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Farmacologia Geral Como agem os fármacos: princípios gerais Ligação das moléculas dos fármacos às células A farmacologia surgiu como ciência quando a ênfase passou da descrição da ação dos fármacos para a explicação de como eles funcionam. •Paul Ehrlich: ideia de que a ação dos fármacos deve ser explicada em termos de interações químicas convencionais entre fármacos e tecidos. Um dos princípios básicos da farmacologia afirma que as moléculas dos fármacos precisam exercer alguma influência química sobre um ou mais constituintes das células para produzir uma resposta farmacológica. » As moléculas de um fármaco precisam ficar tão próximas das moléculas dos constituintes celulares que os dois interajam quimicamente de tal modo que a função desses últimos seja alterada. « Para que os efeitos farmacológicos ocorram, em geral, é preciso que haja uma distribuição não uniforme das moléculas do fármaco dentro do organismo ou tecido, ou seja, as moléculas de um fármaco precisam “ligar-se” a constituintes específicos de células ou tecidos para produzir um efeito. » Corpora non agunt nisi fixata → “Um fármaco não agirá, a menos que esteja ligado.” - Paul Ehrlich « Esses sítios de ligação tão importantes são referidos com frequência como “alvos farmacológicos”. A maioria dos alvos farmacológicos é representada por moléculas protéicas. Alvos protéicos para ligação de fármacos Há quatro tipos principais de proteínas reguladoras que normalmente atuam como alvos farmacológicos primários: • receptores • enzimas • moléculas carregadoras/transportadoras • canais iônicos Há muitos fármacos que, além de se ligarem a seus alvos primários, são conhecidos por se ligarem a proteínas do plasma e a uma variedade de proteínas celulares, sem produzir nenhum efeito fisiológico evidente. Receptores farmacológicos • O que queremos dizer com o termo “receptor”? › Moléculas-alvo por meio das quais mediadores fisiológicos solúveis (hormônios, neurotransmissores, mediadores inflamatórios, etc) produzem seus efeitos. › Termo usado para indicar qualquer molécula-alvo com a qual uma molécula de um fármaco tem que se combinar para desencadear seu efeito específico. › Na biologia molecular, o termo é utilizado para descrever várias moléculas encontradas na superfície das células e que estão envolvidas na resposta imunológica a proteínas estranhas e na interação de células entre si e com a matriz extracelular. › Várias proteínas carregadoras são referidas com frequência como “receptores”. • Receptores nos sistemas fisiológicos › Constituem um componente-chave do sistema de comunicação química que todos os organismos multicelulares utilizam para coordenar as atividades de suas células e órgãos. › Receptores que são constitucionalmente ativos, são aqueles que exercem uma influência controladora mesmo quando não há nenhum mediador químico presente. › Agonistas vs. Antagonistas, esta distinção somente existe para os receptores com algum tipo de papel fisiológico regulador. Especificidade dos fármacos Para quem um fármaco seja útil como instrumento terapêutico ou científico, ele precisa agir de modo seletivo sobre células e tecidos específicos. » O fármaco precisa exibir um alto grau de especificidade pelo sítio de ligação. « As proteínas que funcionam como alvos de fármacos geralmente mostras um alto grau de especificidade pelo ligante, elas reconhecem apenas os ligantes de um tipo específico e ignoram as moléculas muito semelhantes. A especificidade complementar dos ligantes e sítios de ligação que dá origem às propriedades das proteínas de reconhecer de modo preciso as moléculas é fundamental para explicar muitos dos fenômenos da farmacologia. É preciso enfatizar que nenhum fármaco age com especificidade total: › Quanto menor a potência de um fármaco, e maior a dose necessária, maior a probabilidade de que outros sítios de ação, diferentes do sítio primário, ganhem importância. › Esse fato está frequentemente associado ao aparecimento de efeitos colaterais indesejados, dos quais nenhum fármaco está livre. Classificação dos receptores A classificação dos receptores com base nas respostas farmacológicas continua a ser uma perspectiva valiosa e amplamente utiliza. A medição direta da ligação do ligante ao receptor permitiu a determinação de muitos subtipos novos de receptores. A clonagem molecular forneceu uma base completamente nova para a classificação em um nível muito mais rico de detalhes. A análise bioquímica das vias bioquímicas associadas à ativação dos receptores fornece ainda uma outra