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Edmarson Bacelar Mota Planejamento Estratégico 2009 © 2006-2009 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autoriza- ção por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. M917 Mota, Edmarson Bacelar. / Planejamento Estratégico. / Edmar- son Bacelar Mota. — Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009. 172 p. ISBN: 978-85-7638-922-4 1. Planejamento estratégico. 2. Planejamento empresarial. 3. Ad- ministração de empresas. 4. Cultura organizacional. 5. Gestão empresarial. I. Título. CDD 658.4012 IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br Todos os direitos reservados. Edmarson Bacelar Mota Mestre em Engenharia e engenheiro eletrônico pela PUC-RJ. Professor e Consultor em diversos programas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). su m ár io su m ár io su m ár io su m ár io Evolução e revoluçãona Administração 1111 | Administração do planejamento13 | As escolas do planejamento Estratégia e planejamento 31 estratégico – os referenciais de partida 31 | Cenários e tendências – lidando com o ambiente de negócios 33 | Pensamento estratégico, planejamento estratégico e plano estratégico 34 | Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 36 | Hierarquização e integração do processo estratégico 37 | Princípios, missão e visão Estruturação 45 45 | Etapas do planejamento estratégico 47 | Informação externa – coleta, análise e síntese 48 | Informação interna – coleta, análise e síntese 49 | Estabelecendo rumos e diretrizes gerais 51 | Planejando e organizando a condução das etapas do processo Conceitos para refletir 55 55 | O ciclo de vida de produtos 58 | Difusão da inovação 59 | Matriz BCG (Boston Consulting Group) 63 | Matriz de Shapiro Conceitospara estruturar I 71 71 | Brainstorming e variações 77 | Análise dos campos de força 79 | Fatores Críticos de Sucesso (FCS) 81 | Matrizes decisórias: TGN, GUT, Q-SORT e Ponderadas 88 | Análise SWOT (pontos fortese fracos, oportunidades e ameaças) Conceitos para estruturar II 93 93 | Posicionamento estratégico(modelo Porter) 95 | As cinco forças do ambiente de negócios (modelo Porter) 99 | O mix de marketing (os 4 Ps) 101 | Diagrama em árvore 102 | O Balanced Scorecard (BSC) Planejamento estratégico – etapa I 113 114 | Princípios, missão e visão 114 | Cenários 115 | Pesquisa, análise e “auditoria” da informação interna su m ár io su m ár io su m ár io su m ár io 116 | Pesquisa, análise e “auditoria” da informação externa117 | Análise do ambiente de negócios e segmentos associados117 | Consolidação das informações e percepções relevantes117 | Principais aspectos e desafios – análise interna118 | Principais aspectos e desafios – análise externa Planejamentoestratégico – etapa II 123 124 | Análise SWOT – pontos fortes e fracos, oportunidades e ameaças 124 | Fatores Críticos de Sucesso (FCS) 124 | Análise da concorrência (principais concorrentes) 125 | Resumo das informações relevantes 126 | Premissas relevantes 127 | Políticas, direcionamentos, finalidades e objetivos gerais Planejamento estratégico – etapa III 131 132 | Objetivos de marketing (produtos versus mercados) 133 | Objetivos diversos (qualidade, RH, tecnologia, produção etc.) 133 | Estratégias 134 | Táticas (desdobramentos “setoriais” das estratégias) 135 | Projetos – estruturação e orçamento 135 | Orçamento geral 136 | Documentação estruturada do planejamento estratégico 136 | Divulgação e esclarecimentos Exemplo de planejamento estratégico 141 141 | Introdução 141 | Missão 142 | Visão 142 | Organograma 142 | Cursos e alunos por ano 144 | Análise do macro ambiente 145 | Análise do micro ambiente 146 | Análise da concorrência 156 | Objetivos 157 | Estratégias 157 | Matriz objetivos versus estratégias 160 | Ações táticas 161 | Orçamentos 162 | Conclusões Referências 169 Anotações 171 P lanejam ento E stratégico Apresentação O “ritual” do planejamento estratégico existe em muitas organizações e empresas, dos mais dife- rentes tamanhos e setores; no entanto, os proces- sos e o grau de aderência entre o que é planejado e executado, os níveis hierárquicos ou funcio- nais envolvidos, entre outros fatores, são muito variados. Do mesmo modo, o ambiente de negócios não é o mesmo para todas as organizações. Algumas delas atuam em ambientes relativamente está- veis, outras atuam em ambientes extremamente competitivos, inovadores e imprevisíveis. Assim, para iniciar o processo de estratégia, é necessário que alguns referenciais ou elemen- tos sejam claramente estabelecidos, ajudando a estruturar as linhas básicas do planejamento estratégico. A proposta deste livro é oferecer ao leitor um conjunto de procedimentos, ferramentas e mé- todos que tornam o processo de planejamento estratégico melhor estruturado e mais confiável em relação aos seus resultados. Portanto, pensar e planejar estrategicamente auxilia na capacidade de adaptação a novos ce- nários ou eventualidades, e torna-se um meio de sobreviver e prosperar. Evolução e revolução na Administração Administração do planejamento O planejamento estratégico passou por quatro fases, que caracterizam o processo evolutivo. O quadro abaixo apresenta-as de acordo com o processo evolutivo. São elas: Quadro 1 Análise estática Análise dinâmica 1. Planejamento financeiro – Cumprir o orçamento anual. 2. Planejamento com base em previsões – Prever o fututro. 1. Planejamento orientado externamente – Pensar estrategicamente. 2. Administração estratégica – Criar o futuro. Evolução do processo de planejamento estratégico As duas primeiras fases têm ênfase em uma análise predominantemente estática e as duas últimas, em análise dinâmica. Vamos analisar cada uma delas e algumas das suas peculiaridades. Os modelos reais são híbridos, utilizando aspectos dos diversos modelos e combinando-os de acordo com as características do ambiente de negó- cios, da cultura organizacional e de preferências dos principais executivos. Planejamento financeiro Nessa fase, o planejamento é quase exclusivamente apoiado por aspec- tos do orçamento (budget) e fluxos de caixa previstos. Em um mundo “estático”, com poucas variações nos hábitos e produtos disponibilizados, o desafio que se apresenta é avaliar e administrar os ativos financeiros que podem ser utilizados, por meio de alocação de investimen- 12 Planejamento Estratégico tos oriundos de empréstimos, resultados operacionais, capitalização ou outras fontes; adicionalmente, é necessário estimar os resultados, as receitas e suas margens, de modo a prever retornos sobre o investimento e outros indicadores. O planejamento financeiro ainda é utilizado, complementando as simula- ções e análises baseadas em outros processos ou simulações de cenários. Planejamento com base em previsões A partir da década de 1950, com a maior complexidade do ambiente de negócios e concorrência mais acirrada, começaram a surgir modelos que tra- balhavam os aspectos pertinentes aos possíveis cenários e simulações com base em dados históricos. Essa abordagem, quando utilizada isoladamente, tem muitas limitações, pois as crenças em modelos mecanicistas estão cada vez mais frágeis e os resultados obtidos não geram resultados confiáveis em ambientes mutantes ou instáveis. Planejamento orientado externamente Essa forma de planejamento, predominante nas metodologias contempo- râneas, analisa basicamente os aspectos do ambiente externo, mas também do ambiente interno. A análisedo ambiente externo engloba fatores diversos como: cenários, ten- dências, concorrência, tecnologia, aspectos logísticos, entre outros. A coleta, estruturação e análise sistemática das informações externas passou a ser muito relevante e foram criados efetivamente os departamen- tos de marketing nos moldes que existem atualmente. Essa forma de planejamento segue padrões lógicos e, pela compreensão do ambiente externo e também dos aspectos internos da organização, são estabelecidos o posicionamento estratégico básico, as principais linhas es- tratégicas e os objetivos. Muitos conceitos e ferramentas foram estruturados a partir da década de 1970, especialmente os denominados modelos Porter (do especialista Mi- chael Porter). Evolução e revolução na Administração 13 Administração estratégica A partir da última década do século XX começaram a surgir modelos que destacavam a importância de criar o espaço estratégico por meio da “criação do futuro”. Essas idéias enfatizavam a importância de construir uma nova ar- quitetura de negócios e mobilizar as energias rumo a esse novo espaço. Conceitos como arquitetura, intenção e inovação estratégicas, compe- tências essenciais etc., caracterizam essa nova forma de pensar estrategica- mente. Gary Hamel e C. K. Prahalad são especialistas associados a essa fase, a mais recente de todas. As escolas do planejamento Mintzberg, um autor clássico e dos mais respeitados no âmbito da estra- tégia, em sua obra Safári de Estratégia classifica a formulação da estratégia em dez tipos, cada uma com suas peculiaridades. Na prática, os processos parecem utilizar várias delas e não apenas um dos modelos. Essa aborda- gem facilita um melhor desenvolvimento do processo estratégico. O quadro apresenta a lista de escolas, de acordo com a classificação adotada por Mintzberg. As dez escolas de pensamento sobre formulação de estratégia (MINTZBERG, 2000) A escola do design (concepção) A escola do planejamento (formal) A escola do posicionamento (analítico) A escola empreendedora (visionário) A escola cognitiva (mental) A escola de aprendizado (emergente) A escola do poder (negociação) A escola cultural (coletivo) 14 Planejamento Estratégico A escola ambiental (reativo) A escola de configuração (transformação) Vamos analisar sucintamente cada uma dessas “escolas”, caracterizando- as e destacando os principais aspectos, conforme descrito na obra citada de Mintzberg. A escola do design A escola do design representa a visão mais influente do processo de for- mação de estratégia. Seus conceitos-chave formam a base da maior parte dos cursos sobre estratégia e planejamento estratégico. Um dos conceitos mais conhecidos dessa escola é a análise SWOT1 (sigla em inglês de pontos fortes e pontos fracos, oportunidades e ameaças). Essa escola propõe um modelo de formulação de estratégia que busca atingir uma adequação entre as capacidades internas e as possibilidades externas. Várias premissas básicas sustentam a escola do design, algumas plena- mente evidentes, outras implícitas. Vejamos algumas delas: a formação da estratégia deve ser um processo deliberado de pensa- mento consciente; a responsabilidade por esse processo e controle deve ser do executivo principal, que nessa escola é o estrategista do processo; o modelo da formação da estratégia deve ser mantido simples e infor- mal e sempre explicitado; as estratégias devem ser únicas – as melhores resultam de um proces- so de design individual. A escola do design não considera certos aspectos importantes da forma- ção da estratégia, por exemplo, o desenvolvimento incremental, a estratégia emergente, a influência da estrutura existente sobre a estratégia e a plena participação de outras pessoas, além do executivo principal. Um aspecto relevante dessa escola, apesar de usualmente ser simplificado em excesso, é seu caráter informativo e objetivo. Um importante vocabulário 1 SWOT: forças (Strengths); fraquezas (Weaknesses); oportunidades (Opportuni- ties) e ameaças (Threats). Evolução e revolução na Administração 15 e um repertório de ferramentas são características marcantes e estão entre as contribuições dessa escola. Um outro aspecto é a adequação e interação estabelecidas entre as oportunidades externas e as capacidades internas. A escola do planejamento Essa escola originou-se ao mesmo tempo que a escola do design, em meados da década de 1960. Eis algumas premissas da escola do planejamento: as estratégias devem resultar de um processo controlado e consciente de planejamento formal, decomposto em etapas distintas, cada uma delineada por checklists e apoiada por técnicas; a responsabilidade por todo o processo está, em princípio, com o exe- cutivo principal; na prática, a responsabilidade pela execução é dos planejadores; as estratégias surgem prontas desse processo, devendo ser explicita- das para que possam ser implementadas por meio da atenção deta- lhada a objetivos, orçamentos, programas e planos operacionais de vários tipos. A escola do posicionamento O ano divisor de águas foi 1980, quando Michael Porter publicou o livro Competitive Strategy. Embora um livro dificilmente possa criar uma escola, este agiu como um estimulante para reunir grande parte do desencanto com as escolas do design e de planejamento, bem como a necessidade por substância. Esse livro e conceitos associados uniram uma geração de acadê- micos e consultores. Seguiu-se uma enorme onda de atividades, fazendo da escola do posicionamento, em pouco tempo, a escola dominante na área. Na verdade, a escola do posicionamento não se afastou radicalmente das premissas da escola de planejamento, ou mesmo daquelas da escola do design, mas as pequenas diferenças e os novos enfoques serviram para reorientar a literatura. Os tópicos a seguir resumem os principais aspectos que caracterizam a escola de posicionamento: 16 Planejamento Estratégico estratégias são posições genéricas, especificamente comuns e identi- ficáveis no mercado; o mercado (o contexto) é econômico e competitivo; o processo de formação de estratégia é, portanto, de seleção dessas posições genéricas com base em cálculos analíticos; os analistas desempenham um papel importante nesse processo, pas- sando os resultados dos seus cálculos aos gerentes, que oficialmente controlam as opções; as estratégias saem desse processo totalmente desenvolvidas para serem articuladas e implementadas; de fato, a estrutura do mercado dirige as estratégias posicionais deliberadamente, as quais dirigem a estrutura organizacional. Para que a escola do posicionamento focalize, de fato, a seleção de estra- tégias específicas como posições tangíveis em contextos competitivos, ela precisa ser reconhecida como mais antiga do que outra forma que se po- deria supor. Na verdade, ela é de longe a escola mais antiga de formação de estratégia, uma vez que os primeiros registros escritos sobre estratégia, que datam de mais de dois mil anos, tratavam da seleção de ótimas estratégias para posições específicas no contexto de batalhas militares. Esses escritos codificavam e expressavam a sabedoria do senso comum, a respeito das condições ideais para se atacar um inimigo e defender a própria posição. O melhor desses escritos também está entre os mais antigos: o de Sun Tzu, que deve tê-los escrito por volta de 400 a.C. Mais recente é o trabalho de Von Clausewitz, feito no século XIX. De certa forma, esses autores fizeram o que os atuais autores dessa escola fazem: delinearam tipos de estratégias e os adaptaram às condições que pareciam mais convenientes. Mas esses trabalhos não eram sistematizados, ao menos no sentido contemporâneo de dados estatísticos, e assim suas conclusões tendiam a ser expressas em termos imperativose muitas vezes subjetivos. A escola empreendedora A escola empreendedora focaliza o processo de formação da estratégia exclusivamente ou primordialmente no líder da organização, enfatizando os processos de intuição, julgamento, sabedoria e experiência, entre outros. Evolução e revolução na Administração 17 O conceito mais central dessa escola é a visão – uma representação mental da estratégia, criada ou ao menos expressa na cabeça do líder. Essa visão serve como inspiração e também como um senso daquilo que precisa ser feito, uma idéia referencial. A visão tende, com freqüência, a ser mais uma espécie de imagem do que um plano plenamente articulado, tanto em palavras como em números. Essa abordagem torna a visão mais flexível e adaptável a diversas circunstâncias ambientais, mantendo a essência. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão empreendedora da formação da estratégia. A estratégia existe na mente do líder como perspectiva, especificamente um senso de direção a longo prazo, uma visão do futuro da organização. O processo de formação da estratégia é, na melhor das hipóteses, se- miconsciente, enraizado na experiência e na intuição do líder, quer ele conceba a estratégia ou a adote de outros e a interiorize em seu pró- prio comportamento. O líder promove a visão de forma decidida, até mesmo obsessiva, man- tendo controle pessoal da implementação para ser capaz de reformular aspectos específicos, caso necessário. A visão estratégica é maleável e, assim, a estratégia empreendedora tende a ser deliberada e emergente – deliberada na visão global e emergente na maneira pela qual os detalhes da visão se desdobram. A organização é igualmente maleável, uma estrutura simples, sensível às diretivas do líder; quer se trate de uma nova empresa, uma empresa de propriedade de uma só pessoa ou uma reformulação em uma or- ganização grande e estabelecida. Muitos procedimentos e relaciona- mentos de poder são suspensos para conceder ao líder visionário uma ampla liberdade de manobra. A estratégia empreendedora tende a assumir a forma de nicho, um ou mais bolsões de posição no mercado protegidos contra as forças de concorrência direta. 18 Planejamento Estratégico A escola cognitiva Os estrategistas são, em grande parte, autodidatas. Eles desenvolvem suas estruturas de conhecimento e seus processos de pensamento principal- mente através da experiência direta. Essa experiência dá forma àquilo que eles sabem, que, por sua vez, dá forma ao que eles fazem, moldando assim sua experiência subseqüente. Essa dualidade tem um papel central na escola cognitiva, dando origem a duas alas bastante diferentes. Uma ala, mais positivista, trata o processamento e a estruturação do co- nhecimento como um esforço para produzir algum tipo de filme “objetivo” do mundo. Assim, os olhos da mente são vistos como uma espécie de câmera; ela varre o mundo, aproximando-se e afastando-se em resposta à vontade do seu possuidor, embora as mensagens que ela capta sejam consideradas, nessa escola, um tanto distorcidas. A outra ala vê tudo isso como “subjetivo”. A estratégia é uma espécie de interpretação do mundo. Aqui, os olhos da mente voltam-se para dentro, focalizando a maneira pela qual a mente faz sua “tomada” sobre aquilo que ela vê lá fora – os eventos, os símbolos, o comportamento dos clientes e assim por diante. Assim, enquanto a outra ala procura entender a cognição como uma espécie de recriação do mundo, essa ala acredita que a cognição cria o mundo. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão cognitiva da for- mação da estratégia. A formação da estratégia é um processo cognitivo que tem lugar na mente do estrategista. As estratégias emergem como perspectivas, na forma de conceitos, mapas, esquemas e molduras, que dão forma à maneira pela qual as pessoas lidam com informações vindas do ambiente. Essas informações (de acordo com a ala “objetiva” dessa escola) fluem por todos os tipos e filtros deturpadores, antes de serem decodifica- das pelos mapas cognitivos, ou (de acordo com a ala “subjetiva”) são meramente interpretações de um mundo que existe somente como é percebido. Em outras palavras, o mundo visto pode ser modelado, pode ser emoldurado e pode ser construído. Evolução e revolução na Administração 19 A escola do aprendizado Se o mundo da estratégia é realmente tão complexo como diz a escola cog- nitiva, esmagando assim as prescrições das escolas do design, planejamento e posicionamento, como então devem proceder os estrategistas? A escola do aprendizado sugere uma resposta – eles aprendem ao longo do tempo. Vejamos uma estória (MINTZBERG, 2000, p. 135,) que ilustra o conceito central da escola do aprendizado. Se você colocar em uma garrafa meia dúzia de abelhas e o mesmo número de moscas e deitar a garrafa horizontalmente, com a base virada para a janela, irá constatar que as abelhas irão persistir, até morrerem por exaustão ou fome, na tentativa de descobrir uma abertura no vidro; ao passo que as moscas, em menos de dois minutos, já terão saído pelo gargalo no lado oposto [...] É o amor das abelhas pelo vôo, é sua própria inteligência, que acaba com elas neste experimento. Elas, evidentemente, imaginam que a saída para toda prisão deve estar onde a luz brilha mais; e agem de acordo com esse raciocínio lógico. Para as abelhas, o vidro é um mistério sobrenatural [...] e, quanto maior sua inteligência, mais inadmissível, mais incompreensível parecerá o estranho obstáculo. Ao passo que as imbecis das moscas, sem pensar na lógica [...] es- voaçavam de um lado pra outro e têm a sorte que, muitas vezes, acompanha a simplicidade [...] e acabam necessariamente descobrindo a abertura que as leva de volta à liberdade. Será que temos abelhas demais fazendo estratégia e poucas moscas? Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão da escola do apren- dizado para a formação da estratégia. A natureza complexa e imprevisível do ambiente da organização, mui- tas vezes associada à difusão de bases de conhecimento necessárias à estratégia, impede o controle deliberado; a formação de estratégia precisa, acima de tudo, assumir a forma de um processo de aprendiza- do ao longo do tempo, no qual, no limite, formulação e implementa- ção tornam-se indistinguíveis. Embora o líder também deva aprender e, às vezes, poder ser o prin- cipal aprendiz, em geral é o sistema coletivo que aprende – na maior parte das organizações há muitos estrategistas em potencial. 20 Planejamento Estratégico Esse aprendizado procede de forma emergente, por meio do compor- tamento que estimula o pensamento retrospectivo para que se possa compreender a ação. As iniciativas estratégicas são tomadas por quem quer que tenha capacidade e recursos para poder aprender. Isso sig- nifica que as estratégias podem surgir em todos os tipos de funções e de diversas maneiras. Algumas iniciativas são deixadas para que se desenvolvam por si mesmas, ao passo que outras são escolhidas por defensores gerenciais que as promovem pela organização e/ou à alta administração, dando-lhes ímpeto. De qualquer maneira, as iniciativas bem-sucedidas criam correntes de experiências que podem convergir para padrões que se tornam estratégias emergentes. Uma vez reco- nhecidas, estas podem se tornar formalmente deliberadas. O papel da liderança passa a ser de não preconceber estratégias deli- beradas, mas de gerenciar o processo de aprendizado estratégico, pe- los quais novas estratégias podem emergir. Portanto, a administração estratégica envolve a elaboração das relações sutis entre pensamento e ação, controle e aprendizado, estabilidade e mudança. As estratégias aparecem primeiro como padrões do passado; mais tar- de, talvez, como planos para o futuro e, finalmente, como perspectivaspara guiar o comportamento geral. A escola do poder A escola do poder abre o jogo e caracteriza a formação de estratégia como um processo aberto de influência, enfatizando o uso de poder e política para negociar estratégias favoráveis a determinados interesses. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão da escola do poder. A formação da estratégia é moldada por poder e política, seja como um processo dentro da organização ou como o comportamento da própria organização em seu ambiente externo. As estratégias que podem resultar desse processo tendem a ser emer- gentes e assumem mais a forma de posições e meios de iludir do que de perspectiva. Evolução e revolução na Administração 21 O poder micro vê a formação da estratégia como a interação, por per- suasão, barganha e, às vezes, confronto direto, na forma de jogos po- líticos entre interesses estreitos e coalizões inconstantes, em que ne- nhum predomina por um período significativo. O poder macro vê a organização promovendo seu próprio bem-estar por controle ou cooperação com outras organizações, através do uso de manobras estratégicas, bem como de estratégias coletivas em vá- rias espécies de redes e alianças. A escola cultural Coloque o poder diante de um espelho e a imagem invertida que você vê é a cultura. O poder toma a entidade denominada organização e a fragmen- ta; a cultura junta uma coleção de indivíduos em uma entidade integrada chamada organização. De fato, o poder focaliza principalmente o interesse próprio e a cultura, o interesse comum. Analogamente, a formação da estratégia como um processo enraizado na força social da cultura espelha a escola do poder. Enquanto uma lida com a influência de políticas internas na promoção de mudanças estratégicas, a outra preocupa-se em grande parte com influência da cultura na manuten- ção da estabilidade estratégica e, em alguns casos, resistindo ativamente às mudanças estratégicas. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão da escola cultural. A formação da estratégia é um processo de interação social baseado nas crenças e nas interpretações comuns aos membros de uma organização. Um indivíduo adquire essas crenças com um processo de aculturação ou socialização, o qual é em grande parte tácito e não-verbal, embora seja, às vezes, reforçado por uma doutrinação mais formal. Os membros de uma organização podem descrever apenas parcial- mente as crenças que sustentam sua cultura, ao passo que as origens e explicações podem permanecer obscuras. A estratégia assume a forma de uma perspectiva, acima de tudo, en- raizada em intenções coletivas (não necessariamente explicadas) e 22 Planejamento Estratégico refletida nos padrões pelos quais os recursos ou capacidades da or- ganização são protegidos e usados para sua vantagem competitiva. Portanto, a estratégia é melhor descrita como deliberada (mesmo que não seja plenamente consciente). A cultura e, em especial, a ideologia, não encorajam apenas as mudan- ças estratégicas como também a perpetuação da estratégia existente; na melhor das hipóteses, elas tendem a promover mudanças de posi- ção dentro da perspectiva estratégica global da organização. A escola ambiental Os que são favoráveis a essa escola ou visão do processo estratégico tendem a considerar a organização como uma entidade passiva, reagindo a um am- biente que estabelece a pauta e dita o ritmo. Isso reduz a geração da estratégia a uma espécie de processo de espelhamento e “adaptação”. A escola ambiental provém da denominada Teoria da Contingência, a qual descreve as relações entre determinadas dimensões do ambiente e atributos es- pecíficos da organização. Por exemplo: quanto mais estável o ambiente externo, mais formalizada a estrutura interna. Mais tarde, essas idéias foram estendidas à geração da estratégia – por exemplo, quais ambientes estáveis favoreciam mais planejamento. Alguns postulavam que as condições externas forçavam as orga- nizações para determinados nichos: a organização fazia aquilo que seu ambien- te “mandava”, ou era eliminada. Essa opção era tirada da organização e de sua liderança e posta nas mãos daquilo que era chamado ambiente. Enquanto isso, outros afirmavam que as pressões políticas e ideológicas exercidas pelo ambien- te reduziam a opção estratégica, mas não a eliminavam. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão da escola ambiental. O ambiente, apresentando-se à organização como um conjunto de forças gerais, é o agente central no processo de geração de estratégia. A organização deve responder a essas forças ou será “eliminada”. A liderança torna-se um elemento passivo para os fins de ler o ambien- te e garantir uma adaptação adequada pela organização. As organizações acabam se agrupando em nichos distintos do tipo ecológico, posições nas quais permanecem até que os recursos se tor- nem escassos ou as condições demasiado hostis. Então elas morrem. Evolução e revolução na Administração 23 A escola de configuração A escola de configuração, na realidade, é de configuração e transforma- ção. Há dois aspectos relevantes a considerar. O primeiro é como as diferen- tes dimensões de uma organização se agrupam sob determinadas condi- ções para definir estados, modelos ou tipos ideais. Por exemplo: organizações recém-formadas, em especial em indústrias emergentes, tendem a depen- der de líderes empreendedores e estratégias visionárias, operando em estru- turas relativamente simples. O segundo é como esses diferentes estados são seqüenciados ao longo do tempo para definir estágios, períodos e ciclos de vida organizacionais. À medida que a organização empreendedora envelhe- ce e seu ambiente de negócios se acomoda na maturidade, o estágio inicial dá lugar a uma estrutura mais formalizada sob os assim chamados gerentes profissionais, que dependem de processos de planejamento. Vejamos um resumo das