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EDUCAÇÃO E SOCIEDADE - PEDAGOGIA

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EDUCACAO E SOCIEDADE
Podemos dizer que a teoria pedagógica cabe refletir sobre o papel da educação em relação a organização social. Sendo assim, a questão: “qual o objetivo da educação em relação a sociedade?”, nos leva a outras diferentes questões. 
1) Ela visa a salvar a sociedade de suas mazelas? 
2) Ela visa a conservar a sociedade tal qual essa se encontra? 
3) Ela visa a transformar a sociedade e suas estruturas?
AS TEORIAS NÃO CRÍTICAS DA EDUCAÇÃO OU TENDÊNCIA REDENTORA
Demerval Saviani (1994), no seu livro Escola e democracia, discute as questões assinaladas.
Segundo ele, diante do problema da marginalidade escolar e social, e possível identificar três grandes grupos, em relação ao posicionamento que adotam. Em um primeiro grupo ele defende que estão as “teorias não críticas da educação” e identifica alguns aspectos gerais comuns a elas. Para essa tendência, a sociedade e concebida como um conjunto orgânico, harmonioso, e a marginalidade e entendida como um desvio e cabe a escola corrigir essa distorção. Ela deve ser corretora dos desvios sociais e promotora da coesão social. Dessa forma, a escola e concebida com certa autonomia em relação ao meio social. Ela atua modelando a sociedade sem ser influenciada por ela.
Saviani denomina como teorias não críticas: a pedagogia tradicional, a pedagogia nova e a pedagogia tecnicista. São assim denominadas devido a forma ingênua como concebem sua relação com a sociedade. São também chamadas de tendência redentora, no sentido de serem salvadoras da sociedade. Sobre as concepções dessa tendência Luckesi, no seu livro Filosofia da educação, explica:
A tendência redentora concebe a sociedade como um conjunto de seres humanos que vivem e sobrevivem num todo orgânico e harmonioso, com desvios de grupos e indivíduos que ficam a margem desse todo. Ou seja, a sociedade esta “naturalmente” composta com todos os seus elementos; o que importa e integrar em sua estrutura tanto os novos elementos (novas gerações) quanto os que, por qualquer motivo, se encontram a sua margem. Importa, pois, manter e conservar a sociedade, integrando os indivíduos no todo social (LUCKESI, 1994, p. 38).
AS TEORIAS CRITICO‑REPRODUTIVISTAS DA EDUCAÇÃO OU A TENDÊNCIA REPRODUTIVISTA.
Em um segundo grupo, Saviani vê as “teorias critico‑reprodutivistas” da educação e identifica alguns aspectos comuns no seu posicionamento geral em relação à questão colocada anteriormente sobre a marginalidade. Para essa tendência a sociedade é concebida com divisões de classes e estas possuem interesses divergentes. A marginalidade é entendida como algo inerente e produzida pela própria estrutura social. 
Já a educação, está condicionada pela estrutura social e é também reprodutora da marginalidade social, uma vez que reproduz a marginalidade cultural. Portanto, a estrutura socioeconômica determina a forma de manifestação da educação, e esta, por sua vez, e colocada a serviço dos interesses da classe
dominante. Um exemplo dessa tendência encontra‑se na obra Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado, de Louis Althusser. Esse pensador defende que a escola e um dos aparelhos ideológicos do
Estado e serve para reproduzir a ideologia da classe dominante e, dessa forma, manter o status quo.
Essas teorias são críticas devido a forma como concebem a relação da educação com a sociedade, ou seja, analisam a educação a partir dos seus condicionamentos socioeconômicos. São também “reprodutivistas”, pois entendem que a educação é reprodutora da sociedade. Daí serem denominadas por Luckesi como tendências reprodutivistas. Segundo ele:
Diversa da tendência anterior, aborda a educação como uma instancia dentro da sociedade e exclusivamente a seu serviço. Não a redime de suas mazelas, mas a reproduz no seu modelo vigente, perpetuando‑a, se for possível. [...]
A escola, segundo a análise de Althusser, e o instrumento criado para otimizar o sistema produtivo e a sociedade a que ele serve, pois ela não só qualifica para o trabalho, socialmente definido, mas também introjeta valores que garantem a reprodução comportamental compatível com a ideologia dominante (LUCKESI, 1990, p. 41 e 45).
A TEORIA CRITICA OU A TENDÊNCIA TRANSFORMADORA
A partir da análise dos dois grupos anteriores, Saviani propõe uma via alternativa a eles. Trata‑se da Teoria Critica. Ha alguns pontos comuns entre esta e as teorias critico‑reprodutivistas.
Em relação a concepção de sociedade, pode‑se afirmar que há consenso entre as duas: a sociedade e concebida com divisões de classes e estas possuem interesses divergentes. 
Daí que a marginalidade e algo inerente e produzido pela estrutura social. Em relação a concepção de educação, a Teoria Critica também concebe a educação como condicionada a estrutura social e também reprodutora da marginalidade social, já que reproduz a marginalidade cultural. 
Contudo, não entende que essa e sua única possibilidade, uma vez que a educação, ao se fazer consciente dos mecanismos sociais e das influencias que recebe do sistema ao qual está inserida, pode atuar no sentido contrário, ou seja, a escola, com base em um projeto social, pode atuar promovendo a conservação ou a transformação da sociedade. Essa tendência e denominada por Luckesi de transformadora. Em resumo, temos:
A tendência redentora propõe uma ação pedagógica otimista, do ponto de vista político, acreditando que a educação tem poderes quase que absolutos sobre a sociedade. A tendência reprodutivista e crítica em relação a compreensão da educação na sociedade, porem pessimista, não vendo qualquer saída para ela, a não ser submeter‑se aos seus condicionantes. Por último, a tendência transformadora, que e critica, recusa‑se tanto ao otimismo ilusório quanto ao pessimismo imobilizador. Por isso, propõe‑se compreender a educação dentro de seus condicionantes e agir estrategicamente para a sua transformação. Propõe‑se desvendar e utilizar‑se das próprias contradições da sociedade, para trabalhar realisticamente (criticamente) pela sua transformação (LUCKESI, 1990, p. 51).
