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Psicodiagnóstico- processo de intervenção

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MARÍLIA ANCONA­LOPEZ (arg.) 
ANGELA M. R. VORCARO . 
CHRISTLNA CUPERTLNO . 
CLÁUDIA B. BRUSCAGIN .
 DELBA T. R. BARROS . 
GOHARA YVETTE YEHIA . 
MARCOS T.
MERCADANTE .
 MARIA LUlZA P. MUNHÓZ .
MARY D. E. SANTIAGO. 
SILVIA ANCONA­LOPEZ . TEREZA I. H. MITO. 
YARA MONACHESI
PSICODIAGNÓSTICO:
Processo de intervenção
2º edição
1998
EDITORA CORTEZ 
SUMÁRIO
Psicodiagnóstico: uma prática em crise ou uma
prática na crise? PG 9
Mary Dolores Ewerton Santiago
Psicodiagnóstico: processo de intervenção? 
Silvia Ancona-Lopez, PG 26
Psicodiagnóstico formal e avaliação informal
Tereza /ochico Hatae Mito, 37
Compreender ou estranhar: incidências no psicodiagnóstico, PG 51
Ângela Maria Resende Vorcaro
Introduzindo o psicodiagnóstico grupal interventivo: uma história de negociações,PG 65
Marília Ancona-Lopez
Reformulação do papel do psicólogo no psicodiagnóstico fenomenológico-existencial e sua 
repercussão sobre
os pais, PG 115
Gohara Yvette Yehia
o psicodiagnóstico fenomenológico e os desencontros possíveis, PG 135
Christina Menna Barreto Cupertino
A criança participante do psicodiagnósticoinfantil grupal . PG 179 
Maria Luiza Puglisi Munhóz
"Reflexões sobre o uso do psicodiagnóstico em instituições, PG 196
Yara Monachesi
O processo de escolha diagnóstica em uma equipe multidisciplinar: análise das 
negociações, PG 205
Marcos Tomanik Mercadante
Bibliografia comentada: psicodiagnóstico , PG 216
Cláudia Beatriz S. Bruscagin
Delba Teixeira Rodrigues Barros
Bibliografia complementar, PG 232
Claudia Beatriz S. Bruscagin
Delba Teixeira Rodrigues Barros
PSICODIAGNÓSTICO: UMAPRÁTICA EM CRISE OU UMA PRATICA NA CRISE?
Mary Dolores Ewerton Santiago*
Vários são os modelos adotados para obter uma compreensão ou conclusão
diagnóstica sobre o paciente e, entre eles, aquele proposto por O campo e Garcia Arzeno
parece norte ar o trabalho de grande parte dos profissionais da área. O fato de as referidas
autoras terem sistematizado com propriedade os conceitos concernentes ao
psicodiagnóstico sob uma ótica psicanalítica e oferecerem dele uma concepção ampla e
enriquecedora - principalmente no que diz respeito à relação transferêncial /
contratransferencial e à devolução diagnóstica ao paciente no final do processo - contribuiu
para divulgar seu trabalho em nosso meio.
Ocampo e Garcia Arzeno caracterizam o psicodiagnóstico como uma prática bem
delimitada, cujo objetivo é "obter uma descrição e compreensão o mais profunda e
completa possível da personalidade total do paciente ou do grupo familiar. (u.) Abarca os
aspectos pretéritos, presentes (diagnóstico) e futuros (prognóstico) dessa personalidade.
(...) Uma vez obtido um panorama preciso e completo do caso, incluindo os aspectos.
* Doutoranda em Psicologia Clínica pela PUC/SP. Professora do Instituto de Psicologia
da USP e da Universidade Paulista - UNIP.
 9
patológicos e os adaptativos, trataremos de formular recomendações terapêuticas
adequadas (terapia breve e prolongada, individual, de casal, de grupo familiar ou grupal;
com qual freqüência; se é recomendável um terapeuta homem ou mulher, se a terapia pode
ser analítica ou de orientação analítica ou então outro tipo de terapia; se é necessário um
tratamento medicamentos o paralelo etc.)"I.
Abarcar esta proposta, procurando realizá-Ia tal como foi formulada, facilmente
mobiliza no profissional muita ansiedade, pois ele acha-se convocado a revelar um amplo e
profundo conhecimento das teorias e técnicas psicológicas que dão suporte ao seu
trabalho; as fantasias que permeiam e influenciam suas atitudes tendem a oscilar entre a
onipotência e a impotência, principalmente se ele tem pouca experiência clínica. De fato,
dar conta de compreender tantos aspectos implicados no atendimento psicodiagnóstico, em
um curto período de tempo, evidencia facilmente a magnitude da tarefa e pode levar o
profissional, inconscientemente, a se comprometer mais com ela do que com o seu
paciente. Neste sentido, realiza entrevistas que coletem o máximo possível de informações,
e o paciente, solicitado a buscar nos arquivos de sua memória fatos significativos que
ajudem o psicólogo a construir uma compreensão clara sobre seus problemas, assume
fundamentalmente o papel de informante.
Mas o paciente busca auxílio psicológico em um momento muito particular de sua vida.
Algo rompeu seu status quo psíquico, de tal modo que ele, sozinho, não consegue dar
conta da situação. Sua busca denuncia a falência das medidas anteriormente tomadas para
a resolução dos problemas que o afligem, assim como uma insuficiência dos sistemas
explicativos que construiu sobre suas causas. É esta condição singular que exige uma
atenção mais demorada de ambos os participantes,
I. CAMPO, M. L.; GARCIA ARZENO, M. E. et aI. Las técnicas proyectivas y el proce.w
psicodiagnÔstico. 3. ed. Buenos Aires: Nueva Visión, 1975, p.IS.
 10
;em a precipitação de logo iniciar uma pesquisa sobre toda a história do paciente.
Como, muitas vezes é a primeira modalidade de atendimento psicológico buscada pelo
indivíduo, o psicodiagnóstico em uma importância significativa, não só quanto à conclusão
diagnóstica, mas principalmente quanto ao modo de o psicólogo colher o paciente,
relacionar-se com ele, dimensionar com certeza suas dificuldades sem torná-las o objeto
único de suas Investigações. Supomos também que a busca de auxílio psicológico poderia
estar revelando um momento de crise do paciente.
Vejamos alguns pontos de vista sobre a crise. Moffatt, Cuja concepção psicopatológica
está mais centrada nos transtornos de identidade, considera que "a crise se manifesta pela
vasão de uma experiência de paralisação da continuidade do ) processo da vida"2. O que
provoca a crise é o inesperado de Ima situação; se a perturbação se intensifica "há uma
desconinuidade na percepção de nossa vida como uma história ;coerente, organizada
como uma sucessão na qual cada uma Ias etapas é conseqüência da anterior"3. Neste
contexto, o indivíduo não consegue perceber a si mesmo como aquele de mentes e nem
tampouco manter uma atitude prospectiva.
Simon aponta que "o essencial na geração da crise é o 'ato de o indivíduo se ver frente
a uma situação nova e principalmente transformadora"4. Apoiando-se em conceitos klei -
lianos, considera que "os sentimentos de intensa angústia, às rezes de pânico, que
assaltam o sujeito em crise, não seriam levidos apenas à falta de solução para o novo, mas
à projeção : identificação do novo com fantásticas ameaças provocadas )elas figuras
aterrorizantes das camadas do inconsciente que : mergem nesses estados de extrema
tensão emocional".
2. MOFFATT, A. Terapia de crise. São Paulo: Cortez, 1982, p. 13.
3. Id., ibid.
4. SIMON, R. Psicologia clínica preventiva. São Paulo: EPU, 1989, p, 58.
 11
Estas concepções distintas, que relacionam a crise à perda da construção imaginária
do tempos, ou à irrupção de ansiedades arcaicas anteriormente sob controle6 e que
privilegiam diferentes tipos de crises ("crises evolutivas e traumáticas"7, "crises por perda e
por aquisição"8), têm, no entanto, um denominador comum: a crise é provocada por um
fato novo, inesperado, desconhecido.
O fato novo que ocorre com o paciente é que ele não está conseguindo lidar sozinho
com os problemas que o afetam, que suas tentativas neste sentido foram infrutíferas. É
este fato novo que provoca uma mudança no equilíbrio psíquico anterior, mantido com
certas crenças acerca de si mesmo ou do mundo. "Algo" está em desacordo com elas e
esse desacordo freqüentemente é acompanhado de sentimentos de dor e ansiedade, que
podem despertar temores antigos e tornar ainda mais difícil a sua condição interna atual.
Assim, podemos considerar que ao buscar um profissional, o paciente está em uma
situação de crise.
A nosso ver, faz-se necessária, uma atitude continente e empática com o paciente,
uma disposição para escutá-Io e estabelecercom ele um verdadeiro diálogo. E isso implica
necessariamente incluir o paciente no processo diagnóstico de um modo diferente do que
comumente ocorre, ou seja, estimulando-o a compartilhar do trabalho compreensivo em
curso. Ele poderá assim vincular-se à tarefa de modo mais ativo, encontrando um outro
lugar na relação que não somente o de mediador dos dados sobre sua história, e
gradativamente poderá tomar contato com alguns aspectos mais manifestos de sua
conduta.
Estamos familiarizados com a idéia de que o psicólogo deve incluir-se no trabalho
clínico, que é sempre e fundamento.
pg12
uma relação humana, fazendo uso de seus recursos intelectuais, suas emoções, suas
percepções para melhor compreender o paciente. Mas ainda não atentamos
suficientemente para a rotina diagnóstica, que em geral configura uma relação e uma
expectativa de que o saber, o conhecimento, a atitude mental ativa durante o processo são
privilégio ou dever somente do psicólogo.
