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"Para amar o filho, não pn:t i 11 , 1 I, no sentido de esquadrinhar sua pl 1 1111 il 1 mapear seu caráter. Amamos, porq11 · , 111 1 se desde o início o desejo e a d1,p1 111 li tê-lo (não importa a forma) e qu ·1 nalmente." "Todos os filhos são biológko lhos são adotivos. Biológicos. po1q11l maneira de existirmos concrda , 1 adotivos, porque é a única forma d deiramente filhos." "A experiência no ensin qu ciado, com certeza, será dl'nun 1 "O silêncio, sob a capa d 1 1 um halo de vulnerabilidad qu rança, desconfiança e desilu terpes oais, não temos o d i, 1 h as coisas que dizem re p i I o com quem nos envolvemo ." "A verdade não mad111ca q1111 11!1 cionada no afeto." ISBN 85-7409 - 160 -X .JJL .. Depois de Compreendendo o fi- lho adotivo e Compreendendo os pais adotivos, o autor oferece a pais e filhos adotivos a oportunidade de refletirem sobre um dos aspectos mais delicados da relação adotiva: a história anterior à adoção. Neste livro, os três estágios inici- ais da biografia do filho adotivo - origem, segredo e revelação - são tratados com clareza e simplicidade, mas, ao mesmo tempo, com os deta- lhes necessários à compreensão dos que estão envolvidos emocional- mente na relação parental. A cada capítulo, percebe-se não so a fundamentação teórica, como tmnbém a experiência profissional dt I autor, que já se aproxima de três d1 cadas lidando com crianças, ado- h-scentes e adultos adotivos em pro- 11·sso de psicoterapia. Isso nos asse- 111ra o valor do texto que entrega- 111qs ao leitor, na esperança de estar- 1111)s contribuindo para o esclareci- 111 ·nto de uma questão de importân- 1 1, 1 indiscutível. Os Editores t I m,tor: l', it·61o,:o clínico I ', oj: di• l'.~icologia da UFRPE. ADOÇÃO ORIGEM, SEGREDO E REVELAÇÃO UVRARIA DO PSICÓLOGO E EDUCADOR LTDA. UVAOS E TESTES · ~- Contemo, 1390 • Floresta CEP: 30110-008 - Belo Horizonte . w:; site: www.livroriodopslcologo.com.br T1l1fax: (31) 3303-1000 -ATENDEMOS PEDIDOS PELO CORREIO - S327a © Copyright by Edições Bagaço Autor Luiz Schettini Filho Revisão Haidée Camelo Capa e editoração eletrônica Tarciso Júnior Coordenação Editorial e impressão Edições Bagaço Rua dos Arcos, 150 • Poço da Panela• Recife/PE CEP 52061.180 • Tel./Fax: (081) 4410132, 4410133 Schettini Filho, Luiz Adoção: origem, segredo e revelação/ Luiz Schettini Filho. -Recife: Bagaço, 1999. 124p. 1. ADOÇÃO. 2 . CRIANÇAS -ADO- ÇÃO. 3. FILHOS ADOTNOS. 4. PAIS E FILHOS. I. Título. CDU CDD 347.363 362.734 PeR-BPEPCB Endereço do autor: Rua Pio IX, 384 - Torre - Recife-PE CEP 50710-260 Te!.: (081) 445.1281 e-mail: schettin@elogica.com.br Impresso no Brasil Este livro é dedicado às pessoas que me acolheram nas minhas dores. Sumário INTRODUÇÃO ......................................... ......... ............ .... 9 ORIGEM Amor e conhecimento ................................ .......... ............... 2 1 Amor e imposição ...................................... ...... ... .. .... ........ .. 2 7 Amor e perda ........... .-.......................................................... 31 Pais biológicos .............. ...... .. ........ ... .... ................................ 3 9 Passado e futuro .................................................................. 5 5 SEGREDO Adoção e insegurança ................... .......... .. ........................... 6 5 O não-dito ... ..... .................................................................. 71 Pensamentos desnecessários ................................................ 79 REVELAÇÂO Obrigatoriedade da revelação ............................................. 8 9 Revelação e mudança .......................................................... 9 5 Quando revelar ................................................................. 1 O 3 Condições para a revelação ................................................ 109 O mal-dito ........................................................................ 113 O bem-dito ..................... .......................... .............. .......... 119 No tas Bibliográficas .......................................................... 12 5 Bibliografia ..... .... ..... ..................................... ... .................. 12 7 li 1 INTRODUÇÃO A adoção está inscrita em um cenário de impossibilidades. É a tentativa de modificar contingências nas quais as incapacidades in- terferem na trajetória do desenvolvimento pessoal. Por essa razão, adotar um filho é a resultante da interação do poder e do não- poder. Assim descreveu Silvia Chavanneau de Gore: ''A adoção é uma criação construída ba- sicamente sobre as impossibilidades e as pos- sibilidades de muitas pessoas. Sobre o não poder maternar ou amparar uma criatura que foi concebida, gestada e trazida ao mundo. Sobre o não poder conceber ou gestar uma criatura desejada. Sobre o não poder ofere- cer outra solução a situações culturais soci- ais ou econômicas ou prevenir questões vin- culares" ( 1). É pelo não-poder de uns e pelo poder de outros que são traçados os caminhos exis- tenciais de alguns. Os filhos adotivos são a resultante da impossibilidade de pais bioló- gicos de ficarem com os filhos que geraram, mas são, também, a conseqüência do poder • 11 de outras pessoas que, não podendo ou não querendo gerar seus próprios filhos, buscam, no poder gerar e não poder criar de outros, a realização do desejo procriativo. É nesse con- texto de poder e não-poder que o filho ado- tivo organiza sua biografia. Compreende-se, dessa forma, a peculiaridade da história de uma criança adotada. Há na sua relação com o mundo uma dinâmica própria. Estaremos com isso dizendo que os filhos adotivos são diferentes dos outros filhos? Certamente. Eles são diferentes do ponto de vista da for- mação de sua história de vida, o que não sig- nifica estarmos afirmando algo parecido com inferioridade ou deficiência. Ao abordar essa questão, encontramos uma reação de incomodidade nos pais adotivos, provavelmente por uma distorção defensiva, que os leva a interpretar a condição de ado- ção, não só do ponto de vista de uma possível inferioridade, mas, também, e sobretudo, por temerem ser mal interpretados. Isto é, como se, reconhecendo as peculiaridades da his- tória do filho adotivo, estivessem declarando que o seu amor por ele é diferente do amor pelo filho que porventura pudessem gerar. I iferente é a história, não o amor. Incomuns sã as circunstâncias, não o afeto. O amor às p s. as não tem que ser vinculado ao con- I • texto histórico nem a características indivi- duais. Ele é a conseqüência de uma intera- ção que leva em conta a ligação com a pessoa sem a imposição de condições prévias ou cir- cunstanciais. Ama-se porque se ama. Cada filho tem uma história pessoal e, por- tanto, diferente da dos demais, seja ele gera- do por nós ou não. Entendendo a originalidade de cada his- tória pessoal, podemos compreender que a decisão de adotar um filho implica outras de- cisões ( como, por exemplo, a revelação de sua história), que não poderão ser evitadas ou ignoradas. Essa é uma questão de suma importância e que tem sido esquecida, quan- do se opta pela adoção para se estruturar uma família. No processo existencial da vida, uma decisão levará a tantas outras quantas forem necessárias para dar sentido à primeira. Er- ram aqueles que pensam que, na vida, so- bretudo nas relações interpessoais, as deci- sões são isoladas e independentes das que virão mais adiante. Elas pedirão novas inicia- tivas para confirmar a anterior. É somente assim que cresceremos e daremos sentido à vida pessoal. Viver apenas centrados em mo- mentos que sejam, ou pare&am bons, é viver sem projeto e, portanto, é arriscar a própria vida e a dos que nela estão envolvidos. • 13 Quando adotamos um filho, estamos em- preendendo uma ação modificadora da ordem existencial em pais e filhos e, por extensão, nafamília. A adoção não é uma ação isolada ou unilateral nas suas conseqüências. Sua função reestruturadora torna-se mais profun- da do que a própria geração biológica, por- que é uma interferência consciente, psico- lógica e social, em tantos quantos nela este- jam envolvidos. Dentro dessa visão dinâmica, sabendo que cada atitude e ação levam a modificações im- previsíveis nos seus resultados, nos defron- tamos com o fantasma da revelação da histó- ria, o que nos remete à origem do filho que não geramos. É inevitável o confronto com a história. No que diz respeito ao filho adotivo, há três alternativas incrustadas na decisão que tomamos. A primeira, que já pode estar in- corporada à decisão da adoção, é a de revelar, oportunamente, a sua origem. A segunda, a de negá-la, construindo uma nova ( e falsa) história. A terceira, a de adiar a decisão so- bre o assunto. O importante é sabermos que, nessa ques- tão, não podemos assumir a neutralidade. A adoção implica a perda da liberdade de ser- m neutros. Seremos co-responsáveis por qualquer uma das três alternativas. Isso não é estranho nem deve nQs amedrontar, até porque a vida sempre exigirá de nós defini- ções. Melhor serão as definições incômodas do que as indefinições, que terminarão por corroer o que tentamos construir. A experiência tem mostrado que, após a decisão de adotar um filho, revelar sua histó- ria talvez seja a iniciativa de maior importân- cia e repercussão na família adotiva. Prova- velmente essa é a razão por que persiste a preocupação em muitos pais adotivos sobre se se deve realmente desvendar o mistério da origem e, sobretudo, sobre como e quan- do isso deverá acontecer. Ignorar a questão é colocar um véu que, à guisa de "proteção", estabelece uma separação, não entre o filho adotado e seus pais biológicos, mas entre fi- lhos e pais adotivos.Uma atitude que parece ligar, aproximar, preservar, leva ao distancia- mento e à deterioração, porque se fundamen- ta na negação