OS PRESSUPOSTOS EPISTEMOLOGICOS DA EDUCACAO
Será que toda teoria pedagógica pressupõe uma teoria epistemológica? Será que todo professor na sua atuação prática faz uso de uma teoria do conhecimento? Pode‑se afirmar que toda teoria pedagógica pressupõe uma teoria epistemológica, da qual o professor faz uso, mesmo que ele não tenha consciência disso, ou seja, mesmo que o professor não saiba qual teoria do conhecimento sustenta sua práxis pedagógica, ele faz uso de alguma, ainda que isso não lhe seja claro, isso porque o ato de educar pressupõe a quem educar e como educar. Quem eu vou educar já sabe alguma coisa?
Quem eu vou educar não sabe nada, e como uma lousa em branco? Se concebo meu aluno como uma lousa em branco, eu, professor, serei o transmissor exclusivo do conhecimento. Se não concebo meu aluno como uma lousa em branco, meu procedimento deverá ser diferente.
Epistemologia: reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites do conhecimento humano, [...] teoria do conhecimento (HOUAIS, 2009).
EMPIRISMO E A PEDAGOGIA DIRETIVA
Na pedagogia diretiva, o professor é o centro do processo de conhecimento. Ele é o portador do conhecimento que deve ser transmitido aos alunos. O aluno é concebido como uma lousa em branco, como uma tabula rasa ou mesmo um balde vazio, que deverá ser preenchido com os conhecimentos transmitidos pelo professor.
A epistemologia que sustenta essa prática é o empirismo. Nessa concepção, o indivíduo nasce como uma folha em branco, que será preenchida no seu contato como o meio físico e social. Na escola, quem representa os conhecimentos, conteúdos e valores a serem transmitidos são os professores. Daí que, na relação sujeito e objeto, o professor é o sujeito do processo de conhecimento, o detentor do conhecimento, e o aluno, o não sujeito ou: ainda não dotado de conhecimento. Dessa forma, tanto o conteúdo dos conhecimentos quanto a capacidade do aluno de conhecer vem do meio físico ou social.
O professor é o agente do conhecimento e considera seualuno como uma folha em branco, não apenas quando nasceu ou quando chegou à escola, mas sempre que inicia um novo conteúdo da matéria (cf. BECKER, 2001, p. 17). Sendo assim, cabe ao professor transmitir os conhecimentos e depois avaliar, medindo o “nível de conhecimento” que foi transferido aos alunos (MACHADO, 2004, p. 16).
Portanto essa relação preconizada pela pedagogia diretiva é caracterizada pela passividade dos alunos, já que eles devem ficar sentados, enfileirados, em silêncio, prestando atenção, para, assim,
obterem o conhecimento transmitido pelo professor. Tal modelo epistemológico favorece a reprodução da ideologia e a manutenção do status quo, ou seja, da situação existente, uma vez que não há incentivo ao questionamento, à reflexão e à criatividade (cf. BECKER, 2001, p. 18).
APRIORISMO E A PEDAGOGIA NÃO DIRETIVA
A concepção pedagógica não diretiva ou apriorista, do ponto de vista epistemológico, apoia‑se na concepção idealista que admite a existência de ideias inatas ao indivíduo. Para ela, o aluno é o centro do processo de conhecimento, e o professor é um mediador, um facilitador da aprendizagem. O aluno é concebido como dotado de potencialidades inatas, por sua bagagem genética. Cabe ao professor despertar o que cada um já tem em potência. 
O aluno aprende não porque o professor ensina, mas porque ele já nasceu com o dom de aprender, ou seja, a inteligência é algo dado a priori, nasce com o aluno e necessita ser desenvolvida. Cabe ao professor auxiliar, ajudando a despertar o conhecimento já existente no aluno. Se na concepção anterior, o professor era o centro do processo e seu poder e autoridade eram legitimados pelo modelo epistemológico, aqui isso já não poderia ocorrer. Por outro lado, já que o modelo epistemológico não legitima o poder do professor, esse poder acaba, em geral, assumindo uma forma mais dissimulada e perversa que no modelo tradicional (ibidem, p. 21). Segundo Becker,
[...] essa mesma epistemologia, que concebe o ser humano como dotado de um saber “de nascença”, conceberá, também, dependendo das conveniências, um ser humano desprovido da mesma capacidade, “deficitário”. Esse “déficit”, porem, não tem causa externa; sua origem é hereditária. Onde se detecta maior incidência de dificuldades ou retardos de aprendizagem? Entre os miseráveis, os malnutridos, os pobres, os marginalizados [...]. A criança marginalizada, entregue a si mesma, em uma sala de aula não diretiva, produzira, com alta probabilidade, menos, em termos de conhecimento, que uma criança de classe média ou alta. Trata‑se, aqui, de acordo com o apriorismo, de déficit herdado; epistemologicamente legitimado, portanto, (ibidem, p. 22).
CONSTRUTIVISMO E A PEDAGOGIA RELACIONAL
Na pedagogia relacional ou construtivista, os polos sujeito/objeto, aluno/professor não estão dicotomizados, conforme exposto nas teorias anteriores. Nessa concepção, o conhecimento não é visto como algo que vem do exterior para o interior, como na tendência com base no empirismo, ou como algo dado de forma inata, como na tendência com base no apriorismo.
O termo inato indica uma ordem psicológica, significa o que já nasce com o indivíduo. Já o termo a priori, indica uma ordem lógica do conhecimento, corresponde aquilo que é anterior a experiencia.