Pode ocorrer que o paciente procure delegar ao profissional toda a responsabilidade de
chegar a uma compreensão e explicação plausível sobre o que está lhe acontecendo,
baseando-se na crença de que somente ele tem o saber e o poder de fornecer sugestões
úteis. Mas esta situação é equívoca, dado que pode estar respondendo a uma necessidade
defensiva .O paciente no momento. E a tendência, se o psicólogo assim permitir, é de que
se estruture uma relação muito assimétrica, em que o paciente é marginalizado do
processo compreensivo que vai se delineando no diagnóstico.
Dois aspectos podem ser observados aqui: primeiro, a fantasia de incompetência, de
"não saber" do paciente é : compartilhada pelo psicólogo e talvez aceita por ele como Ima
realidade; segundo, a expectativa ansiosa de ambos para chegar a uma compreensão dos
problemas e encontrar medidas remediadoras. .
Contudo, uma relação deste gênero, baseada nas fantasias .e impotência de um e de
onipotência de outro, dificulta : sobremaneira um trabalho clínico proveitoso porque
fundamenta- se na negação. Negação das capacidades ou potencialidades 10 paciente,
negação dos limites do psicólogo, negação da lificuldade de realizar um trabalho profícuo
com tantas distorções perceptivas e sem a participação compreensiva do paciente.
Poder-se-ia argumentar que essa modalidade de relação é omum no diagnóstico, devido
principalmente às fantasias do paciente e à dificuldade ou mesmo à impossibilidade de lidar
com elas no breve período de tempo disponível para esse trabalho. Embora tal argumento
seja verdadeiro, parece-nos.
pg13
apenas um ângulo da questão, que é mais ampla e tem outras implicações.
Referendar a negação do paciente quanto às suas próprias capacidades e aceitar a
idealização que ele faz da pessoa do psicólogo exacerba a relação assimétrica e favorece o
estabelecimento de um vínculo com os aspectos mais emergentes e debilitados do
paciente. E, nessas condições, é provável que ocorra um "esvaziamento" das
possibilidades inerentes ao processo psicodiagnóstico: a construção de um espaço
intersubjetivo, compartilhado por ambos, psicólogo e paciente, com lugar para o saber de
um e o saber de outro, o reconhecimento dos limites de um e de outro.
É comum na entrevista inicial que o paciente chegue ansioso, não somente por suas
dificuldades, por sua situação de crise, como supomos, mas também por estar com uma
pessoa desconhecida, em um encontro que envolve a questão da avaliação.
Em suas considerações sobre a teoria e a técnica da entrevista, diz Eleger: "A entrevista é
sempre uma experiência vital muito importante para o entrevistado; significa com muita
freqüência a única possibilidade que tem de falar o mais sinceramente possível de si
mesmo com alguém que não o
julga, senão que o compreende. Desta maneira, a entrevista atua sempre como um fator
normativo ou de aprendizagem, ainda que não se recorra a nenhuma medida especial para
consegui-lo. Em outros termos, a entrevista diagnóstica é sempre e ao mesmo tempo, em
alguma medida, terapêutica" 9.
Esta concepção de Bleger parece dimensionar adequadamente a importância do
trabalho clínico. No encontro com o paciente, a qualidade da relação com ele estabeleci da
é fundamental. A nosso ver, também o psicólogo que realiza o psicodiagnóstico deveria
atentar mais para este aspecto e visar
pg14
Uma maior exploração, dos efeitos terapêuticos do processo. Mas, para isso, torna-se
necessário reexaminar alguns de seus procedimentos, especialmente aqueles relativos aos
assinalamentos e à devolução diagnóstica.
O campo e Garcia Arzeno consideram que "é necessária uma devolução de
informação diagnóstica e prognóstica discriminada e classificada, em relação com as
capacidades egóicas does) destinatários(s)" 1°. Acrescentam que ela deverá ser feita após
o término das entrevistas e testes, pelo psicólogo que realizou o processo psicodiagnóstico,
em uma ou várias entrevistas. "Tanto o psicólogo, como o paciente ou os pais, podem
colocar a necessidade de outras entrevistas devolutivas. De qualquer modo, é necessário
dar oportunidade aos interessados para metabolizar o que foi recebido na primeira
entrevista e esclarecer, ampliar ou retificar o que foi compreendido nela" lI.
Vale notar alguns aspectos desta proposta:
1. separação nítida entre uma primei~a etapa do diagnóstico (quando o psicólogo trata de
fazer uma investigação por meio de entrevistas e testes) e a etapa final (quando ele
devolve um conhecimento e compreensão);
2. provável intensificação da ansiedade do paciente devido ao período de espera entre a
entrevista inicial e a final;
3. dificuldade de retomar atitudes anteriores do paciente que possam contribuir para uma
melhor integração do material devolvido e que dependem, portanto, da memória do
psicólogo e do paciente;
4. As possibilidades de esclarecimento, reflexão ou "metaboização" do paciente, que
dependam da ajuda do psicólogo, Jarecem estar concentradas nas entrevistas finais;
pg15
5. prolongamento do processo psicodiagnóstico, que poderia então incluir várias entrevistas
devolutivas.
Ainda que possamos reconhecer muitos aspectos valiosos nas contribuições de O campo e
Garcia Arzeno para a prática do psicodiagnóstico, temos um ponto de vista distinto no que
diz respeito às devoluções ao paciente. Como já dissemos anteriormente, "(...) um
profissional experiente e competente pode fazer devoluções no decorrer das entrevistas,
assinalando aqueles elementos sobre os quais tem uma compreensão significativa" 12.
Tal conduta permite que o paciente tome contato com algumas de suas atitudes e
favorece sua auto-observação. Uma das situações que, a nosso ver, não pode passar
despercebida é aquela em que o paciente manifesta, no seu contato com o psicólogo, a
suposição de não ser capaz de expressar seu modo de pensar satisfatoriamente ou de não
ser bem dotado do ponto de vista intelectual. Essa suposição se traduz em um discurso
permeado de expressões do gênero "não sei, não", "eu não entendo", mesmo que em
seguida ele formule alguma explicação para aquilo que diz não saber ou não entender. No
atendimento clínico institucional, essa situação é bastante observada. Contudo, muitas
dificuldades surgem na relação quando este modo de o paciente referir-se a si mesmo não
é assinalado pelo psicólogo. Falar das dúvidas, da negação da capacidade de
entendimento, dos esforços de compreensão do paciente e das percepções ou
pensamentos adequados que ele expressa parece legitimar a capacidade compreensiva e
perceptiva do paciente para ele próprio. Temos a impressão de que não basta reconhecer
as angústias e emoções do paciente, porque ele precisa recuperar a confiança em sua
capacidade intelectual, instrumento importante para a observação, compreensão e
resolução de seus problemas.
12. SANTIAGO, M.D. E. Entrevistas clínicas. ln: Trinca, W. (org.) DiagnÓ.Hico
psicolÓgico: a prática clínica. São Paulo: EPU, 1984, p. 75.
 16
É claro que um assinalamento do psicólogo não levará paciente a mudar seu ponto de vista
sobre si mesmo (sabemos lhe algumas atitudes podem estar cristalizadas e ter seus
benefícios secundários), mas uma observação pertinente, no momento oportuno, resulta
muitas vezes útil porque possibilita ° paciente tomar contato com determinado aspecto de
sua personalidade. Outras vezes ocorre o contrário: o paciente já formulou seu próprio
"diagnóstico" e vem para confirmá-lo ou revela muita desconfiança quanto ao profissional
ou quanto O trabalho a ser realizado. É importante também que tais atitudes sejam
assinaladas para que o processo se desenvolva le modo mais explícito, principalmente no
que se refere à
relação paciente-psicólogo.
A questão de fazer uso de assinalamentos ou interpretações nas entrevistas
diagnósticas é controversa. Alguns propõem-se decididamente a essa idéia, considerando
que o psicólogo, na tarefa diagnóstica, deve limitar-se a realizar uma investigação. ), outros,
como O campo e Garcia Arzeno, deixam claro que os assinalamentos só devem ser feitos
em circunstâncias especíricas: o psicólogo intervém na entrevista inicial quando há
"situações de bloqueio ou paralisação por incremento da angústia, para assegurar o
cumprimento dos objetivos da entre
vista"13 e na devolutiva "(...) quando surgem indícios de fracasso na entrevista, como as
condutas estereotipadas ou a insistência em negar certos conteúdos (...)"14, focalizando
mais o tipo de vínculo que o paciente tem com ele do que propriamente o conteúdo de tais
condutas.
Não obstante, alguns outros profissionais reconhecem a necessidade de fazer certos
apontamentos ao paciente durante o processo psicodiagnóstico por considerarem que o
trabalho alcança uma dimensão mais ampla e compreensiva. Também argumentam a favor
de devoluções parciais e de realizar um trabalho em conjunto com o paciente.
 17
Verthelyi, por exemplo, expressa idéias bastante interessantes sobre esta questão: "em
certo sentido a devolução se inicia no momento mesmo da pré-entrevista e se encontra
inevitavelmente presente durante toda a avaliação. Entendida assim, a devolutiva se
converte em um 'processo' e não somente em um ponto de chegada, ainda que reservemos
a ou as últimas entrevistas para a integração final dos resultados e as recomendações" .15
Ampliando o conceito de devolução, Verthelyi esclarece que há aspectos implícitos que
vamos "devolvendo" ao paciente durante o processo e que incluem a disposição do
consultório, nossa atitude, nosso modo de' pensar, perguntar, planejar o atendimento desde
o primeiro contato telefônico ou a primeira entrevista. Por exemplo: um consultório que
possua uma poltrona confortável e cadeiras mais incômodas ou então assentos similares
para todos, pode transmitir e enfatizar o grau de simetria-assimetria e a distância que
tentamos dar à relação; quando solicitamos que os pais compareçam à primeira entrevista
e explicamos o "porquê" desta insistência, estamos "devolvendo" nossa valorização do
papel paterno. Desta forma, conclui a autora, "não se pode não 'devolver' (informar,
redefinir, esclarecer) certos aspectos de nossos critérios de saúde, doença e cura, inseridos
em um sistema ideológico e de valores que se expressam com maior ou menor grau de
consciência em nossa conduta" .16
Mas Verthelyi fala também das comunicações explícitas e das intervenções do
psicólogo durante o processo psicodiagnóstico. Definindo as intervenções como perguntas,
sugestões, comentários e assinalamentos que podem se dar basicamente em relação a:
1. condutas observáveis na relação do paciente com o psicólogo e a tarefa;
15. VERTHELYI, R. F. de. Tenw.s en evaluaciÓn psicolÓgica. Buenos Aires:
Lugar Editorial, 1989, pp. 50-51.
