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Multiletramentos dos textos aos signos

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2017
MultiletraMentos: dos 
textos aos signos
Profa. Jeice Campregher
Copyright © UNIASSELV 2017
Elaboração:
Profa. Jeice Campregher
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri 
UNIASSELVI – Indaial.
372.4
C193m Campregher, Jeice
Multiletramentos dos textos aos signos / Jeice Campregher: 
UNIASSELVI, 2017.
 
 238 p. : il
 
 ISBN 978-85-515-0091-0
 I. Leitura.
 1.Centro Universitário Leonardo da Vinci.
III
apresentação
Caro acadêmico!
Este livro pretende se colocar como um hall de entrada às discussões 
referentes aos letramentos ou multiletramentos. Da mesma forma, pretende 
demonstrar a vinculação que esses conceitos têm com a formação de leitores 
e cidadãos. As discussões que aqui serão desenvolvidas poderão servir de 
norte a práticas educacionais. Serão estas que ganham consistência a partir de 
dois elementos: fundamentação teórica e experiência. 
Docentes bem fundamentados são capazes de realizar uma prática 
pedagógica significativa, promotora de subjetividades atuantes no mundo 
contemporâneo. Conforme poderá ver ao longo das unidades, trabalhar 
leitura – de textos verbais e não verbais – requer do docente um olhar atento 
às práticas sociais de leitura (e escrita) da sociedade atual. Sem que se tenha 
esse olhar sensível, seguiremos replicando práticas que realizaram conosco. 
As discussões aqui provocarão, desestabilizarão. Muitas vezes, 
interrogam mais que respondem. Algumas vezes, são as perguntas que 
movem mais que as respostas. As duas perguntas elementares que orientam 
esses escritos são: (1) se o mundo atual está em constante movimento e 
transformação, quais práticas devemos convidar à sala de aula? (2) Quais 
habilidades de leitura são fundamentais no mundo atual?
Este livro é produzido com base na proposta de currículo em espiral 
– a partir da concepção de Bruner (1960). A partir dele, compreende-se que 
os conteúdos precisam ser reencontrados pelo aluno – sempre em níveis mais 
complexos, exigindo representações mais elaboradas. Assim, este livro vai ao 
encontro de outros em sua caminhada formativa – da mesma forma em que, 
nele mesmo, há uma progressão, verticalizando e aprofundando os conceitos, 
unidade a unidade.
A organização deste livro se dá em três partes. Na Unidade 1 serão 
explorados os seguintes conceitos/conceitos: letramento(s), leitura no mundo 
atual/contemporâneo, formas de entender a leitura. Na Unidade 2 serão 
abordados os seguintes pontos: Letramentos (no plural), multiletramentos, 
letramento crítico e letramento visual, leitura de imagens, leitura em 
documentos oficiais. Na Unidade 3 serão abordados os seguintes tópicos: 
signos, semiótica, textos publicitários e suas estratégias, habilidades como 
norte na leitura, diferentes abordagens úteis à leitura de imagens e textos 
híbridos. 
A autora, Jeice Campregher, é mestre em Educação, Licenciada em 
Letras. Por meio de sua experiência em sala de aula e com projetos, conduz 
as discussões no sentido de dar suporte à sala de aula. Com Letramento, 
IV
realizou na Prefeitura de Blumenau (SC) um trabalho itinerante em escolas; 
exercendo suporte à alfabetização e ao(s) letramento(s) em turmas de pré a 
quintos anos de escolas da rede municipal. Ainda na prefeitura, realizou um 
trabalho voltado à melhoria dos índices municipais na Prova Brasil; neste, 
produzindo materiais didáticos com ênfase em habilidades de leitura. Entre 
outras experiências no Ensino Superior e formação de professores.
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para 
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades 
em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o 
material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato 
mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. 
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação 
no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir 
a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, 
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade 
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. 
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para 
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto 
em questão. 
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas 
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa 
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de 
Desempenho de Estudantes – ENADE. 
 
Bons estudos!
UNI
V
VI
VII
suMário
UNIDADE 1 - LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA ........................................................................ 1
TÓPICO 1 - LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO ..................................................................... 3
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 3
2 PREÂMBULO TEÓRICO .................................................................................................................... 6
3 LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO ......................................................................................... 10
4 CONCEITOS-CHAVE PARA TRABALHAR O TEXTO ............................................................... 29
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 35
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 36
TÓPICO 2 - OLHARES PARA A LEITURA ........................................................................................ 39
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 39
2 LER: PROCESSO COMPLEXO .......................................................................................................... 40
 2.1 FORMAS DE ENTENDER A LEITURA ....................................................................................... 44
 2.2 LEITURA NA ESCOLA .................................................................................................................. 49
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 52
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 53
TÓPICO 3 - LETRAMENTO .................................................................................................................. 57
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 57
2 CONCEITUANDO LETRAMENTO ................................................................................................. 57
3 ESCOLA E AS PRÁTICAS SOCIAIS ................................................................................................ 59
4 UM OLHAR PARA A SALA DE AULA ............................................................................................ 62
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 65
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................68
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 69
UNIDADE 2 - DOCUMENTOS E TEORIAS RELEVANTES.......................................................... 73
TÓPICO 1 – LETRAMENTOS E MULTIMODALIDADE ............................................................... 75
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 75
2 AFINAL, POR QUE PLURAL? ........................................................................................................... 75
3 OS MULTILETRAMENTOS EM SALA ........................................................................................... 83
 3.1 LETRAMENTO CRÍTICO ............................................................................................................... 86
 3.2 LETRAMENTO VISUAL ................................................................................................................ 92
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 104
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 105
TÓPICO 2 – LEITURA DE IMAGENS ................................................................................................ 107
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 107
2 APROFUNDANDO A LEITURA DE IMAGENS ........................................................................... 108
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 121
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 122
VIII
TÓPICO 3 – LEITURA EM DOCUMENTOS OFICIAIS ................................................................. 125
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 125
2 LEITURA EM DOCUMENTOS OFICIAIS ..................................................................................... 127
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 137
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 141
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 142
UNIDADE 3 - DIDÁTICA: CONCEITOS, POSSIBILIDADES E PRÁTICAS ............................ 145
TÓPICO 1 – ELEMENTOS DA SEMIÓTICA .................................................................................... 147
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 147
2 CONCEITOS CAROS À SEMIÓTICA ............................................................................................. 148
 2.1 ÍCONE, ÍNDICE E SÍMBOLO ........................................................................................................ 158
3 HABILIDADES COMO NORTE DA LEITURA............................................................................. 161
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 172
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 173
TÓPICO 2 – PUBLICIDADE: JOGOS E ESTRATÉGIAS ................................................................ 177
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 177
2 IMAGEM NA PUBLICIDADE ........................................................................................................... 179
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 195
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 197
TÓPICO 3 – POSSIBILIDADES DIDÁTICAS .................................................................................. 199
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 199
2 PROFESSOR: CODINOME EXPLORADOR .................................................................................. 199
3 DIFERENTES LEITURAS: EXPLORANDO POSSIBILIDADES ................................................ 201
LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................... 226
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 229
AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................. 230
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................................... 231
1
UNIDADE 1
LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade tem por objetivos:
• analisar conceito(s) de letramento(s);
• analisar a leitura no mundo atual;
• diferenciar formas de entender a leitura.
Esta unidade está dividida em três tópicos. Em cada um deles você encontrará 
atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados.
TÓPICO 1 – LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
TÓPICO 2 – OLHARES PARA LEITURA
TÓPICO 3 – LETRAMENTO
2
3
TÓPICO 1
UNIDADE 1
LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
1 INTRODUÇÃO
Vivemos em um mundo dinâmico, múltiplo, líquido (BAUMAN, 2001). 
Assim, ensinamos a ler e a escrever neste mundo, do jeito como ele é. Por esse 
motivo, torna-se, antes de tudo, necessária a compreensão desse universo 
existencial do qual fazemos parte ativamente. As atividades de leitura e escrita 
ocorrem dentro desse modo de organização da sociedade. Esta, sendo dinâmica e 
produzida por uma rede de práticas, não pode ser limitada e definida em papéis 
prontos e findados. 
Esses papéis são produzidos em ação, no ato de comunicação. No 
momento em que se dá – o(a) escritor(a) é artista, mas o(a) leitor(a) também é. O 
papel de leitor/ouvinte, por muito tempo, acreditava-se ser passivo. Era definido e 
entendido como o papel de receber a mensagem enviada pelo autor da mensagem 
(falada, escrita ou não verbal). Essa concepção ignorava as nuances, os detalhes e 
a riqueza de elementos que compõem o processo de interação por meio da língua/
linguagem/linguagens. 
Assim, formar leitores começa, antes de tudo, por essa percepção: a de 
que esses processos precisam ser observados. Assim, sai-se da leitura rasa. Da 
decodificação. Do ler para reconhecer informações que o professor solicitou para 
ganhar nota em alguma atividade de sala de aula. Sem uma leitura proficiente, a 
escrita também fica comprometida – apesar de serem processos independentes, 
eles se relacionam. Em outras palavras: aprende-se a escrever escrevendo. Não é 
possível também colocar toda a responsabilidade sobre a leitura. Não é possível 
imaginar que, lendo, automaticamente será possível escrever. Contudo, ler, ler por 
diversos objetivos, ler para ver a nuance e aquilo que está subentendido, ler para 
entender o momento de comunicação, os elementos e, por vezes, paradigmas da 
sociedade... essa leitura, sim, nãohá como não reconhecer que ela não “respingue” 
na escrita. 