Na pedagogia construtivista, o conhecimento é algo concebido como uma construção contínua, realizada na interação entre sujeito e objeto. Tanto a bagagem hereditária quanto o meio social são importantes para o processo de conhecimento, mas nenhum desses fatores pode assumir uma independência em relação ao outro. Desde que nasce, a criança irá, na sua relação com o meio, construir conhecimento por meio de um processo que alterna mobilidade e estabilidade, avançando sempre a novos equilíbrios mais consistentes que os anteriores. Segundo Becker, o professor construtivista:
[...] não acredita na tese de que a mente do aluno é tabula rasa, isto é, que o aluno, frente a um conhecimento novo, seja totalmente ignorante e tenha de aprender tudo da estaca zero, não importando o estágio do desenvolvimento em que se encontre. Ele acredita que tudo o que o aluno construiu até hoje em sua vida serve de patamar para continuar a construir e que alguma porta se abrirá para o novo conhecimento – é só questão de descobri‑lá; ele descobre isso por construção (ibidem, p. 24).
CULTURA E EDUCACAO
O que é cultura? Em um sentido amplo e antropológico, podemos entender por cultura toda produção do ser humano ao construir sua existência, seja produção material ou espiritual. Por exemplo, em uma tribo indígena, seus utensílios, suas armas, suas moradias, suas crenças, sua língua e seus mitos fazem parte da sua cultura. Daí falarmos em cultura tupi‑guarani, em cultura chinesa, em cultura brasileira etc.
Quando se pensa na humanidade, costuma‑se fazer uma primeira e grosseira divisão entre “sociedades primitivas” e “sociedades civilizadas”. Tanto entre as “sociedades primitivas” quanto entre às “sociedades civilizadas”, os grupos que as compõem são muito variados e diferentes em relação as suas crenças e aos seus costumes. Tal questão se deve ao fato de cada grupo humano (primitivo ou civilizado) possuir uma cultura própria para sobreviver. Sem cultura,2 um grupo humano não sobrevive. É do interesse do grupo que a cultura não pereça nem seja esquecida. Para isso, é preciso que se transmita às gerações mais jovens a cultura adquirida pelas gerações adultas. A cultura deve ser aprendida, e esse é o seu caráter mais geral e fundamental. Essa transmissão é feita pela educação (cf. ABBAGNANO; VISALBERGHI, 1999, p. 11).
Mesmo que as sociedades primitivas não possuam escolas tal como a concebemos, elas possuem um processo educativo, e este, visto que é informal, e a aprendizagem se dá nas várias atividades cotidianas do grupo. Logo, pode‑se afirmar que a educação não tem uma única forma, mas pode assumir diferentes formas de acordo com o grau de desenvolvimento dos grupos:
Mas, em essência, é sempre a mesma coisa, isto é, a transmissão da cultura do grupo de uma geração a outra, dadiva pela qual as novas gerações adquirem a habilidade necessária para manejar as técnicas que condicionam a sobrevivência do grupo (ibidem, p. 12).
Nas sociedades primitivas, suas técnicas culturais de comportamento, de sobrevivência, acabam por adquirir um caráter sacro. Os ritos que acompanham várias de suas atividades servem para garantir a repetição das técnicas tradicionais, de forma que elas não sejam esquecidas nem modificadas.
De acordo com Abbagnano e Visalberghi (1999), quanto mais difícil é para o grupo a transmissão e conservação de sua cultura, maior é a tendência de atribuir um caráter sacro a cada elemento do seu patrimônio cultural e, dessa forma, adotar uma postura conservadora ao extremo em relação a tais elementos, imprimindo‑lhe, portanto, um caráter estático. Já as sociedades denominadas secundarias são mais permeáveis às mudanças. Segundo os autores, “[...] são aquelas cuja cultura está aberta às inovações e possui instrumentos aptos a fazer‑lhes frente, compreendê‑las e utilizá‑las” (ibidem, p. 13). É por meio do saber racional que essas ultimas podem enfrentar o duplo problema da conservação e da renovação dos elementos culturais considerados validos na sua sociedade.
Segundo expõe Jaeger (2001, p. 19), em Paideia, “a educação é uma função tão natural e universal da comunidade humana, que por sua mesma evidencia tarda muito tempo em chegar à plena consciência daqueles que a recebem e a praticam”. Assim, embora se pratique a educação em várias épocas e lugares, de modo difuso e informal, a plena consciência de seu processo é um fruto tardio.
O ser humano é um ser que precisa ser socializado para sobreviver. Desde que nasce, ele é submetido a um constante processo de aprendizagem por meio da educação informal. Por intermédio da família, da comunidade, da igreja, dos meios de comunicação etc., as pessoas vão tomando contato com os conhecimentos e valores de sua sociedade; vão observando os comportamentosadequados a sua idade a seu sexo, a sua classe social etc. Então, podemos dizer que mesmo em sociedades em que não há escolas, existe educação, uma educação informal.
À medida que a sociedade vai se tornando mais complexa e começa a lidar com questões como produção, divisão do trabalho e, relacionada à esta, a questão do poder, a educação vai, segundo Brandao (1994), sendo vista como um problema. A partir do momento em que a educação é concebida como um problema, faz‑se necessário refletir sobre sua pratica. A busca de como lidar com a transmissão do saber vai levando paulatinamente a instituição dos meios necessários para tal fim. Dessa forma, a educação formal surge quando as sociedades vão se tornando mais complexas e há a necessidade de organizar a transmissão dos conhecimentos em lugar específico, como a escola.
