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Ádila Cristie Matos Martins Hematologia t HEMOFILIA - As hemofilias são distúrbios hemorrágicos hereditários comuns causados por deficiência quantitativa ou qualitativa de fatores de coagulação específicos Classificação - A (hemofilia clássica): deficiência do fator VIII - B (doença de Christmas): deficiência do fator IX - *C: deficiência do fator XI — ela é uma hemofilia mas muitas vezes fica fora dessa classificação por ser muito rara e especifica de uma etnia EPIDEMIOLOGIA - 80% dos pacientes hemofílicos é afetado pela hemofilia A - A prevalência é de cerca de 1/5.000 nascimentos do sexo masculino e a da hemofilia B é estimada em 1/30.000 nascimentos do sexo masculino - Os genes que codificam a síntese desses fatores encontram-se localizados no braço longo do cromossomo X, a hemofilia afeta quase exclusivamente homens - As filhas de homens hemofílicos são portadoras obrigatórias, mas os filhos são normais. Cada filho de uma portadora tem 50% de probabilidade de ter hemofilia e cada filha tem 50% de probabilidade de ser uma portadora - Uma história familiar positiva é encontrada em 65% dos casos - Hemofilia tipo C é especialmente comum em judeus sefarditas (descendentes de judeus originados de Portugal e Espanha), sendo a prevalência de um para um milhão ETIOLOGIA — genética - As hemofilias são de transmissão recessiva ligada ao cromossomo X, no entanto, em cerca de 30% dos casos, a doença origina-se a partir de uma mutação de novo, podendo ocorrer na mãe ou no feto. Portanto, pode ser observada casos esporádicos, ou isolados da doença - Os genes que codificam os fatores VIII e IX estão localizados no braço longo do cromossomo X. Os defeitos genéticos da hemofilia A compreendem delações, inserções e mutações por todo o gene do fator VIII. 40% dos casos de hemofilia A grave são causados pela inversão do intron 22 do gene - Como o gene do fator IX tem aproximadamente um terço do tamanho do fator VIII, suas mutações genéticas são mais facilmente identificáveis, não havendo relatado nenhuma mutação recorrente como observado para hemofilia A CLASSIFICAÇÃO DA GRAVIDADE DA HEMOFILIA E FREQUÊNCIA DAS HEMORRAGIAS Quantidade de fator de coagulação em relação ao normal - > 5 a 40% — hemorragias espontâneas são muito raras, porém ocorrem em cirurgias e ferimentos muito graves - > 1 a 5% — hemorragias espontâneas são pouco frequentes, porém podem correr em cirurgias e ferimentos graves - < 1% — hemorragias espontâneas são frequentes nas articulações, músculos e outros tecidos QUADRO CLÍNICO - As manifestações dos tipos de hemofilia são indistinguíveis - A maior parte dos hemofílicos A (70%) apresentam a forma grave, com atividade do fator VIII menor do que 1% do normal - Cerca de metade dos recém-natos com a forma grave pode sofrer hemorragia profusa após circuncisão - As manifestações da forma grave ocorrem por volta dos 2-4 anos, quando a criança começa a deambular sem ajuda dos pais, e se caracterizam pelo aparecimento de hemartroses * Hemartroses: manifesta como uma monoartrite de grandes articulações. A mais frequentemente acometida é o joelho, seguida de cotovelo, tornozelo e quadril. Esta hemorragia é proveniente dos capilares subsinoviais e provoca edema e dor intensa. A articulação encontra-se inflamada, semifletida, com eritema e apresenta difícil mobilização - Outras manifestações incluem hematomas intramusculares que podem comprimir nervos periféricos e provocar síndrome compartimental (com comprometimento isquêmico), hematomas retroperitoneais, hematomas do psoas (quadro que simula a apendicite aguda), sangramento gastrointestinal e geniturinário (hematúria). A hemorragia intracraniana ocorre em 10% dos pacientes, possuindo uma mortalidade de 30%. Este evento representa a segunda da causa de morte em pacientes hemofílicos, só “perdendo” para a SIDA. Outro evento hemorrágico Ádila Cristie Matos Martins Hematologia t ameaçador à vida (além da hemorragia cerebral) é o hematoma orofaríngeo, pela possibilidade de levar à obstrução de via aérea alta e morte por asfixia - Os pseudotumores ocorrem no músculo esquelético, ossos longos, pelve, dedos das mãos e pés. Eles resultam de hematomas que evoluíram com uma cápsula fibrosa. No osso, levam à destruição óssea, neoformação óssea, expansão do osso e fratura patológica * ileopsoas — simular abdome agudo DIAGNÓSTICO - O laboratório da hemofilia revela apenas um distúrbio da via intrínseca da coagulação, ou seja, um TTPa alargado, na ausência de outras alterações nas provas hemostáticas. O Tempo de Coagulação (TC) também pode se alterar, porém este teste é muito menos fidedigno do que o TTPa - O diagnóstico é confirmado pelo ensaio específico para os fatores VIII, IX e XI, para diferenciar as hemofilias, cuja terapêutica é diferente DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL - As hemofilias A e B exigem diferenciação específica entre elas para o tratamento adequado. A diferenciação com a hemofilia B é feita através das dosagens dos fatores