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RELATÓRIO SOBRE A ENTREVISTA COM O PROFESSOR Estamos enfrentando tempos desafiadores em todos os sentidos da vida, quando o assunto é a educação das crianças, isso nos remete a pensar sobre o que envolve uma educação de qualidade para os pequenos, já que as mesmas têm sido privadas do ambiente escolar por conta de circunstâncias que fogem ao controle dos pais e educadores. No dia 22 de setembro de 2020, realizei a entrevista com a Professora Lucimeire Aparecida da Silva, 30 anos, que atua há 1 na Educação Infantil, em escolas públicas da Rede Municipal de Ensino de Bragança Paulista, atualmente na E.M. Prof. Eliana Peluso Sperandio, Infantil V, sala com 15 crianças. Ela relatou que uma educação de qualidade em plena pandemia, provocada pelo vírus COVID-19, onde todos estão sendo obrigados a se adaptar com o ensino remoto envolve, sobretudo, a presença da família na vida da criança, envolve a dedicação de separar tempo para que se possa ouvi-las atentamente, experiênciar com os pequenos as mais diversas atividades que farão com que eles se desenvolvam em todos os aspectos. Essas experiências e momentos podem marcar de forma positiva ou negativa as crianças e criar memórias afetivas que as acompanharão ao longo da vida. Sabemos que está cada vez mais difícil separar tempo para estar com os pequenos, pois a rotina diária é muito corrida, as exigências do mercado de trabalho estão cada vez maiores, e ainda existe a rotina doméstica e o fato de que muitas crianças têm passado tempo demais com aparelhos eletrônicos, que prejudicam seu desenvolvimento, diante desse cenário, em se tratando da qualidade de vida e na educação que precisa ser proporcionado às crianças, o NAPA (Núcleo de apoio ao professor e aluno de Bragança Paulista) optou por um planejamento coletivo para toda a rede municipal, com o foco maior no lúdico, explorando muitas brincadeiras, e mesmo que a família não tenha tanto tempo cronológico para dispor, o que irá contar mais é a qualidade das interações, pois a forma mais eficaz de criar memórias afetivas para as crianças é estar disposto a se conectar emocionalmente com elas, e isso só pode ser alcançado quando se investe em interações de qualidade, ou seja, ter a presença, o compartilhar, o brincar juntos, o ouvir o que elas têm a dizer, se atentando para as suas formas de expressão e linguagens, tudo isso está sendo observado e registrado pela professora. A professora reforçou o fato de que, as crianças de 4 a 6 anos estão em uma fase de desenvolvimento da sua autonomia, é um período de aprendizado baseados na associação de funções e tarefas percebidas ao longo do desenvolvimento, no entanto, é essencial que elas experimentem fazer, ajudem em algumas tarefas de casa e se sintam seguras, sintam que as ações delas importam para a família e que elas, como pertencentes ao grupo, contribuem significativamente por meio das suas ações e atitudes, estão também num período de ampliação do vocabulário, descobrindo o mundo por meio da linguagem e das convenções orais ou escritas deste mundo, as atividades são voltadas a fazerem com que descubram diferentes formas de expressão, interação com outros adultos e outras crianças, impulsionando-as a escutar com mais atenção o que as outras pessoas do local estão falando, isso auxilia na elaboração de sua própria fala, elas começam a considerar o diálogo que escutam e, com isso, começam a formular sua habilidade verbal, a raciocinar com mais facilidade, além de obter mais clareza nas relações de coisas e fatos que acontecem ao seu redor, que consigam distinguir algumas situações sociais que antes passavam despercebidas, como a diferenciação entre o que é verdadeiro ou o que é apenas “faz-de-conta”. Elas têm curiosidade pelo mundo ao seu redor, pelo modo como as coisas acontecem, o porquê de determinadas ações e fatos, e há também o desenvolvimento de aspectos socioemocionais, onde as crianças passam a perceber que também são seres separados dos outros, ou seja, têm vida própria, isso significa a descoberta de que as demais pessoas carregam sentimentos e pensamentos. Por isso, a socialização através das brincadeiras é mais elaborada no planejamento do que antes e as interações devem ser trabalhadas, é uma fase de desafios como conversar, dividir coisas e saber esperar num mundo cheio de regras e mudanças, então, nas brincadeiras elaboradas tudo está sendo explorado o tempo todo. O trabalho maior, e mais desafiador do professor