DIVERSOS TIPOS DE CULTURA
Podemos definir cultura em um sentido amplo e antropológico, conforme foi abordado anteriormente, significando tudo que o ser humano produz ao construir sua existência. Assim, diferentes povos criam suas próprias e diferentes culturas. Já em sentido restrito, podemos entender por cultura as diversas produções intelectuais de um povo, expressas na arte, filosofia, ciência, religião, enfim, nas diversas obras espirituais. Nessa acepção, falamos em cultura erudita, cultura popular, cultura de massa, cultura popular individualizada.
A cultura erudita, segundo Aranha (2006, p. 61),
[...] é a produção elaborada, acadêmica, centrada no sistema educacional, sobretudo na universidade, também conhecida como cultura de elite ou alta cultura, por ser produzida por uma minoria de intelectuais das mais diversas especialidades (escritores, artistas em geral, cientistas, tecnólogos).
	Esse tipo de cultura implica elevado rigor na sua produção e, devido a isso, acaba se restringindo a um público reduzido. Em geral, em sociedades desiguais, a maioria das pessoas não tem oportunidade e/ou não são incentivadas a participarem, tanto da produção como do consumo desse tipo de cultura.
A cultura popular possui um conceito complexo, mas, de um modo geral,
[...] consiste na cultura anônima produzida pelos habitantes do campo, das cidades do interior ou pela população suburbana das grandes cidades. No sentido mais comum, a cultura popular é identificada ao folclore, que constitui o conjunto de lendas, contos, provérbios, práticas e concepções transmitidas oralmente pela tradição (ibidem, p. 62).
Isso não significa que o folclore seja uma realidade pronta imutável, porque toda cultura implica certa dinâmica, implica transformação.
A cultura de massa, por sua vez,
[...] resulta dos meios de comunicação de massa, ou mídia. São considerados meios de comunicação de massa o cinema, o rádio, a televisão, o vídeo, a imprensa, as revistas de grande circulação, que atingem rapidamente um número enorme de pessoas pertencentes a todas as classes sociais e de diferente formação cultural (ibidem, p. 63).
Essa cultura tem como diferencial a figura do produtor cultural, que não realiza um trabalho individual, nem anônimo, mas, sim, coletivo, trabalho de equipe, de um conjunto de especialistas.
Ao contrário da cultura popular, a cultura de massa e produzida “de baixo para cima”, impõe padrões e homogeneíza o gosto por meio do poder de difusão de seus produtos. Em linhas gerais, é também uma produção estandardizada que visa ao passatempo, ao divertimento e ao consumo (ibidem).
Já a cultura popular individualizada
[...] se caracteriza por ser produzida por escritores, compositores, artistas plásticos, dramaturgos, cineastas, enfim, intelectuais que não vivem dentro da universidade (e, portanto, não produzem cultura erudita) nem são típicos representantes da cultura popular (que se caracteriza pelo anonimato), tampouco da cultura de massa (que resulta do trabalho de equipe) (ibidem, p. 64).
É nesse tipo de cultura que podemos classificar, por exemplo, a música de Caetano Veloso ou de Tom Zé, o teatro de Plinio Marcos, a poesia de Manoel Bandeira, entre outros.
De acordo com o que foi abordado, fica evidente a diversidade cultural, tanto nas diferentes sociedades como dentro de cada uma delas, nas suas diferentes manifestações.
PLURALIDADE CULTURAL E EDUCACAO
A educação formal se faz de modo sistemático e busca ter clareza em relação às questões: o que ensinar, como ensinar, a quem ensinar, para que ensinar, por que ensinar. Isso surge quando a educação passa a ser vista como um problema e, dessa forma, faz‑se necessária a sua organização.
Um dos desafios que a educação enfrenta é em relação a dialética conservação/transformação. Quais elementos da cultura devem ser conservados? Por que são valorizados? Quais devem ser transformados? Por que são considerados ultrapassados?
A própria etimologia latina da palavra educação remete também a um processo dialético do par conservação‑transformação. Segundo Haydt, a educação,
[...] do ponto de vista social, é a ação que as gerações adultas exercem sobre as gerações jovens, orientando sua conduta, por meio da transmissão do conjunto de conhecimentos, normas, valores, crenças, usos e costumes aceitos pelo grupo social. Nesse sentido, o termo educação tem sua origem no verbo latino Educare, que significa alimentar, criar. Esse verbo expressa, portanto, a ideia de que a educação é algo externo, concedido a alguém (2001, p. 11).
Nesse sentido, a educação visa à transmissão e à preservação da cultura na qual o indivíduo encontra‑se inserido. Tem como objetivo que a cultura se mantenha viva por meio da sua aquisição pelas novas gerações. Nessa perspectiva, privilegia‑se o elemento externo – sociedade –, que se impõe ao interno – aluno. Essa concepção se encontra, de forma extrema, naquele que é considerado o pai da sociologia, Emile Durkheim. Para ele, “a educação é a ação exercida, pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social (...)” (1978, p. 41), e deve preparar as crianças para a integração harmônica ao social. Na sua visão funcionalista do social, a educação é entendida como um elemento externo coercitivo, que deve integrar os indivíduos à sociedade existente, independentemente das suas vontades. Contudo, há outro sentido para o termo educação, ainda segundo Haydt (2001, p. 12):
Do ponto de vista individual, a educação refere‑se ao desenvolvimento das aptidões e potencialidades de cada indivíduo, tendo em vista o aprimoramento de sua personalidade. Nesse sentido, o termo educação se refere ao verbo latino educare que significa fazer sair, conduzir para fora. O verbo latino expressa, nesse caso, a ideia de estimulação e liberação de forças latentes.
Nessa abordagem, privilegia‑se o interno, e o externo deve propiciar as condições favoráveis para que os educandos desenvolvam sua própria personalidade, sua singularidade, para que cada um se torne aquilo que pode ser. Nessa perspectiva, possibilita‑se que cada um se constitua como um sujeito ativo e criativo, que não adote uma postura apenas passiva em relação a cultura vigente, mas também critica e produtora.
