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Resumo - A Psicologia no Brasil

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Prévia do material em texto

Ficha	catalográfica	elaborada	pela	Biblioteca	Reitora	Nadir	Gouvêa	Kfouri/PUC-SP
Antunes,	Mitsuko	Aparecida	Makino
				A	psicologia	no	Brasil:	leitura	histórica	sobre	sua	constituição	/	Mitsuko	Aparecida	Makino	Antunes.	5.	ed.	–	São	Paulo:	EDUC,	2014.
				Bibliografia.
	
				ISBN	978-85-283-0494-7
	
				1.	Psicologia	–	Brasil	–	História.	I.	Título.
	
	 CDD	150.981
	
	
Conselho	Editorial:	Anna	Maria	Marques	Cintra	(Presidente),	Cibele	Isaac	Saad	Rodrigues,	Ladislau	Dowbor,	Mary	Jane	Paris	Spink,
Maura	Pardini	Bicudo	Véras,	Norval	Baitello	Junior,	Rosa	Maria	B.	B.	de	Andrade	Nery,	Sonia	Barbosa	Camargo	Igliori.
	
	
	
	
EDUC	–	Editora	da	PUC-SP
	
Direção:	Miguel	Wady	Chaia
Produção	Editorial:	Sonia	Montone
Revisão:	Siméia	Mello
Editoração	Eletrônica:	Waldir	Alves,	Gabriel	Moraes
Administração	e	Vendas:	Ronaldo	Decicino
Produção	do	ebook:	Schäffer	Editorial
	
	
	
Rua	Monte	Alegre,	984	–	Sala	S16
CEP	05014-901	–	São	Paulo	–	SP
Tel./Fax:	(11)	3670-8085	e	3670-8558
E-mail:	educ@pucsp.br	–	Site:	www.pucsp.br/educ
http://www.studioschaffer.com
http://www.pucsp.br/educ
A
Nena	e	Luís,	in	memoriam
Ana	Carolina
e	Hermenegildo
Sumário
Apresentação
Introdução
PARTE	I
Antecedentes
Capítulo	1
A	preocupação	com	os	fenômenos	psicológicos	no	período	colonial
Capítulo	2
A	preocupação	com	os	fenômenos	psicológicos	no	século	XIX
2.1.	O	Pensamento	Psicológico	na	Educação
2.2.	O	Pensamento	Psicológico	na	Medicina
2.3.	À	Guisa	de	Síntese
PARTE	II
A	psicologia	científica	e	seu	processo	de	autonomização	no	Brasil
Capítulo	1
A	psicologia	em	instituições	médicas
1.1.	Os	hospícios	e	algumas	instituições	correlatas
1.2.	Medicina	Legal,	Psiquiatria	Forense	e	Criminologia
1.3.	Teses	de	Doutoramento	das	Faculdades	de	Medicina
1.4.	À	Guisa	de	Síntese
Capítulo	2
A	Psicologia	em	Instituições	Educacionais
2.1.	Algumas	instituições	educacionais
2.2.	A	Psicologia	nas	obras	pedagógicas	e	psicológicas
2.3.	À	Guisa	de	Síntese
Capítulo	3
A	Psicologia	na	organização	do	trabalho
PARTE	III
Conclusão
APÊNDICE
BIBLIOGRAFIA	CITADA
E
Apresentação
ste	é	um	excelente	livro.	Serve	a	muitos	e	diferentes	leitores,	de	estudantes	e	profissionais	da	área	de
Psicologia	 a	 simples	 interessados	 em	 psicologia	 e	 história	 do	 Brasil.	 Tem	 um	 objeto	 claro	 –	 a
história	da	Psicologia	no	Brasil	–,	mas	que	resulta	de	cuidadosa	pesquisa	baseada	no	princípio	segundo	o
qual	 uma	 “abordagem	 social”	 nesta	 área	 possibilita	 a	 apreensão	 do	 diálogo	que	 se	 estabelece	 entre	 a
Psicologia	 e	 a	 formação	 social	 na	 qual	 ela	 se	 produz,	 considerado	 o	 conhecimento	 como	 produto
fundamentalmente	histórico	e	 social.	Por	outro	 lado,	 é	apresentada	em	 texto	bem	escrito	e	muito	vivo,
envolvente,	o	que	o	torna	de	fácil	e	agradável	leitura.
Particularmente,	 é	 um	 excelente	 livro	 para	 professores	 e	 es​​tu​dantes	 em	 História	 da	 Psicologia.
Acostumados	a	conhecer	a	história	da	psicologia	em	manuais	escritos	a	partir	de	ou	para	cursos	na	área,
mesmo	assim	em	geral	apenas	os	traduzidos	e,	entre	estes,	mais	freqüentemente	aqueles	escolhidos	para
atender	 ao	 entendimento	 da	 área	 como	 um	 conjunto	 de	 teorias	 e	 sistemas	 em	 psicologia,	 os	 leitores
encontrarão	neste	livro	duas	importantes	novidades.
A	primeira	tem	a	ver	com	a	questão:	de	onde	começar?	Repassando	a	história	desta	História,	desde
o	Baldwin,	de	1913,	ou	o	Brett,	de	1921,	mas	também	a	maioria	dos	livros	escritos	especialmente	como
literatura	pedagógica	 (Brock,	1998)	–,	 encontramos	uma	Psicologia	que	 freqüentemente	começa	na	era
pré-socrática.	 Mas	 há	 quem	 entenda	 que,	 para	 melhor	 compreendê-la,	 é	 preciso	 ir	 mais	 longe,
encontrando	suas	raízes	no	pensamento	oriental	que	a	precedeu.	Este	livro	pode	atender	a	uma	proposta
diferente:	por	que	não	começar	de	onde	estamos?	É	o	que	Mitsuko	nos	traz	neste	livro:	uma	história	da
Psicologia	no	Brasil.
A	 segunda	novidade	 responde	a	uma	questão	 relacionada	ao	objetivo	mesmo	do	ensino	 superior.
Como	estudar?	Este	livro	corresponde	a	uma	particular	maneira	de	entendê-la.	Trabalhando	diretamente
com	pesquisa	na	área,	professor	e	aluno	familiarizam-se	com	o	fazer	histórico,	preparando-se	para	 ler
criticamente	qualquer	livro	em	história	da	psicologia.
Em	 linguagem	 muito	 agradável,	 a	 autora	 –	 apaixonada	 pesquisadora	 do	 tema	 –	 leva	 o	 leitor	 a
compreender	como	a	Psicologia	conquistou	seu	espaço	próprio	como	área	de	conhecimento	e	campo	de
práticas	no	Brasil.	E	o	faz	pesquisando	não	só	o	desenvolvimento	de	idéias	e	práticas	psicológicas	e	suas
bases	epistemológicas,	como	os	fatores	contextuais	–	sociais,	políticos,	culturais,	no	interior	dos	quais
esta	história	se	constrói.
Finalmente,	 cabe	 lembrar	 que,	 correspondendo	 a	 uma	 expecta-tiva	 da	 autora,	 este	 livro	 deve
contribuir	também	para	estimular	novos	estudos	na	área,	para	o	que	muito	concorrerá	uma	cronologia	de
fatos	significativos	que,	em	Apêndice,	completa	a	obra.
Maria	do	Carmo	Guedes
BALDWIN,	J.	M.	(1913).	A	history	of	Psychology:	a	sketch	and	a	 interpretation	(2	vols.).	New	York,
Putnan.
BRETT,	G.	S.	(1912-1921).	A	history	of	Psychology	(3	vols.).	New	York,	Macmillan.
BROCK,	 A.	 (1998).	 Pedagogia	 e	 pesquisa.	 The	 Psychologist	 (Bulletin	 of	 The	 British	 Psychological
Society),	vol.11,	n.4	(Special	issue	“History	and	philosophy.	Out	of	margins”),	p.	169/72.
A
Introdução
psicologia	 constitui-se	 numa	 ciência	 que,	 reconhecidamente,	 tem	 exercido	 uma	 função	 social	 de
grande	 relevância,	 quer	 como	 área	 de	 conhecimento	 que	 tem	 contribuído	 para	 ampliar	 a
compreensão	 dos	 problemas	 humanos,	 quer	 como	 campo	de	 atuação	 cada	 vez	mais	 vasto	 e	 efetivo	 na
intervenção	sobre	estes.
No	mundo	atual,	o	desenvolvimento	científico	e	tecnológico	tem	alcançado	patamares	nunca	antes
imaginados.	Tempo	e	espaço	adquirem	novos	significados	com	a	eliminação	das	distâncias	pelas	redes
informatizadas.	Novos	conhecimentos	vêm	transformar	profundamente	a	estrutura	produtiva,	a	educação,
a	assistência	à	 saúde,	 as	artes,	 as	 relações	humanas.	Alguns	velhos	problemas,	no	entanto,	não	apenas
permanecem	como	tendem	a	agravar-se:	a	miséria,	a	exclusão	social,	a	violência,	a	limitação	do	acesso
ao	 saber	 e	 à	 saúde,	 o	 desemprego,	 a	 xenofobia,	 o	 racismo,	 as	 guerras	 imperialistas,	 a	 escassez	 de
perspectivas	existenciais.
Nesse	panorama,	os	problemas	do	presente	e	os	que	vislumbramos	para	um	futuro	próximo	impõem
à	Psicologia	 tarefas	cada	vez	maiores	e	mais	desafiadoras;	disso	decorre	a	 imperativa	necessidade	de
reflexão	sobre	seu	significado	e	sua	responsabilidade	na	construção	do	devir	histórico.
É	preciso,	pois,	que	tenhamos	uma	compreensão	mais	ampla	da	Psicologia	e	de	sua	relação	com	a
sociedade;	nesse	quadro,	o	conhecimento	da	História	da	Psicologia	torna-se	particularmente	importante.
A	compreensão	do	processo	de	construção	histórica	de	uma	área	de	conhecimento	é	tão	imprescindível
quanto	o	conteúdo	de	suas	teorias	e	o	domínio	de	suas	técnicas	que,	tomados	atem-poralmente,	são	meros
fragmentos	de	uma	totalidade	que	não	se	consegue	efetivamente	apreender.
Para	se	compreender	a	Psicologia	como	construção	histórica	devem	ser	considerados	três	aspectos:
o	desenvolvimento	específico	das	 idéias	 e	práticas	psicológicas,	 sua	base	epistemológica	e	os	 fatores
contextuais	 (aspectos	estes	 só	 separáveis	como	 recurso	didático).	O	conhecimento	de	 tais	 elementos	 é
condição	 necessária	 para	 uma	 reflexão	 profunda	 e	 para	 o	 estabelecimento	 de	 parâmetros	 a	 fim	 de
responder	aos	desafios	que	se	colocam	hoje	para	esta	ciência.
Paradoxalmente,	pouco	se	tem	investido	em	estudos	e	na	difusão	desse	conhecimento.	A	História	da
Psicologia	em	geral	e	da	História	da	Psicologia	no	Brasil	em	particular	têm	sido	relegadas	a	um	plano
secundário.	 Poucos	 são	 os	 cursos	 de	 Psicologia	 que	 têm	 essa	 disciplina	 em	 seu	 currículo,	 são	 ainda
escassos	 os	 estudos	 e	 pesquisas	 nessa	 área	 e	 a	 bibliografia	 é	 restrita.	 Essa	 situação	 agrava-se
sensivelmente	 quandoa	 referência	 é	 a	 História	 da	 Psicologia	 no	 Brasil.	 É	 possível	 afirmar	 que	 é
generalizado	 o	 desconhecimento	 do	 processo	 de	 construção	 histórica	 da	 Psicologia	 em	 nosso	 país,
reflexo	possível	do	próprio	desconhecimento	da	História	do	Brasil	pela	maioria	da	população	brasileira.
Esse	quadro	começa	a	se	alterar	com	o	incremento	de	pesquisas	na	área,	particularmente	por	núcleos	e
grupos	de	pesquisadores	de	várias	universidades	brasileiras,	na	sua	maioria	pertencentes	ao	Grupo	de
Trabalho	 em	 História	 da	 Psicologia	 da	 Associação	 Nacional	 de	 Pesquisa	 e	 Pós-Graduação	 em
Psicologia	–	ANPEPP.
Dessa	 constatação	 originou-se	 a	 motivação	 para	 o	 empreendimento	 do	 presente	 trabalho,
inicialmente	 elaborado	 como	 tese	 de	 doutoramento1.	 Buscou-se	 compreender	 como	 a	 Psicologia
conquistou	seu	espaço	próprio	como	área	de	conhecimento	e	campo	de	práticas	no	Brasil,	atingindo	sua
autonomia	e	reconhecimento	como	ciência	específica,	em	conseqüência	da	produção	de	idéias	e	práticas
psicológicas	 no	 interior	 de	 outras	 áreas	 do	 saber.	 Assim,	 o	 foco	 desta	 obra	 incide	 de	 maneira	 mais
privilegiada	no	período	que	vai	da	última	década	do	século	XIX	à	terceira	década	do	século	XX;	perío​-
do	 de	 grandes	 transformações	 sociais,	 econômicas	 e	 políticas	 no	 Brasil	 e,	 particularmente,	 de
significativa	produção	cultural.
Para	 dar	 sustentação	 histórica	 a	 este	 estudo,	 procurou-se	 ex​pli​citar	 seus	 antecedentes,	 isto	 é,	 as
bases	sobre	as	quais	a	Psicologia	conquistou	sua	autonomia	no	Brasil.	Nesse	quadro,	os	conteúdos	serão
apresentados	 em	 partes,	 a	 saber:	 Parte	 I:	 Antecedentes,	 composta	 por	 dois	 capítulos	 referentes	 à
produção	 psicológica	 no	 período	 colonial	 e	 no	 século	 XIX;	 Parte	 II:	 A	 conquista	 da	 autonomia	 da
Psicologia	no	Brasil,	composta	por	três	capítulos	referentes	à	produção	de	conhecimento	psicológico	por
instituições	médicas,	instituições	educacionais	e	pela	aplicação	da	Psicologia	à	organização	do	trabalho;
Parte	 III:	Conclusão	e	um	apêndice,	composto	por	uma	cronologia	dos	 fatos	mais	significativos	para	a
História	da	Psicologia	no	Brasil	–	1890	/	1930.
