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209 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Resumo: o presente estudo teve como sujeito uma se- nhora de 40 anos de idade, mãe de duas filhas pré-adoles- centes, solteira, que trabalhou como empregada doméstica. Foram utilizados princípios e técnicas de modificação do comportamento da Terapia Comportamental para superar suas principais dificuldades, que foram. Os resultados obti- dos comprovaram a eficácia da intervenção devido a uma observação na diminuição da frequência de comportamen- tos indesejáveis e no aumento do número de comportamen- tos desejáveis. Palavras-chave: treino, ansiedade, problemas, mudan- ça comportamento APRENDIZAGEM DE HABILIDADES SOCIAIS E CON- TROLE DA ANSIEDADE: ESTUDO DE CASO CLÍNICO THAISSA NEVES REZENDE PONTES APRENDIZAGEM DE HABILIDADES SOCIAIS E CONTROLE A Terapia Comportamental ou Terapia Analíticocomportamental é uma abordagem em Psicologiaque tem como característica o uso de análises funcionais com o intuito de identificar as contingências que mantêm o comportamento de interesse. Tem como base a Análise do Comportamento e o Behaviorismo Radical como DA ANSIEDADE: ESTUDO DE CASO CLÍNICO 210 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . filosofia. É uma linha terapêutica que se baseia nos princípios da aprendizagem operante e respondente, que podem produzir mu- danças no comportamento humano de modo a torná-lo mais fun- cional (CASTANHEIRA, 2002). De acordo com Castanheira (2002), um dos principais obje- tivos da Terapia Comportamental consiste em compreender as dificuldades dos clientes a fim de propor estratégias e interven- ções baseadas na análise funcional do comportamento. A literatu- ra aponta que a intervenção na Terapia Comportamental consiste em operacionalizar o comportamento de interesse, observando sob que controles o indivíduo responde. Isto implica em identificar as contingências que mantêm o comportamento – problema para, então, modificá-lo. No modelo comportamental, os comportamentos inadequados são tidos como produtos da interação da pessoa com o ambiente em que vive e são função da história de reforçamento do indivíduo. Portanto, a tarefa do terapeuta para modificar comportamentos ina- dequados consiste em: fazer análise funcional do comportamento; selecionar o comportamento de interesse; modificar o comportamen- to problema e avaliar o resultado (CASTANHEIRA, 2002). O pri- meiro passo para a modificação de comportamentos inadequados (análise funcional) consiste em identificar as variáveis anteceden- tes e consequentes dos comportamentos, levando em conta os as- pectos funcionais das respostas (MEYER, 2001). Segundo Meyer (2003), para identificar os antecedentes da resposta (ocasião em que a resposta ocorre), deve-se verificar se existem para essa resposta: a) estímulos eliciadores; estímulos discriminativos; operações estabelecedoras; além de regras e auto- regras; eventos encobertos; e análise da história de vida. Os estímulos eliciadores são eventos que eliciam ou contro- lam respostas reflexas ou respondentes. Deve-se diferenciá-los dos estímulos discriminativos, os quais são estímulos que sinalizam as condições em que uma resposta tem consequências diferenci- adas. Em relação às operações estabelecedoras, estas são condi- ções ambientais antecedentes que alteram o valor do reforçador, como, por exemplo, a saciação e a privação (MEYER, 2003; CUNHA, 2001). A análise dos estímulos antecedentes implica ainda na identifi- cação de determinadas regras e auto-regras como determinantes do 211 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . comportamento no contexto clínico. Desta forma, o estímulo antece- dente pode exercer múltiplas funções; pode ser uma instrução, um conselho, uma ordem, uma exigência ou uma proposta de benefício mútuo. De acordo com o Behaviorismo Radical, toda regra é um comportamento verbal e este tipo de comportamento é, em última análise, modelado por contingências sociais (BANACO, 1997). Segundo Meyer (2003), regras facilitam a aquisição de novos comportamentos quando as contingências são complexas ou aversivas, no entanto, podem causar uma redução da sensibilidade comportamental em relação às contingências naturais. Para a auto- ra, o homem não segue apenas as regras apresentadas por outras pessoas, mas também regras formuladas pelo próprio indivíduo, denominadas auto-regras. Para Jonas (1999), auto-regras são regras formuladas pelos indivíduos que passam a controlar seu próprio comportamento. São estímulos verbais que descrevem contingên- cias, que, por sua vez, afetaram o comportamento verbal e não ver- bal do próprio indivíduo a quem essas contingências se aplicam. Matos (2001) considera que os eventos encobertos na análise funcional são de extrema importância porque facilitam o proces- so de identificação e compreensão dos eventos da análise em questão. No entanto, não se deve atribuir função causal a tais eventos, uma vez que pensamentos, regras e auto-regras e senti- mentos não são os antecedentes priorizados como causa, mas podem ser antecedentes importantes quando há alguma evidência de que participaram como elo na cadeia de contingências controladoras de um determinado comportamento. Uma função primordial do terapeuta comportamental deve ser arranjar e oferecer contingências ao cliente, de modo que ele possa adquirir as habilidades necessárias para um funcionamento mais efetivo (VILLANI, 2004). De acordo com Delitti e Groberman (2005), Meyer (2004) e Silveira (2003), o sucesso da terapia de- pende, em parte, de o terapeuta se tornar uma figura reforçadora e não punitiva para que o cliente possa emitir comportamentos que foram punidos anteriormente em um ambiente natural. Assim, o terapeuta irá ensinar formas mais adaptativas que possam ser emitidas, de modo que o cliente possa ser reforçado e consequentemente capaz de formular novas regras. Del Prette e Del Prette (2005) afirmam que para uma intervenção ser eficaz deve atender pelo menos três critérios: os novos comportamentos 212 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . devem