Outro desafio que a educação enfrenta é o de como lidar com a pluralidade cultural, referida nos itens anteriores. Há uma tendência de muitos em considerarem sua própria cultura como a única valida e verdadeira, concebendo, consequentemente, as outras são como “estranhas”, “exóticas” ou mesmo “inferiores”. Tal concepção revela uma postura etnocêntrica, ou seja, uma visão de mundo que tem como centro sua própria cultura, e isso pode implicar xenofobia, isto é, aversão e ódio pelo diferente, sustenta práticas de violência e dominação em relação aos considerados “outros”.
É necessário considerar a diversidade entre as várias culturas, e, dentro de uma mesma sociedade cultural, a diversidade pessoal, e ainda mais: lembrar que não existem raças, apenas a raça humana do animal symbolicum, que constrói diferentes interpretações simbólicas para o mundo. Daí a necessidade da tolerância. Tolerar que a criatividade do ser simbólico, que é o homem,leva a uma diversidade de respostas diante do existente e do não existente, ou do não empírico. Dito de outro modo, os seres humanos, diante do existente, produzem diferentes interpretações, escolhem diferentes perspectivas; dessa forma, a diversidade do produzir atesta a igualdade na capacidade humana de produção. Logo, tolerar implica reconhecer o outro como outro eu, como um animal symbolicum, e buscar entender sua perspectiva. Eis um desafio para a educação: preparar para a diversidade cultural.
KANT, HANNAH ARENDT E A EDUCAÇÃO
KANT – EDUCAÇÃO PARA AUTONOMIA: A SAÍDA DA MENORIDADE
Esclarecimento [Aufklarung] é a saída do homem da sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a sua causa não reside na falta de entendimento, mas na falta de decisão e de coragem em se servir de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem a coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento [Aufklarung] (KANT, 2005, p. 64, grifo do autor).
Kant explica no seu texto Resposta à pergunta: que é “esclarecimento”? que liberdade corresponde à autonomia, isto é, ser capaz de seguir as próprias leis pensadas pelo sujeito moral, e não simplesmente seguir passivamente o que é ditado. É poder fazer uso do próprio esclarecimento, que para Kant, significa a saída do homem da menoridade, condição está caracterizada como a incapacidade de utilizar o próprio entendimento, sem a orientação de outrem. Para esse filósofo, a não saída da condição de menoridade é culpa do próprio homem, que não tem coragem de fazer uso do seu entendimento, por preguiça e covardia. Por um lado, existe a preguiça em mudar de posicionamento e, por outro, covardia para tomar tal atitude. “É tão cômodo ser menor!” Por isso, É mais fácil continuar sendo o que se é: menor.
Muitos preferem simplesmente não pensar, já que há aqueles que pensam por eles: o padre, o médico, o político, entre outros. Esses tutores procuram manter os homens sob sua orientação, prevenindo‑lhes que é perigoso caminhar por si mesmo. Por isso, muitos consideram difícil e perigosa a passagem para a maioridade. Para Kant, esse perigo não é muito grande, pois após algumas quedas se aprende a andar por conta própria. No entanto, para muitos, essa menoridade tornou‑se quase que uma natureza, adquiram amor por ela, pois nunca os deixou sair dessa condição.
A condição para que um povo se esclareça é a liberdade. Sem ela, apenas poucos conseguem a transformação necessária para sair da menoridade. Para Kant, liberdade significa poder fazer uso público da própria razão em quaisquer questões, ou seja, poder usar a razão de forma livre e pública entre os homens, sobre todos os assuntos. A liberdade ética do sujeito moral não é algo dado, mas deve ser conquistado. Pressupõe sair da condição cômoda, mas nefasta da dependência. Em épocas de crise social, manter a liberdade se torna uma tarefa mais difícil, pois, se esta não está bem embasada, os indivíduos passam a desconfiar de si mesmos. Como liberdade pressupõe pensar, escolher, decidir etc., ela é considerada muitas vezes mais como um problema do que uma conquista ou privilégio. E como é mais cômodo ter quem assuma essa tarefa e pense pelos outros, os homens acabam abrindo mão desse privilégio, acabam desejando e aceitando o feitiço de Circe.
Na Odisseia, de Homero, a feiticeira Circe transformou os companheiros de Ulisses em animais selvagens.
Dessa forma, Kant valoriza o aprimoramento da razão como condição que possibilita ao ser humano libertar‑se de sua condição de menoridade. É necessário Sapere aude!, ousar pensar, ousar “fazer uso do próprio entendimento”. Nessa tarefa, a educação tem um papel fundamental.
HANNAH ARENDT (1906 – 1975) : CRISE NA EDUCAÇÃO
A pensadora Hannah Arendt é autora de “A crise na educação”, que vem sendo considerado clássico para a reflexão sobre o papel da educação na sociedade, em uma perspectiva filosófica, texto que reflete uma problemática que ocorria na década de 1950, nos Estados Unidos da América, não permanecendo circunscrito à sua época, uma vez que discute conceitos intrínsecos à questão educacional de qualquer época.
Arendt esclarece que não é uma educadora profissional, mas que a crise oferece oportunidade para reflexão, obriga a busca por respostas e também o retorno às próprias perguntas. O que é desastroso diante de uma crise é quando se busca responder com soluções prontas, com preconceitos, não desenvolvendo reflexão.
Segundo Arendt, há uma crise recorrente na educação dos EUA, que atinge o patamar de um problema político. E o que explica isso é justamente o fato de que a educação norte‑americana desempenha um papel de natureza política, ou seja, os EUA, desde a sua formação histórica e política, são uma terra de imigrantes. Por conseguinte, a educação tem o papel de fusão e integração em relação aos diferentes grupos étnicos. E, segundo a autora, a imigração ainda desempenha um importante papel no país, que é a garantia da “nova ordem no mundo”, lema este impresso nas notas de dólar. Essa nova ordem, instituída nos EUA, buscava fundar um mundo novo que superasse a opressão e a pobreza vividas no velho continente.
