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CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 1 Aula 04 Olá, Pessoal! Esta é a quarta aula do curso de Administração Pública para AFRFB e AFT. Nela, vamos ver o seguinte conteúdo: Aula 04 – 24/04: 6. Governabilidade, governança e accountability. 7. Governo eletrônico e transparência. Vamos ver o item “8. Qualidade na Administração Pública” em outra aula. Boa Aula! Sumário 1 GOVERNABILIDADE E GOVERNANÇA ...................................................................... 2 1.1 CONFUSÕES ENTRE OS CONCEITOS............................................................................... 5 1.2 CRISE DE GOVERNABILIDADE ................................................................................... 11 2 ACCOUNTABILITY ................................................................................................ 15 2.1 TEORIA DA AGÊNCIA ............................................................................................. 15 2.2 CONCEITO ......................................................................................................... 17 2.3 CLASSIFICAÇÃO ................................................................................................... 23 3 GOVERNO ELETRÔNICO ....................................................................................... 25 3.1 GOVERNO ELETRÔNICO NO BRASIL ............................................................................ 27 3.2 PAPÉIS DO GOVERNO ............................................................................................ 28 3.3 PRINCÍPIOS ........................................................................................................ 29 4 PONTOS IMPORTANTES DA AULA ......................................................................... 34 5 QUESTÕES COMENTADAS ..................................................................................... 35 5.1 GOVERNABILIDADE, GOVERNANÇA E ACCOUNTABILITY ...................................................... 35 5.2 GOVERNO ELETRÔNICO .......................................................................................... 68 5.3 LISTA DAS QUESTÕES ........................................................................................... 81 5.4 GABARITO ......................................................................................................... 98 CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 2 1 Governabilidade e governança O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado fala em “Reforma do Aparelho do Estado” ao invés de “Reforma do Estado” não sem motivo. A maior parte dos autores associa a reforma do Estado à busca de maior governabilidade e a reforma do aparelho do Estado à busca de maior governança. Segundo o próprio PDRAE: O governo brasileiro não carece de “governabilidade”, ou seja, de poder para governar, dada sua legitimidade democrática e o apoio com que conta na sociedade civil. Enfrenta, entretanto, um problema de governança, na medida em que sua capacidade de implementar as políticas públicas é limitada pela rigidez e ineficiência da máquina administrativa. Portanto, não havia um problema de governabilidade, mas sim de governança. A principal diferença entre os dois conceitos reside na dimensão que eles abordam: a governabilidade se refere a uma dimensão política; a governança a uma dimensão de gestão. A capacidade política de governar ou governabilidade deriva da relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade, enquanto que governança é a capacidade financeira e administrativa em sentido amplo de uma organização de implementar suas políticas. Podemos dizer que a governabilidade está associada às condições de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. Já a governança pode ser entendida capacidade que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas, capacidade esta que pode ser dividida em financeira, gerencial e técnica. O termo legitimidade é muito importante no conceito de governabilidade. Um governo só consegue governar caso as pessoas aceitem sua ordens, aceitem suas leis, somente se ele tiver legitimidade. Vamos ver um pouco melhor esse Um atributo do Estado, que consiste na presença, em uma parcela significativa da população, de um grau de consenso capaz de assegurar a obediência sem a necessidade de recorrer ao uso da força, a não ser em casos esporádicos. Para entender melhor o conceito de legitimidade, vamos diferenciá-la de legalidade. Para Paulo Bonavides: A legitimidade é a legalidade acrescida de sua valoração. O princípio da legalidade exprime basicamente a observância das leis, isto é, o procedimento da autoridade em consonância estrita com o direito estabelecido. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 3 Em outras palavras, significa que o poder estatal deverá atuar sempre em conformidade com as regras jurídicas vigentes. Já a legitimidade tem exigências mais delicadas, visto que levanta o problema de fundo, questionando acerca da justificação e dos valores do poder legal. A legalidade de um regime democrático, por exemplo, é o seu enquadramento nos moldes de uma constituição observada e praticada; sua legitimidade será sempre o poder contido naquela constituição, exercendo-se de conformidade com as crenças, os valores e os princípios da ideologia dominante, no caso a ideologia democrática. Portanto, no conceito de legitimidade entram as crenças de determinada época, que presidem a manifestação do consentimento e da obediência. Segundo Vedel: Chama-se princípio de legitimidade o fundamento do poder numa determinada sociedade, a regra em virtude da qual se julga que um poder deve ou não ser obedecido. Portanto, normalmente, quando as questões falarem em legitimidade, devemos associar com governabilidade. Porém, daqui a pouco eu vou mostrar que é preciso ter um pouco de cuidado, pois os conceitos estão passando por reformulações. Voltando para os conceitos, a governabilidade trabalha na dimensão política. Um exemplo em nosso país é o presidencialismo de coalizão. Como nosso sistema partidário é muito fragmentado, nenhum partido sozinho consegue formar maioria. Por conseguinte, para conseguir aprovar suas leis no Congresso, o Executivo precisa fazer acordos com outros partidos, trazendo eles para a chamada “base aliada”, formando as ditas coalizões. Assim, o fisiologismo como meio de negociação de cargos é um instrumento de governabilidade, na medida em que busca aumentar o apoio do governo. Um conceito bastante cobrado é de Eli Diniz, para quem a governabilidade refere-se às “condições sistêmicas de exercício do poder por parte do Estado em uma determinada sociedade”. Seria uma “somatória dos instrumentos institucionais, recursos financeiros e meios políticos de execução das metas definidas”. Segundo a autora, as principais características da governabilidade seriam: � a forma de governo, ou seja, se o sistema é parlamentarista (com todas as suas variantes), presidencialista ou misto, como no caso brasileiro; CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 4 � a relação Executivo-Legislativo: se esta for mais assimétrica para um ou para outro podem surgir dificuldades de coordenação política e institucional, vitais para a governabilidade plena; � a composição, formação e dinâmica do sistema partidário (com poucos ou muitos partidos), o que pode dificultar a relação Executivo-Legislativo e Estado-sociedade; � o sistema de intermediação de interesses vigente na sociedade(corporativista, institucional pluralista, dispersos, ONGs etc.); e � todo o conjunto das relações Estado-sociedade, ou seja, as relações dos movimentos organizados, associações e da cidadania com o Estado no sentido de ampliar a sua participação no processo de formulação/implementação de políticas das quais sejam beneficiários. A autora fala em “formas de governo”, mas o correto é “sistemas de governo”, já que ela está falando do presidencialismo e do parlamentarismo. Portanto, estaria na esfera da governabilidade a relação do Executivo com o Legislativo e também com a sociedade. A forma como o Estado busca o apoio dos cidadãos se insere na governabilidade. Segundo Vinícius de Carvalho, a fonte da governabilidade são os cidadãos e a cidadania organizada, é a partir deles (e da sua capacidade de articulação em partidos, associações e demais instituições representativas) que surgem e se desenvolvem as condições necessárias para a governabilidade. Já a governança tem como origem os agentes públicos ou servidores do Estado, que possibilitam a formulação/implementação correta das políticas públicas e representam a face deste diante da sociedade civil e do mercado, no setor de prestação de serviços diretos ao público. As definições de governabilidade e governança do Vinicius de Carvalho também são muito cobradas em provas, vale à pena dar uma olhada. Em uma definição genérica, podemos dizer que a governabilidade refere-se às próprias condições substantivas/materiais de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado (em um regime democrático, claro). Pode ser concebida como a autoridade política do Estado em si, entendida como a capacidade que este tem para agregar os múltiplos interesses dispersos pela sociedade e apresentar-lhes um objetivo comum para os curto, médio e longo prazos. Já a governança pode ser entendida como a outra face de um mesmo processo, ou seja, como os aspectos adjetivos/instrumentais da CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 5 governabilidade. Em geral, entende-se a governança como a capacidade que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. Esta capacidade pode ser decomposta analiticamente em financeira, gerencial e técnica, todas importantes para a consecução das metas coletivas definidas que compõem o programa de um determinado governo, legitimado pelas urnas. Outra definição importante de governança é a do Banco Mundial, segundo o qual governança é: O exercício da autoridade, controle, administração, poder de governo. É a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos sociais e econômicos de um país visando o desenvolvimento, implicando a capacidade dos governos de planejar, formular e implementar políticas e cumprir funções. Eles falam em poder, algo que nos remeteria a governabilidade, mas é o poder no gerenciamento dos recursos sociais e econômicos, por isso está relacionado à governança. 