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A MEMÓRIA COLETIVA E O DIREITO AO ESQUECIMENTO

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VII CONGRESSO BRASILEIRO DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO 
REGULAÇÃO DA MÍDIA NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO 
São Paulo, 16 e 17 de Novembro 2014 
 
A MEMÓRIA COLETIVA E O DIREITO AO ESQUECIMENTO 
A COLLECTIVE MEMORY AND THE RIGHT TO OBLIVION 
 
José Cláudio Rodrigues Alves
1
 
Monica Walter Rodrigues
2
 
 
RESUMO: 
O recente caso decidido pela Corte de Justiça da União Européia com relação ao direito ao 
esquecimento ganhou espaço na mídia e trouxe à tona questões relativas à privacidade, liberdade de 
expressão e direito à informação, cuja ponderação revela-se tendente à proteção aos aspectos da 
personalidade na sociedade da informação. Sob essa ótica, este artigo, de método dialético e 
bibliográfico, propõe-se a pensar a relação existente entre a memória e a política, a partir da memória 
coletiva apresentada por Halbwachs e da perspectiva de memória e esquecimento de Nietzsche e Arendt, 
apontando-se, como principal desafio na decisão jurídica entre o esquecimento ou o não-esquecimento, 
não só a ponderação entre direitos da personalidade e de liberdade de expressão e de informação, mas 
uma reflexão acerca do interesse público quanto a fatos que compõe a memória coletiva. 
Palavras-chave: Esquecimento. Direitos de personalidade. Memória. Política. Ponderação. 
 
 
SUMMARY: 
The recent case decided by the Court of Justice of the European Union regarding the right to oblivion gained 
media attention and brought up issues relating to privacy, freedom of expression and right to information, which 
reveals weighted - aimed at protecting the aspects personality in the information society. Under this view , this 
article , dialectical and bibliographical method proposes to think the relationship between memory and politics , 
from the collective memory by Halbwachs and the prospect of memory and forgetfulness of Nietzsche and Arendt 
, pointing if , as a main challenge in a legal decision between forgetting or non -forgetfulness , not only the 
balance between personal rights and freedom of expression and information , but a reflection on the public 
interest as the events that make up the collective memory . 
Keywords : Oblivion. Personality rights. Memory. Policy. Weighting 
 
 
 
1
 JOSÉ CLÁUDIO RODRIGUES ALVES. Mestrando em Direito da Sociedade da Informação pela FMU, Graduado em 
Direito pela Universidade Paulista- UNIP, claudio.ralves@hotmail.com. 
2
 MONICA W. RODRIGUES, Mestranda em Direito da Sociedade da Informação na FMU, Especialista em Direito do 
Entretenimento e da Comunicação Social pela ESA/OABSP (2010), Licenciatura em Direito obtida por meio da Formação 
Pedagógica para Docentes da Educação Profissional pelo Centro Paula Souza de Educação Tecnológica (2010), graduada em 
Direito pela FMU (2001), moniwr@gmail.com.. 
85 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
INTRODUÇÃO 
 Nossa proposta inicia pela abordagem à memória e ao esquecimento como faces de uma mesma 
moeda. A memória está relacionada ao processo de acumulação, compartilhamento e ressignificação de 
aspectos individuais e coletivos no contexto social. A educação
3
 vale-se constantemente destes recursos 
como forma de transmissão de conhecimentos, isto porque, é pelo compartilhamento das experiências 
acumuladas que os indivíduos vão formando sua visão de mundo, mas também aprendem a pensar de 
modos variados sobre as coisas sob novos pontos de vista. Nesse sentido, por exemplo, as referências à 
memória como afetiva, cultural, patrimonial a respeito das quais as artes, a ciência e a história se 
encarregam de acumular e que são transmitidas como representações sociais. Acerca da construção 
dessa acumulação de experiências, Maurice Halbwachs (1968), cujo trabalho A Memória Coletiva tem 
sido referenciado desde o final do século passado por diversos autores (ARAUJO, 2007:96, DODEBEI 
e GOUVEIA, 2008:4 e FERREIRA, 2011:105), contribuiu sobre o tema ao estabelecer que entre a 
memória individual e a coletiva, esta prevalece porquanto se trata das interações sociais entre os 
indivíduos. Para ele, os pontos de referência que o homem utiliza para evocar seu próprio passado 
apontam a necessidade de apelo à memória dos outros, fixando-se a pontos de referência que estão fora 
dele e que são fixados pela sociedade, cujos instrumentos são as palavras e as idéias emprestadas do 
meio em que vive e não por ele inventadas. Ou seja, mesmo que se pense que a memória individual é 
aquela construída pelo indivíduo apenas, suas lembranças são constituídas por construções coletivas. 
Sendo assim, a memória individual que se vale do social para continuar existindo, aponta para a relação 
existente entre a memória e o esquecimento, no pensamento de Halbwachs, como faces da mesma 
moeda, já que não é possível ao indivíduo que se lembre sozinho de todos os fatos, contando assim com 
a influência e o apoio do coletivo para o avivamento das lembranças (DODEBEI e GOUVEIA, 2008:5). 
A nosso ver, estabelece-se aí, segundo o par lembrar-esquecer na perspectiva de Halbwachs, a 
dificuldade de divisão entre a memória que é tornada pública e aquela que se entende como privada, 
cuja decisão pela sociedade em relação à lembrança ou o esquecimento traz conseqüências éticas e 
políticas (GONDAR, 2005:17). 
 
