eleía-re e
um coelho. Havia catrinhos e aviões. Caixas de blocm ltra
armâÌ e conrrÌujr. No srande depdsiro de areia. rá'iâs pa-
nelas, colheres e pratos estavâm espalhados; sobre a meìa,
encontrava-se uma jarra de argila e aleumas tintas. No cava-
lete, papéis pâÌa desenhos e pinrurâs. Uma mamadeira cheia
de água estava exposta na prateleira. Uma grande boneca de
pano exibia-se em uma cadeira. No ca-ro, {icava um aho
boneco de boracha inflado que, pela sua base pesada, po-
deria reâssuÍnir suâ posiçào inicial loso depot de esmurÌado.
Os brinquedos eram feiros com maririal iesistenre. mas pa-
Ìeciah muito usados e âté gastos.
Nada bavia naquela saìa que rende.se a reÍreat qual-
quer aÌividade da criança. Nada parecia reÌ 
'áo 
traco oJ re-
quinrado a ponto de não poder ser rocado ou me(mo soc.tdo.
O ingredienre da experiència pessoaì de cada criançâ Írrià
o ambiente único e diferente para ela. Âqui cada uma pode
buscâr, no silêncio, o entendimento dos veÌhos sons, gritar
suas descoberras e enconrros com seu oroÍundo eu e escrpar
da prisào de incerrezas. ,n,iedades e ;edos. Cáda uma úde
rrazer para denLro da sala o impacLo de,odas as conÍigura-
çoes e !o^s, o choqLre das cores e dos movimenros è re-
construir seu mundo, aqui reduzido a um tamanho que ela
pode manipular.
Enfim, esse recinto propoÌcions a cada pequeno uma
zona segura, onde pode extravasar seus s€ntimentos sem Íe-
24
ccios e, assim, aceitando-os e entendendo,os, desabrochar a
original unicidade do seu set.
- Nós íicareros uma hora junros aqui nesra saÌa debrinquedo< disse-he q:ando entÍamos.'- Vocè poderá
ver e examinâr todo o mãrerial que remo.. E ent;o àecidir
o que gostaria de Íazer.
Senrei-me em umà crdeirinha perLo da porta. Dibs per-
mqneceu -o meio da sala. de cosLas para mim, rc,cendó as
duas mãozinhas. tsperei. Tinl.arnos basLanre rernpo. Nào
havia pressa para eiecurar qualquer coisa. Poderia brincar
ou não bÌincar. Conversar ou mantet-se silencioso. Aqui,
não faria _nenhuma dilerençd. A salâ eru pequena e ern qual-
quer ìocal em que Íirasse não esLaria lonãe demai, de mim.
Havia uma me:a. sob a quaì poderia escónder-se. se quises-
rc. Cadeira. brinquedos. rudo à s-a disposição. No enianro,
Dibs continuava parado no cenrro da ;âh.'ObseÌvara. t'-
tão, vâÊarosamente, virou-se e comecou a andar com muita
vacilação, atravesando a sala e, depois, passeando em volta,
junto às paredes. frocara um brinquedo por ourro, na ánsia
de experimenrar rodos. Não oìhâ\s direiamente para mim.
Em Ìaras ocr(iôes, quando terrava ver-me, desviai,a o. seus
quando nosso. olhos se enconrraram. Conrinuara sua re-
diosa caminhada ao 'edor da sala. Seus passo" eram pesa.
dos. Parecir râo baver aìegria ou Íelicidaie naquela criinç,.
A vida para ele era uÍÌì nes&io hotrÍvel.
Camiúou are a casa de bonecas, parsou ,uj mão no
tclhado, ajoelhou-se peruo e. axim. diminuindo de ramanho,
pcnetrou no seu inteÌiof, vagârosamente, seguÌâva, ufna a
umâ. as peçâs do nobiliário. Corno havia Íeiro antes, en.
quarto caminhávamos pelo corredor, ia murmurando com
peusado quesLionamento e inílexào de voz. Falava muito
Lrixo e mm monornnia
- Cama? Cadeira? Mesal Berço? Guarda+oupa? Rá-dio? Chuveiro? Barheiro? - Cada'obiero dâ casi;ha foi..!sim, erguido, índaeado em sua denominrcão e recolocado
.ín reus lugares. Virou.se parâ o monLe dè bonequinhos e
ldcnrificou-os um â um. Esiolheu um homem, um; mulher,
um gÂIoto, umâ garota e um bebê. Foi como se ele t€ntasse
rccoúecêlos, ao dizer: N-Íamãe? Prpai? Irmãl B€bè?
- Entâo escoÌheu os pequenos animaís. - Cachorroi Garo?Coclho? - Seu olhar era insistente e proÍundo. Parecia di-Ílcil e dolorosa aqueìa tareÍa que eìe sè havia imposro.
Cada vez que ele inquiriâ sobre a denominação de um
25
objeLo- knLava.coÍnunkaÌ-lhe minÈÀ compreensão da pâÌa-
vra lauda e drzrâ:
, - 'Sim. lsso.é uma camâ 
., 
ou. .Acho que ë um guar-
da-roupa". ou. aindr. .parece um coelho.. _ T*;;;;;;_
ponderde umâ maneira breve. de acordo mm o que l,avìaclrLo.Ìrs com,a vÂriação necessária paÌa escapâr à monoto-
ma. Quando ele ergueu o bonem pai e disse: _ papai? _
respondilhe: - Pode ser papai. 
'
r ror assrm que começamos nossa conversâ. Tmaginei
que aquela fom sua maneirj de iniciar uma comunicãção
verbal. Denorninar os objeros pareciâ ser um início bastaire
, Ënrão, sentor-se no chao. olhando lixamenre a casa de
Donecas pol um Ìongo iempo. Não o esÌinulei â qualouer
âtrvrdâde. se o^que deseiava erâ senrâr-se ali em :ilé;o,
assrm o raria. r)everia haver ãlguma Ìa7âo para o que ele
estava Ìâzendo. Queria que a iniciarivâ de reier os l;o, d"
nossas Ìelações tosse deìe. MuiLas vezes, essa abenura io ser
perâ comunicação é reatizada pelos aduÌros, em sua ansieda-
de, pnvrndo , cÌjânca de cônst.,,í-I,
. Dibs apenâvâ as mâozin}as junras conÌrâ o peiLo e di-
zra, repetr'ndo várias vezes:
- Portas trancadas, não. portâs tÌahcadas, não. po(_tas trâncadâs, não.
Sua voz trazia um apeÌo de desesperada ansiedâde.
.. .- Dibs. não gosta de porLas rrancada. _ disse ele.Ìlavra um soluço em sua voz,
.. - você não eosta que as porrâs sejaÍn trancadas _clrsse a ele.