Arendt identifica um pathos pelo novo nos EUA, um entusiasmo por tudo o que é moderno, e tal fato, na educação, trouxe graves consequências no século XX. A educação progressista, que era testada na Europa, acabou sendo implantada em larga escala nos EUA, exceto nas escolas particulares e católicas.
Tal fato leva a uma crise, já que a razão humana falhou na busca por respostas ao problema político vinculado à educação, pois, como responder a questões como: por que os alunos não conseguem ler? ou, de um modo mais amplo: por que a escola nos EUA se encontra atrasada em relação ao padrão médio dos países europeus?
A resposta não está no fato de serem os EUA um país jovem, aquém dos padrões europeus, mas, pelo contrário, os problemas são decorrentes do fato de o país ser mais avançado, e os problemas da educação, por sua vez, também serem mais “evoluídos”. As modernas teorias pedagógicas foram implantadas de forma indiscriminada e em larga escala. Portanto, a crise na educação revela, por um lado, a falência da pedagogia progressista e, por outro, a dificuldade do problema, por ter surgido com o desenvolvimento da sociedade de massas.
Outro elemento que, segundo Arendt, não gerou a crise, mas a agravou, está no papel desempenhado pelo conceito de igualdade na sociedade americana, nos vários âmbitos: político, econômico e social, que, segundo ela, torna‑se problemático por extrapolar a legitima igualdade, seja de oportunidades, ou perante a lei, ou ainda em relação à educação.
Assim, o que torna a crise educacional na América tão particularmente aguda é o temperamento político do país, que espontaneamente peleja para igualar ou apagar tanto quanto possível as diferenças entre jovens e velhos, entre dotados e pouco dotados, entre crianças e adultos e, particularmente, entre alunos e professores (ARENDT, 2003, p. 229).
A efetivação desse nivelamento acaba tendo como consequência a perda da autoridade do mestre e o prejuízo para os alunos mais dotados.
Esses fatores gerais, abordados nos parágrafos anteriores, não explicam totalmente a crise, segundo Arendt, nem justificam as medidas adotadas, que se sustentam em três pressupostos básicos, já conhecidos. O primeiro está na concepção de que há um mundo autônomo de crianças que se autogovernam, em que os adultos apenas auxiliam. Nessa situação, o adulto não possui autoridade, pois esta emana do próprio grupo de crianças. Dessa forma, as relações que seriam normais entre crianças e adultos não existem. Nesse tipo de relação, o que é levado em conta é o grupo, e não a criança individual. E a própria criança nessa situação de grupo encontra‑se pior que antes, segundo Arendt, já que a autoridade do grupo é mais severa e tirânica do que a de um adulto isolado.A ação autônoma da criança é quase nula, já que age conforme o grupo:
Assim, ao emancipar‑se da autoridade dos adultos, a criança não foi libertada, e sim sujeita a uma autoridade muito mais terrível e verdadeiramente tirânica, que é a tirania da maioria. Em todo o caso, foram as crianças, por assim dizer, banidas do mundo dos adultos (ibidem, p. 230).
O resultado dessa situação é o abandono das crianças a si mesmas, separadas do mundo dos adultos, ficaram à mercê da tirania do seu próprio grupo. Tal situação, segundo Arendt, traz consequências nefastas, como o conformismo e a delinquência.
O segundo pressuposto básico, segundo Arendt, está relacionado ao ensino.
Sob a influência da Psicologia moderna e dos princípios do Pragmatismo, a Pedagogia transformou‑se em uma ciência do ensino em geral, a ponto de se emancipar inteiramente da matéria efetiva a ser ensinada. Um professor, pensava‑se, é um homem que pode simplesmente ensinar qualquer coisa; sua formação é no ensino, e não no domínio de qualquer assunto particular (ibidem, p. 231).
Tal fato tem como consequência, segundo Arendt, um descuido na formação dos professores, especialmente na rede pública. Assim, o professor deixa de ter domínio sobre a própria matéria que ministra e, dessa forma, mina‑se a autoridade advinda do conhecimento, que é sua fonte mais legítima.
O terceiro pressuposto básico está relacionado à aplicação de uma teoria da aprendizagem embasada no pragmatismo.
Esse pressuposto básico é o de que só é possível conhecer e compreender aquilo que nós mesmos fizermos, e sua aplicação á educação é tão primária quanto óbvia: consiste em substituir, na medida do possível, o aprendizado pelo fazer (ibidem, p. 232).
O objetivo desse procedimento era de que o professor não ensinasse conhecimentos petrificados, mas, sim, o processo do saber. Segundo Arendt, tal procedimento produziu algumas habilidades práticas, mas não fez com que os alunos aprendessem os elementos básicos de um currículo padrão.
O que agrava isso é que o saber foi substituído pelo fazer, pelo trabalho mediante o brincar, levando a uma autonomia do mundo da criança. Os problemas decorrentes são óbvios: sob o argumento de se respeitar a autonomia das crianças, elas são separadas do mundo dos adultos; ficam em um mundo artificial, excluídas da relação natural entre crianças e adultos, que seria, entre outras, a relação de ensino/aprendizagem. Eclipsa‑se a condição da criança como ser em processo, em preparação, em desenvolvimento para a vida adulta.
A filósofa, então, propõe‑se a refletir sobre “[...] o que podemos aprender dessa crise acerca da essência da educação [...]” (ibidem, p. 234), ou seja, sobre qual o verdadeiro papel da educação em relação à civilização, sobre o fato de nascerem crianças e quais obrigações isso acarreta para as sociedades humanas.