16. Id., ibid., p. 51.
 18
2. aspectos do material recolhido (testes).
A autora considera que: "Todas essas intervenções, ao mesmo tempo que ampliam a
informação que o psicólogo recolhe a respeito da flexibilidade ou rigidez do entrevistado (...)
funcionam antecipando aspectos da devolução final"17.
Esse enfoque permite-nos observar que as intervenções modificam a qualidade do
atendimento, levando-nos a estimar com mais clareza as possibilidades e limites do
paciente. Essas intervenções são, portanto, absolutamente necessárias para uma melhor
compreensão diagnóstica sobre ele. Por outro lado, elas também funcionam como
devoluções parciais, dando ao paciente a oportunidade de ter uma imagem diferente de si e
de suas circunstâncias. No contexto de um processo de avaliação diagnóstica como uma
tarefa conjunta, tal como propõe Verthelyi, a devolução deve ser sempre útil. e
enriquecedora para o indivíduo.
Não passa despercebido, contudo, o fato de Verthelyi usar o termo genérico
"devolução" em vez da específica expressão "devolução diagnóstica". Também não passa
despercebido o cuidado com que aponta para a necessidade de diferenciar
psiCodiagnóstico de psicoterapia: "convém diferenciar com clareza a ou as entrevistas de
devolução das possíveis entrevistas terapêuticas ou de orientação posteriores que podem
surgir a partir das recomendações já previstas ou das temáticas que aparecem no
fechamento do diagnóstico. Qualquer entrevista posterior à devolução requer o
estabelecimento de um novo contrato que explicite o enquadre, as características e os
objetivos da tarefa" .18
Esta preocupação de delimitar nitidamente as fronteiras entre psicodiagnóstico e
psicoterapia talvez seja compartilhada por grande parte dos profissionais que realizam o
psicodiagnóstico. Parece haver um receio muito grande de confundir
 19
fos dois processos, teoricamente concebidos como distintos. Mas, na prática, é possível
manter essa diferenciação?
Priedenthal discute esta questão em um interessante artigo em que ressalta a
necessidade, na aplicação das técnicas projetivas, de dialogar com o paciente e de rastrear
juntamente com ele a significação do material de testes, à medida que este se apresenta,
fazendo uso de perguntas, comentários e assinalamentos. Argumenta ser este
procedimento imprescindível para testar as hipóteses que vão sendo formuladas e assim
obter maior esclarecimento e compreensão do material, pois o psicólogo, muitas vezes
preocupado com o "mundo interno" do paciente, pode ficar com elementos algo abstratos
tais como a "imagem" que o paciente tem do casal (sem vinculá-Ia com sua relação
concreta de casal) ou seu "nível de aspiração" (sem vinculá-Io com seu trabalho ou com
seus estudos). Mas, dialogar com o paciente, fazer-lhe perguntas que, muitas vezes, ao
chamar sua atenção sobre um aspecto, funcionam como assinalamentos, é diagnóstico ou
terapia?
Para Priedenthal, a distinção entre os dois é apenas teórica, impossível de ser mantida
na prática clínica. Pois "que significa tudo isso de falar com o paciente sobre seu material e
fazer-lhe perguntas, pedir-lhe associações, mostrar-lhe como se inibiu, que lapsos teve,
quantas repetições de imagens negativas, ou que formas de reagir ocorreram em sua
produção etc? Não é isso tornar consciente o inconsciente (ou como se queria formulá-Io
teoricamente)? Não é isso fazer psicoterapia?,,19
Priedenthal vai mais longe e considera que o psicólogo pode fazer um maior uso desse
procedimento, "seja porque pretende explorar a capacidade de insight do paciente e sua
reação a interpretações, ou porque quer converter o próprio processo de psicodiagnóstico
em uma intervenção terapêutica"2o.
19. FRIEDENTHAL, H. Interrogatório, test de límites y seiíalamientos en el test de
relaciones objetales. In: Verthelyi, R. F. de (comp.). El test de relaciones objetales de H.
Phillipson. Buenos Aires: NuevaVisión, 1976, p. 66.
20. Id., ibid., p. 89.
 20
Friedenthal parece focalizar sua atenção na exploração de todos os recursos
disponíveis (a relação paciente-psicólogo, os testes, os comentários e lembranças do
paciente), a fim de ir ampliando, junto com o paciente, a compreensão que ele tem de si
mesmo. É com esse objetivo que faz intervenções, perguntas e assinalamentos específicos
(estes últimos os mais eficazes, em sua opinião).
Estamos de acordo com Priedenthal que esta forma de trabalho é muito mais
enriquecedora para ambos os participantes (psicólogo e paciente) e que a introdução de
assinalamentos durante o processo psicodiagnóstico (nas entrevistas ou ao final da
administração de cada teste) "permite que o processo introjetivo característico da
devolução se dê de forma dosificada" 21.
Também consideramos que é difícil manter a fronteira entre psicoterapia e
psicodiagnóstico, dado que, no atendimento psicodiagnóstico, como diz friedenthal, as
intervenções fazem-se quase sempre necessárias: "seja para esclarecer situações trans
ferenciais que interferem, seja para aliviar a ansiedade aguda do paciente, ou para pôr à
prova como ele responde a interpretações, o psicólogo (de orientação psicanalítica) logo
intervém com comentários que por sua vez alteram ou gravitam na conduta posterior do
paciente, de modo que se embarca em um processo característico da psicoterapia". 22
Podemos observar que os modos de proceder no psicodiagnóstico, seguindo O campo
e Garcia Arzeno ou Verthelyi e Friedenthal, implicam significativas diferenças. O tipo de
trabalho realizado pelas duas últimas evidencia a necessidade de uma conduta mais
plástica por parte do psicólogo, a necessidade de que ele desenvolva sua capacidade
clínica, sua sensibilidade para captar indícios significativos e decidir quando e como deve
atuar com aquele determinado paciente. Em
 21
Outras palavras, evidencia que ambas as tarefas, diagnóstico e psicoterapia, exigem a
mesma capacidade de compreensão e empatia para o trabalho.
Essas idéias são importantes porque convidam a refletir sobre o modo tradicional de
realizar o psicodiagnóstico, que comumente resulta em um conhecimento que tem utilidade
apenas para o futuro, isto é, para o encaminhamento terapêutico do paciente, nem sempre
seguido por este, como já fez notar Ancona-Lopez23 em um trabalho de pesquisa sobre o
atendimento psicológico nas clínicas-escolas. A par desta constatação, sabemos que o
processo psicodiagnóstico, território absoluto do psicólogo, onde estão assentadas as
diferenciações que lhe conferem identidade, tornou-se também um domínio para o qual
confluem muitas divergências. As diferentes leituras possíveis do material do paciente, os
distintos referenciais teóricos nos quais elas se baseiam tornam as conclusões diagnósticas
um alvo fácil para muitos questionamentos e reduzem a credibilidade a elas outorgada por
outros profissionais. Não raro o paciente torna-se objeto de disputa de poder pelo
conhecimento ou é novamente submetido a outra situação diagnóstica para que o
profissional ao qual foi encaminhado para atendimento psicoterápico possa formular seu
próprio parecer sobre o "caso".
Este quadro tem suscitado muitas inquietações naqueles que trabalham com o
psicodiagnóstico em consultório particular ou em instituições, levando-os a questionar a
finalidade do trabalho realizado com o paciente. Afinal, os problemas evidenciados não
sugerem a existência de "lacunas" na concepção que o psicólogo tem de seu papel no
psicodiagnóstico? Não está afetada a sua própria identidade profissional? Para quem o
psicodiagnóstico é útil: para o psicólogo que realizou o processo, para o paciente ou para o
terapeuta ao qual ele foi encaminhado? Não se faz necessário redefinir o papel do
 22
psicólogo e modificar a prática diagnóstica, de modo que ela se torne, tanto para o
psicólogo quanto para o paciente, dotada de sentido ou de especificidade durante a sua
realização?
Estas interrogações pertinentes obrigam-nos a reconsiderar nossa relação com o
paciente, que vem em busca de ajuda para saber e compreender o que está lhe
acontecendo e vê suas necessidades frustradas quando o psicólogo se exime de uma
interação mais ativa com ele silenciando sobre suas suposições ou percepções acerca do
que se passa nas entrevistas. A idéia de que o paciente só poderá realmente tomar contato
com suas dificuldades e tratar de seus problemas posteriormente, em uma psicoterapia, é
altamente duvidosa. Pode-se supor que a inobservância das recomendações terapêuticas
ou a falta de motivação para segui-Ias derivam da experiência psicodiagnóstica, que pode
influenciar de modo significativo a atitude do paciente para com outros profissionais ou
instituições. Se ele não pode sentir-se compreendido, se não pode conhecer ou reconhecer
alguns de seus aspectos, suas expectativas serão de que o mesmo ocorrerá no tratamento
proposto.
É preciso rever antigas concepções que encaram o psicodiagnóstico apenas como um
referencial para o encaminhamento psicoterápico e consideram que seu valor é apenas
compreensivo, uma vez que a relação com o paciente, mesmo quando enfocada sob o
ângulo da transferência e contra-transferência, não pode ser usada como instrumento de
trabalho. Do mesmo modo, é preciso abandonar a idéia de que o psicodiagnóstico não tem
objetivos terapêuticos e empenhar-se em fazer dele uma prática cujos efeitos sejam
terapêuticos.