1.1 CONFUSÕES ENTRE OS CONCEITOS Até agora estávamos vendo que a governabilidade se refere mais a um aspecto político, enquanto a governança se situa na dimensão da gestão. Porém, essa distinção não é muito clara, não existe um ponto exato que separa os dois conceitos, mas sim uma área nebulosa em que eles se confundem. Podemos tentar entender isso na figura abaixo: Como vimos na definição do Vinícius de Carvalho, a governança corresponde aos “aspectos adjetivos/instrumentais da governabilidade”, ou seja, é um instrumento para que o governo consiga governar. Assim, uma boa governança aumenta a governabilidade, ou seja, há uma relação estreita entre os dois conceitos. Uma má governança também pode diminuir a governabilidade. Foi o que aconteceu na crise do modelo burocrático e do Estado de Bem-Estar. O modelo burocrático tinha uma má governança porque não administrava os Governança Governabilidade CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 6 recursos públicos adequadamente, não tinha capacidade para formular e implementar as suas políticas. Essa má governança foi gerando a insatisfação na sociedade, tanto que ocorreram as revoltas dos taxpayers, ou revolta dos contribuintes, em que as pessoas não queriam pagar mais impostos já que não viam os resultados. O Estado perdeu legitimidade, ou seja, perdeu governabilidade. Há uma área em que os dois conceitos se confundem e há divergência entre os autores. Por exemplo, vamos rever os conceitos do Bresser Pereira, da Eli Diniz e do Vinícius de Carvalho: A capacidade política de governar ou governabilidade deriva da relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade, enquanto que governança é a capacidade financeira e administrativa em sentido amplo de uma organização de implementar suas políticas. A governabilidade refere-se às condições sistêmicas de exercício do poder por parte do Estado em uma determinada sociedade”. Seria uma “somatória dos instrumentos institucionais, recursos financeiros e meios políticos de execução das metas definidas. Em geral, entende-se a governança como a capacidade que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. Esta capacidade pode ser decomposta analiticamente em financeira, gerencial e técnica, todas importantes para a consecução das metas coletivas definidas que compõem o programa de um determinado governo, legitimado pelas urnas. Podemos ver que Bresser e Carvalho colocam a capacidade financeira no conceito de governança, enquanto Eli Diniz associa os recursos financeiros com o conceito de governabilidade. Eu daria preferência pelos dois autores, pois a maior parte dos conceitos coloca capacidade financeira em governança. Porém, o conceito da Eli Diniz já foi usado várias e várias vezes pela ESAF, por isso tem que ficar de olho. Outra confusão entre os conceitos refere-se à legitimidade. Vimos que ela está associada com a governabilidade, mas o conceito de governança vem passando por reformulações. Segundo Bresser Pereira: No conceito de governança pode-se incluir, como o faz Reis (1994), a capacidade de agregar os diversos interesses, estabelecendo-se, assim, mais uma ponte entre governança e governabilidade. Uma boa governança, conforme observou Fritschtak (1994) aumenta a legitimidade do governo e, portanto, a governabilidade do país. Vimos acima a definição de Vinícius de Carvalho, que afirma que a governabilidade pode ser entendida CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 7 como a capacidade que este tem para agregar os múltiplos interesses dispersos pela sociedade e apresentar-lhes um objetivo comum para os curto, médio e longo prazos. E então: a capacidade de agregar interesses é governança ou governabilidade? É gestão ou política? É preciso saber que os conceitos em ciências sociais são reformulados ao longo do tempo, não são verdades estanques, apesar de os concursos cobrarem como se fossem. Assim, o conceito de governança vem passando por uma transformação, deixando de se restringir aos aspectos gerenciais e administrativos do Estado, para abranger aspectos ligados à cooperação entre os diversos atores e a capacidade destes em trabalharem juntos. A discussão mais recente do conceito de governança ultrapassa o marco operacional para incorporar questões relativas a padrões de articulação e cooperação entre atores sociais e políticos e arranjos institucionais que coordenam e regulam transações dentro e através das fronteiras do sistema econômico. Com a ampliação do conceito de governança fica cada vez mais imprecisa sua distinção daquele de governabilidade. Uma das definições de governançamais recentes, originária da América Latina, trata de fazer uma reapropriação do conceito de governance formulado pelo Banco Mundial, incluindo nele a dimensão da “justiça social”, como sendo uma responsabilidade do Estado. Essa nova interpretação é uma espécie de vertente de esquerda da noção de governança, que se opõe a noção difundida inicialmente pelo Banco. Enquanto esta última tem como orientação a redução do tamanho do Estado, principalmente através do seu desengajamento em relação a questões sociais, a primeira tenta atribuir a esse mesmo Estado, o papel de ator principal nas soluções dos problemas sociais. É nesse contexto que Klaus Frey fala da existência de pelo menos duas grandes vertentes analíticas que tratam de governança. Uma seria orientada pela noção difundida pelo Banco Mundial, nela se inscrevem abordagens que tem como objetivos finais principais o aumento da eficiência e da eficácia dos governos, usando para isso mecanismos de participação da sociedade civil. Na outra vertente estão inscritas abordagens que focam o potencial democrático e emancipatório da sociedade civil, como por exemplo, a noção de governança participativa. Mas, segundo o autor as diferenças significativas entre essas abordagens parecem subsistir apenas no plano ideológico, já que em termos práticos elas parecem muito próximas. Em cada uma delas, a necessidade de se levar em conta a “questão da mobilização dos saberes” tem razões diferentes. Os que seguem a vertente do CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 8 Banco Mundial olham a participação a partir “da lógica e das necessidades administrativas e governamentais”. Enquanto que, os adeptos da governança democrática, vêem na participação a possibilidade da “emancipação social e da redistribuição do poder” As teorias da governança estão se voltando cada vez mais para a análise das redes de políticas públicas, buscando analisar qual o papel do governo frente às mudanças que estão ocorrente na prestação de serviços públicos. Alguns autores conceituam a governança como o conjunto de regras, formais e informais, que direcionam o comportamento dos atores da rede. É o caso de Lynn: Regime de leis, regras administrativas, ordens judiciais e práticas que restringem, prescrevem e possibilitam a atividade governamental, onde tal atividade é amplamente definida como a produção e entrega de bens e serviços suportados por recursos públicos. Milward e Provan utilizaram o conceito de “Hollow State”, ou “Estado Esvaziado”, para descrever este novo Estado em que ele transfere a execução de serviços para entidades sem fins lucrativos. Segundo os autores: No uso comum, governo se refere às instituições formais do Estado – Executivo, Legislativo e Judiciário – e seu monopólio do uso legítimo do poder coercitivo. Governança é um termo mais inclusivo, preocupado em criar as condições para uma ação coletiva ordenada, geralmente incluindo agentes do setor privado e não-lucrativo dentro do setor público. A essência da governança é seu foco nos mecanismos de governo – acordos, contratos e garantias – que não se baseiam somente na autoridade e sanções governamentais. Segundo Löffer: A governança pode ser entendida como uma nova geração de reformas administrativas e de Estado, que têm como objeto a ação conjunta, levada a efeito de forma eficaz, transparente e compartilhada, pelo Estado, pelas empresas e pela sociedade civil, visando uma solução inovadora dos problemas sociais e criando possibilidades e chances de um desenvolvimento futuro sustentável para todos os participantes. Assim, o conceito de governança deixa de estar restrito ao campo da gestão, para ganhar contornos políticos, tanto que Frederickson afirma que “a definição implica que a governança é inerentemente política, que envolve barganha e compromisso entre atores com interesses diversos”. E o conceito de legitimidade deixa de ser algo inerente apenas à governabilidade. Para Edmilson Francisco de Oliveira: CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 9 Esse esforço teórico mostrou que a principal diferença entre governabilidade e governança está na forma como a legitimidade das ações dos governos é entendida. Enquanto no conceito de governabilidade a legitimidade vem da capacidade do governo de representar os interesses de suas próprias instituições. No conceito de governança, parte de sua legitimidade vem do processo, do entendimento de que, quando grupos específicos da população quando participam da elaboração e implantação de uma política pública, ela tem mais chances de ser bem sucedida em seus objetivos. Podemos ver aqui que a legitimidade não é mais associada apenas ao conceito de governabilidade, ela passa a integrar também o conceito de governança. Portanto, temos que tomar MUITO CUIDADO. Na governabilidade, a legitimidade está relacionada com a representação de interesses, se a sociedade percebe o governo como um legítimo intermediário na disputa de interesses entre os diversos grupos da sociedade ou se ele é visto como direcionado para determinado grupo. Na governança, a legitimidade está relacionada com a participação da sociedade nas decisões, se as políticas são formadas e implementadas junto com a sociedade. As bancas de concursos normalmente não tratam desses nuances, elas ficam em torno de pontos que são mais consensuais e superficiais. Porém, algumas vezes elas passam a incorporar mudanças mais recentes nos conceitos, e a ESAF já fez isso uma vez com esse conceito de governança. Vamos ver a questão: 1. (ESAF/CGU/2008) Durante a crise do Estado dos anos 1980 e 1990, palavras e expressões foram forjadas para possibilitar o entendimento de suas diferentes dimensões e propiciar a busca de soluções. Neste contexto, quando um governo está preocupado em legitimar decisões e ações se diz que ele está buscando maior ........... Complete a frase com a opção correta. a) governabilidade. b) efetividade. c) governança. d) accountability. e) eficiência. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 10 A questão fala em legitimidade, por isso a tendência é marcarmos governabilidade. Só que ela fala em legitimidade das “decisões e ações”, ou seja, abrange um aspecto mais da gestão, não da política. Portanto, podemos perceber que eles estavam trazendo as tendências mais recentes do conceito de governança. Tanto que a resposta da questão era a letra “C”. Todavia, como choveu recursos de pessoas que associaram a legitimidade com a governabilidade, a ESAF anulou a questão. Mas, vejam que ela não quis alterar o gabarito para a letra “A”, ou seja, ela voltou a trás, mas nem tanto. Governabilidade Governança ��� Capacidade de governar, legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade; ��� Condições sistêmicas de exercício do poder por parte do Estado em uma determinada sociedade. Somatória dos instrumentos institucionais, recursos financeiros e meios políticos de execução das metas definidas; ��� Está relacionada com: a forma de governo, a relação Executivo- Legislativo, a composição, formação e dinâmica do sistema partidário, o sistema de intermediação de interesses, todo o conjunto das relações Estado-sociedade; ��� Condições substantivas/materiais de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. ��� Autoridade política do Estado em si, entendida como a capacidade que este tem para agregar os múltiplos interesses dispersos pela sociedade e apresentar-lhes um objetivo comum ��� Capacidade financeira e administrativa de uma organização de implementar políticas públicas; ��� Aspectosadjetivos/instrumentais da governabilidade. ��� Capacidade que um determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. Esta capacidade pode ser decomposta analiticamente em financeira, gerencial e técnica; ��� O exercício da autoridade, controle, administração, poder de governo. É a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos sociais e econômicos de um país visando o desenvolvimento, implicando a capacidade dos governos de planejar, formular e implementar políticas e cumprir funções. ��� Parte de sua legitimidade vem do processo, do entendimento de que, quando grupos específicos da população quando participam da elaboração e implantação de uma política pública, ela tem mais chances CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 11 para os curto, médio e longo prazos. ��� Sua fonte são os cidadãos e a sociedade civil; de ser bem sucedida ��� Sua fonte são os servidores públicos e agentes do Estado; 1.2 CRISE DE GOVERNABILIDADE A crise do Estado de Bem-Estar estaria associada a uma crise de governabilidade. A sociedade estava cada vez mais insatisfeita com a gestão pública, tanto que surgiram as revoltas dos contribuintes, ou “taxpayers”, agravando ainda mais a crise fiscal do Estado. O diagnóstico contemporâneo sobre governabilidade ou “crise do Estado”, no contexto da globalização, tem como argumento central a crise fiscal nos centros do capitalismo avançado. As duas crises do petróleo na década de 1970 dificultaram o acesso dos Estados aos financiamentos internacionais, fazendo com que ficasse inviável cumprir todas as promessas do Estado de Bem-Estar. No entanto, a crise de governabilidade não é fruto somente da crise fiscal. Veremos agora como alguns autores classificam as causas da crise de governabilidade. Segundo Norberto Bobbio, o termo mais usado entre governabilidade e não- governabilidade é o último. Segundo o autor, esta palavra, carregada de implicações pessimistas (crise de governabilidade) e, frequentemente conservadoras, presta-se a muitas interpretações. De um lado se encontram aqueles que atribuem a crise de governabilidade à incapacidade dos governantes; de outro, aqueles que atribuem a não-governabilidade às exigências excessivas dos cidadãos. Em linhas gerais, as duas versões apresentam vários pontos de contato; porém, quando estritamente distintas, podem chegar, frequentemente, até a atos de acusação (contra governantes ou alguns grupos sociais, quase sempre os sindicatos), ou a posições ideológicas (obediência dos cidadãos ou superação do capitalismo). Segundo Bobbio: A fraqueza substancial destes posicionamentos consiste na falta de ajuste, a nível analítico, dos dois componentes fundamentais, capacidade e recursos, em sentido lato, dos Governos e dos governantes, e solicitações, apoio e recursos dos cidadãos e dos grupos sociais. A governabilidade e a não- governabilidade não são, portanto, fenômenos completos, mas processos em curso, relações complexas entre componentes de um sistema político. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 12 Bobbio divide as teorias a não-governabilidade nas seguintes hipóteses: 1. A não-governabilidade é o produto de uma sobrecarga de problemas aos quais o Estado responde com a expansão de seus serviços e da sua intervenção, até o momento em que, inevitavelmente, surge uma crise fiscal. Não-governabilidade, portanto, é igual à crise fiscal do Estado. 2. A não-governabilidade não é somente, nem principalmente, um problema de acumulação, de distribuição e de redistribuição de recursos, bens e serviços aos cidadãos, mas é, de preferência, um problema de natureza política: autonomia, complexidade, coesão e legitimidade das instituições. A governabilidade depende do relacionamento entre a autoridade e suas instituições de Governo e da força das suas instituições de oposição. 3. A não-governabilidade é o produto conjunto de uma crise de gestão administrativa do sistema e de uma crise de apoio político dos cidadãos às autoridades e aos governos. Na sua versão mais complexa, a não- governabilidade é a soma de uma crise de input (entradas, insumos) e de uma crise de output (saídas, produtos). Nas crises de output, o sistema administrativo não consegue compatibilizar, nem agilizar, os imperativos de controle que lhe chegam do sistema econômico. As crises de input têm a forma das crises de legitimação: o sistema legitimador não consegue preservar o nível necessário de lealdade da massa, impulsionando assim os imperativos de controle do sistema econômico que ele assumiu. A sobrecarga de demanda, primeira hipótese, irá resultar em um problema econômico, a crise fiscal. As consequências da sobrecarga podem ser de vários tipos. Em primeiro lugar elas podem incidir sobre a eficácia do governo, ou seja, sobre a sua capacidade de conseguir os objetivos prometidos, assim como de ser fiel aos seus compromissos. Em segundo lugar, influem no consenso dos cidadãos, isto é, sua disposição de obedecer espontaneamente às leis e as diretrizes do governo. Aqueles que sustentam esta primeira hipótese acabam sempre caindo nas receitas de cunho neoliberalista. Como vimos, o Estado de Bem-Estar entrou em crise porque prometia inúmeros serviços, mas não tinha capacidade de financiamento. O ponto central da segunda hipótese é que uma democracia torna-se tanto mais forte quanto mais organizada, sendo que o crescimento da participação política deve ser acompanhado pela institucionalização (isto é, pela legitimação e aceitação) dos processos e das organizações políticas. Quando, porém, diminui a autoridade política, temos a não-governabilidade do sistema. O aumento da CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 13 intervenção do governo a partir da segunda metade do século XX ocorreu simultaneamente a uma perda de sua autoridade, principalmente na década de 1960. As causas desse fenômeno devem ser buscadas nas transformações culturais de grande