Dibs parecia estar sofrendo, Sua voz tomou_se um sus-
-. Dibç nâo gosta de portâs fechadas. Não sosra depoÌrâs 
-fechadas e rrancadas. Dibs não gosta de p"aredes àsua vohã-
,. Obviamente. eÌe -vivenciou algumas experiências inÍe_I'zes com porras íechãdâs e trancadas. Reconheci o que sen-
tr e exprcssava. Co.meçou, enrão, â riÌâr um após ourro os
bonecos da casa onde os havia colocado. primeiro Íoi o bo
neco pai e a boneca mâe, a quem ordenou:
. - Vão pÂra a loja. Vaó para a toja. Vão embora oaraâloja. Vão eDbora - ordenava enquanro os colocava lónge
. -. Enlâ9 â mãmãe vâi para a loja - comentej. _ Eo papsì rambém? E a irmã?
26
. Descobriu então que ás paredes divisórias da casa de
bonecas podiam ser removidas. Dedocou-as, umâ a uma, di-
zendô:
- Não gosto de paredes. Dibs não eosra de DâÌêdêsJogue fora, bem longe, todas as oaredes. Lrit.
. E.nessa sala de_ludoLerapia. Dibs começou a tibertat_seoro astr*ranres paÌedes que havia consrruido ao redor de si.
, lra clessa mâneira que eìe. lenra e quase dolorosamen_
, , 9*ld: a hora se passou. Íalei.the que nosso periodooc,brrncadeua âli.esrâvâ quase rerminado e que devèriamos
voltar para sua clÂsse.
.. - Temos mais cinco minuros e enÌão deveremos ir _
.,_ Senrou-se no chão. bem em ÍrenLe à casa de bonecas.
n€m lâtou..l âmpou(o eu o fiz. Logo que os
mhutos se esgotassem, vohariamos,
_Não lhe pereunrei se queria ir. Na verdade. não hâvià
clcolha. p{ra ele. Não lhe perguDrei se desejaria rerornâr
rquera brm(adeirâ. Não estaria em condiçoer de comprome-
tcr-se consiSo mesmo. Além disso, não se rrarava de uma
opção exclusivameDre dele. Não promeri reencontrálo na
lcmans segurnte, pors nadâ havi decidjdo com sua màe. Ogatoto já rinÌìa 
_sofrido o suficiente. sem mi,has p,omes3;qu€.podeÌiah_não se concrerizar. Nào lhe pergunrËi se havia
lc dlvertrdo. Por que deveria espicaçáìo, obrigando-o a ava-
lieÌ.uma experiênciâ que apenas começava? Se uma brincadeil. dc cíança éseu meio narural de expressão. por que Lentar-
:o3 enquâctrá-ta em um esquema rÍgido de uma Ìesposra es.tarcotÌpada? Uma criança apenâs se coDfunde com quesrôes
quê tenhâm sido respondidas por alguém antes de'ela ser
lcrguntadâ.
.- EsÌá ha hora de irrnos agora, Dibs - Íatei quandool crnco mlnutos
LentamenLe, ele eigueu*e, romou miúa mão, e deixa-
mos 6 saÌâ. Reromamos pelo mesmo lal/. A meio caminho,
quándo iá visuaìizávamos a porta de sua saÌa, pergunrei.Ìhe
aê cle Julgava que poderia jr soziaho até lá_
- Esrá bem - resoondeu_, Sohou miúa mâo e. por si mesmo, dirigiu-se à portaoa 3ua sab de sula,
Ássim pÌocedi. pois deseiava que Dibs fosse gradual-
mante romando-se rnais e mais seguro de si mesmo e mais
Itlponsóvel. Queria comunicarJhe minha conÍiança em sua
27
câpacidâde de corr€sponder às expectativas. Ácreditava que
ele podeda Íazêìo. Se ele tivesse hesitado, mostrando sinais
de que eu lLe estava pedindo dernais nesse primeiro diâ, eu
teria seguido um pouco mais adiante com ele. Teria percor-
rido todo o caminho até a porta de sua sala, se ele demons
trasse necessitar desse maior apoio. Mas ele quis ir sozinho.
- Até logo, Dibsl - disselhe.
- Está betnl - falou. Sua voz estavâ suave e gentil.tle seguiu pelo hall, ahriu a porLa de sua sala, e então
olhou oara rrds. Acenei-lhe com a mão. A expressào de seu
Ìosto era inteÌessante. Pareciâ suÌpreso - 
quase satisfeiio.
Enúou em sua sala e Íirmemente Íechou a porta atrás de si.
Foi essa a primeira vez que Dibs foi sozinho a algum lugar.
Um de meus objetivos no estabelecimento dessa rela.
ção com Dibs era ajudáJo a conseguit independência emo-
cional. Não gostaria de complicat seu problema, promoven'
do-me como um elemento de apoio tão ihdispehsável, que o
fizesse dependente de mim. Isso adiaria o desenvolvimento
mais compìeLo de seus senriÍnentos de segurança interior.
Se Dibs fosse uma criánçâ corn carências nâ esfera emocio-
naL - e as indicações eram de que sim tentar desen-volver urra Íiraçáo afetiva a essa altura poderia parecer a
sdtisfação de uma necessidade proÍunda da crian(r. ma) crja-
ria um probìema que. em üldma in5tância. só poderia ser
resolvido por ela.
Quando saí daquela primeita ludoterapia com Dibs,
pude compÌeender por que os professores e os outrcs mem-
bros da escola não conseguiram inscrevèJo no livro dos casos
perdidos e 
"em 
elperança. Sen'i un proÍundo respeiLo pela
suâ Íorça e capacidade interiotes. Dibs era uma diançâ de
€xtraoÌdináriâ corâgem,
Telefonei pata a mãe de Dibs, solicitando urr: encontro
com ela o mais cedo possíveÌ. Respondeu-rne que estava
rguardando minhâ chamada. Teria o maioÌ prazer em rec€-
bc-me em sua casa pata um chá, no diâ seguint€, às quatro
hoos. Ágradeci-lhe e aceitei o convite,
A {amília motava em uma bela mansão antiga, rev€s-
tida de pedras, no luxuoso ledo leste da cidade. O exterior
hrvia sido conservado com grande cuidado e meticulosamen-
tc. A polta d€ entÌâda estâva muito bem polida, o puxador
dc metal btilhando. Privilegiada em sua localização, a viven-
da compunLa uma requintada rua tradicional. Á essência da
época em que aquelas lindas antjgas mansões foram cons-
rruídas parecia aìi preservada. Abri o porrão de Íerro rodo
lrab.lhado, subi os degraus e toquei a campaiúa da porta.
Arqvés da pona Íechada, podtâ ouviÌ gritos abaÍados:
- Porras Íechadas, não. Pottas Íechadas, não. Não!Neol Nãol - a voz Ìepetiâ até que Íoi mergulhada no si-lêncio. Pressenti que Dibs não iria pâtticipai de nosso cLá.
A cmpregada uniformizsdâ abÌiu â porta. Apresenteime e
Íul então conduzida a uma ÍoÌmal e requintada sala de visi-
t !, O ambieÍlte, caÌacteÍizado pela beleza e sobriedade do
DobiliáÌio, exibia tão impecável oÌdem, que ninguém ousa-
tlr afitmar que ali houvesse estado uma criança, ainda que
lor cinco minulos. De Íâro. não havia sinais de que quaì.
qu.I pessoa r,rrerre naquera câsã.
