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AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 6.341 DISTRITO FEDERAL RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO REQTE.(S): PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA ADV.(A/S): LUCAS DE CASTRO RIVAS INTDO.(A/S): PRESIDENTE DA REPÚBLICA PROC.(A/S)(ES): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO AM. CURIAE.: FEDERACAO BRASILEIRA DE TELECOMUNICACOES - FEBRATEL ADV.(A/S): FELIPE MONNERAT SOLON DE PONTES RODRIGUES AM. CURIAE.: BANCO CENTRAL DO BRASIL ADV.(A/S): PROCURADOR-GERAL DO BANCO CENTRAL DO BRASIL SESSÃO PLENÁRIA DO STF REALIZADA NO DIA 15 DE ABRIL DE 2020 PRESIDENTE DIAS TOFFOLI – APÓS ABERTURA DA SESSÃO PASSOU A PALAVRA PARA O RELATOR RELATOR: MARCOS AURÉLIO Medida cauteladora implementada individualmente a partir do disposto no art. 10 da Lei 9868/90, e fez tendo em conta a relevância da matéria e a urgência de haver um crivo no STF. RELATÓRIO – MINISTRO MARCOS AURÉLIO Articula com a inconstitucionalidade formal ante a disciplina, por meio de medida provisória, de matéria que alega ser reservada a lei complementar. Conforme argumenta, os dispositivos atacados implicam inovação, no texto da Lei nº 13.979/2020, quanto a providências de polícia sanitária e legitimados a implementá-las considerado o enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do chamado coronavírus. Diz em jogo questão de saúde pública, ressaltando que, na Lei Maior, a temática da vigilância sanitária e epidemiológica está no rol de atribuições do sistema único de saúde. Destaca ser o tema da saúde reservado, como gênero, à competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a teor do artigo 23, inciso II, da Constituição Federal. Aludindo ao parágrafo único do preceito, menciona a pertinência de lei complementar para a normatização da cooperação entre os entes federados, descabendo, segundo afirma, a edição de medida provisória tendo em conta o previsto no artigo 62, § 1º, da Carta da República. Frisa configurado abuso de poder, na modalidade excesso. Aponta a invalidade, por arrastamento, do Decreto nº 10.282/2020, a regulamentar a Lei nº 13.979/2020, no que definidos serviços públicos e atividades essenciais. Sob o ângulo material, aponta a competência administrativa comum, atribuída aos demais entes da Federação, voltada à adoção de medidas de isolamento, quarentena, restrição de locomoção por rodovias, portos e aeroportos, bem assim de interdição de atividades e serviços essenciais. Sustenta esvaziada a responsabilidade constitucional, atribuída a todos os entes, para cuidarem da saúde, dirigirem o sistema único e executarem ações de vigilância sanitária e epidemiológica, nos termos dos artigos 23, inciso II, 198, inciso I, e 200, inciso II, da Constituição de 1988, bem como o critério da predominância do interesse. Sublinha violada a autonomia dos entes da Federação, a revelar adequado o afastamento da exclusividade da União para dispor sobre as referidas providências. Diz do risco atinente à propagação do vírus em virtude da circulação de pessoas. Realça as dificuldades enfrentadas no tocante à implantação de barreiras sanitárias. Requer, no campo precário e efêmero, mediante ato individual a ser referendado pelo Colegiado, a declaração de nulidade, considerado vício formal e material, dos dispositivos atacados. Busca, ainda em sede de liminar, seja assentada a invalidade, por arrastamento, do Decreto nº 10.282/2020. Pretende, no mérito, a confirmação da medida acauteladora. SUSTENTAÇÃO ORAL ADV. LUCAS RIVAS – PDT (Partido Democrático Trabalhista) A ação proposta pelo PDT desafia a constitucionalidade da MP 926/2020 que promove alterações por sua vez na Lei 13.979/20, alterada pela MP objeto dessa ação, estabelece conforme diz explicitamente seu art. 1º, medidas de enfrentamento da pandemia de coronavírus. Portanto senhores ministros, a primícia que o PDT parte, e por isso entende-se que é necessário desfazer alguns equívocos que se tem cometendo no trato da matéria, é de que a Lei 13.979, dispõe na verdade sob medidas especificas, restritas a competência administrativa comum, descrita no Inciso II, do art. 23 da CF. E é por isso que ela elenca uma série de medidas como isolamento, quarentena, restrições de transporte, e assim por diante. Não obstante, o que parece certo, e é a primícia que parte o PDT, é de que a lei alterada pela Medida Provisória, tem uma carga de abstração e generalidade muito baixa, e, portanto, não se trata de uma lei editada com fundamento no inciso XII do art. 