DESENVOLVIMENTO 
Acerca da memória como recurso do que é transmitido na sociedade, temos que, se a construção 
da memória é coletiva, os mesmos processos (acumulação, compartilhamento e ressignificação) que 
constroem a memória também estão relacionados ao esquecimento, ao que vale lembrar que ambos não 
são processos naturais, mas discursos que dependem de seus autores. A esse respeito, interessante as 
contribuições de Silvia Salvatici tanto para o projeto
4
 Arquivos da Memória, realizado no Kozovo, em 
que a maioria de seus entrevistados, apesar das dificuldades em relação às dolorosas lembranças 
apontava o alívio em relatar seus traumas (SALVATICI, 2005:117), quanto pelo artigo Memórias de 
Gênero (SALVATICI, 2005:36), em que os relatos das mulheres resgatavam a subjetividade do 
feminino em relação a fatos que narrados sob a perspectiva masculina não revelam os mesmos 
contornos. 
 
3
 Os autores da educação divergem a respeito do conceito de educação e o sentido que ela tem nas sociedades ou para as 
diferentes classes sociais, cuja tentativa de alcance de seu sentido pela Filosofia da Educação aponta três tendências político-
filosóficas. A primeira que entende a educação como redenção capaz de direcionar a vida a condições melhores, promovendo 
um pensamento não-crítico uma vez que a educação é inerente à sociedade e gestada em seus processos de contradição. A 
segunda apresenta uma visão reprodutivista da educação, considerando-a como instrumento de dominação, determinada por 
condicionantes econômicas, sociais, políticas e culturais, cuja ação pedagógica dos educadores cinge-se na reprodução da 
ideologia da classe dominante. E a terceira como mediação de um projeto social, nem redentora, nem reprodutiva, mas uma 
instância social que pode contribuir para a democratização política, social, econômica e cultural de um país. OLIVEIRA, 
Rodrigues Elizabete. Educação e Trabalho. In: RAMOS, Ivone Marchi Lainetti et al. Formação Pedagógica para Docentes da 
Educação Profissional. São Paulo: Centro Paula Souza, 2007, p.131. 
4
 O projeto foi realizado entre 1999 e 2000 como parte distinta do programa Resposta Psicossocial e Trauma no Kosovo, 
implementado pela Organização Internacional para Migração. 
86 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
 Dentre as referências à memória como afetiva, cultural, patrimonial, destaca-se a importante 
análise realizada por Barrenechea e Dias (2013:301-325) acerca das relações entre a memóriae a 
política em Nietzsche e Arendt, apontando que, em ambos os autores, memória e esquecimento são 
fenômenos sociais que surgem num contexto de violência e coerção. Para os autores, em que pesem as 
conclusões diversas entre os pensamentos de Nietzsche e Arendt, o ponto de tangência entre os 
pensamentos dos dois filósofos, estaria na admissão do homem como animal memoriado - seja pelo 
convívio social, seja pela condição racional - e na afirmação da necessidade de se ultrapassar a 
mediocridade dos homens domesticados, anestesiados e esquecidos de sua própria condição criadora. 
Acerca das visões distintas entre Nietzsche e Arendt em relação à memória e ao esquecimento, e 
apontadas por Barrenechea e Dias, tem-se em Nietzsche (autor alemão do final século XIX) a 
valorização da ação do esquecimento como força contra os excessos da memória historicista que 
caracterizam uma espécie de cultura da obediência e que impedem o homem de não esquecer sua 
condição de rebanho. Para ele, a ação da memória atua na facilitação da conservação do poder por uma 
política que não deseja mudança. Tal situação ocorre pela necessidade gregária do homem que se vê 