Á criada, múLo sisuda, aparentava tal setiedade que
p.rccia est com a família há basrante rempo. Era precisa.
ttÍotocolar e dist,nLe. Vendo-â, mil cogitações ocorreram.me:
SÚd que essa criarura já sorriu aìguma vez) Serd que jd
cxpêrimenlou o lado bom da vidaT Se. na verdade, isso
ronteceu, uma dgidâ disciplinâ a envolve, anulando Éeus
Caplt*lo III
28
âsDecÌos de idenr'Íicãção individual e de esponrâneidade' Á mãe de Dibs cúmprimenrou me conesmente embora
bâstânte sériâ. Fizenos os costìrmeiros comentírios âcerca
do clirna e sobre o prazer de nos encontrarmos
O chá {oi entãã servido. O serviço era deslumbrante
Ela não perdeu muito Lempo expondo a t;tuação:
- Sabemos 
que vocè Íoi chamrda à es.oìa como psi'
cólopa oara observjr Dibs - djtse ela - 
É muita genLileza
*, ã*i,.ir ** Larefa. Gostaríamos que vocè <oubesse que
nós não espeÌamos nenhum miJagre J:i aceiramos a rragédia
de Dibs. Conhecemos sua reputa(ào proÍissjonaì e temos um
srande respeito peìa pesquiia em rodas a( áreas ciendÍicas'
i..l".i'e nãs cièncias do comoonamentohurano Não man-
Ìemos exoectativas de obter qualquer mudança na conduta
de Dibs: ma', se o esrudo de seu caso lhe proporcionar uma
melhor compreensâo do Íenomeno humano. creia que e'ta-
mos mais que di.poniveis pâra PresuI nossa cooperaçáo.
r'n inrcrediirivei: Uma mãe. em nome da ciêrcia, oÍe-
recia-me alsun, dados para e.tudos. Não uma criança doenLe
. ro,r-.udà'. U.u criança que era seu próprio Íiìho Nao
Apenas aìguns eìemento' pãra pe:quisas E Íez questào de
*.1"....t-or. não e'perava nenhuma alLeraçao nos dados
Íornecidos. Pelo menoì 
'enhuma 
melhora Passou a rehLar
inloÍmacões esratírricâs em relação à vida de Dibs Data de
seu nascimento. Seu lenro progresso Seu rerardamento óbvio
e a possibiüdade de uma de{iciência oreánica'senrada à minha frenre. demon.rravo reÌrível neruosis-
mo. Tentava sufocálo, dominando-o sob controle. Mas, de
o"ando em ouardo. mordia os lábios desconcerradamente.
Sua iace esrava pálida. Os cabeìos acinzentados esLavam pre'
Oì oúos eram azuì-cìaros Os lábios. Íinos
Era uma bela senhora, porém {ria e {ugidia em seu relacio'
namento. Usava om veitido cinza em èstilo simples e clás-
sico. Seria difícil caìcular sua idade Aparenrava estar aproxi-
nundo+e dos cinqüentâ anos, mas ptovavelmeite erâ bem
mais nova. txpreisava"e com elesância e inrcligéncia Pa-
Íecia âssumir u .o'rg.. . a esratura de um guerreiro Nào
obstante, muito provavelmente, erâ tão profunda e tÌâgícâ_
mente in{eliz ouanto Dibs.
p*^ntori-me. então, re prerendiâ observâr Dibs em
sua oróoïia ca"a, em seu quanó de brinquedos, que se loca-
t' ,'ì ." 
"ndar 
ruDelior, nos Íundos da residéncia
- É urn '..into tranqüilo 
e ninguém os inreÍromPerá
ou aborrecerá lá. Ele tem grande núìero de brinquedos
io
E t€remos o maiot prazer em adquirir qualquer outro que
. senhora queiÌa ou julgue necessário
- Não. muiro obrisada - 
respondi-Ìhe - Será me-lüor que as sessões sejam realizadas na sala de ludotetapia
do Centro de OÌientâção InÍantil Teremos uma entrevista
ecmanal com a dutação de uma hora.
 minha firrne decisão causoulhe impacto, mas não a
imoediu de apresentar novos areumentos' 
- Dibs possui um incalculável número 
de brinquedos
cncantâdores. E rcremos a maioÍ satisfação em âumentar
rcus honorários para que venha em casa.
- Lamentõ, mas não 
posso atendêla - disse-lhe -E, além disso, ^ terupi^ Í\ão será 
paga de maneira algurna.
- Oh: mâs nós podemos 
pagar reLorquiu imedia-
t.mente. - Insisro mesmo em 
que ìhe paguemos por esse
cstudo.
- É uma 
gentileza sua - respondi-lhe - Mas, defato. não recebemos remu.erâção O que nós solicitamos é
ouc o levem resutarmenre ao CenLro, na horr <ena, e, só
Jm caso de doeúa, o d.irem faftar' Go<taria de sua aquies-
cência oara escrever os relarórios completos de rodas as en'
trcvistaì parr nossos esLudos De minha parre. dar lhe-ei uma
dcctaracão por escrito, aÍirmando que se por umr' eventuâ-
Itdade Ãsse material assim recolhido Íor u'ado para fins de
cnsino ou qualquer tipo de pubìi(âção, todas as inÍormações
ldenriÍicadoìas de DiËs e di sua famíÜa serão de raì Íorma
omitidas, que ninsuém serd capaz de reconhecèìas - En'trcruei-lhe'a declaraçao que jri havia sido assinada anres do
cnõntro. Ela estudou-a cuidadosamente.
- Muito bern - disse 
depois de algum tempo -Poderei euardar esra vial
- 5em dúvida. E a senhora 
e o seu marido poderiam
.riinar o consenrjmenro para a elaboração dos relatório'?
- indaeueilhe, ap'e'entaìdo o documenro id redigido
-"Poder;a 
guardlìo para discurilo com meu narido
c cnviálo oelo cotreio se o aceirarmo' na íntegra)
- Ceruamenre - respondiìhe - 
Apreciarid muiÌo
.c me fizess€ cient€ de sua resolução tão logo a tom€m
Sezurou a folha de papel com cuidado Umedeceu os
llbios. Frouavelmente, sentiã se con+rangida dianre do mo-
i.oto ot.t.o,. e de suas implicações para o fururo desco-
úccido'. Seu filho iria inicjar uma ludoterapia Mas- seria
.u. á deliberaçào Percebi que deverìa a.eitar o período ne'
..ssário pr'ra que a decisào Íosse assumida Assim. podena
31
contâr corÌ a pÌesençâ d€ Dibs no CentÍo de Orientação
Infantil.
- Logo 
que optarmos, avisáJa-ei - declarou.Meu cõraç?o pâÌou. será que essa oponunidade de
esco)ha ajuddìa-ir a íugir do conÍronro consigo, a que a
terapia do Íilho poderia conduzila? Mas, por outro lado,
caso eceitasse noìsa aiuda, estaÌia compÌometida até s€u
{ina1. Ê cumpriria sua tatefa, como um dever livremente es-
coìhidc. Mas, se o tÌaÌâmento lhe Íosse impingido. não po-
derízmos esoerar uma fÌeqüència ÌesulaÌ.
