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VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT --------HANSENÍASE------ 1) Hanseníase: • É conhecida desde as antigas civilizações, China, Egito e Índia, tendo referências do acometimento dos nervos periféricos desde 1847 (Browne, 1985), sendo seu agente etiológico o primeiro patógeno associado a uma doença no ser humano. • História e estigma social: Também conhecida como lepra ou mal de Lázaro, antigamente a enfermidade era associada ao pecado, à impureza, à desonra. Por falta de um conhecimento específico, a hanseníase era muitas vezes confundida com outras doenças, principalmente as de pele e venéreas. Daí o preconceito em relação ao seu portador: a trasmissão da doença pressupunha um contato corporal, muitas vezes de natureza sexual e, portanto, pecaminoso. Quando não eram enviados para leprosários e excluídos da sociedade, os doentes não podiam entrar em igrejas, tinham que usar luvas e roupas especiais, carregar sinetas ou matracas que anunciassem sua presença. O avanço das pesquisas comprovou que a hanseníase nem é uma doença tão contagiosa assim; era muito dissemina na Idade Média e em locais onde as condições sanitárias e de habitação não eram adequadas. • Doença sistêmica infectocontagiosa crônica, causada pelo Mycobacterium leprae (Bacilo de Hans), parasita intracelular obrigatório, com tropismo pelos filetes nervosos periféricos e que gera muitos desafios médicos por não ser cultivado em meio de cultura. O período de incubação (intervalo entre exposição/infecção até a manifestação dos sintomas) é longo, em média de 3 a 10 anos, e a transmissão ocorre somente entre os seres humanos. Admite-se que o contágio se realize pelo aparelho respiratório. Afeta a pele, os nervos periféricos, as mucosas das vias respiratórias superiores, os olhos, as vísceras abdominais, linfonodos, medula óssea, testículos e ovários. • O M. leprae foi identificado em 1873, na Noruega, como agente etiológico causador da hanseníase. Foi o primeiro patógeno bacteriano identificado como agente etiológico de uma doença infecciosa humana. É um patógeno intracelular obrigatório que infecta principalmente o endotélio vascular, fagócitos mononucleares e apresenta especial afinidade por células de Schwann. A habilidade de invadir e sobreviver nestas células constitui a característica notória deste organismo, dando-lhe o status de ser o único patógeno bacteriano capaz deste feito. Possui um tempo de geração (é=tempo de incubação?) que varia entre 11e13 dias, multiplicando-se por divisão binária. Os mecanismos que permitem ao M. Leprae infectar o homem e causar doença ainda são pouco conhecidos. • Graças a recentes técnicas de sequenciamento do genoma humano foi possível estudar melhor o genoma do M. leprae, que possui como característica a perda maciça de genes, o que poderia explicar a taxa de crescimento lenta do bacilo, assim como sua incapacidade de crescimento in vitro. Somente 49,5% do genoma do M. leprae contêm genes que codificam para proteínas, característica não observada em qualquer outro genoma bacteriano até hoje sequenciado; há também 1.116 pseudogenes ou genes degenerados, assim denominados devido à perda de regiões necessárias para sua transcrição e/ou tradução, ou mudança da fase de leitura aberta do gene por deleções ou inserções de bases. Acredita-se que o genoma degenerado do M. leprae seja resultado de erros na replicação combinados a uma redução na capacidade de reparo do DNA, o que provocaria um acúmulo de mutações em genes não mais essenciais para sobrevivência no ambiente intracelular e perda de função do genoma bacteriano ("evolução redutiva”), alterando permanentemente o genótipo e resultando na adaptação ao ambiente em que a bactéria vive. Já o conjunto de genes realmente expressos (gene funcional) do M. leprae está associado com +- 400 proteínas. • O diagnóstico é essencialmente clínico e inclui os procedimentos diagnósticos de Exame Dermatológico + Exame Neurológico + Diagnóstico Laboratorial, que inclui baciloscopia de linfa cutânea e histopatologia de biopsia cutânea ou de nervo sensorial. Excepcionalmente exames laboratoriais complementares mais sofisticados como a reação de polimerase em cadeia (PCR), ELISA e biopsia de nervo são necessários. Os sinais cardinais da hanseníase são lesões cutâneas com alteração da sensibilidade e nervos espessados, podendo haver: ✓ Máculas, placas, tubérculos, pápulas, infiltrações que podem ser únicas ou múltiplas, hipopigmentadas ou eritematosas; ✓ Alterações neurológicas como hiperestesias/hipoestesias/anestesias, redução da força muscular em extremidades com ou sem atrofia, espessamento doloroso de troncos nervosos periféricos (principalmente nos Nn. ulnar, radial, mediano, fibular, tibial posterior, auricular e supraorbitário); ✓ Alterações sistêmicas como artralgias, adenomegalias, rinite, edema de extremidades... OBS: A PCR é uma técnica de amplificação in vitro de DNA com alta sensibilidade e especificidade que possibilitam a identificação inequívoca de quantidades minutas de ácidos nucleicos de microrganismos em fragmentos de tecido, linfa ou sangue periférico devido à utilização de oligonucleotídios específicos aos alvos de interesse em um sistema enzimático regido por uma DNA polimerase isolada de Thermus aq_uaticus. Já em testes sorológicos como os do tipo ELISA ou imunocromatografia para a detecção de anticorpos anti-PGL-1, anticorpos que reagem ao glicolipídio fenólico-1, que é um componente específico da parede celular do patógeno, podem ser usados na definição da forma clínica (MB ou PB) dos doentes; os anticorpos IgM podem ser detectados em soro ou sangue total, de modo que os níveis detectados por estes ensaios sorológicos podem definir precocemente indivíduos com as formas