Isso posto, esta unidade irá verticalizar alguns conceitos para entendermos 
desse importante componente dos currículos de nossas disciplinas: a leitura. Esses 
conceitos, na visão do senso comum, de nada são úteis. Alguns podem, logo de 
início, desenvolver esse tipo de desejo: “diga-me logo como faço”, “dê-me logo a 
fórmula”, “pule essa parte teórica e diga-me logo o que e como fazer”. Esse tipo 
de raciocínio nos amarra a fórmulas que são falsas ou inférteis. Os motivos são 
variados. O primeiro deles é o de que toda turma, todo aluno é diferente e precisa ser 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
4
observado em suas características únicas. Esse, por si só, já é motivo suficiente para 
entendermos que fórmulas é uma busca sem sentido. O que existe são: caminhos, 
caminhos possíveis, caminhos explorados e caminhos ainda não explorados. A 
teoria, portanto, oferece reflexões que ajudarão o professor a escolher e a criar 
melhores caminhos de acordo com as realidades vividas.
Da mesma forma, não significa que ao longo desse material não serão 
oferecidas sugestões de cunho prático. Porém, essa introdução deseja, antes de 
tudo, fazer essa ressalva: a prática dos professores pode ir muito além de tudo o que 
for apresentado aqui como sugestões. Pode ir muito além, desde que amparada em 
uma teoria consistente, em estudos da área. A prática rebelde, sem fundamentação 
é que deixa de levar os alunos a saltos que eles podem e têm o direito de alcançar.
Utilizou-se a palavra “direito”, uma vez que, de fato, a Educação é um direito 
de todo cidadão (assegurado na Constituição brasileira). Independentemente 
disso, a noção de que os alunos têm direito de ter acesso e de dominar ferramentas 
para o exercício da cidadania. A leitura, de fato, é uma das maiores ferramentas 
para esse exercício (tal e qual a escrita e outros). Assim, nós professores precisamos 
ter de forma bem clara o fato de que não estamos fazendo um favor ao ensinar os 
conhecimentos x ou y aos nossos alunos. Que estamos dando acesso ao aluno a 
algo que é direito dele e, portanto, dever nosso como educadores. É o mesmo senso 
de responsabilidade que deve ter um médico ao se importar com seu paciente, 
o policial com os civis, os engenheiros com as obras – que pessoas desfrutarão. 
Ainda que nossos salários sejam pagos por instituições (públicas ou particulares), 
precisamos ter ciência de que trabalhamos por pessoas e para pessoas – aquelas 
que estão na nossa frente, ouvindo-nos e esperando pelo melhor de nós. 
Esse senso de responsabilidade, ter a visão da relevância da nossa disciplina 
e de todo o currículo que ela é capaz de formar para/em nossos estudantes 
é, de fato, o fundamento que nos impulsionará a querer ir além, querer mais 
conhecimento para poder criar aulas e atividades que desenvolvam habilidades e 
competências. Essas que serão ferramentas para o(s) exercício(s) de cidadania, para 
a participação social, para que esses sujeitos em formação possam se movimentar, 
ter independência. Independência pressupõe domínio de um conjunto (mínimo ou 
máximo) de habilidades que serão postas em ação (competências). Ter esse senso 
de responsabilidade fará com que nossa prática não seja moldada ou nosso desejo 
de (bem) formar não seja enfraquecido perante pessoas desinteressadas ou escolas/
instituições que não nos apoiarem (sim, nem sempre seremos compreendidos por 
querer fazer mais, mais do que o mínimo, mais do que o básico). 
Lembre-se: tendo de fato estudado autores e teorias da sua área – com 
dedicação e afinco – você é uma pessoa gabaritada a saber o que é importante, 
o que deve fazer parte da formação dos alunos. Isso nos tirará da teimosia pela 
teimosia. Também nos levará a outro patamar: ao de pessoas comprometidas com 
o conhecimento e a formação de cidadãos. Por esse motivo, espera-se que esta e 
as outras unidades contribuam muito no sentido de dar subsídio para a prática e, 
ainda, para os professores terem fundamentação para as suas práticas. A prática 
pela prática é cópia. É fazer como todos fizeram e repetir o que nos ensinaram. A 
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
5
prática fundamentada altera vidas – a nossa e a dos que estão sentados à nossa 
frente, à espera do que estamos lá para fazer: formar pessoas; levar cada um além 
do estágio em que chegou; ampliar a visão de mundo; ampliar possibilidades 
de participação no mundo; gerar mudança; abrir portas. Sim, em tudo isso, ler é 
essencial. Ler no sentido que aqui será trabalhado.
A partir dessa provocação inicial da unidade, você é agora convidado 
a refletir sobre si a partir de algumas perguntas:
· Você é daqueles que têm indisposição ou até preguiça de mergulhar nos 
estudos teóricos da sua área de estudos?
· Você é daqueles que pensam que teoria é uma coisa e prática é outra?
· Você é daqueles que esperam pelo momento em que virá alguma prática 
pronta, alguma fórmula perfeita e que resolverá todos os seus problemas?
· Você é daqueles que sabem que estudar e entender conceitos é o começo – 
e fundamento – de uma prática pedagógica bem desenvolvida e que gere 
ganhos aos alunos/futuros cidadãos?
Você pode usar esse espaço para fazer algumas anotações a partir 
das reflexões aqui levantadas. Essa percepção gera terreno fértil para que 
todo o mais possa ser mais bem recebido. O bom solo é segredo de uma 
boa plantação! Essa parte está nas mãos de cada um que agora lê este livro! 
Refletir e gerar autoconhecimento é arar a terra e preparar para que muito 
mais possa germinar!
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Muito bem! Agora sim, poderemos seguir com a Unidade 1.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
6
2 PREÂMBULO TEÓRICO
“A única constante é a mudança” (Heráclito de Éfeso).
Quando lemos algo como “mundo atual” ou “mundo contemporâneo”, 
antes de tudo, precisamos reconhecer que este é vislumbrado por variadas áreas. 
Dentro de uma mesma área há perspectivas que se completam ou até mesmo se 
chocam. Em outras palavras, o mundo atual, a forma de organização da sociedade 
moderna pode ser explicada de variadas maneiras ou, ainda, tendo um ponto 
como foco da discussão que passe despercebido a outra corrente teórica. 
Com isso, deseja-se demonstrar que o que aqui for exposto não é forma 
única de entender o mundo e nem mesmo é uma tentativa de findar/encerrar 
a discussão. Muito pelo contrário. Trata-se de explorar alguns conceitos que 
contribuem para a discussão aqui realizada – não toda a explicação possível do 
mundo e da organização social.
Antes de irmos aos conceitos, anote no espaço a seguir algumas 
palavras que vierem à sua cabeça sobre as características da sociedade 
globalizada em que vivemos. Isso fará com que seus conhecimentos prévios 
aflorem antes de seguirmos adiante.
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Muito bem! A partir dessas suas anotações, você poderá ir adiante e, 
com base nesta e nas unidades seguintes, realizar uma comparação com o 
que aqui anotou. Agora podemosretomar a discussão teórica.
Antes de abordarmos conceitos que pretendem descrever o mundo atual 
e a(s) forma(s) de organização, é necessário falar de uma mudança no campo das 
ciências humanas. É comum as ciências humanas, hoje, pesquisarem coletando e 
analisando material linguístico. Ou seja, para entender algum tópico selecionado, 
elas coletam dados cuja materialidade é a linguagem. Em outras palavras, 
quando alguma pesquisa das ciências humanas quer buscar entendimento 
sobre algum aspecto da sociedade, analisa a linguagem, coleta registros escritos, 
entrevista pessoas, entrega questionários a serem preenchidos, analisa dizeres e 
imagens (linguagem não verbal) a partir de filmes e livros clássicos, entre outras 
possibilidades. 
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
7
Nem sempre houve esse entendimento – de que podemos entender o mundo 
analisando linguagem/linguagens. Isso só foi possível a partir de um movimento 
que foi intitulado de Virada Linguística. Este aconteceu conforme descrito a seguir.
A Saussure é atribuído o gesto fundador do estruturalismo, apresentado em 
seu Curso de Linguística Geral, de 1916 (GREGOLIN, 2004). A partir de um encontro 
entre Jakobson e Lévi-Strauss, as ideias estruturalistas chegam à França. Strauss é 
responsável por transferir os modelos linguísticos para o estudo da antropologia. 
Com isso, iniciou-se o processo de “transformação das ideias desenvolvidas no 
interior da Linguística em modelo para outros campos das ciências humanas” 
(GREGOLIN, 2004, p. 21). A partir dessa transposição dos modelos da linguística à 
antropologia, outras áreas começaram a se interessar por linguagem e, mais adiante, 
pelo discurso – como Foucault, Pêcheux, Bakhtin. Além disso, a partir da chamada 
Virada Linguística, ocorre a ascensão da Linguística como um campo de estudos. 