Essa necessidade de revisão também se aplica às crenças de que as intervenções do
psicólogo durante o psicodiagnóstico poderiam ter conseqüências desastrosas, de que o
paciente poderia desorganizar-se, já que não suportaria entrar em contato com alguns de
seus aspectos ou não compreenderia o que o psicólogo quisera lhe dizer ou mostrar. Essas
ressalvas valem para alguns pacientes, mas não para todos. É oportuno lembrar que
nossas fantasias inconscientes a respeito do conhecimento
 23
(e mais especificamente do autoconhecimento) influenciam sobremaneira nosso trabalho e
podem impedir-nos de discriminar adequadamente se nossas atitudes derivam do cuidado
de não tornar as devoluções (parciais ou finais) traumáticas ao paciente ou se respondem
às nossas próprias necessidades defensivas.
Observamos que, muito freqüentemente, o psicólogo adota a atitude de quem sabe ou
compreende tudo, mas não pode comunicar esse saber ao paciente, ou a de quem nada
sabe e portanto nada pode falar, esperando que os testes lhe dêem alguma informação ou
confirmem algumas de suas suposições. Em outras palavras, o psicólogo oscila entre uma
supervalorização e uma desvalorização de suas condições pessoais.
Grande parte dos argumentos que apóiam tais idéias e atitudes remete à questão da
interpretação, da inadequação de seu uso no psicodiagnóstico e da especificidade do
trabalho psicoterápico. Não obstante, embora muitos considerem a interpretação como o
elemento que marca a distinção entre psicodiagnóstico e psicoterapia, é pertinente atinar
também para um outro elemento que marca a semelhança entre os dois processos: a
relação paciente-psicólogo.
Os autores aqui citados deixam claro a importância primordial dessa semelhança e
concordam que o efeito terapêutico do processo psicodiagnóstico decorre basicamente da
qualidade da relação estabelecida com o paciente. Nosso principal foco de atenção e
preocupação deveria, então, ser este: nossa relação com o paciente. Se nossa intervenção
for necessária em algum momento - e ela sempre o será se nos dispusermos a realizar um
trabalho conjunto com o paciente -, procuraremos nos orientar pelos emergentes da
situação. Neste contexto, será possível respeitar as resistências do paciente, discriminar os
aspectos acessíveis e aceitáveis para ele no momento, fazer devoluções parciais que não
signifiquemuma antecipação de algum material que só adquire sentido quando integrado.
Este tipo de procedimento, que permite um contato mais profundo com o paciente,
pode realmente suscitar muito mais ansiedade no psicólogo, já que exige dele uma
abertura maior
 24
para suas próprias experiências internas e para as dificuldades e podem surgir com as
resistências e ambigüidades do ciente. No entanto, se pensamos que todos esses aspectos
tão inextricavelmente ligados à nossa condição de psicólogo 'nico, observamos que não há
como iludi-los na situação agnóstica. Como diz Friedenthal; "Talvez não seja somente
interpretação que faça com que as entrevistas diagnósticas assemelhem às sessões de
terapia, se não o mero fato de le em umas e outras se produzam fenômenos transferenciais
"24.
Poder-se-ia ainda objetar que os procedimentos que su:rem uma atitude mais ativa de
ambos os participantes no processo psicodiagnóstico podem ser aplicáveis somente
quando i uma procura espontânea do atendimento psicológico, quando ) montamos com a
motivação do paciente e com o seu desejo e compreender a si mesmo. Mas, mesmo
naqueles casos em ue isso não acontece, pensamos que há necessidade de rastrear s
motivos que o levaram ao psicólogo, assinalando o que for 19nificativo para que o trabalho
possa ser uma tarefa conjunta
as devoluções não pareçam estranhas ao paciente. Algumas 'vezes o paciente já teve
experiências anteriores, já iniciou ou realizou o psicodiagnóstico com outros profissionais;
então, é pertinente nos perguntarmos: o que ele veio buscar aqui comigo? O que eu posso
fazer com ele neste momento?
 25
PSICODIAGNÓSTICO: PROCESSO DE INTERVENÇAO?
Silvia Ancona-Lopez*
INTERVIR (do latim intervenire): meter-se de permeio, ser ou estar presente, assistir, 
interpor os seus bons ofícios I.
Meter-se de permeio: indica atuação. Posição ativa de alguém que interfere, que se coloca 
entre pessoas, que de algum modo estabelece um elo, uma ligação.
Interpor os seus bons ofícios: ação de quem tem algum preparo em determinada área e 
põe seus conhecimentos à disposição de quem deles necessita. Ação de quem acredita no 
que faz.
Estar presente: não indica necessariamente uma ação, o que leva a pensar em alguém 
disponível, que aguarda uma solicitação. Estar presente parece indicar uma posição, 
alguém a quem se pode recorrer e que está inteiro na situação.
Assistir. indica ajuda, cuidados, apoio.
Na maioria das vezes, quando uma pessoa recorre a um atendimento psicológico, já
utilizou, sem sucesso, seus recursos e seu repertório de conhecimentos para resolver
determinado impasse. Ao aceitar a proposta do psicólogo de passar por um
psicodiagnóstico, esta pessoa demonstra que está buscando
* Doutoranda em Psicologia Clínica pela PUC-SP. Diretora da Clínica Psicológica
das Universidade São Marcos. Professora da Universidade Paulista - UNIP.
I. FREIRE, L. Grande e novíssimo dicionário da língua portuguesa. Rio de
Janeiro: A Noite, 1942, p. 3011.
 26
compreender atitudes suas ou de outra pessoa (um filho, por exemplo) que não se
enquadram no que considera normal ou enquadram. Outras vezes o faz porque um terceiro
(professor médico) lhe diz que há algo errado.
Em qualquer dos casos, esta situação provoca uma sensação estranheza, se não de
sofrimento, permeada por uma impressão de incompetência, que impelem a pessoa a
buscar ajuda profissional.
Freqüentemente é um momento de fragilidade - 'já não sei mais o que fazer"-, em que o
cliente espera encontrar n profissional que esteja disponível, inteiro, totalmente voltado ira
ele, interessado e preocupado em ajudá-la, em dar-lhe apoio e em diminuir seu
desconforto.
Para poder abrir-se e participar com seus relatos e informações, o cliente precisa sentir-
se acolhido e confiar que tem diante de si alguém preparado, que inspire segurança, que se
10stre capaz de compreender sua demanda e que, com a ajuda de seus conhecimentos, o
leve a vislumbrar novas possibilidades.
Conhecer alguém implica, entre outras coisas, conhecer l rede de relações da qual esta
pessoa faz parte. Quando o pedido de psicodiagnóstico partir de um terceiro (pais ou
escola, no caso de crianças; empresa ou médico, no caso de adultos), caberá ao
profissional estabelecer o elo de ligação entre as pessoas e as instituições envolvidas.
Cabe-lhe ajudar o cliente a explicitar a dinâmica dessas ligações a fim de esclarecer como
essa rede é vivenciada.
Os vários sentidos da palavra intervenção - citados em epígrafe - podem ser
encontrados na prática do psicodiagnóstico. Há, no entanto, diferentes níveis de
intervenção possíveis e diferentes atitudes dos psicólogos diante dessa possibilidade, de
acordo com a postura teórica ou filosófica que adotarem. Pretendo, neste artigo, tecer
alguns comentários sobre essas diferenças.
 27
O psicodiagnóstico é uma atividade que veio se desenvolvendo paralelamente à
própria psicologia e à profissão de psicólogo, recolhendo suas práticas nas inúmeras
teorias que procuram conhecer e compreender o homem. Apresenta a questão da
pluralidade das referências, da flexibilidade dos modelos, da utilidade e das limitações do
process02.
O modelo tradicional de psicodiagnóstico é considerado pouco mais que uma coleta de
dados sobre a qual se organiza um raciocínio clínico que vai orientar o processo
psicoterápico. Assim, o psicodiagnóstico costuma ser um momento de transição,
passaporte para o atendimento posterior, este sim considerado significativo (porque capaz
de provocar mudanças), no qual o cliente encontrará acolhida para suas dúvidas e/ou
sofrimento.
A relação que se estabelece nesses psicodiagnósticos normalmente é mediada não só
pelo "terceiro", que fez o pedido, como também por um pressuposto profissional ausente, o
futuro psicoterapeuta. Esta triangulação, ou mesmo quadratura, influenciará a aproximação
entre psicólogo e cliente durante o processo que se está desenrolando. O modo como o
psicólogo considerar as diferenças entre os papéis de diagnosticador e de psicoterapeuta
se refletirá em posturas diversas, mesmo que ele próprio venha a desempenhar as duas
funções. Os que aproximam o papel de diagnosticador ao de observador imparcial tenderão
a se distanciar na relação de psicodiagnóstico, evitando assumir uma atitude de
intervenção para manter-se em uma postura investigativa, que resguarda seus
conhecimentos sobre o "sujeito". Neste caso acredito que o processo perderá muito de seu
sentido e mesmo de interesse ou utilidade para o cliente.
Toda atuação psicológica é uma ação de intervenção cujo significado será dado pelo
campo relacional que se estabelece
 28
entre as partes e que é exclusivo e peculiar àquele momento e àquela relação.
No entanto, de acordo com o pensamento psicológico tradicional, para que a relação
psicológica - se assim a podemos chamar - se transforme em uma relação significativa para
o cliente, ela deve ser longa e duradoura. Paralelamente, há também nesta tradição a idéia
de que um caso só será rico e interessante, para o psicólogo, se for difícil e necessitar de
muitas horas de acompanhamento.
Esta postura é mencionada por Freud em "O homem dos lobos" (1918) onde se lê: "As
análises que conduzem a uma conclusão favorável em pouco tempo são de valor para a
auto-estima do terapeuta, (...) mas permanecem em grande parte insignificantes no que diz
respeito ao progresso do conhecimento científico. Nada de novo se aprende com elas. (...)