Deve-se	destacar	ainda	a	impossibilidade	da	escrita	da	história	ser	definitiva,	sobretudo	quando	os
estudos	 são	 iniciais,	 como	é	 este.	Em	outras	 palavras,	 o	 processo	 será	 sempre	 inacabado	 e	 a	 história
deverá	ser	continuamente	escrita.	Nesse	sentido,	solicita-se	a	todos	aqueles	que	puderem	contribuir	com
sugestões,	correções,	críticas	e	dados	/	fontes	para	o	desenvolvimento	deste	e	de	outros	trabalhos	nessa
área,	que	o	remetam	à	autora	que,	desde	já,	se	manifesta	profundamente	agradecida.
Pretende-se,	assim,	que	este	trabalho	possa	contribuir,	naquilo	que	lhe	cabe,	para	ampliar	o	pouco
conhecimento	que	se	tem	sobre	a	Psicologia	no	Brasil.	Não	há,	pois,	a	pretensão	de	esgotar	o	assunto	ou
considerá-lo	definitivo,	uma	vez	que,	desde	o	início,	a	pesquisa	apontava	para	a	imensidão	de	estudos	a
serem	feitos	nesse	campo	praticamente	intocado.
Há,	no	entanto,	na	publicação	deste	trabalho,	a	imodesta	ex​pec​tativa	de	que	ele	possa	estimular	o
debate	e	a	produção	de	novos	estudos	e	pesquisas	na	área.
1	 ANTUNES,	M.	 A.	M.	O	 processo	 de	 autonomização	 da	 Psicologia	 no	 Brasil	 –	 1890/1930:	 uma	 contribuição	 aos	 estudos	 em
História	da	Psicologia.	São	Paulo,	tese	de	doutoramento,	Psicologia	Social	PUC/SP,	1991.
Parte	I
A
Antecedentes
finalidade	 desta	 parte	 é	 expor	 brevemente	 a	 preocupação	 com	 os	 fenômenos	 psicológicos	 no
período	 anterior	 à	 penetração	 da	 Psicologia	 científica	 no	 Brasil.	 Falaremos	 em	 pensamento
psicológico	 e	 não	 em	 Psicologia,	 sendo	 esta	 última	 expressão	 utilizada	 para	 se	 refe​rir	 à	 ciência
psicológica.	 Deve-se	 lembrar	 que	 a	 Psicologia	 alcançou	 o	 estatuto	 de	 ciência	 autônoma	 somente	 no
último	quartel	do	século	XIX,	tendo	como	marco	o	estabelecimento	de	sua	definição,	objeto	de	estudo,
métodos	 e	 objetivos	 por	 Wilhelm	Wundt,	 na	 Alemanha,	 segundo	 interpretação	 de	 vários	 autores	 em
História	da	Psicologia.
A	 preocupação	 com	 os	 fenômenos	 psicológicos	 faz-se	 presente	 no	 Brasil	 desde	 os	 tempos	 da
colônia,	aparecendo	em	obras	escritas	nas	diferentes	áreas	do	saber	e,	mais	tarde,	durante	o	século	XIX,
em	produções	advindas	de	instituições	como	faculdades	de	medicina,	hospícios,	escolas	e	seminários.
A	abordagem	desses	antecedentes	tem	por	objetivo	demonstrar	como	o	pensamento	psicológico	foi
produzido	por	outras	áreas	do	saber,	sendo	que	seu	desenvolvimento	no	seio	destas	foi	fundamental	para
a	absorção	dos	avanços	que,	no	final	do	século	passado,	os	estudos	psicológicos	alcançaram	na	Europa.
Criaram-se	 assim	 as	 condições	 para	 a	 penetração	 e	 conseqüente	 desenvolvimento	 da	 Psicologia	 no
Brasil,	a	qual	permaneceu	ligada	a	outras	áreas	do	saber	por	muitos	anos	ainda,	e	só	gradativamente	foi
delas	se	se​pa​​rando	e	assumindo	seu	espaço	próprio.
A
Capítulo	1
A	preocupação	com	os	fenômenos	psicológicos	no
período	colonial
lgumas	 informações	 sobre	 o	 pensamento	 psicológico	 produzido	 no	 período	 colonial	 podiam	 ser
encontradas	 no	 artigo	 de	 Samuel	 Pfromm	Netto,	 intitulado	 “A	 Psicologia	 no	Brasil”2.	 Entretanto,
somente	 a	 pesquisa	 pioneira	 realizada	 por	 Marina	 Massimi3,	 concluída	 em	 1984,	 trouxe	 extenso	 e
minucioso	 estudo	 sobre	 essa	 temática.	 Com	 base	 nesse	 trabalho,	 procuraremos,	 neste	 capítulo,	 tão
somente	 traçar	 uma	 breve	 caracterização	 da	 produção	 referente	 aos	 fenômenos	 psicológicos	 nesse
período.
As	mais	antigas	bases	sobre	as	quais,	mais	tarde,	veio	a	Psicologia	a	se	estabelecer	no	Brasil	são
reveladas	 pelo	 pensamento	 psicológico	 produzido	 nesse	 momento,	 denominado	 por	 Pessotti4	 como
período	pré-institucional	da	Psicologia,	por	não	 terem	as	obras	então	produzidas	vínculos	diretos	com
instituições	específicas,	como	viria	a	acontecer	posteriormente.
A	 preocupação	 com	 os	 fenômenos	 psicológicos	 aparece	 em	 obras	 oriundas	 de	 outras	 áreas	 do
saber,	tais	como:	Teologia,	Moral,	Pedagogia,	Medicina,	Política	e	até	mesmo	Arquitetura;	encontram-se,
nestas,	partes	dedicadas	ao	estudo,	análise	e	discussão	de	formas	de	atuação	sobre	os	fatos	psíquicos.
Os	autores	são	brasileiros,	com	exceção	de	alguns	que,	embora	tenham	nascido	em	Portugal,	aqui
passaram	a	maior	parte	de	 suas	vidas.	Em	geral,	 tiveram	 formação	 jesuítica	 e	 cursaram	universidades
européias,	 particularmente	 a	 Universidade	 de	 Coimbra.	 A	 maioria	 desses	 autores	 exercia	 função
religiosa	—	 eram	 preponderantemente	 jesuítas	 –	 ou	 política,	 tendo	 vários	 deles	 ocupado	 importantes
cargos	na	colônia	ou	na	metrópole.
As	obras	são	impressas	na	Europa,	sobretudo	em	Portugal,	pois	ainda	não	havia	imprensa	no	Brasil.
Encontram-se	nessas	obras	preocupações	com	os	seguintes	temas:	emoções,	sentidos,	auto-conhecimento,
educação	 de	 crianças	 e	 jovens,	 características	 do	 sexo	 feminino,	 trabalho,	 adaptação	 ao	 ambiente,
processos	psicológicos,	diferenças	raciais,	aculturação	e	técnicas	de	persuasão	de	“selvagens”,	controle
político	e	aplicação	do	conhecimento	psicológico	à	prática	médica5.
São	 encontradas	 referências	 sobre	 emoções	 e	 prática	 de	 seu	 controle	 ou	 “cura”,	 geralmente	 em
sermões	de	edificação	ético-religiosa,	de	autores	como	Padre	Vieira,	Frei	Mateus	da	Encarnação	Pinna	e
Padre	Angelo	Ribeiro	de	Sequeira;	em	obras	de	Filosofia	Moral,	como	a	de	Mathias	Aires	Ramos	da
Silva	de	Eça,	e	obras	médicas,	como	as	de	Francisco	de	Mello	Franco.	Tais	obras	apontam	para	análises
de	âmbito	comportamental	e	 tratam	de	assuntos	como:	amor,	 saudade,	vaidade,	ódio	ou	 tristeza.	Sobre
isso,	Massimi	 (1987,	 p.	 100)	 afirma:	“As	 emoções,	 chamadas	 de	 ‘paixões’,	 são	 consideradas	 pelos
autores	 ‘forças’	 potentes	 e	 cegas	 que,	 se	 excessivas,	 podem	 afetar	 o	 equilíbrio	 do	 organismo,
tornando-se	‘enfermidades’.”
Sob	diferentes	 enfoques,	 escreveram	sobre	o	 “conhecimentode	 si”,	 autores	 como	Padre	Vieira	 e
Encarnação	 Pinna	 (obtenção	 de	 conhecimento	 de	 si	 pelo	 sujeito),	 Azeredo	 Coutinho	 (objetivação	 da
experiência	interior)	e	Mathias	Aires	(estudo	da	vaidade,	com	base	no	auto-conhecimento).	Essa	temática
guarda	 íntima	 relação	 com	 questões	 posteriormente	 abordadas	 pela	 Psicologia,	 sendo	 o	 auto-
conhecimento	assunto	que	permanece	como	objetivo	da	ciência	psicológica	e	de	sua	prática,	enquanto	a
preocupação	com	a	“objetivação	da	experiência	interior”	constitui	ainda	hoje	uma	questão	fundamental
para	a	pesquisa	psicológica.
As	sensações	e	os	sentidos	foram	abordados	principalmente	no	século	XVIII	e	tiveram	relação	com
o	desenvolvimento	das	idéias	empiristas.	Muitos	dos	estudos	então	realizados	valeram-se	da	observação
e	 até	 mesmo	 de	 resultados	 obtidos	 pela	 experimentação.	 Nesses	 estudos,	 temas	 característicos	 da
Psicologia	 que	 viria	 a	 se	 desenvolver	 já	 estavam	 prenunciados:	 loucura,	 fatores	 de	 natureza	 sexual,
fantasias,	instintos	e	ilusão	de	ótica.	Trataram	desses	assuntos:	Padre	Vieira,	Encarnação	Pinna,	Mathias
Aires,	Sequeira	e	Mello	Franco.
A	pesquisa	de	Massini	revela	que	foram	freqüentes	e	recorrentes	as	preocupações	com	a	criança	e
seu	 processo	 educativo,	 tendo	 sido	 encontrados	 os	 seguintes	 temas:	 formação	 da	 personalidade;
desenvolvimento	 da	 criança;	 controle	 e	manipulação	 do	 comportamento;	 aprendizagem;	 influência	 dos
pais	etc.	Trataram	desse	tema:	Alexandre	de	Gusmão,	Mathias	Aires,	Mello	Franco,	Americus,	Manoel
de	Andrade	Figueiredo,	Azeredo	Coutinho	e	Fernão	Cardim.
O	 papel	 da	 mulher	 foi	 também	 abordado	 por	 diversos	 autores,	 como:	 Feliciano	 Souza	 Nunes,
Alexandre	de	Gusmão,	Azeredo	Coutinho	e	Mello	Franco.	Várias	obras	 tratam	do	papel	da	mulher	na
sociedade,	 abordando	 elementos	 de	 natureza	 psicológica	 ou	 a	 eles	 relacionados,	 tais	 como:	 gravidez,
amamentação,	comportamento	maternal,	sexualidade	e	seus	desvios.	Segundo	Massimi	(1984,	p.	272):
“...	O	interesse	pela	psicologia	da	mulher	nasce	como	parte	da	tentativa	de	definição	do	papel	da
mulher	na	sociedade	colonial	e	pós-colonial.	Há	uma	diferença	muito	grande	entre	a	função	ou
valores	atribuídos	à	mulher	índia	e	os	que	se	atribuem	à	mulher	‘colonizada’	de	acordo	com	os
hábitos	da	cultura	portuguesa.”
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Farela
Vale	a	pena	destacar,	no	trabalho	de	Massimi,	a	referência	às	idéias	de	Alexandre	de	Gusmão,	que
defende	 a	 instrução	 feminina;	 de	 Feliciano	 de	 Souza	 Nunes,	 que	 refuta	 a	 afirmação	 corrente	 sobre	 a
inferioridade	mental	da	mulher	e	de	Azeredo	Coutinho	que	desenvolve	uma	metodologia	específica	para
a	 instrução	 feminina,	 nos	 “Estatutos	 do	Recolhimento	 de	Nossa	 Senhora	 da	Glória”,	 primeiro	 colégio
feminino	 brasileiro,	 fundado	 em	 1802	 e	 que	 custou	 a	 seu	 idealizador	 a	 retirada	 compulsória	 para
Portugal.
Várias	 obras	 estudadas	 por	Massimi	 abordam	 a	 problemática	 do	 trabalho,	 principalmente	 sob	 a
perspectiva	 moral,	 social	 e	 psicológica.	 É	 recorrente	 a	 condenação	 do	 ócio,	 especialmente	 nas	 suas
relações	 com	 o	 vício,	 ao	 qual	 o	 trabalho	 se	 contrapõe.	 Nessa	 questão,	 o	 indígena	 é	 especialmente
considerado,	sendo	visto	como	preguiçoso	e	ocioso	e,	por	isso,	propenso	ao	pecado;	nessa	perspectiva,	o
trabalho	é	visto	como	meio	de	cura	e	instrumento	para	sua	“civilização”.	São	discutidas	questões	sobre:
adaptação	 ao	 trabalho,	 importância	do	 trabalho	para	 a	 criança,	 controle	 sobre	 a	 atividade	produtiva	 e
trabalho	como	instrumento	de	controle.	Mello	Franco,	Alexandre	de	Gusmão	e	Mathias	Aires	são	autores
que	abordam	esse	tema.