Veja a importância dessa mudança para a forma de investigar e entender 
o mundo: passa-se a entender que, por meio da análise da linguagem, pode-se 
compreender o funcionamento, a estrutura, a organização da sociedade. Essa 
compreensão, antes, referia-se somente ao campo da linguística. Assim, muito do 
que hoje é estudado e até a forma de estudar coroa a linguagem (verbal e não 
verbal) como formas de entender o que nos cerca, o homem no mundo, as relações 
humanas, as práticas sociais – em outras palavras, leva a leitura (do verbal e não 
verbal) a outro patamar; eleva a sua relevância. Portanto, muito do que hoje existe 
de teoria/teorias sobre o mundo atual é construído sobre a herança da Virada 
Linguística. Conhecimentos e visões são produzidos a partir da análise dessas 
materialidades linguísticas (do verbal e do visual). 
Essa mudança alterou nossa forma de pesquisar e, ainda, sensibilizou a forma 
de enxergar que os materiais que circulam na sociedade (orais, escritos, não verbais) 
são dotados de signos, carregados de sentidos e passíveis de provocar outros sentidos 
(a partir da leitura, de quem lê, quando lê, onde lê, em que circunstâncias lê). Como 
dito, isso oportunizou que conceitos relevantes surgissem. Hoje, rapidamente, em 
qualquer caminhada acadêmica – não só na formação da área de Letras –, acadêmicos 
estudam algum autor que traga a noção do signo, dos sentidos presentes naquilo que 
se escreve, diz e, também, na linguagem não verbal/visual. Alguns exemplos podem 
ser o curso de Design, o de Moda, Arquitetura, Jornalismo, Serviço Social, Ciências 
Sociais, Psicologia, entre outros. Esses e outros cursos, em algum momento, estudam 
a característica metafórica da linguagem – coisas (aparentes/visíveis) significam 
outras (não presentes); por isso devem ser analisadas.
Na Unidade 3, essas compreensões de representação (presente) de algo (não 
presente) farão mais sentido. Para isso, nesta etapa vindoura, abordaremos o conceito de signo.
NOTA
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
8
Com toda essa abrangência, a concepção de fato permeia as formações, 
os currículos universitários, os documentos oficiais brasileiros (Diretrizes, 
Parâmetros, Propostas Curriculares de Estados e diretrizes de municípios). Assim, 
com o império dessa concepção, os exames, provas e vestibulares acabam por 
absorver essa concepção, exigindo de nossos alunos o reconhecimento de sentidos 
em textos (excertos de fala, textos variados e não verbais).
As aulas de Língua Portuguesa não podem ignorar essa realidade: a 
conceitual (o império dos signos, sentidos, discurso) e a factual (a de que os exames 
e o mundo irão exigir dos cidadãos a compreensão de que as coisas significam e que 
necessitam ser lidas, analisadas, interpretadas). O ensino de língua portuguesa, 
a partir disso, não pode manter o aluno no nível raso de leitura, da superfície, 
do reconhecimento de informações básicas que não exijam, concomitantemente, a 
compreensão do mundo, da intertextualidade, da rede de discursos, das relações, 
dos papéis, dos signos, dos jogos de palavras e de poder, de figuras de linguagem.
Ao longo de todo este livro, você estudará variadas formas de leitura – para 
além da decodificação. A seguir, um exemplo disso. Observe a imagem. Procure 
realizar uma leitura. Depois disso, leia o que segue.
FIGURA 1 – PAWEL KUCZYNSK I63
FONTE: Disponível em: <https://www.pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso 
em: 18 maio 2017.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
9
Análises possíveis (entre outras):
- Posso ver uma mão, um guarda, uma tesoura e um sol no formato de “a” com 
um círculo à volta.
- Posso ver uma mão, uma fronteira e um “a” iluminado, em destaque no 
horizonte.
- Posso ver um mouse na mão, a tesoura (controlando alguma coisa) e o @ (arroba) 
simbolizando a internet.
- Posso ver uma pessoa com o mouse em mãos (a autonomia), o @ (arroba) como 
uma fonte de informações, uma fronteira com um guarda e uma tesoura – 
demonstrando controle entre o homem e a(s) informação(ões) ou notícia(s). 
Consigo associar essa imagem a vários países que realizam esse tipo de controle 
de suas populações. De leis regulamentadoras de seu próprio país. De fatos 
conhecidos – do presente ou do passado; histórias, notícias – a partir dos quais 
já reconheceu a censura (algum site ou blog já retirado do ar, alguma revista ou 
TV que já perdeu financiamento estatal). Enfim, a partir da imagem, associa a 
variados eventos, acontecimento, a outras histórias, a fatos, entre outros.
Para sintetizar
A diferença entre o primeiro (decodificação) e último (interpretação) níveis 
está em alguns fatores:
- experiência de vida;
- leitura de mundo já realizada ou que é realizada dia a dia;
- a quantidade de vezes que já se inseriu em práticas de leitura;
- a quantidade de vezes que já se embrenhou na análise de textos visuais;
- o quanto procura fontes variadas de informação (documentários, jornais, sites, 
aplicativos, redes sociais, entre outros);
- a quantidade de vezes que foi instigado (convidado) a realizar leituras e aceitou 
tais convites (de variados textos: músicas, imagens, campanhas, desenhos, 
propagandas, entre outros);
Ao longo das três unidades deste livro, esses aspectos ficarão mais claros. 
Vamos adiante!
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
10
3 LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
Se ler no mundo contemporâneo é muito mais que decodificar, quais 
conceitos podem nos ajudar a entender a sociedade atual? Afinal, se estamos 
ensinando a ler no tempo presente, precisamos, de fato, de uma base teórica 
que nos ajude a entender este tempo. Alguns conceitos que iremos utilizar são: 
sociedade líquida, discurso, enunciação, esferas, gêneros.
Bauman (2001) utiliza o conceito de modernidade líquida. Este conceito 
também é chamado por outros autores de pós-modernidade, contemporaneidade, 
modernidade tardia, modernidade líquida, hipermodernidade etc. O que mais 
interessa é que tudo se passa (e nos passa...) como se a modernidade – não só um 
tempo, mas uma forma (ou formas) de estar no mundo; maneiras de ser e pensar – 
esteja sendo deixada para trás.
Para Bauman (2001, p. 8), há uma aceleradaliquefação do mundo 
contemporâneo. Como explica o sociólogo, os fluidos “não fixam o espaço nem 
prendem o tempo”. O autor ainda completa: “não se atêm muito a qualquer forma 
e estão constantemente prontos (e propensos) a mudá-la” (BAUMAN, 2001, p. 8). 
Assim demonstra a substância do tempo presente: fluir, mudar, descartar, gerar 
o novo, usar, alterar; assim por diante. Segue uma citação um pouco mais densa, 
porém, necessária – leia calmamente, quantas vezes precisar.
Da mesma maneira, a flexibilidade – uma propriedade hoje tida como importante 
e desejável por si mesma – decorre do caráter líquido da pós-modernidade. O mesmo se pode 
dizer da volatilidade e do correlato fenômeno de descarte, ambos cruciais para a prática do 
hiperconsumo (consumismo). Palavras como essas – liquefação, aceleração, apagamento de 
fronteiras, flexibilidade, volatilidade –, tão comuns nos discursos contemporâneos, apontam 
para a irreversível impermanência e instabilidade do mundo pós-moderno e para o fim do 
mito do sujeito moderno como uma singularidade estável e indivisível. São, também, palavras 
que servem para descrever as novas subjetividades contemporâneas, em termos éticos, polí-
ticos, econômicos, culturais, de convivência, de suas relações com a Natureza e assim por 
diante (VEIGA-NETO, 2008, p. 44).
IMPORTANT
E
Mesmo que em palavras mais complexas, a citação acima revela o caráter 
do tempo atual: a natureza líquida, flexível, acelerada dos movimentos sociais e 
subjetivos. As próprias mídias e redes sociais movem-se, hibridizam, atualizam-se 
e, com algum tempo, são substituídas por novas, mais excêntricas – assim seguem 
em movimento. O sujeito, as subjetividades são convidadas e impelidas a se 
seguirem em movimento: indo além de si mesmos, atualizando-se, formando-se 
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
11
para não se tornarem obsoletos. Esse processo ocorre tanto no mercado de trabalho 
ou, quiçá, em relacionamentos interpessoais – neste último, as redes sociais que 
promovem o “show do eu” (SIBILIA, 2008) contribuem para esse sentimento de 
insatisfação para consigo, com aquilo que se é e se tem.
Na Unidade 3 serão retomados as práticas de linguagem atuais e o show do eu.
NOTA
Aqui se encontra a grande sacada: a insatisfação do momento presente 
é elemento crucial para que as subjetividades sigam se movimentando, indo 
além, gerando, permanecendo ativas, consumindo (saberes, objetos e modos de 
ser). Gerando essa insatisfação, gerando essa necessidade de permanecer em 
movimento que o momento presente gera quem somos. Estamos inseridos nisso. 
Estamos dentro dessas forças centrífugas que nos impelem e agem sobre nós – 
mesmo que não percebamos isso. 
O termo “show do eu”, acima citado, é uma obra da autora brasileira Sibilia. 