porte, que culminaram na década de 60 em sociedades altamente escolarizadas, expostas aos meios de comunicação de massa e inclinadas a uma participação reivindicatória, e que desafiaram as autoridades em todas as instituições e em todos os setores, da família à escola, da fábrica à burocracia. As soluções propostas por esta corrente foram conservadoras, no sentido de diminuir o processo de democratização. Ocorreram as revoltas dos taxpayers justamente porque as pessoas estavam mais escolarizadas e não queriam pagar por algo que não viam retorno. A terceira hipótese se baseia na tese de Habermas e compartilha de alguns dos pressupostos sobre os quais se fundam as outras teses. De um modo particular, aceita a premissa da expansão do papel do Estado e do crescimento da sua intervenção na esfera da economia e evidencia as características políticas da crise, consequência da mudança de relação entre valores e estruturas na área da participação, das preferências e das expectativas políticas. Segundo o autor, o capitalismo sofre periodicamente crises de acumulação econômica. Esta “crise econômica” é desencadeadora de outras. Para reagir a essas crises econômicas, o Estado assume algumas tarefas de apoio ao processo de acumulação – tarefas essas que tenta dissimular uma vez que não são compatíveis com a procura de consentimento ou “lealdade das massas”, por isso gera uma “crise de legitimação”. Ocorre a “crise de racionalidade” porque há uma incapacidade do sistema administrativo em dar conta, com sucesso, dos imperativos do sistema econômico. E há uma crise de motivação porque os seus sujeitos descrentes das possibilidades democráticas se frustram em seusdesejos mais profundos. Habermas não apresenta soluções específicas para o problema da crise de governabilidade, mas afirma que “na medida em que os recursos econômicos não são suficientes para alimentar plenamente as vítimas do crescimento do capitalismo, surge o dilema de imunizar o Estado contra estas pretensões ou de paralisar o processo de crescimento”. Vamos ver agora outro autor. Ao tratar da crise de governabilidade Samuel Huntington, em “A Crise da Democracia”, identifica um conjunto de quatro fatores fundamentais que estariam interferindo nos governos e gerando crise de governabilidade: CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 14 � Erosão da autoridade dada a vitalidade da democracia (excesso de democracia). Dessa perspectiva eles consideram que o Estado de Bem- Estar difundiu uma ideologia igualitária que, ao não poder cumpri-la, acaba por deslegitimar a autoridade pública. A rigor trata-se agora de sustentar a incompatibilidade entre o keynesianismo e a democracia. � Sobrecarga do governo. Esta tese considera que a disponibilidade do Estado intervir nas relações sociais provoca um enorme aumento das demandas dirigidas às instituições políticas, determinando uma paralisia dos governos por sobrecarga de demandas. A satisfação dessas demandas gera tendências inflacionárias da economia. � Intensificação da competição política, gerando desagregação de interesses. Segundo essa tese a competição entre organizações políticas leva à incapacidade de selecionar e agregar interesses, causando a incapacidade das instituições quanto à absorção de demandas fragmentárias. O peso assumido pela administração na mediação dos conflitos provoca uma burocratização da vida pública que, por sua vez, gera a “dissolução do consenso“. � O provincianismo nacionalista na política exterior, devido a pressões exercidas pelas sociedades a respeito de suas necessidades interiores. No centro deste diagnóstico da governabilidade das sociedades contemporâneas encontra-se uma tese economicista, que localiza o fator central da crise em fatores econômicos associados à base inflacionária e ao desempenho dos fatores fiscais. As recomendações para este problema, no receituário neoliberal, envolvem medidas de reforma institucional e política, que implica: � redução das atividades do governo: as teses do Estado mínimo, que implica na reforma institucional do Estado, procedendo a uma desconcentração do Estado, através da descentralização das políticas sociais para as instâncias sub-nacionais dos municípios e repasse das responsabilidades públicas ao setor privado; � aumento de recursos e entradas à disposição dos Estados, o que tem significado um investimento e capacitação do setor tributário do governo, cuja eficiência tem função estratégica, no novo desenho do Estado; � redução das expectativas dos grupos sociais, através de uma redução e desconcentração do Estado de Bem Estar Social, reforma da Previdência e flexibilização dos Direitos sociais; aliados a uma absurda política de contração de empregos. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 15 2 Accountability Antes de entrarmos no conceito de Accountability, acho interessante vermos o que fala a teoria da agência e a relação entre agente e principal. 2.1 TEORIA DA AGÊNCIA A Teoria da Agência estuda as relações contratuais em que se observa a figura de um sujeito ativo que recebe o nome de principal, e de um sujeito passivo chamado agente. O principal é quem contrata e o agente o contratado. Essas relações podem ser explícitas (formais), em que existe um instrumento jurídico em que são expressos os direitos e deveres de cada um, ou implícitas (informais), em que as relações são orientadas por usos e costumes que sustentam e dão legitimidade às ações praticadas entre as partes relacionadas. Como exemplo de uma relação formal, temos os contratos de compra e venda, o contrato de trabalho, etc. São relações contratuais informais a entre o empregado e o patrão, o empregado e o cliente, etc. A suposição básica existente na relação principal-agente é de que o agente irá agir em favor do principal e que por isso receberá alguma recompensa. O agente, ou contratado, deverá desempenhar certas funções, de acordo com os critérios do principal, ou contratante. A teoria tenta identificar os incentivos que levam o agente a servir melhor os interesses do principal. A teoria da agência focaliza os problemas gerados pelo fato de que o agente tem de fazer algo pelo principal, mas não tem os mesmos interesses. O principal nunca tem informação completa sobre as atividades do agente, e muitas vezes nem sabe fazer as tarefas do agente. Como as partes buscam a maximização de interesses individuais, é de se esperar que o agente não vá agir sempre no interesse do principal. Por outro lado, o principal procurará estar cercado de garantias para evitar que seus interesses sejam prejudicados. Segundo essa teoria, os conflitos de agência aparecem quando o bem-estar de uma parte, o principal, depende das decisões tomadas por outra, responsável pela gestão do patrimônio do principal, o agente. Embora o agente deva tomar decisões em benefício do principal, muitas vezes ocorrem situações em que os interesses dos dois são conflitantes, dando margem a um comportamento oportunista por parte do agente. Essa abordagem tenta descobrir que arranjos contratuais e institucionais podem melhor alinhar os interesses do agente com os interesses do principal. O ideal, para o principal, é um sistema de incentivos em que o agente só pode ganhar CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 16 mais por meio de esforços que aumentam os benefícios do principal. O grosso dessa literatura tenta identificar as condições que estimulam maiores esforços dos agentes. Enfatiza especialmente os tipos e combina ações de incentivos e fiscalização que são mais adequados para os interesses do principal em vários tipos de agência. No entanto, em muitos casos o principal tem certa dificuldade em saber se o agente está realmente cumprindo com suas obrigações de forma satisfatória. Aqui entra a assimetria de informação. O agente dispõe de um conjunto de possíveis comportamentos a adotar, suas ações afetam o bem-estar entre as partes e dificilmente são observáveis pelo principal. Decorrentes da assimetria de informação surgem outros dois problemas: � Seleção adversa = quando são selecionados os agentes com maior risco. Se a indústria de seguros de vida praticar um preço baseado na média de risco das pessoas, saíra perdendo porque quem terá maior propensão a fazer seguros serão as pessoas com maior risco. Por isso que são praticados preços de acordo com o risco de cada um. � Risco moral = uma das partes envolvidas em um contrato não dispõe de condições ou mecanismos para monitorar as ações e as atitudes da outra parte envolvida, que pode ter um comportamento de risco. Muitas pessoas com plano de saúde passam a usar os serviços médicos numa proporção bem maior do que quando não tinham o plano. Também existe para o agente. Por exemplo, quando o Estado determina alguns critérios no momento da contratação das empresas privadas e depois passa a usar outras regras. Devido a esses problemas, o principal incorre em custos adicionais para ter que monitorar a atuação do agente. Por exemplo, quando uma empresa contrata um pessoa para distribuir panfletos na rua, não sabe se essa pessoa irá realmente entregá-los ou então jogá-los no lixo. É preciso monitorar a ação desse agente. A auditoria surgiu para servir de instrumento do principal no controle das ações do agente. Segundo Peters, o conflito de agência: existe desde que as empresaspassaram a ser administradas por agentes distintos dos proprietários há cerca de 100 anos. Por essa época, começou a ser delineado o conflito de agência, em que o agente recebe uma delegação de recursos e tem, por dever dessa delegação, que gerenciar estes recursos mediante estratégias e ações para atingir objetivos, tudo isto mediante uma obrigação constante de prestação de contas. (grifo nosso). Podemos observar três tipos de relações agente-principal no âmbito estatal: CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 17 � Cidadãos e políticos: � Políticos e burocratas; � Estado (burocracia e sistema político) e agentes econômicos; Os primeiros são os principais, os segundos os agentes. A sociedade é o principal que delega a responsabilidade pela gestão de seu patrimônio para o Estado. Este é o agente que deve atuar de acordo com o interesse público, ou seja, o interesse da sociedade. 