- Naá comoreendo ior oue. 
qúando uma Íamflia tem
condiçôes de oÍerËcer umr'remineração substancial que ìhe
oossibilitaria dar assistência a ums outrâ criânçâ cujos pais
";o rém recursos ÍiDânceiros. â senhora Íormalmente se re-
cusa a não Ìecebr - insistiu depois de uma longa 
pausa.
- Meu trabalho é Íundamentalmente 
dedicado à pes-
quisa, visando a urÍÌa maior compreensão da psicologia infan-
ú - expliquei-lLe. - Já recebo meu salário 
pelo trabalho
que desen'oÌvo. Isso, ponanro, independe de sua possibilida-
dì de paear. L não posso receber honorários de ninguém. Se
a seúora quiser, poderá oÍetecer uma contÌibuição ao Cen-
tto, sem neúum vinculo com nosso caso paÌticular' A se-
nhora poderá decidt à vontade. Aliás, âs pesquisâs são ba-
sicamente financiadas oor tundos assim colerados.
- Entendo - respondeu. - Mas ainda conrjnuo 
que-
rendo oasála. nessoalmente.
- Ë'tor'..", disso - respondi.lhe. - E agradeçotoda a sua preocupaçào â meu respeito. tntrelanro, iá íui
bastante dara sobre as condições em que posso at€ndet Dibs.
Mantive minha posição cofn firmeza, Sabia que, com
a velocidade de uma serra elétÌicâ, suas palavras poderiam
co ar todos os liarnes que me uniam â Dibs. Mâs, se con-
sesuissemos conÌornar aquela pequena conaovérsia. esraria-
mós construindo importanre deerau inicial, no ediÍício de
sua tesponsabilidade como mãe. Seria. sem dúvida. maG con.
Íonáveì pasar por sua omissào em 
'elâção 
ao filho. Por isso
mestno, d€cidi que seriâ da haior impoÌtânciâ eliminâr €ss€
Percebi"a estauecida pot alguns minutos. Ápertava as
mãos, com sofreguidão, sobre seu colo. Olhava-as, De tepen-
te,lembrei-rne de Dibs, iogando-se no chão, rosto pata baixo,
imóvel, rígido, Novâm€nte, senti entre ambos uma identi-
dade de problemas. kvantou a vista e, ao encontro de meus
olhos, desviou os seus.
32
- Devo dizetlhe alguma coisa mais - confessou. -Em caso de neccssitat de maiores detalhes sobre o caso de
Dibs, posso apenas the indicar a escola como a melhor fonte
para obtêJos. Pessoalmente, n*da mais posso acrescentat.
E n€m kmpouco comparecer a enLrevisras. Se sua< mndi
ções de trabalho iÍnpìicâm um asíduo contato con a mãe dr
criança, prefiro que caDceìe o coÍnpÌomisso que assumiu há
pouco. Nenhumr iníormação renho para adic'onâr às que iá
lhe íorneci. É uma tragédia - uÍÌu enorme Lragédia. Dibsé.. . Bem, Dibs. . . é. . . um Í€tardado mentâl. Já nâsceu
essim. Quanto a mirn, não me sinto em condições de res-
ponder a qìrestionáÌios e paÍticipaÌ de discussões sobÌe seu
caso - enÍauzou, olhândo-rne 
por seguodos, de novo.
Fìcava atettorizada coí]I a perspectivâ de ser submetidâ
a quãisqu€r enúevistas.
- Cornpreendo - ttanqüilizei-a. - E esteia certa deque r€speitarei sua voíÌtâde. EntÌetanto, gostaÌia de lhe dize!
que, se em alguma ocasião, quando quer que seja, desejar
Íalar-mc sobre Dibs, cÌeia que s€rá muito bem"vindâ. Isso
Íicará a seu critério.
Por minutos, senti-a menos contraída. Um pouco alivia-
da, talvez.
- Meu marido também não gostaria de ser solícitadoDâÌa reuniòes - continuou.' 
- lstá ceno - concordei. - O 
que decidirem será
lespeitâdo.
- Bem, 
quando for levâr Dibs ao Cmto, não podeÌei
esperáJo. Voltatei mais tarde, para apanhá-lo, quando estiver
na hota.
- Não haverá 
problemâ - âsseguÌ€i-lhe. - A senho-ra poderá deixálo no Centro e esperá'lo no horário combi-
nado. Ou ainda, se pteÍerir, pod€rá enviaÌ uma pessoa de sua
coúarçâ,
- Muito obrigada. Á senhora não imagina como apre-ciei suâ compreensão - e\presrcu-se depois de um longo,ilêncio.Tetminamos nosso chá. Conversamos sobre assuntos su'
perficiais. DotoLhy Íoi lembrada com as esLâtísLicas indica-
doraç de sue sanidade- caracterlstica evidente de uma ' crian.
çr perfeita".
 mãe de Dibs havia demonsuado muito maior medo,
ansiedade e pânico em suá primeira €ntrevistâ do qu€ Dibs
nÁ sessão inicial de terapiã. S€nti que nâo havia clima pto-
pício para persuadi-la dos benefícios de um trâtamento pes-
3)
r
L
sorl. SeÌia amerçáì, demais. t não qui! assumir esse risco.
RepresenLaria a possibi)idade de perãer Dibs. t acreditara
no potencial emergente daquela úiança que a impulsionava
a protestaÌ conta a permanênciâ de portas üâncadas. Que-
ria abrilas. Entendi seu esforço, percebendo as inúmeras
pottas que sua mãe Íechara em sua vidâ. Na realidade, quan-
tâs tentâtivas Fartiram dela parâ impedir-nos de entÌ€abrir
a pona da ajuda terapêutica? Ainda na salda, voltou a in-
sistir na modificação de nossas condiçóes de trabalho.
Está certa de que não pr€ferc atendé,lo em seu
quano de brinquedos? - perÂunÌou.me. - Seus iosos sàovariados e atraenre<. E poderíamos comprar quaìquei ourro
objeto que a senhora jndicasse. Qualq,eì un'.
Percebi seu visiveì desespero. Agìadeci o oterecimento,
e, de novo, afirmei que só podeÍiâ ât€ndê.lo no C€nrro.
- Comunicarlhe-ei loeo que decidamos - dkse-rebalançando o papeì, que nâo mdis solrou dÂr mãos.
- Muito obrigada - respondilhe, já saindo.No percumo até meu carro sentia o peso opÌessor de
uma famíÌia acorrentada. Pensei em Dibs e em seu quârro
de brinquedo. maravilhosamenLe equipado. Nunca rintra en
rrado li. Mas esLâ!â convicra de que rodos os objero. para
Íins ìúdicos que o dinheÍo pudeise comp'ar ati e'tai;am
reunjdos. I mais. Tudo zelosamente guardado por rrás de
uma sofisticada porta polida. E... tancada por uma fecha,
dura segura!
Lembreime da rnãe de Dibs. Será que, mais tarde, ela
decidiria relatar os Íatos relevantes da história de seu Íilho?