premissas subjacentes à visão da escola de configuração. Na maior parte das vezes, uma organização pode ser descrita em termos de algum tipo de configuração estável de suas características – para um período distinguível de tempo, ela adota uma determinada forma de estrutura adequada a um determinado tipo de contexto, o que faz com que ela se engaje em determinados comportamentos que dão origem a um conjunto específico de estratégias. Esses períodos de estabilidade são ocasionalmente interrompidos por algum processo de transformação – um salto para outra configuração. Esses estados sucessivos de configuração e períodos de transforma- ção podem se ordenar ao longo do tempo em seqüências padroniza- das, por exemplo, descrevendo ciclos de vida de organizações. A chave para a administração estratégica é, não apenas, sustentar a estabilidade ou, no mínimo, as mudanças estratégicas adaptáveis a maior parte do tempo, mas, também reconhecer periodicamente a necessidade de transformação e ser capaz de gerenciar esse processo de ruptura sem destruir a organização. O processo de geração de estratégia pode ser de concepção concei- tual ou planejamento formal, análise sistemática ou visão estratégi- ca, aprendizado cooperativo ou politicagem competitiva, focalizan- do cognição individual, socialização coletiva ou a simples resposta às 24 Planejamento Estratégico forças do ambiente; mas cada processo deve ser encontrado em seu próprio tempo e contexto. Em outras palavras, as próprias escolas de pensamento sobre formação de estratégia representam configura- ções particulares. As estratégias resultantes assumem a forma de planos ou padrões, po- sições ou perspectivas ou meios de iludir; porém, mais uma vez, cada qual a seu tempo e adequado à sua situação. Podemos concluir que o planejamento estratégico para ser mais efetivo não deve seguir apenas uma linha conceitual ou metodológica,mas adap- tar-se a diferentes enfoques, culturas e circunstâncias do ambiente externo à organização e também do ambiente interno. Saber lidar com os diferentes enfoques e integrá-los em formato que contribua para a abordagem estra- tégica, de sua concepção até a implementação de ações e controles associa- dos, é, sem dúvida, um grande sinal de maturidade estratégica. Ampliando seus conhecimentos Leitura do livro: MINTZBERG, Henry; AHL STRAWD, Burce; LAMPEL, Joseph. Safári de es- tratégia: um roteiro pela selva do planejamento estratégico. Porto Alegre: Bookman, 2000. Bom projeto garante só 10% do sucesso do negócio Para a americana Poonam Sharma, autora de livros sobre empreendedores de Harvard, ter um bom projeto é apenas 10% do jogo. A questão é saber como trans- formá-lo num negócio bem-sucedido. Nessa entrevista, ela dá algumas pistas (SOMOGGI, 2003) Mesmo antes de se formar em economia em Harvard em 1999, a ameri- cana de origem indiana Poonam Sharma começou a promover o que chama de espírito empreendedor. Dos 20 aos 22 anos foi diretora do Clube dos Em- Evolução e revolução na Administração 25 preendedores de Harvard, uma organização que reúne alunos que se interessam pelo assunto e que querem abrir a sua empresa. Na época, escreveu o livro The Harvard entrepreneurs club – guide to starting your own business (O clube dos empre- endedores de Harvard – um guia para começar seu negócio próprio, sem tradução para o português). Nele discutia, entre outras coisas, como ter uma boa idéia e quais são os principais mitos de quem quer abrir um negócio próprio. Desde então, Poonam trabalhou numa prestadora de serviços para star- tups, num negócio de private equity e hoje, aos 25 anos, está numa empre- sa de pesquisas de investimentos em Nova York. Nesta entrevista exclusiva a Novos Negócios, Poonam usa muito do que já ouviu para responder algumas das principais dúvidas de quem pensa em seguir vôo solo. Como ter uma boa idéia de negócio? Uma boa idéia é aquela que permite que se faça algo melhor ou de forma mais barata do que aquilo que já existe. Ou que atenda a um mercado es- quecido ou ainda que satisfaça a uma necessidade que ninguém tinha antes. Curiosidade e capacidade de resolver problemas são as características mais fortes das pessoas que têm boas idéias. Para isso, é preciso ter a mente aberta para absorver tudo o que acontece ao seu redor, e não apenas no seu grupo. Quem está sempre em contato com gente diferente pode tirar proveito da di- versidade e aprender a encarar situações do ponto de vista do outro. Também é importante tentar entender como as coisas funcionam e questionar por que não poderiam ser diferentes. Por último, pense que se para você algo é uma necessidade, para os outros também pode ser. Em seu livro, você mostra que há dois caminhos na busca pela idéia perfeita. No primeiro, a idéia nasce de dentro para fora. No outro, o mo- vimento é con trário. Qual é o mais eficiente? A tática de dentro para fora envolve a identificação de quais são as suas habilidades e da procura de qual problema você pode resolver melhor com elas, trazer aquilo que você aprendeu no mercado e aplicar. Já na tática de fora para dentro, você seleciona um mercado-alvo, identifica um problema e encontra uma forma de resolvê-lo. Não dá para dizer qual das duas é mais eficiente. Por um lado, a expertise em determinado mercado facilita a identi- ficação de problemas que precisam ser resolvidos e possibilita que se tenha idéias originais. Por outro, a perspectiva de quem está de fora pode resolver velhos problemas por meio de novas formas de pensar. 26 Planejamento Estratégico Por que é tão difícil fazer uma boa idéia se transformar num negócio bem-sucedido? Um dos maiores mitos do empreendedorismo é de que uma boa idéia é o que basta. Não é verdade. Ela é 10% apenas do jogo. A execução é a parte crucial. Há inúmeras novas tecnologias interessantes que nunca decolam, produtos que não são colocados no mercado de forma correta, negócios que falham porque as pessoas não os administraram da maneira certa. Conhecer as condições do mercado e ter estratégia são a chave. Além disso, a execução apropriada exige planejamento, acompanhamento, paciência e muito traba- lho duro. Pesquisas mostram que a maioria dos novos negócios quebra no pri- meiro ano. Como evitar que isso aconteça? Acho importante estudar os seus concorrentes bem-sucedidos, mas tam- bém aqueles que falharam. Somos levados a acreditar que é fácil porque só temos notícias do que deu certo. Todos dizem que devemos aprender com os próprios erros. Acho que temos que aprender com os erros dos outros. E, de forma geral, a maioria dos empreendedores falham em três pontos. Finanças: os empreendedores não investem dinheiro suficiente ou subestimam o tempo que o negócio vai demorar a dar lucro. No final, ficam sem dinheiro. Timing: alguns ficam tão empolgados com a sua idéia ou com o seu produto, que deixam de considerar as condições do mercado. Ou, às vezes, ignoram as mudanças do mercado ao longo do tem- po, o que altera a competitividade do seu negócio. Pessoas: é comum que elas sejam avaliadas da maneira errada. Por que você aconselha que amigos nunca se tornem sócios? Amigos podem ser os melhores sócios se tiverem as melhores habilidades para assumir essa posição. O que eu defendo é que ninguém deve fazer uma sociedade com alguém só porque ele é seu amigo. Escolha seus sócios com base nas suas habilidades, na sua dedicação, na sua seriedade, e não na sua amizade. É claro que trabalhar com amigos parece divertido, mas também abre a possibilidade de que as pessoas abusem da amizade e esperem que não sejam responsabilizadas por suas ações. Evolução e revolução na Administração 27 Como definir o limite entre amizade e negócios? Honestidade é sempre importante, bondade não. Quando há necessidade de tomar decisões difíceis, a tendência deve sempre ser a de proteger os inte- resses da empresa. Uma boa forma de não deixar a amizade influenciar as de- cisões é pensar no que você faria se a pessoa envolvida não fosse sua amiga. Você afirma que a idade faz pouca diferença na hora de empreender. A experiência não continua a ser fundamental? A melhor hora para começar um negócio é quando você é jovem, porque o idealismo está mais forte do que nunca e porque as suas obrigações e respon- sabilidades são menores. Mas não se pode negar que aos mais novos pode faltar a experiência do mundo dos negócios e a credibilidade que ela dá. Os jovens empreendedores precisam andar numa linha tênue entre concordar com conselheiros mais experientes e ter autoconfiança suficiente para manter as suas próprias convicções. Eles devem compensar a falta de experiência se cercando das pessoas certas. Você aponta como uma das características dos bons empreendedores a capacidade de se recuperar de um fracasso. Qual é a melhor forma de fazer isso? Acho que é fundamental separar as suas ações de você mesmo. O fracasso deve ser encarado apenas como uma lição para aprender e um outro proble- ma para resolver. É assim que os empreendedores crescem. Muita gente acredita que os únicos que se dão bem são os filhos de bilionários ou de pessoas influentes. Isso é um mito? É claro que segurança financeira e conexões familiares ajudam na hora de abrir um negócio. Mas há muitos empreendedores que começaram sem nenhum suporte desse tipo. Acredito que a essência do empreendedor nada tem a ver com a sua origem e sim com o que vem de dentro dele. A falta de suportes externos não deve impedir que alguém aspire seus objetivos. O empreendedor deve ser necessariamente um líder? Um empreendedor começa do nada e constrói uma organização ao seu redor. Ainda que