vivendo em comunidades, havendo assim, desde sempre, a obediência de muitos em relação ao pequeno 
número dos que mandam (BARRENECHEA e DIAS, 2013:310). A oposição a essa dominação estaria 
no esquecimento como forma de rompimento com a condição de rebanho, permitindo a partir daí a 
atuação de forças criativas. Já, para Arendt (autora do século XX e vítima do nazismo) a presença de 
uma memória da violência empregada como fortalecimento de instituições despóticas, inibe a ação 
política, tornando os indivíduos apáticos e enfraquecendo as forças criativas do homem 
(BARRENECHEA e DIAS, 2013:318), constituindo-se nesse sentido a memória numa afirmação contra 
regimes cerceadores da liberdade do indivíduo. 
 Significativamente, Barrenechea e Dias afirmam que a violência atual, distante dos horrores dos 
campos de concentração, atua de forma sutil e elegante, invadindo com seus jogos de imagens nosso 
espaço privado das relações, atropelando, anestesiando e gerando apatia pelo debate público da política. 
Sob essa ótica, gostaríamos de abrir espaço para a uma das interessantes passagens da obra de George 
Orwell, em que Winston, o herói de 1984, que trabalhava no Ministério da Verdade, em suas reflexões 
acerca da realidade que o cercava e inscritas em seu diário como forma de comunicação com o futuro, 
dá-se conta de que apenas uma vez possuíra em suas mãos um indício concreto de um ato de 
falsificação, um fragmento do passado capaz de destruir uma teoria se pudesse ter sido publicado para 
que o mundo tomasse conhecimento. Mas, ao mesmo tempo, questiona-se acerca da efetividade desse 
ato: “será que o controle do Partido sobre o passado teria ficado menos poderoso?” indaga-se ele. As 
vantagens imediatas do controle sobre o passado ele podia compreender, afinal, como rezava o lema do 
Partido, “quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente controla o passado”, 
contudo, ainda intrigado, escreveu em seu diário: “Entendo como, mas não entendo porque”. Percebeu 
então, o imenso poderio reunido contra ele e a facilidade com que qualquer intelectual do Partido, com 
argumentos sutis, lhe derrotaria num debate. “E ainda assim, a razão estava com ele”. “O óbvio, o tolo e 
o verdadeiro tinham de ser defendidos”. A obra de Orwell, publicada em 1949, e recebida como uma 
crítica aos regimes nazi-fascistas, ainda hoje se impõe como um instrumento de reflexão, cujo ponto que 
gostaríamos de estabelecer relação entre a narrativa de Orwell e as reflexões de Barrenechea e Dias 
sobre Nietzsche e Arendt, situa-se na apatia dos indivíduos por sua condição de rebanho e, portanto, 
sujeitos ao controle, mesmo numa sociedade democrática. Tal como Winston, o homem pós-moderno 
entende como, mas não entende o porquê, motivo pelo qual, nosso esforço não em afastar a proteção aos 
aspectos da personalidade na sociedade da informação, mas em atentar para o interesse público quanto a 
fatos que compõe a memória coletiva e para a força afirmativa que se encerra na memória coletiva 
transmitida na sociedade da informação. 
 A respeito do termo “sociedade da informação” Morin (2003:8) refuta seu slogan, dizendo que 
temos excesso de informação, ao mesmo tempo em que temos insuficiência de organização dessas 
87 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
informações e, portanto, carência de conhecimento. Para ele, a compreensão não está ligada à 
materialidade da comunicação, mas ao social, ao político, ao existencial, que só será possível a partir da 
desfragmentação e reorganização dos conhecimentos, como forma de reforma do pensamento. 
 