2.2 CONCEITO O termo accountability vem do latim: ad + computare: contar para, prestar contas a, dar satisfação a, corresponder à expectativa de. O termo que mais se aproxima de accountability é responsabilidade. Frederich Mosher, inclusive, trata-a como sinônimo de responsabilidade objetiva: Acarreta a responsabilidade de uma pessoa ou organização perante uma outra pessoa, fora de si mesma, por alguma coisa ou por algum tipo de desempenho Assim, a accountability abrange a responsabilidade para com um terceiro. O conceito de accountability existe dentro dessa relação principal-agente, buscando definir as responsabilidades do agente em relação ao principal. Porém, o termo vai além da responsabilidade. Fernando Abrucio e Maria Rita Loureiro definem accountability democrática como: A construção de mecanismos institucionais por meio dos quais os governantes são constrangidos a responder, ininterruptamente, por seus atos e omissões perante os governados Não há tradução de accountability para o português. Alguns autores afirmam que isto se deve a pouca qualidade de nossa democracia em comparação com as anglo-saxãs. Por exemplo, Guillermo O'Donnell, um dos autores mais citados acerca de accountability, classifica as democracias da América Latina como Democracias Delegativas. Enquanto nos países desenvolvidos vigora a democracia representativa, em que a população elege representantes para atuar em seu nome, e por isso esses representantes devem atuar segundo os interesses de seus eleitores, na América Latina há uma cultura em que o representante eleito recebe um mandato para “governar da forma que ele achar melhor”. Ele possui uma ampla CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 18 liberdade de ação, sendo, aos olhos das pessoas, o “salvador da pátria”. Não há uma cultura de cobrá-lo pelas promessas de campanha nem de acompanhar de perto suas decisões. Já Anna Maria Campos, no texto “Accountability: quando poderemos traduzi-la para o português?”, afirma que: Quanto mais avançado o estágio democrático, maior o interesse pela accountability. E a accountability governamental tende a acompanhar o avanço de valores democráticos, tais como igualdade, dignidade humana, participação, representatividade. Alguns autores traduzem o termo como responsabilização, outros como dever de prestar contas, mas nenhum destes termos consegue abarcar todos os sentidos presentes na accountability. Ela abrange pelo menos três aspectos: Elementos do Cocneito de Accountability ��� Obrigação em prestar contas ��� Responsabilização pelos atos e resultados ��� Responsividade O agente administra bens pertencentes ao principal, por isso deve prestar contas desta administração. Vimos que Peters fala em “obrigação constante de prestar contas”. O segundo aspecto é a responsabilização. O agente deve responder pelos seus atos, tanto em termos de legalidade quanto de resultados. A administração gerencial mudou o foco do controle a priori sobre os processos para ser a posteriori de resultados, por isso o administrador público responde não só em termos de legalidade, mas também em termos de eficiência, eficácia e efetividade. A responsividade refere-se à sensibilidade do agente em relação à vontade do principal. O agente deve tomar suas decisões de forma a maximizar os interesses do principal, e não os seus próprios interesses. Assim, na administração pública, as decisões do governo devem ter como finalidade sempre o interesse público, seguindo o princípio da impessoalidade. Já Andréas Schedler identifica no conceito de accountability dois aspectos, ao invés de três: 1. Capacidade de resposta dos governos (answerability), ou seja, a obrigação dos oficiais públicos informarem e explicarem seus atos CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 19 2. Capacidade das agências de accountability de impor sanções e perda de poder (enforcement) para aqueles que violaram os deveres públicos. Estes dois aspetos não se diferenciam muito dos três vistos acima. O autor considera a noção de accountability bidimensional: envolve capacidade de resposta e capacidade de punição (answerability e enforcement). Contudo, a capacidade de resposta engloba dois tipos de questões: uma dimensão relativa à informação das decisões e outra condizente com a necessidade dos governantes explicarem tais decisões. A informação pode ser associada à necessidade de prestação de contas, o primeiro aspecto visto anteriormente. Já a explicação, ou justificação, está ligada à responsividade, ou seja, o administrador deve justificar seus atos para demonstrar que eles estão de acordo com o interesse público, com os anseios da sociedade Temos aqui a responsividade. Por fim, a capacidade de punição pode ser associada com a responsabilização. Essas mesmas três dimensões estão nas Normas de Auditoria do TCU (NAT). É muito importante que vocês leiam a parte do documento que fala de Accountability: http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/fiscalizacao_cont role/normas_auditoria Segundo as NAT: Esse conceito de accountability é fundamental para a compreensão da prática da boa governança e da auditoria governamental. Ele envolve, no contexto das relações que se estabelecem entre os administradores públicos, o Parlamento e a sociedade, pelo menos três dimensões – informação, justificação e sanção – como formas básicas pelas quais se pode prevenir o abuso de poder. O documento apresenta uma definição da Intosai: As normas de auditoria da Intosai conceituam a accountability pública como a obrigação que têm as pessoas ou entidades às quais se tenham confiado recursos, incluídas as empresas e corporações públicas, de assumir as responsabilidades de ordem fiscal, gerencial e programática que lhes foram conferidas, e de informar a quem lhes delegou essas responsabilidades. E, ainda, como obrigação imposta, a uma pessoa ou entidade auditada de demonstrar que administrou ou controlou os recursos que lhe foram confiados em conformidade com os termos segundo os quais lhe foram entregues. Em vários momentos do texto das NAT podemos perceber ela falando da delegação de recursos e poder por parte da sociedade para o Estado, que é CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 20 justamente o caráter da relação agente-principal. A auditoria surge nessa relação como um instrumento do principal para fiscalizar a conduta do agente, ou seja, os tribunais de conta tem como função agir em nome da sociedade (principal) para garantir que o agente busque seus interesses. Segundo as NAT: A auditoria, no contexto da accountability, conforme o conceito desenvolvido pelo Escritório do Auditor-Geraldo Canadá (OAG) é a ação independente de um terceiro sobre uma relação de accountability, objetivando expressar uma opinião ou emitir comentários e sugestões sobre como essa relação está sendo cumprida. Um problema que eu penso a respeito das NAT é que elas focam demais no aspecto legal, na fiscalização do agente para ver se ele atua conforme estabelecido nas leis. A accountability é um conceito que vem recebendo novas interpretações, principalmente após as reformas ocorridas no final do Século passado. Arlindo Carvalho Rocha, no texto que está na leitura sugerida, traça a evolução do conceito. ��� Em resumo, a visão de accountability no modelo da velha administração pública explica a nossa tão conhecida atuação dos tribunais de contas focada nos padrões tradicionais de controle e restritos à verificação da conformidade/legalidade da ação dos gestores públicos, restringindo as possibilidades de accountability a esse tipo de controle; ��� Já nos anos de 1980, surgem pressões por mudanças para superar as suas deficiências. Como resposta surge o modelo da nova gestão pública. Há uma mudança de perspectiva da accountability, de uma perspectiva pública para uma perspectiva essencialmente privada, na qual a ênfase está na prestação dos serviços desejados pelos clientes da forma mais rentável possível. A visão de accountability no modelo da nova gestão pública explica o movimento que deflagrou mudanças na visão dos tribunais de contas em relação às atividades de controle e a adoção de novas ações consubstanciadas na realização das conhecidas Auditorias de Natureza Operacional; ��� O terceiro modelo de administração pública, batizada por seus autores de “O Novo Serviço Público” (que podemos associar ao PSO), constitui-se em uma nova proposta. A sua concepção de accountability reconhece, também, que medidas de eficiência e resultados são importantes, mas não são suficientes para abranger outras expectativas que a sociedade projeta em relação aos administradores públicos, tais como agir eticamente e em conformidade com os princípios democráticos. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 21 Podemos resumir assim: na administração burocrática, valorizava-se apenas o controle de conformidade e legalidade; com a NGP, valoriza-se o controle de resultados, em termos de eficiência e efetividade; com o PSO, valoriza-se a participação da sociedade e o caráter democrático. O problema é que os tribunais de contas se concentram ainda muito na legalidade, tendo avançado pouco em termos e resultado e nada no caráter democrático. Segundo Fernando Abrucio e Maria Rita Loureiro: Normalmente, a literatura sobre a accountability trata do controle dos atos dos governantes em relação ao programa de governo, à corrupção ou à preservação de direitos fundamentais dos cidadãos. Mais recentemente, esse tema tem sido estudado em sua intersecção com a reforma do Estado, analisando como o aperfeiçoamento das instituições estatais pode contemplar, ao mesmo tempo, a melhoria do desempenho dos programas governamentais e sua maior transparência e responsabilização do poder público frente à sociedade. a) Divergências em relação ao conceito de accountability Scott Mainwaring identifica cinco áreas de divergência e disputa conceitual em torno da accountability: Escopo e abrangência do conceito: 1º Grupo: apenas os mecanismos de controle formais e institucionalizados devem ser compreendidos sob a noção de accountability, não compreende em seus limites as relações informais de fiscalização e controle, não considerando assim, como agentes de accountability, a imprensa e organizações da sociedade civil; 2º Grupo: embora não restrinjam as relações de fiscalização e controle tão somente às formas institucionalizadas e, portanto, admitam um rol de relações bem mais abrangente, estipulam que tais relações devem necessariamente incluir a capacidade de sanção aos agentes públicos. 3º Grupo: admite toda e qualquer atividade ou relação de controle, fiscalização e monitoramento sobre agentes e organizações públicas como constituintes do conjunto de mecanismos de responsabilização. Objeto dos mecanismos de accountability: CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 22 1º Grupo: limitam-se ao controle e à fiscalização de violações legais por parte de autoridades e agências públicas; 2º Grupo: os mecanismos de accountability também compreendem o monitoramento, o controle e a sanção de divergências políticas que não necessariamente envolvam delitos ou infrações legais. Capacidade de sanção: 1º Grupo: uma atividade ou mecanismo de controle e fiscalização só pode ser considerado instrumento de accountability se for capaz de impor sanções aos governantes ou burocratas sujeitos a seu escrutínio 2º Grupo: alguns mecanismos de accountability sustentam-se apenas pela capacidade de demandar justificação ou prestação de contas dos agentes públicos por seus atos e omissões – limitam-se à exigência de “answerability”; Restrição dos mecanismos de accountability à relação agente-principal: 1º Grupo: a noção de accountability se restringe às relações de agência, isto é, às relações em que um principal A encarrega um agente B para executar uma ação X em seu lugar. Segundo essa formulação, apenas nos casos em que o principal A tem a capacidade de responsabilizar e punir diretamente o agente B – através de algum tipo de punição, do desligamento automático ou da não- renovação de sua condição de agente – poder-se-ia caracterizar tal relação como uma relação de accountability; 2º Grupo: a limitação dos mecanismos de accountability às relações principal – agente torna o conceito excessivamente restrito, e deixa de considerar algumas relações institucionalizadas de fiscalização e controle entre agências públicas ou órgãos estatais. Os controles judiciais, o Ministério Público e mesmo os Tribunais de Contas permaneceriam excluídos da noção de accountability. Quais atores podem exercer o papel de agentes de accountability: 1º Grupo: admitem apenas atores institucionais como agentes de responsabilização; Accountability limitada às relações principal – agente que adotam, restringem a gama de agentes de controle a: (i) os eleitores frente a quem os governantes eleitos devem responsabilizar-se; (ii) os políticos a quem a burocracia deve responder; (iii) o parlamento (ou os parlamentares) frente a quem os gabinetes CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 23 e os ministros devem responsabilizar-se nas democracias parlamentares; e (iv) outros principais nas relações de agência presentes nas burocracias estatais. 2º Grupo: consideram um maior número atores e organizações, institucionais ou não, como agentes de accountability. 2.3 CLASSIFICAÇÃO A accountability pode ser classificada de formas diferentes. A classificação mais tradicional é a de Guillhermo O’Donnell, que diferencia a accountability horizontal da vertical. Segundo este autor, a responsabilização democrática procura aliar dois mecanismos: de um lado, os relacionados à accountability vertical, na qual os cidadãos controlam de forma ascendente os governantes (mediante o voto em representantes), com formas de democracia semidireta (como plebiscitos) ou ainda pela utilização do controle social, exemplificado pelos conselhos de políticas públicas; de outro, os vinculados à accountability horizontal, que se efetivam mediante a fiscalização mútua entre os Poderes (checks and balances) ou por meio de outras agências governamentais que monitoram o poder público, tais como os tribunais de contas. O autor define a accountability horizontal como: a existência de agências estatais que estãolegalmente capacitadas e autorizadas, e realmente dispostas e aptas, a tomar ações que ultrapassem da vigilância rotineira a sanção criminal ou impedimento em relação às ações ou omissões por outros agentes ou agências do estado que podem ser qualificadas como ilegais... pois este tipo de accountability para ser efetivo precisa ter agências que são autorizadas e dispostas a vigiar, controlar, corrigir e/ou punir ações ilegais de outras agências estatais. Em suma, seriam agências estatais funcionando rotineiramente com poderes de supervisão, punindo ações ou omissões do Estado, consideradas ilegais. É o controle exercido por instituições como o TCU, CGU, entre outras. Já a accountability vertical pressupõe uma ação entre desiguais, seja sob a forma do mecanismo do voto (controle de baixo para cima) ou sob a forma do controle burocrático (de cima para baixo). A accountability vertical é, principalmente, embora de forma não exclusiva, a dimensão eleitoral, o que significa premiar ou punir um governante nas eleições. No entanto, ela abrange também o controle exercido por instituições de hierarquia superior. Ela diz respeito à vigilância e sanções que eleitores, imprensa, ONGs, e outras organizações da sociedade civil exercem sobre funcionários públicos. É o meio disponível para que cidadãos comuns possam atuar na fiscalização da atividade CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 24 pública dos seus representantes. Embora as eleições sejam a principal fase da accountability vertical, este conceito abrange ações da sociedade civil e imprensa para fiscalização e exposição dos atos das autoridades públicas. Muitos colocam o controle exercido pelos conselhos gestores, o orçamento participativo, ou seja, os instrumentos de participação da sociedade, dentro da accountability vertical. Outros já preferem diferenciá-los do controle eleitoral, classificando-os como uma accountability societal. Este conceito surgiu da insatisfação em relação às duas outras formas de accountability – a vertical e a horizontal –, que não estariam permitindo uma participação real da sociedade nas decisões governamentais. Era preciso separar tais instrumentos do controle eleitoral. A accountability societal pode ser definida como: um mecanismo de controle não eleitoral, que emprega ferramentas institucionais e não institucionais (ações legais, participação em instâncias de monitoramento, denúncias na mídia etc.), que se baseia na ação de múltiplas associações de cidadãos, movimentos, ou mídia, objetivando expor erros e falhas do governo, trazer novas questões para a agenda pública ou influenciar decisões políticas a serem implementadas pelos órgãos públicos. Esta definição se aproxima muito do controle social. Quando a definição fala em mecanismos institucionais e não-institucionais, podemos fazer um paralelo com o monitoramento legal e o monitoramento autônomo. É não eleitoral para, justamente, se diferenciar da accountability vertical. A definição fala em influenciar decisões, trazer questões para agenda, que podemos associar com o fato do controle social não envolver apenas fiscalização, mas também participação. A noção de accountability societal incorpora novos atores, tais como associações, ONG's, movimentos sociais, mídia. Diferentemente da accountability horizontal e vertical, os agentes da accountability societal apresentam diferenças quanto aos recursos que dispõem, uma vez que não possuem, segundo essa definição, mandato para sanções legais, mas apenas simbólicas, ainda que algumas ações dessa forma de controle possam gerar sanções legais. Podemos dizer que accountability societal é controle social. Classificação da Accountability Vertical Horizontal Societal ��� Controle exercido pelo processo eleitoral, por meio do voto. ��� Controle exercido por agências governamentais ��� Controle exercido pela sociedade – institucional ou não CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 25 Essa classificação é a mais cobrada (senão a única) nos concursos. Porém, existem outras, que vou colocar aqui para vocês conhecerem: Mainwaring ramifica a accountability intra-estatal em três tipos de relações entre agentes públicos ou agências governamentais: � Relações principal-agente: são aquelas nas quais um principal designa um agente para cumprir uma determinada tarefa, ou conjunto de tarefas, e, portanto, goza de ascendência hierárquica sobre ele. Os corpos burocráticos ligados ao Executivo ou ao Legislativo são os exemplos clássicos desse tipo de relação. � Sistema Legal e outros atores estatais com poder de sanção (Judiciário e Legislativo). Tais atores não se enquadram nas relações de tipo principal- agente, mas antes poderiam ser denominados agentes de sanção. � Atores e agências estatais com a função específica de fiscalizar e controlar autoridades e organizações públicas, como os Tribunais de Contas e o Ministério Público. Fernando Abrucio e Maria Rita Loureiro também apresentam uma classificação dos instrumentos que visam garantir a accountability: � Processo eleitoral: sistema eleitoral e partidário; debates e forma de disseminação da informação; regras de financiamento de campanha eleitoral. � Controle institucional durante os mandatos: fiscalização contínua dos representantes eleitos e da alta burocracia – controle parlamentar (CPI, aprovação de altos dirigentes, fiscalização orçamentária); controle judicial (constitucionalidade, ações civis públicas); controle administrativo (tribunal de contas); controle do desempenho dos programas governamentais; controle social (conselhos, orçamento participativo). � Regras estatais intertemporais: o poder governamental é limitado em seu escopo de atuação, a fim de garantir os direitos dos indivíduos e da coletividade – cláusulas pétreas, segurança contratual, acesso prioritário aos cargos por concurso, mecanismos de restrição orçamentária. 3 Governo Eletrônico O Governo Eletrônico caracteriza-se pela utilização de tecnologias de informação e comunicação para melhorar a gestão da informação na administração pública e aprimorar os serviços oferecidos aos cidadãos, aumentando a eficiência e a CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 26 eficácia da gestão pública além de incrementar substantivamente a transparência do setor público e a transparência do cidadão nas suas relações com o Estado. O termo governo eletrônico tem foco no uso das novas tecnologias de informação e comunicação aplicadas a um amplo arco das funções de governo e, em especial, deste para com a sociedade. Em termos gerais pode-se pensar nas seguintes relações sustentadas pelo governo eletrônico: � relação governo-negócio; � relação governo-cidadão; � relação governo-governo. No primeiro tipo, a tecnologia da informação é utilizada como um instrumento de racionalização e otimização das relações do governo com seus fornecedores, por meio de sistemas como o Pregão Eletrônico, o Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores, etc. Na relação governo-cidadão, o principal objetivo é o desenvolvimento da cidadania, por meio da universalização de serviços públicos, promoção da transparência, abertura de canais de comunicação para sugestões e reclamações, etc. Na última relação, a tecnologia da informação é usada como uma forma de maior coordenação e integração entre os órgãos governamentais, os três Poderes e os demais níveis da federação. Em conjunto, o governo eletrônico além de promover essas relações em tempo real e de forma efetiva, seria ainda, potencializador de boas práticas de governança e catalisador de uma mudança profunda nas estruturas de governo, proporcionando mais efetividade,transparência e desenvolvimento, além do provimento democrático de informações para decisão. Para o Banco Mundial, e-gov refere-se ao uso, por agências governamentais, de tecnologias de informação (como redes de longa distância, Internet e computação móvel) capazes de transformar as relações com o cidadão, empresas e outras unidades de governo. De acordo com o National Audit Office (NAO), entidade de fiscalização superior equivalente ao TCU no Reino Unido, governo eletrônico significa prover acesso público via Internet a informações sobre os serviços oferecidos pelos departamentos centrais do governo e suas agências, habilitando o público à condução e conclusão de transações para tais serviços. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 27 A Organização das Nações Unidas (ONU) define e-gov como a utilização da Internet e da web para ofertar informações e serviços governamentais aos cidadãos. 3.1 GOVERNO ELETRÔNICO NO BRASIL No Brasil, o marco inicial do processo de inserção do governo nas discussões acerca do uso das tecnologias da informação e comunicação foi a criação do programa “Sociedade da Informação”, em dezembro de 1999, com o objetivo de “viabilizar a nova geração da Internet e suas aplicações em benefício da Sociedade Brasileira”. Com tal esforço, em setembro de 2000, o Governo brasileiro produziu, dentre outros documentos, o chamado “Livro Verde”, que identificou o conjunto das ações estabelecidas para impulsionar a Sociedade da Informação no Brasil, contemplando ampliação do acesso à Internet, meios de conectividade, formação de recursos humanos, incentivo à pesquisa e ao crescimento, comércio eletrônico e desenvolvimento de novas aplicações. No ano 2000 o Governo Brasileiro lançou as bases para a criação de uma sociedade digital ao criar um Grupo de Trabalho Interministerial com a finalidade de examinar e propor políticas, diretrizes e normas relacionadas com as novas formas eletrônicas de interação. Em julho de 2000, o GTTI propôs uma nova política de interação eletrônica do Governo com a sociedade apresentando um relatório preliminar GTTI- Consolidado contendo um diagnóstico da situação da infra-estrutura e serviços do Governo Federal, as aplicações existentes e desejadas e a situação da legislação de interação eletrônica. Em outubro de 2000 foi criado o Comitê Executivo de Governo Eletrônico, o que pode ser considerado um dos grandes marcos do compromisso do Conselho de Governo em prol da evolução da prestação de serviços e informações ao cidadão. A gestão do governo eletrônico brasileiro é da atribuição do CEGE, presidido pelo Chefe da Casa Civil da Presidência da República. No Brasil, a política de governo eletrônico segue um conjunto de diretrizes que atuam em três frentes fundamentais: junto ao cidadão; na melhoria da sua própria gestão interna; e na integração com parceiros e fornecedores. Podemos observar que são as três relações de que falamos acima. CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 28 3.2 PAPÉIS DO GOVERNO O governo eletrônico deve ser tratado como instrumento de transformação profunda da sociedade brasileira, o que obriga a levar em conta os múltiplos papéis do governo federal neste processo: a) Promotor da cidadania e do desenvolvimento: Isto significa que o governo eletrônico deve orientar-se para as demandas dos cidadãos enquanto indivíduos e também, para promover o acesso e a consolidação dos direitos da cidadania especialmente o direito: a. ao acesso aos serviços públicos; b. à informação; c. ao usufruto do próprio tempo pelo cidadão (economia de tempo e deslocamentos); d. a ser ouvido pelo governo; e. ao controle social das ações dos agentes públicos; f. à participação política. g. à inclusão digital. b) Instrumento de mudança das organizações públicas: Busca-se a melhoria do atendimento ao cidadão e de racionalização do uso de recursos públicos, além de aumentar a transparência da informação, permitindo que o governo eletrônico construa capacidades coletivas de controle social e participação política. Não se trata somente de colocar mais serviços disponíveis na Internet, mas de fazer com que a sua presença na Internet beneficie o conjunto dos cidadãos e promova o efetivo acesso ao direito aos serviços públicos. O governo eletrônico deve promover um deslocamento em direção à apropriação dos recursos de relacionamento entre governo e sociedade pelas organizações da sociedade civil, de forma a garantir que o governo eletrônico construa capacidades coletivas de controle social e participação política. c) Promover a disseminação da tecnologia de informação e comunicação: O governo eletrônico deve contribuir para o desenvolvimento do país. Não basta que o governo funcione como “exemplo indutor para a sociedade na utilização CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 29 de documentos eletrônicos e novas aplicações de suporte aos processos de trabalho”, numa perspectiva voluntarista e na qual o governo federal renuncia a um papel mais ativo na sociedade. Sua intervenção deve ir além do exemplo. O desenho da política de governo eletrônico e das políticas correlacionadas deve abrir espaços para a promoção ativa do desenvolvimento nacional pelo campo da geração de demanda de produtos e serviços e da articulação de iniciativas de fomento e financiamento. Cabe à política de governo eletrônico eliminar a dependência de um número restrito de fornecedores de bens, serviços e licenças de software, estimular a promover o desenvolvimento de software e de novas tecnologias computacionais por entidades de pesquisa e empresas nacionais e fomentar a adoção de instrumentos de governo eletrônico pelos outros níveis de governo. Espera-se, com isto, que possam emergir novas empresas nacionais, novas tecnologias e ambientes colaborativos de desenvolvimento que preparem a superação do paradigma do software proprietário de maneira a reduzir as fragilidades brasileiras nos embates internacionais em torno da propriedade intelectual. d) Promover práticas de Gestão do Conhecimento na administração pública: A Gestão do Conhecimento é o conjunto de processos sistematizados, articulados e intencionais, que governam as ações de criação, captação, armazenamento, tratamento, disseminação e utilização de conhecimentos, com o propósito de atingir objetivos institucionais. Essa inovadora visão de trabalho no setor público, no âmbito do Governo Eletrônico, constitui nova capacidade de articulação do processo decisório, de gestão das suas políticas estratégicas e de inclusão de um novo produtor de conhecimento geralmente esquecido: a sociedade e suas organizações. Além disso, os modelos e práticas da gestão do conhecimento são iniciativas essenciais para integração das três esferas de governo. 