Pode‑se afirmar que a educação se dirige especialmente à criança, que é seu objeto, e esta se apresenta ao educador em uma dupla característica: a. “[...] é nova num mundo que lhe é estranho e se encontra em processo de formação [...]”; e b. “[...] é um novo ser humano e é um ser humano em formação [...]” (ibidem, p. 235). Esse duplo aspecto é característico dos seres humanos, e não se aplica a outros seres vivos. Também não é evidente por si só. Envolve um relacionamento também duplo: com o mundo e com a vida. Os pais, por meio da concepção, geram um novo ser humano e o introduzem em um mundo já existente. A criança é nova em relação a esse mundo e está em processo de formação. Os pais, ao conceberem, assumem, ou deveriam assumir, a responsabilidade pela preservação da vida, pelo devir da criança e pela continuidade do mundo (cf. Arendt, 2003, p. 235). A criança precisa ser protegida dos elementos destrutivos do mundo, e o mundo, por sua vez, precisa ser protegido para não ser derrubado pelas novas gerações.
A criança precisa ser preservada do mundo para crescer e se desenvolver; por isso seu lugar é no aconchego do lar, no seio da família. Na vida familiar privada, em convivência com os adultos, preservada da vida pública, encontra o lugar seguro para desenvolver‑se.
Tudo o que vive, e não apenas a vida vegetativa, emerge das trevas, e, por mais forte que seja sua tendência natural a orientar‑se para a luz, mesmo assim precisa da segurança da escuridão para poder crescer (ibidem, p. 236).
Para Arendt, o problema da educação moderna é que ela buscou servir à criança, estabelecendo um mundo de crianças, mas errou ao minar justamente aquilo que era condição de possibilidade para o desenvolvimento delas. “[...] A educação moderna, na medida em que procura estabelecer um mundo de crianças, destrói as condições necessárias ao desenvolvimento e crescimento vitais” (ibidem). A autora questiona: como isso pode acontecer? Se a educação passada foi criticada por ver a criança como um adulto em miniatura, como pode a educação moderna expor as crianças ao aspecto público do mundo, que é o que mais caracteriza o universo adulto?
Essas condições básicas para o crescimento vital que foram violadas não o foram intencionalmente, já que o objetivo era o bem‑estar da criança, mesmo que os resultados não tenham sido os esperados. Dessa forma, Arendt interroga: qual o papel da escola e qual sua relação com a família e com o mundo? A escola e uma espécie de espaço intermediário entre o espaço do lar e o espaço do mundo.
Em suas palavras, 
[...] a escola não é de modo algum o mundo e não deve fingir sê‑lo; ela é, em vez disso, a instituição que interpomos entre o domínio privado do lar e o mundo com o fito de fazer com que seja possível a transição, de alguma forma, da família para o mundo (ibidem, p. 238).
Uma vez que as crianças chegam à escola, os professores devem assumir a responsabilidade por elas, não tanto a responsabilidade pelo crescimento vital, mas, sim, pelo desenvolvimento da sua singularidade. O educador diante da criança e do jovem deve assumir a responsabilidade de representante do mundo, deve possibilitar o acesso ao que o mundo é. Segundo Arendt, essa responsabilidade é fundamental e está implícita na tarefa educativa. “Qualquer pessoa que se recuse a assumir a responsabilidade coletiva pelo mundo não deveria ter crianças, e é preciso proibi‑la de tomar parte em sua educação” (ibidem, p. 239).
HANNAH ARENDT: AUTORIDADE E EDUCAÇÃO
Hannah Arendt, em seu texto “A crise na educação”, esclarece que autoridade e qualificação do educador não são a mesma coisa, não são sinônimas:
Embora certa qualificação seja indispensável para a autoridade, a qualificação, por maior que seja, nunca engendra por si só autoridade. A qualificação do professor consiste em conhecer o mundo e ser capaz de instruir os outros acerca deste, porém sua autoridade se assenta na responsabilidade que assume por esse mundo (ibidem).
Assim, a qualificação, entendida como conhecimento do mundo e competência em relação aos conteúdos ministrados, não conduz automaticamente à autoridade, uma vez que esta só se configura à medida que o professor assume responsabilidade, ou seja, que responde por seus atos em relação ao papel que assume enquanto representante do mundo. “A autoridade foi recusada pelos adultos, e isso somente pode significar uma coisa: que os adultos se recusam a assumir a responsabilidade pelo mundo ao qual trouxeram as crianças” (ibidem, p. 240). Para Arendt, autoridade não deve ser confundida com o autoritarismo dos países totalitários, a autoridade legítima implica assumir responsabilidade pelo devir das coisas, o que não vem ocorrendo na vida pública e política.
Para Arendt, é necessário um caráter conservador para a educação, mas não para a política. Na política, pressupõe‑se, por um lado, uma igualdade entre pessoas que já foram educadas e, por outro lado, que a conservação levaria à estagnação e destruição de algo que deve permanecer em devir. Em relação à educação, Arendt entende que a conservação é inerente à atividade educacional, uma vez que sua “[...] tarefa é sempre abrigar e proteger alguma coisa – a criançacontra o mundo, o mundo contra a criança, o novo contra o velho, o velho contra o novo” (ibidem, p. 242). E por que a educação deve ser conservadora? Arendt explica o caráter dialético de tal situação:
Exatamente em beneficio daquilo que é novo e revolucionário em cada criança é que a educação precisa ser conservadora; ela deve preservar essa novidade e introduzi‑la como algo novo em um mundo velho, que, por mais revolucionário que possa ser em suas ações, é sempre, do ponto de vista da geração seguinte, obsoleto e rente à destruição (ibidem, p. 243).