O	tema	“adaptação	ao	ambiente”	aborda	a	questão	do	“caráter	brasileiro”,	o	que	pode	prenunciar
elementos	relacionados	à	Psicologia	Social.	Para	vários	autores,	o	ambiente	é	considerado	como	um	dos
fatores	 determinantes	 do	 comportamento;	 para	 Padre	 Vieira,	 o	 clima	 brasileiro	 favorece	 o	 ócio	 e	 a
dissimulação,	assim	como	para	Mello	Franco,	para	quem	a	natureza	dispensa	o	homem	da	luta,	levando-o
ao	 ócio.	 Concepções	 como	 estas	 serão	 freqüentes	 até	 meados	 do	 século	 XX	 e	 terão	 relações	 muito
próximas	com	o	pensamento	psicológico-psiquiátrico	desenvolvido	no	Brasil.	Ainda	sob	esse	tema	são
abordadas	questões	relativas	à	aculturação	e	ao	aprimoramento	do	domínio	sobre	os	índios.
A	 aplicação	 de	 conhecimentos	 psicológicos	 à	 Medicina	 é	 tema	 tratado	 já	 no	 final	 do	 período
colonial	 por	 Mello	 Franco,	 o	 qual	 aborda	 questões	 relativas	 a:	 teorias	 sobre	 relação	 mente-corpo;
estudos	sobre	os	nervos	e	o	sistema	nervoso;	psicopatologia;	temperamentos;	terapêuticas;	teorias	sobre
o	sono	e	os	 sonhos	e,	vale	destacar,	dentre	 suas	contribuições,	a	concepção	a	 respeito	da	 sexualidade
como	determinante	da	loucura.
O	processo	de	colonização	do	Brasil	por	Portugal,	no	contexto	da	expansão	econômica	européia,	foi
pautado	fundamentalmente	na	exploração.	A	metrópole	decidia	o	que	deveria	ser	produzido,	a	maneira	de
fazê-lo	e	tinha	seu	monopólio,	tendo	como	finalidade	exclusiva	o	lucro.	Não	houve	preocupação	de	fato
com	a	colonização	propriamente	dita,	o	que	caracteriza	o	Brasil	meramente	como	colônia	de	exploração.
Essa	 situação	 exigiu	 a	 organização	 de	 um	 forte	 aparelho	 repressivo	 de	 um	 lado	 e,	 de	 outro,	 um
sólido	 aparato	 ideológico,	 sustentado	 principalmente	 pela	 Igreja	 Católica,	 cuja	 função	 precípua	 era
transmitir	e	manter	uma	ideologia	que,	em	última	instância,	legitimasse	a	exploração	da	colônia.
Nesse	contexto,	a	Companhia	de	Jesus	exerceu	papel	fundamental	e	manteve	sua	influência	mesmo
após	sua	expulsão	de	Portugal	e,	conseqüentemente,	do	Brasil,	pelas	Reformas	Pombalinas.
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A	articulação	entre	o	pensamento	psicológico	produzido	no	Brasil	 e	os	 interesses	metropolitanos
revela-se	 em	 muitos	 dos	 conteúdos	 das	 obras	 estudadas	 por	 Massimi.	 Destes,	 deve-se	 destacar	 a
preocupação	com	os	índios,	sobretudo	no	que	diz	respeito	ao	trabalho	e	à	aculturação.	Soma-se	a	isso	a
preocupação	com	o	controle	ou	“cura”	das	emoções	que,	em	algumas	obras,	sugere	a	busca	de	soluções
para	 problemas	 enfrentados	 pela	 colônia,	 cuja	 natureza	 era	 fundamentalmente	 de	 ordem	 moral.	 As
preocupações	 com	 a	 educação	 eram	 também	 relacionadas	 aos	 interesses	 metropolitanos,	 quer	 pela
difusão	da	ideologia	dominante,	quer	pela	necessidade	de	formação	de	quadros	destinados	à	organização
da	empresa	colonial.
Entretanto,	 se	 de	 um	 lado	 é	 patente	 a	 condição	 de	 dependência	 do	 pensamento	 psicológico
produzido	 no	 Brasil	 em	 relação	 aos	 interesses	 metropolitanos,	 por	 outro	 lado	 é	 impossível	 negar	 o
caráter	 de	 originalidade	 em	 muitas	 obras,	 particularmente	 no	 que	 se	 refere	 às	 idéias	 psicológicas
propriamente	 ditas,	 o	 que	 pode	 ser	 constatado	 em	 muitos	 elementos	 apontados	 por	 Massimi	 em	 sua
pesquisa.	 Destes,	 vale	 destacar	 os	 prenúncios	 da	 psicoterapia,	 os	 estudos	 sobre	 as	 crianças	 e	 sua
educação,	 a	 determinação	 do	 ambiente	 sobre	 o	 comportamento,	 as	 concepções	 contrárias	 à	 completa
submissão	da	mulher,	 sobretudo	o	 reconhecimento	da	capacidade	 intelectual	 feminina	e,	 finalmente,	 as
relações	entre	a	prática	médica	e	o	saber	psicológico.
Percebe-se,	 assim,	 que	 a	 produção	 de	 idéias	 psicológicas	 na	 colônia	 refletia	 as	 contradições	 da
sociedade	 colonial	 e,	 por	 decorrência,	 da	 metrópole,	 na	 medida	 em	 que	 a	 primeira	 constituía-se	 em
função	 das	 relações	 determinadas	 pela	 segunda.	Nesse	 sentido,	 é	 possível	 compreender	 que	 as	 idéias
psicológicas	 produzidas	 apresentassem	 concomitantemente	 articulações	 com	 os	 interesses
metropolitanos,	posições	de	confronto	com	estes	e,	por	outro	lado,	originalidade	do	ponto	de	vista	dos
estudos	psicológicos.	Essas	idéias	são	faces	de	umamesma	realidade,	pois	refletem	as	contradições	da
formação	 social	 em	 questão.	 Assim,	 é	 possível	 compreender	 a	 originalidade	 de	 várias	 idéias
psicológicas	 como	 tendo	 surgido	 do	 fato	 de	 que,	 em	 busca	 de	 soluções	 para	 alguns	 problemas,	 a
criatividade	tornou-se	um	imperativo;	as	necessidades	impostas	pela	realidade	exigiram	soluções	que,	ao
mesmo	 tempo	 que	 buscavam	 a	 manutenção	 da	 ordem	 estabelecida,	 também	 se	 constituíam	 em	 forças
impulsionadoras	 do	 real	 em	 direção	 ao	 futuro,	 ou	 ainda,	 poderiam	 estar	 articuladas	 às	 forças	 que
colocavam	em	questão	o	próprio	“status	quo”,	no	sentido	da	busca	de	uma	nova	ordem,	o	que	pode	ser
confirmado	 pelo	 fato	 de	 que	 vários	 autores	 estudados	 por	Massimi	 tiveram	 em	 uma	 ou	 outra	 ocasião
problemas	com	o	poder	metropolitano	ou	com	a	Inquisição.
O	 pensamento	 psicológico	 produzido	 no	 período	 colonial	 é	 de	 extrema	 importância	 para	 a
compreensão	 da	 construção	 histórica	 da	 Psicologia	 no	Brasil,	 pois	 explicita	 suas	mais	 antigas	 raízes,
muitas	das	quais	referentes	a	assuntos	que	permaneceram	em	pauta,	às	vezes	com	profundas	mudanças	nas
formas	 de	 abordagem	 e	 outras	 vezes	mantendo,	 ao	 longo	 do	 tempo,	 sua	 forma	 e	 conteúdo,	 como	 será
demonstrado	adiante.
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2	PFROMM	NETTO,	S.	A	Psicologia	no	Brasil,	in:	FERRI,	M.	G.	e	MOTOYAMA,	S.	(orgs.)	História	das	Ciências	no	Brasil.	São	Paulo,
EPU	e	EDUSP,	1978-1981,	pp.	325/276.
3	MASSIMI,	M.	História	das	 Idéias	Psicológicas	no	Brasil	 em	obras	do	período	colonial.	São	Paulo,	dissertação	de	mestrado,	USP,
1984.
4	PESSOTTI,	I.	Notas	para	uma	História	da	Psicologia	brasileira,	in:	Quem	é	o	psicólogo	bra​sileiro?	São	Paulo,	Edicon	e	CFP,	1988,	pp.
17/31.
5	Sugere-se	também	a	leitura	de:	MASSIMI,	M.	História	da	Psicologia	Brasileira.	São	Paulo,	EPU,	1990	e	MASSIMI,	M.	As	origens	da
psicologia	brasileira	em	obras	do	período	colonial,	in:	História	da	Psicologia	–	Cadernos	PUC,	nº	23.	São	Paulo,	EDUC,	1987,	pp.	95/117.
O
Capítulo	2
A	preocupação	com	os	fenômenos	psicológicos	no
século	XIX
Brasil	sofreu	grandes	mudanças	no	século	XIX,	deixando	a	condição	de	colônia	e	transformando-se
em	império,	ainda	que	se	mantendo	sob	o	poder	da	realeza	portuguesa.	A	condição	de	autonomia,
mesmo	que	 relativa,	 trouxe	profundas	 transformações	à	sociedade	brasileira,	entre	as	quais	 incluem-se
significativas	mudanças	no	 plano	 cultural,	 inserindo-se	 aí	 a	 produção	de	 idéias	 e	 práticas	 de	 natureza
psicológica.	 Nesse	 contexto,	 o	 pensamento	 psicológico	 produzido	 nesse	 período	 diferenciou-se	 do
precedente,	 particularmente	 pela	 vinculação	 às	 instituições	 então	 criadas.	 A	 produção	 do	 saber
psicológico	ainda	foi	gerada,	no	entanto,	no	interior	de	outras	áreas	de	conhecimento,	fundamentalmente
na	Medicina	e	na	Educação,	que	serão	tratadas	a	seguir,	tendo	em	vista	a	explicitação	da	maneira	como
se	deu,	a	partir	delas,	o	de​sen​volvimento	do	pensamento	psicológico	no	período	em	questão.
Para	 melhor	 organizar	 a	 exposição,	 dividiu-se	 este	 capítulo	 em	 duas	 partes:	 o	 pensamento
psicológico	na	Educação	e	o	pensamento	psicológico	na	Medicina.	No	primeiro	item	serão	abordados	os
aspectos	gerais	da	Educação	no	período,	os	conteúdos	psicológicos	no	ensino	e	as	idéias	psicológicas	na
Pedagogia.	Em	relação	à	Medicina,	serão	abordadas	as	produções	relativas	às	Faculdades	de	Medicina
do	Rio	de	Janeiro	e	da	Bahia,	do	Hospício	Pedro	II	e	do	Asilo	Provisório	de	Alienados	da	Cidade	de
São	Paulo.
2.1.	O	Pensamento	Psicológico	na	Educação
Preocupações	 com	 o	 processo	 educativo	 na	 colônia	 permaneceram	 no	 século	 XIX,	 guardando
muitas	 das	 características	 do	 período	precedente,	 porém,	 assumindo	um	caráter	mais	 sistemático,	 seja
pela	gradativa	vinculação	institucional,	seja	pela	maior	elaboração	no	trato	de	seus	conteúdos.
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Com	 a	 transferência	 da	 Corte	 para	 o	 Brasil,	 em	 1808,	 novas	 necessidades	 surgiram,	 tornando
necessária	a	formação	de	quadros	para	os	aparatos	repressivo	e	administrativo	do	governo,	demandando
uma	maior	preocupação	com	a	Educação	e	 com	o	ensino.	Assim,	pode-se	dizer	que	 foi	 a	partir	 desse
momento	que	 efetivamente	 foram	criados	 os	 cursos	 superiores	 no	país,	 embora	 tendo	 como	 finalidade
quase	 exclusiva	 a	 formação	 profissional,	 praticamente	 inexistindo	 preocupação	 com	 a	 produção	 de
conhecimento.	O	ensino	 secundário	manteve	 ainda	por	um	bom	 tempo	a	herança	das	 aulas	 avulsas,	 de
caráter	precipuamente	propedêutico,	voltado	para	o	ensino	quase	exclusivo	dos	alunos	do	sexo	masculino
e	sob	o	domínio	da	iniciativa	privada,	sobretudo	da	Igreja	Católica;	a	exceção	foi	o	Colégio	Pedro	II,	de
caráter	 universalista	 e	 enciclopédico,	 caracterizado	 por	 ser	 elitista	 e	 aristocrático,	 apesar	 de	 ter
finalidade	modelar.	Na	década	de	30	foi	criada,	em	Niterói,	a	primeira	Escola	Normal,	seguida	de	muitas
outras,	oferecendo	cursos	de	no	máximo	dois	anos,	sem	garantia	de	formação	profissional	e	com	docentes
pouco	preparados;	somente	em	1880,	em	São	Paulo,	o	curso	passou	para	três	anos	de	duração.	Em	1890,
no	Rio	de	Janeiro,	foi	criado	o	“Pedagogium”,	com	a	finalidade	de	constituir-se	em	centro	de	pesquisas
educacionais	e	museu	pedagógico,	sob	a	inspiração	de	Rui	Barbosa.
No	 que	 diz	 respeito	 ao	 pensamento	 brasileiro	 no	 século	XIX,	 extensivo	 à	 Educação,	 sofreu	 este
profunda	 influência	 européia.	 As	 principais	 correntes	 de	 pensamento	 que	 aqui	 penetraram	 foram	 o
liberalismo	 e	 o	 positivismo,	 embora	 houvesse	 ainda,	 no	 pensamento	 filosófico,	 forte	 presença	 do
tomismo	e	do	empirismo,	além	de	influências	do	espiritualismo	francês	e	do	idealismo	alemão.
Essas	idéias	tiveram	grande	influência	sobre	o	pensamento	psicológico,	não	apenas	como	tendência
geral,	mas	por	constituírem-se	como	conteúdos	relacionados	às	questões	de	natureza	psicológica.	Esses
conteúdos	 são	 revelados	 particularmente	 pelos	 programas	 de	 vários	 cursos,	 sobretudo	 pelas	 obras
filosóficas	então	difundidas6.