Sem dúvida, setlhe-ia urna penosa tareÍa cârâcterizar as di-
námicas do relacionamento de sua Íamília. Como se senLiria
diante do drama de sua criança? Que papel atribuía a si
nessa tragédia, que â tornâva apavorada perante a perspec-
tiva de ser entr€vistada ou questionadâ sobre o assunto?
Petguntei-me se havia conduzido a entrevista pelo ca-
minho mais proveiÌoso ou se. pelo conrrário. minha posição
Íirme e radical a havia prexionado a taì ponro que estimu-
Ìara seu recuo, ímpedindo-nos de estudar a problemática de
Dibs.
Senti ÍoÌte desejo de adiviúar a decisão que aquele
casal assumiria. Será que aceitaÌiam as condições pÌoposrâs?
Serã que reria ourra oponunidade de rever Dibs? t se, em
nome da espetança, sua e de.eus pais, eu o enconrr,rs* na
sala de ludoterapia, quais seriam os resultados que dali
adviriam?
34
Capítíio Iv
Pof várias semanas, a Íamília de Dibs manteve-se em
completo silêncio. Tel€fonei para a escola e indag ei da di-
retora se recebera algumâ comunicação de \eus pai'. Res
pondeu-me que nada lhe haviam diro sobte o assunro. Per-
guntei sobre Dibs. Soube que sua conduta continuâvâ sem
âlterações. Petmadecia Íreqüentando a escola corn assidui-
dade. Todos 1á apoiando.o, enquanto aguardavam o início
da ludotetapia, que desejavam aDsiosâmente não tardasse.
Enfih, certa manhã, recebi a folha libeÌatória, âssi-
nada por seus pais, dando"me permissão para escev€r os
Íelatórios dãs sessões. Uma pequena observação ao Íinal da
página reaÍirmavâ seu desejo de cooperâr com o nosso trâ-
balho. Sugeriam, tarnbem, que teÌeÍonássemos para sua casa
com o objetivo de marcar â entÌevista inicial corn Dibs.
lúârquei a sersào para a quinraJeira seguilre, à tarde,
na sala de ludoterapia do CenLro. Pedi a mjnha secrcrária
que conÍirmasse, com sua mãe, a possibilidade de atendi-
mento naquele horituio, por parte dela e de Dibs. Não houve
ncnhum inronveniente.
Foi um verdadeiro alívio!
Á julgar pelo tempo consumido. seus pais nào tomaram
r decisào com iaciÌidade. Lra bastante sienificativa Lal de
mora. E o que estaria acontecendo com Dibs durante esse
intetalol Seus pais o tetiam examinado com olhâres pro-
Íétims, tentando avaliar suas possibilidades? De qualquer
maneira, vacilaram, medindo e pesando todos os ângulos e
aspectos envolvidos nâ âlenturr. Uma grarde tenrâção me
.conselhâvâ a teleÍonar para sua mãe, pressionândo"a a Úa-
zct Dibs ao consultório ou pedindo que me desse ciência de
rua deliberação. Só não obedeci a esse impulso porque con-
preendia que nada de imporrante conseguiriâmos ao Íorçâr
umâ decisão. câso nâo a livessem tomado. e muito perderia-
J5
mos se os perturbássemos no peÌíodo de consideraçóes. Foi
uma longa espera, cheia de {rusttações e perguntas.
No dia cornbinado, Dibs úesou ao Centro com sua
mãe. Ela dirigiu+e à recepcionista dizendo que voltaria para
buscálo dentro de uma hora e que ele poderia aguardáJa,
ali mesmo, na sala de espera. Caminhei â seu encontro pârâ
cumprimentálo. Estava imóvel, no exato lugar €m que suâ
mãe o hâ\iâ deixado. Muito bem agasalhado.
chapéu, luvas e botas.
- Boa tarde, Dibs - saudeio. - Como é born vêlode novo! Vamos para nossa sala de brinquedos. Fica bem
no Íinal do haIL
Dibs estendeu sua mãozinha ao enconÉo da minha. Si
lenciosamente. Juntos, ditigimo-nos para a sala de ludo-
terâPia.
- Esta é uma outrâ sâlâ - disselhe. - Mas bernpatecida com aquela onde estivemos há várias semanas.
- Está hem - Íalou hesitante. sala ficava no andar térreo. Cheia de luz solar. Mais
âtraente que â outrâ, embota o equipamento não diferisse
signiÍicâtivâmente do outro. As janelas abdam+e para um
pârque de estacionârnento de catros, e, maís adiante, podiâ-se
ver umâ grande igr€ja revestida de pedras cinzentas.
Logo que entramos, Dibs percorreu o Ìecinto vâgârosâ
mente, tocando o material, noneando os objetos com a mes-
ma inílexáo de voz que hari; usado em s a primeila visiu
à outra sala de tetapia.
* Caixa de areiâ? Cavâlete? Carteira? TiDta? Cârro?
Boneca? Casa de bonecas? - Cada urn eÌâ seguÍado e in-dagado sobre sua identidade. Depois vatiou um pouco.
- Isto é um caÌÌo? Sim, é um cârro. Isto é âreiâ? Sifn,é aÌeia. Isto é tinta? Sim, é tinta.
Quando concluiu o circuito completo da sala, Íalei-lhe:
- É mesmo. Quaítos obietos diÍerentes estâo nestecompârtimento, não é? E você segr.Ìrou'os dizendo seus
- É - tespondeu suavemente.Não desejava aptessáJo. Por ísso davalhe ternpo para
ver e e\aminaÌ o que o cercavâ. Toda criança precisa de
rempo para explorar seu mundo, a seu modo.
Parou ineÍte no centro da sala.
- Dibs, será 
que você gostaria de tirar seu chapéu e
casaco? - pergunteilhe, depois de um 
peÌíodo de espeta.
- Está bem - rcspondeu.
36
- Tire seu chapéu. E seu agasalho, Dibs.Falava, mas não {azia a mais leve menção de movi-
- Bem, vocé {aìou-me que gostaria de tiÍrr seu casacoe chapéu, rào Íoi, Dibs? Órimo: Vá. Tire-os. então.
- Tire as luvas e as botas também - completou ele.
- Está certo - respondi. - 
Tire suas luvas e botas
também, se você quer.
- Está bem - sussurrou.Mer áli D€Ìmâneceu estãtico e eem conÍorto denrro de
seu casaco de mansas compridas Começou a choramingar'
Mantinha+e à miúa frente, com a cabeça inclinada, choran-
do baixinLo.
- Bem, você 
gostaria de ficar sem os agasalhos, mas
quer que o ajude a reti!áìos. É isso?
- Sin - concordou, corn um soìuço na voz
- Ëstá €eÍo, Dibs. Você 
quer que o âjude a tirâÌ seu
casaco e chapé:. Veúa atë aqui que eu o farei.
Estav: sentada em uma cadeirinha e mântive-me ne')a
posição com um propósiro: oÍerecialhe meu aurílio mas
iomo esrava um pouco aÍastada. ele deveria andar algun'
passos pârâ obtêlo.
Dibs caminhou em minha dir€ção. Trôpego e vacilânte.
- Às botâs tâmbérn - faloìr em tom áspeto.
- Pois não. Vou tirat suas botâs.