Essa autora analisou a forma com que as redes sociais nos impulsionam a mostrar 
a nós mesmos. A expor publicamente intimidades que antes não faríamos. A partir 
disso, ela percebeu quanto essas ferramentas têm poder de alterar-nos. Expondo 
o eu, acabamos por produzir-nos a partir dos olhos dos outros – uma espécie de 
regulação externa. Chegamos ao nível de que se tivermos algo e não pudermos 
mostrar, o nível de satisfação parece diminuir. 
Um exemplo da importância atual do “show do eu” é o fato de muitas 
pessoas hoje terem seu sustento vindo de ferramentas como YouTube (canais de 
variedades, blogger ou youTuber), Instagram (páginas dedicadas a um assunto 
específico como saúde, moda ou alimentação). Há pessoas que da noite para o dia 
se tornam famosas, passam a ser seguidas por milhares de pessoas (chamadas de 
“seguidores”) tendo seu “eu” como fonte de inspiração; de estilo de vida, opiniões, 
entre outros. A relevância dessas ferramentas se vê por esses exemplos e, também, 
pelas falas cotidianas “agora somos amigos na rede tal”, “me segue lá”, “compartilhei 
você”, “tal famoso me segue”, “sou seguida por x pessoas”, “minha última foto 
tem x curtidas”. São comentários costumeiros que materializam comportamentos 
e modos de estar no mundo atuais.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
12
Veja, caro acadêmico!
Aqui se encontra a importância de estudarmos e entendermos o mundo atual e como ele 
nos altera – como somos transformados por ele. Essa percepção das ferramentas atuais (que 
nos circundam, que nos afetam e que, também, produzem o ser daqueles que chamamos de 
alunos) possibilitará que promovamos uma prática pedagógica promotora de reflexão, análise. 
Como professores, estar cientes de que nossos alunos são parte integrante desse mundo 
atual e que, portanto, precisam ser levados a enxergar as nuances, os detalhes, as estratégias, 
os jogos. Isso oportunizará com que nós e eles saiamos da inocência, ou seja, de usar por 
usar, sem refletir sobre as causas e as consequências. Como isso será feito em sala, como já 
dito, não há uma fórmula pronta e acabada. Contudo, ao analisar ferramentas – como alguma 
rede social, por exemplo –, os professores devem levantar reflexões que oportunizem ao 
aluno refletir aspectos envolvidos. Da mesma forma, podem ajudar seus alunos no “cuidado 
de si” – não que devam deixar de usar algumas ferramentas, mas que as usem de forma mais 
consciente.
Em tempo: nós trabalhamos leitura e escrita no mundo atual, práticas relativas ao mundo 
contemporâneo. Assim, precisamos olhar essas práticas (as de leitura e escrita) compreendendo 
que elas são localizadas no tempo (quando?) e no espaço (onde?) e são produzidas por 
subjetividades (por quem e para quem?).
Na posição de professores que lecionam dentro do tempo aqui chamado de “modernidade 
líquida”, precisamos ter essa ciência de que nós também precisamos acompanhar esse fluir. 
Ou seja, os nossos alunos têm contato com as mais variadas ferramentas. Eles são, o tempo 
todo, convidados a fluírem, a mudarem, a serem outros, a aderirem a novas ferramentas, 
a abandonar as obsoletas. Assim sendo, quer tenhamos consciência disso ou não, está 
acontecendo o tempo todo. Tendo ciência, poderemos possibilitar momentos de reflexão, 
selecionar melhor os nossos materiais e, também, desenvolver atividades significativas de 
leitura e/ou escrita. 
Observação: apesar de este livro dar ênfase à leitura, como o título e os capítulos seguintes 
demonstram, não é possível deixar de fazer referência à escrita em alguns momentos. Leitura 
e escrita fazem parte das práticas sociais inseridas no mundo contemporâneo e ambas fazem 
parte das nossas aulas. Ambas devem considerar os aspectos aqui apontados.
IMPORTANT
E
Outro conceito que nos ajuda a entender o mundo atual – e as práticas 
de leitura, escrita e, não menos importantes, o texto oral e o texto não verbal – é o 
conceito de discurso e de poder. O próprio termo discurso é abordado em diferentes 
teorizações, ganhando, também, tônicas diferentes. Neste livro, o discurso é abordado, 
prioritariamente, a partir da teoria do filósofo Michel Foucault. Ainda, algumas 
aproximações são feitas a partir da autora brasileira Orlandi – esta, por sua vez, utiliza 
Foucault e análise do discurso francesa (oriunda da teoria de Michel Pecheux).
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
13
O conceito de discurso é polissêmico e necessita de certos cuidados. É preciso 
definir a partir de quem – de qual autor – se apoia para definir o termo “discurso”. Delimitações 
são necessárias.
Este cuidado tem uma razão: manter o rigor e a coerência teórica – seguir uma linha. Podem 
ocorrer fragilidades analíticas caso muitos autores sejam abordados ao mesmo tempo. O que 
é discurso? Depende da base teórica, respostas diferentes podem surgir. Assim, este livro vai 
ao encontro da proposta foucaultiana. 
Somente aqui já nos bastaria, afinal, com essa percepção, já poderemos levantar 
problematizações com nossos alunos na leitura de textos (orais, escritos e não verbais – sim, 
a imagem é um texto que também precisa ser lido: é costurada por discursos). 
NOTA
NOTA
Afinal, o que é discurso e por que esse conceito nos ajuda a entender o 
mundoatual?
O conceito de discurso nos leva a algumas compreensões importantes. 
A começar pela compreensão de que tudo o que é dito, escrito (ou até que é 
materializado em algum desenho, pintura ou peça de publicidade) não vem de um 
nada, fruto de um gesto inaugural, oriundo da inteligência de um artista, de uma 
mente desconexa (como uma ilha). O conceito de discurso nos leva a perceber o 
aspecto interligado de tudo o que nos circunda. Interligado com o quê? A começar, 
pela própria história. Tudo o que dizemos no presente e que é socialmente 
aceito como uma verdade, foi produzido na história para que viesse, hoje, a ser 
considerado uma verdade. É efeito, é produto. 
Vamos a um exemplo mais prático. Quando algum texto, por exemplo, 
definir o que é ser uma boa mulher – em detrimento de todas as outras que não 
são como esta –, esse texto tem suas bases na história, em outros textos, fontes 
variadas (na literatura, na música, na ciência – mesmo que em textos não mais 
aceitos pela própria ciência –, em documentos oficiais anteriormente válidos, em 
apostilas escolares já utilizadas), enfim, nada é isolado. 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
14
Apesar de esses tópicos – aqui abordados de forma abstrata – ganharem 
materialidade (serem visualizados) na Unidade 3 (por meio de exemplos 
de análises/leituras), aqui é válido um exemplo – para entendermos mais concretamente. 
Vamos ilustrar a representação da mulher. Esta, em músicas antigas ou atuais, pode receber 
representações complemente distintas (basta compararmos os clássicos da MPB, Bossa Nova 
com os estilos que sejam atuais: o funk, pop, reggae). Não só na música, mas nas artes de 
forma geral, nos gêneros da esfera publicitária (anúncios em revista, anúncios veiculados na 
televisão, outdoors, capas de revista, rótulos de produtos, entre outras possibilidades).
IMPORTANT
E
FIGURA 2 – PINTURA “THE BIRTH OF VÊNUS” 
DE BOUGUEREAU FIGURA 3 – ANÚNCIO ITAIPAVA
FONTE: Disponível em: <http://arthistorypro-
ject.com/artists/william-adolphe-bouguereau/
the-birth-of-venus/>. Acesso em: 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <http://wp.clicr-
bs.com.br/napontadalingua/2015/06/20/
conar-recomenta-retirada-de-propagan-
da-com-aline-riscado-sensual-demais/?to-
po=5>. Acesso em: 18 maio 2017.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
15
FIGURA 4 – PINTURA “CHARITY” 
DE BOUGUEREAU
FIGURA 6 – PINTURA “MONA LISA” OU “A 
GIOCONDA” DE LEONARDO DA VINCI
FIGURA 5 – ANÚNCIO DOLCE & GABBANA
FIGURA 7 – DESENHO “OFFICE” DE PAWEL 
KUCZYNSKI
FONTE: Disponível em: <https://
www.wikiart.org/en/william-adol-
phe-bouguereau/charity-2>. Aces-
so em: 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <http://www.in-
foescola.com/pintura/mona-lisa/>. Acesso 
em: 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <https://www.pic-
torem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso 
em 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <http://ego.globo.com/moda/noti-
cia/2015/03/apos-polemica-com-elton-john-dolce-gabbana-
-volta-ser-criticada.html>. Acesso em: 18 maio 2017.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
16
FIGURA 8 - GÊNERO HÍBRIDO (VERBAL E VISUAL) – TIRINHA
FIGURA 9 - GÊNERO HÍBRIDO (VERBAL E VISUAL) – TIRINHA
FONTE: Disponível em: <https://br.pinterest.com/pin/371265563015277189/>. Acesso em: 18 
maio 2017.
FONTE: Disponível em: <http://www.willtirando.com.br/>. Acesso em: 18 maio 2017.
Linguagem verbal – Letra de música Linguagem verbal – Letra de música
Maria, Maria
Milton Nascimento
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
Amiga da Minha Mulher
Seu Jorge
Ela é amiga da minha mulher.
Pois é, pois é..
Mas vive dando em cima de mim.
Enfim, enfim...
Ainda por cima é uma tremenda gata, 
pra piorar minha situação.
