Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
INTRODUÇÃO A dor torácica é um dos problemas mais comuns nos serviços de emergência e uma das causas mais prevalentes de internação. Dados estatísticos revelam que cerca de 5 a 10% dos pacientes do total de atendimentos na emergência são devido à dor torácica. Destes, 20 a 30% têm síndrome coronariana aguda (SCA). A partir da década de 1980, devido à elevada incidência da dor torácica, ocorreram formas de padronizar o atendimento desses pacientes, promovendo uma melhora no diagnóstico das SCA e rapidez no seu tratamento. Mesmo assim, pacientes com apresentações atípicas de isquemia miocárdica ou com eletrocardiograma com alterações discretas ainda são frequentemente dispensados de hospitais, por falta do diagnóstico correto. Esse tipo de engano eleva significativamente a mortalidade das SCA em cerca de 25%. O objetivo deste texto é orientar a abordagem dos pacientes com dor torácica nos serviços de emergência e simplificar o tratamento e estratificação daqueles diagnosticados como portadores de SCA. ETAPAS NO DIAGNÓSTICO O diagnóstico da SCA começa a partir da história, exame físico e exames complementares. Com isso, objetiva-se chegar a uma das duas possibilidades: 1. O paciente não apresenta SCA e, portanto, será encaminhado para seguimento ambulatorial. 2. O paciente apresenta SCA e deve ser tratado imediatamente. Tipo de dor Um dos mais importantes pontos na avaliação da dor torácica é caracterizá-la pela realização de uma rápida história clínica. Características da dor, sugestiva de angina e presença de sintomas associados, como sudorese, vômitos ou dispneia, são muito úteis para o diagnóstico correto. A história também permite dicas para possíveis etiologias não-cardíacas. Tabela 1: Causas de dor torácica Sistema Síndrome Descrição clínica Características distintas Cardíaco Angina Pressão torácica retroesternal, queimação ou peso; irradiação ocasional para pescoço, mandíbula, epigástrio, ombros ou MSE. Precipitada pelo exercício, tempo frio ou estresse emocional; duração < 2 a 10 minutos Angina em repouso ou instável A mesma da angina, porém pode ser mais intensa. Geralmente < 20 minutos, menor tolerância para o esforço. IAM A mesma da angina, porém pode ser mais intensa. Início súbito, com duração > 30 minutos. Associação com dispneia, fraqueza, náuseas e vômito. Pericardite Dor aguda, pleurítica agravada com mudanças na posição; duração variável. Atrito pericárdico Vascular Dissecção aórtica Dor excruciante, lacerante, de início abrupto, na parte anterior do tórax, frequentemente irradiando-‐se para o dorso. Dor muito intensa, refratária; geralmente em um contexto de hipertensão ou de um distúrbio subjacente do tecido conectivo, (síndrome de Marfan). Embolismo pulmonar Início súbito de dispneia e dor, geralmente pleurítica, com infarto pulmonar. Dispneia, taquipneia, taquicardia e sinais de insuficiência cardíaca direita Hipertensão pulmonar Pressão torácica subesternal, exacerbada pelo esforço Dor associada à dispneia e sinais de hipertensão pulmonar Pulmonar Pleurite/Pneumonia Dor pleurítica, geralmente breve, sobre a área envolvida. Dor pleurítica e lateral à linha média, associada à dispneia. Traqueobronquite Desconforto em queimação, na linha média. Localização na linha média, associada à tosse. Pneumotórax espontâneo Início súbito de dor pleurítica unilateral, com dispneia. Início abrupto de dispneia e dor. Gastrintestinal Refluxo esofágico Desconforto em queimação subesternal e epigástrico, 10 a 60 minutos de duração. Agravada por refeições pesadas; aliviada por antiácidos Úlcera péptica Queimação epigástrica ou subesternal prolongada. Aliviada por antiácidos ou por alimentos. Doença da vesícula biliar Dor prolongada epigástrica, ou no quadrante superior direito. Não provocada, ou após as refeições. Pancreatite Dor epigástica e subesternal prolongada intensa. Fatores de risco incluem álcool, hipertrigliceridemia e medicações. Musculoesquelético Costocondrite (síndrome de Tietze) Início