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O Sexo feminino no Skate

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O Sexo feminino no Skate
O encontro reuniu dez skatistas mulheres e é um reflexo de como elas vêm usando as redes sociais para organizar encontros e participar de coletivos que visam fortalecer a cena do skate feminino, como é o caso do Minas no skate, The Fresh Girls of Sk8 e Minas na Sessão. “Descobrimos que juntas podemos fazer mais barulho”, diz a skatista profissional Vitória Mendonça, 19, sobre a atuação de mulheres tanto nas pistas quanto nos corres em busca de visibilidade e patrocínio.
O Circuito Brasileiro de Skate tem categorias femininas nas duas modalidades olímpicas, park e street. 
 “Antes, os organizadores de algumas competições só colocavam as meninas por pressão nossa. Isso mudou quando o skate virou esporte olímpico”, defende Karen Jonz, 35, tetracampeã mundial de vertical e a primeira brasileira a conquistar uma medalha de ouro nos X Games, em 2008. Leticia Bufoni, 25, que já levou três medalhas de ouro nos X Games, no street, concorda e completa: “Outro ponto importante é o fato de o Brasil ter uma geração muito boa e competitiva, tanto no feminino quanto no masculino, o que ajuda o esporte no país. Temos nomes como Yndiara Asp, Pamela Rosa, Fadinha e muitas outras representando muito bem as mulheres”.
Karen lembra que quando começou a competir, há 16 anos, a categoria feminina costumava ser deixada em segundo plano: “Chegava num campeonato às 7 da manhã e os organizadores diziam que o feminino tinha sido cancelado porque não ia dar tempo. Quando a gente participava, era maltratada, não tínhamos premiação ou recebíamos os piores prêmios”. Leticia reforça: “Muitas vezes tive que competir contra homens, pois não existiam campeonatos femininos e ainda por cima não pagavam nada”.
A Olimpíada também vem influenciando os planos das brasileiras. Competir e, quem sabe, morar na gringa, costuma ser o sonho das skatistas que querem se profissionalizar. “Comecei a ir para os Estados Unidos porque sabia que tinha uma cena lá”, conta Karen. 
Para o skatista Bob Burnquist, presidente da CBSK, os homens têm mais nível técnico e as mulheres acabam se inspirando em suas manobras. Consequentemente, o mercado apoia mais o skate masculino. A organização, segundo ele, não desenvolve ações direcionadas ao feminino e o crescimento da categoria é resultado de um processo de evolução das atletas ao longo de gerações, o que não tem necessariamente a ver com a estreia do esporte na Olimpíada. “Você vê a Rayssa Leal [no street], de 11 anos e um skate bem avançado. Ela se inspirou na Leticia Bufoni, que se inspirou na Elissa Steamer [americana de 43 anos que ganhou quatro medalhas de ouro nos X Games na modalidade street e foi a primeira mulher a se tornar skatista profissional, em 1998]. A cada geração, vai aumentando, naturalmente”, defende Bob.
A luta por equidade de gênero no esporte não é de hoje. Em 2005, as americanas Cara-Beth Burnside (skatista que ganhou três medalhas de ouro nos X Games, no vertical), Mimi Knoop (três medalhas de bronze nos X Games, também no vertical) e o treinador Drew Mearns fundaram a The Alliance, uma organização que representa skatistas mulheres de vários países, incluindo as brasileiras Karen Jonz e Ana Paula Negrão (skatista e fotógrafa de skate desde 1995). A Alliance desempenhou um papel fundamental para que homens e mulheres passassem a receber o mesmo prêmio nos X Games, a partir de 2008.
Enquanto isso, marcas que patrocinam skatistas começaram a olhar com mais cuidado para a categoria feminina nos últimos anos. Em 2017, a Vans incluiu ações direcionadas ao skate feminino em uma campanha global. No ano seguinte, igualou premiações da competição mundial Vans Park Series e passou a oferecer aulas gratuitas para mulheres em uma pista particular, em São Paulo. Mas a diferença ainda é significativa: hoje, patrocinam 12 skatistas brasileiros – nove homens e três mulheres. Já a Volcom apoia seis skatistas homens e uma mulher no Brasil. Há três meses, Vanessa Rodriguez atua como gerente de marketing de skate feminino na marca, prova de que estão de olho neste universo.
O interesse pelo esporte extrapolou o segmento. A Farm lançou seu primeiro skate, como parte da sua coleção feminina, em 2012 e repetiu em 2015. “Sempre estamos de olho nos movimentos da rua e, quando percebemos mais meninas andando de skate e utilizando o carrinho para mobilidade, tivemos desejo de criar para esse público”, conta Kátia Barros, diretora da marca. Já a Melissa lançou seu skate em 2016. Lá fora, a italiana Emporio Armani lançou no ano passado uma coleção-cápsula inspirada na modalidade.
Mas nem sempre foi assim. “A geração de minas que veio antes de mim entrava na pista e tomava pedrada. Elas tinham que lidar com todo o preconceito”, diz Karen. “Gostava muito quando me confundiam com um homem e não tinha nada a ver com identidade de gênero. É que rolava muito ‘elogio’ do tipo ‘nossa, você nem parece uma menina andando’. Cheguei a raspar o cabelo, usava roupas gigantescas para evitar que vissem meu corpo durante algum movimento.”
A paulistana Priscila Morais, 32, anda há 20 anos e relembra o quanto o skate era estigmatizado na época em que começou. “A menina que andava era tachada de sapatão e drogada. Eu precisava deixar o skate na casa de um amigo porque meu pai escondia ou quebrava para que eu não andasse”, conta ela, que praticava com os garotos do bairro. O esporte a ajudou a enfrentar o cotidiano difícil na periferia paulistana. “O skate salvou a minha vida. O lifestyle urbano abriu minha cabeça para música, literatura, passei a conhecer pessoas e lugares.”