ser significativos no ambiente natural do cliente; os novos desempenhos aprendidos no ambiente terapêutico devem se ge- neralizar para outros contextos e devem ser mantidos no tempo. Em função desta aprendizagem, Villani (2004) afirma que o papel do terapeuta é de natureza didática pois ele ensina o cliente a iden- tificar e manipular as contingências das quais seu comportamento é função. O modelo explicativo proposto pela análise do comportamento tem sido útil para a compreensão de vários fenômenos comportamentais, muitos deles relacionados com estados de so- frimento para a pessoa, como ansiedade, depressão e resolução de conflitos e inassertividade. Várias propostas e técnicas encontram- se à disposição da psicologia para situações que exigem análise funcional das causas do comportamento e propostas de procedi- mentos para mudança do comportamento desadaptativo. De acor- do com Ebert e Nurcombe (2004), a ansiedade é caracterizada por um aumento da tensão, taquicardia, taquipnéia, tremor, suor, sen- sações de medo e apreensão. Nos medos normais, as pessoas apre- sentam respostas emocionais adequadas ao perigo real. Já nos transtornos de ansiedade, o sujeito emite respostas emocionais exageradas frente ao estímulo ameaçador e até mesmo na falta dele. Para Leite (1999), a ansiedade nem sempre é um fator negativo pois, dependendo da intensidade podefuncionar como fator motivacional levando o sujeito a melhorar seu desempenho. A ansiedade pode se tornar um problema quando atinge níveis exa- gerados causando prejuízo ao cliente. Os pensamentos de uma pessoa ansiosa geralmente estão relacionados ao perigo e o sujei- to antecipa os riscos de natureza física, social ou psicológica para si e familiares. De acordo com Skinner (1998), o medo de um evento futuro pode ser originado por estímulos específicos que precede- ram eventos punitivos. Leite (1999) sugere que as distorções cognitivas que assumem funções de controle sobre a ansiedade são: a) catastrofização, onde o sujeito espera pelas piores consequências; b) personalização, onde o sujeito reage como se os eventos externos estivessem re- lacionados diretamente à sua pessoa; c) ampliação e minimização, que ocorrem quando o sujeito atenta para sinais de perigo e des- carta aspectos da situação que indicam segurança; d) abstração seletiva que ocorre quando o sujeito ignora o contexto e valoriza 213 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . apenas os aspectos ameaçadores; e) na inferência arbitrária o su- jeito faz conclusões a partir de poucos dados e, por fim, na f) supergeneralização, o sujeito percebe uma situação passageira como eterna. O método socrático, dentre suas inúmeras utilidades, pode ser utilizado no auxílio da redução da ansiedade excessiva. É utiliza- do em situações que exigem análise de respostas denominadas como pensamentos e autoconhecimento. De acordo com Miyazaki (2004), o método socrático diz respeito à exploração de um deter- minado tema através do questionamento do mesmo a fim de tirar conclusões lógicas em relação a um problema em vez do terapeuta fornecer respostas prontas. A técnica ajuda o cliente a avaliar suas respostas, as consequências de pensamentos e comportamentos, além de auxiliar na identificação de pensamentos inadequados colaborando para a redução da ansiedade desadaptada. As habilidades sociais também são bastante trabalhadas na Terapia Comportamental por meio da análise funcional e do THS (Treino em Habilidades Sociais). Lazarus (apud DEL PRETE; DEL PRETE, 2003) propôs uma identificação das classes de resposta assertiva e de definição de tipologia do desempenho assertivo. Considerou que a assertividade abrangia 4 classes específicas de habilidades componentes: fazer e pedir favores; recusar pedidos; expressar sentimentos positivos e negativos; e iniciar, manter e encerrar uma conversação. O conceito de asserção, de acordo Lange e Jakubowski (1976), consiste na afirmação dos direitos pessoais, na capacidade de expressar pensamentos, sentimentos e crenças de forma adequada sem violar o direito das outras pesso- as. Em outras palavras, uma pessoa assertiva consegue obter gan- hos com maior frequência além de ser capaz de desenvolver e manter relacionamentos saudáveis (FALCONE, 2002). O objeti- vo do programa de Treinamento Assertivo consiste em melhorar o repertório de desempenho social do indivíduo (FALCONE, 2002; DEL PRETE; DEL PRETE, 2005). O terapeuta deve enfatizar os efeitos negativos da inassertividade, tais como frustração, ressen- timento e falta de satisfação, que o cliente vivencia quando se comporta de maneira não-assertiva, e o aumento da satisfação interpessoal, sentimentos de bem-estar e alívio proporcionados com respostas assertivas, o que provavelmente irá provocar o aumento da asserção (RIMM; MASTERS, 1983). 214 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Várias técnicas estão disponíveis para a realização do Trei- namento Assertivo, no entanto, a mais comumente usada é o Ensaio Comportamental ou Role-Play. Essa técnica requer que cliente e terapeuta desempenhem interações inter-pessoais sig- nificativas para o cliente pois ele terá seu repertório comportamental aprimorado através de instalações e desenvol- vimento de habilidades sociais. Parte do tempo o cliente repre- senta ele mesmo e o terapeuta assume o papel de uma pessoa relevante da vida do cliente. Na inversão de papéis, o terapeuta assume o papel do cliente e modela o comportamento adequa- do do cliente durante o ensaio. O objetivo da técnica consiste em instalar ou aperfeiçoar habilidades interpessoais que aju- dam o cliente a melhorar sua qualidade de vida (OTERO, 2004; RIMM, MASTERS, 1983). De acordo com Leite (1999), o trei- no de soluções de problemas também é amplamente utilizado na Terapia Comportamental para auxiliar o cliente nas toma- das de decisões e reduzir os efeitos causados pela indecisão, tais como ansiedade, sentimento de culpa e remorso. Para Catânia (1999), a resolução de problemas é um comportamen- to no qual as características discriminativas definem o proble- ma e a