e no silêncio. Nem sempre es- tamos protegendo, quando negamos fatos existenciais importantes. O silêncio, sob a capa da preservação, deixa um halo de vul- nerabilidade que propicia insegurança, des- confiança e desilusão. Nas relações interpes- soais, não temos o direito de silenciar sobre as coisas que dizem respeito à vida das pes- • 15 1 1 soas com quem nos envolvemos. O silêncio, às vezes, é perverso. Há circunstâncias nas quais quem ama não silencia. O amor fala, assim como também ouve. Na relação de afe- to, falar e ouvir são ações alimentadoras da vida, embora nem sempre se fale e, muitas vezes, não se ouça o que é agradável. Quan- do se ama, a dor do que se ouve se dilui no amor e na confiança de quem nos fala. Não há palavra dura e incômoda que não suporte- mos quando surge em um diálogo de amor. Sabemos, pelo trato com famílias adotivas, que muitos aspectos importantes da relação interpessoal entre pais e filhos, bem como o desenvolvimento destes, são influenciados pela atitude assumida a respeito da sua ori- gem. Se se opta pelo segredo, o desenvolvi- mento psicológico, no seu sentido mais abrangente, toma uma direção diferente da- quela que ocorreria caso se escolhesse o ca- minho da revelação. É importante ficar claro que a revelação da origem não é uma simples questão de in- formação. Ela está ligada à formação de uma história pessoal e, conseqüentemente, à re- lação da criança com o mundo e com a vida. A informação que não se vincula à formação tende a produzir deformação. P r essas razões, resolvi abordar mais de- / () . - ------·-----==---- - talhadamente esse aspecto específico da con- vivência adotiva. Por razões puramente didá- ticas, dividi o livro em três momentos, ape- sar da íntima relação que existe entre eles: origem, segredo e revelação . • 17 ORIGEM I AMOR E CONHECIMENTO O amor vem antes do conhecimento. Pode parecer estranho que comecemos a falar so- bre a origem histórica do filho adotivo, afir- mando que o conhecimento é secundário quando nos referimos a uma relação afetiva. O amor é um mistério; não tem explicação lógica. O amor a uma pessoa flui sem que dele nos demos conta e sem que por ele se- jamos responsáveis . Não se pode impedir uma pessoa de amar outra, porque o amor não exi- ge ser correspondido. Aqueles que esperam os trâmites do co- nhecimento, buscando conjugar elementos que produzam segurança e satisfação pesso- ais para construir uma relação de afeto, se expõem ao insucesso ou à surpresa de en- contrar o vazio ao longo do caminho. O co- nhecimento não é uma condição necessária • 21 ao amor. Ama-se e, pelo amor, se conhece. No processo de busca do conhecimento do objeto do amor, nos deparamos com duas si- tuações possíveis: aprofundamos o amor ou enfrentamos o que nos desagrada. Mas o amor permanece. Amar é mais do que simplesmente gostar. Para gostar precisamos de fatos e atributos e, portanto, de condições. Gostamos de coisas que as pessoas são ou daquilo que têm em si e que complementam lacunas em nossa vida pessoal ou, ainda, de situações que nos esti- mulam na busca de objetivos existenciais. Isso é gostar. A-mar é coisa diferente. O amor é incondicional: não está vincula- do a fatos ou atributos nem a características específicas do outro. Amamos a pessoa e não seus atributos ou aquilo que, na relação com ela, nos produz prazer. Quando amamos, amamos o outro; quando gostamos, gostamos no outro. Gostamos do que outro faz, so- bretudo em relação a nós, porém ama- mos o outro como outro, isto é, como pessoa independente do que é ou faz. O amor não busca condições. Abordando o tema da "felicidade", Marco Aurélio Dias da Silva escreve: "O que se cha- ma de felicidade - e que creio possível, em- bora talvez não muito fácil - é o estado de paz interior que nos permita 'viver agrada- velmente' e ter gosto pela vida. Somente quando alcançamos esse estado - ou dele nos aproximamos - é que nos tornamos capazes, de fato, de amar às outras pessoas. É um amor não programado, não intencional e, sobretu- do, incondicional. O que quero dizer com isso é, em primeiro lugar, que a pessoa não deci- de amar os outros e nem age deliberadamente neste sentido. Não. Não é por aí. O que ocorre é uma natural e espontânea empatia e tolerância para com as pessoas. Muito importante: essa empatia é difusa, isto é, atinge a todos indis- tintamente, e até aqueles que podem se afi- gurar, aos que olham de fora, como inimigos e adversários. Implica uma grande capacida- de de perdoar e compreender a razão de ser e de agir das outras pessoas e uma não me- nor - ou total - incapacidade de guardar ódio ou rancor de quem quer que seja. Uma gran- de característica do verdadeiro amor é ser incondicional" (2). É por isso que, quando gostamos das ca- racterísticas (qualidades para nós) do outro e, ao longo da convivência, percebemos que se modificam, deixamos de gostar, porque, simplesmente, desapareceram os motivos da relação que construímos. Desse modo, po- • 23 demos gostar e des-gostar. O gostar pode ser efêmero. Amar transita por outro caminho. "O amor não busca os seus interesses" (I Cor. 13:5). O gostar pode se desvanecer, mas o amar não acaba. Isso é verdadeiro em qualquer das for- mas de relação interpessoal. Como ficará en- tão o amor que não encontra correspondên- cia no outro? Como seria o amante sem o amado? Com certeza, continuaria a ser aman- te, porque o amor não se nutre necessaria- mente de uma resposta ou de um retorno afetivo. O amante que perde a convivência com o objeto do seu amor acondiciona den- tro de si o afeto pela pessoa amada para so- breviver ao desconforto de sua ausência. Essas considerações são importantes para entendermos o sentido ( direção e significa- do) das relações afetivas parentais. Sabemos que ao filho se ama, embora nem sempre dele se goste. Isto é, amamos o filho, porque ama- mos a pessoa dele, mas, muitas vezes, não gostamos de determinados comportamentosseus ou mesmo de algumas de suas caracte- rísticas. São infelizes as pessoas que apenas ostam, porque vivem o provisório e o incon- 1 tente. Amar é permanente e duradouro. Para amar o filho, não é preciso conhecê- lo, n sentido de esquadrinhar sua persona- I • lidade ou mapear seu caráter. Amamos, por- que estabeleceu-se desde o início o desejo e a disponibilidade para tê-lo (não importa a forma) e querê-lo incondicionalmente. É por essa razão que temos a possibilidade de amá- lo, mesmo que não corresponda às nossas expectativas e nem preencha nossos ideais. Quando impomos condições para termo_s um filho, obstruímos o fluxo natural do amor a ele como pessoa. Quem apenas gosta, não ama; vive o verniz da vida, mas não usufrui do seu conteúdo em profundidade e extensão maiores. O gostar passa, porque as pessoas se modificam pelo tempo, pela aprendizagem, pelas distorções e pelos egoísmos. O amor permanece, porque está ligado à pessoa na sua essência. Cabe, a essa altura, lembrar que decresce de importância conhecer elementos históri- cos ou características pessoais do filho que e quer adotar. Isso não significa que deva- mos deixar de lado suposições que compõem a fantasia daqueles que geram ou adotam fi- lhos. O que estamos afirmando é que a ten- tativa de realizar por inteiro as fantasias so- bre o filho não só é tarefa impossível como imprópria para uma relação parental. Encai- xa-se aqui a observação feita por Ilya Prigogi- ne: "O possível é mais rico que o real" (3). • 25 O filho que se adota está dentro desse con- ceito do "possível". É assim que poderemos amá-lo: pelas suas possibilidades e não pela segurança antecipada que, às vezes, busca- mos, para que tudo ocorra sem atropelos e sofrimentos. O filho é muito mais o "possí- vel" do que o "real", isto é, o desafio de um caminho novo a cada dia e não a segurança e a garantia de preenchimento do modelo que desenhamos em nossa imaginação. (,. II AMOR E IMPOSIÇÃO Assim como o amor é incondicional, como dissemos anteriormente, também não pode ser imposto à pessoa a quem amamos. O amor não tem que necessariamente ser aceito pela pessoa amada, nem pode ser imposto a ela; quando muito poderá ser exposto e oferecido. Esse é um conceito importante para dar sentido às relações interpessoais. A recipro- cidade do amor seria o ideal da vida na rela- ·ão entre as pessoas, porém sabemos, pela própria convivência com elas, que essa cor- r spondência não é a regra do dia-a-dia. Não são poucas as vezes que amamos sem ser amados, o que não desmerece o amor como •moção nobre e fundamental. O amor busca o amor do outro, mas, também, em situações d excepcionalidade, subsiste por si mesmo. Amamos o filho independentemente de ele n s amar. É nesse sentido que entendemos • 27 que a nossa grande tarefa na relação parental é oferecer e expor o amor que sentimos. E isso podemos fazer pela palavra, pelo silên- cio, pela atitude, pelas ações e por todas as formas peculiares à individualidade. Na relação adotiva, a afetividade cresce de importância pela inexistência da ligação bio- lógica. No entanto, a existência desse amor, em toda a sua intensidade, não solucionará, necessariamente, os problemas pessoais do filho ou do grupo familiar. Tomemos, por exemplo, as questões rela- cionadas com a origem genealógica do filho adotado.