nem todo empreendedor seja um líder fantástico, ele pre-cisa ter habilidade para inspirar pelo menos algumas pessoas para que elas trabalhem na sua idéia, confiem na sua visão e o sigam, algo que pode até 28 Planejamento Estratégico fracassar. Se o empreendedor não for capaz de ganhar a confiança dos outros, possivelmente o negócio não sairá do chão. Qual é a hora de desistir? Ao embarcar num negócio novo é importante considerar os custos de oportunidade envolvidos. Meu conselho é perguntar a si mesmo quanto você está disposto a perder. E, então, parar para refletir quando você chegar nesse ponto. Por que, na sua opinião, Madonna é um bom exemplo de espírito empreendedor? Empreendedorismo é uma arte, não uma ciência. Madonna é o seu próprio produto. Tem feito um marketing eficiente em muitos mercados por vários anos porque analisa o mercado da música pop, antecipa novas tendências e envolve seus consumidores (seus fãs) com uma versão melhorada dela mesma de tempos em tempos. Algumas pessoas têm dificuldades em dar o primeiro passo. Por quê? Seres humanos têm horror da rejeição. Ficam paralisados com o medo de que algo não vai dar certo. Com isso, em muitos casos, algumas pessoas nem tentam. Meu único conselho nessa situação é: tente ser honesto com você mesmo. Um empreendimento é um grande compromisso. Como na busca de qualquer tipo de excelência, ninguém melhor do que você mesmo para se motivar. Para se sentir comprometido e para dar o seu melhor. Quais são as características essenciais dos empreendedores de su- cesso? Não há um teste que aponte quais empreendedores terão sucesso, mas o espírito empreendedor tem alguns elementos fundamentais. Número 1 – automotivação: os empreendedores sempre fazem as coisas acontecerem. Eles definem onde querem chegar ou o que querem fazer, e perseguem esse objetivo. Não precisam de ninguém para incitá-los a agir, pois têm uma con- fiança interior, um compromisso com sua visão. A idéia é o combustível que faz a automotivação funcionar. Número 2 – filosofia do risco estratégico: há um mito que diz que os empreendedores amam risco, que eles são “super- homens” que ignoram a prudência. Mas não é o que acontece normalmen- te. Os empreendedores mais bem-sucedidos simplesmente administram o Evolução e revolução na Administração 29 risco de forma diferente. Ao pensar estrategicamente, planejando seus passos com antecedência, conseguem aumentar o risco que podem tolerar. Número 3 – autoconhecimento: é importante que o empreendedor seja honesto com ele mesmo sobre as suas forças e fraquezas. Identificar pontos fracos lhe dá a oportunidade de unir forças com pessoas cujas habilidades complementam as suas. Atividade de aplicação 1. Reflita sobre as diversas escolas do planejamento e analise o seu am- biente de negócios e sua organização. Agora responda: Quais escolas ou estilos de planejamento são mais adequados a esse ambiente em que você atua? Por quê? Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida Cenários e tendências – lidando com o ambiente de negócios O ambiente de negócios, em especial os aspectos da sociedade intensiva em serviços, tendo como maior ativo o conhecimento, apresenta diversas macromudanças (quadro 1) que devem ser consideradas no momento da elaboração da estratégia e seus desdobramentos. Quadro 1 – Macromudanças Globalização Informação Tecnologia Tamanho e velocidade Padronização (Des) Regulamentação Modelos de gestão Nível de conhecimento (pessoas) Criatividade e inovação Formas de trabalho Formas de vínculo/remuneração Alianças e parcerias Qualidade 32 Planejamento Estratégico Marketing E-commerce Organização virtual O “tamanho” do estado Revolução na educação Emergência do terceiro setor Especialista versus generalista Equipes autogerenciadas As estratégias podem e devem ser adaptadas aos aspectos diversos do ambiente de negócios; por exemplo: turbulência ou serenidade, expansão ou estabilidade, pouca ou muita concorrência, muita ou pouca regulamen- tação etc. As diversas escolas ou formas de estruturação do processo estratégico nos orientam sobre a forma de agir e a multiplicidade de influências e estilos de condução que podem ocorrer. Esses aspectos são fortemente influencia- dos pela cultura organizacional, modelo de gestão, lideranças atuantes, ciclo de vida, organização e muitos outros fatores. Uma outra questão é pertinente aos cenários. Em um mundo com poucos ambientes de negócios que gozam de relativa estabilidade, o paradigma é a mudança e então ficam as perguntas – quais as mudanças prováveis? Em quais cenários poderão ocorrer? Quais as características desses cenários e quais são os mais prováveis? Como a concorrência poderá se comportar nesses novos ambientes de negócios? As perguntas e dúvidas são muitas e as respostas poucas e incertas. Há na literatura especializada, gerada a partir da década de 1970, livros com diversos enfoques ao tema cenários. As abordagens seguem por diver- sos caminhos, com enfoques objetivos, subjetivos e probabilísticos. Os estra- tegistas organizacionais não podem realizar a análise do ambiente externo sem incluir o estudo dos possíveis cenários e seus impactos prováveis no am- biente de negócios. Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 33 Pensamento estratégico, planejamento estra- tégico e plano estratégico A figura 1 apresenta as diversas fases e peculiaridades relevantes do pro- cesso estratégico: pensamento ou postura estratégica, planejamento estra- tégico e o plano estratégico (o documento). Figura 1 Pensamento estratégico Postura, iniciativa, percepção, intuição, “cultura”, visão, experiência, liderança, busca do “norte”, timing. Planejamento estratégico Metodologia, etapas, desafio intelectual, participativo, busca do com- prometimento, visão do negócio e proces- sos, consistência, coerência etc. Plano estratégico Documento, síntese, boa comunicação, conectividade, objetividade, sinalizações. Cada uma dessas fases tem suas peculiaridades. É importante destacar o fato de cada uma delas ser mais restritiva ou seletiva do que a fase anterior; ou seja, na fase do pensamento estratégico há um processo amplo e aberto, permitindo opções e alternativas diversas; já o planejamento estratégico, usualmente, segue rituais e apóia-se em formulários e procedimentos es- truturados, ferramentas e técnicas para consolidação de informações etc. O plano estratégico é o documento que oficializa e divulga o que efetivamente foi decidido para ser realizado pela organização. De certo modo, há correlação parcial das diversas fases com os níveis hie- rárquicos da organização: 34 Planejamento Estratégico Alta administração pensamento ou postura estratégica Média gerência planejamento estratégico Gerências operacionais plano estratégico, sua implementação e desdobramento operacionais Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida Para dar partida ao processo estratégico, é necessário que alguns refe- renciais sejam claramente estabelecidos, tais como os valores organiza- cionais, premissas, políticas e diretrizes gerais. Esses elementos ajudam a estruturar as linhas básicas e possíveis da estratégia e o processo de planejamento estratégico. Um outro aspecto relevante é a compreensão do “negócio em que estamos”. O quadro 2 apresenta uma reflexão crítica sobre “o que é o nosso negó- cio”, na qual fica muito clara a importância de refletir sobre esse aspecto e ter respostas claras à respeito; a abordagem do saudoso Peter Drucker é muito objetiva. A outra afirmativa, de Charles Revson, fundador da Revlon, mostra as percepções de um negócio da fábrica ao ponto-de-venda. Quadro 2 Qual é onosso negócio? “A questão é que tão raramente perguntamos ao menos de forma clara e direta ou dedicamos um estudo e uma reflexão adequada sobre o assunto, que esta pode ser, talvez, a mais importante causa do fracasso dos negócios.” Peter Druker Qual é o nosso negócio? “Na fábrica produzimos cosméticos, nas lojas vendemos esperança.” Charles Revson – Revlon Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 35 O quadro 3 sintetiza a importância de ter respostas claras a diversas refle- xões, de modo a dar clareza aos caminhos que a organização deve seguir e o seu âmbito de atuação. Quadro 3 A definição do negócio não é tão óbvia quanto a maioria das pessoas pode pensar. Enquanto buscamos identificar de fato o negócio, incorremos em muitas perguntas que precisam ser respondidas antes que nosso fim maior seja atingido. Na verdade, a definição do negócio é a determinação de seu âmbito de atuação. Os quadros 4 e 5 mostram diversas visões de negócio de diversas organi- zações, destacando como podem ser vistas em formato restrito ou estratégi- co. Essa diferença, ou melhor dizendo, essa amplitude, pode ser vital para a adoção de referenciais de partida mais adequados. Quadro 4 Qual o negócio da Arisco? Atlas? Petrobras? Estrela? Kopenhagen? Localiza? Quadro 5 Empresa Visão restrita Visão estratégica Arisco temperos alimentos Atlas elevadores transportes Petrobras combustíveis energia Estrela brinquedos diversão Kopenhagen chocolates presentes Localiza aluguel de carros soluções em transportes 36 Planejamento Estratégico Hierarquização e integração do processo estratégico O processo estratégico pode atuar nas diversas dimensões e hierar- quias organizacionais. Cada nível tem sua responsabilidade característi- ca, assim como um modus operandi estabelecido para dar mais efetivida- de aos seus processos. A figura 2 apresenta o triângulo da mudança, conforme proposto por Mintzberg, para traduzir o modo como os diversos tipos de mudança atuam na hierarquia organizacional. Figura 2 Mudança radical Mudança orgânica Mudança sistemática Mudança radical – grandes guinadas de rumo ou estratégias normal- mente acontecem ou são validadas pelo “topo” organizacional. Dificil- mente uma mudança drástica ou ruptura com padrões estabelecidos poderá ocorrer sem esse apoio. Mudança sistemática – aquela que ocorre dentro de padrões ou pa- radigmas estabelecidos ou definidos pelos procedimentos, normal- mente ocorre na média gerência. Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 37 Mudança orgânica – aquela que caracteriza os movimentos contínu- os e expectativas apoiadas em efeitos “sociais” no contexto da orga- nização, em geral ocorre mais vigorosamente nas “bases” ou áreas de gerência operacional. Princípios, missão e visão As crenças, valores e princípios (quadro 6) formam um referencial “forte” para um processo estratégico mais coerente e com maior probabilidade de sucesso. Quadro 6 Crenças: desejos, mitos, intenções. Valores: a “prática”, o “dia-a-dia”. Princípios: declarações com finalidades “práticas e objetivas”, em ge- ral para diversos públicos (stakeholders). Conectividade com a cultura organizacional? Um outro elemento importante é a visão (quadros 7 e 8). Por meio de uma visão estimuladora e apoiada em “venda” e aceitação efetiva, é possível criar a energia emocional e o direcionamento rumo ao futuro. É como se estivés- semos energizando a cultura organizacional rumo a novos desafios, estrutu- rais e de mercado, que compõem um delineamento para os resultados que deverão ser atingidos pelas estratégias. Quadro 7 Visão Certa vez, perguntaram a Michelângelo como conseguia fazer esculturas tão belas. Ele respondeu: “Eu pego um bloco de pedra e a estátua já está dentro; eu só tiro o excesso”. 38 Planejamento Estratégico Quadro 8 Exemplos de visão Martin Luther King: “Eu tenho um sonho [...]” John Kennedy “Até o final desta década levaremos o homem à Lua e o traremos de volta, a salvo.” TAM “Ser a maior e a mais lucrativa empresa de transportes aéreos.” Petrobras 2010 – abril 2003 “A Petrobras será uma empresa de energia com forte presença internacio- nal e líder na América Latina, liberdade de atuação de uma corporação inter- nacional e foco na rentabilidade e responsabilidade social.” O quadro 9 conceitua os principais elementos que compõem a missão e podemos observar no quadro 10 diversos exemplos disso. Quadro 9 – Principais elementos Missão Tem característica predominantemente qualitativa e filosófica. Os seguintes aspectos devem ser abordados. Objetivos gerais. Definição do negócio. Competência distintiva. Indicações para o futuro, o que a organização fará e o que a organi- zação nunca fará. Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 39 Quadro 10 – Exemplos Embrapa Gerar, promover e transferir conhecimento e tecnologia para o desenvolvi- mento sustentável dos segmentos agropecuário, agroindustrial e florestal, em benefício da sociedade. Pronto-socorro de um hospital (EUA) Transmitir confiança aos aflitos. Exército da salvação (a mesma desde sua criação, há 180 anos) Transformar os rejeitados em cidadãos. Os referenciais de partida no processo estratégico envolvem basicamen- te conhecer e praticar as diversas etapas e estágios, que são: pensamento estratégico, planejamento estratégico e plano estratégico. Deve-se incluir também a clareza sobre os princípios, missão e visão. Ampliando seus conhecimentos Leitura do livro: TIFFANY, Paul; PETERSON, Steven D. Planejamento estratégico. Rio de Janei- ro: Campus, 1998. O exemplo está dentro de casa Criadora do benchmarking, a matriz da Xerox determinou: a filial brasileira é um modelo de eficiência a ser copiado pelo grupo (BREITINGER, 1996) No final do ano passado, uma centena de executivos americanos da Xerox reuniu-se na cidade texana de Dallas, nos Estados Unidos, para assistir a uma 40 Planejamento Estratégico palestra do presidente da subsidiária brasileira, o capixaba Carlos Salles. Eles tentavam entender por que a Xerox do Brasil é considerada, pelo presidente mundial, o americano Paul Allaire, um modelo de eficiência a ser copiado nas outras 111 filiais do grupo. Para aqueles que, como o próprio Allaire, tinham mais de vinte anos de casa, a pregação de Salles soava extremamente fami- liar. O jeito brasileiro de fazer negócios nada mais é do que a aplicação dos cânones em voga na própria Xerox nos anos 1960. De lá para cá, a matriz ex- perimentou vários modelos e teorias de administração em busca de um ca- minho para driblar a crescente concorrência. O resultado é que a sucessão de doutrinas fez a empresa perder seu foco, abrindo espaço para os concorrentes japoneses. No Brasil, porém, a companhia passou ao largo das novidades e continuou crescendo. Em 1995, deu um salto. Suas vendas aumentaram 34%, chegando a 1,4 bilhão de dólares. “Sempre fugimos dos modismos por aqui”, afirma Salles. Durante anos, Salles e seu antecessor, o sueco Gunnar Vikberg, hoje apo- sentado, fizeram malabarismos para driblar as ordens dos seus chefes basea- dos em Stamford, Connecticut. Valia tudo, desde dizer que iam aplicar os novos mandamentos e simplesmente ignorá-los até inventar dúvidas e mais dúvidas, atribuindo a elas a responsabilidade pelo atraso das mudanças. Foi assim, por exemplo, quando a matriz começou a dar ordens para que a subsidiária aban- donasse a estrutura descentralizada de filiais para adotar o novo modelo esco- lhido para os Estados Unidos. A direção brasileira, ao contrário, acreditava que a melhor estrutura para a subsidiária era a que já estava em uso, baseadaem unidades que prestavam atendimento integral aos clientes. “Qualquer mudan- ça só iria atrapalhar”, afirma Salles, 56 anos, que está no comando da subsidiária desde 1987, época em que a empresa faturava 600 milhões de dólares anuais. A decisão foi protelada por tanto tempo que a matriz acabou desistindo. “Hoje ela quer adotar o modelo brasileiro, isto é, voltar ao padrão antigo”, diz Salles. Rebeldia O sinal de que a subsidiária deveria ser copiada pelos americanos não po- deria ser mais explícito. Em janeiro passado, durante a reunião anual para premiar os melhores resultados, Salles arrematou todos os oito troféus de de- sempenho oferecidos pela matriz. Ganhou o primeiro lugar em atendimento aos clientes, marketing, finanças, terceirização, engenharia, satisfação dos em- pregados e desempenho global. E também um prêmio inédito de melhor de- Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 41 sempenho em todo o mundo, criado especialmente para a operação brasilei- ra. Um detalhe: a matriz da Xerox foi a criadora do conceito de benchmarking, que autoriza a cópia sem a menor cerimônia das melhores práticas empresa- riais. A novidade, agora, é que o benchmarking é feito dentro de casa. Além dos louros, a subsidiária recebeu outros indicadores de que os olhos da corporação estão voltados para cá. Atualmente, há um grupo de dezesseis executivos brasileiros espalhados pelo mundo. Entre eles, está Sedat Ozmen, que no Brasil ocupava a diretoria executiva de marketing e agora ficará base- ado em Londres para cuidar da operação do Oriente Médio e da África, em processo de reestruturação. Edmund Burke, outra cria da Xerox brasileira, é o segundo homem da área de serviços técnicos da matriz. “Temos mais solicita- ções de executivos do que podemos atender”, afirma Salles. A Xerox foi criada nos Estados Unidos no fim dos anos 1950, e sua primeira copiadora chegou ao mercado em 1959. Foi um furor. A companhia cresceu e começou a estruturar-se em filiais que cuidavam de todas as necessidades dos clientes de sua região. A grande virtude desse modelo era a descentralização e a flexibilidade. “É muito mais fácil manobrar uma frota de barcos de pesca do que um transatlântico”, diz Salles. Isso durou até a década de 70. Na época, o crescimento da companhia fez com que os executivos americanos começas- sem a repensar o modelo. A centralização logo ganhou força, sob a alegação de que era necessário cortar custos administrativos. Ou seja, a auto-suficiên- cia da frota de barquinhos foi por água abaixo. Uma das conseqüências foi o inchaço das estruturas de apoio. Departamentos como o de planejamen- to estratégico e o de controle ganharam poder, em detrimento das áreas de operações. Na busca de soluções para a crise, executivos de fora passaram a ser contratados para os cargos mais altos, afastando a empresa de sua cultura original, que era a de dar preferência ao pessoal interno. É bem verdade que a Xerox não foi a única a tomar essas decisões. Boa parte do PIB americano seguiu pelo mesmo caminho. O resultado dessas mudanças é conhecido. A partir de 1972, quando caducou a patente da máquina xerográ- fica, os japoneses invadiram os Estados Unidos. A reação da Xerox mostrou-se equivocada. A empresa passou a concentrar-se em grandes máquinas, produ- zidas para grandes clientes. O erro estratégico custou-lhe a perda da hegemo- nia no ramo de copiadoras. A Xerox começou a perder posições até chegar a deter pouco mais de 20% do mercado americano. Os japoneses, por sua vez, conquistavam as grandes companhias a partir das suas pequenas copiadoras. 