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Resenha Livro Globalização, dependência e neoliberalismo na América Latina - Carlos Eduardo Martins

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MARTINS, Carlos Eduardo. Globalização, Dependência e Neoliberalismo na América Latina. São Paulo: Boitempo Editorial, 2011.
Logo na introdução da obra, o autor anuncia que “captar o movimento da crescente articulação entre o global e as particularidades regionais, nacionais e locais é um dos maiores desafios das ciências sociais contemporâneas”. Dessa forma, o livro busca, segundo o próprio autor, situar as trajetórias e possibilidades da América Latina num espaço mundial em movimento. A análise aqui é prospectiva e retrospectiva, segundo Martins, e, para tanto, usa como guia a história. Estruturas, tendências seculares e ciclos permeiam o trabalho que não quer oferecer certezas matemáticas, mas interpretações heurísticas da realidade.
Globalização, dependência e neoliberalismo são, para o autor, eixos analíticos para compreender a posição da América latina no mundo em que vivemos e as alternativas com que se defronta. O primeiro capítulo se caracteriza como uma introdução metodológica da globalização. Nele, cinco visões a respeito do fenômeno são resumidas, tendo especial ênfase a teoria da dependência e a teoria do sistema mundial. O resumo dessas visões não se mostra gratuito, mas busca, a partir de um diálogo com tais visões, construir um aparato de investigação próprio da globalização.
Dando início ao capítulo em questão, o autor começa se interrogando o que é exatamente globalização; que impactos e modificações ela produz sobre as estruturas econômicas, políticas, sociais e ideológicas anteriores; e que novas direções despontam para o desenvolvimento da humanidade. Na resposta à primeira pergunta, o autor apresenta, em linhas gerais, as cinco visões da globalização já mencionadas na introdução e prefácio do livro.
A primeira interpretação é a globalista. Para esta, a globalização criou um novo objeto para as ciências sociais: a sociedade global. Como novidade radical, ela subordina o local e o nacional. Faz isso com base no paradigma tecnológico microeletrônico que, ao fundir as tecnologias eletrônicas e de comunicação, permite a integração financeira e produtiva em escala planetária. Os atores que encabeçam esse processo são corporações multinacionais – que tornaram-se empresas globais – junto dos fundos de investimento e pensão, e os grandes bancos, que criam um regime de acumulação desterritorializado como predomínio da riqueza financeira sobre a produtiva, condicionando as políticas estatais, portanto, aos objetivos de rentabilidade desses atores. Na esfera social, os direitos trabalhistas e a grande rede de proteção social tornam-se obsoletos e são ameaçados de extinção.
O autor ressalta que, na descrição dos elementos da era global, os autores globalistas convergem, mas no que tange aos seus efeitos, divergem, dividindo-se entre aqueles que acreditam na tendência à sincronia, harmonia e integração, assim que assimilada a nova cultura da competitividade; e os que, inversamente, consideram que esse processo tende à polarização, diacronismo e, no limite, à revoluções socialistas mundiais.
A segunda interpretação da globalização é formulada pelas teorias da hegemonia compartilhada. Difere da globalista questionando o fato das novas tecnologias dos anos 1970 terem construído uma sociedade global. Diz que a globalização, com as tecnologias microeletrônicas, só aumentaram o grau de internacionalização da economia mundial. Nesse sentido, os Estados nacionais continuam a ser os atores fundamentais da realidade em que vivemos, segundo essa interpretação, fazendo das empresas organizações competitivas interessadas em se apropriar dos ativos estratégicos e serviços fornecidos por esse Estado, como segurança, a partir do aparato de coerção e de regulação jurídica; a absorção parcial dos custos de produção de infraestrutura de transportes e comunicação, da P&D ou de qualificação da força de trabalho; e a referência de identidade cultural.
No entanto, mesmo essa visão alerta para o aumento do grau de internacionalização que provoca aumento do fluxo de bens e serviços entre Estados nacionais. Tal fenômeno pode provocar um deslocamento da articulação entre Estado e capital, ao ponto de exigir do primeiro completa reformulação. Essa reformulação implica em novos marcos de regulação fundados em regimes internacionais baseados em tratados e agências de regulação do mesmo tipo, em blocos de integração regional e na cooperação intergovernamental. Implica também no aumento da democratização, dado o desenvolvimento das tecnologias de informação por parte da sociedade. Porém, contrariando ilusões, não acaba com a hierarquia posta pelo sistema mundial entre nações desenvolvidas centrais e nações periféricas e semiperiféricas, dado que cabe às primeiras papel de destaque na organização dos regimes internacionais.