É uma situação que precisa ser ana- lisada e compreendida do ponto de vista in- formativo mais do que do afetivo. "O conhecimento da relação genealógica é um aspecto importante da identidade adul- ta já que relaciona cada indivíduo com as ge- rações passadas e futuras. A adoção, por sua natureza, afeta essa relação, podendo produ- zir um vazio e uma sensação de falta de raí- zes. A falta de conhecimento e sentido da própria identidade não pode ser encarada do ponto de vista do óbvio, não importando quão ternos e carinhosos tenham sido os pais ado- tivos. A extensão desse déficit nos adotivos varia de indivíduo para indivíduo, porém a n e sidade de o filho adotivo conhecer sua 'v rdadeira' identidade existirá sempre" ( 4). Vemos aqui, mesmo diante de uma situa- ão de fundamental importância para a cri- ança, como sua identidade pessoal, que o amor, sendo necessário, é insuficiente para stabelecê-la. Mesmo assim, muitos pais pen- sam que, por amarem intensamente seus fi- lhos, encaminharão bem todas as coisas. Sem dúvida, o amor é o caminho para a dinamiza- 'ão das relações interpessoais, mas nunca o será de uma forma absoluta. Ainda sobre essa questão, sabemos que, dentre os conflitos que a criança adotada en- frenta, um dos mais importantes é o que tem a ver com o estabelecimento de sua identi- dade diante da incontestável existência de "quatro pais" na sua história pessoal. Como organizará sua história do ponto de vista cri0~ nológico, ordenando· a existência dess-à' du- plicidade de origem? Se de um l~do há um 'o meço genético (pais biológicos); de outro, há um começo afetivo (pais adotivos). É pela informação dos elementos da sua história, e através da formação de laços afeti- s, que se organiza a sua identidade pesso- al. A experiência nos diz que, ao longo do t mpo, vai prevalecer a ligação afetiva, fican- i o vínculo biológico como um componen- histórico da identidade. É, portanto, por intermédio da afetividade compartilhada que • 29 se consolida a autêntica relação parental. Apesar disso, constatamos que o amor dos pais pelos filhos não garante a reciprocidade afetiva, o que é verdadeiro também para a parentalidade biológica. Até aqui temos dito que o amor não pode ser imposto. Precisamos, porém, dar ênfase a uma idéia mencionada apenas de passagem: ele pode ser exposto, até porque, dificilmente, alguém poderá contê-lo represado em si.O que se vive em segredo um dia será mostrado abertamente. Esse processo, de algum modo, está im- plícito na afirmação de John Bowlby: "Se um bebê tem o amor e a companhia de sua mãe e logo também a de seu pai, ele crescerá sem uma pressão exagerada de anseios libidinais e.sem uma propensão irresistível para odiar. Se não tiver essas coisas, seus anseios libidi- nais provavelmente serão muito elevados, o que significa que o bebê estará procurando constantemente amor e afeição, e será con- tinuamente propenso a odiar aqueles que não conseguem - ou lhe parecem não conseguir -dar-lhe o afeto que ele tanto deseja"(S). · O amor é a emoção que propulsiona o desenvolvimento pessoal e proporciona cres- cimento sem esperar recompensa. Não é de ua natureza buscar contra-partida. III AMOR E PERDA Já dissemos que o amor independe do co- nhecimento e que, embora seja intenso, não pode ser imposto à pessoa amada como tam- bém, por ser incondicional, não exige retri- buição. Ele é unilateral; surge sem que ne- . ssite de correspondência, mas precisa d um objeto (pessoa) para se expressar e ·rescer. Dissemos também que ele não acaba. Sub- H i te na sua essência, mas quando se vê con- finado ao nascedouro, se entristece por não poder aparecer em todo o seu esplendor. É nesse cenário que surge o fantasma ameaçador da perda, geralmente, resultante da ação unilateral do outro ou de circunstân- ·ias incontroláveis. Assim, perde-se quem se ama sem que se perca o amor. É por essa 1 azão que o amor traz em si o germe do so- • 31 frimento, pois o afastamento provisório ou definitivo do ser amado instala a dor para a qual o único lenitivo é a consciência que tem o amante do amor que possui. Só isso o man- tém vivo para continuar amando, porque o amor não morre. Impossív°el, portanto, é dissociar o amor da dor, pois esta se insere no vazio deixado pela ausência de quem se ama. Estamos sujeitos a dois tipos ,~e dor: a dor física e a dor da alma. Aquela, a tecnica mé- dica e psicológica se encarregam de resolver ou amenizar. Esta só desaparecerá quando incorporarmos as aprendizagens para as qua_is nos sobreveio. Amor e dor são pedagógicos. A perda estávinculada à dor da alma. É o desconforto provocado pelo abandono que al- tera o campo de desenvolvimento do amor, dificultando ou impedindo sua realização. Provavelmente a dor da perda não é gratuita. Essa é, no entanto, uma questão para ser con- siderada do ponto de vista estritamente pes- soal. Aqui ninguém pode interferir para dar explicações. Cada qual com sua dor. Cada dor com seu ensinamento. Sabemos, pela convivência nas relações in- terpessoais, que as perdas precisam de um veículo de expressão, no caso, o sofrimento (a dor da alma), para que o organismo psí- 3 • quico não adoeça. Shakespeare escreveu: " oltai as palavras tristes, as penas que não falam sufocam o coração extenuado e fazem- n quebrantar" (6). Na perda, as coisas têm de ser ditas ao outro que está ausente. Se está ausente, ·orno lhe podemos falar? Falamos com o ob- j ·to (pessoa) imaginado assim como a crian- ·a o faz, montando seus cenários e colocan- d na boca dos personagens "inventados" a expressão real da sua dor. A dor da perda. A separação (perda) não verbalizada tor- na-se, então, uma ameaça à relação com o mundo exterior. Toda separação pede um motivo ou, pelo menos, uma reflexão sobre H u processo. Os rompimentos afetivos pre- ·i am ser tratados pelas partes neles en- volvidas para que se consiga elaborar de uma maneira saudável a perda ou o afasta- mento. Quando se nega a oportunidade da ivência das rupturas nas relações inter- p ssoais, comete-se uma injustiça com a 1 arte que sofre a perda, porque ela fica des- pr vida de instrumentos que a auxiliem na rganização da desordem provocada no . u interior. Essas reflexões têm valor e aplicação uni- v ·rsais, ajustando-se às mais diversas situa- ·- es do comportamento humano. • 33 Quando pensamos no processo psicológi- co vivido pelos filhos adotivos, entendemos com mais facilidade as peculiaridades da or- ganização da sua vida afetiva, porque estão atrelados a uma seqüência de ganhos e per- das de amores conquistados a duras penas, perdas sofridas pela ação daqueles de quem . . se esperaria que os amasse e seguisse com eles o caminho da vida. Comumente olha-se o filho adotivo sob o aspecto dos seus ganhos: ganha pai, mãe, fa- mília, oportunidades de crescimento e edu- cação. Fica em plano secundário o que veio antes de tantos ganhos: as perdas que ocorr~- ram, muitas vezes, quando tudo começou (na fecundação, nascimento, estabelecimento dos vínculos afetivos com as figuras parentais bi- ológicas e seu posterior rompimento). A sobrevivência de uma criança está além da manutenção de sua fisiologia e, até mes- mo, do funcionamento de sua inteligência. Ela só será verdadeiramente humana quan- do alcançar níveis confortáveis de interação afetiva. Uma criança não vive sem amor (Cf. René Spitz). "O comportamento de ligação é concebi- do como qualquer forma de comportamento que resulta em que uma pessoa alcance ou marrtenha a proximidade com algum outro U • indivíduo diferenciado e preferido, o qual é usualmente considerado mais forte e ( ou) mais sábio" (7). Isso nos indica que o de- envolvimento da criança pressupõe e neces- ita envolvimento afetivo, seja com os pais biológicos ou adotivos. No caso dos filhos adotivos, acrescenta-se à sua história a rup- tura dos laços afetivos com a mãe de origem e a transposição dessa ligação para uma nova figura maternal. É importante termos em vista que, na sua f rma básica, a ligação afetiva de uma crian- ·a com pessoas significativas assume um ca- ráter de relevância durante os nove primei- r s meses de vida. Quanto maior a interação · m a figura mais próxima, maior o aprofun- damento dos laços de afeto que darão instru- mentos insubstituíveis para a organização de ~ua vida de relação com as pessoas. Entender a perda afetiva por que passa a ·riança adotada quando se desliga da mãe bi- ol gica ou da pessoa a quem estava apegada · upri-la de amor ( diferente de superprote- çã ) é o bem maior que a ela se pode dar. Essa seria uma das fortes razões por que o filhos adotivos tentam fazer o "caminho d volta" quando empreendem a busca da sua ori em histórica. Estariam vivendo de uma forma consciente e determinada o luto da • 35 primeira vinculação afetiva para dar pleno sentido à ligação com os pais adotivos. A pro- cura dos pais biológicos, portanto, não tem como objetivo a substituição da parentalida- de adotiva. A perda, dentro de uma relação de amor, precisa ser v~vida para ser convenientemen- te resolvida. Acreditamos que após uma per- da há uma seqüência de três comportamen- tos distintos: protesto, desespero e desliga- mento. É natural e esperado o protesto por causa do sentimento de espoliação e de obs- trução do fluxo pessoal da vida. O desespero sobrevém pela constatação do vazio produzi- do pela ausência da pessoa que compunha parte do sentido de vida. O desligamento da pessoa que se afastou completa o processo da perda, possibilitando a recomposição da trajetória da vida, que nunca mais será ames- ma. A vida será uma outra vida e não a volta a situações anteriormente experimentadas, mesmo que tenham sido agradáveis e gratifi- cantes. Após uma perda, mesmo tendo havido um vínculo afetivo de importante significação existencial, a vida será construída em função da lacuna deixada, o que não implica, neces- ariamente, uma forma ruim ou deteriorada d' viver. I(). Essas três fases indicam o processo sau- iável de resolução de uma crise de ordem ·mocional. Bowlby sugere: " ... uma pessoa que sofre uma perda experimenta comumen- t um impulso irresistível para reaver a pes- H a, mesmo sabendo que a tentativa é infru- tífera, e para recriminá-la por ter partido mesmo quando sabe que a recriminação é irracional" (8). As emoções mais profundas do ser huma- no estão ligadas à estruturação, manutenção, rompimento ou reconquista dos vínculos emocionais. Isso nos remete aos começos das 1 i ações afetivas do filho com a