base para a classificação. Interações fármaco-receptor A ocupação de um receptor por uma molécula de um fármaco pode ou não resultar na ativação desse receptor. Figura 01. Distinção entre ligação de fármacos e ativação de receptores. ● Ativação do receptor: quando o receptor é afetado de um tal modo pela molécula ligada a ele que acaba desencadeando uma resposta tecidual. » A ligação e a ativação representam duas etapas distintas da geração de uma resposta mediada por receptor que é iniciada por um agonista. « ● Antagonista do receptor: fármaco que se liga a um receptor sem causar sua ativação e, como consequência disso, impede que um agonista se ligue a esse mesmo receptor. Apresentam, no caso mais simples, eficácia zero. ● Afinidade: tendência de um fármaco se ligar aos receptores. » Fármacos com alta potência geralmente apresentam alta afinidade pelos receptores e, consequentemente, ocupam uma porcentagem significativa de receptores, mesmo em baixas concentrações. « ● Agonistas plenos: possuem alta eficácia. Fármacos que são capazes de produzir uma resposta tecidual máxima, ou seja, a maior resposta que o tecido é capaz de dar. • Ligação dos fármacos aos receptores: › CURVA CONCENTRAÇÃO × EFEITO Figura 02 Tais curvas permitem estimar a resposta máxima que o fármaco é capaz de produzir (𝐸𝑚á𝑥) e a concentração ou dose necessária para produzir 50% da respostas máxima (𝐶𝐸50 𝑜𝑢 𝐷𝐸50). ‣ tais curvas não fornecem estimativas corretas da afinidade dos fármacos pelos receptores. Isso se dá porque a relação entre a ocupação dos receptores e a resposta geralmente é do tipo não-linear. ‣ não podem ser utilizadas para medir a afinidade de fármacos agonistas a seus receptores, pois a resposta fisiológica produzida não é, via de regra, diretamente proporcional à ocupação dos receptores. ‣ o efeito final evidentemente não será a medida direta da ocupação dos receptores. ‣ é preciso lembrar que os agonistas estão sujeitos a uma rápida degradação enzimática ou à captação por células, conforme se difundem da superfície em direção ao seu sítio de ação. › DOSE × RESPOSTA Figura 03. Tal curva mostra que a resposta máxima pode ser obtida à medida que a dose aumenta. ‣ a relação entre a dose de um fármaco e a resposta clínica observada pode ser muito complexa. ‣ em sistemas in vitro a relação entre a concentração de uma droga e seu efeito é frequentemente simples e pode ser descrita com precisão matemática. ‣ as respostas a pequenas doses de um fármaco costumam aumentar em proporção direta à dose. ‣ à medida que aumenta a dose, observa-se uma diminuição no incremento da resposta, por fim, podem-se alcançar doses em que não há como obter nenhum aumento adicional na resposta. Agonistas parciais e Conceito de eficácia A capacidade da molécula de um fármaco de ativar um receptor é, na verdade, uma característica que se manifesta de modo gradual, e não como um processo de tudo ou nada. A resposta máxima (maior resposta que pode ser produzida por aquele fármaco em alta concentração) difere de um fármaco para outro. » As potências relativas de dois agonistas podem ser distintas em diferentes tecidos, ainda que o receptor seja o mesmo. « ● Eficácia: tendência de um fármaco, uma vez ligado, ativar o receptor. É a “força” do complexoagonistas-receptor em desencadear uma resposta tecidual. » A eficácia descreve a tendência do complexo-fármaco- receptor a adotar o estado ativo, em vez do estado de repouso. « ● Agonistas parciais: fármacos que apresentam níveis de eficácia intermediários. A resposta, para qualquer porcentagem de ocupação, é muito menor para o agonista parcial, que é incapaz de produzir uma resposta máxima, mesmo quando a ocupação dos receptores é de 100%. » A diferença entre os agonistas plenos e os parciais reside na relação existente entre a ocupação dos receptores e a resposta. « • Ativação constitutiva de receptores e Agonistas inversos: Embora estejamos acostumados a pensar que os receptores são ativados apenas quando uma molécula de um agonista se liga a eles, há exemplos nos quais pode ocorrer um nível apreciável de ativação mesmo na ausência de ligantes. › Ativação constitutiva → Ocorrem mutações nos receptores (tanto espontâneas, em algumas condições patológicas, quando induzidas experimentalmente), que resultam em substancial ativação na ausência de qualquer ligante. A atividade em repouso pode ser baixa demais para ter qualquer efeito sob condições normais, mas pode se tornar evidente quando há receptores expressos em demasia. › Agonista inverso → Fármacos capazes de reduzir o nível de ativação constitutiva. Podem