A reforma do pensamento é uma necessidade democrática fundamental: formar cidadãos capazes 
de enfrentar os problemas de sua época é frear o enfraquecimento democrático que suscita, em 
todas as áreas da política, a expansão da autoridade dos experts, especialistas de toda ordem, que 
restringe progressivamente a competência dos cidadãos. Estes estão condenados à aceitação 
ignorante das decisões daqueles que se presumem sabedores [...]. O desenvolvimento de uma 
democracia cognitiva só é possível com a reorganização do saber [...]. Precisamos, pois, estar 
intelectualmente rearmados, começar a pensar a complexidade, enfrentar os desafios da 
agonia/nascimento de nosso entre-dois-milênios e tentar pensar os problemas da humanidade na 
era planetária. (MORIN, 2012:103-104) 
 
Dodebei e Gouveia (2008:8) apontam o deslocamento da relação passado-presente para a relação 
passado-presente-futuro na preservação do conhecimento, cujo processamento contínuo de novas 
informações é o mesmo que possibilita a fusão, complementação e descarte de informações da memória, 
tornando difícil o resgate dos formatos originais de ingresso, motivo pelo qual as memórias geridas e 
gerenciadas não podem ser tomadas mais como bancos de dados (informação), mas sim como centros de 
conhecimento, cuja informação é processada em seu interior, o que para Latour (2004) implica na 
intersecção de conhecimentos. 
 
A veracidade não vem da superposição de um enunciado e de um estado do mundo, mas procede 
antes da manutenção contínua das redes, dos centros e dos móveis imutáveis que aí circulam. A 
palavra verdade não ressoa quando uma frase se prende a uma coisa como um vagão a outro 
vagão, conforme o modelo comum da adequatio rei et intellectus. Deve-se ouvi-la antes como o 
ronronar de uma rede que gira e que se estende [...] as belas palavras de conhecimento, exatidão 
e precisão perdem seu sentido fora destas redes, dessas transformações, dessas acumulações, 
dessas mais-valias de informação, dessas inversões de relações de força. (LATOUR,2004:12-14) 
 