mãe biológica p r menor que tenha sido o tempo de convi- A ncia. Querer apagar da memória emocio- 1 wl da criança essa introdução ao arcabouço af tivo da sua vida é expô-la a estados de vul- 11 rabilidade na relação com as pessoas com qu m se encontrará ao longo do tempo. O m do e o sentimento de ameaça diante da 11 cessidade de colocar o filho adotivo face a 1 a com a sua origem não podem superar a 11nportância e o direito de conhecê-la. Em uma carta a Binswanger, que sofrera, ao que parece, uma perda significativa, Freud eH reveu: "Embora eu saiba que após tama- nha perda o estado agudo de luto acabará por di ipar-se, também sei que permanecere- • 37 mos inconsoláveis e nunca encontraremos um substituto. Seja o que for que venha pre- encher a lacuna e ainda que a preenchesse completamente, continuaria sendo, não obs- tante, uma outra coisa. E, na realidade, é as- sim que deve ser. É a única maneira de per- petuar aquele amor a que não queremos re- nunciar" (9). Parece claro que não se pode desprezar o desenrolar da vida afetiva dos filhos adotivos por terem vivenciado vínculos rompidos e re- compostos com figuras parentais "substitu- tas". Na realidade os pais adotivos não subs- tituem os biológicos, até porque não há ne- cessidade de assumirem esse lugar. Os ado- tivos são pais, assim como os biológicos con- tinuam sendo. IV PAIS BIOLÓGICOS Entendendo a natureza e a dinâmica do amor nas relações interpessoais e, especifi- ·amente, nas relações parentais, podemos p nsar com mais propriedade nos pais bioló- gicos e no lugar que ocupam na história do filho adotivo. Sabemos que o filho (biológico ou adoti- v ) surge antes mesmo do processo natural da procriação. Aparece no desejo comparti- lhado de duas pessoas ou, apenas, como re- sultado de um processo puramente fisiológi- .. De qualquer forma, o filho instala-se em um espaço virtual. É como se "existisse" an- t s de existir. Ele provém não só da gravidez, 1 as de um contexto histórico q~ue se organi- ,r,a na mentee nas emoções dos pais biológi- ·os. Isso mostra a complexidade do processo le filiação que, nesse sentido, é o mesmo • 39 tanto para o filho biológico quanto para o ado- tivo: " ... a filiação do filho adotivo inclui tam- bém conhecer e aceitar aqueles que o pro- criaram" ( 1 O). A necessidade maior dos filhos adotivos não é, entretanto, apenas conhecer sua ori- gem, mas os motivos pelos quais foram aban- donados. Na maioria das vezes, não expres- sam esse desejo, mas o vemos subjacente nos seus processos de busca da história pessoal. É, porém, no processo psicoterápico que ve- mos com mais detalhes a explicitação desse desejo, sobretudo através de projeções em desenhos, histórias "inventadas" e na des- crição de sonhos. Para muitos pais adotivos essa necessida- de de busca e identificação da causa do aban- dono soa como uma ameaça à relação afetiva com o filho. Por essa razão, há duas questões que precisam ser levadas em conta, quando se decide adotar um filho. A primeira é a re- solução interna (pessoal) do problema da es- terilidade. A segunda, a impossibilidade de ,, encontrar suas características biológicas no filho. Sobre a esterilidade, devemos estar aten- tos para um comportamento comum entre a pessoas que não conseguem viver a expe- ri "ncia procriativa: a tentativa de esconder a 10 • i11f 'rtilidade, escondendo também a condi- ao do filho como adotivo. É verdade que não po 1 mos ignorar o referencial da nossa cul- t 11ra, que impõe a condição de procriar como 1111\ valor pessoal insubstituível. A infertili- da 1 leva, na maioria dos casos, a um senti- 111 nto de incompletude que se confunde 1·0111 a idéia de inferioridade, o que provoca 111 canismos de fuga, criando, muitas vezes, 1 l I fi uldades para pais e filhos adotivos que t· v"em embaraçados em problemas desne- 1 t·Hsários. O fenômeno da esterilidade cresce de im- portância quando o vinculamos a outra ques- t ,10 fundamental: o sentido da vida. Não po- demos considerar o gerar filhos como fun- ' ,IO precípua da vida. Isso nos levará à auto- ' h·Htruição. Tratando do assunto, Viktor Frankl 1 omenta: "Entre as possibilidades que se 1hr 'm à mulher que queira dar sentido a sua 1 istência, duas se situam em primeiro pla- 11(): a de ser esposa e a de se tornar mãe. Sem d11 ida alguma, temos aí dois valores. O mal e tá m se absolutizar ambas essas possibili- c l.1d , que podem dar sentido à existência , 11 uma mulher. Se tais valores não forem , s umidos em sua relatividade, corre-se o ris- ' o d divinizá-los. É o que sucede quando a 11111th r age éomo se o ser-esposa e o tornar- • 41 se-mãe não fosse apenas um, mas sim, o úni- co valor possível para ela. Já ouvimos dizê-lo e agora o sabemos confirmado. Toda idolatria traz em si uma potencialidade vingativa, levando diretamente ao desespero. Ou, em sentido con- trário, cada desespero, em última instância, tem na sua base uma idolatria" (11). O sentido da vida resulta de um conjunto de percepções que temos do mundo e de nós mesmos como pes- soas e não apenas de um atributo ou meta in- dividual que estabelecemos. Sem dúvida, ter um filho preenche uma lacuna significativa na vida humana. Chama- nos a atenção a declaração de D.W. Winni- cott, respeitado pensador psicanalítico, que, ao final de sua vida, sem filhos, disse: " ... é muito difícil um homem morrer quando não teve um filho para matá-lo na fantasia e po- der sobreviver a ele, proporcionando assim a · única continuidade que os homens conhe- cem" (12). A segunda questão que não pode ser es- quecida quando cogitamos de adotar um fi- lho é tomarmos consciência de que não ire- mos encontrar nele a identificação no seu sentido biológico. É preciso estarmos segu- ros de que essa não é a ligação parental mai- r. Vale aqui refletir sobre as expressões que habitualmente usamos para designar o filho I • q11e eramos e aquele gerado por outros. Re- i e , i1-- e aos pais de origem dos filhos adota- do. orno "biológicos" e aos que os acolhe- i 1111 como "adotivos", leva-nos a um contra- ' 11so. Todos os filhos são biológicos e to- do s filhos são adotivos. Biológicos, por- q11t· sa é a única maneira de existirmos con- 1 e ta e objetivamente; adotivos, porque é a 1111ica forma de sermos verdadeiramente fi- 11111 . A real e autêntica parentalidade é a afe- 11 a. O processo biológico é apenas o condu- 1 •, para que se possa amar e, portanto, trans- 11, 1 mar o puramente biológico em afetivo. ( 'ompreendendo a dinâmica da parentali- cl II k, poderemos enfrentar com mais cora- ,, 111 ' determinação situações ameaçadoras q,11· 1 sestabilizam alguns pais adotivos di- 111 te da figura ( embora ausente) dos pais de 111 i , ·m de seus filhos. título de exemplo, mencionaremos al- • 1111 1nedos que habitualmente encontramos 1111 pais adotivos: , ) er m abandonados pelos filhos quando es- 1 t ·s demonstrarem interesse pelos pais de ori- ' ·m e começarem a empreender sua busca; l 1 11ao manterem um vínculo afetivo sufici- 1·11t mente forte com o filho para garantir a ·stabilidade da relação parental; • 43 1 1 1 1 l 1 li 1 c) terem sua autoridade contestada por não serem pais biológicos; d) confrontarem-se com comportamentos inadequados e socialmente reprováveis à semelhança do que supõem tenha acon- tecido com os pais biológicos ( 13). Direta ou indiretamente, os pais adotivos enfrentam o medo do rompimento da rela- ção com os filhos. Entretanto, a convivência afetiva produz recursos e instrumentos que solidificam a ligação familiar. Esse fenômeno, observado nas famílias com filhos adotivos, nos remete a uma idéia exposta por Adolf Portmann, quando descre- veu o homem como um "precocial desampa- rado e dependente". Foi dessa forma que apontou a precariedade do ser humano após o nascimento, sugerindo que sua existência embrional é excessivamente breve, o que é completada pelo que chamou de "útero soci- al" (14). Isto é, dentro do grupo social, o indi- víduo continua sua formação na interação com o ambiente. Esse ponto de vista indica a im- portâ?cia da convivência entre as pessoas como elemento de transformação e aperfei- çoamento das potencialidades pessoais. Isso nos leva a pensar que é dentro da di- n âmica das relações interpessoais que se es- 1 1 IH 1 'cem as reais e permanentes ligações ,tc-1 iva . A parentalidade adotiva se situa den- 1, 11 d ·s e contexto. 1 > ' ' crevendo as condições de sobrevivên- 1, da criança após o nascimento, Françoise 1 ,, ,1 to indica com clareza a função necessá- ,,, da mãe para a vida do filho, quando diz: 1 >t pois do nascimento, que o faz deixar a l'l,1n nta nas entranhas da mãe e estar em e 11 t lróprio organismo separado dela, ele so- l, I' 11 ma mutação: respiração, circulação, di- ,, t ao visceral e funcional e excreção autô- 111111,a. Não pode, porém, sobreviver - e isso 1111 ante pelo menos o dobro do tempo de sua 11,d.1 ·ã - sem depender do aleitamento, do d111, do asseio e da proteção dispensados por 11111:1 -riatura viva gue assuma a responsabi- l1d,1de de cuidar dele. 1 >urante muito tempo ele precisa de pais 11 li 11rais ou substitutos, e o comportamento 1, ' H co-viventes tutelares em relação a ele l,11111a-o e informa-o em sua carnalização do l 1.1 a- dia, de modo indelével tanto em ter- 11111 d estrutura quanto de linguagem, tan- 111 11:1 H funções de seu organismo físico, qua- 111 1 I iva e quantitativamente, quanto no devir .111 d -~ nvolvimento de suas potencialidades • 11dicas, que sua individuação expressará ·u modo de inserção social" (15). • 45 É nesse ambiente que os pais adotivos têm toda a oportunidade do mundo de exercer a maternidade/paternidade na sua extensão mais ampla. Desaparece aí a diferença entre pais biológicos e adotivos para sobressair ape- nas a função de pais de filhos que, sendo obrigatoriamente biológ1cos, são também cir- cunstancialmente adotivos. Ainda considerando a presença dos pais bi- ológicos na históriados filhos adotivos, vale a pena voltar a atenção para a adolescência, pois é o momento mais delicado e conturbado do desenvolvimento pessoal. Para o filho adotivo, a adolescência tem um significado especial, porque, sendo um período de substituição de algumas conquistas infantis, traz também grandes questionamentos que são feitos de forma ampla e, às vezes, desorganizadoras. O tema da origem genética tem, nesse capítulo da biografia, uma significação própria. Quem são meus pais de origem? Como são? Ainda vivem? Tenho irmãos? Essas são perguntas que explodem como petardos incontroláveis. Algumas observações sobre o adolescente adotivo são importantes e nos indicarão a me- dida dos seus conflitos. São, também, refe- renciais para entendê-los e atendê-los. Um dos aspectos relevantes no processo d e busca é a conquista da autonomia. Não 46 • 1'111 kmo frustrar o desejo da identificação da ,, 1 •t m ob pena de pôr em risco a estabili- 1 11 lt la auto-imagem pessoal. Impedir ou Ili 1c11ltar a pesquisa sobre a vida pregressa, 111 1110 de forma sutil e indireta, é uma in- 11, 1 ~ncia indevida na liberdade individual 1 ,·,dização da vida pessoal. 