Teólogos,	professores	e	médicos	são	freqüentemente	os	autores	de	tais	obras	filosóficas	e	tendem	a
considerar	a	Psicologia	como	parte	integrante	da	metafísica,	tendo	como	objeto	de	estudo	geralmente	a
“alma”,	o	“espírito”	e	o	“eu”.
Em	pesquisa	empreendida	por	Massimi	 (1989),	os	assuntos	encontrados	em	tais	obras	 filosóficas
são	divididos	pela	autora	em	duas	categorias:	os	conceitos	relativos	aos	fundamentos	da	vida	psíquica
(alma,	 eu,	 consciência,	 identidade,	 caráter,	 faculdades	 etc.)	 e	 os	 conceitos	 referentes	 a	 fenômenos
psíquicos	 específicos	 (percepção,	 emoção,	 cognição,	 motricidade	 etc.).	 Esses	 assuntos	 aparecem
freqüentemente	 em	 obras	 psicológicas	 e	 pedagógicas	 das	 primeiras	 décadas	 do	 século	 XX,	 porém
abordados	mais	cientificamente.	Obras	de	Teologia	Moral,	nessa	época,	 abordam	 também	questões	de
ordem	psicológica.
Além	dos	conteúdos	de	ensino,	a	preocupação	especificamente	pedagógica	foi	também	fonte	para	o
desenvolvimento	 do	 pensamento	 psicológico.	 Há	 uma	 crescente	 preocupação	 com	 os	 fenômenos
psíquicos,	especialmente	no	que	diz	respeito	aos	métodos	de	ensino,	pois	estes	remetem	à	necessidade	de
conhecimento	sobre	o	educando	e	à	formação	do	educador,	o	qual	deve	dominar	esse	saber	para	realizar
mais	 eficazmente	 sua	 ação	 pedagógica.	 Esses	 conteúdos	 são	 encontrados	 nos	 programas	 da	 disciplina
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Pedagogia	das	Escolas	Normais,	os	quais	tratam	geralmente	de	questões	como:	educação	das	faculdades
psíquicas,	aprendizagem	e	utilização	de	recompensas	e	castigos	como	instrumentos	educativos.	Há	evi​-
dente	influência	de	pensadores	como	Locke,	Rousseau,	Pestalozzi,	Herbart	e	Spencer,	além	da	presença
do	dualismo	interacionista	de	Descartes,	conforme	demonstra	Massimi	(1989).
Há	 grande	 preocupação	 pedagógica	 com	 a	 educaçãoou	 com	 o	 desenvolvimento	 das	 faculdades
psíquicas	 da	 criança,	 especialmente	 a	 inteligência,	 seguida	 das	 sensações	 e	 da	 vontade.	 Encontra
Massimi	 (1989),	 em	 sua	 análise,	 a	 concepção	 de	 inteligência	 “...	 como	 uma	 faculdade	 complexa,
composta	 de	 várias	 funções:	 atenção,	 percepção,	 imaginação,	 intuição,	 abstração	 e	 generalização,
associação	de	idéias,	comparação,	juízo,	raciocínio,	razão,	memória	e	linguagem.”	(p.	361)
As	preocupações	com	as	questões	de	ordem	psicológica	pela	Pedagogia,	no	século	XIX,	esboçam	a
sistematização	 que	 será	 empreendida	 a	 partir	 de	 seu	 final	 e	 início	 do	 século	 seguinte,	 com	 maior
aprofundamento	e	especialmente	maior	rigor	metodológico	em	seu	estudo.	Os	temas	pouco	diferem	nos
dois	 períodos,	 o	 que	 permite	 afirmar	 que	 não	 há	 ruptura,	 mas	 uma	 evolução	 no	 tratamento	 dessas
questões,	confirmando	a	importância	da	relação	entre	Psicologia	e	Pedagogia.
Acrescenta-se	 a	 isso	 que	 a	 relação	 entre	 Psicologia	 e	 Pedagogia	 guarda	 íntima	 relação	 com	 o
pensamento	 escolanovista,	 cuja	 penetração	 no	 Brasil	 inicia-se	 no	 século	 XIX,	 mas	 cuja	 efetiva
explicitação	e	consolidação	somente	ocorrerá	no	século	XX.
2.2.	O	Pensamento	Psicológico	na	Medicina
As	Faculdades	de	Medicina	do	Rio	de	Janeiro	e	da	Bahia	foram	criadas	em	1832,	tendo	sua	origem
nas	Cadeiras	de	Cirurgia,	na	Bahia,	e	de	Cirurgia	e	Anatomia,	no	Rio	de	Janeiro,	 instaladas	em	1808.
Nessas	 faculdades,	 como	exigência	para	a	conclusão	do	curso,	o	aluno	deveria	defender	publicamente
uma	tese	de	douto​ra​mento	ou	inaugural,	que	lhe	conferia	o	título	de	doutor.	Grande	parte	dos	trabalhos
sobre	assuntos	psicológicos,	nessa	época,	é	proveniente	dessas	teses,	que	tratavam	de	temas	relacionados
a:	Psiquiatria,	Neurologia,	Neuriatria,	Medicina	Social	e	Medicina	Legal.	Muitas	dessas	teses	antecedem
a	 criação	 formal	 de	 uma	 cátedra	 afim	 às	 questões	 psicológicas,	 pois	 a	 primeira	 delas,	 denominada
“Clínica	das	Moléstias	Mentais”,	 foi	criada	em	1881	e,	desde	1836,	encontram-se	 teses	que	 tratam	do
fenômeno	psicológico.	Os	 assuntos	 tratados	 são	muito	variados,	 dentre	os	quais:	 paixões	ou	 emoções,
diagnóstico	 e	 tratamento	 das	 alucinações	 mentais,	 epilepsia,	 histeria,	 ninfomania,	 hipocondria,
psicofisiologia,	 instrução	 e	 educação	 física	 e	 moral,	 higiene	 escolar,	 sexualidade	 e	 temas	 de	 caráter
psicossocial.
Os	mesmos	 assuntos	 foram	 também	 tratados	 em	 artigos	 publicados	 nos	 “Annaes	 Brasilienses	 de
Medicina”	e	em	outras	revistas	médicas,	em	obras	isoladas	e	mesmo	em	teses	de	alunos	brasileiros	que
fizeram	sua	formação	na	Europa.
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A	primeira	tese	que	trata	do	fenômeno	psicológico	foi	defendida	em	1836,	por	Manoel	Ignacio	de
Figueiredo	 Jaime,	 denominada	 “As	 paixões	 e	 afetos	 d’alma	 em	 geral,	 e	 em	 particular	 sobre	 o	 amor,
amizade,	gratidão	e	o	amor	da	pátria”,	de	influência	cartesiana	e	muito	próxima	das	temáticas	abordadas
no	 período	 colonial.	Outras,	 além	 desta,	 tratam	 assunto	 semelhante,	 sendo	 que,	 no	 final	 do	 século,	 as
expressões	por	elas	usadas	já	não	mais	aparecem,	dando	lugar	à	palavra	“emoção”.
Temas	relativos	à	sexualidade	são	muito	freqüentes,	como:	cópula,	onanismo,	histeria,	ninfomania,
prostituição	etc.,	valendo	ressaltar	que,	em	1914,	a	tese	de	Genserico	Aragão	de	Souza	Pinto	evolui	para
um	tratamento	teórico	baseado	na	Psicanálise.
Crescente	 interesse	 pela	 Medicina	 Legal	 é	 observado,	 assim	 como	 sua	 proximidade	 com	 a
Psicologia	Social.	A	 tese	de	 Júlio	Afrânio	Peixoto,	denominada	“Epilepsia	e	Crime”,	 é	demonstrativa
desse	fato.
Nos	anos	finais	desse	período,	temas	bastante	próximos	da	Psicologia	propriamente	dita	começam	a
aparecer	 de	 maneira	 significativa,	 revelando	 maior	 rigor	 metodológico	 e	 uma	 base	 científica	 mais
apurada.	 Vale	 lembrar	 que	 a	 Psicologia	 conquistou	 o	 estatuto	 de	 ciência	 autônoma	 no	 último	 quartel
daquele	século,	momento	em	que	aparecem	teses	que	podem	ser	identificadas	com	a	ciência	psicológica.
No	final	do	século	XIX	é	defendida	a	tese	“Duração	dos	Atos	Psíquicos	Elementares”,	de	Henrique
Roxo,	considerada	por	Lourenço	Filho,	Pessotti	e	Pfromm	Netto	como	o	primeiro	trabalho	de	Psicologia
Experimental,	 baseado	 em	 número	 significativo	 de	 dados	 obtidos	 experimentalmente,	 com	 o	 uso	 do
“psicômetro	de	Buccola”.
Muitas	 teses	podem	ser	consideradas	como	pertencentes	à	Medicina	Social7	 e	 tratam	de	questões
relacionadas	à	higiene	e	àquilo	que	hoje	consideramos	como	fatores	ou	fenômenos	psicossociais.
As	condições	de	 saneamento	das	cidades	e	de	 saúde	da	população	eram	extremamente	precárias,
sobretudo	nas	 cidades	 e	 para	 as	 camadas	mais	 pobres.	A	presença	de	 “leprosos,	 loucos,	 prostitutas	 e
mendigos”	 nas	 ruas,	 aliada	 ao	 clima	 quente	 e	 à	 posição	 geográfica	 da	 cidade	 (principalmente	Rio	 de
Janeiro)	 eram	 questões	 preocupantes	 para	 os	 médicos,	 para	 quem	 as	 “sujeiras”	 e	 “imundícies”	 —
materiais	 e	 morais	—	 que	 grassavam	 nas	 cidades	 deveriam	 ser	 eliminadas.	 É	 nesse	 contexto	 que	 se
origina,	segundo	Roberto	Machado	(1978),	a	Medicina	Social	no	Brasil,	preocupada	mais	com	a	“saúde”
do	 que	 com	 a	 “doença”,	 buscando	 as	 causas	 das	 moléstias	 para	 preveni-las.	 Busca-se,	 pois,	 a
normalização	da	sociedade,	com	vistas	a	uma	formação	social	sadia,	composta	por	indivíduos	sadios;	ou
seja,	 é	 preciso	que	 a	 sociedade	 seja	organizada,	 livre	da	 “desordem”	e	dos	 “desvios”	que	devem	ser
eliminados	por	meio	de	um	projeto	profilático.
A	 Medicina	 Social,	 nesse	 quadro,	 elaborará	 propostas	 para	 as	 várias	 instituições	 sociais,	 com
finalidade	 de	 higienizá-las,	 preocupando-se	 com	 hospitais,	 cemitérios,	 quartéis,	 bordéis,	 prisões,
fábricas	e,	de	maneira	especial,	com	as	escolas,	tema	esse	muito	freqüente	nas	teses	de	doutoramento.
Para	 a	 higienização	 das	 escolas	 são	 propostas	 formas	 de	 controle	 do	 comportamento,	 em	que	 se
discute	 o	 uso	 de	 recompensas	 e	 castigos	 para	 eliminar,	 por	 exemplo,	 a	 desobediência	 e	 a	 prática	 da
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masturbação.	 Esta	 última,	 segundo	 Machado	 (1978),	 é	 vista	 como	 algo	 que	 “...	 provoca	 a	 tísica,	 a
loucura,	a	epilepsia,	a	hipocondria,	a	flegmasia	crônica	de	todos	os	órgãos	e	finalmente	a	morte”	(p.
304);	acrescenta	ainda	o	autor	que	uma	das	medidas	preventivas	para	o	onanismo	é	a	prática	da	ginástica.
Deve	ser	lembrado	que	a	Sociedade	de	Medicina	e	Cirurgia	do	Rio	de	Janeiro	esteve	articulada	às
Faculdades	de	Medicina	na	defesa	da	Medicina	Social.
A	Medicina	 Social	 contribuiu	 também	no	 plano	 da	 intervenção	 social,	 o	 que	 remete	 à	 defesa	 da
criação	de	hospícios,	uma	necessidade	imperativa	para	a	higienização	e	a	normalização	da	sociedade.
Até	meados	do	século	XIX,	não	havia	qualquer	forma	de	assistência	específica	aos	doentes	mentais.
Os	 “loucos”	 erravam	 pelas	 ruas,	 eram	 encarcerados	 nas	 prisões	 ou	 reclusos	 em	 celas	 especiais	 das
Santas	Casas	de	Misericórdia,	sendo	que	algumas	destas	possuíam	suas	“casinhas	de	doudos”.
Por	 volta	 de	 1830	 começam	 a	 aparecer	 as	 reivindicações	 para	 a	 criação	 de	 hospícios,	 partindo
principalmente	dos	médicos,	sobretudo	os	higienistas	ligados	à	Sociedade	de	Medicina	e	Cirurgia	do	Rio
de	 Janeiro,	 por	 meio	 de	 artigos	 em	 que	 eram	 criticadas	 as	 condições	 de	 abandono	 dos	 “loucos”,
propondo	 a	 criação	de	 um	asilo	 higiênico	 e	 tratamento	moral.	Essa	 proposta	 vincula-se	 ao	projeto	 da
referida	sociedade	para	organizar,	disciplinar	e	normalizar	a	cidade,	em	busca	da	salubridade	geral	do
espaço	urbano.