 Por outro lado, no que tange à veracidade, Monica Teresa Mansur Silva (2013:95) acerca do 
dever da verdade pela imprensa lembra que a verdade tem compromissos constitucionais com a honra, a 
imagem e a privacidade, salientando por outro lado que na sociedade da informação há outros meios de 
comunicação que podem ser acessados sem o controle estatal, sendo a marca principal da Internet a 
plena liberdade de expressão inclusive em relação a temas sensíveis. Para ela, em que pese o senso 
comum e sua tendência em desconsiderar regras éticas, deve imperar no relacionamento social a 
veracidade - esta que, segundo o campo filosófico, nasce da decisão de encontrá-la, do espanto, da 
admiração e do desejo de saber (MANSUR, 2013:75) - indagando a autora o porquê valorizá-la na 
sociedade da informação. Nesse sentido, os processos de acumulação, compartilhamento e 
ressignificação da memória e do esquecimento, evidenciam o tênue limite entre fatos que compõem 
aspectos públicos e privados da memória, verificando-se em certos casos a ocorrência de confrontoentre 
direitos constitucionais igualmente tutelados como os direitos da personalidade e a liberdade de 
expressão e de informação. 
Acerca dessa ampla possibilidade de divulgação de informações que por vezes confrontam os 
direitos da personalidade, recentemente, a Corte de Justiça da União Européia, reconheceu a 
aplicabilidade do direito ao esquecimento sob a perspectiva da Internet, em especial quanto aos sistemas 
de busca, chamando a atenção para as discussões em torno do tema. Isto porque, a decisão ao analisar o 
pedido formulado de exclusão de dados pessoais na rede face à Diretiva 95/46-CE, concluiu que a 
liberdade de informação não se pode sobrepor ao direito à privacidade e que a atividade desenvolvida 
pela Google e sua filial espanhola constitui tratamento de dados e não mera ferramenta tecnológica de 
88 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
busca. Em sentido oposto, a Ministra Nancy Andrighi
5
 se manifestou no sentido de que “não se pode, 
sob o pretexto de dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na web reprimir o direito da 
coletividade à informação”. A decisão foi anterior à vigência da Lei 12.965/2014 e faz referência ao 
provedor de pesquisa como espécie do gênero provedor de conteúdo
6
 limitado apenas a indicar links 
onde podem ser encontrados os termos ou expressões de busca fornecidas pelo próprio usuário. Em que 
pese a distinção entre as posições adotadas no caso europeu e o brasileiro, a decisão européia teve seus 
reflexos por aqui, porquanto o caso foi citado como referência à aplicabilidade do direito ao 
esquecimento, no recente julgado sobre a veiculação do caso Aida Curi
7
 ocorrido em 1958. Decerto que 
o Ministro Luis Felipe Salomão reconheceu a distinção de sua aplicação para a Internet e a mídia 
televisiva, contudo no mesmo acórdão fez extensa explanação sobre sua aplicabilidade à Internet, 
invocando o Enunciado 531
8
 da VI Jornada do Conselho da Justiça Federal, manifestando que “diante 
das preocupantes constatações do hiperinformacionismo, o momento é de novas e necessárias reflexões, 
das quais podem advir novos direitos ou novas perspectivas sobre velhos diretos revisitados”. 
Acerca dessa última afirmação do Ministro de “novas perspectivas sobre velhos direitos 
revisistados” nossas reflexões em torno da memória coletiva, mais especificamente quando na 
ocorrência de casos concretos envolvendo pessoas públicas ou casos que ganham notoriedade, pesa 
sobre o Judiciário a ponderação sobre a prevalência entre o público e o privado, entre a privacidade e a 
liberdade de informação. Maria Letícia Mazzucchi Ferreira, em Políticas da Memória e Políticas do 
Esquecimento, refere-se ao esquecimento como recurso para estabilização de tensões e dissipação do 
sentimento de vingança utilizado por grupos ou governos, em que o “difícil lema da unidade nacional e 
do apaziguamento” choca-se com violações a direitos humanos (2011:112). Aponta ainda a autora a 
análise de Nicole Lorax acerca da memória cívica em Atenas, indicando que na República Ateniense, o 
esquecimento por decreto é imposto como uma forma de regular a memória cívica, sendo no começo do 
século V, proibidas representações e rememorações da tomada de Mileto pelos persas em 494 
(FERREIRA, 2011:213). 
A respeito desta “difícil gestão do passado” a autora menciona as discussões em torno da Lei de 
Anistia e a parte final do voto
9
 do Ministro Relator Eros Grau na Arguição de Descumprimento de Lei 
Fundamental proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil, em que a despeito de haver julgado sua 
improcedência afirma: “há coisas que não podem ser esquecidas”, “é necessário não esquecermos, para 
que nunca mais as coisas voltem a ser como foram no passado”. O artigo da autora faz referência à 
 