14. ·rdade que a autonomia tão sonhada 1,, adolescente precisa de referenciais ama- l 111 l't'ld s de pessoas mais experientes. De- 11111 , lembrar, no entanto, que o referen- 1 d I iste para que dele nos aproximemos 111 1111 afastemos, buscando, dessa forma, o 1111111 ho pessoal. < hit ro aspecto delicado das mudanças na 1111t- · ~ncia é a transformação corporal. , 1111 iv ~ncia com adolescentes nos mostra 11111, lar za essas modificações, tanto na for- 111 1 q11:1nto nas funções. A estatura aumenta 'I 111 l.1111 nte, a compleição se altera, a força · intensifica, enfim, a imagem corpo- " me formas mais delineadas e mar- . N se panorama descobrimos a deli- de ~., la situação para o filho adotivo. É 111111do u corpo físico vai assumindo as ca- l , 1, , 1 ti as do corpo adulto e ele, conscien- 1111 111 ·on cientemente, se "compara" às 1ili.11 i Jades distintivas de seus pais bioló- tória de adoção, no entanto, lhe • 47 nega essa possibilidade de comparação. Ele se parece com alguém que não lhe aparece. Esse é um momento em que o apoio afetivo é imprescindível para que ele não seja sufo- cado pela ausência de referências corporais. Nesse caso, a ausência não se assemelha ao vazio, pois é ela que preenche uma lacuna em sua história. Infelizmente os adultos não se ocupam mais detidamente desses momentos críticos do desenvolvimento do filho, assumindo, pelo contrário, uma posição de estranheza oure- criminação pelas modificações de comporta- mento que provocam. As experiências da adolescência são, sem dúvida, o cerne do desenvolvimento psicoló- gico humano, pois aí são vividas grandes e profundas angústias. É na adolescência que o indivíduo se encontra com a perda .de algu- mas conquistas infantis sem ainda ter con- quistado os direitos de adulto. É a transição na qual se vive o momento entre a ameaça da morte e a conquista da ressurreiçã·o. Não é sem propósito que a maioria das pessoas ten- de a se lembrar com ma1s detalhes dos acon- tecimentos da infância . do que das dores da adolescência. Assim, afogamos no "esqueci- mento" as dores lancinantes do medo para nos preservar do sofrimento continuado. < >utro momento da adolescência que não l'"d · passar despercebido é o da eclosão da 11alidade. A entrada na puberdade (ins- 1 d:1 ·ão da capacidade procriativa) ocorre, • 111 , ral, próximo ao início da adolescên- 1 , . Sob esse aspecto, a adolescência do fi- 11111 a lotivo se reveste de importância in- 11 n1tível. J\ Hua história é, marcadamente, a história l I cxualidade de seus pais biológicos. Isto , o que ele sabe de sua história é que seus 1 11 o geraram, mas não o criaram, o que t, 111 forma os pais de origem em pessoas li- 1d:tH a ele fundamentalmente pela ação pro- , 1 , tiva e não por uma relação de significa- 'º 1f •tiva mais profunda. Sobressai a sexu- 11 ,d:id 'e não a afetividade. 11 111 mais de duas décadas de trabalho psi- • 1111'1 :1pico, temos constatado uma incidên- , , < . pressiva de precocidade sexual em cri- 111 · :1 . 'adolescentes adotivos, o que nos leva , , 1 ab lecer a hipótese de a estreita relação , I, lii•ação histórica com os pais biológicos ser 111 ti i ·amente vinculada ao fenômeno da re- i" 11d 11 ·ão. Isso nos alerta para a necessidade , I. 111 i ·ntar os filhos adotivos desde cedo so- l,, e , . questões da sexualidade, para que dis- 1111 ·o ·s acentuadas não interfiram no desen- ,d 1111 •nto de sua personalidade. • 49 Além dessa precocÍdade, temos observa- do, em outros casos, uma exacerbação sexu- al incômoda e de difícil trato com o apareci-, mento da puberdade (Cf. W.D. Winnicott). Essas observações nos auxiliam na orien- tação do filho adotivo, não só com respeito à condução saudável da sexualidade, mas tam- bém ao encaminhamento sobre as questões ligadas à origem histórica, de vez que os pais biológicos passam a ocupar o lugar a que têm direito na vida do filho que geraram. Esse es- paço não tem a ver com qualquer interferên- cia na relação afetiva com os pais adotivos. Ain- da, não devemos descurar da sua relação com o sexo oposto dentro da perspectiva do casa- mento, o que, certamente, irá remetê-lo à his- tória de sua concepção e, portanto, ao contex- to desconhecido de sua origem, podendo pro- duzir alguma insegurança e dando margem a fantasias, provavelmente, desabonadoras da conduta sexual dos pais biológicos. Essa pos- sibilidade existirá ao negarmos ( ou distorcer- mos) a história real. Talvez essa seja uma das fortes razões por que não temos o direito de dificultar o acesso à origem, pois poderemos ser co-responsáveis por dificuldades que, de outra maneira, não existiriam. O que temos visto até aqui nos dá acerte- za de que o filho adotivo precisa encontrar O• 1111 1, d ' si um lugar para a ausência de 11 p:i i H biológicos. , 111110 acolher dentro de si a ausência de 111 Ih· deu a vida? Se se constrói um lu- 11 11,11 a a presença dos pais adotivos, há que 1 também um espaço para alguém que , 111 1pou do milagre da vida, pois uns são 'I"'' lantes pela presença e outros não me- ' , 1111 portantes por estarem ausentes. A au- 111 ,., t· a confirmação de uma presença an- , 1111 . Por essa razão, estaremos sendo pre- 1 1111 e da história pessoal quando relega- 'º ·squecimento os pais biológicos dos 11111 1dotivos. 111 . ~ncia é a presença sem objeto, mas 111, 1 , 1 ealidade biográfica. ' ilH· aqui transcrever o poema ''Ausên- 1 e 1 · J rge Luís Borges. Seus versos são 1111111 •otas de sensibilidade, descrevendo o 11 ,do o da ausência. 11 II" 1 1 levantar a vasta vida q11C' ainda agora é teu espelho: 1 11 l.1 manhã hei de reconstruí-la. 1 >, d que te afastaste, '111:tnto lugares se tornaram vãos ,·m cntido, iguais , l11z s do dia. ' I II d• , que foram nicho de tua imagem, •5[ músicas em que sempre me aguardavas, palavras daquele tempo, eu terei que quebrá-las com minhas mãos. Em que ribanceira esconderei minha alma para que não veja tua ausência que como um sol terrível, sem ocaso, brilha definitiva e desapiedada?. Tua ausência me rodeia como a corda à garganta. O mar no qual se afunda" (16). No filho adotivo, a ausência dos pais de origem é uma presença que necessita res- peito para que se estabeleça na vida o con- forto da completude e não a angústia do abandono. Os questionamentos sobre a origem fami- liar são uma forma de adequar a fantasia à realidade da existência dos pais biológicos. As perguntas serão sempre bem-vindas. O silêncio persistente sobre a origem nos deve deixar alertas para a possibilidade de pertur- bação do desenvolvimento pessoal. A busca da origem não se restringe ape- nas à satisfação de uma auto-identificação histórica, mas cumpre a finalidade de che- gar até à família biológica o que, certamente, tem a ver com anecessidade de complemen- tação da história, a busca da semelhança físi- 52 • -----~ , t·m alguns casos, o encontro com sua I 11.1. ' l .1 I ·z não seja fácil amar uma criança que 11al11 a a cada momento os que o abandona- 1111 < ) • nhecimento da origem, para os pais l,it I os, pode funcionar como a exumação 1 11111 fato que deveria permanecer sepulta- i , I• e ontexto desconfortável poderá ser 11 ,do s encararmos a família biológica ,11111 o "grupo procriativo" e a família adoti- 111110 o "grupo criador". • 53 V PASSADO E FUTURO 1 linhas e entrelinhas do capítulo ante- 11, t, ·mos a intenção de mostrar que uma I" 1 u·ncia do passado não se restringe ao em que é vivida; ela, necessaria- 1 it 1, s projeta no futuro. As experiências 1111 111:is ão cumulativas e irreversíveis. So- e em perder sua essência, produzin- 1 d, . • modo, novas formas de vida. No o do desenvolvimento humano, o pas- 1 , 1111n ·a está totalmente desvinculado do 1 , it (' 11<.lcndo dessa forma a evolução psi- 1 , 11 ., da criança e do adolescente, perce- 1111, a importância das experiências pas- l I lo filho adotivo, particularmente suas ·om os pais biológicos, que trans- 1 1111, no mínimo, durante dois momen- , , 11 i 1 ,cativos: a gestação e o nascimento. • 55 Na história de alguns, teremos de acrescen- tar ainda o tempo de convivência com os pais de origem - na maioria dos casos, apenas com a mãe. Se quisermos apontar, dentre os proble- mas que a criança adotada enfre,nta, aqueles mais comuns e, talvez, mais relevantes, in- dicaremos dois: a) o desconhecimento da origem biológica; b) a impossibilidade de ter nascido da barri- ga da mãe adotiva. A experiência clínica em psicoterapia de crianças e adolescentes adotivos nos fornece uma amostragem significativa sobre o assun- to. Para o primeiro problema - desconheci- mento da origem -, poderemos encontrar a solução para um percentual reduzido de ca- sos. Na sua grande maioria, os pais adotivos não dispõem de elementos suficientes para localizar os pais biológicos, mesmo quando estão dispostos a ajudar. É importante, no en- tanto, que a família adotiva mostre sua dispo- nibilidade para a busca, pois, independente do sucesso das tentativas, o filho terá reforça- do seu vínculo afetivo com os pais adotivos. O segundo problema - nascer da barri- ga da mãe adotiva-, por razões óbvias, não 56 • 1 , 11l11ção objetiva. O filho adotivo terá de 1 11der - os pais também - a conviver com 1 1 < ,ti idade histórica, buscando a solução 111 ,·.,minho da ligação afetiva. Na prática, a 1 , 10 afetiva terá de superar a filiação bio- 1. <) desejo de ter saído do corpo da mãe 1 ,11 ,., • tá ligado à garantia de que, dessa 11111 ,, diminuiriam as possibilidades de re- ,,. 