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Universidade Estácio de Sá – Campus Norte Shopping Biomedicina – Genética Forense (2020/1) Prof. Marcelo A. S. Baptista ESTUDO DE CASO (AV1) 1) Um crime bárbaro aconteceu em Porto Alegre, RS, onde uma menina de 8 anos foi morta por fratura da coluna cervical e estuprada. Dois suspeitos foram presos e confessaram ter participado do crime. Existiam dúvidas de quem teria estuprado a menor e, para o esclarecimento do caso criminal, foram coletadas amostras de esfregaço bucal da vítima, esfregaço vaginal da vítima, além de sangue dos suspeitos. As amostras coletadas foram submetidas à extração de DNA e, especificamente, para a amostra vaginal foi feita uma extração diferencial de DNA, separando as frações feminina e masculina. Após a extração do DNA, uma amplificação por PCR foi realizada usando um kit multiplex com 10 loci de STR mais amelogenina. Os resultados obtidos foram compilados na Tabela 1. Tabela 1. Perfis genéticos de 10 loci de STR mais amelogenina obtidos de amostras questionadas e referências visando identificação criminal em caso de estupro. Locus Esfregaço bucal (vítima) Esfregaço vaginal (fração feminina) Esfregaço vaginal (fração masculina) Sangue (suspeito 1) Sangue (suspeito 2) D1S1656 5, 7 4, 5, 7 4, 5 4, 5 5, 11 D7S1517 9, 12 6, 7, 9, 12 6, 7 6, 7 9, 10 D20S156 10, 15 10, 15 14, 16 14, 16 17, 17 D8S369 ND ND 28, 33.1 28, 33.1 27, 28 D3S1545 4, 7 4, 5, 6, 7 5, 6 5, 6 5, 6 D12S391 ND ND 17, 18 17, 18 19, 20 THO1 6, 8 6, 8 6, 9.3 6, 9.3 6, 9.3 FES ND ND 11, 12 11, 12 11, 12 VWA31 17, 17 14, 16, 17 14, 16 14, 16 14, 15 CD4 5, 10 5, 6, 10 5, 6 5, 6 5, 6 Amelogenina XX XY XY XY XY ND, não determinado. (A) Qual o objetivo investigativo ao se realizar extração de DNA diferencial a partir de esfregaço vaginal da vítima? O processo foi bem sucedido? Explique. (1,0 ponto) A extração diferencial de DNA foi realizada com o propósito de separar e isolar o DNA da fração espermática (masculina) misturada à fração epitelial (feminina) da vítima e, com isso, obter o perfil genético exclusivamente masculino a partir do esfregaço vaginal da vítima, simplificando a comparação entre amostra questionada e amostra referência e a interpretação do resultado. A fração espermática (masculina) foi completamente isolada, obtendo-se somente o perfil genético masculino, enquanto, a partir da fração epitelial, evidenciou-se um perfil característico de mistura de amostras biológicas, com três ou quatro alelos em alguns loci analisados. Como a fração epitelial pode conter tanto o DNA feminino quanto eventualmente o masculino (por contaminação com células epiteliais masculinas), não foi possível isolar a fração epitelial da vítima nessa preparação, sem, contudo, comprometer a análise do caso. (B) Identifique a(s) amostra(s) questionada(s) e a(s) amostra(s) referência(s) analisadas. (1,0 ponto) Amostra questionada = esfregaço vaginal da vítima; Amostra referência = esfregaço bucal da vítima e sangue dos suspeitos. (C) A comparação direta dos perfis genéticos obtidos a partir das amostras analisadas juntamente com a informação do banco de dados de frequências alélicas da população referencial possibilitou a seguinte interpretação estatística referente ao Suspeito 1: É aproximadamente 1.000.000.000.000 (um trilhão) de vezes mais provável que encontremos o perfil genético observado se considerarmos que a amostra questionada é proveniente do doador da amostra referência do que se considerarmos que é proveniente de outra pessoa qualquer da população./=== A expressão verbal acima visa quantificar a força da evidência genética (identidade entre o perfil genético da amostra questionada e o da amostra referência) estimando a razão de probabilidades (ou índice de coincidência cumulativo) da evidência genética sob duas hipóteses alternativas mutuamente exclusivas. Quais são essas hipóteses? H0: a amostra questionada é proveniente do doador da amostra referência; H1: a amostra questionada é proveniente de outra pessoa qualquer da população. Qual hipótese deve ser aceita? H0. A que conclusão se chega? Responda em linguagem técnica pericial. (2,0 pontos) Com base na análise dos sistemas genéticos independentes, está evidenciada a condição de identidade entre o doador da amostra referência 1 e a amostra questionada. (D) Qual a interpretação do resultado referente ao Suspeito 2? O perfil genético da amostra referência 2 não apresentou coincidência com o perfil da amostra questionada em 06 dos 10 loci genéticos