Se fosse mulher feia tava tudo certo, 
mulher bonita mexe com meu coração.
Se fosse mulher feia tava tudo certo, 
mulher bonita mexe com meu coração.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
17
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida
FONTE: Disponível em: <https://www.letras.
mus.br/>. Acesso em: 18 maio 2017.
[refrão]
Não pego, eu pego, não pego, eu pego, 
eu não pego não..
Não pego, eu pego, não pego, eu pego, 
eu não pego não..
Minha mulher me perguntou até: qual 
é, qual é?
Eu respondi que não tô nem aí.
Menti, menti..
De vez em quando eu fico admirando, 
é muita areia pro meu caminhão.
Se fosse mulher feia tava tudo certo, 
mulher bonita mexe com meu coração.
Se fosse mulher feia tava tudo certo, 
mulher bonita mexe com meu coração.
FONTE: Disponível em: <https://www.letras.
mus.br/>. Acesso em: 18 maio 2017.
Comentários sobre os textos acima:
1) há imagens que remetem ao clássico, ao romântico, à mulher idealizada (que pode ser 
encontrada em movimentos da literatura; não só a brasileira); há a mulher adorada, 
delicada, corpo com os chamados “padrões de época”, remetendo às ideias românica 
(intertexto apresentado pelo título da obra que faz referência à Vênus). 
2) há mulheres com muita roupa e pouca roupa; falantes ou quietas; com uma 
postura x ou y em relação aos homens; tristes e serenas; pensativas, reflexivas e 
contemplativas; 
3) há mulheres estabelecendo uma relação com outros na imagem (anjos, 
adoradores, copo, garrafa de cerveja, crianças); há imagens compostas por 
elementos como o mar, céu, escada, bolsa, maleta;
4) o corpo está em uma posição cuja posição é socialmente reconhecida como 
discreta e comedida, posição de sensualidade (quadris, curvas e postura); 
mulher representada como bela; mulher que trabalha e é forte;
5) corpos que acolhem (recebem, abraçam), corpos ao chão, corpo segurado ao 
chão, mão que serve de apoio para que um objeto receba destaque no topo, 
mãos que são levadas ao cabelo, mãos repousadas, mão que segura pasta, 
bolsas, entre outros;
6) olhares que observam com ternura, com admiração; olhares que observam de 
cima para baixo, com olhares mais sérios, remetendo aos “bad boys”.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
18
Observações:
1) Quanto mais contrastantes os textos (verbais e visuais), mais gritantes ficarão o 
elementos que as compõem e os sentidos nelas explorados – o que contribuirá 
com a interpretação e a crítica. 
2) Esses são somente alguns gêneros possíveis com algumas posições possíveis 
(entre várias outras) a serem exploradas em materiais que circulam em 
sociedade. A variedade é imensa: textos visuais (imagens, desenhos), verbais 
(letras de música) e híbridos (constituídos por texto verbal e não verbal). As 
imagens poderiam ser outras. Os elementos a serem percebidos: muitos outros. 
Esses tópicos farão ainda mais sentido quando chegar à unidade 3 deste livro. 
Ao chegar no conceito de letramento visual e letramento crítico, sugere-se o 
retorno aos textos acima apresentados.
3) Os anúncios apresentados (à direita) não foram bem recebidos – tanto pelos 
consumidores quanto por orgãos de fiscalização. Apresentar anúncios 
criticados ou censurados – sem dizer aos alunos, imediatamente, que se tratam 
de anúncios mal recebidos – contribui com a leitura crítica. É válido que antes 
construam suas análises e, somente ao final da exploração do texto (a partir de 
variadas estratégias) saibam desses fatos e conheçam os órgãos de regulação 
das propagandas.
ATENCAO
Sugere-se o bom senso na seleção das imagens de acordo com a faixa etária 
dos envolvidos. A imagem em que a mulher se coloca “em frente a uma escada” necessita 
de maturidade. Selecionar bem seus materiais – frente aos estágios de vida dos sujeitos – 
e adequação à idade também é parte do crescimento docente no trato com os textos (e 
imagens) em sala de aula.
Retomandoa linha. É possível perceber inter-relações (contradições, 
ideias contrárias, posições diferentes) em gêneros de uma mesma esfera (apenas 
publicitária, por exemplo) ou de esferas diferentes (publicitária, jornalística, 
literária, científica, entre outras) ou, ainda, textos de naturezas distintas (comercial 
veiculado na tv, documentários, pintura clássica, música gospel, poema modernista, 
desenhos com ênfase em crítica social, caricaturas, tirinhas, cenas de teatro, entre 
outras).
Uma pesquisa mais bem elaborada (em graduação ou pós-graduação, por 
exemplo), pode buscar essas referências (esse Arquivo, conforme intitula Foucault) 
para compreender essa interdependência entre textos e, também, entre história 
e o presente. Claro que, com nossos alunos, isso seria complicado por alguns 
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
19
ATENCAO
A partir disso, pode-se perceber a infinidade de possibilidades de explorar um 
texto – ou dois ou mais textos, de forma comparativa, com abordagem intertextual. 
O conceito de intertextualidade já está propagado no ensino de língua/linguagem. Esse 
conceito vai ao encontro de outros: dialogismo (Bakhtin), discurso (Foucault), enunciado 
(Bakhtin), entre outros.
quesitos – a começar pelo fator tempo. Para realizar pesquisas de forma vertical 
(aprofundada) é necessário tempo, dedicação – para que o interesse por pesquisar 
e questionar o mundo comece a brotar. 
Neste momento da discussão, sugere-se que não se perca de vista o seguinte: 
o presente é efeito, produto da história, das lutas discursivas anteriormente 
realizadas, de que os sentidos das coisas – que parecem óbvios no presente – 
são possibilitados pelo Arquivo (um campo de possibilidades e conhecimentos/
saberes socialmente aceitos). Se estamos formando leitores, portanto, devemos 
levar nossas turmas a ter essas percepções elementares: (1) a de que o conhecimento 
é produto e é construção coletiva e (2) a de que tudo está interligado – estabelece 
alguma relação com algo do passado, do presente ou, ainda, contribui para a 
construção daquilo que começa a surgir (futuro).
Essas compreensões vão aparecer em nossas práticas – quer percebamos ou 
não. Quando elaboramos um exercício. Quando lançamos perguntas aos alunos querendo 
levá-los além da leitura que, no momento, conseguiram empreender. Bem conduzir as 
atividades, portanto, requer domínio desses conceitos.
IMPORTANT
E
A partir de tais compreensões, poderemos, por exemplo, trabalhar a 
noção de intertextualidade. A partir de Fiorin (2002, apud COVALESKI, 2016), 
compreendemos que a intertextualidade é a incorporação de um texto em outro. 
Essa pode ser: (1) citação (uma referência literal a algum texto anterior), (2) 
alusão (reprodução de construções com algumas substituições) ou (3) estilização 
(reprodução do estilo – tanto em se tratando da forma de expressão quanto do 
conteúdo). O mesmo autor ainda compreende que ao estabelecer essa relação 
intertextual é possível remeter a outro texto de duas outras formas: (1) polêmica 
(propõe uma oposição) – um exemplo comum é a paródia – e (2) contratual (quando 
reforça ou enaltece) – um exemplo comum é a paráfrase.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
20
Todos estes compreendem que, 
ainda que o tempo e o espaço 
sejam diferentes, aquilo que 
é dito, escrito ou produzido/
visto (objetos simbólicos e 
artefatos culturais) estabelece, 
de alguma maneira, relação 
com o já dito (Orlandi). Coloca-
se em uma esteira, encaixa, vai 
ao encontro, fundamenta-se em 
concepções, visões e conceitos 
anteriormente produzidos. 
Estabelecer essas relações é 
ler para além do momento 
presente – é investigar o 
momento presente e aquilo que 
nele emerge, ganha visibilidade 
à nossa volta.
FIGURA 10 - ICEBERG
FONTE: PICTOREM Disponível em: <https://www.pic-
torem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 
maio 2017.
Exemplo de citação: muito comum em textos verbais. Em meio ao texto, algum 
trecho de livro de algum médico, especialista, cientista, algum fato histórico, 
entre outros elementos. Utilizado como argumento de autoridade – para 
reforçar um ponto de vista ou defender uma linha de raciocínio.
Exemplo de estilização: quando o estilo de algum autor é reproduzido em 
suas obras. Por exemplo: estilo de José Saramago sendo utilizado por outro 
autor. Os traços utilizados por Van Gogh em suas pinturas serem reutilizados 
por outro pintor. Algum outro autor passar a utilizar o nome Helena em suas 
personagens – como Manuel Carlos em suas novelas. Esse estilo é o que leva 
autores a serem eternizados por terem características únicas.
Exemplo de alusão: comum em textos verbais e também em textos visuais. A 
alusão pode ser discreta (velada) ou clara/explícita. Essa alusão (referir-se a 
algo ou alguém) costuma ser feita a partir de algo conhecido ou não pelo leitor/
espectador. A publicidade e as artes utilizam muitas alusões. Reaproveitam 
aquilo que já é conhecido, famoso ou benquisto (de outros autores ou de outros 
tempos) para o interior de suas produções. Algumas vezes, deixando claras as 
intenções, outras, deixando a responsabilidade de entender por parte do leitor. 