- E as luvas - insisriu. rorcendo a5 mâos.
- Clato, as luvas também - 
respondi-lhe.
Quando rerminei, Dibs esrava mais leve. sem dúvida.
Coloquei as luvas nos bohos do casaco e enrreguei a ele
iunLo com o chapiíu. Deirou-os cair no chào. Ergui-os e de-
pcndurei-os na maçaneta da poúâ- 
- Vamos dependurdlos aqui, aré a 
hora da saida -disse-lhe. - licaremos 
juntos por umâ horâ. E, depois, você
Nada respondeu. Dirigiu-se áo cavaìete e examinou a.
tintâs. Ficou aii poÌ um longo iempo. PÍonunciou o nome dâs
cores das tinrasìue ali enconrrara. ReotgrniTou_âs com cal_
ma. Colocou o veimelho, o amrreìo e o azul na prateìeira do
c.valete. Com cuidado, separou'os nos seus espaços adequa-
dos e acrescentou as outras cores, completando assim o nú_
mcro das seis cores básicas do espectro Colocou então as
cores rerciárias nos luqares corretos, adicionou o branco e
o preto, e assim organizou Lima escala com lodas as cores
dc acotdo com seus valoÍ€s hieÌárqúcos. Tudo foi por ele
37
elaborâdo corn calma e eÍì silêncio. Quando os perc€beu em
ordem exata, escolheu um pote e e,Ìaminou-o. ObseÌvou seu
interior. Misturou â tinta dentro corn o pincel. Suspendeu-o
oara melhor vê-lo sob a luz. Correu os dedos suavemente
i;obre o rórulo. l-eu a marca comercial da tinta e o nome
- Tinta Favor Ruhl. Vermelho 
Tinta Favor RulÍ.
Â2u1, Tinta Favor RuLl. Preto.
Essa era uma parcial respostâ a uma antiga indagação
Sim. Dibs sabia ler. Éstava asora obviarnente lendo os ró-
rulos de uma maneira completa. E, ainda, a escala de cores
{ôi mÍ ele corÌerâmenÌe oisanizada e denominada.'- Bom, vocé sabe ìeios n;tulos dos potes de tinta
- disselhe eu. - E sabe muiLo bem os nome. 
das cores
É verdade - respondeu com vacllação.
Ëntão, sentou-se na mesinha e apanhou a caixa de lápis
de cor. Leu o nome que eslava escriro no esLoio Tomou o
láois vermelho e escreveu com lerras de imprensa em lerras
fiimes e bem deÍinidas: venMtrHo. Fez o mesmo com todrs
âs outÌas cotes, €screvendo o nome na seqüência exata, for-
mando um círculo. Escrevia e sole*ava em voz alta.
Olheio. Tentei responderJhe verbâlÌnehte que estava
remnhecendo seu estorço para comunicar-se comigo por m€io
daouela atividade.
- Você esú dizendo os 
nomes das cores e registran
do-os com o lápis conespondente, não é2 Estou peÌcebendo.
V-E-R-M-E L-H.O, Íorma vermelho
- É - concordou.
- E âindâ está elaborando um atco de 
cores, não é
verdade?
- É - repetiu.Apanhou, em seguida, a câixa de âquaÌelas. Leu o nom€
resistrado na caixa. fuu pequenos toques de titta cúloridâ
em um pedaço de papel ãeìeseúo, obedecendo à mesma
ríeidâ e delibetada hietarquia das corcs. Tentava mânteÌ
mius comentários de acordo com sua ação, evitando Íalar em
demasia parâ não indicar qualquer orienláção ou demonsúar
alquma ãxpectaúva especifica, para ele concretizar. O que
qúeria era mmunicarlhe compÌeensào ou simplesmenLe re-
cbúecimento de sua exteriorização referencial. Deseiava que
Íosse ele quem abrisse os caninhos. Deveria segui-ìo respei-
rálo e entend&lo. Deseiava Íazèlo sentir que a ele cabeíam
as iniciârivas a serem assumidas naquele recinto. Quanto a
mim, tecoúeceria seu esforço, numa dupla comunicação, ba_
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seada na realidade concreta, que funcionaria como experiên-
cias cornoanilhadas por nós dois Nào queria proclamar admi
mcão oeias zuas habilidades Por que surpreenderme dianre
da eviàéncia de sua capacidade? Quando a liberdade de jni-
ciativas se abÌe purn ". iodlutdoo, sua escolha 
tecai sobre
as arividades em que se sente mais sesuro Qualquer excla-
mação de surpresa ou elogio pode ser inrerpretada como ln-
dicsdora da ãíeçao a seeuii E, com isso, outras esfeÌas
de exploração sãó Íechadai, rePÌeseÍrtando perdas da maior
irnpoÌtância pârâ ele.
Todas as pessoas pÌocedem com pÍecâuções pâra Fro'
teqer a inteeridìde de sua personaìidadè. tsrávamos familia-
riz"ando-os"um com o outrõ. Âqueles obieros que Dibs men
cionou. ao siruar-se na sâla, eram realidades que não esLavam
".".l"idas 
ern nenhum conrorro afetivo sério Constiruiam
no enranto. inrredieotes comparLilhâdos por n<is dois uma
pon,. puo noi'u comunicaçào Para Dibs eram conceiros
seguros.
De qLrando em quando, relanceava os olhos em minha
direçào, mas Jogo os desviava
Sem dúvida. essas atividades iniciais transbordavam uma
riqueza de revelaçòes. Heddr rinha de Íato soberbas razões
oaia ter fé em Dibs. Na verdade, âquela criança estrvâ não
L-.o,. oront" outn.*.rsir, mas iá começando a longa aven-
t'.' do àesabrúhar. Oualquer que Íosse szu probJema. po-
dír-o" 
"sot" 
retiÌat'lhe o ;ótulõ de retardado mental
Dibs entou no depósito de ateia Enfileirou os solda-
dôs mnbinando os parés, dojs a dois  areia penetrou-lLe
os sapatos. Olhou-mè, aPontou Pârá os peziúos. choramin-
" 
- Oue é isso? - 
peÍguntei-lhe - A areia estí en-ttando em seus sâPâtos?
Ácenou com a cabeça aÍirmaúvamente.
- Se você 
quGer, Poderá tiráJos.
- Está bem - 
respondeu_me em tom ásp€ro.
Mas não Íez neúum movimento Pelo contÌáÌio, sen-
tou-se. fitando os calçados e lamutiândo6e. EspeÌei
- Você titaÍá seus sapatos - 
{a1ou com gtande es
Íoro.' 
- Você 
gostarìa de tirâr os seus e quer que o aiude,
não é?
Ássentiu com uÌn movimerrto de cabeça. Presteilhe â
issistênciâ solicitadâ. Desafnalrei os lâços e retirei-lhe os sa-
39
ï
patos dos ÉJ Com muita cautela, coÌocou os pés na areia.
Mâs não poÌ muito tempo. Lgo quis sair.
Aproimouxe da mesa e observou os blocos e peças de
jogos de atmar. Então, calrna e d€libeÌâdamente, começou a
sobrepor peça por peça. O grande bloco assim formado úe-
meu e se desrnoronou. Dibs esÍÌegou as mãos umâ nâ outrâ.