A novidade só pode ser obtida de análises que apresentem especiais dificuldades e, para
que isso aconteça, é necessário que a elas se dedique bastante tempo"3 (p. 22).
Anos mais tarde (1937), no entanto, o próprio Freud se questiona sobre o tema da
duração da análise. Escreve ele: "A experiência nos ensinou que a terapia psicanalítica – a
libertação de alguém de seus sintomas,inibições e anormalidades de caráter neuróticos - é
um assunto que consome tempo. Daí, desde o começo, tentativas terem sido feitas para
encurtar a duração das análises. (u.) Eu mesmo adotei outro modo de acelerar um
tratamento analítico, inclusive antes da guerra. (u.) Nesse dilema, recorri à medida heróica
de fixar um limite de tempo para a análise"4 (pp. 247-248).
As reflexões de Freud, nesse texto, estendem-se pelos temas complexos do "término
da análise" e das possibilidades profiláticas da psicanálise. Todo o texto é permeado por um
certo ceticismo quanto à eficácia da psicanálise para provocar
 29
mudanças permanentes, alertando para a ingenuidade dos que esperam que seus clientes
atinjam "um nível de normalidade psíquica absoluta" (p. 251) mesmo após muitos anos de
terapia.
Freud aborda essas questões e demonstra claramente seu desconforto: "Partimos da
questão de saber como podemos abreviar a duração inconvenientemente longa do
tratamento analítico" (p. 267). E conclui: "Mas outro ponto já se tornou claro: se quisermos
atender às exigências mais rigorosas feitas à terapia analítica, nossa estrada não nos
conduzirá a um abreviamentode sua duração, nem pa~sará por ele" (p. 255).
As questões sobre alta, duração e mudanças ocorridas no decorrer de um atendimento
psicológico referem-se sempre às chamadas psicoterapias e, no caso das citações acima, à
psicanálise, que é um processo todo especial. Assim, não é fácil estabelecer um elo com o
psicodiagnóstico. O que fica claro, no -entanto, é que a idéia de intervenção está sempre
ligada ao processo terapêutico.
Mesmo as terapias breves (que buscam resolver o dilema da duração apontado por
Freud) consideram que o processo de intervenção se inicia, preferencialmente, após um
período que poderia ser chamado de psicodiagnóstico. Este é constituído de algumas
sessões nas quais se selecionam os clientes que melhor possam beneficiar-se daquele tipo
de psicoterapia e a intervenção acontece apenas em situações especiais5.
Mais uma vez podem ser percebidas as marcas da tradição, que se mantém muito forte
entre os psicólogos, sobretudo entre os que se dedicam ao psicodiagnóstico. Como lembra
Mahfoud, diante das dificuldades do cliente, "a 'resposta padrão' do psicólogo é
psicoterapia"6. Esta mesma idéia é expressa por Silva: "Por identificar a prática
psicoterapêutica como sinônimo de atuação clínica é que o modelo único tem
 30
sido mantido (...), a psicologia tem tentado exercer um único modo de atuar através dos
atendimentos psicoterápicos de seguimento contínuo e/ou prolongado"7 (p. 31).
Assim, o psicodiagnóstico não é considerado, na maioria das vezes, como prática de
intervenção, pois além de se dar num número relativamente pequeno e determinado de
encontros, é entendido como prática de investigação, avaliação ou seleção. Deste modo,
não pode ser percebido como um momento passível de abrir perspectivas novas ou
possibilitar mudanças positivas para o cliente. Se estas últimas, eventualmente, ocorrerem,
serão creditadas à relação estabeleci da com o profissional, mas não assumidas por ele
como uma intenção ativa naquele momento. Isso implica que as novas perspectivas
abertas ao cliente, por não serem explicitadas, correm o risco de não ser devidamente
exploradas e de o processo perder muito da sua nqueza.
A visão clássica do psicodiagnóstico recomenda uma atitude de neutralidade, o que leva
a certo distanciamento do profissional, para facilitar as manifestações inconscientes do
cliente. Além disso, recomenda-se que os contatos com o psicólogo durante o
psicodiagnóstico não se estendam além do "necessário", a fim de evitar o desenvolvimento
de uma relação transferencial que exigiria outro tipo de atendimento.
Na minha opinião, esta postura distanciada, durante o psicodiagnóstico, implica certo
esforço, por parte do profissional, para impedir que a intervenção seja efetiva, já que, de
qualquer modo, ela estará ocorrendo. De acordo com Tsu: "As questões concernentes à
relação entre o psicólogo e o cliente, vistos como sujeitos que possuem interioridade
psíquica e que se movem numa rede de inter-relações, têm um caráter central em toda a
práxis psicológica"8.
 31
A mesma autora diz que "aquele que entrar em contato direto com o profissional
poderá vir a ser psicologicamente conhecido em sua dinâmica interna, ou seja, visto como
pessoa que se relaciona com as demais a partir dos dados da realidade exterior e da sua
própria realidade psíquica" (p. 40). Ora, este contato não é privilégio de um relacionamento
que ocorra dentro de um processo psicoterápico e, portanto, não pode ser desconsiderado
em um psicodiagnóstico.
Pelos motivos apontados anteriormente, no entanto, há um certo pudor em se admitir que,
no caso de um psicodiagnóstico, a relação que se estabelece no âmbito desse processo
possa vir a propiciar uma troca que venha a gerar transformações ou abrir novas
possibilidades para os componentes da relação.
Na verdade estamos tratando aqui de uma visão ampla da psicologia, que não limita a
intervenção psicológica a determinadas situações ou settings. Essa maneira de pensar a
psicologia exige uma atitude flexível, inventiva e responsável por parte do psicólogo, que
deverá transitar entre a teoria e a prática com certa desenvoltura9. À medida que o
profissional acredita que todo contato seu com um cliente pode (e a meu ver deve) ser um
momento significativo para ambos, sem dúvida adotará uma postura mais ativa e reverá
muitos dos conceitos que norteiam sua prática 10.
O relacionamento psicológico será significativo se produzir um conhecimento que se dê
na possibilidade de uma formulação
 32
conjunta da experiência vivida naquela relação, tanto no contexto de um psicodiagnóstico
como em uma sessão de psicoterapia.
Quando o cliente busca um psicólogo espera ser atendido em suas necessidades,
pouco importando sob que nome este atendimento se efetue li. Muitas vezes,
desconsiderando este pedido do cliente, o psicólogo, ao nomear sua prática, decide
postergar a intervenção, empobrecendo um encontro rico de possibilidades.
É preciso então perguntar: como pode se dar esta intervenção no âmbito do
psicodiagnóstico?
Inicialmente, torna-se necessário haver por parte do cliente o pedido de uma ajuda
imediata: a predisposição para iniciar um movimento no sentido da mudança. Esta
demanda, nem sempre explícita, ao ser captada pelo psicólogo deverá ser clareada ao
cliente. Por seu lado, se o psicólogo for capaz de despir-se dos conceitos tradicionais já
mencionados, que envolvem a práxis psicológica, será capaz de abrir-se para esta
demanda e convidar o cliente para uma caminhada conjunta.
Esta colaboração, no entanto, somente será possível se o psicólogo se abrir para a co-
participação do cliente e acreditar que este último pode compartilhar os conhecimentos que
se forem configurando durante o processo. É uma atuação que se caracteriza pelo fato de o
psicólogo partilhar suas impressões sobre (e com) o cliente, levando-o a participar do
processo e a abandonar a postura passiva de "sujeito" a ser conhecido 12. A partir daí, o
psicólogo manterá sua escuta voltada para as possibilidades de intervenção.
 33
A intervenção ocorre à medida que não se posterguem os apontamentos que
naturalmente ocorrem ao psicólogo durante os encontros, ou seja, quando se compartilha
com o cliente, durante as sessões de psicodiagnóstico, a maneira como ele se apresenta: a
impressão que causa ao psicólogo e as reflexões
que possibilita. Se for possível captar o estilo do cliente isto é, sob que formas ele 
estabelece relações com o mundo - e se ele puder ser esclarecido sobre isso, novas 
perspectivas de autoconhecimento certamente se abrirão para ele.
Os apontamentos serão interventivos se não repetirem as situações devida cotidiana
do cliente. Ou seja, quando introduzirem a estranheza no relacionamento, de modo a fazer
o cliente confrontar-se com uma ruptura: a ruptura de seus comportamentos usuais, a
ruptura da compreensão costumeira, a ruptura dos jogos relacionais que aprendeu a jogar.
Estabelecendo um paralelo com a relação amorosa e relevando os exageros poéticos
e os ciúmes que permeiam o soneto, podemos recorrer a Camões, que exige de sua
amada um comportamento diferenciado para com ele, de modo que possa se sentir
distinguido entre todos.
Diz o poeta:
Se a ninguém tratais com desamor,
antes a todos tendes afeição,
e se a todos mostrais um coração
cheio de mansidão, cheio de amor;
desde hoje me tratai com desfavor, mostrai-me um ódio esquivo, uma isenção; poderei 
acabar de crer então
que somente a mim me dais favor.
Que, se tratais a todos brandamente, claro é que aquele é só favorecido a quem mostrais 
irado o continente.
Mal poderei eu ser de vós querido, se tendes outro amor na alma presente: que amor é um,
não pode ser partido.13
 34
Mesmo que o amor do psicólogo seja um amor partido, um amor vendido, nem por isso
deixará de ser amor. Mas só será uma relação amorosa pItdutiva e exclusiva se a atitude
do profissional garantir ao cliente a sua singularidade no momento do encontro.
