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Metabolismo Integrado: Metabolismo de NAD+ e Restrição Calórica Efeitos Metabólicos da Concentração de NAD+ Pelarga Doença comum no início do século XX, seus sintomas incluem: diarreia, dermatite e demência. Em 1914, o médico Goldberg iniciou a tratar a doença com uma substituição da dieta rica em milho da região, por uma dieta contendo mais proteínas animais. Em 1940, Elvehjem propôs o tratamento da doença com nicotinamida e ácido nicotínico (vitamina B3), sendo ambos precursores da molécula de NAD+. De onde vem o NAD+? 1906 – Sir Arthur Harden descobre uma coenzima, conceito novo na época, que participa da fermentação do leite. Coenzima essa que viria a ser o NAD+. 1923 – Hans von Euler-Chelpin descobre que a coenzima citada anteriormente é um nucleotídeo açúcar fosfato. 1935 – Otto Warburg foi capaz de purificar a coenzima NAD+ e determinar seu papel na transferência de H+, essencial para o processo de oxirredução da fermentação. NAD+ como Substrato Além de ser uma coenzima importante em diversos processos bioquímicos, o NAD+ também age como substrato das enzimas sirtuínas. As sirtuínas são enzimas deacetilases, ou seja, elas retiram radicais acetil de proteínas, sendo esse processo dependente da molécula de NAD+, que é utilizada como aceptor do grupo acetil, gerando nicotinamida e O-acetil-ADP-ribose. NAD+ como Regulador Metabólico Envelhecimento Conforme camundongos envelhecem, a quantidade de NAD+ em todos os tecidos é reduzida, enquanto que a quantidade de NADH aumenta. Desenvolvimento Muscular A proporção de NAD+/NADH é aumentada na presença de galactose, em comparação com a glicose. Esse aumento na concentração de NAD+ aumenta a expressão de proteínas ligadas à proliferação das células musculares. Obesidade Em modelos de obesidade observou-se uma redução dos níveis de NAD+ no fígado e no tecido adiposo. Modelo de obesidade = camundongo com dieta rica em gordura. De forma oposta, camundongos estimulados a fazer exercícios apresentam níveis mais altos de NAD+. Restrição Calórica Camundongos com restrição calórica, ou seja, com uma redução na ingesta de calorias, apresentam os seguintes efeitos na proporção NAD+/NADH: Fígado – ↓ NAD+ Músculo – ↑ NAD+ Tecido Adiposo – ↑ NAD+ Metabolismo de NAD+ A principal forma de síntese de NAD+ é através do ácido nicotínico. Também é possível sintetizar NAD+ através do triptofano, mas o metabolismo do triptofano se desloca bem mais para sua degradação do que para a formação de NAD+. Por último, é possível sintetiza NAD+ pela chamada “Via de recuperação”, que ocorre após a degradação do NAD+ em nicotinamida, possibilitando a ressíntese de NAD+ através da própria nicotinamida. Experimentos com NAD+ Camundongo com inibição da NAMPT A NAMPT é uma enzima da via de recuperação de NAD+, responsável por converter a nicotinamida em NAM- mononucleotídeo. Camundongos com uma inibição parcial da expressão dessa enzima, uma vez que a inibição total não é viável, apresentam redução na secreção de insulina, como uma semi-diabetes do tipo 1. Camundongos com deleção da NNMT A NNMT é uma enzima que degrada nicotinamida, então sua deleção aumenta as taxas de nicotinamida no organismo, o que estimula a via de recuperação do NAD+. Camundongos com a deleção dessa enzima apresentam: • Resistência à obesidade (o camundongo não consegue ganhar peso) • Mais massa magra (músculo) e menos massa gorda (gordura) • Redução no tamanho dos adipócitos • Maior sensibilidade à insulina • Menor acúmulo de gordura no fígado • Maior consumo de oxigênio (gasto energético) Sirtuínas As moléculas de NAD+ podem ser encontradas no citoplasma, nas mitocôndrias ou no núcleo celular, e embora o NAD+ não seja capaz de atravessar de uma região para outra, seus intermediários são. Além disso, há sempre uma regulação para manter o equilíbrio da quantidade de NAD+ nesses 3 “pools”. Lançadeiras As proteínas lançadeiras são importantes na regulação dos níveis de NADH e NAD+ no citoplasma e na mitocôndria. Transportador de Malato / alfa-cetoglutarato No citoplasma, ocorre a conversão de oxalacetato em malato, consumindo NADH e gerando NAD+. Esse malato é enviado para dentro da mitocôndria através do transportador de malato, e no interior da organela o malato é convertido de volta a oxalacetato, consumindo NAD+ e formando novamente NADH. Transportador aspartato / glutamato O oxalacetato, através da ação da enzima mAAT, é convertido em aspartato, em