1~, como se na interioridade do filho t I a "certeza" de que, sendo uma par- l11 1 nrpo da mãe, jamais seria desprezado • 1 1 l''llado. Se ele substitui essa "certeza" l 1, 1111Htatação dos fortes laços afetivos que 1 , 1111 1 s bretudo, à mãe adotiva, dilui-se a idade, a expectativa ou o desejo de ter , 11 l11 da sua barriga. 1 , • uma das razões por que questiona- , 1 ortna simbólica de se dizer que o fi- 1, l11t iv é "filho do coração'. Voltaremos 1111to na terceira parte deste livro. I' 11 ·ntalidade adotiva tem suas peculia-. l 1, 1, . l<Ja se desenvolve dentro de um con- 1, 1 111 oprio e, se não compreendido ade"" 1 , 1d 1111t·11te, dificultará a condução do de- 11 , d i Ili ·nto e sua estabilização. É preciso 1 1 I'' 11c11r mos entender o que se passa no 1 il •li, 1 da fantasia do filho adotivo. Por exem- q11.111do ele se refere à mãe biológica e adotiva, certamente não está dando o • 57 mesmo significado ao termo mãe. Aliás, as mesmas palavras ditas por pessoas diferen- tes não têm, necessariamente, o mesmo sig- nificado. A designação de um objeto pela pa- lavra passa pela interpretação de quem o no- meia. E a interpretação é função da percep- ção que, por sua vez, está ligada a todo um acervo de experiências passadas. Quem nos garante que, ao designar al- guém de "mãe", estaremos descrevendo as mesmas características e qualidades que ali- nhamos em nossa mente? O que percebe- mos é, em parte, o que é e, em parte, o que está dentro de nós. A interpretação é sempre individual. Por essa razão, a idéia que o filho adotivo tem de "mãe", não precisa coincidir com o pensamento daquele filho que não viveu a experiência da adoção. Sabemos que há um raciocínio possível que se instala na mente dos filhos adotivos: "Os pais que me geraram não são meus pais verdadeiros. Meus verda- deiros pais são os que me adotaram". Essa é uma lógica que precisamos aceitar, mesmo sendo para nós um paradoxo. Assim vê Eva Giberti: " ... a contradição não é posta entre duas ordens diferentes mas ntre duas afirmações: 'todo sujeito é filho da união sexual entre um homem e uma , ,· por outro lado: 'eu sou filho, mas 11, 1 11niã ' , ou melhor: 'eu não sou o l 1 11111th r e do homem que me conce- ,, 1111 ainda: 'eu sou o filho de um ho- 11111:1 mulher que não são meus pais'. 111 11 m paradoxo lógico organizado atra- 1/ 11 mações, fortalecendo a dinâmica t, 11 ,1 l l pensar no_s adotivos" ( 17). i ao nos possibilita compreender 11 11 1 lareza os esforços do filho adotivo 1 da ua origem, processo esse que t 1 1 a t·olaboração dos pais adotivos, pois 111i ·a~ pessoas confiáveis com quem 111 1111tar. Com isso ele será fortalecido, 1 , 11 t, 1 a "conciliar" a existência de sua 11 1 •cm: a biológicà e a adotiva. a razão que o passado ( origem ,, .1) 111terfere na construção do futuro. 1 , 1111>~ isso com mais clareza no ado- li, 1dotivo. ''As conjecturas do adoles- 1 , e I ito de sua origem se misturam I' 1 •11ntas e expectativas sobre seu fu- 11:i d ' cendência" (18). 1111 l.1 ações próprias de qualquer ado- 11 t, 1 om respeito a seu futuro, também 11 111111 am s no filho adotivo, apenas, nes- 1 11 il1 :1. amo vinculações específicas às ori- de sua história. Sabemos, por desconhecimento das carac- • 59 terísticas físicas e biológicas dos pais de ori- gem dá lugar a fantasias, expectativas e dúvi- das sobre como serão quando adultos. Novamente nos deparamos com uma questão concreta que, na maioria dos casos, não será resolvida através do conhecimento da origem, dada a impossibilidade de locali- zação e identificação dos pais biológicos. Há, no entanto, uma experiência que oferecerá indicações tranqüilizadoras sobre essa ques- tão. No momento em que o filho adotivo ti- ver oportunidade de gerar seus próprios fi- lhos, verá neles características genéticas e fenotípicas (aparência física) de seus pais biológicos. Mesmo que não consiga identifi- cá-las, terá a certeza de que em seus filhos estarão contidas algumas dessas marcas ge- néticas. Finalmente, encontramos uma correlação entre desconhecimento da história adotiva e dificuldades de aprendizagem. Quem lida com crianças-e adolescentes adotivos perce- be um percentual significativo de indivídu- os com distúrbios da aprendizagem. A expli- cação apressada que surge para a maioria dos casos é a existência de déficit intelectual, vin.:.. culando-se a hipotética deficiência à condi- ção de "ser adotivo". Sabemos, pela consta- tação clínica, que isso não é verdadeiro. Mui- 60 • • 11 11 que apresentam dificuldade de l1 i , •em revelam capacidade intelectual 111 c-l m sua faixa etária e, em alguns il, 111onstram inteligência acima da , lc l ' ll grupo. 1 111d11 id ntificamos perturbações no pro- l 'I 11 ·ndizagem, em geral, verificamos t 11, t·lacionadas com insegurança e sen- " de menos-valia, decorrentes de in- obre sua origem. Isto é, o desco- 1111 1110 da origem e, por isso, a desorga- 1, , l:i biografia pessoal, produzem dis- , I, naturezas variadas, inclusive blo- 1111 p dimentos à aprendizagem. d 11 1 111 ra para que a criança adotiva te- o ,l ua origem histórica possibili- ' , ct ·ioda curiosidade e da pesquisa., 11 111 . obre a origem pode produzir im- ' 1 it 11. a aplicação de sua capacidade de , 1 dl xão, levando-a a um estado de angústia que chegam a ela pelo d 111 do inconsciente. Portanto, abrir-lhe • t , 1 l:1 história pessoal é facilitar os ca- ' , 11 ., t II rais da aprendizagem. 111 111na vez, vemos que o futuro de- i!, l>oa relações com o passado. • 61 SEGREDO VI )<,JÃO E INSEGURANÇA , , ln·( pcionado por uma pessoa de con- 1.1 I ·z seja o maior abalo emocional da 1 tll'ia humana. Confiança e entrega são t 111 obre o qual se constrói o lado sau- 1 d.1 i la. 111 oposição à confiança, está o segredo. 111 d iança, a convivência entre as pes- e torna uma farsa e, por conseqüência, .1n injustiça. Manter em segredo as q11 • stão ligadas à vida é decretar, aos , •, , morte e destruição. 111 t ·ma ver tudo isso com a relação en- 11 t· filhos adotivos? Existiria atitude se- 111111tc.· numa relação que teve início atra- 11 11ma intensa ação afetiva? Lamenta- 11 11 11h', s caminhos egoístas e estritamen- 11d1 · , luais desvirtuam os sentimentos que 111 ,11 am plenos de expectativas e espe- 1 1 , I prazer. • 65 Ao analisar a atitude de alguns pais adoti- vos que, de forma completa ou parcial, ten- tam manter segredo sobre a origem biológica de seus filhos, entendemos que sua finali- dade é conquistar segurança para si e para eles. Desconhecem, no entanto, a impossi- bilidade de seu intento, pois estariam bus- cando segurança em um estado de insegu- rança. Manter o segredo sobre a história adotiva é estabelecer uma situação profundamente injusta para o próprio filho, pois a história é sabida pelos pais adotivos, a mãe biológica, outros familiares, pessoas envolvidas com o nascimento da criança, menos por aquele que tem o direito inalienável de saber: o filho. Aqui o segredo é inaplicável e desumano. O segredo é, quase sempre, resultante da insegurança provocada pelo medo da discri- minação social. É dessa forma que muitos tentam preservar a vida do filho. Como se pode preservar alguma coisa, utilizando-se um instrumento que deteriora? Uma outra razão de muitos para manter o segredo na adoção é a atitude de rejeição à diferença. Confunde-se diferença com infe- rioridade, o que dá margem a uma luta in- glória para afirmar a todo custo que família biológica e adotiva são iguais, ou que o filho , 11 111.1 t ·rn de diferente do "filho bio- 1 .1 111 istência leva, certamente, à , d., 111 ir m biológica do filho adota- ,. ig , a cada passo, atitudes dis- 1' 11 a encobrir ou explicar o que foi p111 11a se admitir o caráter de dife- 111 11t-rnidade/paternidade adotiva. p la experiência que a aceita- d li(' 1 • n as é uma variável que pode 11111 1 .,d ção bem-sucedida (Cf. Da- i < > q II se distancia demasiadamen- 11d,1d · tende a produzir desarmonia 11111 a da vida. A aceitação das dife- 111110 um componente da realidade, 1, difi ultar, organiza, de uma for- 111 i la, a trajetória pessoal. Nin- e , om egurança divorciado da sua l 1 11111 rn razão para a manutenção do 1 , 1 , 1d ~ia de que as crianças doadas 1 ,, , pod m ter tido um passado "ver- , ', I' ·rcebemos, desse modo, que 111 1, , t·la ão íntima entre estigma e 1 , " l l ma pessoa estigmatizada é pro- 111 ·gr do, mas o segredo também 1, ti rmatização" (19). 