clínicas mais graves, antes mesmo que estes exibam os sintomas clínicos da doença. VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT • As formas clínicas podem ser classificadas de acordo com diferentes critérios: ✓ A aprovada no VI Congresso Internacional realizado em Madri em 1953, baseada nos critérios de polaridade, proposta por Rabello Jr., classificando a doença em formas polares tuberculoide e virchoviana e formas interpolares indeterminada e dimorfa; ✓ A que utiliza o critério laboratorial do resultado do exame baciloscópico nos esfregaços de linfa cutânea dos pacientes; são classificados como PB os casos com baciloscopia negativa e MB os com baciloscopia positiva; ✓ A que se baseia em critérios clínicos, histopatológicos e imunológicos proposta por Ridley e Jopling (1966). • A OMS (1998) sugere que, para os locais endêmicos onde não estão disponíveis métodos diagnósticos laboratoriais, sejam utilizadas classificações essencialmente clínicas com base no número de lesões cutâneas. Por este método são classificados como PB (paubacilar) os casos com até 5 lesões cutâneas e como MB (multibacilar) os com mais de 5 lesões cutâneas. A legislação sobre o controle da hanseníase no Brasil normaliza a utilização, para alocação nos esquemas poliquimioterápicos, da classificação operacional recomendada pela OMS baseada no número de lesões cutâneas; a baciloscopia de pele, quando disponível, deve ser utilizada como exame complementar (Ministério da Saúde 2000). • Formas PB (Paucibacilar)- caracterizadas por: ✓ Classificação de Madri: formas indeterminadas (I) e tuberculoide (T); ✓ Classificação de Ridley e Jopling: formas indeterminada (I), tuberculoide-tuberculoide (TT), borderline- tuberculoide (BT); ✓ Classificação operacional: casos com até 5 lesões cutâneas. ✓ Se for utilizado o critério baciloscópico, são os casos que apresentam baciloscopias negativas nos esfregaços cutâneos. ✓ As manifestações clínicas mais frequentes são áreas com distúrbio de sensibilidade térmica, dolorosa e tátil, manchas hipoacrômicas anestésicas ouhipoestésicas, placas eritematoinfiltradas, acometimento de troncos nervosos, mono ou polineuroapatia, em geral unilateralsimétrica. • Formas MB (Multibacilar)- caracterizada por: ✓ Classificação de Madri: dimorfa (D) e virchoviana (V); ✓ Classificação de Ridely e Jopling: borderline-borderline (BB), borderline-lepromatosa (BL), lepromatosa- lepromatosa (LL); ✓ Utilizando o critério baciloscópico são todos os casos que apresentem bacilos ácido-álcool-resistentes (BAAR) nos esfregaços de linfas cutâneas; ✓ Classificação operacional: casos com mais de 5 lesões cutâneas. ✓ As manifestações clínicas mais usuais são manchas, placas, tubérculos, nódulos com ou sem alteração da sensibilidade, infiltração eritematosa difusa, acometimento de troncos nervosos: mono ou polineuropatia, em geral assimétrica. • Histopatologia das lesões: a lesão histopatológica básica da hanseníase é um infiltrado inflamatório que pode variar na sua constituição conforme a posição do paciente no espectro de Ridley-Jopling. ✓ O infiltrado inflamatório nos pacientes tuberculoides (TT e BT) se apresenta como um infiltrado granulomatoso com células epitelioides circundadas por um halo linfocitário. A presença de células gigantes é mais frequente e abundante na forma TT. O infiltrado nessa forma atinge e erode a epiderme e os pequenos ramos nervosos são destruídos pelo infiltrado granulomatoso. Esse tipo de infiltrado é mais destrutivo para os filetes nervosos e por isso eles são menos frequentemente vistos na derme nas formas T (BT e TT). A presença de BAAR é muito escassa e o infiltrado pode atingir positividade de 1+. VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT ✓ A forma BB apresenta um granuloma de células epitelioides com aspecto frouxo sem células gigantes e menos linfócitos. A quantidade de BAAR é maior do que nas formas TT e BT. Essa forma é mais instável e frequentemente desenvolve episódio reacional do tipo 1 (reação reversa). ✓ As formas L (BL e LL) se apresentam com um infiltrado constituído predominantemente por macrófagos repletos de BAAR, exibindo ainda degeneração espumosa (macrófagos virchovianos) em face da degeneração bacilar que ocorre dentro dos macrófagos. Nas formas L (BL e LL), os macrófagos em vez de eliminar as micobactérias infectadas, funcionam como meio de cultura para o M. leprae, permitindo o crescimento bacteriano em seu citoplasma onde são encontradas as aglomerações bacilares conhecidas como globias. Nas formas BB e BL encontramos frequentemente os ramos nervosos na derme circundados e invadidos por infiltrado inflamatório próprio da forma. Pelo fato de essas formas afetarem o sistema nervoso periférico de uma maneira mais lenta e mais tardia, é possível visualizar maior número de ramos nervosos dérmicos em meio ao infiltrado inflamatório. A forma BL pode se apresentar com quantidade razoável de linfócitos. • A interação do M. leprae com o ser humano pode variar, considerando que apenas uma pequena porcentagem (1 a 3%) dos indivíduos expostos desenvolvem a doença, gêmeos monozigóticos têm mais frequentemente concordância na doença e nas formas da doença do que gêmeos dizigotos, as formas não estão distribuídas aleatoriamente em irmãos doentes e a frequência de doentes em famílias com casamentos consanguíneos é maior. Isso porque a vulnerabilidade à hanseníase pode ser herdada. Além disso, trata-se de uma doença de natureza poligênica que é influenciada por fatores ambientais. Podem ser citados os promotores dos genes de IL-10 e TNF que poderiam estar associados à capacidade individual de produzir níveis aumentados ou diminuídos das citocinas, levantando a hipótese de que, na hanseníase, o polimorfismo nos promotores nestes genes TNF estaria controlando a suscetibilidade