uma reação que envolve o glutamato, que acaba sendo convertido em alfa-cetoglutarato. A saída do aspartato da mitocôndria, e a entrada do glutamato, acontecem pelo mesmo caminho, que é o transportador de aspartato/glutamato. O alfa-cetoglutarato gerado pela reação da enzima mAAT é transportado para fora da mitocôndria através do transportador de malato / alfa-cetoglutarato. Ação das Sirtuínas Como foi dito anteriormente, as sirtuínas são enzimas responsáveis pela desacetilação de proteínas, utilizando o NAD+ como substrato do processo. Exercício As sirtuínas promovem a desacetilação da enzima PGC-1α em resposta ao exercício físico. Restrição Calórica A restrição calórica aumenta a expressão de sirtuína no tecido adiposo e nos músculos. Depleção de Glicose A depleção de glicose em leveduras, que simula uma restrição calórica, também aumenta a atividade da sirtuína, devido ao aumento das concentrações de NAD+. Longevidade O aumento na expressão de sirtuínas em diversos modelos (leveduras, moscas, camundongos...) mostra um aumento considerável da longevidade. Ao mesmo tempo, camundongos com uma redução de sirtuínas apresentam menor tempo de vida. Metabolismo Mitocondrial A possível razão por trás de todos os outros efeitos da sirtuína é o aumento do metabolismo mitocondrial, promovido por essa enzima. Experimentos com Sirtuína Aumento da expressão de Sirtuína Camundongos com a expressão de sirtuína aumentada apresentaram as seguintes características: • Consumo de oxigênio normal (era esperado um consumo maior) • Atividade motora menor (era esperada uma atividade maior) • Peso normal (era esperado um peso menor) • Temperatura corporal mais baixa (era esperada uma temperatura mais alta) Através desses dados é possível perceber que o aumento da expressão de sirtuínas, em situações metabólicas normais, não traz grandes efeitos. No entanto, em camundongos com situações metabólicas desfavoráveis, como Figura 1: Esquema do equilíbrio dos níveis de NADH e NAD+ entre o citosol e a matriz mitocondrial. dieta rica em gordura (obesidade), foi evidenciada uma resistência ao diabetes e à esteatose hepática, que são dois efeitos bem favoráveis. Knockout da expressão de Sirtuína Enquanto os efeitos da maior expressão de sirtuína são discretos, uma deleção da expressão de sirtuína traz consequências bem evidentes, como: • Ganho de peso • Redução do consumo de oxigênio (atividade metabólica) • Resistência à insulina (diabetes do tipo 2) • Acúmulo de gordura no fígado (esteatose hepática) • Aumento de gordura no sangue (dislipidemia) A soma desses fatores (obesidade, diabetes, esteatose e dislipidemia) forma a síndrome metabólica. Poli (ADP-ribose) polimerases (PARPs) e ADP-Ribose cíclica sintase (CD38) Poli (ADP-ribose) polimerases (PARPs) As PARPs são responsáveis pela ADP-ribosilação de proteínas, utilizando o NAD+ como substrato, o que gera nicotinamida ao final da reação. Funções das PARPs As PARPs são enzimas responsáveis por processos metabólicos como: • Redução da atividade das hexoquinase (↓ captação de glicose) • Redução de NADPH (↓ via das pentoses e síntese de glutationas) Pelo NAD+ ser substrato, tanto da PARP, quando da sirtuína, a maior atividade de uma enzima automaticamente leva a queda na função da outra. Envelhecimento O envelhecimento leva a um aumento na quantidade de PARP no organismo, ao mesmo tempo que diminui a quantidade NAD+. Consumode Calorias O maior consumo de calorias leva a uma maior expressão de PARP, uma dieta rica em gorduras também. Experimentos com PARPs Knockout para PARP Um camundongo sem a expressão de PARP possui todos os benefícios de uma maior expressão de sirtuínas, o que inclui: • Menor acúmulo de gordura • Maior gasto energético • Tolerância ao frio aumentada • Tolerância à glicose aumentada • Mais mitocôndrias nos músculos e no tecido adiposo • Aumento da longevidade (testado em vermes) ADP-Ribose cíclica sintase (CD38) A CD38 é uma enzima responsável pela formação de cADP-ribose, que é um segundo mensageiro celular, através da molécula de NAD+. Assim como as PARPs, por utilizar o NAD+ como substrato, a maior atividade da CD38 reduz a atividade das sirtuínas. Experimentos com CD34 Knockout para CD34 A deleção da CD34 gera os mesmos efeitos que um aumento na atividade das sirtuínas, como: • Menor ganho de peso • Menor acúmulo de gordura no fígado • Menor acúmulo de gordura abdominal Suplementação Alimentar com Precursores de NAD+ e Inibidores Farmacológicos de