solução deste é o reforçador. De acordo com Leite (1999), a habilidade para solucionar um problema está relacionada ao processo de encontrar uma resposta eficaz que altere a situa- ção problemática além de gerar o máximo de consequências positivas e o mínimo de negativas. Para lidar de forma eficaz com o problema, é necessário aprender a avaliar e a encontrar respostas que provoquem a solução do problema. A solução é definida como a resposta que modifica a situação capaz de eliminar ou reduzir sua natureza problemática. Quanto ao grau de dificuldade do problema, ele é proporcional à disponibili- dade do repertório da pessoa que possui o problema. Isto im- plica que quanto menor for o repertório do indivíduo maior será a situação problemática. Para Jacob (2004), a capacidade de resolver problemas engloba várias habilidades específicas tais como: orientação para o problema; definição e formulação do problema; levantamento de alternativas; tomada de decisão; e prática da solução e verificação. A orientação para o problema corresponde ao conjunto de respostas (crenças, avaliações e expectativas) de orientação de uma pessoa quando tem que 215 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . enfrentar um problema. A definição e formulação do problema consiste em compreender a natureza da dificuldade do proble- ma para avaliar o problema de forma mais precisa. O levanta- mento de alternativas é o objetivo do processo de solução do problema que torna todas as possibilidades possíveis. Já na tomada de decisão, as alternativas são avaliadas, julgadas e com- paradas opções disponíveis para serem aplicadas na situação problemática. Na prática da solução e verificação, a alternati- va escolhida é colocada em prática e, em seguida, deve-se ava- liar as consequências da escolha (JACOB, 2004). A técnica da descatastrofização é utilizada em clientes an- siosos e com dificuldade de solução de problemas. O pensamen- to catastrófico consiste em predições catastróficas, causando irritação nos reflexos e na atenção aumentando a ansiedade, tornando o indivíduo mais propenso a emitir comportamentos desastrosos. Seu objetivo consiste em diminuir ou anular a con- centração do cliente em aspectos negativos extremos de uma situação (SAVOIA, 2004). Outra técnica que auxilia na resolução de problemas e to- mada de decisão é a análise de custo e benefício dos comporta- mentos. Esta técnica ajuda o cliente a ter conhecimento das desvantagens de se comportar de forma indesejável e as vanta- gens de se comportar de forma desejável. Por permitir maior segurança em situações de tomada de decisão, esta técnica tam- bém auxilia na redução da ansiedade provocada por episódios de indecisões (LEABY, 2006). O objetivo do presente trabalho consistiu em aplicar princí- pios e técnicas de modificação do comportamento da Terapia Comportamental.De acordo com o mandato terapêutico, foi es- tabelecido, juntamente com a cliente, três metas: 1) aprendiza- gem de habilidade sociais (aumentar a frequência de comportamentos assertivos em situações de interação social, familiar e acadêmica); 2) treino de resolução de problemas e tomada de decisão; bem como reduzir a ansiedade frente à essas situações e 3) falar em público. Para tanto, foram utilizadas os seguintes procedimentos: análise funcional, redações, ensaio comportamental, método socrático, respiração diafragmática, descatastrofização e análise de custo-benefício das respostas da cliente. 216 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . MÉTODO Participante O sujeito deste trabalho, de nome fictício Selma, possuia 40 anos de idade no início da terapia e reside em Goiânia. É solteira e possui duas filhas, 14 e 12 anos, que moram com ela. O pai de suas filhas possui outra família, mas visita Selma e as crianças semanalmente. Durante este trabalho, a cliente cursou o 2º ano do Ensino Médio e trabalhou como empregada doméstica em uma casa de família, ativi- dade que ali exerceu até o presente trabalho. Selma nasceu numa família de 12 irmãos. Todos os filhos devi- am trabalhar na roça para prover o próprio sustento. A cliente relatou que o esposo de sua mãe achava que ela não era sua filha e, por isso, a ela cabia mais trabalho que aos outros filhos. Além disso, em datas festivas, Selma não ganhava presentes do pai, possivelmente, segun- do ela, em função da dúvida que ele tinha quanto à sua paternidade. Segundo ela, o esposo de sua mãe era ruim, ignorante, chato, amea- çador e agressivo. No entanto, a cliente disse que sempre o amou e que teve orgulho de ter sido a única filha que teve condições de cuidar da doença do pai até sua morte. Aos 8 anos de idade, Selma foi levada para a casa de sua madri- nha de batismo devido à exploração imposta pelo esposo de sua mãe. Cinco anos depois, foi convidada para trabalhar em uma casa onde exerce sua profissão há mais de 20 anos. Neste emprego, ainda jo- vem, Selma conheceu um rapaz o qual passou a namorar e posterior- mente a morar juntos. Anos depois, Selma engravidou da filha mais velha mas no terceiro mês de gravidez o rapaz dormiu uma noite fora de casa e Selma não permitiu que morassem juntos novamente. No entanto, dois anos depois, Selma engravidou da segunda filha. O rapaz queria que abortasse, mas Selma teve a segunda filha e o rapaz regis- trou as duas crianças em seu nome. Antes do nascimento das filhas, o rapaz pediu Selma em casamento mas ela negou o pedido pois acha- va que ele estava interessado nas terras de seu suposto pai. AMBIENTE/MATERIAIS O atendimento terapêutico era realizado no consultório do Cepsi (Centro de Pesquisa e Prática em Psicologia), na área V da UCG 217 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . (Universidade Católica de Goiás). O consultório continha mesa com três cadeiras, duas poltronas, tapete, mesinha de centro, almofadas, relógio de parede, pia e iluminação artificial. Nas sessões foram utilizados caderno, lapiseira, borracha, folhas de papel A4, prontu- ário com fichas padronizadas do Cepsi sobre o nível sócio econô- mico, frequência, autorização e evolução do caso da cliente. PROCEDIMENTO