1 11 f , i, ,. ·gurança se agrega à relação pa- 1 d II f I a 1uando se tenta, desnecessa- r egredo! No esforço de pre- • 67 servar o filho de um incômodo social, _acaba- se impondo uma desordem individual. Nas entrelinhas do segredo sobre a ado- ção, encontramos ainda outro motivo para que continue existindo. Ele serve para proteger os pais inférteis da cobrança da sociedade, que impinge às pessoas a obrigatoriedade de gerar filhos para que sejam "normais". Lidar bem com a infertilidade é imprescindível para enfrentar a tentação do segredo. Embora não escondam de seus filhos, muitos pais adotivos continuam, de alguma forma, a assumir uma atitude de segredo, quando recomendam a eles não contarem para os outros sobre sua adoção. Dizem: "é um segredo só nosso". Usam o segredo como instrumento de proteção para si e o filho, sem perceber que criam uma interrogação sobre a possibilidade de existirem "outras coisas" que não lhe foram ditas. A verdade não pode ser parcial, pois não seria verdadeira. Um fato de ordem existencial, ao ser explicitado, pre- cisa não somente ser, mas também parecer verdadeiro. O segredo, ainda, interfere de forma pre- judicial na formação da identidade pessoal, pois ela é construída sobre eventos que se sucedem, promovendo uma linha de desen- volvimento que dá sentido à pessoa como ser 1 liatos históricos significativos di- 1 , 111 •anização da identidade pesso- 1,11, 11 ·ia históricas que têm a ver I, i11t ·rna - o nascimento e os pri- ,,,t.,to diretos com o mundo - são 111111 1111 ·s que auxiliam na formação 1 11dl. ,' ão inúmeros os exemplos de 1 11111 oH que lamentam desconhecer , 11d 10s dos começos de sua exis- 11d,· que nem sempre os pais po- 1111 d,11n para completar essas infor- l'11d1·m, no entanto, expor com cla- 1" ., h ·m, passando para o filho as , I<: 1ue dispõem sem medo e com • 1 111 .,t ' divagar junto com ele sobre 11( , 1:1 • hipóteses de como as coisas , 1111 . O filho precisa velejar pores- dc.·Hconhecidos, de preferência 1il1 ,doH de um navegador experiente. stão lutando para compreen- 111 t 01 ia de vida, para preencher as , 11 11 1 col car rostos nas figuras som- 1 11 1 1 k ·obrir seus motivos, para re- i il •111n 1 odo, a dissonância e a con- 1 1 111 1 por informações incompletas e 1 li 11 1 1 .. (2 ) . ~- , , 1 l11 obr a origem tende a colocar 11 e. m uma situação constrange- • 69 -- dora, porque, vivendo o impulso natural para completar sua história, teme ser desleal com os pais adotivos que, indireta ou veladamen- te, dificultam sua pesquisa. Sabemos de muitos filhos adotivos que, ao sentirem segurança e tranqüilidade nos pais adotivos que se dispõem a ajudá-los no encontro com a história, se desinteressam em prosseguir na busca. Por que o desinteres- se? Provavelmente a insistência em chegar até aos pais biológicos é, em parte, um esfor- ço para comprovar a verdade e a profundida- de do vínculo afetivo com os pais adotivos. A vitória sobre o segredo é a liberdade de buscar. Robin R. Heller assim descreveu o sentido da busca para o filho adotivo: "Para todos, a busca é urna jornada pessoal de vali- dade e capacitação. É um ato imensamente político, que insulta a passividade. É a recu- sa em aceitar o silêncio. Requer um compro- misso direto com a verdade. É simplesmente uma jornada extra que o adotado assume para responder a questão: 'Quem sou eu?"' (21). 70• VII O NÃO-DITO I, , ·alidade desconhecida lt 1111.1 sua vingança. 1 •a y Gasset , 11 faz parte do processo pedagógico, 111 mo modo corno a frustração tem pa- 11 lc- ante na aprendizagem. Com certe- o primeiro impulso é ouvir "sim" a 1 , h11scando a satisfação imediata dos nos- lc ·jos. No entanto, o passar do tempo, , 1 mostrando que aquilo que considera- , , radável nem sempre se coaduna com t· bom para produzir segurança e esta- 111 I uk. 1 > , mesma forma, porém, negar ou silen- 1, t·ndo ações benéficas e construtivas, lc 111 er, também, em outros momentos, t 111ks destruidoras, perversas e desurna- • 71 nas. Os comportamentos assumidos, as ati- tudes tomadas e as decisões comunicadas como resultado de um processo internaliza- do, e que atingem as outras pessoas sem o conhecimento delas, evidenciam algo de pa- tológico. Como decidir alguma coisa em que o outro está implicado sem que ele de nada participe? O não-dito é um instrumento de crueldade, porque surpreende e reduz as possibilidades de o outro se organizar para enfrentar a desordem que, certamente, so- brevirá. Diante de situações graves ou importan- tes, há pessoas que optam pelo recurso do não-dito para implementar suas decisõescom o objetivo de reduzir o sofrimento do outro - pelo menos no tempo - ou com a finalidade de diminuir sua dor pessoal ou, ainda, pelo medo de se confrontar com uma realidade angustiante. O não-dito é um instrumento do egoísmo. A negação da verdade que o ou- tro tem o direito de saber é evidência de fra- queza diante de uma realidade existencial. Paul Tillich resumiu a negação do "não-dito", dizendo: "O negativo vive do positivo que ele nega" (22). Há momentos em que o silêncio se apro- xima da perversidade, porque engana, pro- voca dúvidas, fragiliza, angustia, desvitaliza. 111 111 obre a verdade - agradável ou 11111.1 for.ma de domínio sobre quem 111 q11 ·stionar a confiança. ponto que compreendemos quão 1 11l'r da verdade existencial um se- 11 lc, ido. Negar a um filho elementos 1 11a formação é deixá-lo sem sus- , p 1eológica naquilo que é relevante 11 dl' l'nvolvimento. Como saber para 11111 ·m saber de onde viemos? Como 1dl'quadamente o futuro se ignora- i« 111 ·ntos norteadores das experiên- 1d:i . ? Viveremos de todo modo, mas 1 1110 do modo mais seguro e enri- 1 li , 'c·ndo as várias circunstâncias em 1111 provocam a destruição dos filhos • 1, ,1 mou de "filicídio" -Arnaldo Ras- 1 p1111 ta como forma de "matar" os fi- 111111 t lenta e atenuada pela negação obretudo nos primeiros anos de t) ()uem ama não esconde a verdade, 1 11gação afetiva suporta os embates 11111,Hlidade de alguns sentimentos ou 1 1 •radáveis.Averdade fortalece a con- e ta aprofunda o amor. , 1 ·flexões são o resultado de muitos iv "ncia e convivência com pais e dot ivos. Foram inúmeras as vezes em 1 ••••••••••••• • ••••••• • • 73 que vimos relações aparentemente tranqüi- las se tornarem angustiantes e difíceis, por- que veio à superfície o que estava contido nas profundezas de um segredo sobre a his- tória adotiva do filho. Tudo se fragiliza quan- do é construído sobre o "não-dito". Os pais adotivos tiranizam seus filhos, quando lhes negam informações que só poderiam saber por intermédio deles - ou de terceiros, o que seria incômodo e lamentável. Silenciar sobre a origem desorganiza a vida interior da criança adotada, porque a deixa sem referencial para prosseguir na estrutu- ração de aspectos importantes da personali- dade. Ela precisa ouvir a sua história para ouvir a si mesma. Balkanyi nos alerta: ''A pa- lavra ouvida tem ressonâncias afetivas e evo- ca imagens mnêmicas" (24). Isso significa que, embora a palavra não seja uma forma perfeita e completa de comunicação, é in- substituível em determinadas situações in- ter e intrapessoais. A palavra suscita as ima- gens da memória. Falar ao filho é a ação mais apropriada e confortadora que os pais podem produzir para ele. O "não-dito" incita a fantasia sobre fatos que não comportam os acréscimos da imagi- nação. Quando negamos, silenciamos ou, mesmo, dificultamos o acesso à história ado- . . . . . . . . . . . . . . . ............ . 74 • 11111 1'111111 il uindo para a exacerba- 111 1 1 1 o qu , nem sempre, resulta 1 111 p.11 a desenvolvimento. "É a 1 11 L, t 111 palavras que alivia tudo o 1 n11dido" (25). O que é dito em 1 11 a . ' compreensíveis torna-se o 11 10 sô do ponto de vista da infor- 1 11 t.11nl "'m porque acrescenta e for- 1 1111 fiança. Quando optamos pelo 1 111 ", t· p rque estamos inseguros do 111111 011 do amor do outro por nós. ·zes que sentimos dificuldade 1,, , lc· falar ao filho a verdade sobre a 1111 ia, d vemos reavaliar nosso amor e, ,11nor não esconde a verdade, por- ', krne. f 111 11, o "não-dito" é uma farsa, por- pie I q11 iramos ou não, existe uma co- 111 silenciosa entre pais e filhos, que 111 1 e· • nsciente ou inconscientemen- 11 •.1110 se pensar que o que não se fala d1t11. dito não resulta só da palavra 111.1s da palavra pensada, sentida e vi- 1111 d creveu a psicanalista Vera Lu- l111Ti: "É importante lembrar, também, tl 1 11ciar o fato da adoção contribui para l 1 ., . t,;uma uma importância desmesu- dramática e fantasiosa, porque 1 • • ' • • •• •••• • 75 todo oculto deixa margem para ser preenchi- do por qualquer outra cena, muitas vezes pior do que o fato mesmo. Além disso, uma vez iniciada uma men- tira, a própria família será levada a criar e re- criar mentiras. Os efeitos disso são sempre nocivos, com grandes prejuízos, especial- mente para crianças e adolescentes, que de- pendem tanto dos adultos mais próximos para armar seu mundo. Mas, se há pais adotivos que imaginam que conseguem suprimir o que lhes aflige ao ocultar a adoção, a psicanálise já mostrou que se enganam ingenuamente. Todos conhece- mos o dito popular de que as mentiras têm pernas curtas, e as experiências clínicas mos- tram que há um saber que se constrói a par- tir da experiência, e que, mesmo não nome- ado claramente, tem efeitos decisivos sobre a vida do sujeito" (26). Por que esconder o que está inscrito no inconsciente? Nas ligações afetivas, a comu- nicação transcende o consciente. É nesse en- contro que ultrapassamos as barreiras do ra- cional e mostramos um ao outro a face à qual poucos têm acesso. É nesse momento que se estabelece a verdadeira comunhão. Viver só o consciente seria pouco para quem ama. O amor também se nutre do inconsciente. 76 • e 111ot ivo, torna-se impossível es- 111 toria adotiva, tentando ignorar o 11 1 entranhas da origem biológica • 1 11 ,t ado. "Mesmo quando a família 11 l 1 11 a adoção, a verdade aflora por- 11 1111 ·icnte é incapaz de mentir" 1 do sobre a filiação adotiva pode al- i t qc t t,ria do desenvolvimento pesso- 1 11. 111do · nseqüências inimagináveis. lc, l ta r preservando, poderemos es- 1 , 111do o caminho do sobressalto, das 111<.· ·rtezas. Audusseau-Pouchard 111 11111a curiosa observação da psiqui- li 1111 · Bonnet: "Se Édipo tivesse co- 11a s origens, o destino que levou Ili , ulotado a matar seu pai sem saber e 11 pai biológico, poderia ter sido ............ 