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as garantias previstas, fatores estes que resultam em processos demorados, ou mesmo que nunca terminam, ou quando terminam já não produzem os efeitos desejados. Dessa forma, o processo como sempre foi conhecido, não se faz capaz de resolver todas as situações conflituosas, vez que necessita atender todas as garantias das partes, com segurança jurídica e a efetiva prestação jurisdicional, evidenciando a necessidade de vias alternativas à jurisdição na resolução de conflitos. Houve a necessidade de implementar medidas para efetivar os direitos que estavam sendo popularizados, conforme MAZZEI: “Em verdade, o que se percebe é que, uma vez previstas as garantias e os direitos fundamentais no texto constitucional de 1988, faz-se necessário implementar medidas para efetivá-los. Nesse sentido, 2 passa-se a discutir a implementação dos meios de resolução de conflitos para além da exclusiva imposição da decisão pelo Estado-juiz.”1 Houve a busca por alternativas que visavam garantir a celeridade das ações judiciais, com isso, as vias primitivas de solução de conflitos, a autotutela, a heterocomposição e a arbitragem voltaram a ser utilizadas, no entanto, dentro dos ditames legais e com o intermédio do Estado. Surgiu então um termo: Alternative Dispute Resolucion (ADR) no Brasil conhecido como os meios “alternativos” de resolução de controvérsias, significando que é possível que o conflito se resolva de maneira adequada, sem a necessidade de passar pelo crivo do judiciário. A melhor maneira de se resolver um conflito seria utilizar um meio mais apropriado, devendo os operadores do direito observar o caso concreto e aplicar o meio mais apropriado a ser utilizado para sua resolução. No Brasil, o CNJ editou a Resolução nº 125, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses, contendo as diretrizes básicas para a implementação de meios não adjudicatórios de solução de conflitos como, por exemplo, a mediação e a conciliação.2 O Novo Código de Processo Civil de 2015 contempla em seu artigo 3º, o dever de estimular os métodos de solução consensual de conflitos3, algo que deve ser feito tanto pelos juízes como pelos advogados. Ainda, em 2015 durante a vacatio legis do novo CPC, foi promulgada a Lei 13.140/2015, chamada de “Lei da Mediação” que possui o condão de disciplinar os meios autocompositivos de solução de conflitos. E atualmente, para a solução dos 1 MAZZEI, Rodrigo; CHAGAS, Bárbara Seccato Ruis. Breve ensaio sobre as postura dos atores processuais em relação aos métodos adequados de resolução de conflitos. In. ZANETI JR, Hermes; CABRAL, Trícia, Navarro Xavier (coords). Justiça multiportas: Mediação, conciliação, arbitragem e outros meios de solução adequada pra conflitos. DIDIER JR, Fredie. Coleção grandes temas do novo CPC. Salvador: JusPodvim, 2017. p. 68. 2 Idem. 3 “Art. 2o - CPC:O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei. Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei. § 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.” 3 conflitos, temos como mecanismo a mediação, conciliação, negociação, a arbitragem e a jurisdição estatal, devendo cada caso ser analisado previamente e direcionado para o melhor mecanismo. Mas ainda, esses procedimentos são pouco adotados, os advogados prontamente ajuízam ações, comparecem as seções de conciliação/mediação sem sequer analisar se é possível resolver a questão antes da sentença, muitos esperam o final do processo para propor negociação, comportamento resultante de diversos paradigmas que precisam ser quebrados, visto que as partes quando buscam o advogado também esperam o ajuizamento da ação. O objetivo do projeto é demonstrar as vantagens do emprego dos meios adequados de solução de conflitos, além de apresentar novas propostas que vem integrando esse sistema. Revelando que acompanhar o que deve ser a evolução do direito poderá trazer ganhos, tanto para as partes, quanto aos operadores do direito, afastando os paradigmas culturais que resistem à dinâmica da sociedade. 4 1 O CONFLITO Cotidianamente, Estados, entidades, organizações e indivíduos se deparam com situações conflituosas, muitas destas situações acabam por se resolver ao longo do tempo, no entanto, algumas tomam proporções que ultrapassam a capacidade de resolução, causando impactos nos envolvidos e até mesmo a seres diversos daqueles que a compõem, mas para solucionar esses conflitos, primeiro se torna imperioso entendê-los profundamente. Na busca de conceituar o conflito, alguns doutrinadores entendem que, conflito e disputa são sinônimos, outros entendem que há distinção entre os conceitos que podem ser considerados eventos independentes4. A concepção do conflito sugere um evento dinâmico, ou seja, em constante transformação, por se tratar de um sistema relacional entre seres que constantemente se comunicam, sejam entre pessoas, pessoas e organizações, entre grupos, segmentos sociais, ou ainda entre países.5 Dessa forma, pode-se definir o conflito como: “um processo ou estado em que duas ou mais pessoas divergem em razão de metas, interesses ou objetivos individuais, percebidos como mutuamente incompatíveis.” 6 O conflito pode ser entendido como interação social com constante processo de influência mútua e de mudanças que surge de relações sociais em que membros distintos possuem objetivos que não são compatíveis. O conflito pode ainda advir de questões inconciliáveis entre o meio físico e o sujeito comportando nestas suas forças internas, realidades psíquicas ou relações interpessoais.7 BIANCHI entende que a visão de mundo do indivíduo está diretamente ligada a incompatibilidade por ele exercida, conforme: Apesar de reconhecer que a noção de ausência de compatibilidade está vinculada a muitas definições conceituais, é necessário considerar também o papel relevante desempenhado pela percepção da pessoa e por sua visão de mundo, na própria significação daquilo que apresenta como incompatível. Cada Pessoa tende a ter uma visão diferenciada das situações 4 BIANCHI, Ângela Andrade; JONATHAN, Eva; MEURER, Olivia Agnes. Teorias do Conflito. In: ALMEIDA, Tania; PELAJO, Samantha; JONATHAN, Eva. (coords). Mediação de Conflitos: Para iniciantes, praticantes de docentes. Salvador: JusPodvm, 2016. p.72. 5 Idem. 6 AZEVEDO, André Gomma de. (Org.). Manual de Mediação Judicial: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA., 6ª ed. Brasília: CNJ, 2016. p. 49. 7 BIANCHI, Angela Andrade; JONATHAN, Eva; MEURER, Olivia Agnes. Op. cit., p.72. 5 que vivencia, de modo que uma mesma situação social pode ser significada de múltiplas formas.8 Neste contexto pode-se dizer que a desavença não está nos fatos, mas sim na versão contada, ou mesmo percebida a partir da percepção que o indivíduo tem sobre aquele fato, seu ponto de vista, nas palavras de DELLORE: O que se percebe, porém, é que, apesar de indispensável à existência do ordenamento jurídico prescrevendo padrões de conduta, amparando certos interesses, reconhecendo legitimidade a certas pretensões, em detrimento de outras, pré-compondo os conflitos de interesse, nota-se a insuficiência do ordenamento jurídico para eliminar os conflitos. Em outras palavras, a despeito da existência de normas fixando padrões de conduta, acontece, com frequência, de alguém querer