A cliente que participou deste estudo foi selecionada pela pró- pria estagiária entre inúmeros casos disponíveis no Cepsi. Feita a sele- ção, o passo seguinte foi entrar em contato com a cliente para agendar a primeira sessão. Nesta, foi definido que os atendimentos no primei- ro semestre (março a junho) ocorreriam uma vez por semana, com duração de cinqüenta minutos. No segundo semestre (de agosto a novembro), a cliente concordou em ser atendida duas vezes por se- mana, sendo que cada sessão tinha duração de cinqüenta minutos. O procedimento constituiu-se em quatro etapas: Rapport, Linha de Base, Intervenção e Avaliação. Rapport Esta etapa do procedimento ocorreu nos primeiros vinte mi- nutos da primeira sessão. Seu objetivo consistiu em iniciar a cons- trução de um vínculo de confiança entre a cliente e a terapeuta/ estagiária. Nesta etapa, foi feito o contrato terapêutico, enfatizando a importância da assiduidade, pontualidade e realização das tare- fas para a evolução da terapia. Por fim, foram dadas explicações simplificadas à cliente de como a abordagem comportamental seria trabalhada dentro do contexto clínico. Linha de Base A segunda etapa do procedimento iniciou-se na primeira sessão com a realização de uma entrevista, cujo objetivo foi obter informa- ções necessárias sobre as queixas da cliente, de tal modo que a terapeuta/estagiária pudesse fazer uma avaliação das queixas da cli- ente e desenvolver programas de intervenção adequados às suas de- mandas. Após esta coleta preliminar de dados, a terapeuta/estagiária 218 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . formalizou um primeiro mandato terapêutico, no qual, juntamen- te com a cliente, foi definido quais queixas seriam inicialmente trabalhadas ao longo da terapia. Inicialmente, as queixas da cliente giravam em torno da depen- dência, insegurança, esquecimento, dificuldades e obesidade da filha mais velha. Portanto, o mandato terapêutico se resumia em traba- lhar o emagrecimento bem como em diminuir a dependência e in- segurança da filha. De acordo com as observações da terapeuta/ estagiária, foi preciso pontuar o excesso de preocupação e ansieda- de que a cliente tinha diante das filhas, familiares e de fatos corri- queiros. A partir da sétima sessão, o mandato terapêutico foi redefinido a fim de atender as necessidades e dificuldades da clien- te e não de suas filhas. Isso se deveu ao fato de a terapeuta/estagiária supor que os reais problemas da cliente não eram as queixas por ela colocadas de início e hipotetizou que as afirmações sobre sua filha eram função da esquiva dos seus verdadeiros problemas pessoais. A partir desse momento, o objetivo passou a tratar da sua dificulda- de de falar em público, diminuir a ansiedade frente a situações de tomadas de decisão e aumentar a assertividade em situações de interação social, familiar e acadêmica. Intervenção Esta terceira etapa foi realizada a partir da 3ª sessão até a 28ª. Consistiu em solicitar à cliente tarefas de casa em forma de regis- tros e tarefas práticas, além da aplicação de técnicas de modifica- ção do comportamento, de acordo com as necessidades e metas estabelecidas pela cliente. As intervenções realizadas pela terapeuta/estagiária foram: análise funcional, redações, ensaio comportamental, método socrático, respiração diafragmática, descatastrofização e análise de custo-benefício das respostas da cliente. A análise funcional foi feita pela própria cliente, como tarefa de casa. Na segunda sessão, a terapeuta/estagiária ensinou a cli- ente a fazer análise funcional de seu próprio comportamento atra- vés de um exemplo (Antecedente: Ver a filha comendo muito; Resposta: Fala para a filha comer menos, pois ela está obesa; Consequência: a filha emburra e continua comendo muito) e, posteriormente, foi pedido que a cliente elaborasse outro exem- 219 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . plo que estivesse de acordo com sua queixa. O objetivo desse instrumento consistiu em promover um auto-conhecimento na cliente sobre sua forma de interagir com o ambiente. Foi utilizada para identificar relações de dependência entre as variáveis envol- vidas com suas queixas afim de modificá-las para que a cliente pudesse responder de forma mais desejável. As discussões da análise funcional ocorreram a partir da terceira sessão, totalizando sete quadros de análises funcionais ao longo da terapia. Assim como a análise funcional, as redações também foram discutidas para ajudar na identificação das queixas e na definição do mandato terapêutico. Cada redação teve um tema diferencia- do, no entanto, todas estavam relacionadas às demandas da clien- te cujos títulos foram: “Quem sou eu?”; “Por que fazer terapia?”; “Como posso melhorar o jeito de conviver com minhas filhas?” e “O que me irrita?” As redações foram discutidas na quinta, na oitava, na 12ª e 14ª sessões respectivamente O ensaio comportamental teve como objetivo aperfeiçoar o repertório comportamental da cliente no que diz respeito as suas habilidades assertivas e dificuldades para falar em público. Ao discutir a possibilidade do término do relacionamento com o pai das filhas, foi preciso realizar um ensaio comportamental no qual a terapeuta/estagiária assumiu o papel da cliente para servir de modelo para a cliente aprender a interagir de forma mais assertiva com o pai das filhas (21ª sessão). A técnica também foi utilizada para ensiná-la a se comportar dentro de sala de aula, a fim de re- duzir sua ansiedade ao apresentar trabalhos escolares. Inicialmente, foi escolhido um tema e a cliente fez uma “apresentação” para a terapeuta/estagiária dentro do consultório (16ª sessão). O método socrático foi utilizado para verificar as reais chances de suas preocupações se realizarem, além de avaliar o seu sofri- mento, ocasionado pela antecipação da ocorrência de possíveis consequência aversivas. Foi utilizada quando a cliente manifes- tou preocupação excessiva quanto à obesidade da filha. O diálogo girou em torno dos pensamentos repetitivos que a cliente possuía ao “prever” alguma frustração da filha em seus