Pergunta-se: como gerar esta situação de singularidade? Procurando responder a partir
da psicologia fenomenológica, esta singularidade se estabelece à medida que o psicólogo
mostra ao cliente o que 'lhe aparece' através do que o cliente ~stá lhe trazendo. Não é um
demonstrar ou um avaliar entre verdades e mentiras, mas o iluminar de um momento, de
uma ;ituação. Esta iluminação ou clareira 14 que se abre no existir io cliente de algum
modo desestrutura o estabelecido (a ruptura le que falava). É apresentar uma situação de
modo novo, nusitado e, por isso mesmo, no primeiro momento desconforável pois causa
uma desestruturação momentânea 15. Desestruuração provocada pelo aparecimento da
angústia que ocorre .0 se dissolver uma imagem solidificada, uma identidade stratificada.
Destruída ou abalada a maneira usual de o cliente gir, ele se verá diante da necessidade de
uma reorganização, ~ que lhe abrirá a possibilidade de novas escolhas.
Tanto quanto uma psicoterapia, o psicodiagnóstico pode Izer com que o cliente se
perceba como campo de possibiI:lades. A situação psicodiagnóstica parece-me privilegiada
este sentido porque pressupõe que se procure conhecer a mneira como o cliente se
apresenta. Isto é, faz parte do )ntrato do psicodiagnóstico dizer que se tentará mapear a
laneira como aquela pessoa estabelece as relações consigo, )m o mundo e com os objetos
e o que, na sua maneira de itar no mundo, a está incomodando ou aos outros. Isso se
 35 
faz pesquisando os acontecimentos marcantes, a história de vida e sua influência nas
transformações, o modo como a pessoa encara sua existência. Ou seja, pesquisa-se a
percepção do cliente a respeito de sua história de vida, percepção mobilizada no ato da
relação com o entrevistadorl6.
A fala do psicólogo pode revelar ao cliente a sua própria fala, desocultando o que está
encoberto, não interpretando, mas dando sentido. Isto é, a fala do cliente revela como seu
mundo lhe aparece. Cabe ao psicólogo, por sua vez, mostrar como este mundo lhe está
sendo mostrado pela fala do cliente: o mundo tal como se apresenta ao cliente.
Portanto, o cliente de psicodiagnóstico espera conhecer alguma coisa nova sobre si
mesmo. Melhor ainda, espera que a clareira, que abrirá um vazio no conhecimento que tem
sobre sua maneira de funcionar, lhe apresente novas possibilidades de ser. É, pois, injusto,
por parte do psicólogo, negar esta possibilidade ao cliente e desonesto trair-lhe a confiança,
guardando para si os conhecimentos que ele veio pedir que lhe fossem apresentados.
Não pretendo aqui sugerir que a atividade psicodiagnóstica se iguale à psicoterapia,
mas venho propor que não se perca
a oportunidade de tornar este momento com o psicólogo um encontro privilegiado,
significativo para o cliente. A idéia de intervenção no psicodiagnóstico faz-se cada vez mais
presente entre os psicólogos; discussões e textos sobre o assunto começam a proliferar.
Deixo, pois, aqui a minha contribuição.
 36
PSICODIAGNÓSTICO FORMAL E AVALIAÇÃO INFORMAL
Tereza Iochico Hatae Mito*
o psicodiagnóstico ocupa um lugar de destaque entre as opções oferecidas nos serviços
de psicologia que propõem um atendimento sistematizado, independentemente do motivo
que leva o paciente a procurar a instituição. Em geral, começa-se por uma inscrição
efetivada em uma entrevista de triagem, após a qual o paciente aguarda chamada para
psicodiagnóstico, como um trajeto obrigatório que dará acesso a algum tipo de terapia, se a
avaliação indicar sua necessidade. Continua a ser realizado em maior número do que as
psicoterapias propriamente ditas, se levarmos em conta os encaminhamentos após o
psicodiagnóstico, os abandonos e o pouco número de vagas disponíveis para psicoterapia
nas instituições de atenção à saúde mental I.
O psicodiagnóstico é quase sempre conduzido de forma tradicional, isto é, estruturado
em etapas previamente estabelecidas para atingir determinado objetivo. Segundo a
concepção
* Master of Arts in Education pela Osaka University of Education. Doutoranda em
Psicologia Clínica pela PUC-SP. Supervisora da Universidade São Marcos e professora da
Universidade Paulista - UNIP.
I. ANCONA-LOPEZ, M. Características da clientela de clínicas-escola de psicologia em
São Paulo. In: MACEDO, R. M. (org.). Psicologia e instituição: novas formas de
atendimento. 2. ed.. São Paulo: Cortez, 1986.
 37
psicodinâmica, proposta por Ocampo e Garcia Arzen02, seus objetivos são: conhecer,
investigar e compreender o paciente por meio de técnicas de entrevistas, observações
dirigidas e aplicação de testes. Há uma preocupação com o levantamento exaustivo da
história de vida da criança, a dinâmica familiar, a investigação das relações entre os
comportamentos do paciente e as concepções da psicopatologia. Utiliza-se uma seqüência
imposta pela necessidade de avaliar melhor os pontos obscuros para confirmar ou rejeitar
hipóteses acerca do paciente: dinâmica psicopatológica, deficiência intelectual, problema
neurológico, psicomotor etc.
Entretanto, na avaliação, o profissional não se restringe à interpretação dos dados
fornecidos pelo paciente no psicodiagnóstico formal. Não basta investigar apenas aspectos
do paciente; é preciso também levar em conta os aspectos do próprio profissional e da
relação que se estabelece entre ambos. A elaboração desses aspectos processa-se de
uma forma muito particular para cada profissional, que lança mão de recursos pessoais
para compreender as possibilidades do paciente e as suas para o desenvolvimento de um
trabalho psicológico. Pelo menos duas formas de avaliação são utilizadas: a primeira,
decorrente de um trabalho sistematizado, o psicodiagnóstico formal; e a segunda,
decorrente de um processo mais pessoal, "
pelo qual se avaliam alguns aspectos da relação psicólogo-paciente que não são passíveis
de ser analisados no processo convencional do psicodiagnóstico. É a este processo que
chamamos de "avaliação informal".
Este artigo quer discutir a relação que se estabelece entre estas duas avaliações,
centrando-se nesta última, o diagnóstico informal: o processo de avaliação espontâneo, que
acontece quando o profissional recebe o paciente para um primeiro contato, o momento em
que avalia a possibilidade de "estar
2. OCAMPO. M. L. S., GARCIA ARZENO. M. E. et aI. O processo psicodiagnóstico. In:
OCAMPO, M. L. S., GARCIA ARZENO. M. E. et a!. O processo psicodiagnÔstico e as
técnicas projetivas. São Paulo: Martins Fontes, 1981.
 38
com" o paciente para tornar efetivo seu trabalho, seja este de psicodiagnóstico ou
psicoterapia. Em outraspalavras, pretendemos abrir um espaço para refletir sobre essa
avaliação pessoal, considerando que, no início de qualquer processo, determinados
aspectos do paciente, são avaliados para que ele seja aceito. Tal aceitação implica que o
profissional julga que tem recursos pessoais para ajudar o paciente e que este tem
condições de se beneficiar da relação, independentemente dos resultados obtidos numa
avaliação sistematizada como o psicodiagnóstico tradicional.
Podemos considerar que a avaliação informal sempre foi utilizada; que a avaliação
formal surgiu da necessidade do profissional apegar-se a instrumentos "mais confiáveis" do
que sua própria percepção pessoal. Por um bom tempo os profissionais utilizaram
"cegamente" os recursos da avaliação formal, com a certeza e a tranqüilidade de estarem
fazendo a coisa "certa", não baseada em inferências pessoais, mas já estruturada e testada
por outros. Para tanto, a psicologia utilizou-se de modelos de identificação, principalmente
do modelo médico, para se afirmar e ser aceita como ciência, tentando estabelecer as
conexões causais para explicar e compreender o homem. 
Os testes contribuíram para o desenvolvimento de uma linguagem padronizada que
pudesse ser aceita pelas disciplinas científicas das quais passou a fazer parte. Assim, a
avaliação passou a ser considerada um modelo suficiente para dar conta do diagnóstico
psicológico de qualquer caso independentemente do psicólogo que o aplicava.
Entretanto, na prática, constatamos que o psicodiagnóstico formal, sozinho, tem pouca
utilidade. Em sua análise da relação entre psicodiagnóstico e psicoterapia infantil,
Marques3 constata que o extenso trabalho investido no psicodiagnóstico dentro da
instituição é pouco aproveitado pelo profissional para quem
3. MARQUES, Y. M. Utilização dOJ elementos do pJicodiagnÔJtico na pJicoterapia
infantil em instituiçi5eJ de atendimento pJicolÔgico. Dissertação de Mestrado, Psicologia
Clínica, PUC-SP, 1989, p. 185.
 39
se encaminha a criança posteriormente. Mesmo quando se realiza um diagnóstico
formalizado baseado em "instrumentos mais confiáveis de trabalho", ocorre um outro
diagnóstico que é "não formalizado, que atende às necessidades do psicoterapeuta de
conhecer seu paciente para poder tratá-l o adequadamente".
Isso significa que os dados obtidos num psicodiagnóstico tradicional não isentam o
terapeuta da necessidade de fazer uso da avaliação informal. Por mais completo e
exaustivo que seja o relatório de outro profissional, o terapeuta precisa "ver com os próprios
olhos" e "sentir" o paciente através de sua própria experiência. Nas palavras de Marques
para o atendimento infantil: "o terapeuta precisa sentir a mãe de seu paciente, utilizando
seus próprios recursos para identificar os pontos que considera importantes como apoio
para o trabalho psicoterápico4 (grifo nosso)."