PARP e CD38 Suplementação com precursores de NAD+ Nicotinamida Ribosídeo Em leveduras e vermes: • Aumento da longevidade • Aumento da quantidade de mitocôndrias • Aumento do gasto energético Em mamíferos (camundongos): • Aumento da quantidade de mitocôndrias • Aumento do gasto energético • Redução do peso • Redução do acúmulo de gordura • Redução de colesterol e triglicerídeos no sangue • Aumento da sensibilidade à insulina • Aumento da secreção de insulina (em camundongos idosos) Todos os efeitos benéficos da ingesta de precursores de NAD+ são dependentes de sirtuínas, pois elas que estimulam a síntese de mitocôndrias, que é a base de todos os efeitos. Os efeitos em mamíferos não são tão destacados quanto em vermes ou leveduras, uma vez que quanto mais complexo o organismo, menos perceptivas se tornam as mudanças metabólicas. Inibidores de PARP e CD38 Inibidores de PARP Efeitos benéficos da inibição de PARP1: • Perda de peso • Redução de massa gorda (gordura) • Maior gasto energético • Maior atividade de sirtuína Efeitos adversos da inibição de PARP2: • Redução na secreção de insulina (diabetes do tipo 1) • Problemas na expressão de diversas proteínas, incluindo a insulina Inibidores de CD38 Efeitos benéficos da inibição de CD38: • Melhora na tolerância à glicose • Maior atividade de sirtuína Restrição Calórica Restrição calórica pode ser definida como uma redução no consumo de calorias, em cerca de 30%, sem haver um quadro de subnutrição. Os benefícios dessa prática incluem: aumento da longevidade e redução de doenças associadas ao envelhecimento (ex: diabetes e câncer). Restrição Calórica em Leveduras Leveduras, se cultivadas em meio normal (2% de glicose), realizam primeiro o processo de fermentação, e depois que a glicose disponível no meio é reduzida, passam a fazer respiração mitocondrial. Agora, caso as leveduras sejam cultivadas em meio com restrição calórica (0,5% de glicose), as mesmas faram respiração mitocondrial desde o começo. Foi observado que leveduras cultivadas com restrição calórica vivem mais que as cultivadas em meio rico em glicose, pois o processo de fermentação envelhece as mesmas. Mas só funciona em levedura? Já foi evidenciado que a restrição calórica leva a um aumento da longevidade em diversos seres vivos, como: • Vermes – Expectativa de vida 2 a 3 vezes maior • Moscas – Expectativa de vida 2 vezes maior • Ratos – Expectativa de vida de 30 a 50% maior • Macacos – Já foi notado aumento da expectativa de vida, mas ainda não foi determinado de quanto • Humanos – Acredita-se haver um aumento da expectativa de vida, além de já ter sido evidenciada uma menor tendência no desenvolvimento de doenças como: diabetes, câncer, obesidade e problemas cardiovasculares. Como a restrição calórica funciona? PKA? Estudos com camundongos mostraram que o estímulo da PKA aumenta a expectativa de vida dos machos, mas não das fêmeas. Os camundongos machos apresentaram: • Redução do peso corporal • Redução da gordura no fígado • Redução das taxas de leptina • Redução na glicemia de jejum • Melhor resposta à insulina Por outro lado, as fêmeas continuaram normais, ou com efeitos muito discretos, o que faz com que a PKA provavelmente não seja o fator principal por trás dos benefícios da restrição calórica. TOR? Leveduras com knockout para TOR realmente apresentam maior longevidade, o que pode indicar que a AMPK, enzima ligada ao metabolismo, que inibe TOR e que é aumentada em situação de restrição calórica, seja a principal responsável pelos efeitos benéficos dessa prática. AMPK? A condição de restrição calórica aumenta a expressão de AMPK, que age estimulando as sirtuínas e inibindo mTOR. As sirtuínas estimulam outras duas importantes enzimas: PGC-1alfa e FOXOs, trazendo os seguintes efeitos metabólicos: • Biogênese mitocondrial • Aumento do metabolismo oxidativo • Proteção contra o estresse oxidativo Mas porque ainda não confirmou que é a AMPK? Ainda não há uma confirmação de que a AMPK é a principal responsável pelos efeitos benéficos da restrição calórica, devido a alguns dados conflitantes na literatura sobre o tema. Leveduras A inibição da AMPk realmente reduz o tempo de vida. Por outro lado, a hiper expressão de AMPK também reduz o tempo de vida das leveduras. Vermes Fatores a favor de AMPK: • AMPK é necessária para a maioria dos efeitos da restrição calórica • A hiper expressão de AMPK aumenta a expectativa de vida dos vermes • Restrição de glicose aumenta as taxas de AMPK