5
 Recurso Especial 1316921/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 26/06/2012. O caso refere-se à ação ordinária 
inominada, ajuizada por Maria da Graça Xuxa Meneghel em face de Google Search, objetivando a remoção do seu site de 
pesquisas via Internet os resultados relativos à busca pela expressão "xuxa pedófila" ou, ainda, qualquer outra que associe o 
nome da autora a uma prática criminosa qualquer. 
6
 A Lei 12.965/2014 faz referência a dois tipos de serviços; o de conexão à internet e o de aplicações de internet, o que, 
segundo a definição dada em seu art.5º, VII – conjunto de funcionalidades que possam ser acessadas por meio de um 
terminal conectado à internet – enquadraria o Google como prestador desse tipo de serviço. 
7
 O caso refere-se à morte de Aída Jacob Curi, à época com 18 anos, morta em 14/07/58, no Rio de Janeiro no bairro de 
Copacabana. À época, dois dos acusados foram inocentados quanto ao crime de homicídio, mas condenados por atentado 
violento ao pudor e tentativa de estupro, Ronaldo Castro que parece ter convencido Ainda a subir ao apartamento e o porteiro 
Antonio Souza que auxiliou Ronaldo e outro rapaz Cássio Murilo, este menor de idade na ocasião do crime, foi condenado 
pelo homicídio de Aída e encaminhado ao Sistema de Assistência ao Menor. Todas estas informações foram retiradas de sites 
na Internet, não sendo possível indicar apenas um como fonte de consulta. Aliás, para o termo de busca Aida Curi, o Google 
retorna cerca de 31500 ocorrências, entre imagens e textos, alguns fazendo referência ao crime apenas a título 
exemplificativo ou explicativo de algo que se está comentando, outros se propondo a discutir detalhes do crime em si e 
outros ainda, discutindo temas relativos à maioridade penal, a educação e à chamada juventude transviada na década de 50. 
Há ainda ocorrências para o livro “Aida Curi: o preço foi a própria vida!”, publicado pelo irmão da vítima Monsenhor 
Mauricio Curi, bem como um relato de uma prima do acusado Ronaldo Castro, Mariza Eneider Castro, em que ela tece 
considerações acerca do comportamento e atos passados de Ronaldo e de seu pai, afirmando que o pai teria influenciado 
financeiramente no resultado do julgamento (este relato em www.memoriaviva.com.br). 
8
 Enunciado 531 – A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação incluir o direito ao esquecimento. 
9
 Decisão na Argüição de Descumprimento de Lei Fundamental, disponível em 
http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiasstf/anexo/adpf53.pdf, acessado em 14/09/14, às 21:00. 
89 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
fragilidade da memória e sua relativização em relação àqueles a quem se dirige a busca da verdade por 
meio de decisões jurídicas. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
Como considerações finais, as reflexões expostas nos sugerem como desfecho em relação ao 
direito ao esquecimento a importância da ponderação a serviço da memória coletiva quando aplicado a 
pessoas públicas relacionas à política, situações em que o interesse público deverá nortear a decisão. No 
entanto, como alerta Barroso (2007:86) é preciso cuidado com a dissimulação na aplicação da cláusula 
genérica que pode culminar na imposição de discursos oficiais de matizes variados. O autor lembra que, 
em diferentes fases, a vida brasileira já foi vivida na clandestinidade e que a interdição compulsória da 
liberdade de expressão e de informação, mesmo quando precedida do devido processo legal - ainda que 
não se possa compará-la aos atos de censura experimentados no passado - comporta riscos análogos e 
que o passado é muito recente para não assombrar (BARROSO, 2007:97). Por fim, conforme aponta 
Barroso (2007:86), o atendimento ao requisito do interesse público no exercício da liberdade de 
informação e de expressão, na verdade cuida do próprio conteúdo veiculado pelo agente sobre o qual se 
procura realizar um juízo de valor acerca do interesse na divulgação de determinada informação ou 
opinião. É preciso lembrar queo interesse público maior é a própria liberdade sobre a qual repousa o 
conhecimento dos cidadãos acerca do que ocorre à sua volta, e é sobre essa liberdade que se deve 
construir a confiança nas instituições e na democracia. Portanto, a regra geral é a de não se admitir 
limitação à liberdade de expressão e de informação que por si só constituem o interesse público em si 
mesmo, exceto em situações limite de quase ruptura do sistema. Ou seja, o interesse público como 
norteador quanto à manutenção da memória ou de seu esquecimento, seria o fundamento da força 
criativa transformadora da sociedade, idealizada no pensamento de Nietzsche e Arendt, diante do 
dilema: lembrar para não esquecer-esquecer para não lembrar. 
 