ou a gravidade (inclusive de formas reacionais) dos doentes, pois são genes que influenciam o padrão e a intensidade da resposta imune. Há também influências de background genético com descrição de genes candidatos envolvidos na regulação da interação neuroimunoendócrina entre patógeno e hospedeiro; a região 10p13 está ligada à forma clínica; Um agrupamento no cromossomo 17qll, contendo genes como NOS2A e STATSB, foi associado à suscetibilidade tanto para a hanseníase como para a tuberculose; os cromossomos 2q33-35, 4q32, 6q22-23, 6p21, 20pl2 estão associados tanto com a hanseníase quanto com a forma clínica; a região 6q25, mais especificamente os genes PARKIN e PARCG, também está envolvida fortemente na suscetibilidade à hanseníase. A caracterização funcional destes genes nas diversas fases da doença poderia ser utilizada como ferramenta para definir marcadores genéticos para diagnóstico precoce na população de alto risco, especialmente os contatos domiciliares dos pacientes. • O curso da infecção e as formas clínicas são determinadas pela resposta imune específica e, embora as imunidades celular e humoral estejam simultaneamente ativadas na hanseníase, o componente celular assume maior importância na eliminação bacilar, pois o M. leprae é um patógeno intracelular. Porém, o desenvolvimento dos níveis de resposta imune e o aparecimento das formas clínicas da hanseníase parecem depender de fatores ainda não completamente estabelecidos, mas sabe-se que a carga bacilar (que se expressa em função do tempo de estabelecimento da resposta imune após a exposição), ou seja, a concentração local de M. leprae, assim como a resposta imune do hospedeiro podem ser críticas. • A forma de infecção subclínica é definida como um estágio no qual nenhum sinal da doença está presente ou a imunidade definitiva não se desenvolveu. Já os pacientes lepromatosos apresentam um quadro de anergia específica ao M. leprae; as lesões se apresentam principalmente com uma relação CD4/CDS invertida na lesão, ausência de organização e diferenciação dos macrófagos para formar granuloma e atrofia da epiderme. Há total afastamento da epiderme do infiltrado inflamatório na derme por uma faixa de tecido conjuntivo denso, a faixa de Unna, característica desta forma clínica. O aspecto quiescente das lesões lepromatosas sugere que o microambiente tissular impede a migração e o acúmulo de linfócitos, especialmente células T CD4+, já que os linfócitos do sangue periférico nestes pacientes mantêm uma proporção de células CD4: CDS normal (2:1). Já pacientes tuberculoides desenvolvem resposta imune celular que leva à morte e à eliminação da maioria dos bacilos, mas que frequentemente provoca danos aos nervos. As lesões tuberculoides apresentam um predomínio de células T CD4+, embora células com fenótipo CDS+ também estejam presentes, mantendo uma relação CD4/CDS positiva. Há expressão de antígenos HLA-DR em queratinócitos hiperplasiados e presença de linfócitos intraepiteliais. • Na hanseníase, a resposta imune depende do padrão de resposta dos linfócitos Th1 e Th2. Os pacientes LL apresentaram um perfil predominante de citocinas do tipo Th2 (IL-4, IL-5 e IL-1O), sugerindo suscetibilidade à doença; os pacientes tuberculoides apresentaram perfil do tipo Thl (IFN , IL-2). Vários autores descreveram que lesões de pacientes tuberculoides apresentam mRNA de IL-12, IL-lS, IFN e TNF aumentado em comparação a pacientes lepromatosos. A citocina IL-10 tem sido detectada em altos níveis em pacientes lepromatosos com correlações positivas com o IB. A presença de resposta Thl confirmada não só por testes in vitro como pela expressão de mRNA de citocinas (IFN, IL-12, TNF) nas lesões tuberculoides opõe-se ao predomínio Th2 (IL-4, IL- 10) nas formas virchovianas. Nas formas borderline se detectam padrões mistos, Thl e Th2; estas formas são as mais suscetíveis a apresentarem reações hansênicas. • Eventos precoces na infecção podem ser cruciais em determinar qual destas duas vias predominará, marcando o padrão da resposta imune. As células apresentadoras de antígeno poderiam desempenhar um papel importante na VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT regulação da resposta imune. Entretanto, o mecanismo pelo qual o modo de apresentação favoreceria a ativação de um tipo ou outro delinfócitos Th ainda não está definido. Recentemente demonstrou-se que a imunidade inata, por meio da ativação de receptores toll-like (TRL), exerce crucial influência na determinação da resposta imune adquirida e, consequentemente, das diversas formas clínicas. Recentes evidências suportam a hipótese de que o perfil de citocinas gerado pela resposta imune inata possa regular a subsequente capacidade de resposta imune antígeno- específica. • A partir do momento da infecção, fagócitos mononucleares desempenham um papel importante, tanto na resposta imune específica quanto na resposta imune inata. Além de suas funções como célula apresentadora de antígeno e de sua capacidade microbicida (morte e destruição do patógeno), estas células secretam um grande número de fatores solúveis que interagem não só com células do sistema imune, como também com células dos tecidos. As células apresentadoras de antígenos, como macrófagos e células dentríticas, são cruciais para direcionar a diferenciação dos linfócitos Th0 para um perfil Thl ou Th2. Dentre os fatores críticos para a diferenciação durante a infecção estão também as citocinas presentes no sítio da infecção, o tipo e a concentração, a rota de infecção e os fatores genéticos. Já está bem estabelecido que a presença de IL-4 direciona a resposta imune preferencialmente para um perfil Th2, caracterizado pela secreção de IL-4, IL-5 e IL-13, importante para a resposta a patógenos extracelulares. Por outro lado, a indução do perfil