- Miss A.l - 
gritou, chamahdo-me pelo nome, com
que, a partir dai, iria tratar-me. - Àiude-me, e bem de-
- De fato, você gosra de pedir minha rjuda, não éverdade?
- Sim - respondeu, com um relancear de o1hos.
- Bem, que quer que eu faça? Diga-me, Dibs.Perto da mesa, Dibs olhava os blocos, apertando as
mãozinhâs contrâ o p€ito. Silencioso. Ele e eu.
Ëm que esLaria pensando? O que estaria procurando?
Oual serü a melhor maneira de aiudálo? Oueria comunicar
the meu esforço de compteendêJo. Pouco sabia sobre seu
mistéÌio. E ele tânbém. Mâs nessâ nossâ ignoÌânciâ Ìepou-
sava parte de nossa espeÌânça. Por isso esperavâ. Seriâ um
ato de violência invadir seu mundo privado para tentar aÌran-
carlhe respostâs. Se conseguisse Íazêlo sentir minLa con.
Íiança nele, como pessoa que tem verdadeiras razões para
suas âtitudes, se pudesse transmitir-lhe â convicção de que
não hí respostas €scondidas para ele adivinhar, nem padrões
de conduta estândardizados, nen uma solução pronta parâ
seu problema em mihhâ mente, e nem pressâ paÌa Íâzer
qualquer coisa - Dibs poderia conquistar. mais e mais. umsentimento de seguÌânça em si mesmo, pâtâ entend€r e acei-
tar suas ptóprìas reações. lsso levaria tehpo, verdadeiÌo €s'
Íorço. grande paciència por prrre de nós doi..
De repente, levantou*e, estendeu os bÌaços, seguÌândo
urn bloquinho de construiÌ em cada mão e os Íez coüdiÍ com
€stampido.
- Uma desüuição! - exdâmou.
- Foi umâ destruição?
- Foi sim - respondeu. - Uma destruiçãolUm caminhão entÌoü no parque de estacionamento e
parou junto de nossa janela aberta. Dibs correu pata ÍecháJa,
apesar do calor que Íâ:ia.
- Feúe a 
janela 
- dizia.
- Você quer fechar a 
janela? 
- perguntei. - Masestá quente áqui dentro corn a janela aberta.
- É verdade - respondeu.
40
- Feche você a 
janela, Dibs. Ahl Você a quer.rnesmo
fechada.
- É isso mesmo - disse. - Dibs vai Íechá-la - Ía-lou com bastante firmeza.
- Reâlmente, você sabe o 
que quer, não é?
EsÍregava desajeitadamenre seu rosLo. onde as lágrimas
haviam deixado lânros vesrígios. Teria sido tão Íáciì lomálo
nos braços e consolálo, estender o horírio, Lenrar aberta-
mente dâr.lLe demonsffação d€ afeto e simpâtia. Mâs quâl
o valor que tal atitude teriâ diante dos problemas emocio'
nais da vida daqueìa criança? Não rerta ele que volrar para
casa independentemente de sua vontadeì tvitar en{renrar a
realidade não o aiudaria. Dibs ptecisava desenvolver sua Íor-
ça para encarar seu mundo, mas essa fortaleza deveria brotar
de seu interior, e o exterior deveria ser experimentado tal
qual se apr€sentava. Qualquer mudança significâtiva paÌa
Dibs deveria vir de seu interior. Não podíamos transÍeri-la
parâ s€u fneio âmbiente.
A hora se havia €sgotado e Dibs estava pronto parâ
sâir. Tomou minhâ mão e encaminhâmo-nospara a sala de
recepção. Sua mãe lá o aguardavâ e parccia muito bem. Dibs
- úrranqüilo, inseeuÌo de si e da sir.uaçào. Quando 
Dibs
a viu, atiróu-se no chão, esperneando e gritando .eu prote'to
Despedi-me dele, cumprimenrei sua màe. disseJhe que gos-
tarià de vè.Ìo nâ semanâ sesuinre e os deixei. Ho-ve um
tremendo alarido na sâ14 de esperâ, enquânto sua mãe ten_
tava leváJo. Seu embaraço cÌescia com a resistênciâ de Dibs
Não enavâ sârisfeita coÍniÂo mesma por ter_me omitido.
nas nada podia fazer a não ser deiráìos resolver o problema
à sua manãira. Pareceu-me oue. se eu perÍnanecesse ali obser-
"n"Jo.os 
ou intederhdo. somenre iria conÍundilos e co'n'
blicar á siruacào. Não ooderia Íicar a Íavor ou conrra Dibs
àu sua mae. Não queria tomaÍ teúuma posjçào qüe impli-
casse critica sobre o comporramento da mãe ou do {ilho
Assim, parecia qr. o."ihor procedimento seriâ deixar a
cena sem envolver-me Pessoalmente,
41
Czptt"Io V
Na semara seguinte, Dbs retornou ao Centro de Oden-
tação InÍantil, exatamente na hora marcada pâra a terapia.
Encontrava-me em meu escriLório, quando a recepcionisLa
tmou a campainha que anunciava sua chegada. Fu' imed;ara-
mente para a sala de recepção e encontrei-o p€rto da poÌtâ.
Sua mãe já havia saído.
- Boa tarde, Dibs - cumprimenLei-o. apro*;mân-
Nada respondeu. Mantinha*e de olhos baixos.
- Vamos para a sala de brinquedos - disseJhe, es"tendendolhe ninhâ mão. Tomou-â e percortemos o áall até
a sala de brinquedos. Esperei a seu lado que tomasse a ini-
ciativa de entrar. Depois de ter penetado no recinto, Dibs
r€cuou Íepentinamerìte, segurando a potta. Havia nela uma
placa dependurada. EÌgueu'se e retiÌou-a,
- "Não pertuó€" - leu.ViÌou o letÌeiro e olhou âs pâlâvÌas no ve$o. -"Ludo" - leu pausadamente.Bateu de leve corn um dedo sobre o final da palavm.
Ëra um norne novo para ele. Tetapia. Estudouo em todos
os detalhes. - "Te-rapia" - 
pÌonunciou.
- Tetupia - reperi com â pronúnciâ correra.
- Sala de ludoterapia? - indagou.
- Exâtâm€nte - respondi.
- Sala de ludoterapia - Ìepetiu, entÌândo e Íechandoa porta atrás de nós. - Você vai titar seu chapéu e o casaco
- disse ele.Sabia que ele se reÍeria a si mesmo. Dibs raramente
se tratava a si próprio como Pr.
- Você quer que eD tire mea casaco e nea chapé!?
- 
perguntei'lhe.
- Sim - concodou.
- Mas eu não estou usândo chapéu e casaco,
42
Dibs olhou-me confusamente.
- Vo€ê tirâ seu châpéu 
e seu €âsâco - Íalou 
puxando
- Gosrarja que eu o aiudasse a rirar 
seu casaco e cha-
' Tiúa desejado focalizar sua atencão no e* quando o
pronunciei com-ênfase, Mas esse era um problema muito
- Sim - respond€u-be.