Para	Machado	(1978),	a	constituição	da	Psiquiatria	no	Brasil	inicia-se	com	a	criação	dos	hospícios,
articulada	às	finalidades	da	Medicina	Social;	afirma	ele:
“Coube	à	medicina	social	a	tarefa	de	isolar	preventivamente	o	louco	com	o	objetivo	de	reduzir	o
perigo	e	impossibilitar	o	efeito	destrutivo	que	ela	viu	caracterizada	em	suadoença.	Nasce	assim,
no	Brasil	dos	meados	do	século	XIX,	não	uma	‘psiquiatria	preventiva’,	mas	a	psiquiatria	como
instrumento	da	prevenção.”	(p.	380)
Assim,	 em	 1842,	 é	 inaugurado	 no	 Rio	 de	 Janeiro	 o	 Hospício	 Pedro	 II,	 cujas	 práticas	 foram
fundamentadas	 nas	 idéias	 de	 Pinel	 e	 Esquirol.	 Seu	 funcionamento	 guiava-se	 pelos	 princípios	 de
isolamento,	 vigilância,	 distribuição	 e	 organização	 do	 tempo	 dos	 internos,	 com	 vistas	 à	 repressão,
controle	e	 individualização.	Considerava-se	a	necessidade	de	afastar	o	“louco”	das	causas	da	 loucura,
isto	 é,	 da	 sociedade	 e	 da	 família,	 e	 romper	 com	 seus	 hábitos	 para	 realizar-se	 o	 tratamento.	Via-se	 o
trabalho	 como	 excelente	 terapêutica,	 por	 sua	 necessidade	 de	 disciplina,	 sendo	 o	 trabalho	 agrícola
especialmente	 recomendado;	 entretanto,	 essa	 terapia	 não	 era	 igualmente	 aplicada,	 sendo	 prescrita
sobretudo	aos	internos	pobres.
Nesse	sentido,	a	Psiquiatria	brasileira	evoluiu	de	uma	concepção	que	propunha	a	cura	da	“loucura”
com	sangrias	e	banhos	para	uma	preocupação	de	natureza	comportamental,	em	que	o	tratamento	passou	a
basear-se	em	intervenções	no	plano	moral.
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Em	 1848	 é	 aprovada	 por	 lei	 provincial	 a	 criação	 de	 um	 hospício	 em	 São	 Paulo	 e,	 em	 1852,	 é
inaugurado	 o	 Asilo	 Provisório	 de	 Alienados	 da	 Cidade	 de	 São	 Paulo8,	 na	 Av.	 São	 João,	 nas
proximidades	da	Av.	Ipiranga,	tendo	ficado	conhecido	como	Hospício	Velho.	Sua	ação	ficou	limitada	à
reclusão,	objetivando	excluir	os	“loucos”	das	ruas	da	cidade.	Sua	direção	ficou	a	cargo	de	um	alferes,
Tomé	de	Alvarenga,	tendo	negros	libertos	e	egressos	das	prisões	como	funcionários,	os	quais	eram	mal
vistos	socialmente,	o	que	explica	a	aceitação	de	um	trabalho	que	era	considerado	repugnante	e	aviltante.
Muitos	dos	internos	eram	estrangeiros,	geralmente	imigrantes	italianos	ou	negros	alforriados;	a	maioria
era	 do	 sexo	masculino.	 O	 hospício	 sofreu	 muitas	 rebeliões	 e	 vários	 surtos	 de	 epidemia.	 Para	 Cunha
(1986),	o	hospício
“causava	incômodo	ou	escândalo	–	quando	não	medo	puro	e	simples	–	aos	seus	seletos	vizinhos
do	 centro	 da	 cidade.	 Seu	 administrador	 não	 cessa	 de	 enfatizar,	 em	 seus	 relatórios,	 a
impossibilidade	 de	 conter	 a	 loucura	 naqueles	 exíguos	 sete	 cômodos,	 sem	 ventilação,	 sem
condições	 sanitárias,	 sem	 condições	 de	 segurança.	 O	 espaço	 do	 internamento	 produz	 o	 medo
constante	 da	 contaminação	 da	 cidade,	 e	 tenderá	 a	 ser	 deslocado	 para	 longe	 das	 vistas
temerosas.”	(p.	61)
Assim,	em	1862,	o	Hospício	Velho	mudou-se	para	a	Ladeira	Tabatinguera.	Essa	mudança	ocorre	em
função	 da	 problemática	 disciplinar,	 não	 havendo	 preocupação	 terapêutica	 específica.	 Permanecem,	 no
entanto,	 os	 problemas	 de	 superlotação,	 altas	 taxas	 de	mortalidade	 e	morbidade,	 fugas	 e	 violência.	Os
métodos	disciplinares	não	são	mudados.
Somente	com	o	ingresso	do	médico	alienista	Francisco	Franco	da	Rocha,	o	hospício	paulista	passa
para	uma	fase	em	que	a	preocupação	é	de	caráter	médico-terapêutico.
Vê-se,	pois,	que	havia	diferenças	profundas	entre	os	hospícios	do	Rio	de	Janeiro	e	de	São	Paulo.	O
primeiro	teve,	desde	seu	início,	uma	preocupação	médico-psiquiátrica,	com	base	em	teorias	e	práticas	da
Psiquiatria	 estrangeira.	 O	 hospício	 paulista,	 ao	 contrário,	 funcionou	 tão	 somente	 como	 espaço	 de
reclusão,	aparecendo	uma	concepção	psiquiátrica	apenas	no	final	do	século,	com	Franco	da	Rocha.	Tal
diferença	pode	ser	em	parte	explicada	pelo	fato	de	que	o	Rio	de	Janeiro	 tinha,	nessa	época,	um	clima
bastante	 propício	 à	 discussão	 e	 ao	 desenvolvimento	 do	 pensamento	 psiquiátrico,	 contando	 com	 a
Sociedade	de	Medicina	e	Cirurgia	e	a	Faculdade	de	Medicina,	instituições	estas	que	foram	fundamentais
para	a	evolução	do	pensamento	e	da	prática	alienista	no	Rio	de	Janeiro.
Ainda	 nesse	 século	 foram	 criados:	 o	 Hospício	 São	 João	 de	 Deus,	 em	 1861,	 em	 Recife;	 um	 em
Salvador,	em	1874	e	outro	em	Porto	Alegre,	em	1884.
2.3.	À	Guisa	de	Síntese
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As	transformações	históricas	por	que	passou	a	sociedade	brasileira,	no	seio	da	qual	foi	produzido	o
pensamento	 psicológico	 aqui	 em	 estudo	 e	 o	 desenvolvimento	 das	 idéias	 psicológicas	 na	 Europa,	 que
caminhavam	para	o	estabelecimento	de	sua	autonomia,	são	fatores	fundamentais	para	a	compreensão	da
História	da	Psicologia	no	Brasil.
O	 fim	 da	 condição	 colonial	 permitiu	 o	 desenvolvimento	 de	 várias	 instâncias	 da	 formação	 social
brasileira,	dentre	as	quais	as	de	âmbito	cultural.	A	criação	de	cursos	superiores,	a	impressão	de	livros	e
o	surgimento	de	várias	instituições	são	exemplos	dessa	mudança.	A	busca	de	uma	“identidade	nacional”,
principalmente	 advin​da	 de	 intelectuais	 que	 buscavam	 a	 compreensão	 e	 a	 solução	 dos	 problemas
nacionais,	 deve	 também	 ser	 destacada;	 a	 preocupação	 com	 a	 saúde	 e	 a	 educação	 encontram-se	 nesse
plano.	Ao	mesmo	tempo,	é	possível	dizer	que	o	Brasil,	agora	nação	autônoma,	adquiria	maior	facilidade
de	contato	com	o	resto	da	Europa,	isento	da	mediação	de	Portugal,	o	que	facilitava	a	penetração	de	idéias
correntes	no	Velho	Mundo,	especialmente	na	França,	indiscutível	centro	intelectual	da	época.
A	 produção	 de	 idéias	 psicológicas	 foi	 também	 produto	 dessa	 sociedade	 em	 transformação,
sobretudo	 na	 busca	 de	 respostas	 às	 necessidades	 que	 se	 diversificavam	 e	 se	 impunham	 pelos	 novos
tempos.	 As	 transformações	 econômicas,	 com	 suas	 conseqüências	 para	 o	 incremento	 do	 processo	 de
urbanização,	acabaram	por	trazer	à	tona	novos	problemas	ou	a	explicitação	de	problemas	antigos,	que	o
país	 não	 se	 encontrava	 preparado	 para	 resolver.	 Nesse	 contexto,	 a	 Medicina	 e	 a	 Educação	 foram
chamadas	 a	 contribuir	 para	 a	 solução	 dos	 problemas,	 incluindo-se	 aí	 a	 preocupação	 com	o	 fenômeno
psicológico	em	várias	de	suas	dimensões.
O	desenvolvimento	do	pensamento	psicológico	no	Brasil,	no	século	XIX,	não	pode	ser	visto	porém
apenas	 na	 sua	 dimensão	 local.	 É	 necessário	 considerar	 que	 a	 preocupação	 com	 os	 fenômenos
psicológicos	vinha,	durante	 séculos,	 se	desenvolvendo;	entretanto,	 é	no	século	XIX	que	a	evolução	da
Filosofia,	de	um	lado,	e	dos	conhecimentos	produzidos	pela	Fisiologia,	de	outro,	começaram	a	caminhar
em	direção	a	uma	possível	síntese.	É	possível	dizer	que	o	século	XIX	foi,	para	a	Psicologia,	o	momento
fundamental	 que	 preparou	 as	 condições	 para	 sua	 autonomia.	 Esse	 período	 não	 apenas	 sintetizou	 e
aprofundou	 o	 conhecimento	 a	 respeito	 dos	 fenômenos	 psicológicos,	mas,	mais	 que	 isso,	 as	mudanças
ocorridas	na	Europa	do	século	XVIII	criaram	desafios	e	necessidades	que	precisavam	ser	 respondidas
pelo	 conhecimento	 produzido	 no	 século	XIX.	Aparece	 aqui	 também	 a	 problemática	 do	 incremento	 do
processo	de	urbanização	decorrente,	na	Europa,	do	avanço	do	modo-de-produção	capitalista.	Assim,	uma
sociedade	que	enfrentava,	de	um	lado,	os	problemas	relativos	à	saúde,	saneamento,	habitação	e	outros,
criados	pela	densidade	demográfica	e,	por	outro	lado,	os	movimentos	sociais	que	questionavam	as	bases
sobre	 as	 quais	 aquela	 sociedade	 se	 erigia,	 precisava	 de	 instrumentos	 para	 melhor	 compreender	 tais
problemas	 e	 sobre	 eles	 intervir.	 Era	 necessário	 buscar	 o	 controle,	 não	 apenas	 de	 problemas	 como
epidemias,	mas	também	da	conduta	humana.	A	isso	acrescenta-se	que	a	ideologia	burguesa	colocava	no
indivíduo	 o	 fundamento	 de	 uma	 sociedade	 baseada	 na	 propriedade	 privada,	 portanto	 pessoal	 e
individual;	 fazia-se	 necessário,	 pois,	 compreender	 o	 homem	 nessa	 dimensão.	 De	 resto,	 é	 preciso
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considerar	que	uma	formação	social	baseada	na	divisão	social	do	trabalho	e	no	avanço	técnico	apontava
para	a	especialização	do	conhecimento.
Nesse	 panorama,	 o	 contato	 de	 muitos	 brasileiros	 com	 os	 movimentos	 intelectuaiseuropeus
inevitavelmente	 fez	 com	 que	 essas	 idéias,	 lá	 em	 franca	 expansão,	 mais	 cedo	 ou	 mais	 tarde	 aqui
chegassem	 também.	A	profusão	de	 idéias	na	Europa,	 somada	às	necessidades	da	 sociedade	brasileira,
permitiu	 que	 aqui	 se	 desenvolvessem,	 dentre	 várias	 áreas	 de	 conhecimento,	 também	 as	 idéias
psicológicas.
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6	Marina	Massimi	realiza	em	sua	tese	de	doutoramento	um	extenso	estudo	sobre	as	idéias	psicológicas	difundidas	em	instituições	de	ensino	de
São	Paulo	e	Rio	de	Janeiro,	no	século	XIX,	encontrando	um	material	revelador	da	preocupação	com	os	fenômenos	psicológicos	no	período	em
questão.	Ver	MASSIMI,	M.	A	Psicologia	em	Instituições	de	Ensino	brasileiras	do	século	XIX.	São	Paulo,	 tese	de	doutoramento,	USP,
1989.
7	Para	aprofundamento	nessa	questão,	ver:	MACHADO,	R.	e	outros.	Danação	da	norma:	Medicina	Social	e	Constituição	da	Psiquiatria
no	Brasil.	Rio	de	Janeiro,	Graal,	1978.
8	Para	aprofundamento	sobre	o	hospício	de	São	Paulo,	ver:	CUNHA,	M.	C.	P.	O	espelho	do	mundo:	Juquery,	a	história	de	um	asilo.	Rio
de	Janeiro,	Paz	e	Terra,	1986.
Parte	II
N
A	psicologia	científica	e	seu	processo	de
autonomização	no	Brasil
ovas	e	significativas	transformações	ocorreram,	a	partir	do	final	do	século	XIX,	tanto	na	sociedade
brasileira	quanto	na	Psi​cologia.
O	Brasil	 adotou	 o	modelo	 republicano,	 ao	mesmo	 tempo	 em	 que	 se	 consolidava	 e	 atingia	 pleno
desenvolvimento	 a	 economia	 de	 base	 agrário-comercial-exportadora,	 vinculada	 fundamentalmente	 à
produção	 cafeeira,	 o	 que	 contribuiu	 para	 a	 geração	 de	 condições	 que	 possibilitaram	 a	 efetivação	 do
processo	 de	 industrialização	 do	 país.	 Tais	 fatores	 concorreram	 para	 a	 expansão	 do	 processo	 de
urbanização	e	para	a	definição	do	pólo	econômico-político-cultural	do	país	na	região	Sudeste.	Assistiu-
se,	 nesse	 momento,	 à	 expansão	 do	 ideário	 liberal	 entre	 os	 intelectuais	 brasileiros,	 cuja	 participação
política	e	cultural	tornou-se	intensa,	trazendo	à	tona	a	preocupação	com	a	“questão	nacional”	e	a	busca
de	caminhos	para	o	progresso	e	a	modernidade.