24 da Constituição que dispõe sobre competência concorrente. A primícia que se tem aqui, é, portanto, que se estar no campo da competência comum, no campo da atuação administrativa, tanto da União, quanto dos Estados, Municípios e DF. E com a devida vênia dos colegas, e de entendimentos em contrários, parece que não cabe entender como se colocou a ADI 6343, proposta pela REDE apregoada na sequência, ou na ADPF 665 da relatoria do Ministro Luiz Fux, tratar a matéria, tanto no programa normativo da Lei 13.979, quanto as alterações promovidas pela MP 926, em termos de competência concorrente, isso para nós parece um equívoco, até porque essa lei geral que estabelece providências, dispositivos, estatuições genéricas e abstratas, que aí sim, a União promove em defesa da saúde com base no inciso XII do art. 24 da Constituição, Competência concorrente, ela já existe. Que é a lei 9.782 que institui o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e a própria ANVISA, e aí sim, se trata sem dúvidas de norma geral por excelência de caráter abstrato e genérico. A Lei 13.979, alterada pela MP 926 objeto de apreciação dessa ação, por outro lado, trata especificamente dos poderes de policia sanitária, são providências de caráter administrativo concreto, e nesse sentido, peço licença desse tribunal, para lembrar do excelente firmado da relatoria do Ministro Barroso, no recurso extraordinário 658.570 de MG, em que sua excelência colocou que até existem poderes de policia que podem ser privativo ou exclusivo da União, como é o caso da classificação indicativa, como é o caso da classificação de diversões públicas previstas no inciso XVI do Art. 21 da Constituição. Mas como bem ressaltou o Ministro Barroso naquela oportunidade, não é o caso da saúde e nem do meio ambiente, nesses casos a competência é comum e portanto, existe uma coincidência de atuação e não de legiferação, entre os entes federativos que é exatamente a primícia que se fixa na ação direta proposta pelo Partido Democrático Trabalhista. É bem certo que na doutrina é preciso ressaltar alguns doutrinadores ilustres como o professor José dos Santos Carvalho Filho, que entende que esse discursão entre concorrente e comum é sem dúvida irrelevante. Todavia, outros doutrinadores ressaltam a importância, como é o caso do professor José Afonso da Silva, nesse sentido Ministro Faccin, peço uma especial atenção de Vossa Excelência, a respeito justamente da fixação da topologia constitucional do fundamento de validade da Lei 13.979 e por consequência da MP 926. Porque se trata de competência comum e não competência concorrente para não se cogitar mais por exemplo do princípio da subsidiariedade ou por exemplo das máximas, que Vossa Excelência trouxe no Recurso extraordinário 194.704 a partir do direito comparado. Se se trata de competência concorrente não há hipótese de discursão a respeito da prevalência ou não de forma geral, mas apenas de atuação e repita-se e não de legiferação conjunta dos Entes federativos. Da Mesma forma Ministra Rosa, se Vossa Excelência me permite, é preciso fazer uma distinção, até que ponto os entes federativos poderiam legislar em material de defesa da saúde, como dispõem o inciso XII do art. 24 da Constituição, e por isso, trata-se de matéria concorrente, de legislação concorrente e não de atuação comum, de competência administrativa, como se saí no inciso II do art. 23 da Constituição. E é nessesentido, Senhor Presidente, que parece inclusive, ser importante ressaltar mais uma vez essa distinção entre comum e concorrente, que parece confundir um pouco esse complexo debate entre as atuações dos Entes Federativos nas decisões proferidas por Vossa Excelência ontem, senhor presidente, nas suspensões de tutela provisória 172 e 173, se tinha na verdade uma substituição pelo poder judiciário para adoção de providências de vigilância sanitária, o que não é o caso da hipótese que se sustenta nessa ação direta de inconstitucionalidade, nessa ação direta de inconstitucionalidade o âmbito material do que se espera ser resolvido pela decisão do Supremo é o poder de polícia dos Entes federativos e não eventuais decisões, em ultima analise talvez merece um exame sobre a perspectiva do protagonismo judiciário, de qualquer maneira, é importante ressaltar que nessas suspensões de tutela provisórias deferidas ontem, o próprio Procurador Geral da República opinou favoravelmente as medidas adotadas pelos Governadores, em que pese nessa manifestação ter se pronunciado no sentido contrário. De todo modo, isso revela a complexidade