Thl parece essencial para a ação efetiva contra patógenos intracelulares. Esta atividade requer ótima produção de IFN pelas células Thl. O IL-12 parece ser um fator importante para o desenvolvimento deste fenótipo. Esta citocina é produzida pelas células fagocíticas em resposta a patógenos como micobactérias e estimula a produção de IFN que, por sua vez, favorece a erradicação de microrganismos intracelulares. No entanto, outros fatores são essenciais para o direcionamento da resposta Thl. Já foi demonstrado que a IL-18, embora não induza o fenótipo Thl, tem atividade sinergística com a IL-12 para induzir a produção de IFN. • Por outro lado, componentes das micobactérias têm a habilidade de modular atividade microbicida dos macrófagos LAM, um lipopolissacarídio componente da parede celular de micobactérias e um potente inibidor da ativação mediada pelo IFN. Foi também evidenciado que a resistência à ativação com IFN pode ser mediada pela prostaglandina E2 e/ou a IL-10. Alguns antígenos exclusivos do M. hanseníase, como PGL-1 (glicolipídio fenólico 1), presente na membrana da bactéria e encontrado nos tecidos infectados, também podem estar associados à não resposta dos pacientes lepromatosos. O PGL-1 regula negativamente a liberação de citocinas como o TNF por monócitos, podendo esta substância contribuir para a ativação defeituosa dos macrófagos e para a indução de um perfil supressor via células T. Desta forma, M. leprae parece modular a resposta imune desenvolvida nas lesões por meio de componentes de sua parede celular e também via secreção de substâncias com atividade supressora sobre os macrófagos. Monócitos infectados podem contribuir para a fraca ativação dos linfócitos T nos indivíduos lepromatosos, devido à liberação de fatores que possam suprimir a ativação destas células. • Estados reacionais hansênicos: são complicações emergenciais com episódios agudos ou subagudos com comprometimento neurológico, cutâneo e sistêmico, isolados ou simultâneos, variando de acordo com cada caso e com o tipo de reação; ocorrem por alterações no sistema imunológico com fisiopatologia e fatores desencadeantes ainda não completamente elucidados. Podem deixar sequelas, por isso devem ser diagnosticados e tratados rapidamente. As reações podem ocorrer antes da introdução da poliquimioterapia, na vigência desta e após a alta terapêutica. • As reações hansênicas são classificadas em: ✓ Reação tipo 1 ou reação reversa (RR); decorre do aumento da imunidade celular e se exterioriza clinicamente por inflamação das lesões cutâneas e dos troncos nervosos periféricos. Mais frequentes em pacientes classificados como PB, nos quais as reações não são tão comuns, com formas BB/BL. ✓ Reação tipo 2 ou eritema nodoso hansênico (ENH); ocorre devido à ativação de citocinas como TNF, IL-2, IL-6 e IL-8. A resposta imune celular parece também contribuir para a gênese deste tipo de reação que, além dos comprometimentos neurológico e cutâneo, cursa com sintomas sistêmicos. Mais frequente em paciente classificados como MB, quando as complicações são frequentes e podem ser observadas até 5 anos após a alta terapêutica, e nas formas lepromatosas BL/IL. ✓ Neurite isolada; nos casos em que a agudização se exterioriza unicamente com comprometimento dos troncos nervosos periféricos. Mais frequentes em pacientes classificados como PB. • Quanto aos aspetos imunológicos das reações, é bom lembrar que no polo tuberculoide as lesões são poucas e localizadas com baciloscopia negativa enquanto no polo lepromatoso as lesões são numerosas e disseminadas com baciloscopia positiva. Compondo o espectro, as formas BT, BB e BL mostram gradações progressivas do número e da distribuição das lesões e da carga bacilar. Porém, a ocorrência de reações fornece um novo entendimento dos mecanismos de regulação imunológica durante a interação hospedeiro-patógeno. As reações parecem representar um rompimento de um estado estável alcançado em um curso crônico da doença em pacientes MB anteriormente não responsivos que são capazes de reverter para o perfil imunológico altamente responsivo, ocasião na qual os quadros clínico e histopatológico se aproximam do polo turberculoide do espectro. A possibilidade de os pacientes desenvolverem qualquer tipo de reação depende de variáveis multifatoriais, que necessariamente incluiriam características genéticas, haplótipos de HLA, variantes imunológicas e carga bacilar, entre outros. VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT • Durante a RR há reemergência ou aumento da resposta imune celular que depende da expansão de células T M. leprae-específicas. A RR está consequentemente associada ao aumento da produção de IFN, levando à formação de granulomas e ao aumento da atividade microbicida do macrófago. Também há evidências de resposta imune celular no ENH que incluem: resposta linfoproliferativa positiva junto à produção aumentada de IFN; detecção da expressão de IFN e IL-12 mRNA nas lesões e no sangue de pacientes; envolvimento de células T ativadas na produção intensificada de TNF por monócitos estimulados por M. leprae através do contato direto célula-célula. • A ocorrência sequencial de ENH e RR no mesmo paciente pode, ainda, indicar um fundo imunológico semelhante, compartilhado por ambas as reações. Um perfil de citocina mRNA idêntico foi observado nas lesões do mesmo paciente no curso das reações, no entanto as células T somente estavam presentes na RR, quando as lesões exibem infiltrado maciço de macrófagos, constituindo granulomas. Já no ENH predomina o infiltrado linfoplasmocitário com neutrófilos e vasculites. Neste contexto, IFN somente foi detectado em cultura de PBNC em aproximadamente 30% de todos pacientes ENH estudados ao passo que ambos os tipos de pacientes, RR e ENH, expressaram IFN e IL-12 mRNA