relacionamentos amorosos, das tentativas feitas para provocar o emagrecimento da filha e da despreocupação da mesma quanto à própria obesidade (6ª sessão). A técnica também foi utilizada para desfazer falsas auto- regras que a cliente possuía quanto ao comportamento de tirar dú- 220 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . vidas, tais como: “Perguntar é feio”; “Se não entendi na primeira explicação, então não vou entender mais”; “Tenho medo de per- guntar e errar” e “As pessoas vão ficar falando de mim”. A respiração diafragmática foi utilizada com o objetivo de au- xiliar a reduzir a ansiedade da cliente. Inicialmente foi feito um treino dentro do consultório onde a terapeuta/estagiária deu as ins- truções de como fazer tal respiração. Posteriormente, foi feita uma pequena demonstração para a cliente, que fez o primeiro treino na presença da terapeuta/estagiária. A técnica foi ensinada na 13ª ses- são e na sessão seguinte foi feito outro treino em consultório, na presença da terapetua/estagiária, a fim de verificar se a cliente fazia a respiração diafragmática corretamente. A técnica foi solicitada como tarefa de casa diária com 5 séries de 15 repetições até a última sessão (30ª sessão). Quanto à descatastrofização, ela foi utilizada para ajudar a cliente a testar a realidade de suas cognições. Foi feita uma aná- lise lógica dos acontecimentos negativos que a cliente achava que poderiam ocorrer caso deixasse as filhas sozinhas no final de se- mana quando fosse trabalhar (3ª sessão). Esta técnica foi utilizada todas as vezes que a cliente demonstrou predições catastróficas e a terapeuta/estagiária precisou reavaliar as possibilidades de ocor- rência de uma catástrofe para evitar comportamentos indesejáveis e diminuir a ansiedade da cliente. Associada ao método socrático, a descatastrofização também foi útil para avaliar os pensamentos excessivos que lhe causavam ansiedade e a impedia de solucionar problemas tal como tomar decisão em continuar se relacionando com o pai das filhas ou não somente para dar às filhas o que ela própria “não teve”, um pai. Por fim, a análise de custo-benefício foi utilizada para demons- trar os custos que um comportamento inassertivo pode acarretar e os benefícios de se comportar assertivamente quando os parentes chegam tarde em sua casa para jantar no domingo e quando cor- tam suas plantas sem seu consentimento (9ª sessão) . A técnica foi utilizada também para pontuar os benefícios de tirar dúvidas e apre- sentar trabalhos na sala de aula (15ª sessão), para avaliar os custos e benefícios de manter o relacionamento com o pai das filhas (24ª sessão e 27ª sessão), para analisar as vantagens e desvantagens de fazer um curso de informática (26ª sessão) e decidir em iniciar uma atividade física (24ª sessão). 221 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Avaliação Foi solicitada uma avaliação da terapia como tarefa de casa em forma de registro para a cliente na 28ª sessão e foi discutida nas duas sessões seguintes. A avaliação feita pela cliente ajudou-a a ter cons- ciência das suas mudanças e da importância de mantê-las mesmo após o término da terapia. A Tabela 1 apresenta o número de comportamentos indesejáveis e desejáveis (de acordo com o mandato terapêutico) nas etapas da linha de base e intervenção. É possível notar que a cliente apresentou 40 comportamentos indesejáveis e nenhum comportamento desejável durante a etapa da linha de base. Após a intervenção, a cliente diminuiu o número de comportamentos indesejáveis para 9 e aumentou o núme- ro de comportamentos desejáveis para 24. É possível perceber que todos os comportamentos indesejáveis tiveram um índice menor após a inter- venção. O comportamento de indecisão e a dificuldade de falar em público tiveram índice zero, o que implica que a intervenção foi eficaz para reduzir esses comportamentos. Quanto à inassertividade e aos epi- sódios emocionais negativos, seus índices não foram zerados, mas observa-se uma redução de suas frequências. Quanto aos comporta- mentos desejáveis, a cliente apresentou um aumento dessas respostas, considerando que não houve registro desses comportamentos na etapa da linha de base. Isto sugere que a cliente acrescentou novas respostas em seu repertório comportamental durante a etapa da intervenção. CI LB I CD LB I Tabela1: Número de Comportamentos Indesejáveis (CI) e de Comportamentos Desejáveis (CD) Durante a Linha de Base (LB) e Intervenção (I). Inassertividade 12 4 Assertividade 0 6 Indecisão 3 0 Tomada de decisão 0 3 Episódios Emocionais Episódios Emocionais Negativos* 20 5 Positivos** 0 13 Dificuldade de falar em público 5 0 Falar em público 0 2 Total 40 9 Total 0 24 Legenda: *Relatos de ansiedade, tristeza, raiva e nervosismo 222 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . A Tabela 2 exemplifica cada uma das categorias de respostas indesejáveis especialmente trabalhadas na terapia, o tipo de interven- ção realizada para cada uma delas e o resultado dessa intervenção. No primeiro exemplo (letra A) a cliente apresentou um comportamento indesejável em função da falta de assertividade para cobrar dos ir- mãos uma contribuição financeira para pagar a conta de luz, já que todos moram no mesmo lote e a conta de luz é única. O comporta- mento de “não procurar” os irmãos para dividir a conta da luz gerou consequências negativas, tais como: pagar a conta de luz sozinha, raiva e gasto extra no mês. O uso da análise funcional, a análise de custo- benefício do comportamento indesejado e o ensaio comportamental, viabilizaram a organização de condições mais favoráveis para que a cliente emitisse um comportamentodesejável numa situação poste- rior semelhante (organizar jantar para reunir a família) que exigia assertividade, como procurar os irmãos para dividir os gastos do jan- tar. Desta forma, a cliente obteve consequências mais benéficas como economia financeira e relato de sensação de alívio. Tabela 2: Exemplos de Comportamentos Indesejáveis e suas Consequências, Intervenção Utilizada para Cada uma das Respostas Emitidas pela Cliente e Comportamen- tos