do tema, mas o certo é que, fixando-se a premissa de que se discute em termos de competência comum e não concorrente, a atuação administrativa dos Estados portanto, não mediante lei, mas mediante decreto ou outros atos administrativos que se revelem cabíveis, elas nos traz o fundamento diretamente da Constituição, e por isso não pode ser objeto de restrição de Medida Provisória, como aconteceu na Medida Provisória 926. A Medida Provisória 926, a quem reside o aspecto central da sua inconstitucionalidade no ponto de vista material, na verdade redistribuiu as competências administrativas comuns do inciso II do art. 23 da Constituição, centralizando-as no Presidente da República ou através dos Órgãos reguladores, especialmente a ANVISA, mais também da ANTT ou da Agência Nacional de Transportes Aquáticos. Nesse ponto, é importante dizer que não cabe, com todas as vênias, sustentar como fez o Advogado Geral da União nos embargos opostos nessa mesma ação, dizer que a Medida Provisória é constitucional a medida que legisla sob normais gerais de trânsitos, isso porque, tanto a Lei 13.979, quanto a própria medida provisória impugnada, a medida provisória 926, na verdade trata de um tema único, isso é pacifico, consensual, não há como argumentar de outra maneira. Tratam na verdade de saúde pública, mais uma vez eu repiso é competência comum, e nesse ponto há jurisprudência pacifica no sentido de que determinadas intervenções estatais promovidas pelos entes federativos a título da competência comum, em que pesem possam tangenciar competências, inclusive legislativas, mas também comuns dos Estados, não são inconstitucionais (...). O que se tem na verdade é uma violação material da Constituição em afronta ao art. 18. O certo é que a Medida Provisória 926, quando fez alterações na lei 13.979, na verdade pretendeu realizar uma interpretação autentica da Lei 13.979 e da própria constituição, fazendo com que os destinatários das normas autorizativas de providências administrativas constantes na Lei 13.979 fosse apenas e em última análise à União, Poder Executivo Federal, em termos de poder concedente, órgãos reguladores e Presidente da República, editando os decretos. Nesse sentido, é até curioso, mas o que se revela é que a MP acabou incorrendo naquela figura clássica do Direito Constitucional, dos métodos de trabalho, da interpretação da Constituição conforme a lei, e não da lei conforme a constituição. Ou seja, se a constituição já atribuiu a um determinado destinatário, a um sujeito de direito, que são os Entes Federativos, a competência para cuidar da saúde, não pode a Medida Provisória a pretexto de interpretá-la mitigar essa competência. Para concluir, como se trata de uma questão de destinatários da norma, o Partido Democrático Trabalhista entende que não se trata de redução de texto, mas sim na forma da linha A.2 do pedido acolhido pelo Ministro Marcos Aurélio, de declaração de nulidade por vicio material, sem redução de texto dos dispositivos da MP 926, declarando-se a inconstitucionalidade, no sentido em que trata de exclusividade da União praticou sob as medidas da Lei 13.979, resguardando-se explicitamente nos termos do artigo 18 da Constituição, autonomia dos Entes Federativos para implementar medidas de politicas sanitárias, na forma como deferido pelo Ministro Marcos Aurélio, portanto, se requer o referendo da medida cautelar implementada por sua excelência. ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO – ANDRÉ LUIZ DE ALMEIDA MENDONÇA O Presidente da República, por sua vez, defende que há uma diferenciação entre as competências de legislar e as materiais administrativas. Embora seja comum a competência de “cuidar da saúde”, ela não é legislativa, a qual foi exercida, in casu, sob o disposto no art. 24, XII, da CRFB. Daí que, em seu entender, tem a Lei 13.979, de 2020, assim como as alterações feitas por medidas com força de lei, natureza de norma geral. Já no que tange à inconstitucionalidade material, o Presidente da República afirma que “o artigo 3º, caput, da Lei nº 13.979/2020, dispõe expressamente a atuação de cada autoridade, no âmbito de suas respectivas competências, quanto à adoção de medidas para o isolamento, a quarentena, e restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, no que respeita à trânsito e transporte por rodovias, portos ou aeroportos de entrada e saída do País, bem como locomoção interestadual e intermunicipal de passageiros”. No mesmo sentido, ainda, as alegações trazidas pela Advocacia Geral da União. Acrescenta que as normas, por