VIII e IX - O diagnóstico diferencial entre a hemofilia A e a doença de von Willebrand é feito através do estudo da atividade antigênica e funcional do fator von Willebrand * DvW — protege o fator VIII da degradação plasmática — por isso essa correlação - As hemofilias A e B devem ser diferenciadas das outras deficiências da via intrínseca, que causam prolongamento do TTPa. A deficiência do fator XI acomete homens e mulheres, apresentando diátese hemorrágica mais leve do que as hemofilias. As deficiências dos fatores XII, precalicreína e cininogênio de alto peso molecular, embora apresentem prolongamento do TTPa, não cursam com manifestações hemorrágicas - No caso da deficiência combinada dos fatores V e VIII, além do prolongamento do TTPa, há prolongamento do TP e redução dos níveis dos fatores VIII e V, não associados à doença hepática - A hemofilia B é diferenciada da da deficiência de vitamina K através da normalidade das concentrações plasmáticas dos fatores II, VII e X - TAP ↑ e TTPA normal: deficiência do fator VII - TTPA ↑ e TAP normal: deficiência de fatores VIII, IX, XI ou XII - TAP ↑ e TTPA ↑: problema hepático ou deficiência da via comum - Se tudo tiver normal e mesmo assim tiver sangramento: problema na hemostasia primária TRATAMENTO HEMOFILIA A - Antigamente, os hemofílicos A eram tratados com crioprecipitado. Este componente do sangue é preparado pelo descongelamento do plasma a 4ºC, sendo retirado o sobrenadante e ressuspendido o precipitado em 30-50 ml de plasma. O que precipita no fundo da bolsa é um concentrado rico em fibrinogênio, fator VIII, fvW, fator XIII e fibronectina. Uma única unidade de crioprecipitado contém metade da quantidade de fator VIII de uma bolsa de plasma fresco congelado, em um volume 10 vezes menor. Contudo, para tratar o hemofílico, muitas bolsas de crioprecipitado eram necessárias (cada uma vem de um doador diferente), aumentando muito a chance de infecções transmitidas por componentes do sangue (ex.: HIV). Isso fez com que atualmente existam muitos hemofílicos infectados pelo HIV (cerca de 50% daqueles politransfundidos no passado) e com hepatopatia crônica por vírus B ou C (10-20%) - Atualmente, não se usa mais o crioprecipitado para tratar o hemofílico A, pois temos disponível o fator VIII purificado (com inativação de agentes infecciosos por detergentes ou calor) e o fator VIII recombinante. No primeiro, o preparado é feito a partir de plasma de cerca de 10.000 doadores, passando por uma série de técnicas inativadoras de vírus. Nos EUA, o pool de doadores submete-se a screeningpara vírus da hepatite A, B e C e HIV (através de PCR). O fator VIII recombinante é obtido a partir de células de cabras geneticamente preparadas. - A reposição dos preparados de fator VIII nos hemofílicos A está indicada sempre que houver hemorragia no preparo pré e peroperatório. A dose deve ser calculada de modo a manter a atividade do fator VIII entre 15-20% nos sangramentos leves, entre 25-50% nas hemartroses ou sangramentos de moderada gravidade e, ainda, em torno de 50% na hemorragia intracraniana e no preparo cirúrgico. A dose do hemoderivado deve ser administrada duas vezes ao dia e por um período de 3-14 dias, de- pendendo da gravidade do quadro. No pós-operatório, a duração da reposição é de 10-14 dias, para garantir uma cicatrização adequada. - Terapia Adjuvante: nos casos de hemorragia branda, podemos utilizar o DDAVP (desmopressina), que tem como efeito principal aumentar a atividade do fator para Ádila Cristie Matos Martins Hematologia t 5-10% (4-6 vezes). Os antifibrinolíticos (EACA, ácido tranexâmico) podem ser usados como adjuvantes antes de procedimentos na cavidade oral. A atividade fibrinolítica é maior nas mucosas, portanto o sangramento mucoso responde melhor a estes medicamentos. A dose é a mesma descrita para a doença de von Willebrand. Vale ressaltar que os antifibrinolíticos são contraindicados na vigência de hematúria: pela chance de formar coágulos obstrutivos do sistema uroexcretor HEMOFILIA B - O tratamento no passado era a base da reposição de plasma fresco congelado, uma vez que o crioprecipitado não contém fator IX. O concentrado do complexo protrombínico parcial (Prothromplex) contém os fatores II, IX e X da coagulação, sendo uma opção terapêutica. Contudo a presença de alguns fatores ativados neste concentrado pode levar a eventos tromboembólicos - Atualmente, a terapêutica de escolha para a hemofilia B é a reposição de fator IX purificado e de fator IX recombinante HEMOFILIA C - Infusão de plasma fresco congelado em vigência de sangramentos e preparos para eventos cirúrgicos. Atualmente um fator XI recombinante tem sido empregado. No entanto este hemoderivado encontra-se associado com episódios trombóticos e coagulação intravascular disseminada, devendo ser utilizado com cautela. A reposição deve ter como objetivo atingir, no máximo, 70% de atividade do fator XI REFERÊNCIAS 1.Tratado de Hematologia — Zago 2.Hemato, 2019 — MedCurso
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