Ou seja, caso o leitor tenha conhecimento, irá reconhecer a alusão e, assim, irá 
compreender mais profundamente os sentidos pretendidos por aquele texto.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
21
FIGURA 12 – ALUSÃO NA PUBLICIDADE
FONTE: Disponível em: <https://blogs.oglobo.com/rebimboca>. Acesso em: 18 maio 2017.
A alusão é feita à foto clássica dos Beatles (a capa do Abbey Road da banda, em 
que os quatro integrantes estão atravessando a rua na faixa). Na propaganda
A seguir, dois exemplos de alusão:
A alusão feita no 
desenho é a cena “ser ou 
não ser” de Hamlet (peça 
escrita por Shakespeare). 
Alusão que ajuda a dar 
sentido ao desenho. Sem 
a percepção da alusão, 
o leitor não alcança o 
mais profundo do texto. 
Não alcança os sentidos 
implícitos.
FIGURA 11 – ALUSÃO NO DESENHO
FONTE: Disponível em: <https://www.pictorem.com/profi-
le/Pawel.Kuczynski>. Acesso em: 18 maio 2017.
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
22
acima, os quatro carros (chamados New Beetle) também atravessam a rua na 
faixa.
Ao fazer alusão cria-se, também, a intertextualidade.
Além de um trabalho a partir da intertextualidade, pode-se, ainda, 
selecionar textos de épocas completamente diferentes (um muito antigo e um atual) 
para que possam observar que um texto que se propõe a dizer a verdade sobre algo 
pode, de fato, estar retomando um discurso que circula em vários lugares e por 
variados meios (orais, escritos e não verbais). Em outras palavras: reproduz algo 
que já foi dito antes ou mostrado antes (em músicas, em imagens, em propagandas, 
entre outros). Assim estaremos trabalhando a partir da compreensão do termo 
discurso sem que nem precisemos abordar o termo em sala. O que importa é a 
compreensão e a visualização dessas conexões e redes – que fazem parte do mundo 
contemporâneo, ou melhor, que constituem a essência do mundo atual.
Válido, ainda, é observar outros elementos na produção dos textos (esses 
verbais ou visuais). Neste momento, voltamos a lançar um olhar a partir da teoria 
foucaultiana. De acordo com Foucault (1987, p. 8-9, grifos nossos), “em toda 
sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada, 
organizada e redistribuída por certo número de procedimentos”. Abaixo, vamos 
observar cada termo selecionado.
Controlada: pois nem todo mundo pode falar tudo (exemplo: verdades 
médicas precisam ser proferidas por médicos ou alguém gabaritado pela área da 
saúde). Selecionada: sim, o que se diz também é selecionado, tendo em vista seu 
posicionamento, crenças, valores, posição assumida. Organizada: a organização 
textual tem em vista os efeitos pretendidos (conquistar, convencer, descrever, 
esclarecer, entre outros objetivos). Redistribuída: dá a ideia de conexões e redes, 
conforme já dito acima.
Vamos adiante, já chegaremos no ponto crucial da atual discussão. Abaixo, 
umacitação complexa, porém essencial:
ATENCAO
Em uma sociedade como a nossa, conhecemos, é certo, procedimentos de 
exclusão. O mais evidente, o mais familiar também, é a interdição. Sabe-se bem que não se 
tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que 
qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. Tabu do objeto, ritual da circunstância, 
direito privilegiado ou exclusivo do sujeito que fala: temos aí o jogo de três tipos de interdições 
que se cruzam, se reforçam ou se compensam, formando uma grade complexa que não 
cessa de se modificar (FOUCAULT, 1987, p. 9, grifos nossos).
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
23
Vamos destrinchar essa citação. A começar pelo “não se tem o direito de 
dizer tudo” – há certa limitação, variando de cultura para cultura, daquilo que 
não se pode dizer (separação do certo e do errado) – sim, e a maioria de nós, 
portanto, procura escrever ou produzir dentro daquilo que é aceito socialmente, 
politicamente correto, mesmo que sequer acreditemos naquilo.
DICAS
Aqui encontramos mais uma discussão que pode ser levantada com nossos 
alunos: sentidos presentes nos textos (orais, escritos e não verbais) que promulgam e reforçam 
o socialmente aceito, aquilo que é almejado, o que recebe o status de “adequado” e “mais 
elevado” entre todas as possibilidades. Esses sentidos estão por todos os lados, convidando-
nos a ser, a adentrar, a encaixar, a ser como os modelos são, a ser como a forma é – para 
sermos aceitos, para sermos referência, para produzirmos o tão desejado “show do eu”.
Continuando a abordar o excerto de Foucault apresentado acima, “não 
se pode falar tudo em qualquer circunstância”. Os sujeitos ao se posicionarem, 
ao produzirem textos, ao falarem, ao escreverem, ao produzirem alguma peça de 
arte ou publicitária, enfim, analisam e passam suas produções pela peneira das 
circunstâncias – mesmo que de forma não consciente. Seja como for, esse é um 
aspecto que pode fazer parte de nossas provocações ao lermos com nossos alunos. 
Ler também é entender esses mecanismos que são postos em funcionamento.
Por fim, ainda sobre a citação, “qualquer um, enfim, não pode falar de 
qualquer coisa”. Nesse momento, é a posição sujeito assumida pelo autor. Qual é 
a posição assumida e o que se pode dizer a partir dela? É o exemplo dado acima 
do médico ou profissionais da saúde. Assim, ao ler um texto, para a análise dos 
sentidos, também é relevante analisar a posição assumida por quem diz, escreve 
ou produz determinado texto não verbal. Essa posição assumida também contribui 
para o entendimento do que se diz, como se diz e, algumas vezes, por que diz. 
Esses aspectos podem levar nossos leitores a outros patamares, a um nível mais 
proficiente de leitura.
Vamos entender pensando na prática!
1) O texto “Não se aproxime” é um texto que pode ter diferentes sentidos. 
“Não se aproxime” no portão de uma casa, pode gerar medo (mistério 
sobre algo que oferece perigo – animal, eletricidade, entre outros). O “não 
se aproxime” de uma mulher que chora ao brigar com o namorado tem 
outra conotação. O “não se aproxime” em uma propaganda – ao lado 
de uma mulher de vermelho, segurando um perfume, em uma posição 
sensual – provoca outros sentidos nos leitores. O “não se aproxime” ao 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
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lado de uma campanha social – acima de uma imagem com uma pessoa 
gripada – produz outro sentido. A frase “não se aproxime” dita por um 
médico durante uma cirurgia tem outra conotação. Assim por diante.
2) Podem ser dadas imagens, para que os alunos criem outros elementos 
(parte verbal), produzindo diferentes gêneros.
3) Podem ser entregues textos (poemas, cartas, bilhetes, músicas, carta do 
leitor, artigo de opinião, crônica, tirinha, carta de apresentação, diário, 
cartaz de uma campanha social, outdoors) e os alunos devem pensar nos 
elementos: quem produziu, para quem produziu, quais os objetivos, quais 
os sentimentos presentes, a quais leitores pode interessar e não interessar, 
entre outros.
4) Podem ser trabalhadas frases genéricas (abstratas) e ser solicitado que 
os alunos (com uso de imagens e diferentes gêneros textuais) produzam 
sentido àquela frase – dentro de contextos, gêneros, definindo quem diz, 
para quem diz e as circunstâncias. A seleção de imagens ajuda a definir 
e a fixar sentidos que estejam abstratos ou sejam genéricos. Exemplos de 
frases genéricas: “isto é para você”, “vim aqui para falar algo importante 
a você”, “quero dar a você uma boa notícia”, “há uma experiência única 
à sua espera”, “Um acontecimento chamou a atenção de uma cidade do 
interior de São Paulo”, “Aqui está a maior alegria da vida”. “Amiga, você 
é insubstituível”. Esses dizeres podem passar a fazer parte de gêneros 
da esfera jornalística, literária, publicitária, interpessoal (entre outros). 
Por vezes, a produção de materiais com os alunos contribui não só com 
a produção de gêneros. Essas atividades contribuem, inclusive, com 
a leitura sensível e aprofundada proposta neste livro. As habilidades 
solicitadas na produção solidificam habilidades úteis à leitura.
Portanto, retomando: direito de dizer, circunstância e posição assumida 
fazem parte de todo texto a que nos dispomos a ler. O termo “circunstância”, a 
partir de Orlandi, é chamado de “condições de produção” (ORLANDI, 2005). A 
partir da autora, as condições de produção interferem em aspectos como estilo e, 
também, em quais saberes (discurso) serão evocados por parte dos sujeitos.
É necessário assumir uma posição que tenha direito e credibilidade para 
falar de alguma coisa (objeto): como é o caso de o professor falar do desempenho 
do aluno; como é o caso do médico falando de seu paciente; como é o caso do 
psicólogo discorrendo sobre a personalidade do seu paciente; entre outras formas 
de poder falar sobre algo ou alguém. 
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
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Assumir um lugar não é lugar estável. Um professor ou uma professora 
não é sempre professor(a) quando deixa sua sala de aula (não veste o papel 
para sempre). Um médico não é sempre médico, quando está em momentos 
informais com amigos ou família. Um mesmo sujeito se alterna, muda, flui, 
de acordo com as condições de produção, intenções, posição assumida. A 
ilustração ao lado pretende demonstrar essa ideia de movimento e flexibilidade 
de um mesmo sujeito ao produzir textos (orais, escritos e não verbais).