REFERÊNCIAS 
ARAÚJO, Maria Paula Nascimento, SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. História, memória e 
esquecimento: Implicações políticas. Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 79:2007. 
URL:http://rccs.revues.org/728, acesso em 10/09/2014, às 15:35 
BARRENECHEA, Miguel Angel de, DIAS, Mário José. Entre a memória e a política: Nietzsche e 
Arendt na atualidade. Cad. Nietzsche, São Paulo, n. 33, p. 301-326, 2013. 
BARROSO, Luis Roberto. Liberdade de expressão versus direitos da personalidade. Colisão de 
direitos fundamentais e critérios de ponderação. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). Direitos 
Fundamentais, Informática e Comunicação: algumas aproximações. Porto Alegre: Livraria do Advogado 
Ed., 2007. 
DODEBEI, Vera, GOUVEIA, Inês. Memória do futuro no ciberespaço: entre lembrar e esquecer. 
Revista de Ciência da Informação, 2005, v.9, n.5, p.1-11, out 2008 
FERREIRA, Maria Letícia Mazzucchi. Políticas da Memória e Políticas do Esquecimento. Aurora. 
Revista de arte, mídia e política [Online], 10:2011. Acesso em 09/09/2014, 13:00. 
GONDAR, Jô. Quatro proposições sobre a memória social. In: GONDAR, Jô & DODEBEI, Vera. 
(orgs.). O que é memória social? Rio de Janeiro: Contra capa, 2005. p. 17. 
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Tradução de Laurente Léon Chaffter. São Paulo: 
90 
 
Anais do VII Congresso Brasileiro da Sociedade da Informação, São Paulo, vol. 7, pág. 84-90, nov./2014 
Edições Vértice, Editora Revista dos Tribunais: 1990. 
LATOUR, B. Redes que a razão desconhece: laboratórios, bibliotecas e coleções. In: PARENTE, A. 
(Org.). Tramas da rede. Porto Alegre: Sulina, 2004. p.39-63. 
MANSUR, Monica Teresa. Verdade, Mentira e imprensa na sociedade da informação. In: 
MINARDI, Liliana Minardi (Coord.). O direito na sociedade da informação. São Paulo: Atlas, 2013. 
MORIN, Edgard. A comunicação pelo meio: teoria complexa da comunicação. Revista FAMECOS. 
Porto Alegre, nº 20, abril 2003, p.7-12, quadrimestral. 
MORIN, Edgard. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução Eloá 
Jacobina. 20ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012. 
OLIVEIRA, Rodrigues Elizabete. Educação e Trabalho. In: RAMOS, Ivone Marchi Lainetti et al. 
Formação Pedagógica para Docentes da Educação Profissional. São Paulo: Centro Paula Souza, 
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ORWELL, George. 1984. Tradução de Alexandre Hubner, Heloisa Jahn; pósfácios Erich Fromm, Bem 
Pimlott, Thomas Pynchon. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. 
SALVATICI, Silvia. Memórias de gênero: reflexões sobre a história oral de mulheres. História 
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SALVATICI, Silvia. Narrativas de violência no Kosovo do pós-guerra. História Oral. Revista da 
Associação Brasileira de História Oral, 2005, vol. 8, n. 1, 115-127, jan.-jun.2005.

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