- Ben. vou aiudálo.Dessa vez. no entânto, ele pârricipou bem mais ativa-
menre. Entresue;-lhe então o chapéu e o sobretudo
Relanceú sobre mim seu olhar, Pesou'os e caminhou
em direcão à Dorta.
- Voce'vai dependuÍá-los 
aqui - disse. colocando-osnâ mâcaneta.
- Coloquei-os 
âí na semânâ passada Hoie quem vai
fazeÌ isso é você.
Sentou-se ao lado da caixâ de ar€ia e en{ileirou os sol-
dados aos pares. Depois, foi à casa de bonecas e arrumou a
mobíia.
- Onde está a 
porta? Onde está a porta? - pergun-ravá, âpontando para a aberrura da Írente da casa de bo-
- Acho 
que eíá dentro do armário aqui perto
Dibs íoi aié ìá e apanhou o prinel fronrrl onde esLa'
vam reoresenLadas as ianelas e a porta. Ém seu retorno,
bateu, oor âcidente, na ca"inha Uma de suas principais pa-
Ìedes caiu. I-€vântou.a, recolocando_a em seu encaixe corre_
io. Tentou .olocrt o puinel no lugar previsto Era uma tareÍa
difícil. Tentou repetìãas vezes e em todas Íalhava na conexão
'- Trâncal - murmumu - Trancal
- Vcê ouer a casinha trancada?
- Trancada - insìsriu, tentândo 
Íixar q peça de
novo. - Agorã, sim, está bem 
trancada
- Poii é. vocè encontrou 
o paineL e Íechou a casa
Dibs olhou-me e esboçou a promessa de um sorriso
- El fiz isso - 
disse vâidosamente.
- D€ Íato, 
você o Íez, e soziúo - comentei. Dibsrofiiu cratificado consiÂo mesmo
cirulou a casa diboneca', e lechou rodas as janeìas e
' 
- Todas techadas. Todasl - 
exdamou.
4)
- Verdade, todas as janelas e portas esrão fechadasagora - concordei.Ábaixou-se para obsetvâr a paÌte de baixo da casa.
Havia durs pottinhas ali. Ele as âbriu. - Áqui é o porão -disse. - Jogue Ludo fora. Paredes, mah pareães e dÌvisórias.Paredes sem porrâs. - No porão esLâvem pardadâs çárirsdivisóriâs e muitos móveis de casa de boneca.
- Faça uma Íechadura - disse a si nesmo. E, obede-cendo- apaahou meu lápis e com cuidado desenhou a maça-
* Você acha que deve haver uma Íeúadura na porta?
- pergunteilhe.
- Sim - murmurou. Desenhou uÍna mâçânerâ nâ poÌ-tâ. - AgoÌa a portâ tem uma maçaneta, também.
- Sim! você pôs uma maçan€tâ e uma Íechadura na
- É uma Íechadura que Lranca com uma chave. E pa-redes akas e {oÌtes: Ë um; porra. Umâ poÌla trancada: '
- tsrou vendo - come.rei.A casiúa balançou Ìigeiramente quando Dibs a tocou.
Deteve'se, então, a €xamináJa. Apanhou urna das divisórias,
tenrando encaixáia em um de seus canros para manrer firme
a casa. Conrinuava a oscilar. Depois, rentando colocar ; divi-
sória sob dois dos cantos, empurrou-a rcb o rerceiro canro e
a casa parou de baÌan(ar.
- Prontoi - anunciou. - Não balança mâis. Nãoteme e não balança, agota.
Ìrvantou uma parte do teÌhado, mexeu em alguns rnó-
vet. À divisóriâ escorresou e. de novo. a casinÀa oscilou.
Dibs recuou um pouco paÌa olhála. - l\.,liss Á.. ponha al-gurnâs rodinhas na base, assim ela não irá mâis tÌemer e
balançar.
* Você acha qu€ isso solucionârá o problemâ? - peÌ-gunter.
- Resolvetá - respondeu. - Resolverá, sem dúvida.Assim. ficou claro que Dibs rinha um rocabuìúio rico,
embora nào o usasse. Podia obsenar e definir problemas.
E conseguia solucioná'los. Por que desenhara uma Íechadura
com todos os acessóÍios na porta da casa de bonecas? Ás
porras Íechadas que havia enconrrado em sua vida, sem dú-
vida. o haviam impressiooado profundàmenLe.
DiÌigiu-s€ à cai:{a de areia e saltou dentro. Escolheu
alguns dos soldados que se enconravam espalhados na areia.
Ëxaminava cada um à medida que os segutava. - Dibs ga-
44
nhou uns parecidos con estes no Natal - disse-me, exibin-do-me um exemplar.
- Você ganhou soldadinhos no Natal? - repeti.
- Sim. EyarâmenLe iguais a esÌes. Bem. não exaLamen-re. Mas do mesmo Ìipo. Aqueles tèm Íuzis nâs mãos. Aque-
les têm as armas bem aqui. Eles átiram. Àrmas, âÌmâs de
v€rdade, ati!âm. Estes carregam os fuzis nos ombros. Estes
estão em posição de atiÌar. Veja. Àqui há quaEo que são
muito parecidos. E, logo ali, quato mah. Estes três com
ârmas âpontâdâs nestâ diÍeção. E âqui üm oütro igual. qra-
tro e quatro são oito. Somando tìês e mais ufn, são doze.
- Isso mesmo - concordei, enquanto ele agrupava ossoldadinhos. - Você 
pode iuntar os cohjuntos de soldados
e somálos cortetamente.
- É vetdade - Dibs {alou. Então, com hesitação,aoescentou: - Eu... 8u... Ez posso.
- Sim, você 
pode, Dibs - {alei.
- Aqueles dois homens estão com bandeiras - con-tinuou, apontando duas outras figuras. EnÍil€irou-os todos
ao lado da caixâ de areia. - Todos estes têm armas. E estãodisparando-as. Mas estão de costas para este lado.
- Você 
quer dizer que todos estão atirando na mesma
difeçâo? - 
perguntei indicando üm tanto vâgâmente nâ di
reção dos soldados.
Dibs encarou-me. Olhou para as Íiguras e inclinou a
cabeça. - LIes nào estào aLiÌando. . . em ,o.i - falou comtimeza.
- Compreendo. EIes não esrào arirando err mim.
- Ë iso mesmo - disse.Entertou a mão na âreiâ e encontrou mais alguns solda-
dos de brinquedo. Retirou-os e aliúou-os. Entertou os pés
calçados na ateia.
* Tire os sapatos {alou de repente. Desamarrou
os cordões e tiÌou os sâpatos. Então, reorganizou os sol.
- Tudo pronto. Estão em Íila, todos 
juntos. Estão
todos iuntos.
Selecionou, em seguida, tÌês soldados e preparou com
eles uma nova Íila. Com cuidado e firmeza, empurrou-os,
um a um, para denrro da areiâ. O rerceiro nào Íicou rào so
reÌÌado quanto €le desejava. Rerirou-o para reenterrilo em
um ponto mais ptofundo, apanhou um

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