terem caráter geral, não tolhem a autonomia dos demais entes. Aduz que, se admitida a possibilidade de intervenção de Estados, Distrito Federal e Municípios, “tal providência, decerto, causaria uma enorme instabilidade na prestação dos serviços públicos, além de clara invasão da competência do ente que titulariza o serviço, inclusive em matérias de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos”. PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA – AUGUSTO ARAS Opina o PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA pelo indeferimento da medida cautelar. VOTO DO RELATOR – MIN. MARCOS AURÉLIO Marco Aurélio argumenta que a medida provisória não contraria a Constituição porque não impede a tomada de providências normativas e administrativas por estados, Distrito Federal e municípios. Mas, apesar de não acolher o pedido de nulidade dos dispositivos da MP, o ministro acolheu o pedido para que fique explícita a competência concorrente dos entes federativos (estados, Distrito Federal e municípios) para tomar essas medidas. Acolheu parte da ação do PDT contra a Medida Provisória (MP) 926/2020. Essa medida provisória restringiu ao governo federal as competências para determinar o que são serviços essenciais e para limitar a circulação interestadual e intermunicipal de pessoas e mercadorias. Vota no sentido de referendar a medida cautelar proferida. VOTO MIN. ALEXANDRE DE MORAES É importante ressaltar que o presente julgamento não se refere a questões meramente monocráticas, meramente administrativas, de quem pode fazer isso ou de quem pode fazer aquilo. Nesse julgamento, assim como em outros, se refere a um dos alicerces do Estado Democrático de Direito, que é o federalismo e as suas regras de distribuição. Muito mais do que a discursão de quem pode mandar “A”, mandar “B”, aqui estamos discutindo a questão de um dos três alicerces do Estado Democrático de Direito. Federalismo, assim como a separação dos poderes, e a declaração de direitos fundamentais, são os três alicerces que têm a mesma finalidade, delimitação de poder. O federalismo tem exatamente essa finalidade, que é limitar o poder de um único ente. Elenasceu para repartir o poder entre as comunidades locais e a comunidade central, o poder central representado no Brasil pela União, e as comunidades locais, os Estados, assim como os Municípios e o Distrito Federal, como lembrou o Ministro Marcos Aurélio. A gravidade da crise não permite o desrespeito a Constituição, mais do que isso, nas crises é que as normas constitucionais devem ser respeitadas, na crise a Constituição deve servir de guia aos líderes políticos, para que haja cooperação, integração, exatamente para chegarmos a bom tom ao final dessa difícil caminhada para todos, para União, Estados, Municípios, para todos os brasileiros. A regra no Brasil é autonomia dos Entes locais, é autonomia dos Estados-membros e dos municípios, essa é a regra. E essa regra deve ser interpretada a partir de uma matéria principal, saúde pública nesse momento. O federalismo brasileiro é um federalismo sofrido, que nasceu com a Constituição de 1891 e que até hoje não conseguiu chegar ao verdadeiro federalismo, ao federalismo idealizado pelos Norte-americanos em 1787. Recebeu na Constituição de 1988 um fortalecimento. Há peculiaridades locais que precisam ser analisadas, e por isso, toda distribuição de competência na Constituição Brasileira, seja a distribuição de competências administrativas, seja na distribuição de competências legislativas. A distribuição de competências no federalismo brasileiro foi baseado no princípio da predominância de interesse. A partir desse princípio, interesse geral, União, interesse regional, Estados, interesse local, Municípios. A partir disso a própria Constituição já estabeleceu algumas matérias, e deixou as demais matérias, como as competências administrativas comuns e as competências legislativas concorrentes, para que fossem interpretadas de acordo com o princípio da predominância do interesse. Saúde pública, art. 23 é matéria de competência comum, de todos os Entes http://www.congressonacional.leg.br/materias/medidas-provisorias/-/mpv/141144 Federativos, e não está apenas no art. 23, no art. 194 a Constituição assim também estabelece, agora que obviamente a competência comum administrativa não significa que todos podem fazer tudo, isso gera bagunça, isso gera anarquia, o que significa a competência comum administrativa, é que a partir do princípio da predominância de interesse, a União deve editar normas, políticas públicas