FIGURA 13 - CURL-UP
FONTE: Disponível em: <http://www.mcescher.com/>. Acesso em: 18 maio 2017.
A posição não é única e nem mesmo é levada o tempo todo. Ela é assumida. 
Assim como uma mesma pessoa pode assumir variadas posições ao produzir 
textos. “Um único e mesmo indivíduo pode ocupar [...] diferentes posições e 
assumir o papel de diferentes sujeitos” (FOUCAULT, 2002, p. 107). Assim, ainda 
que possamos encontrar o currículo do autor x ou dados sobre ele, como idade e 
afins, ainda assim preciso verificar naquele texto qual é a posição por ele assumida, 
os jogos, as argumentações, as defesas, o que critica e o que defende. Assim poderei 
observar, com mais clareza, a posição ou posições por ele assumida(s). 
Observações sobre as posições assumidas
Posições são assumidas em todos os gêneros discursivos. Em uma 
notícia, o jeito com que uma história é narrada pode ser a visão do jornalista 
discretamente defendida. Um romance produz (por variados elementos) a 
visão do autor sobre cada personagem (ainda que não seja algo propriamente 
dito – é dito de outros modos, por meio das ações dos personagens ou, ainda, 
sobre a opinião de um personagem sobre outro). Um poeta, ainda que não 
sinta aquilo que o “eu lírico” está sentindo, assume uma posição frente àquilo 
que o poema aborda (a vida, algum fato, ou uma visão sobre uma pedra, como 
Drummond bem o fez). 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
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Um exemplo na literatura (poemas) é Fernando Pessoa e seus heterônimos 
e pseudônimos. Fernando é a mesma pessoa, contudo, por vezes, escrevia comoÁlvaro de Campos – intenso, pessimista, sem energia para a mudança, entre 
outros –, outras como Alberto Caeiro – adepto ao bucolismo, não pensar – e 
outras, ainda, como Ricardo Reis – carpe diem, viver o presente, contra emoções 
e sentimentos exagerados. Em cada uma, há uma posição diferente no mundo.
Assim, na produção de um mesmo jornalista, de um mesmo publicitário, de um 
mesmo blogueiro podem aparecer posições diferentes – ao produzir materiais 
sobre um mesmo assunto, inclusive. Ainda, pode não coincidir com a opinião 
que daria caso não estivesse na posição de jornalista, publicitário ou blogueiro 
– opinião essa que apenas vem à tona quando junto a parentes e/ou amigos 
íntimos. Assim, uma mesma pessoa pode assumir diferentes posições. 
Nas imagens, desenhos ou textos híbridos, os posicionamentos também 
podem ser analisados. Abaixo, exemplos de algumas obras de Pawel Kuczynski. 
Nelas – e em outras obras do autor – pode-se visualizar o posicionamento dele 
em relação aos livros e aos celulares.
FIGURA 14 – ISLANDS (ILHAS) FIGURA 15 – HARPA
FONTE: Disponível em: <https://www.picto-
rem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso 
em: 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <https://www.
pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. 
Acesso em: 18 maio 2017.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
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FIGURA 16 - DINNER FIGURA 17 - JOURNEY
FONTE: Disponível em: <https://www.picto-
rem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. Acesso 
em: 18 maio 2017.
FONTE: Disponível em: <https://www.
pictorem.com/profile/Pawel.Kuczynski>. 
Acesso em: 18 maio 2017.
As escolhas, as composições, os contextos aos quais celulares (ilhas, solidão, 
mesa de jantar, oração sobre o celular, roteador no centro da mesa, um jantar 
sem comida, cabeças inclinadas, ambiente ao fundo escurecido; fora a mesa, 
não haver outros objetos na composição; além do azul da tela, só há o branco 
e tons pastel) e livros (barco, vela, navegar, imaginação são associados, harpa, 
música, arte, papel ativo do leitor junto ao livro) não são aleatório s. Remetem 
às vivências, aos comportamentos e ao simbólico (livro/viagem/barco e celular/
comida/sagrado). Todos esses elementos contribuem para a produção da 
posição no texto – neste caso, em relação a dois assuntos. As posições precisam 
ser analisadas em um texto específico (seja ele verbal ou visual) – não um 
fato dado, uma opinião eterna do autor. As posições são assumidas ao serem 
produzidos os textos, as falas/oralidade, os desenhos, os documentários, os 
textos dissertativos argumentativos, assim por diante.
Conforme anunciado há algumas páginas, os dois conceitos baseados 
em Foucault que seriam abordados eram o de discurso e de poder. Durante 
muito tempo e em algumas teorias, o poder foi compreendido de uma forma 
bipartidarizada: (1) os que têm e (2) os que não têm. A partir de Foucault – e outros 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
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Na Unidade 3 veremos exemplos de imagens presentes em livros didáticos – o 
que nos possibilita compreender a relevância de sermos nós sensíveis ao que chega à escola 
(pronto a ser aplicado e utilizado). Para contribuirmos com o senso crítico, precisamos antes 
dominar conceitos específicos para a análise de materiais diversos (em nossa vida diária e no 
exercício da docência). Há imagens que reforçam verdades aceitas, reforçando-as. Voltemos à 
discussão teórica.
NOTA
O poder também é considerado em rede, uma vez que ele é exercido em 
relação a algo ou alguém num dado momento – não somos professores 24 horas; 
somos docentes no exercício da docência; depois disso somos filhos, pais, amigos, 
jogadores de vôlei, cozinheiros; são variadas as posições assumidas em um dia ou ao 
longo de nossa vida. Não há um só papel fixo para uma pessoa. Esta também, de um 
jeito ou de outro, acaba por regular a si e/ou submeter-se ao poder. “Ao mesmo tempo 
se submetem ao poder, são capazes de exercê-lo. E se os indivíduos são capazes de 
exercer o poder é porque o poder os atravessa” (VEIGA-NETO, 2006, p. 24). Exemplo: 
o profissional x que atualmente escreve em uma revista conceituada já teve que se 
submeter a uma instituição que o formou e deu a ele um diploma, uma certificação.
Da mesma forma, os sujeitos seguem se adequando à emissora para a qual 
trabalhem, ao partido ao qual sejam filiados, à revista para a qual escrevam, entre 
autores que se colocaram nessa esteira teórica – o poder passou a ser visto muito 
mais como rede e, também, como posições a serem assumidas. Assim, o docente 
que assume uma posição de poder em relação à turma também está em uma 
posição de responsabilidade em relação a instâncias superiores ou instituições. 
Ou seja, ele também está sendo acompanhado por outros (pessoas, instituições, 
questões burocráticas) que estão acima dele.
No texto, também, esse poder é assumido. Todo ato de escrita (ou, claro, 
a produção de alguma obra de arte – texto não verbal) é um ato de assumir uma 
posição, marcar posição no mundo, participar, firmar uma visão, externar uma 
crença, utilizar um espaço de ação e, quiçá, crítica do mundo. Assim, pode-se 
compreender que assumir um lugar é assumir um local de poder, é firmar-se no 
mundo e em relação aos outros, é exercer influência, é sair do silêncio. Sair do 
silêncio já é posicionar-se e posicionar-se já é assumir um lugar em relação ao outro. 
Quando alguém se apropria de um discurso, há também o poder atrelado a 
ele. Ocorre “uma apropriação do discurso com seus poderes e saberes” (FOUCAULT, 
1987, p. 44-45). Assim sendo, em vários textos que leremos em sala, existe a 
possibilidade de analisarmos esse poder assumido: o de alguém que se posiciona e 
revela um poder de dizer algo sobre alguém ou alguma coisa – seja numa posição 
de crítica ou de manutenção das verdades aceitas, defendendo-as e reforçando-as.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
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Caso o leitor desse livro aprecie mergulhos filosóficos, sugere-se a busca pelos 
conceitos de público e privado na visão de Kant. Mais especificamente, no texto “O que é o 
esclarecimento?” A esfera privada e a pública exercem influências sobre nós, ainda que de 
formas diferentes.
NOTA
outros. A visão de mundo e dos acontecimentos da Veja é completamente diferente 
da Carta Capital – as pessoas que produzirem textos para uma ou outra revista, 
portanto, irão ao encontro do conselho editorial da revista e dos mantenedores. 
O mesmo acontece em cargos que ocupem em instituições – sem contar que, por 
vezes, essas instituições se submetem a seus clientes. O mesmo acontece no uso da 
linguagem (oral, escrita e visual). 
Analisar um texto é entender que, ao mesmo tempo em que se assume uma 
posição, há uma escolha que tanto reflete um exercício de liberdade e, ao mesmo 
tempo, há também regulações que caem sobre aquele que produz textos ou obras 
– alguns mecanismos sutis, outros mais visíveis. Entender esses processos também 
faz parte da leitura dos textos que circulam na contemporaneidade. Eles também 
fazem parte da rede de saber-poder.