estudados, estabelecendo assim a condição de não contribuidor. E a conclusão? Responda em linguagem técnica pericial. (1,0 ponto) Com base na análise dos sistemas genéticos independentes, fica estabelecida a condição de não contribuidor (não coincidência) entre o doador da amostra referência 2 e a amostra questionada. NOTA TÉCNICA Extração Diferencial de DNA A extração diferencial de DNA é uma técnica de extração modificada que permite a lise seletiva e o isolamento do DNA de uma mistura de espermatozoides e células epiteliais (Figura 1). Amostras forenses, como as coletadas em casos de violência sexual, podem conter espermatozoides (evidência) misturados com células epiteliais vaginais e/ou retais (referência). Técnicas de extração diferencial permitem o isolamento físico seletivo da fração masculina da amostra forense antes da obtenção do perfil genético. Durante a extração diferencial, as células epiteliais são primeiro seletivamente lisadas através da adição de dodecilsulfato de sódio (SDS) e proteinase K. Os espermatozoides são geralmente resistentes à lise por esses produtos químicos. Uma vez que as células epiteliais tenham sido lisadas, a centrifugação é usada para sedimentar seletivamente quaisquer espermatozoides intactos. O sobrenadante contendo o DNA das células epiteliais pode então ser removido para um tubo separado. Os espermatozoides isolados são então lisados pela adição de SDS, proteinase K e ditiotreitol (DTT) (Figura 1). O DTT é um forte agente redutor que desestabiliza as pontes dissulfeto de proteínas presentes nas membranas nucleares do espermatozoide, liberando o DNA das células espermáticas. O DNA na fração epitelial e na fração espermática pode então ser extraído separadamente por métodos orgânicos ou não orgânicos. O método de extração diferencial pode simplificar a interpretação dos resultados do perfil genético em casos de crime sexual, aumentando a probabilidade de obter perfil de DNA exclusivamente masculino isolado da fração espermática (Figura 2). Como a fração epitelial pode conter tanto o DNA feminino quanto eventualmente o masculino (por contaminação com células epiteliais masculinas), um perfil característico de mistura de amostras biológicas, com três ou mais alelos, é passível de ser obtido, a partir da fração não espermática. Figura 1. Fluxograma de extração diferencial de DNA. Comumente empregada para o processamento de evidências de violência sexual, as células epiteliais são primeiramente lisadas, deixando espermatozoides intactos, que são facilmente sedimentados por centrifugação. A remoção do lisado de células epiteliais para um tubo separado deixa um sedimento enriquecido de espermatozoides. A desnaturação subsequente das ligações dissulfeto de proteínas da membrana nuclear espermática pelo agente redutor DTT facilita a lise dos espermatozoides para a extração do DNA. SDS e Proteinase K Incubar e Centrifugar Transferir Sobrenadante Lisado da Fração Epitelial Ressuspender Sedimento Espermático Lisado da Fração Espermática SDS, Proteinase K e DTT Lisado da Fração Epitelial DNA Epitelial DNA Espermático Isolar/Purificar DNA por Extração Orgânica ou Fase Sólida Isolar/Purificar DNA por Extração Orgânica ou Fase Sólida DTT Figura 2. Representação esquemática ilustrando os resultados das quatro amostras tipicamente associadas aum caso de violência sexual. Durante a extração diferencial de DNA, a amostra questionada é dividida em duas frações: (a) fração não-espermática ou epitelial e (b) fração espermática. O perfil genético do suspeito (d) é comparado com a fração espermática (b) para averiguar possível identidade. O perfil genético da vítima (c) fornece confirmação da identidade da amostra referência com a fração não- espermática (a). Amostra Questionada (Q) Amostra Referência (R) Fração Epitelial Fração Espermática Vítima Suspeito Extração Diferencial Universidade Estácio de Sá – Campus Norte Shopping Biomedicina – Genética Forense (2020/1) Prof. Marcelo A. S. Baptista QUESTÕES DISCURSIVAS (AV1) 1) A partir do caso criminal a seguir, foi realizada a análise genética das amostras biológicas visando a identificação criminal, após o que foi produzido o respectivo laudo pericial de exame de DNA, cujas partes relevantes foram transcritas (com adaptações) abaixo. Analise o caso e responda o que se pede. Resumo: Suposto caso de violência sexual com morte da vítima. Foi comparada amostra de sangue do suspeito com esfregaço vaginal e amostra subungueal da vítima. Objetivo pericial: Determinar se os perfis