súbito de dor intensa e fugaz. Reprodução pela pressão sobre a articulação, afetada. Pode haver edema e inflamação no local. Doença do disco cervical Início súbito de dor fugaz. Pode ser reproduzida pelo movimento do pescoço. Infeccioso Herpes zóster Dor em queimação prolongada com distribuição em dermátomo. Rash vesicular, distribuição em dermátomo. Psicológico Síndrome do pânico Aperto torácico ou dolorimento frequentemente acompanhado por dispneia e durando 30 minutos ou mais, não relacionado ao esforço ou ao movimento. O paciente frequentemente apresenta outras evidências de distúrbios emocionais. A anamnese deve classificar a dor apresentada pelo paciente em: definitivamente anginosa, provavelmente anginosa, provavelmente não-anginosa ou definitivamente não-anginosa. Tabela 2: Avaliação do tipo de dor torácica Tipo da dor Característica da dor Definitivamente anginosa Dor/desconforto retroesternal ou precordial, geralmente precipitada pelo esforço físico, podendo irradiar-se para ombro, mandíbula ou face interna do braço (ambos), com duração de alguns minutos e aliviada pelo repouso ou nitrato em menos de 10 minutos. Provavelmente anginosa Tem a maioria, mas não todas as características da dor definitivamente anginosa. Provavelmente não-anginosa Tem poucas características da dor definitivamente anginosa (“dor atípica”, sintomas de “equivalente anginoso”). Definitivamente não-anginosa Nenhuma característica da dor anginosa, fortemente indicativa de diagnóstico não- cardiológico. Os pacientes podem não ter dor torácica como apresentação da SCA. e sim equivalentes anginosos como: epigastralgia, náuseas, vômitos, sudorese ou dispneia. No Multicenter Chest Pain Study, isquemia aguda foi diagnosticada em 20% dos pacientes com dor torácica em “facada”, 12% dos pacientes com dor pleurítica e 7% de pacientes com dor torácica que pudesse ser completamente reproduzida pela palpação. Probabilidade de SCA Analisando-se as informações da avaliação da dor, antecedentes pessoais, exame físico e ECG, é possível calcular a chance de isquemia miocárdica e, com base nisso, tomar decisões terapêuticas. Tabela 3: Níveis de probabilidade de angina instável ou IAM de acordo com história clínica e ECG Alta probabilidade Média probabilidade Baixa probabilidade Qualquer um dos itens a seguir: Ausência dos itens de alta probabilidade e pelo menos 1 dos itens a seguir: Ausência dos itens de alta e média probabilidade e: Dor definitivamente anginosa Dor provavelmente não-anginosa em diabéticos ou com2 fatores de risco* ou Dor definitivamente não- anginosa Dor provavelmente anginosa (sobretudo pacientes com idade avançada) Com doença vascular extracardíaca** ou Dor provavelmente não- anginosa e 1*** fator de risco (exceto diabete) Alterações hemodinâmicas e de ECG durante dor precordial Com depressão ST de 0,5 a 1 mm ou inversão de onda T > 1 mm não dinâmicas ECG normal ou com alterações inespecíficas * Fatores de risco para DAC: hipertensão arterial sistêmica (HAS), dislipidemia (DLP), tabagismo e diabete melito (DM) e idade avançada. ** Manifestação extracoronária de aterosclerose: doença cerebrovascular, aortopatia, hipertensão renovascular e obstrução arterial crônica em membros. *** Avaliar de maneira individualizada pacientes que podem ter probabilidade intermediária se houver apenas um fator de risco, mas que seja muito acentuado (p.ex., tabagista importante ou antecedente familiar fortemente positivo). Pacientes de baixa probabilidade não necessitam de avaliação complementar para isquemia miocárdica, devendo-se pesquisar diagnósticos diferenciais para o quadro apresentado e receber tratamento conforme indicado. Pacientes de média probabilidade de SCA devem submeter-se a um protocolo específico de avaliação de dor torácica, já que necessitam de uma avaliação minuciosa, para auxílio diagnóstico e decisão terapêutica. Também nesse grupo é fundamental considerar diagnósticos diferenciais, como dissecção aguda de aorta, embolia pulmonar, doenças gastroesofágicas.
Compartilhar