A	 Psicologia,	 por	 sua	 vez,	 adquiriu	 no	 final	 do	 século	 passado	 o	 estatuto	 de	 ciência	 autônoma;
processo	esse	originado	na	Europa	e	 seguido	de	acelerada	evolução	dessa	ciência	não	apenas	em	seu
solo	original,	mas	também	nos	Estados	Unidos.	Na	virada	do	século,	ocorreu	intenso	desenvolvimento	da
ciência	 psicológica	 em	 todas	 as	 instâncias,	 quer	 no	 plano	 teórico	 –	 destacando-se	 a	 diversidade	 de
abordagens	surgidas	nessa	época	e	o	aumento	significativo	da	produção	de	pesquisas	–,	quer	no	plano
prático,	em	que	esta	ciência	penetrou	e	ampliou	seu	potencial	de	aplicação.
A	concomitância	desses	dois	conjuntos	de	fatores	e	a	possibilidade	efetiva	de	estabelecimento	de
relações	entre	eles,	em	função	da	articulação	entre	potencialidades	e	necessidades,	passíveis	de	serem
mutuamente	realizadas,	permitiram	um	avanço	sem	precedentes	na	história	da	Psicologia	no	Brasil.
Os	problemas	que	o	Brasil	enfrentava	no	século	XIX	tenderam,	com	a	virada	do	século,	a	agravar-
se	e	outros	vieram	a	eles	se	somar,	de	tal	maneira	que	o	pensamento	psicológico,	já	em	franco	processo
de	 desenvolvimento	 no	 país,	 encontrou	 terreno	 fértil	 para	 penetrar	 e	 estabelecer-se	 na	 sua	 dimensão
científica	e	caminhando	para	sua	autonomia	teórica	e	prática	em	relação	às	áreas	do	saber	no	interior	das
quais	 havia	 se	 desenvolvido	 até	 então,	 como	 a	 Medicina	 e	 a	 Educação.	 Ao	 mesmo	 tempo,	 o
desenvolvimento	 da	 ciência	 psicológica	 e	 a	 ampliação	 de	 seu	 campo	 de	 ação	 maximizavam	 as
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possibilidades	 concretas	 de	 a	 Psicologia	 contribuir	 com	 possíveis	 respostas	 para	 as	 questões	 que	 se
impunham.
A	Psicologia	e	outras	áreas	de	conhecimento	foram	buscadas	no	sentido	de	contribuir	com	soluções
para	 os	 problemas	 relacionados	 à	 saúde,	 à	 educação	 e	 à	 organização	 de	 trabalho,	 no	 interior	 de	 uma
formação	social	dependente	e	atrasada,	em	busca	da	mo-dernidade	representada	pela	concretização	do
ingresso	do	Brasil	no	mundo	industrializado.
Nesse	 contexto	 e	 em	 face	 de	 tais	 problemas	 ocorreram	 importantes	 realizações	 da	Psicologia	 no
Brasil,	cujas	principais	produções	são	ainda	oriundas	das	instituições	médicas	e	educacionais.	A	partir
dessa	base	e	em	seu	interior	é	que	a	Psicologia	se	desenvolveu,	conquistando	sua	autonomia	em	relação
às	áreas	do	saber	no	interior	das	quais	evoluíra	até	então,	por	meio	da	definição	e	da	delimitação	cada
vez	mais	explícitas	de	seu	objeto	de	estudo	e	de	seu	campo	próprio	de	ação.	Tentaremos	demonstrar	que
a	produção	psicológica	no	interior	de	algumas	instituições	delineia-se	cada	vez	com	maior	clareza,	de	um
lado	pela	diferenciação	gradativa	de	outras	áreas	de	conhecimento,	como	a	Psiquiatria	por	exemplo,	e	de
outro	 lado	pela	penetração	das	 idéias	e	práticas	 já	constitutivas	da​quilo	que,	na	Europa	e	nos	Estados
Unidos,	era	considerado	como	Psicologia	científica.
As	personagens	dessa	história	são	principalmente	médicos,	educadores,	bacharéis	em	direito	e	até
engenheiros,	sendo	que	muitos	deles	acabaram	por	dedicar-se	exclusivamente	à	Psicologia	e	podem	ser
considerados	 como	 os	 primeiros	 psicólogos	 brasileiros.	 Acrescentam-se	 a	 eles	 vários	 psicólogos
estrangeiros	 que	 para	 cá	 vieram	 ministrar	 cursos,	 proferir	 palestras	 ou	 prestar	 assistências	 técnicas
específicas,	dos	quais	muitos	aqui	permaneceram	e	se	radicaram	definitivamente	no	país.
Abordaremos,	 a	 seguir,	 a	 produção	 psicológica	 na	Medicina,	 na	 Educação	 e	 na	 sua	 aplicação	 à
organização	 do	 trabalho,	 no	 período	 compreendido	 entre	 a	 última	 década	 do	 século	 XIX	 e	 as	 três
primeiras	décadas	do	século	XX.
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A
Capítulo	1
A	psicologia	em
instituições	médicas
tendência	do	século	XIX	manteve-se	por	algum	tempo,	diferenciando-se	gradativamente,	sendo	que
as	 preocupações	 estritamente	 psiquiátricas	 foram	 se	 delineando	 com	maior	 clareza	 e	 delimitando
mais	 explicitamente	 suas	 fronteiras	 com	 a	 Psicologia.	 Tais	 fatos	 ocorreram	 ainda	 no	 interior	 da
Medicina,	mas	já	caracterizada	como	especialidade	psiquiátrica,	particularmente	nas	instituições	asilares
e	 em	 seu	 correlatos,	 como	 a	Medicina	 Legal	 ou	 a	Higiene	Mental.	 A	 principal	 evidência	 disso	 foi	 a
criação	 de	 laboratórios	 de	 Psicologia	 em	 diversas	 instituições	 psiquiátricas,	 cuja	 produção	 foi
principalmente	de	natureza	psicológica.	O	desenvolvimento	dos	saberes	psiquiátrico	e	psicológico	e	suas
decorrências	práticas	 foram	fatores	 fundamentais	para	que	ambas	as	áreas	adquirissem	contornos	mais
nítidos	e,	conseqüentemente,	uma	maior	delimitação	entre	si.
O	país	 encontrava-se	 ainda	na	mesma	 (e	 talvez	pior)	 situação	que	no	 século	 anterior,	 no	que	diz
respeito	 às	 precárias	 condições	 de	 saneamento	 e	 saúde	 do	 povo	 brasileiro.	 Intelectuais	 e	 políticos
reclamavam	da	Medicina	intervenções	concretas	por	meio	de	um	projeto	profilático,	com	a	finalidade	de
erradicar,	ou	pelo	menos	minimizar,	as	inúmeras	doenças	infecto-contagiosas	que	assolavam	o	país.	Esse
movimento,	no	âmbito	da	Medicina	Geral,	estava	intimamente	relacionado	à	questão	da	Higiene	que,	nos
anos	iniciais	do	século	XX,	estava	revestido	de	ampla	responsabilidade	frente	à	realidade.	É	no	bojo	de
tais	fatos	que	tanto	o	pensamento	psiquiátrico	quanto	o	psicológico	encontraram	fértil	terreno	para	seus
estudos	 e	 para	 a	 aplicação	de	 seus	 conhecimentos	por	meio	da	Higiene	Mental,	 instância	derivada	da
Higiene	 em	 sua	 expressão	 geral.	 As	 ligas	 de	 Higiene	 Mental	 foram,	 assim,	 importantes	 fontes	 de
produção	de	pesquisa	e	de	práticas	relacionadas	à	Psicologia.
Para	 expor	 essa	 linha	 de	 desenvolvimento	 histórico	 da	 Psicologia,	 abordaremos	 a	 seguir	 as
produções	 dos	 hospícios,	 incluindo	 a	 Liga	 Brasileira	 de	 Higiene	 Mental;	 as	 produções	 relativas	 às
intermediações	entre	Psiquiatria	e	Direito,	que	foi	um	importante	veiode	desenvolvimento	da	Psicologia,
principalmente	por	meio	da	Me​dicina	Legal,	e	das	teses	de	doutoramento	das	Faculdades	de	Medicina.
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1.1.	Os	hospícios	e	algumas	instituições	correlatas
O	 sustentáculo	 das	 produções	 que	 serão	 apresentadas	 a	 seguir	 foi	 o	 alienismo.	 Surgiu	 este	 na
Europa,	 como	 área	 que	 se	 auto​nomizou	 em	 relação	 à	 Medicina	 tradicional,	 estabelecendo	 como	 seu
objeto	 de	 estudo	 a	 “razão”,	 cuja	 compreensão	 não	 poderia,	 segundo	 seus	 defensores,	 situar-se	 na
Anatomia	ou	na	Fisiologia,	 pois	 teria	 aquela	uma	natureza	diversa.	Ao	alienismo	veio	 somar-se,	mais
tarde,	o	organicismo,	que	trazia	a	concepção	de	loucura	como	organicamente	determinada.
O	pensamento	psiquiátrico	brasileiro	da	época	tinha	como	principal	característica	o	ecletismo,	que
conjugava	o	alienismo	clássico,	especialmente	de	Pinel	e	Tuke,	com	o	organicismo,	em	particular	numa
de	 suas	 vertentes,	 a	 teoria	 da	 degenerescência,	 fortemente	 calcada	 na	 concepção	 da	 determinação
hereditária	da	loucura.
A	 teoria	 da	 degenerescência	 propunha	 ações	 que	 extra​polavam	 os	 muros	 asilares,	 propondo	 a
higienização	 e	 a	 discipli​na​rização	 da	 sociedade.	 Considerava	 ainda	 a	 existência	 de	 uma	 hierarquia
racial,	estando	no	ápice	a	raça	ariana	e	na	base	a	raça	negra;	muitos	teóricos	acreditavam	ser	os	negros
mais	propensos	à	degeneração	por	sua	inferioridade	biológica.
No	 Brasil,	 essas	 duas	 correntes	 juntam-se	 numa	 só	 experiência,	 em	 que	 a	 exclusão	 do	 “louco”
deveria	ser	compartilhada	com	a	prevenção	“social”	da	loucura.
O	 alienismo	 havia	 sido,	 no	 século	 anterior,	 expressão	 da	 Medicina	 Social,	 que	 incluía	 em	 seu
projeto	 profilático	 a	 preocupação	 com	 a	 pobreza,	 a	marginalidade	 social,	 o	 crime	 e	 a	 loucura.	Como
solução	 apresentava-se	 a	 necessidade	 de	 um	 efetivo	 controle	 sobre	 a	massa	 urbana,	 com	 vistas	 à	 sua
disciplinarização.	Nesse	contexto,	ganha	força	a	teoria	da	degenerescência.
Essas	idéias	são	incrementadas	na	virada	do	século,	com	o	agravamento	dos	problemas	urbanos,	de
tal	maneira	que	o	controle	das	massas	impunha-se	como	premente	necessidade	para	uma	sociedade	que
almejava	 ingressar	 num	 efetivo	 processo	 de	 industrialização,	 sobretudo	 no	 que	 diz	 respeito	 ao
proletariado.	 Assim,	 a	 articulação	 entre	 pensamento	 psiquiátrico	 e	 controle	 do	 processo	 produtivo
revela-se	explicitamente.
A	 preocupação	 com	 a	 “ordem”	 urbana	 e	 com	 o	 “progresso”	 baseia-se	 também	 nos	 princípios
positivistas,	 ainda	 fortemente	 arraigados	 no	 ideário	 brasileiro.	 A	 questão	 da	 “ordem”	 assume	 grande
importância	nessa	conjuntura,	devendo	o	asilo	excluir	do	convívio	social	aqueles	que	não	se	adaptassem
às	 normas	 estabelecidas,	 isto	 é,	 os	 “desordeiros”,	 estando	 incluídos	 nessa	 categoria	 os	 indivíduos
engajados	nos	movimentos	sociais	organizados.
Tais	 concepções,	 embora	majoritárias,	 não	 foram	 unânimes,	 o	 que	 demonstraremos	 adiante	 pela
experiência	 de	 Ulysses	 Pernambuco	 em	 Recife.	 Além	 desta,	 apresentaremos	 a	 seguir	 algumas
considerações	sobre	o	Hospício	do	Juquery,	o	Hospital	Nacional	de	Alienados,	a	Colônia	de	Psicopatas
do	Engenho	de	Dentro	e	as	Ligas	de	Higiene	Mental.
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Hospício	do	Juquery9
Os	primórdios	do	Hospício	do	Juquery	situam-se	no	Asilo	Provisório	de	Alienados	da	Cidade	de
São	 Paulo.	 Sua	 criação	 é	 obra	 de	 Franco	 da	 Rocha,	 que	 empreendeu	 a	 reforma	 psiquiátrica	 em	 São
Paulo,	denunciando	a	precariedade	da	assistência	aos	doentes	mentais	e	defendendo	uma	nova	instituição,
baseada	em	práticas	científicas,	sobretudo	no	“asilamento	racional”.
O	 Hospício	 do	 Juquery	 foi	 construído	 fora	 da	 zona	 urbana,	 sendo	 seu	 projeto	 arquitetônico	 de
autoria	de	Ramos	de	Azevedo.	Em	1898	já	funcionavam	as	colônias	agrícolas;	e	suas	dependências	foram
várias	 vezes	 ampliadas	 ao	 longo	 do	 tempo,	 sendo	 anexados	 o	 pavilhão	 para	 “crianças	 anormais”,	 o
laboratório	histoquímico	e	o	Manicômio	Judiciário.
