Buscar

Abaixo o Juridiquês_Ari Lima_Revista Visão Jurídica

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 3 páginas

Prévia do material em texto

1 
Revista Visão Jurídica, nº 51, agosto/2010 
Texto de Ari Lima 
 
 
ABAIXO O JURIDIQUÊS 
 
 
A comunicação escrita é a principal ferramenta de trabalho dos 
advogados e deve ser utilizada de maneira clara e convincente 
 
 
A advocacia vive um processo de modernização e adaptação à 
nova realidade social, oferecendo sistematicamente novas 
soluções jurídicas, com o objetivo de atender a necessidades, 
expectativas e exigências que surgem a cada dia na sociedade. 
No entanto, apesar de estar ocorrendo esta importante e 
necessária adaptação, o setor continua utilizando métodos 
antigos e, em muitos casos, ultrapassados, no seu processo de 
prestação de serviços. Um exemplo claro é a utilização de uma 
linguagem excessivamente forense, e por vezes inadequada, nos 
processos e no trato com os clientes, o chamado “juridiquês”. 
 
 É fato que toda atividade profissional possui uma linguagem própria do setor, 
desenvolvida para auxiliar a comunicação entre os pares. Médicos, engenheiros, empresários 
e policiais têm em sua comunicação particular palavras, expressões e jargões desconhecidos 
dos leigos, mas que são importantes no contexto interno de cada área, para melhor expressar 
as ideias. 
 
 Na advocacia não poderia ser diferente. Por isso, palavras como doutrina, 
jurisprudência, contencioso, liminar e até expressões em latim como habeas corpus, ad hoc e 
modus operandi são necessárias no contexto dos processos judiciais. No entanto, além 
dessas palavras e expressões já consagradas ao longo do tempo, muitos advogados 
“recheiam” seus textos com termos que vão além da necessidade de comunicar uma ideia 
específica, gerando peças jurídicas com expressões como “exordial acusatória”, “consorte 
supérstite” e “excelso sodalício”, para denominar respectivamente os termos denúncia, viúvo 
e Supremo Tribunal Federal, como exemplifica o professor Virgílio de Mattos, da Escola 
Superior Dom Helder Câmara, em matéria publicada na revista Visão Jurídica. 
 
 Quando um advogado pergunta ”Você já perlustrou os autos?”, ele está utilizando uma 
linguagem arcaica. Seria mais adequado se ele fizesse a pergunta usando a expressão “Você 
já leu o processo?” 
 
 O exemplo mostrado por Cláudio Moreno, mestre em língua portuguesa, e Túlio 
Martins, juiz de Direito e jornalista, no excelente livro “Português para convencer – 
comunicação e persuasão em Direito” (Editora Ática, 2006), ilustra bem a questão de 
linguagem inadequada na elaboração de textos jurídicos, em um parágrafo de petição: 
 
Destarte, como coroamento desta peça-ovo, emerge a premente necessidade de jurisdição 
fulminante, aqui suplicada a Vossa Excelência. Como visto nas razões suso expostas com 
pueril singeleza, ao alvedrio da lei e com a repulsa do Direito, o energúmeno passou a 
solitariamente cavalgar a lei, esse animal que desconhece, cometendo toda sorte de 
maldades contra a propriedade deste que vem às barras do tribunal. Conspurcou a boa água 
e lançou ao léu os referidos mamíferos. Os cânones civis pavimentam a pretensão sumária, 
estribada no Livro das Coisas, na Magna Carta, na boa doutrina e nos melhores arestos deste 
sodalício. Urge sejam vivificados os direitos fundamentais do Ordenamento Jurídico, espeque 
 2 
do petitório que aqui se encerra. O apossamento solerte e belicoso deve ser sepultado ab 
initio e inaudita altera parte, como corolário da mais lidima Justiça. 
 
 Por mais estranho, e até de certa forma cômico, que possa aparecer o texto 
apresentado, ainda hoje é possível encontrar esse tipo de redação nos processos judiciais. 
Acreditam os autores estar praticando uma comunicação escrita de alto nível, quando na 
verdade estão produzindo textos confusos que deixam tanto o Direito quanto os fatos em 
segundo plano. 
 