para a saúde pública de interesse nacional, os Estados, de interesse regional e os Municípios, visando como o próprio art. 30, inciso I estabelece, visando o seu interesse local. Não é possível que ao mesmo tempo à União queira monopólio da condução administrativa da pandemia nos mais de 5 mil municípios, isso é absolutamente irrazoável. Como não é possível também que os Municípios queiram, a partir de uma competência comum estabelecida pela Constituição, se tornarem repúblicas autônomas dentro do próprio Brasil. Fechando os seus limites geográficos, impedindo a entrada de serviços essenciais. Mas não é isso que a Constituição estabelece, a constituição estabelece exatamente a divisão de competências a partir da cooperação, chamado de federalismo cooperativo, a partir da cooperação de interesses, da predominância de interesses. No momento de crise, o que precisamos é do fortalecimento da união entre os Entes Federativos, ampliação da cooperação entre os Entes Federativos, dos três poderes. Em defesa do interesse público, o que menos precisamos é de embates judiciais entre entes federativos, para que um queira anular o que o outro fez, temos que afastar esses personalismos de diversos entes federativos, prejudiciais a condução das políticas públicas de saúde essenciais nesse momento ao combate da pandemia do COVID-19, e a própria norma impugnada pressa pela cooperação, ela pretende na sua disciplina articulação prévia entre os órgãos. Nesses termos, acompanhou a liminar concedida pelo Min. Marcos Aurélio, referendando-a, que a lei deve ser interpretada com absoluto respeito as competências dos Estados, Distrito Federal e Municípios, estabelecidos na Constituição. VOTO MIN. EDSON FACHIN A emergência internacional, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde, não implica nem muito menos autoriza a outorga de discricionariedade sem controle ou sem contrapesos típicos do Estado Democrático de Direito. As regras constitucionais não servem apenas para proteger a liberdade individual, mas também o exercício da racionalidade coletiva, isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma eficiente. O Estado Democrático de Direito garante também o que Madison chamava de liberdade pública: o direito de examinar as razões governamentais e o direito de criticá-las. Os agentes públicos agem melhor, mesmo durante emergências, quando são obrigados a justificar suas ações. O exercício da competência constitucional para as ações na área da saúde deve seguir parâmetros materiais específicos, a serem observados, por primeiro, pelas autoridades políticas. Como esses agentes públicos devem sempre justificar suas ações, é à luz delas que o controle a ser exercido pelos demais poderes tem lugar. O pior erro na formulação das políticas públicas é a omissão, sobretudo para as ações essenciais exigidas pelo art. 23 da Constituição Federal. É grave que, sob o manto da competência exclusiva ou privativa, premiem-se as inações do governo federal, impedindo que Estados e Municípios, no âmbito de suas respectivas competências, implementem as políticas públicas essenciais. O Estado garantidor dos direitos fundamentais não é apenas a União, mas também os Estados e os Municípios. A União exerce sua prerrogativa de afastar a competência dos demais entes sempre que, de forma nítida, veicule, quer por lei geral (art. 24, § 1º, da CF), quer por lei complementar (art. 23, par. único, da CF), norma que organiza a cooperação federativa. Dito de outro modo, na organização das competências federativas, a União exerce a preempção em relação às atribuições dos demais entes e, no silêncio da legislação federal, têm Estados e Municípios a presunção contra essa preempção, a denominada “presumption against preemption” do direito norte-americano. O Congresso Nacional poderá, se assim o entender, regular, de forma harmonizada e nacional, determinado tema ou política pública. No entanto, no seu silêncio, não se pode tolher o exercício das competências dos demais entes na promoção de direitos fundamentais. Nesta fundamentação, concluiu na linha do voto do eminente relator, nada obstante, assentando que concedo parcialmente a cautelar para dar interpretação conforme a Constituição, ao § 9º do art. 3º desta lei 13.979, a fim de explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos termos no inciso I, do art. 198 da Constituição, o Presidente da República, poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais. É como voto. VOTO MIN. ROBERTO BARROSO Afirmou suspeição, por motivo de fórum íntimo. VOTO MIN. ROSA