Desejáveis Emitidos Após a Intervenção e suas Consequências Continua... Antecedente A)Vencimento da conta de luz que de- veria ser divida en- tre os irmãos Comportamento (Indesejável) Consequência Não procurou ir- mãos para dividir a conta. Pagou a conta de luz sozinha. Raiva; gastou a mais neste mês Antecedente Consequência Comportamento (Desejável) Análise funcional da situação; Análise de custo/benefício do comportamento indesejado; Ensaio comportamental Ter que organizar jantar para reunir a família Fez “vaquinha” co- brando uma quan- tia em dinheiro de cada parente Relatou sentir-se feliz e aliviada INTERVENÇÃO 223 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Antecedente B) Proximidade da páscoa Comportamento (Indesejável) Consequência Pensamentos (dú- vida) excessivos sobre comprar ou não comprar ovos de páscoa para as filhas Relata ansiedade; nervosismo; senti- mento de culpa ...Continuação Continua... C) A filha, conside- rada dependente pela mãe, toma ini- ciativa e faz bolo sozinha A mãe não elogiou a “independência” da filha Relatou tristeza; remorso por não ter elogiado a filha Antecedente Consequência Comportamento (Desejável) Análise funcional da situação; Ensaio comportamental Filha fazer visita sozinha no hospi- tal. Reforçou o com- portamento da filha (considerada de- pendente pela mãe) de ter ido ao hospi- tal sozinha Relatou sentir-se bem INTERVENÇÃO Antecedente Consequência Comportamento (Indesejável)INTERVENÇÃO Análise funcional da situação; Desca- tastrofização dos pensamentos Pensamentos ex- cessivos (dúvidas) sobre trabalhar ou não na chácara no final de semana e ter que deixar filhas sozinhas em casa. Foi trabalhar na chácara e deixou as filhas em casa. Pen- sar que tudo pode- ria dar certo Relatou sentir-se tranqüila e traba- lhou “em paz” Antecedente Consequência Comportamento (Desejável)INTERVENÇÃO 224 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Continua... Continua... Antecedente D) Ter que apresen- tar trabalho na sala de aula.Sentiu-se ansiosa e nervosa Comportamento (Indesejável) Consequência Não apresentou o trabalho, “preferiu” perder pontos na nota final Relatou sentir-se triste e ficou com nota baixa na maté- ria Antecedente Consequência Comportamento (Desejável) Análise funcional da situação; Análise de custo/benefício, método socrático e ensaio comporta- mental Dúvida em alguma matéria faz pergunta para o professor na frente de todos Fica sem dúvida na matéria e relatou sentir-se bem. INTERVENÇÃO A letra B exemplifica uma situação de resolução de proble- ma e tomada de decisão (indecisão) no qual a cliente não pos- suía classes de respostas em seu repertório que favorecesse a solução, o que lhe causou ansiedade, nervosismo e sentimento de culpa. A cliente apresentou comportamentos excessivos so- bre pensar em comprar ou não ovos de páscoa para as filhas e, após o uso da análise funcional da situação e descatastrofização dos pensamentos, ela foi capaz de tomar uma decisão que geras- se consequências mais benéficas em uma situação semelhante à anterior. A cliente apresentou pensamentos excessivos sobre deixar as filhas sozinhas no final de semana para trabalhar, no entanto, a cliente optou em deixar as filhas sozinhas e relatou ter trabalhado em paz e ter se sentido bem. A letra C ilustra um exemplo de um dos episódios emocio- nais negativos que a cliente apresentava antes da intervenção. Este episódio ocorreu em função da cliente não ter elogiado a filha (considerada dependente) quando teve a iniciativa de fazer um bolo sozinha. O uso da análise funcional e do ensaio comportamental criou condições para que a cliente emitisse comportamentos que pudessem gerar episódios emocionais po- sitivos mais favoráveis a ela. Quando a mesma filha teve a ini- 225 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . . ciativa de ir ao hospital sozinha para visitar a mãe, a mesma reforçou o comportamento da filha parabenizando-a e desta for- ma, relatou ter se sentido bem . A letra D exemplifica a dificuldade da cliente de falar em público. Esta dificuldade a impedia, dentre outras situações, de fazer apresentação dos trabalhos acadêmicos, o que gerava consequências negativas, tais como tristeza e nota baixa. Após a intervenção (análise funcional da situação, análise de custo-be- nefício, método socrático e ensaio comportamental), a cliente pas- sou a ter comportamentos desejáveis, tais como tirar dúvidas com os colegas e com os professores na frente de todos. Isto sugere que a cliente aprendeu a se comportar de forma mais desejável, obtendo assim um rendimento acadêmico melhor. A Figura 1 apresenta o número de tarefas solicitadas e o nú- mero de tarefas realizadas pela cliente, do mês de Março a Ou- tubro de 2007. Observou-se que de Março a Junho houve um aumento gradual do número de tarefas realizadas pela cliente. No último mês do primeiro semestre (Junho), a cliente superou o número de tarefas solicitadas. Isso se deve ao fato de que ela fez todas as tarefas do mês em questão, mais duas tarefas do mês anterior que não foram cumpridas no momento em que foram solicitadas. No mês de Agosto foi possível notar uma queda brus- ca no número de tarefas realizadas, obtendo o mesmo resultado do mês de Março, o que significou menos da metade do número das tarefas solicitadas. Quanto ao mês de Setembro e Outubro, a cliente superou o número de tarefas realizadas em relação aos meses anteriores, alcançando mais que a metade do número de tarefas solicitadas. Isto provavelmente pode ter ocorrido devido a um maior comprometimento da cliente com as tarefas solicita- das pela estagiária. A Figura 2 apresenta no eixo vertical a por- centagem da frequência da cliente e no eixo horizontal os meses Março a Outubro de 2007. Observou-se que ao longo da terapia o índice de frequência da cliente foi superior a 60%. Nos dois primeiros meses de atendimento houve 75% de presença em cada mês. Quanto ao mês de Maio, observou-se o menor índice de frequência devido a problemas de saúde da cliente que a impos- sibilitou de comparecer regularmente nas sessões. Os índices má- ximos