A terceira interpretação é a neodesenvolvimentista. Tem a presença de autores socialistas e outros partidários de um capitalismo organizado. O fenômeno aqui é entendido pela sua estrita lógica financeira originada da integração de mercados desse tipo. Nega a existência de um sistema produtivo mundial e não acredita no fim da soberania e do Estado nacional, mas no fortalecimento deste, na figura dos EUA, para manter e expandir sua condição hegemônica. Tal país, segundo essa concepção, faz isso baseado na força de sua moeda e de suas armas, impondo o neoliberalismo às demais nações com o intuito de liberalizar a conta capital e o mercado dos demais Estados nacionais. 
Quanto à principal alternativa proposta por essa concepção de globalização, inclui-se o restabelecimento de um regime de acumulação que priorize o investimento produtivo, variando entre seus autores as formas de se fazer isso. Uns apontam para o crucial papel dos EUA na criação de um novo regime de acumulação, outros na criação de blocos regionais continentais, outros na transição para o socialismo, e há ainda aqueles que apontam para uma centralização financeira interna que impulsione o desenvolvimento da burguesia industrial local, o desenvolvimento do capital tecnológico e do mercado interno etc.
A quarta interpretação, a qual o autor dá maior destaque, subdivide-se entre aqueles que endossam a ideia de um moderno sistema mundial, como Giovanni Arrighi, Immanuel Wallerstein e Beverly Silver, e os que discordam dizendo haver um único sistema mundial formado desde a revolução neolítica há 5 mil anos, como André Gunder Frank e Barry Gills. O primeiro grupo se apoia no conceito de tempo histórico, tirado da obra de Fernand Braudel, que o divide entre a longa duração, a conjuntura e o acontecimento. Desse conceito retira noções como ciclos sistêmicos e tendências seculares. Os ciclos sistêmicos ligam-se à ascensão e à queda de Estados hegemônicos que organizam a economia mundial em centros, semiperiferias e periferias. Nesse sentido, enquanto as tendências seculares do moderno sistema mundial absorve suas contradições, novos ciclos sistêmicos podem ser desencadeados, redirecionando os caminhos do desenvolvimento.
A globalização é vista aqui como etapa derradeira do moderno sistema mundial em sua capacidade de conter suas tendências antissistêmicas. Logo, vislumbra-se outra forma sistêmica a ser estabelecida pelas lutas sociais na medida em que uma grande crise puser fim ao moderno sistema mundial e ao capitalismo histórico que o conduz.
 Já no segundo grupo de autores, o único sistema mundial existente, tendo origem afro-eurasiana, sempre foi conduzido pela acumulação de capital e, até o século XVIII, tem o seu centro na Ásia, para no século XIX a Europa e o Ocidente empurrar o Oriente à condição periférica, assumindo a posição de centro. Os processos que o compõem são cíclicos mas de larguíssimo prazo, com aproximadamente quatrocentos e quinhentos anos. A globalização aqui é entendida dentro da sua dinâmica cíclica, com sua recentragem na Ásia.
Por fim, tem-se a quinta interpretação da globalização dada pela teoria da dependência, em sua versão marxista, organizada por autores como Theotonio dos Santos, Ruy Mauro Marini, Orlando Caputoe Ana Esther Ceceña. Nela, a globalização é vista como revolucionadora das forças produtivas através da revolução científico-técnica em escala planetária que integra processos produtivos mundialmente, elevando a lei do valor ao máximo e, por isso mesmo, significando um período de profunda crise do modo de produção capitalista que se dá por meio da tendência decrescente da taxa de lucro e pela impossibilidade progressiva de limitá-la. Nesse sentido, a globalização impulsiona inicialmente uma economia mundial imperialista que incorpora sob diferentes formas países dependentes e/ou semiperiféricos e socialistas estabelecendo limites crescentes para sua expansão. A partir desse enfoque, destaca-se a importância dos ciclos de Kondratiev para análise e prospectiva dos movimentos de expansão e crise da gestão capitalista da globalização.