WEBER Lembrou que o Brasil feio a promulgar o regulamento sanitário internacional, acordado em assembleia da ONU em 2005, trata-se do decreto 10.212. O Brasil possui uma dimensão continental, detém como Estado Federado que é, uma moldura normativa constitucional, que a juízo da Ministra Rosa Weber, permite lhe dar com a crise pandêmica, protegendo e cuidando da saúde pública com medidas que atendam as peculiaridades regionais e locais. A questão, já muito bem enfatizada, envolve como pano de fundo o federalismo e a distribuição de competências entre os Entes federados. E nesse ponto, é essencial ater-se ao sistema delineado pela nossa constituição, como forma de manutenção do ordenamento democrático e do estado de direito. O modelo federativo brasileiro, como sabemos a autonomia atribuída aos Estados não lhes dá em absoluto plenaliberdade para o exercício da competência legislativa, sendo-lhes obrigatória a observância as matérias previstas pela constituição. Embora competência legislativa concorrente mitigue os traços centralizadores delineia-se um federalismo de cooperação, com aplicação do princípio da predominância do interesse nos deveres mínimos de proteção aos direitos fundamentais. A proteção em defesa da saúde, estando diante de competência legislativa concorrente da União, Estado e o Distrito Federal, conforme comando do art. 24, inciso XII, da nossa Carta política. Assim, cuidar da saúde figura dentre as competências comuns administrativas nos termos dos artigos 23, inciso II e parágrafo único da CF. Cabe ao Brasil, valer-se da estrutura federal, exatamente para evitar o caos, o estabelecimento de parâmetros mínimos, possibilitando onde necessário, a implementação de medidas diferenciadas inclusive mais rígidas se o caso, de controle do novo coronavírus. Não detecta qualquer inconstitucionalidade por vicio formal, não se estar a tratar de normas gerais de cooperação confiadas constitucionalmente a lei complementar, mas de medidas específicas e pontuais necessárias a imediatas coordenações de ações de combate a pandemia. Nessa linha, assentada no marco do Estado democrático de direito, a imprescindibilidade da absoluta reverência pela União, pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, as liberdades fundamentais passiveis de mitigação tão somente de modo temporário em prol do direito à saúde, referendo a medida cautelar, acompanhando o relator com a interpretação conforme o art. 3º § 9º, é o voto. VOTO MIN. LUIZ FUX Em relação ao § 9º do artigo 3º, não só na figura do Presidente da República, mas também nas figuras dos executivos das demais unidades federadas, e então nesse particular, acompanho essa interpretação conforme foi originariamente confirmada pelo Ministro Edson Faccin, e depois acrescentada pelos demais, também acompanho. E também acompanho o Ministro Alexandre de Moraes, pois fiz uma proposta de voto analisando artigo por artigo no tocante a alínea B, do art. 3º, quanto a locomoção interestadual. Em suma, acompanho o voto do Ministro relator, com a interpretação conforme o § 9º, conferindo a todos os executivos das unidades federadas o poder de enumeras as atividades essenciais, devendo ouvir as agências reguladoras por falta de expertise quanto as atividades essenciais. E a interpretação conforme o Ministro Alexandre de Moraes, a alínea B do art. 3º da lei alterada pela Medida Provisória. VOTO MIN. CARMEN LUCIA Votou no sentido de referendar a cautelar que tinha sido inicialmente exarada pelo Ministro Marcos Aurélio, com esse acréscimo apenas, que era mais uma explicitação, mas que fica como acréscimo, pois consta expressamente o meu voto, conforme o § 9º do artigo 3º da Medida Provisória, é como voto senhor presidente. VOTO MIN. RICARDO LEWANDOWSKI No caso da doença em que pretendemos combater, existe um dispositivo constitucional que me parece muito pedagógico no sentido de apontar para qual seria o papel da união nesse enfrentamento, e diz o artigo 21, inciso XVIII, que cabe a União planejar e promover a defesa permanente contra calamidades públicas. Isso a meu ver, significa como disse, estabelecer regras gerais e oferecer apoio material aos demais Entes Federados, os Entes Regionais e Locais, Estados e Municípios, não podem ser alijados dessa batalha, porque tem o poder/dever de tomar as medidas necessárias para combater a doença. Porque além da competência comum, que compartilham com a união, cabe- lhes cuidar da saúde e assistência pública, e mais ainda, compete aos municípios organizar o abastecimento alimentar, nos respectivos