ser considerados fármacos com eficácia negativa. » A maioria dos receptores parece ter uma forte preferência pelo estado inativo, e, por isso, não há diferença prática entre um antagonista competitivo e um agonista inverso. « • Modelo dos dois estados do receptor: Tanto os agonistas quanto os antagonistas ligam-se a receptores, mas apenas os agonistas os ativam. A formulação mais simples considera que o receptor ocupado é capaz de passar de um estado de “repouso” para um estado ativado, sendo este último facilitado pela ligação de uma molécula de um agonista, mas não de uma molécula de um antagonista. • Receptores de reserva: Muitos agonistas plenos eram capazes de desencadear respostas máximas ocupando um número muito pequeno de receptores, frequentemente menos que 1%. O mecanismo que associa a resposta à ocupação dos receptores tem um substancial capacidade de reserva. Pode-se dizer que, os sistemas possuem receptores de reserva. A existência de receptores de reserva não implica qualquer subdivisão funcional do conteúdo de receptores, mas simplesmente que esse conteúdo é maior que o número necessário para desencadear uma resposta completa. Isso significa que um dado número de complexos agonista-receptor, que corresponde a um determinado nível de resposta biológica, pode ser alcançado com uma concentração de “hormônios ou neurotransmissores” inferir àquela necessária, caso houvesse menos receptores à disposição. Antagonismo farmacológico O antagonismo ocorre quando o efeito de um fármaco é diminuído ou completamente abolido na presença de um outro fármaco. ● Antagonismo químico: refere-se à situação pouco comum na qual duas substâncias se combinam em solução, como consequência, o efeito do fármaco ativo é perdido. Ex.; agentes quelantes se ligam aos metais pesados e, dessa forma, reduzem sua toxicidade. Ex.; anticorpos neutralizantes contra mediadores protéicos, como as citocinas e os fatores de crescimento. ● Antagonismo farmacocinético: descrevem a situação na qual o “antagonista” reduz de modo efetivo a concentração do fármaco ativo em seu sítio de ação, o que pode ocorrer de várias maneiras: 1) a velocidade de degradação metabólica do fármaco ativo pode ser aumentada; 2) a velocidade de absorção do fármaco ativo pelo trato gastrintestinal pode ser reduzida; e 3) a velocidade de eliminação renal pode ser aumentada. ● Antagonismo por bloqueio dos receptores: › Antagonismo competitivo: um fármaco se liga de modo seletivo a um tipo específico de receptor sem ativá-lo, mas impedindo que um agonista se ligue a ele. É o mecanismo mais direto por meio do qual um fármaco é capaz de reduzir o efeito do outro. ‣ a similaridade entre a estrutura química da molécula do agonista e do antagonista. ‣ para uma determinada concentração do agonista, a ocupação dos receptores por esse agonista será reduzida na presença do antagonista. ‣ pelo fato de os dois estarem em competição, a elevação da concentração do agonista pode restaurar a ocupação dos receptores por esse agonista. ‣ diz-se que o antagonismo é “superável”. ‣ o antagonismo competitivo irreversível, ou não-equilíbrio, ocorre quando o antagonista se dissocia muito lentamente, ou mesmo não se dissocia, dos receptores. Como consequência, não ocorre uma alteração na ocupação dos receptores pelo antagonista quando o agonista é adicionado. ‣ o antagonismo competitivo irreversível ocorre com fármacos dotados de grupos reativos que formam ligações covalentes com o receptor. › Antagonismo não-competitivo: o antagonista bloqueia, em algum ponto, a cadeira de eventos que leva à produção de uma resposta pelo agonista. ● Antagonismo fisiológico: interação entre dois fármacos cujas ações opostas no organismo tendem a se anular mutuamente. Dessensibilização e Taquifilaxia ● Dessensibilização e taquifilaxia: sinônimos utilizados para descrever que o efeito de um fármaco diminui gradualmente quando ele é administrado de maneira contínua ou repetida. Se desenvolve em poucos minutos. ● Tolerância: diminuição gradual da responsividade a um fármaco, que leva dias ou semanas para se desenvolver. ● Refratariedade: perda da eficácia terapêutica. ● Resistência a um fármaco: descreve a perda de eficácia dos fármacos antimicrobianos ou antitumorais. Muitos mecanismos diferentes podem dar origem a esse tipo de fenômeno, como: 1) alteração nos receptores; 2) perda de receptores; 3) depleção de mediadores; 4) aumento da degradação metabólica do fármaco; 5) adaptação fisiológica; e 6) extrusão ativa do fármaco das células.
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