A partir dessas diferentes visões a respeito de um mesmo fenômeno como a globalização, Martins, confirmando Arrighi e Silver, vê nessa multiplicidade de interpretações a expressão ideológica de tempos de crise e transição. Para o entendimento desse momento, portanto, busca fazer um balanço das diferentes análises em questão, a fim de construir um referencial teórico-metodológico próprio capaz de interpretar as transformações oriundas da globalização, as dimensionando. Para isso, parte da proposta braudeliana de articulação do tempo longo, com os tempos conjuntural e breve, ou seja, a articulação dos tempos das estruturas, dos ciclos e dos acontecimentos. A partir dessa visão, detecta-se no quadro que se apresenta uma profunda crise do capitalismo, que se globaliza por meio do neoliberalismo.
Martins ressalta que na crise das estruturas, ganha destaque sua dimensão cíclica, pois ela nos permite traçar sua dinâmica e suas tendências. Por sua vez, as dimensões estrutural e cíclica condicionam as forças do tempo imediato, estabelecendo limites e possibilidades para sua ação. Entretanto, para efetivar a proposta de Braudel, o autor se vê na necessidade de ultrapassar os limites de tal obra incorporando as sugestões de Immanuel Wallerstein para a reconstrução do pensamento científico. Nestas, se aponta o desafio de superar o legado científico do liberalismo. Para isso, necessita-se partir das principais forças teóricas que o confrontam.
O autor, portanto, recorrerá a três correntes teóricas em que acredita ter-se cumprido tal missão: as ciências do Estado, a escola dos Annales e o marxismo. Na visão do autor, que corrobora Wallerstein, todas elas têm em comum o fato de se contraporem ao modelo de ciência positivista, que tem suas bases no pensamento universalista-particularista britânico, no qual se advoga, basicamente, que o conhecimento se move do particular ao abstrato e que deve ser compartimentalizado em disciplinas particulares. É nesse sentido que tem-se a separação entre disciplinas nomotéticas (sociologia, economia e ciência política), dedicadas à formulação de leis gerais, e as idiográficas (história e antropologia) dedicadas às particularidades e ao indeterminado. E ainda, a segmentação do conhecimento entre as disciplinas nomotéticas que deu base para a tentativa de estabelecer leis puras da economia, da política e do social, entendidos como os domínios separados e combinados do mercado, Estado e sociedade civil, respectivamente.
Ao autor caberá o detalhamento dessas principais correntes que se contrapõem ao modelo de ciência tradicional. Começando pelas ciências do Estado, sabe-se que estas tiveram seu principal polo de organização na Alemanha e se basearam na obra de Friederich List, cujo trabalho fundamental é Sistema nacional de economia política (1841). Surgem na segunda metade do séc. XIX criticando as pretensões dos liberais em criar uma economia internacional independente do Estado e da política, fundada no cosmopolitismo dos mercados e na paz, o que ignora o fato de que a economia internacional não elimina as guerras, os interesses nacionais e a polarização mundial. Criticaram ainda a economia liberal por sua compreensão limitada da origem da riqueza, centrada nas trocas e em seus desdobramentos, como a divisão do trabalho e as liberdades individuais. Em contraste, enfatizaram o trabalho coletivo, a união, o planejamento e a acumulação cultural, mobilizados pelo Estado, como os fundamentos de uma teoria das forças produtivas capaz de situar a riqueza sob bases realistas.
Entretanto, o autor apresenta as limitações dessas ciências no fato de buscar no Estado o principal instrumento e fonte de contraposição ao liberalismo, partilhando com este o suposto de que a nacionalidade é o marco organizacional por excelência dos seres humanos. Seu fim se deu na segunda década do século XX quando, antes de desaparecerem, se aproximaram das utopias liberais de um mundo pacífico e baseado nos mercados, mas com um Estado atuando em prol disso, visando superar as assimetrias que o mercado espontaneamente provocava. Depois disso, cederam lugar à organização anglo-saxônica do conhecimento.
