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Daniela Carvalho CIRROSE HEPÁTICA DEFINIÇÃO • Estágio final de qualquer doença hepática crônica, caracterizado por fibrose e pela conversão do parênquima normal em nódulos estruturalmente anormais. O processo envolve o fígado de uma maneira geral e é essencialmente irreversível. • Pode ser classificada em compensada e descompensada: o Cirrose descompensada → presença de ascite, sangramento/ hemorragia varicosa, encefalopatia hepática ou icterícia. EPIDEMIOLOGIA • Prevalência mundial estimada é em média de 100 (com variação de 25 a 400) por 100 mil pessoas, mais varia amplamente entre os países e diferentes regiões. • É uma causa importante de morbidade e mortalidade. • OMS: cerca de 800 mil pessoas morrem anualmente em decorrência da cirrose. Daniela Carvalho FISIOPATOLGIA • Fibrose hepática/ cirrose: o Ativação das células estreladas hepáticas em resposta a alguma lesão (resultado da perda de seus depósitos de vitamina A) → proliferação, desenvolvimento de retículo endoplasmático granular proeminente e secreção de matriz extracelular (colágeno tipo 1 e 3, proteoglicanos sulfatados e glicoproteínas); também e transformam em miofibroblastos hepáticos contráteis. o A deposição do colágeno do espaço de Disse leva à “defenestração” das células endoteliais sinusoidais → alteração nas trocas entre o plasma e os hepatócitos. • Complicações da cirrose: o Hipertensão portal e estado circulatório hiperdinâmico ▪ Resulta do aumento da resistência do fluxo portal e da elevação do influxo venoso portal. A HP é decorrente do aumento da resistência vascular intrahepática ao fluxo portal, devido a distorção da arquitetura hepática (componente mecânico) e aumento do tônus hepático (componente dinâmico). Uma vez instalada, a HP influencia os leitos vasculares extra-hepáticos tanto na circulação sistêmica como na circulação esplâncnica, levando, respectivamente, à formação de vasos colaterais (angiogênese ou abertura de vasos previamente fechados) e vasodilatação arterial. Aumento da produção de vasodilatadores como óxido nítrico, prostaciclina, glucagon, dentre outros, associado à resposta anômala aos vasoconstritores e angiogênese decorrentes da HP levam à vasodilatação arterial esplâncnica, que por sua vezl eva à diminuição do volume sanguíneo efetivo e hipotensão. Como consequência, há ativação de fatores neuro-humorais, retenção de sódio e água, hipervolemia e aumento do débito cardíaco. Esse processo ajuda a aumentar o fluxo sanguíneo na veia porta (“retroalimentação”), agravando a HP. Com o agravamento da mesma, são ativados outros mecanismos vasoconstritores como hormônio antidiurético, as alterações hemodinâmicas também se agravam e outras complicações também se desenvolvem como hiponatremia, síndrome hepatorrenal, etc. o Varizes e Hemorragia varicosa ▪ Complicação derivada da HP Daniela Carvalho Hemorragia digestiva alta (HDA) é o segundo evento mais comum de desconpesação dos pacientes com cirrose, sendo a principal etiologia varizes gastroesofágicas (VGE), com altas taxas de morbimortalidade. o Ascite e Síndrome Hepatorrenal ▪ A ascite é secundária a hipertensão sinusoidal e à retenção de sódio. ▪ Com a progressão da cirrose e a HP, a vasodilatação é mais pronunciada (que ocorre devido a um aumento na produção de NO) e, assim, há ativação adicional do SNS e do SRAA que resulta na retenção adicional de Na (ascite refratária), retenção de água (hiponatremia) e vasoconstrição renal (síndrome Hepatorrenal). A principal teoria da formação de ascite é a vasodilatação arterial periférica, levando à retenção de sódio e água, devido à ativação do sistema renina angiotensina aldosterona (RAA) e sistema nervos simpático. Além disso, na cirrose há diminuição síntese albumina e redução da pressão oncótica vasos esplâncnicos, levando à extravasamento do fluido para a cavidade peritoneal – ascite. Em outras palavras, na síndrome de hipertensão portal decorrente de cirrose há alteração da permeabilidade intestinal (pressão capilar), facilitando o acúmulo de líquido na cavidade abdominal. Além disso, a