observados ocorreram no mês de Junho, Agosto e Outubro. No entanto, no mês de Setembro, houve uma queda da porcen- 226 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . tagem da presença embora tenha permanecido superior a todos os outros meses que não atingiram 100%. Ma rço Ab ril Ma io Jun ho Ag ost o Se tem bro Ou tub ro 0 20 40 60 80 100 120 Figura 2: Porcentagem da Presença da Cliente nas Sessões do Mês de Março à Outubro de 2007 Número de tarefas solicitadas Número de tarefas realizadas Legenda: Figura 1: Número de tarefas solicitadas e número de tarefas realizadas pela cliente do mês de Março à Outubro Ma rço Ab ril Maio Jun ho Ag ost o Se tem bro Ou tub ro 0 5 10 15 20 25 227 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . DISCUSSÃO O objetivo do presente trabalho consistiu em verificar a efi- cácia de princípios e técnicas de modificação do comportamento da Terapia Comportamental nas seguintes situações: 1) aprendi- zagem de habilidades socias, 2) treino de resolução de problemas e tomada de decisão; bem como reduzir a ansiedade frente à essas situações e 3) falar em público. A partir da análise dos resultados, pode-se verificar que ao longo das sessões a cliente demonstrou engajamento à terapia que pode ser comprovado pelas Figuras 1 e 2. Os resultados das tabelas sugerem que a cliente aprendeu novos comportamentos (Tabela 1) e foi capaz de generalizá-los para si- tuações semelhantes às quais esses comportamentos foram apren- didos (Tabela 2). Na Tabela 1, verificou-se que ao longo da terapia a cliente aprendeu novas formas de se comportar, embora ainda apresen- tasse comportamentos indesejáveis após a intervenção. Isto im- plica que as técnicas utilizadas auxiliaram no aumento de comportamentos desejáveis, mas não foram suficientes para eli- minar todos os comportamentos indesejáveis. Uma possível ex- plicação para esse fato pode ser creditada à maior dificuldade em identificar todas as variáveis que estão funcionalmente relaciona- das ao comportamento no ambiente clínico, o que, por sua vez, é mais fácil de ocorrer no laboratório. A permanência de comporta- mentos indesejáveis após a intervenção também pode ser justificada, possivelmente, em função desses comportamentos indesejáveis eliminarem estímulos ansiógenos (reforço negativo). Apesar desse aparente benefício, os comportamentos indesejáveis lhe causavam uma limitação (redução do repertório comportamental) na interação com o ambiente, o que a longo pra- zo reduziu o número de reforçadores que a cliente poderia obter. Contudo, o aumento da frequência de comportamentos desejáveis sugere que a cliente obtinha consequências reforçadoras ao emiti- los. De acordo com Skinner (1998), um evento é considerado reforçador quando provoca o aumento na frequência da resposta. Isto sugere que o aumento dos comportamentos aprendidos du- rante a fase de intervenção proporcionou reforços positivos que não eram obtidos quando a cliente se comportava de maneira in- desejável na fase da linha base. 228 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . Em relação ao comportamento de tomar decisão, percebe-se na Tabela 1 que a cliente era impedida de resolver problemas da forma desejável devido aos níveis de ansiedade que experimenta- va frente a situações de tomadas de decisão. Para controlar a an- siedade da cliente, foi utilizada a respiração diafragmática (técnica amplamente utilizada para a redução e alívio da ansiedade mal adaptada). O diafragma é uma camada de músculos que separa o tórax do abdômen que durante a inalação do ar, deve se mover para baixo para expandir os pulmões e provocar um aumento da caixa toráxica, causando desta forma uma desaceleração das funções orgânicas, diminuição da pressão sanguínea e, como consequência, o relaxamento. Esta técnica obedece o princípio do contracondicionamento que consiste na utilização de procedimen- tos de aprendizagem para a substituição de um tipo de resposta por outro (RIMM; MASTERS, 1983). Desta forma, a cliente dei- xou de vivenciar níveis de ansiedade e passou a experimentar tranquilidade e relaxamento em situações que lhe exigiam tomar uma decisão. Para cada resposta indesejável que a cliente apresentava e que estava incluída em seu mandato terapêutico, foram utilizadas técnicas para que ela pudesse aprender a responder posteriormen- te de forma mais desejável em uma situação semelhante (Tabela 2). Para Villani (2004), o principal papel do terapeuta comportamental consiste em arranjar contingências para o cliente aprender novas habilidades a fim de se relacionar com o ambiente de maneira mais efetiva além de garantir sua persistência após a terapia. As tarefas de casa e as intervenções utilizadas foram for- mas de promover a generalização do comportamento, pois desta maneira a cliente passou a responder de forma semelhante à apren- dida na fase de intervenção em situações que apresentavam estí- mulos semelhantes. De acordo com Del Prete e Del Prete (2005), o valor de um estímulo reforçador pode ser generalizado para outros estímulos com propriedades semelhantes. Isto implica que a simi- laridade de estímulos facilita que comportamentos já aprendidos possam ocorrer novamente. Uma medida do engajamento gradual da cliente com a tera- pia pode ser observada pelo aumento no número de tarefas de casa realizadas (Figura 1) à medida que o número de sessões aumen- tou. As tarefas de casa podem assumir papel reforçador para a 229 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . cliente, pois, através dos registros que ela fazia, foi possível fazer uma auto-observação e identificar quais variáveis controlavam o seu comportamento (DELITTI; GROBERMAN, 2005). Desta forma, o terapeuta deve ser capaz de fazer um arranjo de contin- gências para promover a aprendizagem de comportamentos mais adaptativos às contingências de sua vida e gerar consequências positivas (SKINNER, 1974). Foi de extrema importância que a terapeuta/estagiária modelasse o comportamento da cliente no ambiente terapêutico através de reforços pelos seus desempenhos frente ao uso de determinadas técnicas de