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DIREITO PENAL P R O F . T A S S I O D U D A 2020 Direito Penal Tema: Requisitos do crime continuado Prof. Tassio Duda O tema concurso de crimes é disciplinado entre os arts. 69 a 76 do Código Penal, sendo possível encontrar, nos citados dispositivos, os institutos do concurso material; concurso formal; crime continuado; erro na execução; resultado diverso do pretendido; bem como o limite máximo e a unificação do tempo de cumprimento de pena. No presente texto serão abordados os requisitos do crime continuado, com ênfase no entendimento doutrinário e jurisprudencial. O crime continuado é previsto no caput do art. 71 do Código Penal, o qual dispõe o seguinte: A doutrina extrai do dispositivo legal uma série de requisitos para a caracterização do crime continuado. A expressão “mediante mais de uma ação ou omissão”, por exemplo, indica a necessidade de pluralidade de condutas. Em seguida, o artigo ao estabelecer “pratica dois ou mais crimes da mesma espécie” indica o próximo requisito: pluralidade de crimes da mesma espécie. Esse ponto merece especial atenção, pois há algumas divergências acerca da expressão “crimes da mesma espécie”. A primeira corrente doutrinária (majoritária) defende que crimes da mesma espécie dizem respeito às infrações tipificadas, em regra, no mesmo dispositivo legal, seja na forma tentada ou consumada, simples ou qualificada etc. Veja o seguinte exemplo dado por Sanchez (2016): Por outro lado, há uma segunda teste doutrinária – minoritária - que, basicamente, aponta que crimes das mesmas espécies são aqueles que buscam proteger o mesmo bem jurídico, independentemente de sua localização topográfica. Sob esse ponto de vista, seria possível reconhecer a continuidade delitiva entre o crime de furto mediante fraude e o estelionato, pois tais delitos buscam tutelar o patrimônio. 1. CONCURSO DE CRIMES 2. REQUISITOS DO CRIME CONTINUADO Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. (...) JOÃO, funcionário público, subtrai durante cinco sextas-feiras, valores da repartição pública na qual exerce função. Trata-se de crime de peculato (art. 312, caput, CP) praticado em continuidade delitiva simples ou genérica (art. 71, caput, também do CP). Direito Penal Tema: Requisitos do crime continuado Prof. Tassio Duda Superada essa discussão, passa-se ao próximo requisito, a conexão temporal. É necessário que haja um lapso de tempo razoável entre um delito e o outro para que se possa reconhecer o crime continuado. De acordo com os Tribunais superiores, a prática de um crime e outro não pode exceder o intervalo de 30 (trinta) dias. Assim, caso um indivíduo cometa um crime no dia 15 de março e posteriormente pratique outro crime da mesma espécie no dia 13 de abril do mesmo ano, atendido os demais requisitos, poderá ser reconhecida a continuidade delitiva. Observe o seguinte julgado do STF: No mesmo sentido, o STJ: O Código Penal, em seu art. 71, também exigiu, como requisito, a conexão espacial. Significa que há uma necessidade de que os crimes tenham sido cometidos em lugares próximos. Isso não quer dizer que os delitos devem ter sido praticados no mesmo bairro ou cidade, pois é possível, em certos casos, o reconhecimento da continuidade em cidades limítrofes ou contíguas. Esse entendimento é aceito pelo STJ. Veja: MAS QUAL SERIA ESSE LAPSO TEMPO RAZOÁVEL? (...) O Supremo Tribunal Federal, todavia, lançou luz sobre o tema ao firmar, e a consolidar, o entendimento de que, excedido o intervalo de 30 dias entre os crimes, não é possível ter-se o segundo delito como continuidade do primeiro (...) (STF: HC 107.636/RS, rel. Min. Luiz Fux, 1.ª Turma, j. 06.03.2012). (...) 3. O art. 71, caput, do Código Penal não delimita o intervalo de tempo necessário ao reconhecimento da continuidade delitiva. Esta Corte não admite, porém, a incidência do instituto quando as condutas criminosas foram cometidas em lapso superior a trinta dias. (...) (HC 239.397/RS, rel. Min. Laurita Vaz, 5.ª Turma, j. 08.04.2014). (...) IV. Não obstante o fato de o reconhecimento da continuidade delitiva não exigir que as condutas tenham sido praticadas no mesmo município, podendo ser admitida quando se tratarem de delitos ocorridos em comarcas limítrofes ou próximas, na hipótese, os estupros foram praticados em comarcas territorialmente distantes. V. Não evidenciados os requisitos indispensáveis à caracterização do crime continuado, tendo em vista a ausência de unidade de tempo e espacial, não há que se admitir a unificação da penas. (STJ: HC 206.227/RS, rel. Min. Gilson Dipp, 5.