âmbitos de atuação. Segundo dispõe o Artigo 23, inciso II e VIII do texto constitucional. E evidente, dentro dessas competências, é preciso balizar-se segundo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, e a observância desses dois critérios deve estar devidamente explicitado nas disposições dos motivos desses atos dos entes federados e da União. E esses motivos podem ser inclusive submetidos ao crivo do judiciário, especialmente quanto a sua correspondência dos fatos que alegadamente dão suporte. O federalismo cooperativo longe de ser uma peça retórica exige que seus integrantes de apoiem mutuamente, deixando de lado suas divergências ideológicas, ou partidárias, dos respectivos governantes. Federalismo cooperativo exige diálogo, exige liderança política, e a cooperação entre os entes federados a toda evidência não pode ser imposta por lei, mesmo porque a realidade fenomenológica é tão multifacetada e a evolução da pandemia é tão imprevisível e tão repleta de surpresas, que o legislador não poderia prever de antemão. Em resumo Senhor Presidente, acompanho integralmente o voto do eminente relator, referendando a liminar que concedeu, e conforme § 9º do artigo 3º da lei impugnada, é como voto. VOTO MIN. GILMAR MENDES O texto constitucional realmente nos desafia em termos de interpretação na matéria examinada nesta ADI. De um lado, há as competências privativas da União, tanto legislativas quanto administrativas. E temos também a competência legislativa concorrente da União, dos Estados e dos Municípios para legislar, como temos também as competências comuns. Estamos diante de conflito aparente de normas constitucionais. Isso porque o art. 21, XVIII, da Constituição estabelece ser competência da União planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações; ao passo que o art. 23, II, dispõe ser competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios cuidar da saúde e assistência públicas. Ademais, o art. 22, X e XI, determina ser competência privativa da União legislar sobre trânsito e transporte, bem como sobre o regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial; enquanto o art. 24, XII, estatui a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para editar normas sobre previdência social, proteção e defesa da saúde. O art. 30, I, ainda dispõe ser competência dos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local. Diante desse quadro, a União invoca os dispositivos constitucionais relativos à sua competência exclusiva, para centralizar as decisões acerca de medidas de enfrentamento da crise sanitária do Covid-19, enquanto os entes regionais e locais fundamentam-se em dispositivos de competência comum e concorrente para justificar os atos de restrição de locomoção de pessoas que vêm sendo adotados em seus âmbitos. A questão, portanto, é bastante delicada. Embora não se trate de problema propriamente novo, a repartição de competências federativas ainda suscita diversos problemas que habitualmente são analisados por este Plenário, como: i) o que são normas gerais em matéria de competência concorrente e quais os seus limites e possibilidades?; ii) em que medida entes federativos regionais e locais podem legislar sobre providências de índole administrativa necessárias ao cumprimento das leis de competência privativa da União?; iii) qual o critério de distinção entre normas de direito civil, de competência privativa da União, e legislação que promove a responsabilidade por dano ao consumidor, cuja competência é concorrente?; iv) como distinguir objetivamente o que é matéria processual (competência privativa da União) e o que é assunto relativo a procedimentos em matéria processual? Essa é uma série questões que evidencia o fato de estarmos caminhando sobre terreno nebuloso, que desperta diversas controvérsias tanto na doutrina quanto na jurisprudência, inclusive desta Suprema Corte. De qualquer modo, a relação entre União, Estados e Municípios, porém, preocupa. Independentemente do direcionamento da políticapública de saúde que se pretenda adotar, é inviável que ela seja executada sem uma articulação mínima com os Estados e Municípios. Temos visto muitas experiências exitosas nos governos estaduais, que inclusive poderiam servir de modelo nacional, mas que encontram resistência por parte do próprio Governo Federal. Sem dúvida, essa é uma discussão muito mais fácil de se fazer na teoria do que na prática. Acredito que somente na análise de situações mais concretas é que o Tribunal poderá se manifestar de maneira mais clara sobre o