na pele durante a reação. Supõe-se que seja possível que uma produção transitória de IFN por células Th2 esteja operante nas lesões de pacientes ENH, enquanto em pacientes RR parece ser uma produção mais prolongada e estabelecida de IFN (e TNF) por clones de Thl. • Os estados reacionais têm sido relacionados com a produção exagerada de TNF in vivo e in vitro, apontando o TNF como mediador-chave na imunopatologia da lesão tecidual, tanto na RR quanto no ENH. Especulou-se que a emergência da resposta imune inata ou adquirida em ENH seguida pela produção de IFN, IL-6 e IL-12 in situ poderia estar envolvida de forma sinérgicana amplificação da resposta inflamatória e na produção aumentada de TNF tanto local como sistêmica. O papel da resposta imune inata na hanseníase foi recentemente confirmado pela demonstração de intensa expressão de TLR2 e TLRl em lesões tuberculoides em contraste com lesões lepromatosas. Além disso, a estimulação de TLR com a lipoproteína 19 kDa de M. leprae na presença de citocinas Thl aumentou a capacidade de matar o M. leprae como também aumentou a secreção de TNF. Ao contrário, citocinas Th2 inibiram a produção de TNF pelos monócitos. Estudos recentes demonstraram que M. leprae, a exemplo de M. tuberculosis, induz à apoptose em monócitos e ativa o fator de transcrição NFkB. • Supõe-se também que a cinética da liberação de TNF e IL-10 em resposta ao M. leprae poderia estar alterada em pacientes reacionais. O remodelamento de componentes da matriz extracelular requer a ação de proteases, entre elas MMP (metaloproteinases de matriz), que são proteínas ligantes de zinco, aparentemente estimuladas por citocinas como IL-1, TNF , e ésteres de forbol. As MMP e seus inibidores também têm um papel importante no remodelamento tecidual que acompanha inflamação, cicatrização de feridas, invasão tumoral e reabsorção óssea e por muito tempo têm sido considerados como possíveis fatores na patogenia de várias doenças. Na hanseníase, expressão aumentada de mRNA de ambos, MMP-2 e MMP-9, foi recentemente detectada em lesões cutâneas reacionais. • A capacidade do M. leprae de infectar a célula de Schwann é uma característica única do bacilo entre todas as bactérias patogênicas para o homem. O envolvimento de pelo menos três diferentes proteínas envolvidas na aderência do M. leprae à laminina presente na membrana basal das células ainda não foi demonstrado, embora dados preliminares do laboratório sugiram que TNF e outras citocinas estão envolvidos e podem ser os principais mediadores da lesão neural. A capacidade de ligantes de M. leprae induzirem apoptose de SC através da ligação de TLR-2 proporciona um mecanismo pelo qual a ativação da resposta imune inata contribui para a lesão de nervo na hanseníase. • O diagnóstico das reações hansênicas é feito com base na análise clínica e laboratorial. As manifestações frequentes incluem: ✓ Reativação das lesões cutâneas preexistentes com eritema, edema, calor e hipersensibilidade e aparecimento de novas lesões que podem apresentar as condições inflamatórias referidas ou se exteriorizar como máculas RR macular. Espessamento e dor espontânea ou à palpação de troncos nervosos periféricos (neurite). Ocasionalmente, surgem edemas de extremidades uni- ou bilateral; distúrbios sistêmicos (febre, mal- estar geral). Podem ser referidos, antes da exteriorização dos sinais e sintomas reacionais, hipersensibilidade e hiperestesia em extremidades (palmas das mãos, plantas dos pés, pavilhões auriculares e nariz) e sensação de prurido nas lesões. ✓ Eritema Nodoso Hansênico é característico dessa doença com nódulos cutâneos de aparecimento súbito e sob pele aparentemente normal, eritematosos, dolorosos, móveis, isolados, com distribuição simétrica e bilateral principalmente na face e extremidades; o comprometimento sistêmico é comum, em muitos casos grave, com características de estado toxêmico; neurite; edema e eritema com características inflamatórias em mãos e pés. ✓ Laboratorialmente, podem ser detectadas leucocitose e neutrofilia; reação leucemoide, queda abrupta do hematócrito; anemia normocítica e normocrômica; níveis elevados de proteína e reativa e fibrinogênio; diminuição da atividade fibrolítica; elevação dos níveis de transaminases, aldolases e fosfatases. ✓ A neuropatia periférica da hanseníase se apresenta com manifestações predominantemente sensoriais e autonômicas envolvendo a sensibilidade térmica, tátil e dolorosa e comprometendo também as secreções sudoríparas, sebáceas, o trofismo e a ereção do pelo, comprometimento da função motora, paresias, paralisias e hipotrofia muscular. VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT OBS: A lesão do nervo periférico é representada por infiltrado inflamatório que ocupa os compartimentos do nervo (endoneuro, perineuro e epineuro), podendo o infiltrado ser constituído por granuloma epitelioide com pouco ou nenhum bacilo e por infiltrado formado por macrófagos que se tornam vacuolados contendo bacilos álcool-ácido- resistentes em seu interior. O infiltrado inflamatório do nervo acaba por destruir as fibras nervosas mielinizadas e não mielinizadas, comprometendo gravemente a função neural dos pacientes. Os mecanismos de lesão do nervo periférico na hanseníase são controversos, sendo a fase inicial da interação do M. leprae com os componentes do nervo. Essa interação que ocorre antes da invasão do nervo pelo infiltrado inflamatório é fundamental para os eventos subsequentes, pois ela resulta na modificação estrutural e biológica do órgão, alterando a sua barreira protetora, permitindo a detecção do bacilo pelo sistema imunológico do hospedeiro e a consequente ocupação do nervo pelo infiltrado imunoinflamatório que é altamente destrutivo para esse órgão. Foi registrado que o M. leprae tem o poder de induzir