ª Turma, j. 06.10.2011); (grifos nossos) 2.1 CONEXÃO TEMPORAL 2.2 CONEXÃO ESPACIAL Direito Penal Tema: Requisitos do crime continuado Prof. Tassio Duda O art. 71 estabelece uma necessidade de semelhança entre a forma pela qual os crimes são praticados. O agente, em sua empreitada criminosa, deve ter seguido um padrão na prática das infrações penais. Em razão desse requisito, não é possível o reconhecimento do crime continuado do furto praticado por meio de escalada e outro furto com rompimento de obstáculo. Nesse caso, o modo de execução é distinto. Ademais, também não há que se falar em crime continuado quando o primeiro crime é praticado em concurso de pessoas e o segundo não. Observe: De acordo com Bitencourt (2018), como outras “condições semelhantes” a doutrina aponta a mesma oportunidade e a mesma situação propícias para a prática do crime. Por essa expressão, a lei faculta a investigação de circunstâncias que se assemelhem às enunciadas e que podem caracterizar o crime continuado. Segundo o autor, essa expressão genérica — “e outras semelhantes” — tem a finalidade de abranger quaisquer outras circunstâncias das quais se possa deduzir a ideia de continuidade delitiva. Assim, entre outras, o aproveitamento da mesma ocasião (das mesmas circunstâncias), ou de persistente ocasião favorável, ou o aproveitamento da mesma relação permanente. São citados, como exemplos, o doméstico que subtrai diariamente charutos ao patrão; o morador da casa que frauda, por vezes sucessivas, o medidor da luz elétrica; o coletor de rendas que se apropria, por várias vezes, do dinheiro do Estado. Por fim, é necessário um último requisito para o reconhecimento da continuidade delitiva: a unidade de desígnios. De acordo com o que a doutrina chama de teoria objetiva-subjetiva ou mista, além de observar os requisitos já trabalhados – pluralidade de condutas, pluralidade de crimes, conexão temporal, conexão espacial, conexão modal – é de suma importância que os crimes tenham sido objeto/resultado de um plano previamente elaborado pelos agentes, existindo um vínculo subjetivo entre as infrações. É uma teoria amplamente adotada na jurisprudência. Veja: (...) Não há continuação delitiva entre roubos sucessivos e autônomos, com ausência de identidade no modus operandi dos crimes, uma vez que verificada a diversidade da maneira de execução dos diversos delitos, agindo o recorrido ora sozinho, ora em companhia de comparsas, não se configura a continuidade delitiva, mas sim a habitualidade criminosa (...) (REsp 421.246/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 22/02/2010 2.3 SEMELHANÇA NA FORMA DE EXECUÇÃO 2.5 UNIDADE DE DESÍGNIOS 2.4 OUTRAS CONDIÇÕES SEMLEHANTES Direito Penal Tema: Requisitos do crime continuado Prof. Tassio Duda Vale ressaltar que há uma segundateoria – minoritária - conhecida como objetiva pura ou puramente objetiva, segundo qual basta a presença dos requisitos objetivos previstos no caput do art. 71 para o reconhecimento da continuidade delitiva. Ou seja, não há necessidade de se verificar a intenção do agente em praticar os crimes em continuidade delitiva. Sintetizando, de acordo com o que já foi estudado, para restar caracterizado o crime continuado é necessário que o agente: a) pratique mais de uma ação ou omissão; b) que as referidas ações ou omissões sejam previstas como crime; c) que os crimes sejam da mesma espécie; d) que as condições do crime (tempo, lugar, modo de execução e outras similares) indiquem que as ações ou omissões subsequentes efetivamente constituem o prosseguimento da primeira. É assente na doutrina e na jurisprudência que não basta que haja similitude entre as condições objetivas (tempo, lugar, modo de execução e outras similares). É necessário que entre essas condições haja uma ligação, um liame, de tal modo a evidenciar-se, de plano, terem sido os crimes subsequentes continuação do primeiro. (...) Para a caracterização da continuidade delitiva é imprescindível o preenchimento de requisitos de ordem objetiva – mesmas condições de tempo, lugar e forma de execução – e de ordem subjetiva – unidade de desígnios ou vínculo subjetivo entre os eventos (Teoria Mista ou Objetivo-subjetiva) (...) (RHC 43.601/DF, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6.ª Turma, j. 03.06.2014). Microsoft Word - CRIME CONTINUADO REQUISITOS.pdf DIREITO PENAL CAPA.pdf
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