Franco	 da	 Rocha	 e	 seu	 sucessor,	 Pacheco	 e	 Silva,	 defendiam	 a	 centralização	 da	 assistência
psiquiátrica	 como	 forma	 de	 gerar	 condições	 para	 o	 estudo	 da	 loucura,	 com	 base	 na	 descrição,
comparação	e	classificação,	revelando	concomitantemente	a	preocupação	em	demonstrar	a	pertinência	da
teoria	da	degenerescência.
Segundo	Cunha,	a	produção	do	hospício	demonstrava	que:
“o	 interesse	 se	 desdobra	 a	 partir	 de	 quadros	 nosológicos	 já	 configurados	 e	 volta-se	 para	 a
identificação	 das	 formas	 particulares	 das	 ‘doenças’	 naquela	 sociedade	 particular,	 como
decorrência	de	uma	herança	genética	onde	amalgamavam-se	imigrantes,	escravos	e	todo	tipo	de
sangue	degenerado:	o	impacto	do	crescimento	urbano	no	crescimento	da	sífilis,	deflagradora	de
um	tipo	determinado	de	patologia	mental	(...);	a	loucura	associada	às	caracteristicas	raciais	e	o
significado	 disto	 em	 sua	 apresentação	 na	 sociedade	 miscigenada	 do	 país;	 a	 correspondência
entre	 loucura	 e	 crime;	 a	 relação	 entre	 as	 formas	 de	 doença	 mental	 e	 os	 padrões	 culturais
‘atrasados’	como	(...)	as	religiões	‘primitivas’	dos	negros	e	dos	pobres”	(1986,	p.	77).
O	Juquery	representou	em	São	Paulo	o	pensamento	psiquiátrico	hegemônico	no	Brasil,	nessa	época.
Sua	prática	articulou-se	às	necessidades	trazidas	pelo	processo	de	industrialização	que	se	acelerava	na
cidade	e	teve	uma	dimensão	política	que	era	a	de
“conferir	 legitimidade	 à	 exclusão	 de	 indivíduos	 ou	 setores	 sociais	 não	 enquadráveis	 nos
dispositivos	 penais;	 permitir	 a	 guarda	 (...)	 e	 a	 regeneração	 ou	 disciplinarização	 de	 ind/
resistentes	às	disciplinas	do	trabalho,	da	família	e	da	vida	urbana;	reforçar	papéis	socialmente
importantes	 para	 o	 resguardo	 da	 ordem	 e	 da	 disciplina,	 medicalizando	 comportamentos
desviantes	(	...)	e	permitindo	que	sua	reclusão	possa	ser	lida	como	um	ato	em	favor	do	louco,	e
não	contra	ele”	(Cunha,	1986,	p.	80).
Farela
O	hospício	vai	gradativamente	abandonando	sua	preocupação	com	a	loucura	individual	e	assumindo
tarefas	de	ordem	social,	sobretudo	no	que	diz	respeito	ao	controle	da	força	de	trabalho.
Do	 ponto	 de	 vista	 prático,	 as	 técnicas	 “científicas”	 utilizadas	 consistiam,	 por	 exemplo,	 em:
alternância	 de	 banhos	 frios	 e	 quentes,	 malarioterapia,	 traumaterapia,	 laborterapia	 e	 terapias	 me​dica​-
mentosas.
A	 produção	 do	 Juquery	 circunscreve-se	 especificamente	 no	 âmbito	 da	 Psiquiatria,	 não	 trazendo
contribuição	direta	para	o	conhecimento	e	 a	prática	da	Psicologia.	Entretanto,	 sua	preocupação	 com	a
loucura	abarca,	sem	sombra	de	dúvidas,	o	fenômeno	psicológico,	embora	sua	maior	contribuição	seja	a
de	 demarcar	 mais	 nitidamente	 as	 fronteiras	 entre	 a	 Psicologia	 e	 a	 Psiquiatria	 e,	 conseqüen​temente,
demonstrar	nesse	caso	um	fator	relevante	para	a	compreensão	do	processo	de	autonomização	da	ciência
psico​ló​gica.
É	 necessário	 reconhecer,	 entretanto,	 que	 ambas	 as	 áreas	 tratam,	 sob	 enfoques	 e	 fundamentos
diversos,	 fenômenos	 de	 uma	 mesma	 natureza	 e	 que	 é	 inquestionável	 que,	 apesar	 das	 fronteiras,	 há
intersecções	tanto	do	ponto	de	vista	do	objeto	de	estudo	quanto	do	ponto	de	vista	prático.	Soma-se	a	isso
que	suas	produções	situam-se	numa	dada	realidade,	sendo	que	cada	uma,	a	seu	modo,	busca	responder	às
suas	demandas.
Hospital	Nacional	dos	Alienados
Após	a	proclamação	da	república,	o	Hospício	Pedro	II	passou	a	ser	chamado	Hospital	Nacional	dos
Alienados10	e	sua	administração	transferida	ao	Estado,	em	substituição	à	Santa	Casa	de	Misericórdia.	Em
1902,	 após	 a	 detecção	 de	 inúmeros	 problemas	 na	 instituição,	 foi	 nomeado	 para	 sua	 direção	 Juliano
Moreira,	cuja	prática	inaugura	“uma	psiquiatria	cujos	 fundamentos	 teóricos,	práticos	e	 institucionais
constituíram	um	sistema	psiquiátrico	coerente”	(Costa,	1976,	p.	26).	Esse	hospício	pode	servisto	como
o	primeiro	no	Brasil	que	tratou	a	loucura	do	ponto	de	vista	eminentemente	médico.	Nomes	consagrados
como	 Henrique	 Roxo,	 Afrânio	 Peixoto	 e	 Mauricio	 de	 Medeiros	 contribuíram	 com	 a	 constituição	 da
prática	psiquiátrica	instalada	na	instituição.
Em	1907,	sob	a	direção	de	Juliano	Moreira,	é	criado	o	provável	segundo	laboratório	de	Psicologia
no	 Brasil	 (o	 primeiro	 teria	 sido	 no	 “Pedagogium”,	 em	 1906),	 denominado	 Laboratório	 de	 Psicologia
Experimental	 da	 Clínica	 Psiquiátrica	 do	 Hospital	 Nacional	 dos	 Alienados11.	 Esse	 laboratório	 foi
chefiado	por	Maurício	de	Medeiros,	construído	sob	a	influência	de	Georges	Dumas,	com	quem	Medeiros
trabalhou	em	Paris,	no	laboratório	de	Psicologia	do	Hospital	de	Saint’Anne.
Nesse	hospício,	também	sob	a	direção	de	Juliano	Moreira,	res​ponsabilizou-se	Heitor	Carrilho	pelo
setor	que	deveria	abrigar	os	“criminosos	loucos”,	gérmen	do	Manicômio	Judiciário,	criado	em	1921.
O	 Hospital	 Nacional	 dos	 Alienados	 foi,	 como	 o	 Juquery,	 um	 asilo	 modelo	 para	 o	 pensamento
psiquiátrico	 da	 época,	 representando	 a	 tendência	 vigente	 em	 que	 o	 ecletismo	 tornou-se	 posição
Farela
Farela
praticamente	hegemônica.	Para	ele	confluíram	médicos	cariocas	e	baianos,	representando	as	orientações
de	 Teixeira	 Brandão	 e	 Raimundo	 Nina	 Rodrigues	 respectivamente,	 sendo	 que	 ambas	 as	 tendências
tiveram,	 apesar	 de	 suas	 particularidades,	 como	 seu	 principal	 fundamento	 a	 Medicina	 Social	 e	 seus
motivos	de	natureza	sócio-política.
Ao	 contrário	 do	 Juquery,	 no	 entanto,	 nesse	 hospício	 é	 explícito	 o	 vínculo	 com	 a	 Psicologia,
concretizado	na	existência	do	 laboratório.	Nesse	sentido,	o	Hospital	Nacional	dos	Alienados	pode	ser
visto	como	uma	instância	produtora	de	conhecimento	psicológico,	tendo	abrigado	profissionais	que,	em
seu	 laboratório	ou	fora	dele,	produziram	relevantes	obras	psicológicas,	como	Maurício	de	Me​deiros	e
Plínio	Olinto.	 Isso	 remete	 à	questão	de	que	a	Psiquiatria	no	Brasil,	 em	sua	manifestação	 institucional,
assumiu	 parcela	 da	 produção	 psicológica,	 vinda	 não	 somente	 da	 tradição	 passada,	 quando	 não	 havia
qualquer	forma	de	delimitação	entre	as	duas	áreas	de	saber,	mas	também	pelo	fato	de	que	a	Psiquiatria
necessita	do	intercâmbio	com	o	conhecimento	psicológico,	fomentando	e	sediando	sua	pesquisa.
Por	fim,	deve-se	dizer	que	a	impossibilidade	de	acesso	aos	documentos	que	registram	a	produção
do	laboratório,	pois	esses	encontram-se	perdidos,	compromete	sobremaneira	a	avaliação	mais	profunda
da	participação	desse	hospício	e	de	seu	laboratório	na	história	da	Psicologia	no	Brasil.
Colônia	de	Psicopatas	do	Engenho	de	Dentro
Fundada	no	Rio	de	Janeiro	na	década	de	10,	a	Colônia	produziu	extensa	contribuição	à	Psicologia
por	meio	de	seu	fértil	laboratório12,	criado	em	1923.
Esse	 laboratório	 foi	 transformado	 em	 Instituto	 de	 Psicologia,	 subordinado	 ao	 Ministério	 de
Educação	e	Saúde	Pública,	em	1932.	Em	1937	foi	incorporado	à	Universidade	do	Brasil,	para	contribuir,
segundo	 Penna,	 com	 as	 Faculdades	 de	 Filosofia,	 Ciências	 e	 Letras,	 de	 Educação	 e	 de	 Política	 e
Economia.
Havia	 também	 na	 Colônia	 a	 Escola	 de	 Enfermagem,	 que	 continha	 em	 seu	 currículo	 a	 disciplina
Psicologia,	ministrada	por	Gustavo	Rezende	e	Nilton	Campos.
Criado	 por	 Gustavo	 Riedel,	 diretor	 da	 Colônia,	 o	 laboratório	 foi	 patrocinado	 pela	 Fundação
Gaffrée-Guinle.	Sua	finalidade,	juntamente	com	uma	exposição	de	motivos	e	até	mesmo	uma	definição	da
função	do	psicólogo,	foi	assim	expressa	por	Osvaldo	N.	de	Souza	Guimarães:	“atualmente	todo	Instituto
destinado	ao	estudo,	cura	e	profilaxia	das	moléstias	mentais	deve	ter,	como	auxiliar	indispensável,	um
laboratório	 de	 psicologia,	 a	 cargo	 de	 um	 psicólogo	 profissional.	 Este	 torna-se,	 então,	 valioso
colaborador	do	médico,	para	eficiência	de	tal	Instituto”	(Guimarães,	apud	Penna,	1985,	p.	28).	Para	a
direção	do	laboratório	foi	chamado	o	psicólogo	polonês	Waclaw	Radecki.
O	laboratório,	que	contava	com	sofisticados	equipamentos	vindos	de	Paris	e	Leipzig,	“funcionava
como	 instituição	 auxiliar	médica;	 (2)	 como	 auxiliar	 das	 necessidades	 sociais	 e	 práticas;	 (3)	 como
núcleo	de	pesquisas	científicas;	(4)	como	centro	didático	para	formação	de	psicólogos”.	(Penna,	1985,
p.	30).
A	 extensa	 produção	 do	 laboratório	 demonstra,	 em	 relação	 aos	 asilos	 já	 estudados,	 um	 imenso
avanço	 em	 direção	 ao	 reconhecimento	 da	 autonomia	 científica	 e	 prática	 da	 Psicologia	 no	 Brasil.
Explicita-se	aí,	com	clareza,	que	a	Psicologia	é	vista	como	campo	próprio	de	conhecimento	e	ação,	ao
mesmo	tempo	em	que	é	reconhecida	sua	íntima	relação	com	a	Psiquiatria.
Do	 ponto	 de	 vista	 da	 produção	 do	 laboratório,	 além	 da	 quantidade	 de	 pesquisas	 e	 ensaios,	 três
elementos	 apresentam-se	 como	 particularmente	 significativos:	 a	 preocupação	 com	 a	 formação	 de
psicólogos	 e	 a	difusão	do	 conhecimento	psicológico;	o	 trabalho	 clínico	 e	 a	 aplicação	da	Psicologia	 a
questões	relativas	ao	trabalho.
O	laboratório	da	Colônia	contribuiu	com	uma	das	primeiras	referências,	no	Brasil,	da	perspectiva
psicoterápica,	 num	 momento	 em	 que	 tal	 campo	 de	 ação,	 quando	 existia,	 limitava-se	 à	 Psiquiatria.	 É
possível	 tomar	 como	 hipótese	 que	 esse	 tipo	 de	 trabalho,	 ainda	 que	 incipiente,	 tenha	 lançado	 algumas
bases	para,	mais	 tarde,	 tornar-se	um	dos	mais	 importantes	campos	de	atuação	da	Psicologia	no	país,	o
qual	 só	 nas	 décadas	 seguintes	 viria	 a	 ter	 contornos	 mais	 definidos	 como	 possibilidade	 de	 aplicação
psicológica.