capacidade de reabsorção líquido ascítico é um processo autolimitado e na cirrose essa capacidade é ultrapassada. o Peritonite Bacteriana espontânea ▪ É uma infecção do fluido ascítico, ocorre na ausência de perfuração de um órgão oco ou um foco inflamatório intra-abdominal. O principal mecanismo envolvido é a translocação bacteriana, migração de bactérias do intestino para o linfonodos mesentéricos e outros locais extra intestinais. Ela ocorre em pacientes com mecanismos de defesa reduzidos para ascite, como o baixo nível de complemento no líquido ascítico. o Encefalopatia hepática ▪ Na cirrose a amônia acumula – se na circulação sistêmica por causa do desvio de sangue realizado pelos colaterais portossistêmicos e do metabolismo hepático diminuído (p. ex. insuficiência hepática). A grande quantidade de amônia no cérebro danifica as células cerebrais de suporte ou astrócitos e desencadeia alterações estruturais. o Icterícia ▪ Reflexo da incapacidade do fígado de excretar bilirrubina e consequentemente resulta da insuficiência hepática. o Complicações cardiopulmonares ▪ O estado circulatório hiperdinâmico eventualmente resulta na IC de alto débito com utilização periférica de oxigênio diminuída (cardiomiopatia cirrótica). ▪ A vasodilatação no nível da circulação pulmonar desencadeia hipoxemia arterial (síndrome hepatopulmonar). ▪ Exposição do leito pulmonar às substâncias vasoconstritoras que podem ser produzidas na circulação esplâncnica e passar pelo metabolismo hepático (hipertensão porto pulmonar). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • História natural: fase inicial (cirrose compensada) -> fase progressiva rápida marcada pelo desenvolvimento de complicações da hipertensão portal ou disfunção hepática (ou ambas) (cirrose descompensada). Daniela Carvalho • Cirrose compensada: o Assintomático em muito dos casos. o Fadiga inespecífica, libido diminuída ou distúrbios do sono podem ser as únicas queixas. o Pode estar presente varizes esofágicas não hemorrágicas. • Cirrose descompensada: o Ascite o Varizes hemorrágicas o Icterícia o Encefalopatia hepática o Combinação de achados o Síndrome Hepatorrenal o Peritonite bacteriana espontânea ▪ As manifestações clínicas mais comuns são febre, icterícia e dor abdominal. o Encefalopatia hepática ▪ Estágio 1: alterações na consciência com variação comportamental de inversão do padrão de sono/vigília e transtornos de memória. ▪ Estágio 2: confusão, comportamento bizarro e desorientação. ▪ Estágio 3: letargia e desorientação profunda ▪ Estágio 4: coma ▪ Asterixe e fetor hepaticus também podem estar presentes. o Complicações pulmonares ▪ Dispneia de esforços ▪ Pode levar a baqueteamento digital, cianose e “aranhas” vasculares. DIAGNÓSTICO • Padrão ouro -> biópsia hepática o Em pacientes com sinais e sintomas de doença hepática crônica, a presença de cirrose pode, muitas vezes, ser confirmada com exames por imagem não invasivos, sem necessidade de biópsia hepática. • Exame físico Daniela Carvalho o Atrofia muscular (regiões musculares bitemporais e eminências tenar e hipotenar) o Angiomas aracnoideos (troco, face e MMS) o Eritema palmar o Homens ▪ Perda de cabelo no peito e abdome, ginecomastia e atrofia testicular o Petéquias e equimoses ▪ Resultado da trombocitopenia e do TP prolongado) o Contratura de Dupuytren ▪ Cirrose alcoólica o Lobo hepático direito menor à palpação e de consistência mais densa o Esplenomegalia ▪ Hipertensão portal o Circulação colateral na parede abdominal • Testes laboratoriais o ALT e AST ▪ Podem estar elevadas com a atividade da doença o FA e GGT ▪ Geralmente estão normais, a não ser que haja obstrução biliar o Bilirrubinas ▪ Normais, maspode se elevar com a progressão da doença o TP ▪ Pode estar alargado com a progressão para insuficiência hepática o Globulina ▪ Geralmente estão aumentadas o Albumina ▪ Encontra-se reduzida na insuficiência hepática ou desnutrição o Hemograma ▪ Pode apresentar anemia, leucopenia, trombocitopenia ou pancitopenia; plaquetopenia. • Exames por imagem o TC; US; RNM o Contorno hepático nodular, fígado diminuído com ou sem hipertrofia