aumento de expressão de mRNA e de proteínas correspondentes a MMP9, MMP2, TIMPl e de TNF em células de Schwann, o que explica a patogenia da lesão neural da hanseníase, pois o aumento da expressão de MMP9 está implicado no processo de ativação de TNF, na ruptura da barreirahematoneural e no processo de desmielinização da fibra nervosa com a consequente dor neuropática. A isso se soma o efeito de linfócitos citotóxicos sobre células de Schwann infectadas, diminuição da fosforilação das proteínas de neurofilamentos e atrofia axônica. • Tratamento: a OMS recomenda a associação de quimioterápicos no tratamento de todos os pacientes de hanseníase objetivando a prevenção de cepas do M. leprae quimiorresistentes, eliminação da população bacteriana viável no menor tempo possível, diminuição do risco de recidivas e do número de casos de abandono. A utilização dos esquemas poliquimioterápicos se dá pela associação dos seguintes medicamentos: ✓ Rifampicina: antibiótico semissintético dos grupos das rifaminas possui a propriedade de atravessar membranas lipídicas mantendo a atividade antimicrobiana em ambiente ácido, propriedade particularmente útil no caso de bactérias intracelulares; ✓ Clofazimina: Seu componente ativo é um corante imunofenazínico e é o único medicamento no tratamento da hanseníase que possui propriedades anti-inflamatórias relacionadas com a diminuição da mobilização de neutrófilos e da transformação linfocitária induzida por mitogênese. ✓ Dapsona: Foi o primeiro quimioterápico a ser utilizado no tratamento da hanseníase e persiste até os dias atuais em virtude de seu baixo custo e boa tolerabilidade com reduzidos efeitos colaterais graves. ✓ Ofloxacino: Antibiótico do grupo das fluoroquinolonas é efetivo contra o M. leprae na dose de 400 mg. Estudos laboratoriais demonstram que 22 doses de 400 mg eliminam 99,9% da população viável do M. leprae. Possui como efeitos colaterais manifestações gastrintestinais (náuseas, diarreia) e no sistema nervoso central (cefaleia, tonturas, insônia e alucinações). ✓ Minociclina: Antibiótico do grupo das tetraciclinas, possui significativa atividade bactericida frente ao M. leprae, porém consideravelmente menor do que a da RMP. Estudos clínicos demonstraram que a dose de 100 mg/dia é eficaz. Possui como efeitos colaterais alteração permanente da coloração do esmalte dentário em crianças, distúrbios gastrintestinais e no sistema nervoso central (tonturas, tremores). • Esquemas poliquimioterápicos para hanseníase: ✓ Pacientes PB: Rifampicina - 600 mg uma vez ao mês com supervisão + Dapsona - 100 mg/dia, autoadministrados. Duração: 6 doses em até 9 meses. o Deve ser feito contato quinzenal, preenchimento de fichas com revisão dermatológica na 6ª dosee avaliação do grau de incapacidade. o Receberão alta por cura, os pacientes que completaram as 6 doses de PQT (poliquimioterapia) supervisionada, em até 9 meses, independentemente do número de faltas consecutivas. o Os doentes com alta por cura sairão do registro ativo e devem retornar anualmente, por 3 anos, quando serão liderados com orientação para retornar para sua unidade, caso desenvolvam sinais e sintomas sugestivos de atividade da doença ✓ Pacientes MB: Rifampicina 600 mg - uma vez ao mês com supervisão + Clofazimina 300 mg - uma vez ao mês com supervisão 50 mg - diários autoadministrados + Dapsona 100 mg - diários autoadministrados. Duração: 12 doses com supervisão (período máximo de 18 meses). o Deve ser feito contato quinzenal, preenchimento de fichas com revisão dermatológica na 6ª e 12ªdoses e avaliação do grau de incapacidade. o Receberão altas, por cura, os pacientes que completaram as 12 doses de PQT supervisionada, em até 18 meses, independentemente do número de faltas consecutivas. Sairão do registro ativo, devendo retornar anualmente, por 3 anos, para acompanhamento. • Tratamento das reações hansênicas: visto que as manifestações hansênicas são emergenciais, deve-se tratar adequadamente. Os corticosteroides, por suas ações imunossupressora e anti-inflamatória, são as medicações de VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT escolha, pois inibem a resposta inflamatória, desencadeada tanto por estímulos imunológicos como por não imunológicos. A talidomida pode ser considerada como o fármaco mais efetivo no tratamento do ENH e que reduz os níveis séricos do TNF sem afetar a produção de IL-1 e IL-6. A pentoxifilina é uma metilxantina com ação na viscosidade sanguínea, fibronólise, coagulação e cicatrização. As evidências entre os níveis séricos elevados de TNF e o desenvolvimento do ENH também sugerem que a melhor opção terapêutica para o ENH é a utilização de anticorpos anti-TNF. Lembrando que o tratamento das reações deve estar associado ao tratamento poliquimioterápico na eventualidade de o paciente ainda não ter completado o número de doses preconizadas; nos casos que apresentar reação após a alta, somente utilizar as substâncias antirreacionais. 