111 \ 111 t rpretação tradicional do mi to 1 p1 imcira violência vivida por Édi- t li, 111dono" (28). < 1 ue a filiação abrange três as- " 111 p 1 · men tares: a realidade biológi- 1 d e· ps icológica, que são indissociá- <' • ntexto que nos encontramos 1 il 1 1 ·ao "biológica" e adotiva. Pierre 1 1p1 e· , nta com clareza essa questão, li d I r. " filiação é uma realidade bio- 11111 1 1 ·alidade social e uma realidade 1 • • ••• ••• • •• • • • • •77 psicológica. A criança adotada deve viver es- sas três etapas do seu nascimento. A primei- ra vive com a pessoa que a levou em seu ven- tre, sua mãe biológica, que a trouxe ao mun- do. Sem essa separação e esse primeiro laço, não existiria. A segunda tem lugar quando é pronunciada a sentença de adoção que lhe dá um sobrenome e é registrada na sua nova família diante dos olhos da sociedade. A ter- ceira se completa quando por fim ele conhe- ce sua origem biológica e a aceita sem culpa, ao mesmo tempo que reconhece seus pais adotivos como pais com pleno conhecimen- to" (29). A filiação real exige essa completude, pois uma pessoa sem passado e sem história vive uma descontinuidade genealógica. É prefe- rível a construção de uma personalidade so- bre uma história difícil e sofrida do que ten- tar moldá-la sobre o vazio. A experiência nos ensina que o que não é anunciado, com certeza, será denunciado. 7 • VIII 1 1·.N AMENTOS l I· SNECESSÁRIOS 1, "pensamento desnecessário" 11, 11d11zimos virá em nosso auxílio 1 • .1 mos compreender um f enô- 111p11rtamento de repercussão prá- 11,, .,. Í~ verdade que será difícil , 11111 'lareza e segurança quais I' 11 a mentos considerados desne- , 11 11 rnecanismos do pensamento 11 , tHtemas de grande complexi- e sem sentido, em deter- 111 1 t'H ário poderá estar sendo o , , 11, ·nte de pensamentos impor- 11t :111t , somos assaltados em al- 1 ,1111 1 r pensamentos, cujos re- •• 111 i •dade, medo e angústia sem para a solução das situações • 79 que nos afligem. Geralmente nos deixamcan- sados e esgotados, por causa da sua natureza compulsiva e repetitiva. Parecido com o que acabamos de descre- ver é o Distúrbio Obsessivo-Compulsivo (DOC), que tem sido problema para uma in- finidade de pessoas. Apenas para dar uma idéia sucinta do que é o DOC, transcreve- mos o que diz Rapoport: "Idéias sem sentido voltam repetidas vezes à cabeça, surgidas do nada; certos atos 'mágicos' são repetidos vá- rias vezes. Para alguns as idéias não têm sen- tido (números, um número ou diversos nú- meros), para outros são pensamentos muito fortes - por exemplo, 'acabo de matar al- guém'. A intromissão, nos pensamentos conscientes diários, destas idéias intensas, repetitivas e (para a vítima) repulsivas, ab- surdas e estranhas é uma experiência dra- mática e impressionante. Não se pode tirá- las da cabeça. Esta é a natureza das obses- sões. A necessidade compulsória de repetir ri- tuais pequenos e particulares, ou complica- dos e visíveis, irracionais e esquisitos, é im- pressionante e digna de nota. É esta a natu- reza das com pulsões" (30). No entanto o que chamamos de "pensa- mento desnecessário" não assume esse ca- 80• . H melha-se ao DOC, prin- p · ·to repetitivo, o que pro- , d 11 ., ·ao da ansiedade e da an- ' 1 11 111 1 ainda, produzir estados de- 111 ,tios desnecessários estão, ge- 1 ,il.,do a temas desagradáveis irnista e ameaçadora. Ins- em nenhuma previsão 11 1111111L Ao contrário, pelo _seu , 11, ao-se estabelecendo sor- ando a fazer parte do acervo 1 , <orremos, mesmo que não 1 1111·1 progresso na solução dos 11 , f rn ma repetitiva, tais pensa- ' li :11 n aracterísticas de ante- .to ·ompostos de situações 11111 , ·ad ras dadas como "cer- t 11111 prováveis". Na maioria das f, 1111('1\tos preconizados jamais , ,11it1·e ·r, porém as dores já fo- 111 p• o<· • o exaustivo de repeti- 11111 1 p, ;hica auto-destrutiva que 11:is a viver com desânimo e as pessoas que confun- ntecipação. Se fizer- 1· 111 1 ossa metodologia do • 81 pensar sobre as situações Jo dia-a-dia, ire- mos nos deparar com previsões que nunca se realizaram, catástrofes que nunca aconte- ceram ou pensamentos que nada tiveram a ver com o que previram. São pensamentos desnecessários ou, pelo menos, dispensáveis. Se não nos mantivermos vigilantes, essa" tendência à preservação" nos levará a com- portamentos desgastantes e dolorosos. É pre- ciso aprendermos a lidar de forma mais efi- ciente com a capacidade humana de pensar, adotando hábitos mais salutares para a nossa vida intra-pessoal. É verdade que não será tarefa fácil con- trolar os pensamentos. Simplesmente eles aparecem. Entretanto, poderemos aprender a conduzi-los e aproveitá-los para o nosso en- riquecimento sem deixar que nos levem por direções improdutivas e deteriorantes. Infe- lizmente não cabe nos objetivos deste livro tratar de meios e técnicas para exercer tais controles. Muitos desses pensamentos estão ligados a estados de insegurança ou tentativas de contornar, explicar ou mudar situações de- sagradáveis e frustrantes. A recorrência aos mesmos pensamentos, nesse caso, é um es- forço para encontrar explicações a fim de minimizar a angústia, os sentimentos de cul- R2 • ·omum de "pensamentos des- 11 1 " < con truir na mente situações azão à raiva por meio d e tra- 111 1 , como conseqüência de injus- 1"' l 1111\0s vítimas. Assim, organiza- i te- es tratégias de agressão e des- ofrimentos infringidos àque- 111 ,, 11 que nos prejudicaram.Aina- 11 111 t·H tá propriamente no conteú- 1" 11 a m ntos, mas na compulsão e 111, 111<· H ' constituem em um exer- q11 1 lt-içoamento" dos instrumen- ,11, ao outro. Desse modo nos 11 11.111 lo mentalmente toda a tra- l 1 i, < 11rolaria até à nossa vitória fi- 11 .,o s ria a garantia de nossa a f rma, satisfeitos com a 111 •ança, ao mesmo tempo em , 111111 o H ntimentos de culpa dela l i11al d contas, não chegamos 1 " . . " E 11 11 .1 ; ap nas 1mag1namos . n- 1 , 11111< · ·ou e terminou em nossa 1 , ,tl,lt ,na, porém, é que esse pro- , 1 t< ·1 mina um sem-número de 11 , ptt· r ide o caráter desne- « 1 ipo d ' p ensamento. podem até ter uma • 83 1 1 I função saudável, por auxiliarem a diluição e a desativação de situações que seriam catas- tróficas se encontrassem expressão objetiva. São, no entanto, desnecessários quando as- sumem o ritmo frenético da repetição des- controlada, promovendo intenso desgaste emocional. Examinando-os do ponto de vista prático, percebemos que não contribuem para a so- lução do problema em torno do qual se de- senvolvem. A necessidade de nos precaver e garantir o sucesso diante de situações des- conhecidas nos leva a formular encenações complexas e minuciosas, que ensaiamos de- talhadamente, repetindo-as à exaustão com diálogos e marcações dignos das mais bem elaboradas peças teatrais. Colocamos a fala na boca dos opositores e retrucamos com res- postas "irrefutáveis". Repetimos, refazemos, ajustamos e repassamos tantas vezes quan- tas a energia nos permita. E, mesmo assim, não evoluímos em nada. Muitas vezes todo esse trabalho mental é realizado em cima de situações imutáveis e irreversíveis. Outras vezes, nada mais é do que uma tarefa insana, executada sobre uma hipótese que, quase sempre, não se confir- ma. E, assim, vão o tempo e a energia, que deveriam ser aplicados na ordenação dos des- compassos que as experiências dolorosas nos 84 • 1 1111 intimo da alma. , :atitudes e pensamentos desne- 1111s mem parte razoável do nosso l 11 111 io-nos a oportunidade de viver 1'••11taneidade e plenitude. "Como 1 11tro em salvas de prata, assim é a 11 t., a seu tempo" (Prov. 25: 11). O f 1 < 1 ·ríamos dizer do pensamento. < 1 i 1., que fomos discorrendo sobre os 11 1110 desnecessários, paralelamente 1 1111hém alinhando algumas situações 11 11 te encontradas na relação adotiva. 111(1meras as vezes em que pais adoti- 111 • revivem, montam e remontam cm que se vêem perdendo o filho 1 pais biológicos, que viriam inexora- 1111· r clamá-lo. ti, as vezes suspeitam que ele acalenta fantasias ligações de afeto com os origem, o que seria uma ameaça à 11 adotiva. Isso seria motivo para mer- 11·1n em intermináveis pensamentos a 110 de como lidar com tais situações. 11l>rimos, no entanto, que uma pura su- ,111 gera uma formulação extensa e com- da de pensamentos que resultam em 111 em fundamento objetivo. Nada mais 111 lo que pensamentos dispensáveis que 11 miram tempo e energia, além de pro- ' . . ... .. .... . ..... . • 85 <luzirem sofrimento. Mais uma vez, é importante acentuar a ur- gência de estarmos alertas para avaliar com mais freqüência os pensamentos que formu- lamos sobre a convivência com os filhos ado- tivos. Teremos, assim, a oportunidade de nos exercitar nessa arte de dispensar os pensa- mentos que julgarmos desnecessários e que povoam a mente à revelia do nosso desejo. Outros pensamentos desnecessários ocor- rem quando desconhecemos que a inadequa- ção do comportamento do filho não é, neces- sariamente, produto da história da adoção. Crianças e adolescentes adotivos passam pe- las mesmas crises de crescimento e adapta- ção da personalidade daqueles que são cria- dos pelos pais de origem. Raivas, rejeições, agressões, rebeldias vividas pelos filhos são comuns a adotados e não-adotados. Por que pensar que nos adotivos esses comportamen- tos estão sempre vinculados às peculiarida- des de sua história? Enfim, se conseguirmos discernir com mais clareza os pensamentos incômodos e ameaçadores que assaltam nossa mente da- queles que estão ligados a realidades factu- ais, reduziremos em muito os que são dis- pensáveis. São inúmeros os fardos desneces- sários que levamos pela vida afora. Por que não deixá-los à margem para seguir em fren- te com mais desenvoltura e prazer? 86 • ... ... ... --YELAÇÃO .. . . . . . . . . . . . . . . . . . IX BRIGATORIEDADE DA REVELAÇÃO d ida que evoluímos na observação, no 11a vivência do processo
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