Fatores contra AMPK: • Os efeitos de AMPK não são gerais, dependem do tipo de regime do experimento • Nem todo experimento de restrição calórica é dependente de AMPK Moscas Fatores a favor de AMPK: • Inibição da AMPK reduz o tempo de vida • Sem AMPK, não ocorrem os efeitos da restrição calórica Fatores contra AMPK: • Mesmo na ausência de AMPK, alguns modelos apresentam fenótipos da restrição calórica Ratos Fatores a favor de AMPK: • Miméticos da restrição calórica ativam AMPK • AMPK interage com diversas vias ligadas à longevidade • Agonistas de AMPK previnem o desenvolvimento de doenças ligadas ao envelhecimento Fatores contra AMPK: • Miméticos da restrição calórica não mostraram aumento no tempo de vida • Não há evidência genética conclusiva de que a AMPK está envolvida com os efeitos da restrição calórica • Alguns casos de restrição calórica não mostraram maior ativação da AMPK Aumento da Longevidade em Leveduras ATPase Vacuolar Leveduras expostas a restrição calórica e a super expressão de ATPase vacuolar apresentam aumento na longevidade, e em taxas bem similares, o que indica que as duas vias devem seguir o mesmo mecanismo. A captação de glicose pelas leveduras inibe ATPase vacuolar, o que acaba por inibir a excreção de aminoácidos, gerando um acúmulo dos mesmos no interior da levedura. O acúmulo de aminoácido na levedura estimula mTOR, que inibe a atividade das mitocôndrias, gerando uma redução na longevidade. Na restrição calórica, por outro lado, há uma menor captação de glicose, então não há inibição da ATPase vacuolar, o que evita o acúmulo de aminoácido intracelulares, não estimulando mTOR e, portanto, não há inibição da atividade mitocondrial, o que possibilita maior gasto energético e longevidade. Peroxirredoxina Leveduras knockout para peroxirredoxina apresentam queda no tempo de vida. Além disso, leveduras expostas a restrição calórica, caso não expressem peroxirredoxina, não apresentam aumento da longevidade. Basicamente, a peroxirredoxina protege a levedura contra o estresse oxidativo, sendo esse processo inibido pela alta captação de glicose. Radicais Livres e Envelhecimento Em 2012, um estudo compilado de vários seres vivos, medindo a taxa de proteínas com dano oxidativo, pela porcentagemda vida máxima desses seres, mostrou que: • O dano oxidativo das proteínas aumenta com o passar do tempo; • A partir de 60% da vida máxima, a taxa de dano oxidativo das proteínas aumenta consideravelmente. Estresse oxidativo e RC Estudos mostram que, além do estresse oxidativo aumentar com a idade, esse processo está diretamente ligado com a alimentação, de forma que uma restrição calórica (RC) diminui consideravelmente os radicais livres em basicamente todos os tecidos. Essa redução dos radicais livres promovida pela RC, segundo os dados atuais, está bem mais relacionada a uma proteção celular contra os mesmos, do que exatamente a diminuição da formação dos radicais. Leveduras expostas a água oxigenada (que possui radicais livres), se mostraram bem mais resistentes se cultivadas em um meio de RC. Respiração Mitocondrial e RC Leveduras em situação de RC consomem mais oxigênio, pois dão preferência ao processo de respiração mitocondrial, sobre a fermentação, já que a respiração gera mais energia. Leveduras com inibição da hexoquinase executam ainda mais respiração mitocondrial, também pela baixa disponibilidade de glicose. A RC aumenta o tempo de vida das leveduras, mas caso haja ausência de citocromo, proteína essencial na respiração mitocondrial, esse efeito não é observado. Então quanto menos radicais livres melhor? Alguns vermes que vivem em lugares de alta pressão apresentam uma concentração de radicais livres abaixo do ideal. Esses seres, caso sejam tratados com substância geradoras de radicais livres, como o paraquat, têm seu tempo de vida aumentado, o que vai contra a ideia de que a redução dos radicais livres é algo tão benéfico assim. Os radicais livres são essenciais em vários processos de sinalização do organismo e sua redução exacerbada gera problemas, assim como o excesso. Portanto, há uma quantidade ideal de radicais livres no organismo, que deve ser mantida. A inibição da óxido nítrico sintase (NOS), que é uma enzima formadora de radical livre, acaba por inibir todos os efeitos metabólicos da RC, mostrando que a sinalização por radicais livres é essencial, até mesmo para a RC, que teoricamente é um processo antagônico.
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