assunto. Acompanho o eminente relator, para assentar a competência dos entes federativos regionais e locais para adotar medidas de enfrentamento da crise de saúde decorrente do Covid- 19, notadamente no que diz respeito ao isolamento social e à quarentena, independentemente de autorização por órgão central. Ademais, na linha do proposto no voto do eminente Min. Edson Fachin, confiro interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, § 9º da Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. VOTO MIN. CELSO DE MELLO Ausência justificada. VOTO MIN. DIAS TOFFOLI Portanto, pedindo vênia, a uma maioria que vai um pouco além, no sentido de dar interpretação conforme o § 9º, artigo 3º, entendo que na decisão do relator, está conclusão já estar claro o bastante. Por isso, peço vênia, para o Ministro Luiz Edson Faccin, a partir do qual veio a interpretação conforme, e da mesma maneira aqueles que o acompanharam, conforme artigo 3º, § 9º, e da mesma maneira peço vênia ao Ministro Alexandre de Moraes e ao Ministro Luiz Fux, que também davam explicitação de interpretação conforme, em relação ao comando da Alínea B, inciso 6, do artigo 3º, introduzidos pela Medida Provisória impugnada. E portanto, proclamo o resultado, Decisão: O Tribunal, por maioria, referendou a medida cautelar deferida pelo Ministro Marco Aurélio (Relator), acrescida de interpretação conforme à Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei nº 13.979, a fim de explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais, vencidos, neste ponto, o Ministro Relator e o Ministro Dias Toffoli (Presidente), e, em parte, quanto à interpretação conforme à letra b do inciso VI do art. 3º, os Ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux. VOTO GUI PAGNOCELLI É importante observar a Constituição Federal quando a mesma, em seu art. 1º menciona os Municípios como integrantes do sistema federativo, com ênfase à autonomia local, e ao fixá- la junto com a autonomia dos estados e do Distrito Federal (art. 18 da CF). A essência da autonomia contém primordialmente a autoadministração e o autogoverno, ambos presentes em todos os entes federados. A Constituição de 1988 ao tratar sobre o assunto, se torna pouco objetiva em matéria de competências administrativas e legislativas. É difícil identificar na Constituição os limites das competências dos entes federativos em cada matéria. A Constituição fala, por exemplo, que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública. No mesmo sentido, estabelece que a saúde é direito de todos e dever do estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença, o que é a base para o Sistema Único de Saúde, que por sua vez, revela ser um sistema pensando de forma descentralizada (art. 196 CF). Relativamente ao art. 21, XVIII, da Constituição, que estabelece ser competência privativa da União planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, que a competência privativa da União no enfrentamento das catástrofes naturais não inviabiliza que as demais autoridades públicas, regionais e locais, participem e contribuam para a solução de problemas que também lhes dizem respeito. Em seu art. 23, II, a Constituição dispõe ser competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios cuidar da saúde e assistência públicas. enquanto o art. 24, XII, estatui a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para editar normas sobre previdência social, proteção e defesa da saúde. O art. 30, I, ainda dispõe ser competência dos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local. Assim, há medidas de enfrentamento de crises sanitárias que podem ser tomadas autonomamente pelos entes federativos regionais e locais, no exercício de competência que lhe é própria. Tudo isso contribui para o aprimoramento do pacto federativo, de modo que esse tipo de gestão compartilhada da saúde precisa ser estimulado e efetivamente implementado no plano concreto. Além disso, é importante registrar que a quantidade de hospitais federais é muito reduzida, de modo que a execução efetiva de medidas de saúde em hospitais públicos para combater a pandemia do Covid-19 recai sobre os Estados e Municípios, que justamente por isso têm sido cautelosos quanto às medidas de distanciamento social, para evitar um colapso do sistema público de saúde. Nesses termos, acompanho o eminente relator. Confiro interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, § 9º da Lei 13.979. Conforme a linha proposta no voto do eminente Ministro Edson Fachin.
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