Merece	referência	também	a	contribuição	do	laboratório	à	organização	do	trabalho,	que	se	mostra
claramente	 definida,	 particularmente	 no	 que	 se	 refere	 à	 utilização	 de	 testes	 para	 fins	 de	 seleção	 e
orientação	profissional.	Foram	realizados	estudos	e	pesquisas	sobre	fadiga	em	“trabalhadores	menores“,
seleção	 de	 candidatos	 à	 aviação	 militar,	 psicometria	 e	 questões	 profissionais	 etc.	 Além	 disso,	 é
necessário	dizer	que	o	trabalho	no	laboratório,	junto	com	outros	que	se	realizavam	em	outras	instituições,
traz	 uma	 nova	 característica	 às	 contribuições	 que	 até	 então	 as	 instituições	 psiquiátricas	 davam	 à
problemática	 do	 trabalho,	 cuja	 principal	 finalidade	 era	 exercer	 o	 controle	 e	 a	 disciplinarização	 do
proletariado	urbano	fora	dos	muros	da	fábrica.	A	partir	daí,	a	Psicologia	penetra	no	interior	do	processo
produtivo,	com	um	caráter	estritamente	técnico-científico,	por	meio	da	intervenção	direta	nos	processos
seletivos	e	no	estabelecimento	de	contingências	e	normas	nas	relações	de	produção,	com	base	no	saber
psicológico.
Um	destaque	especial	deve	ser	dado	à	importância	da	presença	de	Radecki	nesse	laboratório	e,	por
decorrência,	na	história	da	Psicologia	no	Brasil.	Foi	ele	o	autor	de	grande	parte	dos	trabalhos	produzidos
no	 laboratório,	 quando	 não	 colaborador	 ou	 orientador.	 Foi	 ele	 quem	 ministrou	 inúmeros	 cursos	 e
conferências,	 com	 influência	 significativa	 na	 divulgação	 e	 difusão	 da	 Psicologia	 no	 país.	 Suas
realizações	 constituem-se	 na	 quase	 totalidade	 da	 produção	 do	 laboratório,	 devendo-se	 a	 ele	 também,
provavelmente,	a	marcante	cultura	psicológica	presente	nos	trabalhos	produzidos,	em	que	são	freqüentes
citações	e	referências	a:	Ribot,	Claparède,	William	James,	Janet,	Forel,	Babinski,	Bernheim,	Kräepelin,
Bleuler,	 Minkowski	 e	 Kretschemer,	 dentre	 outros,	 devendo-se	 salientar	 a	 significativa	 presença	 da
Psicanálise.
Finalmente,	deve-se	reafirmar	que	a	Colônia	de	Psicopatas	do	Engenho	de	Dentro	foi	uma	das	mais
importantes	instituições	que	geraram	condições	para	o	estabelecimento	da	Psicologia	no	Brasil,	quer	pela
consolidação	desta	área	do	 saber	como	ciência,	quer	em	 relação	ao	 reconhecimento	de	 sua	autonomia
teórica	e	prática.
Liga	Brasileira	de	Higiene	Mental	e	instituições	correlatas
A	 Liga	 Brasileira	 de	 Higiene	Mental	 foi	 fundada	 em	 1923,	 por	 Gustavo	 Riedel,tendo	 em	 seus
quadros	os	mais	eminentes	psiquiatras	e	intelectuais	da	época.	Segundo	Jurandir	Freire	Costa,	o	objetivo
inicial	da	Liga	idealizada	por	Riedel	era	a	melhoria	da	assistência	ao	doente	mental.
A	 partir	 de	 1926,	 porém,	 esse	 objetivo	 foi	 cedendo	 lugar	 ao	 ideal	 eugênico13,	 à	 profilaxia	 e	 à
educação	dos	indivíduos.	A	preocupação	transferiu-se	do	indivíduo	“doente”	para	o	“normal”,	da	cura
para	 a	 prevenção,	 ampliando	 seu	 raio	 de	 ação	 para	 a	 sociedade	 como	 um	 todo,	 definindo	 a	 ação
psiquiátrica	como	prática	higiênica,	apoiada	na	noção	de	eugenia.
Essa	 concepção	 contribuiu	 para	 uma	 interpretação	 racista	 da	 sociedade	 brasileira,	 que	 tendia	 a
atribuir	 os	 problemas	 sócio-econômicos	 às	 questões	 raciais,	 especialmente	 à	 presença	 de	 “raças
inferiores”,	numa	explícita	referência	aos	negros	que,	junto	com	o	clima	quente,	eram	responsabilizados
pelo	atraso	do	país.	Essas	idéias	desembocaram	na	defesa	do	“embran​queci​mento	da	raça	brasileira”	e,
posteriormente,	na	busca	da	“pureza	racial”.
No	 bojo	 dessa	 discussão,	 a	 problemática	 educacional	 ocupou	 lugar	 privilegiado,	 sendo	 que	 a
ignorância	 era	vista	 como	uma	das	mais	graves	doenças	 sociais.	 Juntamente	 com	essa	questão	 e	 a	 ela
relacionada	 integra-se	 a	 problemática	 das	 relações	 de	 trabalho;	 temas	 que	 estiveram	 diretamente
articulados	ao	pensamento	da	Liga	e	constituíram-se	em	objetos	de	estudo	e	alvos	de	ação.
A	Liga	reconhecia	a	Psicologia	como	ciência	afim	à	Psiquiatria	e	estimulava	sua	produção.	Nesse
sentido,	foi	criado	um	laboratório	de	Psicologia,	cuja	direção	foi	inicialmente	confiada	ao	francês	Alfred
Fessard	e	posteriormente	a	Plínio	Olinto,	que	foi	sucedido	por	Brasília	Leme	Lopes.	Além	disso,	a	Liga
propôs	em	1932,	ao	Mi​nistério	da	Educação	e	Saúde	Pública,	a	presença	obrigatória	de	“gabinetes	de
Psicologia”	 junto	 às	 clínicas	 psiquiátricas,	 sendo	 a	 proposta	 acolhida	 em	 instruções	 do	 referido
ministério.	 Anualmente	 a	 Liga	 realizava	 as	 “Jornadas	 Brasileiras	 de	 Psicologia”,	 cujo	 objetivo	 era
difundir	pesquisas	puras	e	aplicadas	nessa	área	do	conhecimento.
Preocupação	com	a	Psicologia	teve	também	a	Liga	Paulista	de	Higiene	Mental,	fundada	em	1926,
por	 Pacheco	 e	 Silva,	 funcionando	 em	 moldes	 semelhantes	 à	 sua	 correspondente	 nacional.	 Na	 Liga
Paulista,	 a	 Psicologia	 aparecia	 explicitamente	 articulad4a	 às	 questões	 relativas	 à	 organização	 do
trabalho,	como	instrumento	de	obtenção	de	conhecimento	a	respeito	das	funções	psicológicas	presentes
no	 exercício	 profissional,	 tais	 como:	 funções	 psicomotoras,	 memória,	 atenção	 e	 julgamento;	 tais
elementos	 articulavam-se,	 na	 prática,	 à	 aplicação	 da	 Psicologia	 à	 seleção	 e	 orientação	 profissional.
Como	ilustração,	vale	a	pena	citar	um	trecho	de	Bonifácio	Castro	Filho14:
“A	higiene	mental	nas	oficinas	e	nas	profissões	em	geral	é	um	fator	de	grande	prosperidade	para
a	 indústria,	 porque	 assegura	 um	 melhor	 rendimento.	 Ela	 pode	 ser	 realizada	 pela	 orientação
profissional	e	pela	seleção	psicológica	dos	operários,	tendo	por	efeito:
1º)	 a	 eliminação	nas	oficinas	de	 certas	 classes	de	profissionais	 psicopatas	que	 constituem	um
peso	morto	e	um	grave	prejuízo	para	a	coletividade;
2º)	colocar	os	indivíduos	em	seus	devidos	lugares,	de	acordo	com	as	aptidões	mentais,	condições
que	favorecem	o	êxito	do	trabalho”	(Castro	Filho,	apud	Cunha,	1986,	p.	189).
Essas	idéias	buscavam	na	Psicologia	não	apenas	fundamentação	teórica	e	corpo	de	técnicas	úteis	às
suas	finalidades	de	higienização	social	do	trabalho	e	da	família,	como	também	prenunciavam	um	outro
tipo	 de	 prática	 que	 se	 aproximava	 da	 prática	 clínica	 da	 Psicologia	 no	 momento	 subseqüente,	 pelas
denominadas	“clínicas	de	higiene	mental”,	cuja	finalidade	era	de	origem	profilática	e,	portanto,	voltada
para	o	indivíduo	“normal”.
A	isso	deve-se	acrescentar	o	papel	desempenhado	pelo	Instituto	de	Higiene	de	São	Paulo,	cuja	ação
foi	semelhante	à	da	Liga	Brasileira	de	Higiene	Mental.	Esse	instituto	foi	dirigido,	a	partir	de	1926,	por
Geraldo	Paula	Sousa,	que	organizou	um	grupo	de	estudos	de	Psicologia	Aplicada,	do	qual	participaram
médicos,	educadores	e	engenheiros;	os	estudos	aí	realizados	versaram	sobre	a	Psicologia	do	Trabalho	e
deram	também	origem	ao	“Serviço	de	Inspeção	Médico-Escolar”,	no	qual	foi	criada	uma	escola	especial
para	crianças	com	deficiência	mental	e,	em	1938,	uma	clínica	de	orientação	infantil,	provavelmente	uma
das	primeiras	no	país,	chefiada	por	Durval	Marcondes.
A	 concepção	 psiquiátrica	 das	 Ligas	 de	 Higiene	Mental,	 embora	 fortemente	 arraigada	 nas	 idéias
correntes	na	Psiquiatria	brasileira,	não	era	contudo	unânime.	Segundo	Freire	Costa,
“na	 mesma	 época,	 Odilon	 Galotti,	 no	 Rio,	 James	 Ferraz	 Alvim,	 em	 São	 Paulo,	 e	 Ulisses
Pernambucano	 em	 Recife	 (...)	 orientavam	 suas	 pesquisas	 numa	 direção	 totalmente	 oposta	 à
higiene	social	da	raça.	Para	esses	psiquiatras,	que	mantinham	também	ligações	com	a	L.B.H.M.,
a	higiene	mental	continuava	a	ser	aquilo	que	Riedel	havia	desejado	que	fosse:	melhoramento	e
humanização	da	assistência	psiquiátrica	aos	doentes	mentais”	(1976,	p.	63).
O	 pensamento	 e	 a	 ação	 das	 ligas	 são	 expressões	 de	 uma	 concepção	 autoritária	 de	 mundo,
representada	na	Psiquiatria	principalmente	pelo	pensamento	alemão,	nas	 figuras	de	Rudin,	Hoffmann	e
Meggen​dorfer,	continuadores	do	organicismo	de	Kräepelin.	Pretendia-se,	em	nome	da	ciência,	abarcar	o
controle	da	 sociedade	 e,	 para	 tal,	 defendia-se	 e	 estimulava-se	 a	 pesquisa	 e	 a	 aplicação	da	Psicologia
como	meio	 auxiliar	 para	 seus	 fins.	 É	 interessante	 notar	 que	 a	 Psicologia	 encontra-se,	 nesse	 contexto,
como	detentora	de	um	saber	 e	de	um	corpo	de	 técnicas,	particularmente	 a	psicometria,	 rela​cionada	às
práticas	especificamente	psicológicas,	numa	versão	bastante	próxima	das	atuais.
O	Movimento	Psiquiátrico	de	Recife
Esse	 movimento	 erigiu-se	 sobre	 o	 alicerce	 representado	 pelas	 idéias	 e	 ações	 de	 Ulysses
Pernambucano,	caminhando	na	contramão	do	pensamento	psiquiátrico	corrente	na	época	e	contribuindo
significativamente	para	a	Educação	(que	será	especificamente	abordada	no	próximo	capítulo).
Formado	 na	 Faculdade	 de	Medicina	 do	 Rio	 de	 Janeiro,	 Pernambucano	 foi	 discípulo	 de	 Juliano
Moreira;	 porém,	 sua	 prática	 distanciou-se	 da	 Psiquiatria	 organicista	 preponderante	 nos	 meios
acadêmicos	e	 institucionais	de	então.	Nomeado,	em	1924,	diretor	do	Hospital	de	Doenças	Nervosas	 e
Mentais	 de	 Recife,	 aboliu	 os	 calabouços	 e	 as	 camisas-de-força,	 implantou	 a	 praxiterapia,	 criou	 o
Pavilhão	de	Observações,	o	Laboratório	de	Análises	e	o	Pavilhão	de	Hidroterapia,	tendo	também	criado
o	sistema	de	“internato	acadêmico”	para	os	jovens	médicos	estagiarem.
Teve	 Pernambucano	 participação	 fundamental	 na	 implantação	 da	 “Assistência	 a	 Psicopatas	 de
Pernambuco”,	assim	composta:	serviços	para	doentes	mentais	não	alienados,	com	ambulatório	e	hospital
aberto;	 serviços	 para	 doentes	 mentais	 alienados,	 com	 hospital	 para	 doentes	 agudos	 e	 colônia	 para
doentes	 crônicos;	Manicômio	 Judiciário;	 Serviço	 de	 Higiene	Mental,	 com	 Serviço	 de	 Prevenção	 das
Doenças	Mentais	e	Instituto	de	Psicologia.	Sobre	o	Serviço	de	Higiene	Mental,	afirma	João	Marques	de
Sá15:
“Creio	 mesmo	 que	 o	 Serviço	 de	 Higiene	 Mental	 foi	 o	 responsável	 pela	 suspensão	 da
interferência	da	polícia	sobre	os	cultos	afro-brasileiros.	As	seitas	africanas	tiveram	em	Ulysses	e
no	 mestre	 Gilberto	 Freyre	 os	 mais	 ardentes	 defensores,	 passando	 a	 receber	 certo	 grau	 de
controle	científico	do	serviço	de	Higiene	Mental”	(1978,	p.	20).
A	referência	acima	a	“controle	científico”	relaciona-se	prova​velmente	aos	estudos	realizados	por
Pernambucano	 sobre	 os	 africanos	 no	 Brasil	 e	 que	 o	 fez	 conhecido	 também	 como	 antropólogo.	 Esses
estudos	 foram	 inicialmente	 influenciados	 por	 Nina	 Rodrigues,	 cujo	 teor	 era	 marcadamente

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