genéticos das amostras questionadas coincidem com o perfil do doador da amostra referência. Extração de DNA: as amostras referência e questionadas foram submetidas à extração de DNA. Obtenção do perfil genético: As amostras de DNA foram submetidas à amplificação pelo método da PCR com emprego do sistema de identificação humana PowerPlex® 16 System (Promega) para análise de 15 (quinze) regiões de STR autossômico mais o marcador de sexo (amelogenina). Resultados obtidos: Local genético Amostra sanguínea Amostra vaginal Amostra subungueal D3S1358 16, 18 15, 16 15, 16, 18 THO1 9.3, 9.3 7, 9 7, 9, 9.3 D21S11 29, 31.2 30, 34 29, 30, 34 D18S51 13, 13 12, 15 12, 15, 16, 17 Penta E 10, 11 7, 17 7, 11, 17 D5S818 11, 13 12, 12 12, 12 D13S317 11, 12 11, 14 9, 11, 14 D7S820 10, 11 11, 12 8, 9, 11, 12 D16S539 11, 12 12, 12 11, 12 CSF1PO 10, 12 11, 12 10, 11, 12 Penta D 9, 12 12, 13 8, 10, 12, 13 vWA 15, 17 15, 18 15, 17, 18 D8S1179 11, 14 14, 14 14, 14 TPOX 9, 11 8, 9 8, 9, 12 FGA 20, 24 20, 23 20, 22, 23 AMEL XY XX XY Análise e Interpretação dos Resultados: 1. O perfil alélico obtido da amostra vaginal é compatível com perfil originário de um indivíduo do sexo feminino. 2. O perfil genético obtido da amostra ungueal demonstra a mistura de pelo menos 02 perfis alélicos sendo que em todos os locais estudados observou-se coincidência (identidade) com o perfil alélico da amostra vaginal. 3. O perfil genético da amostra sanguínea não apresentou coincidência com o perfil da amostra ungueal em 12 dos 15 locais genéticos estudados, estabelecendo assim a condição de não contribuidor. Conclusão: Com base na análise comparativa entre a amostra sanguínea e as amostras vaginal e ungueal, fica estabelecida a condição de não contribuidor (não coincidência) entre os perfis alélicos de STR autossômicos obtidos a partir destes materiais. (A) Identifique a(s) amostra(s) questionada(s) e a(s) amostra(s) referência(s) analisadas. Justifique a resposta. (1,0 ponto) Amostra questionada = esfregaço vaginal e amostra subungueal da vítima; O esfregaço vaginal e a amostra subungueal foram coletados com o propósito de identificar eventual material biológico do agressor (sêmen e tecido epitelial) de origem desconhecida. Amostra referência = sangue do suspeito. A amostra de sangue do suspeito, cuja a origem é conhecida, foi coletada para fins comparativos na análise de identificação individual. (B) Que evidências observadas no perfil genético obtido da amostra ungueal demonstram a mistura da materiais biológicos de indivíduos diferentes? (1,0 ponto) A amostra ungueal demonstra a mistura de material biológico de pelo menos dois indivíduos, devido às seguintes observações: perfis com três ou quatro alelos em 12 dos 15 loci analisados, e perfil heterozigoto (masculino) no locus da amelogenina obtido a partir de amostra coletada de indivíduo do sexo feminino (vítima) e contendo material genético da vítima. (C) Por que os marcadores genéticos de STR são úteis para discriminação de misturas de amostras biológicas? (1,0 ponto) O fato de os marcadores de genéticos de STR serem altamente polimórficos possibilita a detecção e discriminação de misturas de materiais biológicos pela identificação alélica dos contribuidores individuais. 2) Observe os perfis de três marcadores de STR mostrados em forma de eletroferograma (abaixo). Com base nessas informações, responda o que se pede: (A) Para a identificação inequívoca dos alelos dos três loci analisados é necessária a marcação diferencial com corantes fluorescentes? Por quê? (1,0 ponto) Não. Porque os alelos conhecidos dos três loci analisados se distribuem em faixas de tamanho não sobrepostas. (B) Calcule a probabilidade de ocorrência deste perfil genotípico na população caucasiana norte-americana. (1,0 ponto) Consultando a tabela de frequências alélicas para os loci D13S317, D7S820 e D16S539, temos que: D13 f(10,11) = 2pq = 2(0,077)(0,229) = 0,035 D7 f(8,10) = 2pq = 2(0,099)(0,283) = 0,056 D16 f(9,12) = 2pq = 2(0,101)(0,268) = 0,054 Daí, segue que RMP = fD13 . fD7 . fD16 = (0,035) . (0,056) . (0,054) = 0,0001058 ≈ 1,1 . 10-4 Fazendo o inverso desse número, temos cerca de 1 em 9.000. Legenda: N, número de alelos observados em perfis homozigotos e heterozigotos genotipados na amostra populacional caucasiana norte-americana. Homozigotos Heterozigotos Total Homozigotos Heterozigotos Total Homozigotos Heterozigotos Total Alelo Frequência N Alelo Frequência N Alelo Frequência N Total Total Total
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