do lobo caudado/ esquerdo, esplenomegalia, vasos colaterais intra-abdominais indicativos de HP. • Medição da pressão portal o Cateterização da veia hepática com a medição da pressão encunhada e livre -> método mais simples, seguro, reprodutível e amplamente utilizado para medir indiretamente a pressão portal. Daniela Carvalho TRATAMENTO • Visa a interrupção ou reversão da fibrose, no entanto fármacos antifibróticos não mostraram reverter a fibrose consistentemente ou melhorar resultados em pacientes cirróticos. Atualmente, o tratamento da cirrose compensada está direcionado para prevenção do desenvolvimento da descompensação por: o Tratar a doença hepática subjacente para reduzir a fibrose o Evitar fatores que possam piorar a doença o Rastreamento para detectar varizes e carcinoma hepatocelular • O tratamento da cirrose descompensada está direcionada para os eventos de descompensação. • Varizes o Pode-se fazer uso de Betabloqueadores que atuam reduzindo a pressão portal e, por isso, diminuem o risco de desenvolvimento de varizes, hemorragia varicosa e ascite. A profilaxia primária com betabloqueadores não seletivos deve ser oferecida a pacientes com varizes de fino calibre, mas que apresentam elevado risco de sangramento e para varizes de médio e grosso calibres, enquanto a ligadura elástica fica reservada àqueles que apresentam intolerância ou contraindicação aos betabloqueadores. o O betabloqueador mais utilizado é o propanolol 20mg, via oral, 2x/dia ou Nodolol 20mg, via oral, 1x/dia. A dose do propranolol deve ser ajustada a cada três dias até que se obtenha redução de 25% da frequência cardíaca basal (até 55 bpm). • PBE o Para prevenir a PBE, pode-se lançar mão do uso de antibioticoterapia empírica com cefotaxima 2g, de 12/12 horas, via intravenosa ou ceftriaxona 1 a 2g, de 24/24 horas, via intravenosa ou ácido amoxicilina-clavulanato 1g, de 8/8 horas, via intravenosa. • Ascite o Nos casos de ascite, além da paracentese de alívio quando há grande acumulo de líquido, podemos usar os diuréticos como furosemida e/ou espironolactona nos casos em que a perda de peso for inadequada ou se houver desenvolvimento de hipercalemia. Esses medicamentos são usados na dose de 100mg/dia, de espironolactona e 40 a 160mg/dia de furosemida. • Encefalopatia hepática Daniela Carvalho o Para evitar a encefalopatia hepática, podemos utilizar a lactulose 15 a 30mL, via oral, 2x/dia, ajustada para obter duas evacuações/dia. • Desnutrição o Abordagem nutricional eficaz, assim como a correção de deficiência de vitaminas. • Transplante hepático o Como a cirrose é até então considerada como uma doença irreversível, o transplante hepático é o único tratamento definitivo para isso é necessário que o paciente preencham os critérios para transplante. • Hipertensão portal o Em alguns pacientes com hipertensão portal e candidatos ao transplante hepático, pode-se realizar a anastomose portocava intra-hepática por via radiológica (TIPS). Esse procedimento, reduz a hipertensão portal e com isso diminui o risco de algumas complicações da cirrose, como a ruptura de varizes esofágicas. (Não é um tratamento definitivo, apenas uma “ponte” para a realização do transplante hepático). PROGNÓSTICO • Para estimar o prognóstico de pacientes com cirrose, existem vários modelos que podem ser empregados, sendo os mais utilizados a classificação de Child-Pugh (CCP) e de MELD. Fonte – resumo baseado em: • Cecil Medicina - Goldman, L. Ausiello, D. - 23ª ed. 2009 editora Elsevier - págs 1312 – 1320. • Texto de suporte das atividades ambulatórias, em enfermaria e discussão de casos sobre cirrose e complicações < Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4911533/mod_folder/content/0/CIRROSE%20E%20COMPL ICA%C3%87%C3%95ES.pdf?forcedownload=1 > https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4911533/mod_folder/content/0/CIRROSE%20E%20COMPLICA%C3%87%C3%95ES.pdf?forcedownload=1 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4911533/mod_folder/content/0/CIRROSE%20E%20COMPLICA%C3%87%C3%95ES.pdf?forcedownload=1
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