4 CONCEITOS-CHAVE PARA TRABALHAR O TEXTO
As licenciaturas devem fazer esse movimento de estudar áreas variadas 
e correntes teóricas – assim como fizemos até aqui, emprestando conceitos da 
filosofia, sociologia e da análise do discurso. Afinal, nosso objeto de trabalho é 
o conhecimento e nosso maior interesse é formar pessoas da melhor forma que 
formos capazes. Para isso, a nossa formação deve ser um processo de construção 
do senso de responsabilidade e da ampliação da visão sobre a relevância do nosso 
trabalho. Esse eterno movimento de ir além, de não parar, de estudar mais, de 
analisar, de selecionar outros materiais com os quais ainda não trabalhamos – esse 
movimento que é próprio do mundo em que vivemos e não há como vivermos em 
uma caixinha, isolados de todo o mais.
Outro autor que nos é caro nos estudos da linguagem e dos textos que 
circulam em sociedade – pelos mais variados meios – é Bakhtin. Tal autor, assim 
como sua própria teoria apregoa, não produziu sozinho. Junto a ele, houveuma 
multiplicidade de vozes que formou o que hoje chamamos de Círculo de Bakhtin. Tal 
pluralidade já pode ser observada na própria constituição do círculo. Os membros 
são de variadas partes da Rússia: Nevel, Vilnius, São Pertersburgo, Vitebsk e 
Orel. Além do fato de que esses exerceram múltiplas atividades profissionais – 
jornalistas, filósofos, historiadores, filólogos, musicistas, poetas, professores (de 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
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filosofia, história, literatura) e escultores (SZUNDY, 2014). Essa multiplicidade 
possibilitou a vivência do pluralismo linguístico e cultural que verteu na teoria.
Esse autor, em seu círculo de estudos, trouxe importantes contribuições 
à forma de ver a circulação de materiais em nossa sociedade e, assim sendo, 
poderemos ter práticas pedagógicas mais significativas. Vamos a alguns conceitos 
que nos ajudarão a entender os processos de leitura e escrita no mundo atual.
Um dos conceitos que está na base da construção teórica é heterogeneidade. 
Esse conceito vai ao encontro daquele visto anteriormente (discurso). A partir da 
noção de heterogeneidade, pode ser percebido que aquilo que circula, as verdades, os 
enunciados, as afirmações, os textos não são desconexos. Não existe enunciado único, 
que nasça totalmente novo, sem elos com toda uma rede de significação construída 
nas/a partir das relações humanas e a história. Como dito anteriormente, as teorias 
acabam por se entrecruzar, explicando aspectos semelhantes de formas diferentes.
Neste momento, não se torna tão relevante entrarmos em aspectos da teoria 
bakhtiniana – que é vasta e complexa. Trata-se de selecionar elementos essenciais que abordem 
o mundo atual – claro, para procurar visualizar os processos de produção de sentidos, de 
circulação de textos e, a partir disso, para melhor fundamentarmos e organizarmos nossas 
aulas. Reforçando: a partir disso, o docente pode se tornar mais autônomo. A riqueza de 
conhecer o mundo vai elevar o trabalho pedagógico a novos patamares.
NOTA
FIGURA 18 - LITHOGRAPH
FONTE: Disponível em: <http://www.mcescher.com/gallery/back-in-holland/
predestination/>. Disponível em: 10 maio 2017.
TÓPICO 1 | LER NO MUNDO CONTEMPORÂNEO
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Um exemplo ajuda a compreender melhor essa visibilidade. Algum tempo atrás, você 
tinha uma ideia e a divulgava em alguma roda de conversa, recebia aprovação ou reprovação dos 
outros “filósofos” (amigos ou familiares) que a ouviam. Muitos dos ouvintes sequer precisavam opinar 
ou demonstrar contentamento ou desgosto. Às vezes, aquela ideia se propagava e acabava virando 
uma gíria ou algum jargão; caso tivessem gostado da sua ideia ou opinião, aquilo era passado adiante, 
formando opiniões de outras e outras pessoas. Atualmente, é possível inclusive medir quanto que 
o pensamento recebeu aprovação ou reprovação. Hoje existem ferramentas como twitter ou 
facebook. A medida dessas aprovações são as vezes que a mensagem é “replicada”, compartilhada 
ou curtida. Ou, ainda, a mensagem pode receber um bombardeamento de “dislikes” (para traduzir, 
podemos fazer uso de um neologismo: “descurtidas”), em se tratando de vídeos do YouTube. Hoje, 
essas redes estão mais visíveis. Ganham visibilidade por meio dessas ferramentas de interação.
NOTA
Se enunciados se colocam em redes, o que é um enunciado para Bakhtin? 
As pessoas não falam, escrevem ou externam por gestos ou arte, apenas palavras 
ou frases. Elas externam enunciados. O enunciado precisa ser analisado dentro do 
contexto. “Cada enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de 
outros enunciados” (BAKHTIN, 2003, p. 272).
Detalhe: Bakhtin chegou a essa compreensão – junto a outros intelectuais 
– em sua época. Atualmente, vivemos em um mundo globalizado, em redes (de 
internet, de TVs a cabo repletas de canais internacionais, redes sociais constantemente 
aparecendo e sendo substituídas, sites de bate-papo – incluindo entre países, para 
praticar idiomas). Redes antes sutis, discretas. Hoje muito mais visíveis e palpáveis.
Em tempo: por esses meios, ferramentas e redes passam, circulam os 
enunciados. Estes agrupados, organizados em gêneros. Esses gêneros circulam em 
sociedade pela TV, pela internet, livros, revistas, jornais, aplicativos de celular, sites 
de bate-papo, entre inúmeras possibilidades. Assim, como estudantes de linguagem, 
devemos ter ciência de que esses gêneros circulam e são carregados de enunciados, 
sentidos – que devem ser analisados dentro do contexto.
Aqui chegamos a outro conceito-chave para o ensino de leitura e escrita na 
contemporaneidade: gêneros do discurso. Nas palavras do autor, gêneros são “tipos 
relativamente estáveis de enunciados” (BAKHTIN, 2003, p. 261-262). Importante é a 
palavra “relativamente”, afinal, a partir do estilo do autor, da circunstância, dos objetivos, 
das intenções, dos jogos de poder, das ferramentas linguísticas de que cada um dispõe, 
esse gênero é plástico e flexível – além de muitos serem híbridos (misturam-se). 
Antes dos estudos bakhtinianos, no Brasil, a nomenclatura utilizada era 
somente a de “tipologia textual”, ou seja, interessava saber qual o tipo do texto: 
narração, descrição, dissertação. A partir disso, procurava-se verificar qual a tipologia 
do texto. Esses termos ainda são usados, mas com uma percepção diferente: dentro 
de um mesmo gênero pode haver uma ou mais tipologias. Exemplo: quando o autor 
descreve o contexto de um homicídio, ele faz uma descrição. Contudo, não deixa 
de continuar a ser uma narração (do fato). Assim como em textos cujo objetivo 
primordial seja dissertar, pode haver a descrição ou quiçá a narração. 
UNIDADE 1 | LEITURA E SOCIEDADE LÍQUIDA
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Voltemos aos gêneros. Bakhtin (2003) descreveu gêneros em duas categorias: 
os primários e os secundários. Os primários são aqueles que vão chegando a nós 
no convívio social desde a infância – no contato, vão sendo “apreendidos” e por 
nós incorporados em nossas práticas. Esses são ainda aqueles espontâneos, menos 
ensaiados – aqueles da linguagem cotidiana, de comunicação verbal espontânea, 
caracterizados, muitas vezes, pela oralidade. Exemplos desses gêneros são: 
recados, conversações espontâneas, fofocas, piadas, entre outros. São os gêneros 
apreendidos, absorvidos pelo convívio. Os secundários são aqueles mais complexos, 
que necessitam de intervenção – esses precisam ser aprendidos. Os secundários 
absorvem os primários, indo além, intensificando os protocolos, os elementos que 
os compõem, o vocabulário, as construções frasais e as formatações. Exemplos são 
os textos escritos ou orais que começam a seguir certos protocolos; dos mais simples 
(cartas pessoais, telefonemas, apresentação pessoal) aos mais complexos (carta de 
apresentação, currículo, artigo de opinião, artigo científico, entre outros).
Se gêneros são relativamente estáveis, pode-se imaginar que eles tenham 
nomes, certo? Que todo gênero do discurso possa receber um nome para identificá-
lo, correto? Vale dizer que o círculo de Bakhtin não se debruçou tanto nesse sentido. 
Esse trabalho foi sendo feito pelos que se colocaram na esteira teórica de Bakhtin 
– inclusive autores brasileiros.
Além disso, muito se caminhou na discussão sobre esferas – outro conceito 
que surgiu a partir dos estudos do círculo de Bakhtin. Os textos científicos/acadêmicos 
circulam, prioritariamente, na esfera acadêmica. Os textos jornalísticos, por sua vez, 
na esfera jornalística. Os artísticos, na esfera artística. A escolha do gênero, portanto, 
não é aleatória. Ela é feita a partir das condições reais e sociais da enunciação (esfera). 
Em alguns momentos, gêneros próprios de uma esfera podem passear por outra (os 
religiosos, por exemplo, podem circular na esfera acadêmica com alguma finalidade 
específica, como realizar alguma análise em alguma pesquisa em andamento; 
alguns gêneros literários podem ser inseridos em alguma abertura de capítulo de 
algum gênero acadêmico, como uma dissertação, por exemplo). Assim sendo, essas 
migrações são raras,

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