- Não tinha meninas, não tinha nem banheiro feminino nas competições, quase não deixavam eu competir para falar a verdade. Eu tinha que ficar brigando para competir. Não tinha nem premiação para mim para falar a verdade. Já teve competição que a inscrição era 200 reais e eu competi, ganhei e levei apenas 100 reais.
Como não tinha competições exclusivamente femininas, Karen geralmente, era sempre a única mulher entre os homens:
- Aqui no Brasil quando eu passava para as semis era como se eu tivesse ganhado os campeonatos, porque tinha uns 60 caras mais ou menos e eu ficava em 30º lugar, parecia que eu tinha levado o título do campeonato. Quando eu pegava pódio com os meninos, era massa. Naquela época eu nem pensava em preconceito, eu me sentia de igual para igual.
- É tudo muito novo, né? Agora eu me sinto mais em casa, é muito louco ver todo mundo de top e blusinha, um monte de menina no vestiário, a gente conversa sobre os nossos assuntos, coisas que não rolavam antes. Eu ficava muito oprimida de andar com roupa que mostrasse muito o corpo porque eu ficava envergonhada sabendo que os meninos iam olhar, ficava com medo de ser zoada o tempo inteiro.
Karen foi uma das responsáveis por fundar a Associação Brasileira de Skate Feminino (ABSFE), em 2000, e dar início a um processo de evolução e popularização do esporte entre as mulheres. Em 2018, além de conquistar premiações iguais, ganharam o mesmo número de vagas para disputar a corrida olímpica para Tóquio 2020. Segundo Karen, as conquistas das mulheres no esporte só foram possíveis por meio de muitos anos de luta.
- A gente já conquistou bastante coisa, mas ainda temos muito para conquistar. Se não fosse um movimento próprio nosso de conscientização, as premiações iguais não teriam acontecido. Eu acho que é o justo, mas ainda tem muita coisa para melhorar.
Confirmado como nova modalidade a partir dos Jogos Olímpicos de 2020 , em Tóquio, o skate não para de crescer no Brasil. De acordo com pesquisa encomendada pela Confederação Brasileira do esporte radical, o número de praticantes teve um salto de 100%, com maior representação nas regiões metropolitanas e no Sudeste do País.
Outro dado significativo é o aumento da participação de mulheres no skate . Em 2009, por exemplo, cerca de 10% dos praticantes eram do sexo feminino, agora, segundo os dados de 2015, são 19%, o que representa cerca de um 1,6 milhão de pessoas. 
O notável crescimento da participação de mulheres no esporte proporcionoua expansão de empresas que lançaram linhas de vestuário e tênis que visam conforto, moda e praticidade, o que é importante no esporte. Este mercado já gera mais de R$ 1 bilhão no Brasil e, segundo a GIA (Global Industry Analysts), deve movimentar 19,6 bilhões de dólares no mundo nos próximos cinco anos.
As mulheres não são novas no skate – desde que o skate foi inventado na Califórnia nos meados do século 20, mulheres como Patti McGee, Peggy Oki, Kim Cespedes e Laura Thornhill desempenharam papéis essenciais no desenvolvimento do skateboard. Ainda assim mulheres são radicalmente novas para a indústria do skate, que durante muito tempo foi um clube de competições, patrocínios, pagamentos e glórias masculinas.
O mundo não obteve sua primeira mulher como skatista profissional até 1998, quando Elissa Steamer assinou com a Toy Machine.
Beth Burnside se tornou a primeira skatista profissional a conseguir seu próprio modelo de tênis assinado em 1994, isso porque ela simplesmente trouxe a ideia para Vans. A mesma atitude de quando ela e Jen O’Brien convenceram os X Games a realizar uma demonstração de mulheres em 2002.
Competições importantes começaram a incluir mulheres, como o Vans Park Series. Os patrocínios corporativos demoraram a acompanhar o movimento, mas aos poucos as coisas começam a equalizar dentro do skate.
Com a inclusão do skate nos Jogos Olímpicos as oportunidades devem aumentar ainda mais. A esperança que todas carregam consigo é que em pouco tempo, uma futura geração de mulheres como não sinta mais a pressão de serem skatistas.
As marcas estão percebendo que o skate feminino agora é popular, e que há um mercado agora onde antes era apenas um nicho. Isso é certamente verdade para Nora Vasconcellos, skatista campeã mundial e a primeira mulher a usar a Adidas. Ela se juntou à equipe da Adidas no final de 2017, apenas alguns meses depois que a Welcome Skateboards lançou seu modelo profissional
Obrigado Taiara Darós, Isadora Pachedo, Letícia Bufoni, Nora Vasconcellos, Karen Jonz, Liza Araújo, Yndiara ASP e a todas as mulheres que estão mudando a cara do skate, que por sinal está sempre se renovando incessantemente.
A expressão “isso é coisa de homem” é bastante familiar, principalmente em esportes considerados culturalmente masculinos. O skate, nascido na Califórnia em 1950, é um deles. Surfistas da região colocaram rodas de patins em pranchas de madeira para se divertir quando o mar não tinha ondas.
Dez anos após a criação do esporte, ainda nos Estados Unidos, o skate teve como primeira atleta profissional Patti McGee. Criada em uma década onde o machismo reinava, ela mostrou que as mulheres, sim, poderiam andar de skate e participar de eventos.
Hoje o cenário é diferente, mas ainda existe resistência de alguns atletas homens à participação feminina.

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