2) Farmacologia da Hanseníase: Rifampicina: • Faz parte de um grupo de antibióticos macrocíclicos chamado Rifamicinas. É derivada do fungo do solo Streptomyces, tem atividade antimicrobiana mais ampla do que a isoniazida e é usada no tratamento de inúmeras infecções bacterianas causadas por micobactérias intra e extracelulares. Como rapidamente surgem cepas resistentes durante o tratamento, nunca é usada como fármaco único para tratar a tuberculose ativa. A resistência à rifampicina pode ser causada por mutação na afinidade da RNA-polimerase DNA-dependente da bactéria pelo fármaco ou por diminuição da permeabilidade. • Seu mecanismo de ação se dá por bloqueio da transcrição através da interação com a subunidade beta da RNA-polimerase DNA-dependente bacteriana, mas não a humana. Assim, o fármaco é específico contra procariotos e inibe a síntese de RNAm suprimindo a etapa inicial. • Ela é eficaz contra vários microrganismos gram-positivos e gram-negativos e é usada profilaticamente por indivíduos expostos a meningite causada por meningococos ou Haemophi/us influenzae. A rifabutina, um análogo da rifampicina, tem alguma atividade contra o complexo Mycobacterium avium-intracellulare, mas é menos ativa contra tuberculose. • Com administração oral, é distribuída por todos os órgãos e líquidos corporais, sendo captado pelo fígado e sofre circulação entero-hepática. A rifampicina pode causar indução das oxidases hepáticas de função mista (ver p. 14), reduzindo sua meia-vida e promovendo numerosas interações com fármacos. A sua eliminação e a dos metabólitos é pela bile nas fezes ou pela urina. • Embora bem tolerada, pode haver efeitos adversos como náuseas, êmese e urticária, raras hepatites e morte devido à insuficiência hepática, por isso não deve ser adm sozinha ou ionizada em alcoolistas, idosos e hepatopatas. Quando a rifampicina é dosificada intermitentemente ou quando as doses diárias são de 1,2 g ou mais, ocorre uma síndrome tipo gripe, com febre, calafrios e mialgias e às vezes associada com insuficiência renal aguda, anemia hemolítica e choque. Como a rifampicina pode induzir inú meras enzimas citocromo P450 (ver p. 14), ela pode determinar a redução da meia-vida de outros fármacos que são coadministrados e biotransformados por esse sistema. Também pode haver coloração de urina, fezes e outras secreções de vermelho-alaranjado. Dapsona: • É estruturalmente relacionada com as sulfonamidas e de modo similar inibe a síntese de folato via inibição da di-hidropteroato sintetase. Ela é bacteriostática contra Mycobacterium leprae, mas cepas resistentes são encontradas. A dapsona também é empregada no tratamento de pneumonia causada por Pneumocystis jiroveci em pacientes infectados com HIV. • É bem absorvida do TGI e se distribui por todo o organismo, com níveis elevados concentrados na pele. O fármaco entra na circulação entero-hepática e sofre acetilação hepática. A dapsona e seus metabólitos são eliminados pela urina. • As reações adversas incluem hemólise, especialmente em pacientes com deficiência de glicose-6 fosfato desidrogenase, bem como metemoglobinemia, neuropatia periférica e a possibilidade de desenvolver "eritema nodosum leprosum" (uma complicação cutânea séria e grave da hanseníase, combatida com corticosteroides ou talidomida). Clofazimina: • é um corante fenazina que se liga ao DNA e evita que sirva de modelo para futuras replicações de DNA. Sua propriedade redox pode levar à formação de radicais de oxigênio citotóxicos que também são tó xicos para a bactéria. A clofzimina é bactericida contra o M. leprae e tem alguma atividade contra o complexo M. avium-intracellulare. • Com adm oral, o fármaco se acumula nos tecidos, permitindo o tratamento intermitente, mas não entra no SNC. • Podem haver coloração vermelho-marrom na pele e Enterite eosinofílica. O fármaco também tem alguma atividade anti-inflamatória. 3) Prevenção e controle da Hanseníase: VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT • A principal prevenção consiste em diagnóstico precoce, tratamento poliquimioterápico adequado e tratamento das neurites com corticoterapia, principalmente durante os estados reacionais. É importante orientar o paciente para que realize o auto-exame diário e evite traumatismos, calos, ferimentos e queimaduras. As atividades de prevenção e tratamento de incapacidades não devem ser dissociadas do tratamento PQT/OMS. Desenvolvidas durante o acompanhamento de cada caso, devem ser integradas na rotina dos serviços da unidade de saúde, de acordo com seu grau de complexidade. A adoção de atividades de prevenção e tratamento de incapacidades será baseada nas informações obtidas através da avaliação neurológica, no diagnóstico da hanseníase. Estas informações referem-se ao comprometimento neural ou às incapacidades físicas identificadas, as quais merecem especial atenção tendo em vista suas conseqüências na vida econômica e social dos portadores de hanseníase, ou mesmo suas eventuais sequelas naqueles já curados. • Em Rondonópolis, são 03 polos de atendimento que visam melhorar a qualidade de vida e bloquear a disseminação da doença. Isso inclui unidades de referência farão biópsia, entrega de material para coleta de linfa, notificação e relatório mensal, tratamento e alta dos casos diagnosticados, bem como o controle dos comunicantes intradomiciliares de todos os doentes da área de abrangência das mesmas. As demais Unidade Básicas de Saúde, serão responsáveis pelo acompanhamento das doses supervisionadas e pelo controle de todos os comunicantes intradomiciliares, bem como pelo relatório destas atividades e o encaminhamento destes ao Sistema de Informação. • Para a efetividade de medidas de prevençãoe controle, é papel das Unidades Básicas de Saúde, dentre outras coisas: examinar o paciente com sinais suspeitos; acompanhar e encaminhar casos de incapacidade grau II; Preencher ficha de notificação com entrega semanal; examinar os comunicantes intradomiciliares e encaminhar relatório para o Sistema de Informação; dar todas as informações sobre Hanseníase e prognósticos sem e com o tratamento aos doentes; alertar a comunidade para a suspeita de Hanseníase, informando a eficácia do tratamento, importância do diagnóstico e tratamento precoce e trabalhando no sentido de superar preconceitos; investigar em todos os usuários atendidos na U.S, a presença de lesões suspeitos de Hanseníase, encaminhando para consulta médica. • Além disso, devem ser feitas a identificação determinantes fundamentais da qualidade de vida: trabalho/renda e consumo de bens e serviços; das características genéticas, ambientais, socioeconômicas e culturais, que interferem sobre a saúde... 