Não se trata, porém, de substituir o diagnóstico formal pelo informal. Consideramos
que correspondem a dois níveis diferentes de compreensão do paciente, mas não estamos
tratando de processos exclusivos. Segundo EI-Id5, o psicodiagnóstico informal ocorre
"sempre que o psicólogo clínico observa, reúne dados e faz julgamentos a respeito do seu
paciente", o que "antecede necessariamente todo processo de tomada de decisão, seja no
início, seja no decorrer de qualquer modalidade de intervenção ou psicoterapia" . ;
Neste sentido, verificamos que a avaliação informal não é só complemento, mas parte 
integrante no estabelecimento de uma relação profissional-paciente. Na medida em que o 
impaciente não é considerado um mero "objeto" mas um "outro" mais participativo, com 
necessidades e recursos próprios, a ~ cada início de um novo processo com um novo 
profissional, exige-se que se leve em conta, que se avalie a possibilidade do trabalho 
psicológico conjunto, nesta relação específica.
 40
Ortigues e Ortigues6, criticam o uso que geralmente se faz das entrevistas
preliminares, concebidas em função do terapeuta, que "conduz o processo até um ponto
por ele definido e estipulado", fazendo propostas de psicoterapia, reeducação ou mesmo
internação quando se considera concluída a avaliação. Consideram essencial que se
verifique se a proposta corresponde também aos desejos do paciente e dizem: "o analista
não quer uma psicoterapia para esse consulente; averigua o que ele deseja" .
A contribuição de Hollender7, que data de mais de 20 anos, mantém-se muito atual
para estes nossos questionamentos. Hollender discrimina situações em que o
psicodiagnóstico pode ou não ser separado da psicoterapia, em função de o caso ser
agudo, emergencial, ou não. Seu estudo refere-se ao processo de seleção de pacientes, à
avaliação e ao começo da psicoterapia, que ele denomina "formas definitivas de
psicoterapia". Em síntese, trata-se de uma psicoterapia psicanaliticamente orientada, uma
relação a dois para a aquisição de autoconhecimento, que exclui técnicas grupais e outros
recursos que não as trocas verbais e não-verbais. Sua principal contribuição foi questionar
a avaliação inicial quando esta se resume na tomada da história para reconstrução genética
e formulação psicodinâmica, ou para a obtenção de informações específicas. Considera
que o mais importante é obter informações para determinar se duas pessoas podem
trabalhar juntas, de um modo particular, em direção a um objetivo particular. Neste sentido,
importa tentar esclarecer nas entrevistas iniciais: o que a pessoa pode e quer fazer a
respeito dos seus problemas; a quem incomoda os problemas e quem deseja ajuda: a
própria pessoa ou alguém da família; que tipo de relação a pessoa procura: a pessoa quer
aquilo que o terapeuta está preparado para oferecer?
 41
Essa postura está de acordo com a de Herrmann8, que considera que nas entrevistas
iniciais o analista "precisa decidir se a pessoa que o procura requer algum tipo de
atendimento, qual o tipo, e, caso seja análise, se ela possui condições mínimas de
analisabilidade, ou se ele próprio é o analista indicado". Herrmann prossegue enfatizando
que "mais importante é antecipar corretamente como funcionarão juntos no campo
transferencial, pelo menos o bastante para decidir que o processo tem alguma chance de
ser produtivo. Não basta um paciente apto, aliado a um analista capaz, é preciso uma dupla
minimamente ajustada".
Cordioli9 argumenta que a. seleção da intervenção mais
apropriada e efetiva depende da habilidade do terapeuta, considerada muito mais como
arte do que como uma ciência. Acrescenta que "nossos esforços serão mais úteis se nos
dedicarmos a ajustar a relação terapêutica e o método clínico ao paciente e suas
necessidades". Ou seja, a intervenção só é possível quando há consonância entre o que o
paciente procura e o que o profissional tem a oferecer.
As propostas de avaliar se "duas pessoas podem ou não trabalhar juntas", se "uma
dupla é minimamente ajustada" para iniciar um processo analítico, ou de falar na "arte" ou
"habilidade" do terapeuta em escolher a intervenção mais apropriada e efetiva, trazem
implícitas restrições pessoais utilizadas pelos profissionais para aceitar ou não o paciente,
sem deixar claro o processo interno que cada um utiliza para tal. O que faz
com que um terapeuta aceite um paciente e "acredite" no bom prognóstico? Ou, ao
contrário, o recuse preferindo encaminhá-lo para outro tipo de atendimento, "acreditando"
não poder ajudá-Io? Quais os pressupostos que o terapeuta tem para si, nem
 42
sempre claramente delineados para os outros, os recursos de que lança mão, baseado na
sua experiência, formação teórica etc., para avaliar o paciente possível?
Segundo Herrmannlo a resposta a esses questionamentos não é simples. Se nos
referimos a recursos pessoais, incorporados à experiência de cada um,não podemos
desmembrá-los e considerar cada parte isoladamente. Os recursos utilizados, para serem
efetivos, formam um corpo de conhecimento integrado, que não é passível de verificações
isoladas.
A experiência pessoal acumulada permite interpretar os dados obtidos formalmente e
integrá-los num todo significativo. Esse processo tende a ser cada vez mais automatizado e
rápido, quanto maior a experiência do profissional. A dificuldade de enumerar essas
operações e explicitá-las decorre em parte dessa automação, que torna menos explícito o
caminho percorrido.
Talvez possamos justificar melhor a dificuldade de ter acesso ao raciocínio clínico
desenvolvido, recorrendo às contribuições de Figueiredoll, que discute os conceitos de
conhecimento tácito (pessoal) e conhecimento explícito (representacional) a partir dos
trabalhos de Polanyi. Para esse autor, a conhecimento tácito é aquele incorporado aos
hábitos afetivos, cognitivos, motores e verbais de uma pessoa num nível de experiência em
que sujeito e objeto ainda não estão totalmente separados. Isso torna difícil, senão
impossível, transformá-lo em regras e instruções. Por outro lado, o conhecimento explícito,
que pretende ser objetivo e reflexivo, poderia tornar-se disponível para o conhecimento
(críticas, avaliações e correções).
Se entendemos o processo psicodiagnóstico a partir desta ótica, podemos considerar
que a dificuldade de tornar explícitas as "crenças" que o psicólogo utiliza na aceitação ou
não de um paciente e na indicação de uma intervenção mais apropriada
 43
advém do fato de tratar-se de um conhecimento tácito, pessoal, acumulado ao longo da
experiência.
Figueiredol2 enfatiza que é ilusório pensar na possibilidade de elaborar um
conhecimento explícito, objetivo e reflexivo que seja uma reprodução fiel do conhecimento
tácito do psicólogo. Refere-se à idéia de que "a experiência incorporada, o conhecimento
entranhado no corpo e nos seus órgãos não é totalmente transparente e convertível em
teoria". E prossegue: "Na direção inversa, também, os sistemas de representação nunca
serão totalmente incorporados às práticas, serão sempre compreendidos de acordo com as
possibilidades abertas pelo conhecimento tácito e pessoal".
Neste sentido, ao entendermos o psicodiagnóstico formal e informal como processos
configurados a partir do chamado conhecimento representacional e pessoal, constatamos
que não há como prescindir de um ou de outro. Permanecem como dois processos
distintos, mas complementares.
Há possibilidade de buscar referenciais comuns, estabelecer regras para os fatores
levados em conta na avaliação informal de um caso? Ou seja, é possível passar a própria
experiência, senão integralmente, pelo menos parcialmente, delineando algumas regras
que possam nortear os passos de outra pessoa?
Devemos supor esta possibilidade na medida em que se mantêm os atendimentos
supervisionados na formação do terapeuta em uma determinada técnica e linha teórica.
Não hácomo substituir a vivência e a experiência pessoal do profissional em formação,
mesmo quando alguém mais experiente orienta seus primeiros passos. Segundo
Herrmann13, o único modo de transmitir essa experiência a outra pessoa, é empreender
com ela uma reflexão sobre "como se faz". Cada um deve viver sua própria experiência.
 44
Entretanto, como em qualquer outra área clínica, no caso do psicodiagnóstico os
aspectos formais permitem que se ouse iniciar a experiência clínica. O psicólogo deve
receber do supervisor a orientação mínima acerca das diretrizes que nortearão seu
trabalho.
No psicodiagnóstico formal, é necessário que o psicólogo saiba qual o seu objetivo, de
que instrumentos dispõe e como utilizá-l os para avaliar o paciente: se numa entrevista livre
ou observação lúdica, se numa situação de aplicação de testes. Pode ser orientado quanto
aos aspectos a atentar e investigar, quanto à seqüência e ao manejo adequado do material
utilizado.
Na avaliação informal, o supervisor pode auxiliar o psicólogo na busca de suas
posições primeiras, dos conhecimentos
e experiências em que se apóia no atendimento de seu caso.
,
Contudo, o próprio psicólogo deverá aprimorar sua capacidade de avaliar. Trabalhos nessa
direção, que analisam a avaliação informal, chegam a contribuir para o conhecimento
formalizado, quando conseguem explicitar alguns de seus pressupostos.
No caso das psicoterapias breves, a especificidade da técnica de intervenção e a
preocupação com os resultados determinaram a definição de critérios psicodiagnósticos a
considerar no início do processo. Para tanto, a tarefa de investigar sobre o paciente através
de testes, foi ampliada e passou a considerar também aspectos motivacionais tanto do
paciente como do profissional e as condições mínimas requeridas de um e de outro. Como
conhecimento mais objetivo, pode ser definido através de regras que, embora não excluam
o uso de critérios mais subjetivos, podem ser enumeradas e explicitadas.
O profissional necessita das seguintes condições mínimas: formação teórica,
disponibilidade física, temporal e pessoal para atender, postura ética etc. O paciente, por
sua vez, deve poder comparecer e manter a freqüência mínima necessária para poder
receber ajuda e, principalmente, ter motivação, de acordo com a concepção de Sifneos.
Não basta que o profissional avalie o grau de comprometimento e a necessidade de psico
 45
terapia, Se o paciente não pode estar ali para isso, se não é capaz de fazer sacrifícios para
mudar.