42 Planejamento Estratégico “O problema da matriz foi confundir máquinas pequenas com clientes peque- nos”, diz Salles. No Brasil, ele conseguiu manter a produção dos equipamentos menores, a contragosto dos chefões. A rebeldia foi favorecida pelo tamanho reduzido da subsidiária em relação ao resto do mundo. Além disso, a América Latina, nos anos 1970 e 1980, não era prioridade da corporação. Só depois que a filial brasileira chegou ao ter- ceiro lugar em vendas, em 1993, atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão (cujas receitas, em 1995, foram respectivamente de 7,5 bilhões e 5,2 bilhões de dólares), é que começou a merecer um acompanhamento especial. Para chegar a esse tamanho, a Xerox do Brasil aproveitou ao máximo a carona do fim da reserva de mercado de equipamentos de informática. A companhia passou a oferecer uma variedade maior de produtos para seus clientes. Antes, lançava uma nova máquina a cada dois anos. Com a queda da Lei de Informá- tica, chegou a quarenta lançamentos em apenas doze meses. Além de aumentar a oferta de produtos, a Xerox, dona de 75% do merca- do nacional, passou a enfatizar o atendimento aos clientes com dois projetos que, hoje, também estão sendo copiados pela matriz. Um deles é o Centro de Atendimento ao Cliente, CAC. Dentro de cada filial, um grupo de funcionários dá plantão para tirar todas as dúvidas dos usuários. O outro é o projeto Anjos da Guarda. Cada funcionário da filial, mesmo os administrativos, recebe uma carteira de clientes pela qual é responsável. Periodicamente, telefona para saber se tudo está bem. Nas demais filiais, por exemplo, o cliente costuma ser atendido por secretárias eletrônicas. “O cliente é um ser humano e tem de ser atendido por uma pessoa, e não por máquinas”, diz Salles. Ele próprio não é afeito a lidar com engenhocas eletrônicas. Salles atende seu telefone e não usa computador. Escreve sempre à mão e sua secretária digita os textos. Não há dúvida de que se trata de um procedimento antiquado. Principalmente quando praticado por um homem de negócios cuja empresa vende produtos de tecnologia digital. Mas foi graças à sua teimosia em não seguir a cartilha administrativa vigente que a Xerox do Brasil passou de cópia a benchmarking da matriz. Estratégia e planejamento estratégico – os referenciais de partida 43 Atividades de aplicação Individualmente 1. Estruture os princípios, valores, visão e missão que considera mais ade- quado para sua organização. 2. Assista ao filme A fuga das galinhas (Chicken run, Nick Park e Peter Lord, EUA 2001, Universal Filmes) e observe a ocorrência dos principais con- ceitos abordados neste capítulo. Em grupo 3. Discuta o significado e a importância dos conceitos de visão e missão. Estruturação Etapas do planejamento estratégico O planejamento estratégico pode ser realizado de diversas maneiras e, usualmente, sofre influências dos aspectos mais variados, tais como: meto- dologias estabelecidas; diretrizes gerais ou políticas organizacionais; interes- ses pessoais ou de grupos; limitações financeiras ou de recursos; jogos de poder; visões e percepções pertinentes ao ambiente de negócios e à concor- rência; nível de tolerância a riscos etc. Considerando-se esses e outros aspectos, é fundamental que se estruture etapas ou processos básicos para assegurar sua realização com a maior efeti- vidade possível. A partir dessas etapas realizam-se o detalhamento das fases e processos necessários, ferramentas de apoio, responsabilidades, entre outros aspectos peculiares a cada tipo de organização e modelo de gestão utilizado; também se deve pensar na forma de desdobrar esse plano para as dimensões táticas e operacionais, ou seja, fazer acontecer. A figura 1 mostra a relação simples e conceitualmente óbvia, assim como os principais questionamentos pertinentes, que ligam o presente ao futuro. Figura 1 Como? Situação atual Situação futura desejada Por quê? Uma boa análise do ambiente de negócios, ou simplesmente o acom- panhamento rotineiro dos principais aspectos estratégicos do negócio e do ambiente em que está inserido, além da percepção das peculiaridades 46 Planejamento Estratégico operacionais daprópria organização, fornecem os elementos para uma boa compreensão do aqui e agora (situação atual). Uma outra questão é saber a situação futura desejada. Pode parecer sim- ples, por se tratar aparentemente de um desejo, mas na realidade irá de- mandar toda uma percepção de cenários, tendências e outras informações contextuais e, então, irá estabelecer o que será o nosso “desejo” dentro desse possível futuro. Decidir sobre a situação futura desejada é, ao mesmo tempo, uma técnica e uma arte, mas acima de tudo uma decisão que não pode deixar de ser tomada, sob o risco de sermos atropelados inexoravelmente quando esse futuro chegar. A corrida pelo futuro é sempre no presente, prin- cipalmente, pelas atitudes proativas. A figura 2 apresenta a estrutura geral das etapas de um processo clássico de planejamento estratégico. A princípio, a análise começa com uma boa noção das “diretrizes gerais” estabelecidas pela organização e também por elementos que compõem a “percepção do ambiente”; esses elementos inte- ragem e de alguma forma são interdependentes em algum grau. Figura 2 Diretrizes gerais Percepção do ambiente Planejamento estratégico Desdobramentos operacionais e projetos Planos operacionais e de projetos Ações Estruturação 47 Ao se ter as diretrizes gerais e a percepção geral de alguma forma defi- nidas, formalmente ou não, estão criadas as condições para a realização do planejamento estratégico propriamente dito. O planejamento estratégico, dependendo da cultura organizacional e as- pectos diversos do ambiente de negócios, pode assumir formatos e níveis de detalhamento variados, indo desde a documentação de percepções e decisões sem uma análise factual mais elaborada, até processos muito ela- borados e apoiados em uma boa base de dados históricos, interpretações do momento atual e cenários futuros. Uma mescla dessas abordagens talvez seja, na maior parte das vezes, o formato mais pertinente. Informação externa – coleta, análise e síntese Coleta, análise e síntese da informação externa são dimensões da chama- da auditoria da informação. Consiste basicamente em coletar as informações em diversos âmbitos que afetam ou podem afetar a organização. Algumas dimensões são clássicas, tais como: ambiente econômico, tendências, cená- rios diversos, políticas governamentais, legislações, atuação da concorrência etc.; enfim, há várias possibilidades. Muitas organizações não têm uma abordagem sistematizada para “com- preender” os aspectos do ambiente externo, baseiam-se em informações eventuais, opiniões que podem ser muito particulares ou subjetivas e uma base de dados muito simples e pouco confiável ou até mesmo inexistente. Especialmente organizações de maior porte, ou que atuam em ambiente muito competitivo, não podem prescindir de informações externas sistema- tizadas, que sejam validadas por profissionais com as credenciais necessárias e com dedicação ao menos parcial de tempo, para garantir um bom nível qualitativo nas interpretações e recomendações, oriundas da base de dados quantitativa. O quadro 1 resume alguns dos componentes usuais da “informação externa”. 48 Planejamento Estratégico Quadro 1 Aspectos da economia e do negócio: Economia, política, fiscal, legal, sociocultural, tecnológico, ambiental, responsabilidade social, imagem, entre outros. Aspectos do mercado: Tamanho, crescimento e tendências (R$ e volume), características e segmentação (produtos, preços, canais de distribuição, clientes, consumidores, comunicação, práticas setoriais), entre outros. Aspectos dos concorrentes: Os principais, tamanho, segmentação, reputação, capacidade de produção, marketing, vínculos e parcerias, faturamento, lucratividade, pontos fortes e fracos, entre outros. Informação interna – coleta, análise e síntese A coleta, análise e síntese da informação interna também são dimensões da chamada auditoria da informação. Consistem basicamente em coletar as informações no âmbito da própria organização e classificá-las, de modo a ser útil ao processo estratégico. Devido à quantidade de informações dispo- níveis atualmente, esse processo é muitas vezes mais difícil do que parece, pois a grande questão é: quais informações são relevantes, o nível de deta- lhamento e a forma de organizá-las. Estruturação 49 O quadro 2 apresenta algumas das dimensões clássicas associadas à “in- formação interna”. Quadro 2 Vendas: Total, por localização geográfica, por segmento, por cliente, por produto, por “canal”, entre outros. Faturamento, lucratividade. Indicadores econômico-financeiros entre outros. Os processos. Sistemas de informações gerenciais. Sistemas de gestão. Talentos humanos e capital intelectual. Estabelecendo rumos e diretrizes gerais A frase de Robert Pirsig, “a qualidade não está nas coisas nem nas pessoas, mas sim na relação entre elas”, em Zen e a Arte de Manutenção de Motocicletas, caracteriza bem a necessidade de estabelecer diretrizes e assumir algumas premissas no contexto coisas e pessoas, fazendo a ponte entre elas, inter- namente e externamente, para que o processo estratégico possa fluir com desenvoltura e o planejamento estratégico seja referenciado com análises e decisões de “alto nível”, em todos os sentidos. Uma outra questão a destacar é o oportunismo planejado, conforme ilus- trado no quadro 3. 