nas aulas online, segundo a Professora Lucimeire, é fazer essa mediação, explicar para a família a importância e objetivos de cada atividade. Quanto ao planejamento e semanário, são feitos pelo NAPA, de forma coletiva e enviado para a coordenadora todo início de mês, sendo assim, a coordenadora repassa para os professores orientando a maneira que deverá ser abordado cada atividade. As aulas são elaboradas com 1 semana de antecedência, por se tratar de Educação Infantil, a mediação do professor muitas vezes é feita através de vídeos gravados pelos próprios, áudios e fotos. A escola conta com ajuda de professores cargos (eventuais), que ficam encarregados de gravar grande parte dos vídeos, visto que eles não assumiram responsabilidade sobre nenhuma sala, e é também uma forma de comprovar seus trabalhos em casa para a Secretaria de Educação. A organização dos professores é feita através de grupos criados no aplicativo WhatsApp, tendo como administradores responsáveis a coordenadora e a diretora, onde toda dúvida dos professores é sanadas por elas, que estão sempre dispostas a ajudar e orientar, nesse grupo é compartilhado ideias, experiências, vídeos de contação de história entre outros. A aula remota é feita através do aplicativo WhatsApp, cada professor é responsável pelo grupo formado dos alunos de cada sala, na sala Infantil V, é postado diariamente as 13:00h as atividades do dia, a professora fica à disposição para a família até as 17:00h, após esse horário ela não responde mais as postagens, só volta a responder no próximo dia, 10 minutos antes de aula iniciar, dando um retorno para cada aluno que publicou o registro. A rotina é organizada com atividades permanentes e atividades diversas, incluindo projetos. De início é feita as permanente que é a acolhida, e em seguida a exploração diária do calendário, solicitando que a criança marque o dia em que se encontra, reforçando o dia da semana, pois é fundamental ter uma rotina com as crianças a fim de trabalhar a noção de tempo que está sendo construída por elas, feito isso é realizada a contação de história gravada pelo professor, ou vídeo compartilhado de canais do youtube, (visto que não é permitido a leitura de livros na integra sem prévia autorização do autor, pois fere os direitos autorais garantidos na lei 9610 de 19/02/1998), logo após é postada a atividade a ser elaborada pelos alunos, que devem ser registradas pela família através de foto, vídeo ou áudio e enviada para o professor, com descrição do nome e data, no próprio grupo, a professora sempre finaliza a acolhida com uma mensagem explicativa sobre o objetivo e a importância da criança realizar aquela atividade, quando é 17:00h é feito a despedida. A professora organiza e salva tudo em pastas para documentar a participação de cada aluno. Para a família que não tem acesso ao aplicativo, é disponibilizado na escola as atividades impressas, que devem ser retiradas, realizadas e entregues ao final de cada mês, para esses é feito acompanhamento mensal. A participação diária é muito pouca, a professora relatou que é preciso baixar um pouco as expectativas, respeitar as limitações das crianças e de quem ensina, e fazer o que é possível, quer dizer, fazer aquilo que cada um reconhece como algo que pode ser feito, mas sem perder a esperança de dias melhores e utilizando estratégias mais flexíveis é possível continuar a apoiar a evolução e desenvolvimentodos alunos mesmo em meio ao distanciamento social, é necessário haver uma conversa entre educadores, pais, alunos e escola, para redução de danos psíquicos de todos os envolvidos na Educação. A professora elabora as aulas e vídeos na própria casa, em seu celular pessoal, caso precise de algum material ela comunica a coordenadora, que agenda um horário na escola para ir retirar, ela ainda salientou que precisou aprender novas metodologias, inclusive na área da tecnologia, aprendeu a editar vídeos, a pesquisar imagens, organizar o próprio celular para obter mais espaço para salvar os registros, está aprendendo novas formas de aprendizagem, e que têm a oportunidade de explorar maneiras criativas de oferecer experiências significativas de aprendizagem para seus alunos, entretanto, reforçou que o grande desafio é fazer com que a famílias participem diariamente das aulas, tendo que estar convidando o tempo todo, muitas vezes, ter que conversar no particular e perguntar se está tendo alguma dificuldade, e se há algo em que possa ajudar, solicitando justificativas pela falta de