Neste sentido, vários estudos se preocuparam com a sistematização desses critérios
para psicoterapia breve de adultos (MalanI4; SifneosI5), como tentativas de evitar
indicações inadequadas, pouco frutíferas. Y oshida 16 faz uma extensa revisão das
psicoterapias breves e sintetiza a idéia dos principais expoentes com relação aos critérios
psicodiagnósticos. Destaca que a efetividade da intervenção decorre da dinâmica resultante
da interação entre terapeuta e paciente, em que se levam em conta as condições tanto de
um como de outro.
Embora não suficientes, essas diretrizes gerais permitem iniciar uma experiência que
deverá ser completada com o desenvolvimento da habilidade pessoal para que o
diagnóstico seja um processo proveitoso também para o paciente.
A habilidade pessoal que não pode ser transmitida pelo profissional mais experiente,
não pode ser criada, mas deve ser desenvolvida pelo próprio indivíduo, integrará os
recursos a serem utilizados na avaliação informal.
O que seria possível sistematizar para o diagnóstico informal? Um dos aspectos
importantes a considerar, a partir das contribuições da psicanálise e da psiquiatria
psicodinâmica, refere-se à contratransferência, aos sentimentos que o paciente desperta n
o profissional. Gabbardl7 assinala que a experiência de um tratamento pessoal permite que
o profissional distinga os sentimentos originados de conflitos inconscientes não- resolvidos
dos sentimentos provocados pelo paciente, em qualquer pessoa com a qual tenha contato.
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Em que medida essas reflexões poderiam beneficiar nossa prática clínica? Como
vimos anteriormente, o exercício do psicodiagnóstico nas instituições vem demonstrando
que é necessário repensá-I o para que não sejam perdidos grandes investimentos. As filas
de espera, os abandonos, são entendidos, na maioria das vezes, como resultado da
inadequação do modelo utilizado para uma clientela que tem necessidades específicas que
não podem ser supridas pela simples transposição do modelo de atendimento particular, a
longo prazo, para as instituições.
Mas este quadro não parece ser simplesmente fruto desta inadequação, mas também
de uma postura com relação ao que se considera prioritário para o paciente. submetê-lo a
um longo processo que inclui triagem, psicodiagnóstico e encaminhamentopode parecer
adequado do ponto de vista teórico, útil para o processo de formação do terapeuta, mas
não se pode dizer que o seja também para o paciente.
Esta preocupação não se restringe ao trabalho institucional, mas atinge também o
atendimento nos consultórios particulares, onde se adota o modelo tradicional de avaliação
e encaminhamento.
Se, o terapeuta pudesse utilizar melhor seus próprios recursos na avaliação informal
de um caso, para aproveitar a motivação inicial do paciente, talvez tivéssemos uma fila de
espera menor e menor número de desistências.
Há necessidade de viabilizar uma intervenção mais direta, se não eliminando, pelo
menos minimizando a lacuna entre psicodiagnóstico e psicoterapial8. O modelo tradicional
de avaliação sugere que o paciente deve aguardar o término do processo para poder
receber de volta a indicação e os efeitos benéficos de uma psicoterapia. Entretanto,
podemos entender a distinção entre psicodiagnóstico e psicoterapia apenas como
 47
processos em que predominam um ou outro objetivo: investigar ou tratar. O que as
reflexões sobre o tema têm mostrado é que estes objetivos se interpõem e que já a partir
das entrevistas iniciais, o paciente se beneficia das intervenções do profissional, mesmo
dentro de um processo psicodiagnóstico. A experiência do terapeuta pode permitir que se
devolvam informações ao paciente à medida que se compreenda a sua dificuldade, desde
que este possa recebê-IasI9. Isso poderá ser feito se a avaliação informal indicar que tal
relação poderá trazer benefícios ao paciente.
Ao estabelecer diferenças entre as entrevistas psicodinâmica e médica, Gabbard20
cita Menninger e colaboradores, para afirmar que não só não há distinção entre diagnóstico
e tratamento, mas que o tratamento precede o diagnóstico se entendermos que "o paciente
vem para ser tratado, e tudo o que for feito, na medida em que lhe diz respeito, é
tratamento, independentemente de como o médico o chame". Constatamos que a
separação entre psicodiagnóstico e tratamento se faz mais como necessidade do
profissional; o paciente nem sempre compartilha deste modo de entender o trabalho. Muitos
deles, referindo-se ao psicodiagnóstico feito na instituição responsável pelo
encaminhamento, falam de uma melhora decorrente do "tratamento" anterior. Neste
sentido, a pessoa que busca ajuda pode sentir-se beneficiada já a partir do primeiro
contato.
Como representante da psicanálise, Herrmann21 diz arespeito:
"O diagnóstico não é uma operação isolada que antecede a análise. É, ao contrário, uma 
das dimensões do trabalho analítico, cujo exercício vem a ser especialmente exigido nos 
primeiros contatos. (...) as entrevistas prévias já são análise,
 48
na medida em que nelas o método psicanalítico encontra-se em ação".
Na psicoterapia breve, Fiorini22 a primeira entrevista "está destinada a cumprir não
apenas funções diagnósticas e de fixação de contrato; mais que isso (u.) ela desempenhará
um papel terapêutico". As propostas de fazer interpretações de ensaio logo nas primeiras
entrevistas (Malan23; Sifneos24) têm o objetivo de avaliar se o paciente tem recursos
egóicos adequados para se beneficiar da técnica, ao mesmo tempo que já proporcionam
elementos para levá-lo a uma compreensão das suas dificuldades, revertendo em efeito
terapêutico. A possibilidade de "estar junto com" o paciente implica já um efeito terapêutico
dado pela sua aceitação pelo terapeuta.
Dentro dessa perspectiva, encontramos também as psicoterapias breves infantis, em
que a distinção entre psicodiagnóstico e psicoterapia é menos definida, e o psicólogo,
desde os primeiros encontros, pode fazer devoluções ao paciente. Essas intervenções
breves têm maior chance de sucesso quando a consulta é carregada de potenciais
transferenciais que favorecem uma forte aliança terapêutica e motivação para a obtenção
de ajuda25.
A partir destas reflexões, podemos concluir que: no processo de avaliação, o
profissional faz uso tanto do diagnóstico formal quanto do informal, como processos
complementares de um mesmo trabalho. A avaliação informal, no início de qualquer
processo, diagnóstico ou terapêutico, permite ao profissional uma integração dos dados
obtidos formalmente e uma apreensão mais global do paciente, para decidir sobre a via-
bilidade de uma relação específica de ajuda. Esta possibilidade
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depende da experiência, do conhecimento pessoal acumulado pelo psicólogo na percepção
do outro, na leitura de suas necessidades, e dos recursos disponíveis ao paciente. Esta
habilidade ou bagagem do psicólogo permite que o paciente se beneficie já a partir dos
primeiros encontros, sejam quais forem os objetivos do atendimento: consulta,
psicodiagnóstico ou psicoterapia. Pelo fato de ser pessoal, tal habilidade não pode ser
pensada em termos de regras claramente delineadas, passíveis de ser transmitidas na
íntegra de um para outro, embora um trabalho de análise desconstrutiva permita estabe-
lecer alguns indicadores utilizados por grupos de profissionais ou para atendimentos
específicos. Mas haverá sempre variações individuais no ajuste dos recursos próprios à
regra básica, que justificam o termo "informal". O diagnóstico deixaria de ser informal no
momento em que fosse objetivado, enumerado e
explicitado para o conhecimento.
Tal objetivação não é possível nem desejável. Pensar em objetivar seria pensar em
anular as diferenças individuais na forma de perceber, compreender e sentir o outro, o que
não é viável. Também não se deseja essa objetivação, na medida em que essas diferenças
permitem maior riqueza e diversidade na compreensão de algo tão complexo como o ser
humano.
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COMPREENDER OU ESTRANHAR: INCIDÊNCIAS NO PSICODIAGNÓSTICO'
Angela Maria Resende Vorcaro*
Nada criado que não apareça na urgência, nada na urgência que não engendre seu
ultrapassamento na fala.
Jacques Lacan
Do psicodiagnóstico
A dispersividade das diferentes teorias psicológicas produziu, na prática
psicodiagnóstica, efeitos de coesão que lhe permitiram uma institucionalização crescente.
O estatuto desta
prática não foi sustentado por uma teoria específica do sujeito. Por se ancorar na promessa
de uma "descrição e compreensão o mais profunda e completa possível da personalidade
total do sujeito ou do grupo familiar"2, o modelo que configura tal prática apoiou-se numa
multiplicidade de pressupostos.
 51
No seu ensaio de "globalização compreensiva", a prática psicodiagnóstica combina
atividades e instrumentos desenvolvidos nas mais diferentes perspectivas conceituais.
Sustenta na mesma construção diagnóstica fragmentos das visões inatista, cognitivista,
comportamentalista, genética e psicanalítica, que resvalam na diversidade das estratégias
que a aparelham. Privilegiando as incidências técnicas de alguns conceitos, serve-se delas,
ao preço de apartá-Ias do campo conceitual a que remetem e do objeto que visam. Tal
"aplicação" fragmentária de teorias num mesmo processo (o psicodiagnóstico) cria uma
ilusória homogeneidade conceitual, aplainada na suposta síntese do sujeito.
Nos seus movimentos de constituição, as práticas psicodiagnósticas eram
basicamente tributárias da herança médica classificatória e diferencial assegurada pelo uso
de mediadores psicométricos generalizáveis, que exigiam, como garantia de cientificidade,
uma coleta de "dados empiricamente observáveis", obtidos, seja na anamnese, seja nos
"estímulos" oferecidos ao paciente.
Posteriormente, com a adesão e incorporação de alguns conceitos oriundos da
psicanálise (os que permitiam uma leitura desenvolvimentista e, também, a técnica do jogo,
a transferência e a contratransferência), a neutralidade observadora mostrou-se
insustentável e assumiu-se a pregnância de um campo transferencial que denunciava e
obrigava

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