 Segundo Moreno e Martins, no exemplo citado, o advogado explica os fatos e justifica 
a necessidade de obter jurisdição de urgência para defender um proprietário que move ação 
contra um vizinho que invadiu uma parte de seu terreno, onde existe um córrego com água 
potável e um abrigo para vacas leiteiras. Pede liminarmente a reintegração da posse dizendo 
que houve violência e que a invasão se deu clandestinamente, e que isso está lhe trazendo 
crescentes prejuízos. 
 
 Como se vê, a questão é simples. No entanto, o advogado pode pôr tudo a perder por 
se expressar de forma inadequada. Os autores sugerem uma nova abordagem de redação 
para a mesma petição, mais clara e simples, em estilo moderno e mais adequado, como no 
exemplo apresentado a seguir: 
 
Do que foi exposto acima, conclui-se que os fatos narrados nesta petição inicial são 
incontroversos e estão provados sumariamente por meio dos documentos aqui juntados. 
Tanto o Código Civil como a Constituição da República contêm regras claras que protegem a 
propriedade, observada sua função social – ou seja, exatamente a hipótese desse processo. 
Como nos ensina a melhor doutrina e a jurisprudência, o pedido em exame contém todos os 
elementos que determinam a concessão imediata da reintegração de posse: há interesse 
econômico, os fatos estão provados e o Direito do autor é indiscutível. A água potável 
existente no local está sendo poluída e as vacas leiteiras ficaram ao desabrigo, pelo que os 
prejuízos são evidentes. Assim, pede a concessão da liminar, por medida de Direito e de 
Justiça. 
 
 
 O exemplo citado acima demonstra que toda peça jurídica pode, e deve, ser escrita de 
forma a ser compreendida não apenas pelos operadores do Direito envolvidos no processo, 
mas também pelas partes, ou seja, pelos clientes dos respectivos advogados, muitas vezes 
pessoas de outras áreas profissionais como médicos, engenheiros e empresários, e até de 
pessoas simples, como donas de casa, mecânicos e pequenos comerciantes que têm pouca 
ou nenhuma compreensão dos termos e jargões jurídicos, ou seja, do “juridiquês”. Alguns 
deles não conseguem nem compreender alguns dos termos da procuração que assinam 
autorizando seus advogados a defender seus direitos. 
 
 Trazendo a questão da comunicação para o marketing jurídico e as relações 
comerciais dos advogados com o mercado, no processo de captação, conquista e fidelização 
de cliente, entendemos que uma comunicação clara, agradável e persuasiva pode fazer 
grande diferença para o sucesso do escritório. A linguagem deve levar em conta o nível de 
compreensão do público-alvo e jargões jurídicos devem ser evitados. 
 
 Alguns advogados têm escrito e publicado artigos informativos dirigidos ao seu 
público-alvo como ferramenta de marketing jurídico. A divulgação desses conteúdos na 
imprensa e na internet presta um grande serviço à comunidade, tirando dúvidas e sugerindo 
soluções para os problemas jurídicos do dia a dia. Ao mesmo tempo, os artigos publicados 
por advogados discutindo assuntos relevantes ajudam a promover sua marca e construir uma 
reputação positiva no mercado. No entanto, essa forma de praticar o marketing jurídico precisa 
levar em conta os conceitos apresentados anteriormente. 
 3 
 
 O uso de expressões e palavras só compreensíveis pelos operadores do Direito faz 
com que a mensagem não chegue de maneira adequada ao público-alvo ou que este perca 
o interesse de conhecer o teor do texto. Neste caso, a mensagem é inútil, pois o leitor desiste 
de compreender os textos se eles forem excessivamente rebuscados e técnicos. 
 
 Não somos contra a utilização da linguagem forense por parte dos advogados. No 
entanto, esse tipo de linguagem tem o momento adequado e deve sempre ser direcionado a 
públicos que sabidamente irão compreendê-lo. Além disso, o bom senso e o objetivo da 
comunicação devem sempre ser priorizados, tanto nas petições jurídicas como na 
comunicação direta com os clientes-alvo. 
 
 Acreditamos que na prática de uma advocacia moderna e eficaz o advogado deve 
privilegiar o sentido e o objetivo da comunicação, procurando expressar-se, seja por via 
escrita, seja por via oral, de forma clara, persuasiva e convincente, sem pedantismos, sempre 
levando em contaa capacidade de compreensão de seu público-alvo. Assim, o profissional 
do Direito estará sintonizado com o cliente e, ao mesmo tempo, será eficaz em sua prática 
jurídica.

Continue navegando