3.3 PRINCÍPIOS O governo eletrônico está sendo implementado segundo sete princípios, que são adotados como referência geral para estruturar as estratégias de intervenção, adotadas como orientações para todas as ações de governo eletrônico, gestão do conhecimento e gestão da TI no governo federal. São elas: CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 30 a) Promoção da cidadania como prioridade; A política de governo eletrônico do governo brasileiro abandona a visão que vinha sendo adotada, que apresentava o cidadão-usuário antes de tudo como “cliente” dos serviços públicos, em uma perspectiva de provisão de inspiração neoliberal. O deslocamento não é somente semântico. Significa que o governo eletrônico tem como referência os direitos coletivos e uma visão de cidadaniaque não se restringe à somatória dos direitos dos indivíduos. Assim, forçosamente incorpora a promoção da participação e do controle social e a indissociabilidade entre a prestação de serviços e sua afirmação como direito dos indivíduos e da sociedade. 1. O governo eletrônico deve promover a universalização do acesso aos serviços públicos em termos de cobertura e equanimidade da qualidade oferecida: � O provimento de serviços deve priorizar os serviços básicos de interesse dos cidadãos que cubram amplas parcelas da população; � Os sítios e serviços on-line do Governo Federal devem priorizar a prestação de serviços para as classes C, D, E, sem detrimento da qualidade dos demais serviços já disponíveis na Internet. � Os sítios e serviços on-line do Governo Federal devem utilizar tecnologias inclusivas e não excludentes e oferecer garantia de acesso universal, abrangendo portadores de necessidades especiais, cidadãos de baixa escolaridade e usuários de diversas plataformas 2. Os sítios e serviços on-line do Governo Federal devem ser estruturados de acordo com os assuntos de interesse e perfil do público-alvo: � acesso e a utilização de portais pelos seus usuários devem se dar de forma flexível, o que significa que diferentes dispositivos podem permitir o acesso (computadores pessoais, computadores de mão, telefones celulares); � o governo eletrônico deve promover a centralização e simplificação do acesso. Assim, os portais governamentais devem conter acesso não somente a serviços e informações providos pelo órgão ou nível de governo, mas também por outras instâncias estatais. 3. Os serviços on-line devem ser oferecidos com base nos “eventos da vida” do cidadão: � Os portais governamentais devem ser estruturados predominantemente pelas demandas dos indivíduos e eventos da linha da vida”, ou seja, CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 31 devem oferecer acesso a serviços e informações correspondentes a demandas pré-estabelecidas e vinculadas a eventos da vida dos cidadãos e cidadãs e organizações. Para tanto, devem ser organizados por agrupamentos lógicos de informação e aplicações destinados a atender categorias de necessidades dos usuários, em substituição ao critério departamental. 4. Tornar disponível a informação pública de maneira largamente acessível e compreensível: � Os sítios e serviços on-line devem ser estruturados de forma a promover a transparência das ações governamentais; � Os recursos de governo eletrônico devem oferecer novas formas de organizar e apresentar a informação de maneira a facilitar o controle social das ações de governo; � Deve-se buscar quebrar monopólios de informação, tanto no interior da administração pública como no conjunto da sociedade, de maneira a ampliar e democratizar a circulação de informações. 5. Fazer uso da Internet como um canal de comunicação entre governo e sociedade, permitindo a participação popular e a interatividade com os cidadãos: � O governo eletrônico deve ter entre seus objetivos fortalecer processos participativos, o que significa que deve incorporar recursos de interatividade que estimulem a participação ativa da sociedade. � Não somente pela via da inclusão digital, mas também pelo fornecimento de conteúdos relevantes, o governo eletrônico deve contribuir para ampliar a capacidade de participação das organizações da sociedade civil nas políticas públicas. 6. Os sítios e serviços online devem ter assegurado a qualidade e confiabilidade do seu conteúdo, o que significa que: � O governo deve estabelecer padrões públicos de qualidade para os serviços de governo eletrônico, no formato de “cartas de serviço” do governo eletrônico. As cartas de serviço são um tipo de documento público que estabelece compromissos entre governo, trabalhadores e cidadãos-usuários quanto aos direitos dos cidadãos, às características e qualidade dos serviços, os mecanismos de monitoramento e os canais de sugestões e reclamações. � Os padrões de qualidade dos serviços oferecidos através do governo CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 32 eletrônico devem dar conta de um mínimo de compromissos, como: tempos de resposta, nível de satisfação, condições de prestação do serviço, responsabilidades e direito a recurso. 7. Articulação do governo eletrônico com o desenvolvimento e a inclusão social: � Além do acesso aos serviços públicos, o governo eletrônico também deve promover a inclusão social por meio da articulação com iniciativas de promoção do desenvolvimento de maneira includente e desconcentradora de riqueza, com atenção às oportunidades de criação de novas oportunidades, à articulação com a política industrial, a geração de empregos e iniciativas de apoio às empresas nacionais. b) Indissociabilidade entre inclusão digital e o governo eletrônico; A Inclusão digital deve ser tratada como um elemento constituinte da política de governo eletrônico, para que esta possa configurar-se como política universal. Esta visão funda-se no entendimento da inclusão digital como direito de cidadania e, portanto, objeto de políticas públicas para sua promoção. 1. Segmentação de públicos: � Escolas e crianças são públicos prioritários e indispensáveis, mas não exclusivos; � As iniciativas devem enfocar o público como sujeito do processo, não apenas destinatário de serviços; � A segmentação de públicos não pode impedir que as iniciativas garantam acessibilidade universal. Poderão ser desenhados programas para públicos específicos, sem levar a constituição de “guetos” e a alimentação de exclusão e discriminação pela política de inclusão digital. c) Utilização do software livre como recurso estratégico; O software livre deve ser entendido como opção tecnológica do governo federal. Onde possível deve ser promovida sua utilização. Para tanto, deve-se priorizar soluções, programas e serviços baseados em software livre que promovam a otimização de recursos e investimentos em tecnologia da informação. Entretanto, a opção pelo software livre não pode ser entendida somente como motivada por aspectos econômicos, mas pelas possibilidades que abrem no CURSO ON-LINE – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA P/ AFRFB E AFT PROFESSOR: RAFAEL ENCINAS Prof. Rafael Encinas www.pontodosconcursos.com.br 33 campo da produção e circulação de conhecimento, no acesso a novas tecnologias e no estímulo ao desenvolvimento de software em ambientes colaborativos e ao desenvolvimento de software nacional. d) Gestão do Conhecimento como instrumento estratégico de articulação e gestão das políticas públicas: A Gestão do Conhecimento é compreendida, no âmbito das políticas de governo eletrônico, como um conjunto de processos sistematizados, articulados e intencionais, capazes de incrementar a habilidade dos gestores públicos em criar, coletar, organizar, transferir e compartilhar informações e conhecimentos estratégicos que podem servir para a tomada de decisões, para a gestão de políticas públicas e para inclusão do cidadão como produtor de conhecimento coletivo. e) Racionalização dos recursos; O governo eletrônico não deve significar aumento dos dispêndios do governo federal na prestação de serviços e em tecnologia da informação. Ainda que seus benefícios não possam ficar restritos a este aspecto, é inegável que deve produzir redução de custos unitários e racionalização do uso de recursos. Grande parte das iniciativas de governo eletrônico pode ser realizada através do compartilhamento de recursos entre órgãos públicos. Este compartilhamento pode se dar tanto no desenvolvimento quanto na operação de soluções, inclusive através do compartilhamento de equipamentos e recursos humanos. Destaque especial deve merecer o desenvolvimento compartilhado em ambiente colaborativo,
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