modificação do com- portamento e por meio da realização das tarefas de casa. Neste procedimento, a terapeuta/estagiária reforçava os comportamen- tos que estavam próximos do comportamento desejável e coloca- va em extinção aqueles que eram incompatíveis com o objetivo de ensinar um novo comportamento à cliente (MOREIRA; MEDEIROS, 2007). De acordo com Skinner (1998), é com o re- forço de uma série de aproximações sucessivas que uma resposta rara pode adquirir alta probabilidade de ocorrer. Na Figura 1, nota- se que houve um aumento gradual do comprometimento da clien- te com as tarefas, possivelmente em função dos reforçadores que obtinha com a realização das mesmas. De Março a Junho, a clien- te aumentou o número de tarefas realizadas, conforme o aumento de sua frequência (Figura 2), o que realmente corrobora a idéia de que houve engajamento da cliente à terapia. É importante ressaltar que nas primeiras sessões o terapeuta deve assumir o papel de uma figura reforçadora e não punitiva para que o cliente possa comparecer às sessões seguintes e estabelecer o vínculo terapêutico aos poucos. Isso irá favorecer o engajamento do cliente com a terapia, o que poderá facilitar na modificação de comportamentos (DELITTI; GROBERMAN, 2005). De acordo com a Figura 2, é possível notar que nos três primeiros meses de terapia a cliente apresentou frequência entre 60 e 80% e, a partir do quarto mês, atingiu 100% de presença, exceto o mês de Setem- bro, quando atingiu mais que 80%. Esses dados sugerem o estabe- lecimento de vínculo terapêutico, possivelmente em função dos reforçadores que a cliente obteve durante as sessões com a terapeuta/estagiária. Em função dos resultados da Tabela 1, apesar do aumento do número de comportamentos desejáveis, observa-se que a cliente 230 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . ainda emitiu comportamentos indesejáveis mesmo após a inter- venção. Isto sugere que a programação da generalização decom- portamentos desejáveis para novas situações não foi 100% eficaz, pois a cliente não emitiu algumas respostas aprendidas em situa- ções posteriores semelhantes à situação na qual aprendeu o novo comportamento, tal como na situação em que chamou a atenção das filhas de forma ameaçadora e punitiva quando achou o almo- ço escondido pelas filhas na cozinha. Embora a cliente tenha de- monstrado um crescente engajamento com as tarefas de casa, se tivesse realizado um maior número de tarefas solicitadas, prova- velmente teria mais chances de entrar em contato com as contin- gências, confrontar suas auto-regras e, desta forma, responder de forma desejável e adquirir consequências reforçadoras. Uma ou- tra sugestão que pudesse diminuir o número de comportamentos indesejáveis estaria numa possível extensão da linha de base. Desta forma, a terapeuta/estagiária poderia ter maior conhecimento das variáveis que controlavam o comportamento da cliente e que não foram identificadas na linha de base do presente trabalho. Tendo conhecimento dessas variáveis, a terapeuta/estagiária poderia ar- ranjar as contingências de modo que a cliente pudesse enfrentá- las e aumentar a probabilidade de ela emitir essas novas respostas. Na última etapa do procedimento de intervenção, realizou-se uma avaliação com a cliente sobre o processo terapêutico e os relatos colhidos junto à cliente sobre a contribuição da terapia para mudança do seu comportamento em interação com seu meio. É possível correlacionar alguns relatos da cliente com os dados obtidos neste trabalho. Em oposição a inassertividade, identificada na linha de base, a cliente relatou na etapa de avaliação que: “Acho que aprendi a manobrar as palavras...” ; “O pessoal em casa me acha mais tranqüila”. Quanto à ansiedade para tomada de decisão e resolução de problema, a cliente relatou: “...sei decidi o que realmente é bom prá mim...”; “...era muito agitada, agora sei me controlar”; “...tomo decisão sem culpa, antes ficava sofrendo e com peso na consciência...”. Em relação à habilidade de falar em pú- blico, a cliente relatou que é capaz de fazer perguntas para os professores sem ficar envergonhada (“Antes ficava quebrando a cabeça sozinha para resolver um exercício e não conseguia”). Em função dos reforçadores obtidos por meio da intervenção, a clien- te vivenciou um maior número de experiências emocionais posi- 231 e s t u d o s , G oi ân ia , v . 36 , n . 1 /2 , p . 2 09 -2 33 , ja n./ fev . 20 09 . tivas e relatou: “Eu mim sinto muito bem, tudo na minha vida mudou”; “...aprendi só coisas que mim fez bem”; “... sou uma pessoa mais feliz”. Por fim, pode-se concluir que o objetivo do trabalho foi al- cançado, pois os resultados demonstraram que os procedimentos e as técnicas utilizadas nesse trabalho foram eficazes para modi- ficar determinadas classes de comportamento. A cliente que se apresentou com pouco repertório em habilidade social, que tinha dificuldade para tomar decisões em função da ansiedade e dificul- dades para falar em público, passou a responder de forma mais desejável, tornando-se mais assertiva, capaz de se expressar em situações públicas como, por exemplo, fazer perguntas na sala de aula e tomar decisões sem experimentar níveis de ansiedade incapacitantes, comumente presentes em situações de fuga e es- quiva . Referências BANACO, R. A. Auto regras e patologia comportamental. In: ZAMIGNANI, D. R. (Org.). Sobre comportamento e cognição. São Paulo: Arbytes, 1997. p. 81-88. BAUM, W. M. Comportamento e linguagem verbal. In: BAUM, W. M. (Orgs.). Compreendendo o behaviorismo. Porto Alegre: Artmed, 1999b. p. 125-153. CAMESCHI, C. E.; RODRIGUES, J. A. Contingências aversivas e comportamento emocional. In: RODRIGUES, J. A.; RIBEIRO, M. R. (Orgs.). Análise do comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 113-137. CASTANHEIRA, S. dos S. 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Aca- dêmica de Psicologia pela PUC Goiás. E-mail: <thaissapontes@hotmail.com> Minha orientadora é Pós Dra Josele Abreu-Rodrigues em Psicologia Experi- mental pela Universidade de Flórida.
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