participação para apresentar à direção da escola, além de manter o equilíbrio entre o home office, as tarefas domésticas, o cuidado com a filha, o uso de internet, não está sendo uma tarefa fácil, além de tudo isso, há a falta de contato físico que impacta a todos, principalmente as crianças menores, que têm muita dificuldade de aproveitar uma Educação totalmente virtual até porque a questão corporal é muito premente. Muitos pais relatam estresse, falta de tempo, insatisfação da criança, falta de recursos como justificativas, sendo motivos relevantes pois o virtual não é para todos os alunos, tampouco para todos os professores. Não cabe ao professor fazer com que a escola seja normal no período totalmente anormal que vivemos hoje. A pandemia trouxe diversos desafios para os professores, entre eles está a avaliação, que até o momento será feita através de observação do comportamento e interação, para isso é importante levar em consideração as atividades desenvolvidas, a condição social e econômica das famílias, uma vez que por diversos motivos tiveram dificuldades de acompanhar os conteúdos, sendo assim injusto fazer apontamentos sem essas condições. A professora só pode escrever sobre as crianças se ela realmente foi observada, no caso, a professora relatou que não houve interação direta entre o educador e aluno, e uma das estratégias para a questão avaliativa, será enviar um formulário de auto avaliação aos familiares, com perguntas abertas, de múltipla escolha, para que a própria família avalie o comportamento da criança. A escola está sendo bem flexível, buscando o máximo de interação possível com a família. Muitos pais ainda têm receio se essa nova forma de aprender pode prejudicar o desenvolvimento dos filhos, as crianças se adaptam muito fácil às novas realidades, é claro que elas precisam de um tempo para se organizar, mas logo engatam. A principal dificuldade em relação aos menores, de até seis anos, é deles precisarem de mais assessoria e nem sempre os pais podem auxiliá-los, já que estão trabalhando, essa faixa etária irá exigir mais dos pais, que nem sempre têm didática para ensinar. A professora busca conversar com os pais, e informar que o ideal é conversar com a escola, e tentar pensar em alternativas, não é fácil, já que as crianças têm que lidar com distrações que não tinham na escola, como por exemplo, a tentação da geladeira, o telefone tocando, a televisão, barulho de carros, entre outros. A dinâmica familiar conta muito para tornar o ambiente mais leve em casa, a rotina pode ser uma aliada para ajudar a reduzir o ritmo e distribuir as tarefas, sem estresse, e os pais mantendo seu horário de expediente. “Tem que ter uma hora para começar e terminar, eu percebo que muitos pais se sentem culpados ao brincar com os filhos, porque acham que deveriam estar trabalhando, mas quando estão trabalhando, acham que deveriam estar com os filhos, eu sempre ressalto que o ideal é organizar seus horários para ser o mais inteiro possível, tanto no trabalho, como com as crianças”. A família precisa estar atenta ao fato de que o hoje é o momento que se tem para plantar as boas sementes em relação a essa educação de qualidade, que não envolve apenas os aspectos cognitivos, os conteúdos escolares, mas em primeiro lugar, a construção de uma atmosfera de afetividade e valores específicos carregados por cada família, precisa pensar sobre como deseja que essa criança se desenvolva, em meio a quais valores e quais experiências serão significativas neste processo. Sem o auxílio que as famílias têm dado nas atividades escolares, jamais as escolas conseguiriam fazer com que o que planejamos chegasse às crianças. Pensando nesses aspectos dos dias e circunstâncias atuais e em como se dá o desenvolvimento das crianças nesta faixa etária, está destacado no planejamento, a importância das interações e das brincadeiras como forma de criar as memórias afetivas para os pequenos, tendo como base a cultura e a vida da família. Certamente, todos os momentos e esforços investidos neste sentido criarão condições para que haja uma educação de qualidade para que elas se desenvolvam a partir dos vínculos afetivos fortalecidos. O momento que estamos vivendo é histórico e certamente alguns lembrarão dele com dor, pelas inúmeras perdas, mas também podemos criar memórias afetivas em nossas crianças, memórias de conexão e acolhimento, quando tudo que elas precisam ouvir é algo como: vai ficar tudo bem!
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