O fator complicador da educação moderna encontra‑se na dificuldade de preservar um mínimo de conservação necessária para a existência da própria educação. Segundo Arendt, há uma íntima conexão entre a crise da tradição e a crise da autoridade na educação. O professor é um ser que representa o passado, que faz a ligação entre o passado e o presente, entre o velho e o novo, e isso não é tarefa fácil. Tal situação não se apresentava aos antigos, que tinham o passado como modelo de excelência e a autoridade do professor encontrava apoio nesse passado.
O problema da educação moderna é uma crise em relação à autoridade e à tradição, a situação agora é outra e não adianta querer retomar o passado. Nas palavras de Arendt:
O problema da educação no mundo moderno está no fato de, por sua natureza, não poder abrir mão nem da autoridade nem da tradição, e ser obrigada, apesar disso, a caminhar em um mundo que não é estruturado nem pela autoridade nem tampouco mantido coeso pela tradição (ibidem, p. 246).
Assim, Arendt propõe que não só educadores e professores, mas adultos de um modo geral, devam ter uma relação apropriada com crianças e jovens, que faça uso da autoridade e da tradição especifica para eles. Nas suas palavras, 
[...] devemos ter em relação a eles uma atitude radicalmente diversa da que guardamos um para com o outro. Cumpre divorciarmos decisivamente o âmbito da educação dos demais e, acima de tudo, do âmbito da vida pública e política, para aplicar exclusivamente a ele um conceito de autoridade e uma atitude face ao passado que lhe são apropriados, mas não possuem validade geral, não devendo reclamar uma aplicação generalizada no mundo dos adultos (ibidem).
Para ela, a consequência prática dessa atitude “[...] seria uma compreensão bem clara de que a função da escola é ensinar as crianças como o mundo é, e não instruí‑las na arte de viver” (ibidem).
Também não se devem tratar as crianças como se fossem maduras, mas isso não significa separá‑las totalmente do mundo adulto, como se a infância tivesse uma autonomia em relação a ele.
Segundo Arendt, a relação entre adultos e crianças em geral não deve ser um problema exclusivo da pedagogia. Cabe a todos nós essa questão, já que habitamos um mundo comum, que é renovado pelo nascimento.
A educação é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele e, com tal gesto, salvá‑lo da ruina que seria inevitável não fosse a renovação e a vinda dos novos e dos jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá‑las do nosso mundo e abandoná‑las a seus próprios recursos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando‑as em vez disso com antecedência para a tarefa de renovar um mundo comum (ibidem, p. 247).
RESUMO
Sobre algumas teorias educacionais. Dentre elas, a tendência redentora, que tem uma visão otimista da educação em relação à sociedade. Concebe que a educação pode salvar a sociedade de suas mazelas sociais e, dessa forma, é criticada por sua ingenuidade.
Já a tendência reprodutivista, tem uma visão critica em relação ao papel da educação na sociedade, mas não vê alternativa para a escola senão a reprodução do sistema, portanto, a visão crítica se une a uma postura pessimista. Por fim, conhecemos a tendência transformadora, que tem uma visão crítica em relação ao papel da educação na sociedade, mas não concebe a escola como condenada à reprodução do sistema. Entende que ela pode colaborar para conservar, mas também para transformar a sociedade.
Também estudamos sobre alguns tipos de pedagogia, como a pedagogia diretiva, na qual o professor é o centro do processo de conhecimento. Ele é o portador da informação que deve ser transmitida aos alunos. À epistemologia que sustenta essa prática é o empirismo. Nessa concepção, o indivíduo nasce como uma folha em branco que será preenchida no seu contato com o meio físico e social. Na escola quem representa os conhecimentos, conteúdos e valores a serem transmitidos são os professores.
Já na pedagogia não diretiva, o aluno é o centro do processo de conhecimento e o professor é um mediador, um facilitador da aprendizagem. O aluno é concebido como dotado de potencialidades inatas, pela sua bagagem genética, e cabe ao professor despertar o que cada um já tem em potência. O aluno aprende não porque o professor ensina, mas porque ele já nasceu com o dom de aprender, ou seja, a inteligência é algo dado a priori que nasce com o aluno e necessita ser desenvolvida.
E, por fim, na pedagogia relacional ou construtivista, os polos sujeito/objeto, aluno/professor não estão dicotomizados. Na pedagogia construtivista, o conhecimento é algo concebido como uma construção contínua, realizada na interação entre sujeito e objeto. Tanto a bagagem hereditária quanto o meio social são importantes para o processo de conhecimento, mas nenhum desses fatores pode assumir uma independência em relação ao outro.
No tema relativo à cultura, estudamos que, em um sentido amplo e antropológico, podemos entendê‑la como toda produção do ser humano na construção de sua existência, seja produção material ou espiritual. Discutimos que um dos desafios que a educação enfrenta é em relação à dialética conservação/transformação. É necessário refletir sobre quais elementos da cultura devem ser conservados, por que são valorizados e quais devem ser transformados por serem considerados ultrapassados.
O tema esclarecimento também foi tratado neste estudo. Para esta discussão, recorremos a Kant, que entende esclarecimento como a saída do homem da sua menoridade, ou seja, da sua condição de dependência em relação aos tutores. Para ele (Kant), de um modo geral, o próprio ser humano é culpado dessa menoridade. Há dois motivos principais de permanência nessa condição: preguiça e covardia. Discutimos o papel da educação e da filosofia para possibilitar a saída da condição de menoridade.
E, para concluir, abordamos algumas ideias de Hannah Arendt, para quem os educadores são os representantes do mundo. De acordo com a autora, eles fazem a ligação entre o passado e o presente, e devem estar aptos para preparar as crianças para o mundo. Educadores devem possuir qualificação e autoridade. Qualificação significa ter conhecimento profundo em relação ao conteúdo ministrado. Autoridade implica assumir a responsabilidade como representante do mundo. Educadores e adultos devem assumir
a responsabilidade pela preparação das novas gerações para que possam renovar o mundo.

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