4) Epidemiologia da Hanseníase: • A hanseníase é amplamente distribuída no hemisfério sul, estando presente em quase todos os países da África, da América Latina e da Ásia. Entretanto, somente 7 países são considerados endêmicos e apresentam prevalência acima de 1 por 10.000 habitantes (Brasil, Índia, Madagascar, Moçambique, Nepal, Tanzânia). A taxa de prevalência no Brasil é de 4,52 pacientes para 10.000 habitantes (MS, 2003). • Dados obtidos a partir de um estudo descritivo do perfil epidemiológico dos casos novos de hanseníase no Brasil, no período de 2012 a 2016. As fontes utilizadas para a obtenção dos dados foram: (i) as notificações dos casos de hanseníase registradas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan); e (ii) as estimativas populacionais para o ano de 2014 elaboradas pelo Ministério da Saúde/SVS/CGIAE segundo regiões e Unidades da Federação (UFs). • O Estado do Mato Grosso possui 11 municípios prioritário para a hanseníase, que são: Alta Floresta, Barra do Garças, Cáceres, Cuiabá, Diamantino, Juara, Rondonópolis, Sinop, sorriso, Tangará da Serra e Várzea Grande. • No período de 2012 a 2016, foram diagnosticados 151.764 casos novos de hanseníase no Brasil, o que equivale a uma taxa média de detecção de 14,97 casos novos para cada 100 mil habitantes. Nesse período, observou-se que a taxa de detecção por 100 mil habitantes na população masculina foi maior que na população feminina em todas as faixas etárias, sobretudo a partir dos 15 anos de idade. Além disso, essa proporção é crescente com o aumento da faixa etária, apresentando, na população masculina de 60 ou mais anos de idade, uma taxa média de detecção cerca de oito vezes maior que na população menor de 15 anos. • Classifica-se o caso de hanseníase como incapacidade grau 0, quando a força muscular e a sensibilidade desses segmentos estão preservadas; grau 1, quando há diminuição da força muscular e/ou diminuição de sensibilidade; e grau 2, quando há deformidade visível nas mãos e/ou pés e/ou olhos. Assim, em relação à detecção de casos novos com grau 2 de incapacidade física, o estudo revelou uma taxa média de 10,53 casos para cada 1 milhão de habitantes do Brasil, no período de 2012 a 2016. Com isso, há uma constatação de que as deformidades visíveis são uma das principais causas do estigma social e do isolamento de pessoas na sociedade. Este trabalho mostra que esta situação afeta a vida de milhares de brasileiros, porque compromete mecanismos de defesa, como a capacidade de sentir dor, a visão e o tato, tornando-os mais vulneráveis aos riscos de acidentes, queimaduras, feridas, infecções e amputações, entre outros. • A análise dos indicadores por macrorregião mostrou que as regiões Centro-Oeste (37,27/100 mil hab.) e Norte (34,26/100 mil hab.) exibiram as maiores taxas médias de detecção geral no período analisado (2012-2016), enquanto as menores foram registradas nas regiões Sul (3,75 por 100 mil habitantes) e Sudeste (5,31 por 100 mil habitantes). Observa-se que todas as UFs, exceto o Rio Grande do Norte, apresentaram maiores taxas de detecção no sexo masculino. Os maiores valores deste indicador no sexo masculino foram registrados nos estados de Mato VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT Grosso, Maranhão, Tocantins e Rondônia, enquanto nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Alagoas as taxas médias de detecção foram mais próximas entre os sexos. • No período 2012-2016, a proporção dos casos novos com classificação operacional multibacilar foi prevalente no sexo masculino (62,7%), enquanto a classificação paucibacilar prevaleceu no sexo feminino (58,6%). • Nos cinco anos de análise (2012-2016), 95,7% dos casos novos diagnosticados no país declararam sua raça/cor no momento da notificação. Destes, 58,9% corresponderam à raça/ cor parda, 26,8% à branca, 12,8% à preta, 0,9% à amarela e 0,4% à indígena. Isso reflete o contexto histórico da população negra no Brasil, pois este segmento, além de representar a maior parte da população do país, é o que mais padece com as desigualdades em diversos aspectos da vida social, inclusive na saúde, assim como ocorre quando se observa a predominância de hanseníase em homens com baixa escolaridade pode sugerir a influência dos determinantes sociais, que assumem papel importante no processo de adoecimento da população. Vale ressaltar a importância dessa informação para o planejamento das atividades, principalmente nos aspectos relacionados à educação em saúde, sobretudo na abordagem de autocuidado. • A hanseníase virchowiana ocorre nos indivíduos que apresentam imunidade celular menos eficaz contra o Mycobacterium leprae e representa importante foco infeccioso nos casos não tratados. A forma dimorfa acomete pessoas com instabilidade imunológica contra o bacilo, constituindo tais indivíduos um grupo mais sujeito às reações hansênicas, que são uma das principais causas de surgimento de incapacidades físicas em hanseníase. VANESSA TELLES- MEDICINA UFMT • Apesar da hanseníase ser um problema relativamente maior entre os homens, esse grupo populacional provavelmente comparece menos às unidades de saúde para o controle de comunicantes. Destaca-se que a vigilância de contatos é a principal estratégia de detecção ativa para a descoberta de casos, uma vez que facilita o diagnóstico precoce, contribuindo para a queda da cadeia de transmissão e reduzindo, consequentemente, as de!ciências que surgem em decorrência do atraso no diagnóstico. Em relação ao percentual de exame de contatos por UF, observa-se que os estados de Rondônia, Amapá, Sergipe, Alagoas e Mato Grosso apresentaram maiores percentuais de contatos examinados, entre os contatos dos casos novos registrados em mulheres.
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