50 Planejamento Estratégico Quadro 3 Oportunismo planejado Faça o “dever de casa”. Perceba bem os valores, visão, missão etc. Adquira competências, percepção do “ambiente”. Pense sobre os rumos e as possibilidades. Desenvolva pessoas, processos etc. Pense e planeje estrategicamente. E então será mais fácil perceber e explorar as oportunidades Oportunismo planejado é “contar com a sorte”, isso porque você criou as condições para que as oportunidades sejam aproveitadas e as condições po- tencialmente adversas foram atenuadas, ou até mesmo eliminadas. Como dizia um famoso astro do golfe: “engraçado, quanto mais eu treino mais sorte eu tenho!” É esse tipo de sorte que podemos associar ao conceito de opor- tunismo planejado. Os elementos referenciais da organização, orientando a sua atuação no mercado são: princípios, valores, visão, missão, políticas básicas e objetivos superiores, entre outros. Muitas vezes, alguns desses aspectos são discutidos e validados, adaptados ou alterados no processo de planejamento estratégi- co e não em etapa anterior. O quadro 4 sintetiza os principais tópicos. Quadro 4 Elementos referenciais Princípios Valores Visão Missão Políticas básicas Objetivos superiores Estruturação 51 Planejando e organizando a condução das etapas do processo A organização para o processo de planejamento estratégico começa com a decisão firme de fazê-lo e os recursos necessários, que, na maior parte das vezes, é a disponibilização de tempo de gestores, especialistas e eventual- mente de consultores. É importante não confundir os recursos para a realização do planejamen- to estratégico (a fase intelectual e elaborativa) com os recursos para, poste- riormente, fazê-lo acontecer. Obviamente não faz o menor sentido disparar um processo de planejamento estratégico sem uma perspectiva ou diretriz de recursos para fazê-lo acontecer. Apesar de o planejamento estratégico poder ser conduzido de diver- sas maneiras e de haver muitas metodologias e enfoques disponíveis no mercado, cada organização deve ir experimentando e ajustando sucessi- vamente seu jeito de fazer, adaptando-o às peculiaridades da cultura or- ganizacional e à visão dos seus líderes. Também, ajustes são necessários para, permanentemente, adequar o planejamento estratégico à variedade de requisitos, à diversidade ou até mesmo à complexidade do ambientemutante e, muitas vezes, surpreendente que precisamos lidar hoje e talvez mais ainda no futuro. A estruturação do planejamento estratégico requer, não apenas, a rea- lização de etapas organizadas e seqüenciais nos aspectos conceituais, mas também, o envolvimento e a dedicação dos envolvidos em sua concepção e estruturação, sejam gestores ou especialistas. Ampliando seus conhecimentos Leitura do livro: McDONALD, Malcolm. Planos de marketing: planejamento e gestão estraté- gica – como criar e implementar. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. 52 Planejamento Estratégico Seis princípios de liderança Nizan Guanaes Primeiro princípio – conhecer bem aquilo em que você acredita Para ser um líder efetivo, suas idéias a respeito de metas, objetivos e va- lores precisam ser fortes e claras de modo que acontecimentos e influências externas não consigam desviá-lo do caminho. Segundo princípio – ser otimista Quem quer conviver com alguém notadamente pessimista? É preciso que o líder sempre procure ver o lado positivo das coisas para poder contaminar seus liderados com essa positividade. Terceiro princípio – a coragem É tipicamente mal compreendido pelas pessoas. Muitos pensam que co- ragem é a ausência do medo. Coragem é a administração do medo. Pessoas corajosas usam o medo como fator de motivação para que busquem continu- amente a melhoria de sua própria performance. Lidar com o novo é sempre um risco. O líder competente usa o medo do risco para administrar as contin- gências e tornar a situação melhor gerenciável. Quarto princípio – planejamento contínuo A tese é: se você está preparado para o pior será mais fácil administrar e solucionar o inesperado. O exemplo utilizado – seria impossível ser diferente – foi como a prefeitura de Nova Yorque lidou com o ataque de 11 de setembro. O texto a seguir, de Nizan Guanaes, apresenta seis princípios de liderança. Eles são aplicáveis ao processo estratégico e seus princípios fundamentais de sucesso. Estruturação 53 Nunca se poderia imaginar que aviões pudessem ser utilizados como mísseis. Mas como a prefeitura sempre se preparara para um grande atentado terroris- ta, foi um pouco mais fácil lidar com a catástrofe. Quinto princípio – trabalhar em equipe Acreditando que pode fazer tudo sozinho, você fatalmente acabará sozi- nho. É muito importante que o líder conheça as suas próprias forças e fraque- zas para que possa montar equipes que possuam competências complemen- tares às suas. Sexto princípio – comunicação Para se tornar um melhor comunicador, Giuliani dá uma receita simples: seguir os cinco primeiros princípios. Contudo, o planejamento contínuo – quarto principio – é considerado crucial para garantir a qualidade da comu- nicação. A tese de Giuliani é que comunicação é o somatório de informação e emoção. Se as coisas não correm conforme o planejado é preciso manter as pessoas informadas sobre o que está acontecendo exatamente. Isso aumen- tará a credibilidade do líder perante seus liderados. Atividades de aplicação Individualmente 1. Quais são os elementos referenciais importantes e mais adequados pa- ra um bom processo de planejamento estratégico em seu ambiente de negócios/organização? Em grupo 2. Discussão sobre os elementos iniciais importantes para um bom pro- cesso de planejamento estratégico. Conceitos para refletir O ciclo de vida de produtos O ciclo de vida de produtos é um conceito importante na compreensão de como um produto se comporta, desde a fase de sua elaboração/projeto até o momento em que, por falta de interesse do mercado ou outros fatores, ele deixa de existir, sendo desativada sua “produção” ou oferta do serviço ao mercado. Compreender suas peculiaridades, agir em momentos certos – dando sobrevida ao produto – além da adoção de estratégias pertinentes a cada fase, fazem parte do repertório de ações no contexto do planejamento estratégico. Vamos abordar sucintamente cada uma das fases desse ciclo e suas prin- cipais características, conforme a figura 1: Figura 1 Desenvolvimento Crescimento Maturação Saturação Declínio Introdução Tempo Vendas (R$) ou qualidades 56 Planejamento Estratégico Desenvolvimento É a fase em que o produto é desenvolvido, sendo muito útil uma boa visão das necessidades e expectativas do mercado, dos recursos para desenvol- ver e conduzir o projeto e dos elementos que permitam a antevisão do pos- sível ciclo de vida do produto. A boa integração da função marketing com as áreas envolvidas e o domínio de técnicas de elaboração e gerenciamento de projetos estão entre as capacidades viabilizadoras dessa fase. Nela não há receita, apenas investimentos que devem ser avaliados de acordo com as estratégias da organização, não apenas de retorno financeiro, mas também de “presença” no mercado, estruturação de portfólio, entre outras. Introdução Nessa fase, o produto começa a chegar ao mercado, podendo começar a ter receitas que iniciem a amortização dos investimentos ou atendimento a aspectos estratégicos vislumbrados na concepção do produto. É um momento crítico e deve ser acompanhado com muita atenção, pois aí se inicia o ciclo de aprendizado dos diversos aspectos que compõem a vida do produto, tanto no ambiente interno como no externo. Crescimento Se tudo correr bem – como sempre almejamos – é iniciada a fase na qual o produto cumpre sua missão no mercado e os retornos (financeiro, merca- dológico, estratégico, entre outros) começam a aparecer. Muitas vezes é o momento em que as habilidades de eficiência operacional são vitais para dar sustentação ao crescimento, assim como a sinergia de diversos aspectos logísticos e comerciais. Maturação Esta é a fase em que as vendas do produto se estabilizam ou apenas cres- cem acompanhando o crescimento do segmento específico. Por exemplo, se cerca de 95% da população em uma determinada região já utiliza pasta de dente, o crescimento global do setor nessa região seguirá basicamente a evolução quantitativa dessa população, o que naturalmente não impede Conceitos para refletir 57 incremento ou decréscimo de consumo de marcas específicas, devido a re- posicionamento, novos hábitos, entre outros. É um momento difícil para as organizações que estão no mercado porque se iniciam guerra de preços, competição mais acirrada e esforços contínuos para eficiência operacional. Normalmente, as organizações se esforçam para reposicionar ou vitalizar os produtos, criar diferenciais, agregar serviços es- peciais e tudo isso para aproveitar os investimentos já feitos e colher o que for possível, aumentando a taxa de retorno global do produto em seu ciclo de vida. Saturação É caracterizada pelo início do declínio das vendas; neste momento, muitas organizações saem do mercado por incapacidade de enfrentar os preços em queda, alguns negócios são incorporados a outros – vendas, fusões e outros movimentos que visam aumentar a eficiência operacional, seja por meio de redução em custos de fabricação, seja nos aspectos comerciais, logísticos, pós-venda ou outros que se façam necessários. Declínio É o momento em que o produto está em seus últimos “minutos” de vida e, nesse momento, a estratégia principal é encerrar ou desativar os proces- sos operacionais preservando a imagem ou marca institucional, ou então manter um nicho que “teima” em usar o produto, por diversos motivos. Exemplos de produtos que já tiveram seu apogeu e que hoje já não exis- tem ou têm pouco uso – disco de vinil, disquete de computador oito pole- gadas, televisor em preto-e-branco, rede para cabelo (produto praticamen- te extinto, a partir do advento do laquê e outros aspectos da moda), entre outros. Um outro exemplo que mostra um grande sucesso de reposicionamento e revitalização do produto
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