Resistindo tanto à essa hegemonia intelectual anglo-saxã quanto ao marxismo oficial da III Internacional, a escola dos Annales – surgida em torno da Revue de Synthèse Historique, fundada por Henri Berr em 1900 e depois corporificada nos Annales d’Histoire Économique et Social, criados por Lucien Febvre e Marc Bloch em 1929 – tem seu auge entre 1945 e 1968. Sua cosmovisão ganhou projeção com a pretensão de a França ser uma terceira força entre os Estados Unidos e a União Soviética e com a Conferência de Bandung, em 1955, advogando em favor de uma cultura internacional do não alinhamento. 
Fernando Braudel, nesse período, tem grande destaque com seu conceito de longa duração desenvolvido em sua obra História e ciências sociais (1958). Duração aqui tem o sentido do tempo das estruturas, significando mudança, processo e, portanto, irreversibilidade; além de representar uma dialética dos tempos múltiplos e contraditórios da vida social, que não existem isoladamente, se apresentando de forma conjunta através do tempo das estruturas, das conjunturas e do acontecimento. 
Assim, explica Martins que “… o tempo das estruturas significa o lento desgaste da arquitetura que fundamenta a organização suficientemente fixa entre as realidades e as massas sociais.” Já o tempo das conjunturas seria o movimento das oscilações regulares e periódicas atuando sobre as estruturas, modificando-as e renovando-as, sem alterar a expansão de seus componentes profundos. Por fim, o tempo dos acontecimentos é “… o tempo breve, da crônica, do dia a dia, imediato e anárquico que incide sobre as estruturas e suas oscilações cíclicas.” (p. 24)
Há duas características, portanto, fundamentais na escola dos Annales para estabelecer o confronto com o liberalismo no terreno metodológico, destacadas por Martins: seu movimento de reflexão que parte do geral para o particular; e a integração dos tempos múltiplos da vida social e das diversas dimensões da realidade que esse movimento permite. Assim, critica-se no liberalismo a separação entre o econômico, o político, o social e o histórico, e reconceitua-se o capitalismo a partir da visão de que o econômico e o político constituem dimensões indissociadas do processo de gênese e desenvolvimento desse sistema. 
O autor aponta a queda dos Annales como resultado de sua insuficiente potência teórica ao ponto de levar até as últimas consequências a crítica à estrutura do sistema capitalista. Remete a Wallerstein, ressaltando o fato de que este autor situa a decadência e a crise dos Annales em 1968 devido ao fato de que foram muito mais uma escola de análise de conjuntura, ao renovarem os métodos em história, do que de análise das estruturas, apesar dos conceitos formulados nesse terreno que serviram como ponto de partida de análises posteriores.
Quanto ao marxismo, Martins aponta primeiro a constatação de Wallerstein de ser essa corrente “… a ideologia por excelência das forças antissistêmicas da economia-mundo capitalista, tendente ao universalismo e a fundamentar a transição mundialdo capitalismo para o socialismo.” (p. 25) Apesar da ressalva que Wallerstein faz quanto às respostas sistêmicas que visam despojar o marxismo de seus componentes revolucionários para produzir, segundo Martins, “marxismos de direita e de centro”, o que interessa distinguir é o marxismo enquanto teoria antissistêmica e revolucionária.
Assim, o autor descreve o marxismo a partir das obras de Marx e Engels, ressaltando seu enfoque metodológico que traça uma teoria da produção material da existência humana, a partir de sua relação com a natureza e consigo própria. Destaca-se então sua característica de partir do global para o particular e do abstrato para o concreto, num processo dialético permanente. Nesse sentido, rompe com os nacionalismos metodológicos do liberalismo ao se fundamentar numa perspectiva global e internacionalista para analisar o capitalismo como um conjunto de forças econômicas, tecnológicas, sociais, políticas e ideológicas que partem do domínio do Estado e do mercado mundial para efetivar-se como modo de produção e assim converter-se em uma força planetária que estende o mercado mundial para todos os continentes do globo.
O marxismo se vale de variadas referências para a interpretação da economia mundial capitalista, sendo destacadas como principais por Martins as análises de Karl Marx e Frederich Engels; as teorias do imperialismo de Buckarin, Lenin, Rosa Luxemburgo, Hilferding e Grossman; as teorias do ciclo de Nicolai Kondratiev; a teoria da revolução científico-técnica de Radovan Richta; e as teorias da dependência de Theotonio dos Santos e Ruy Mauro Marini.
Depois de fazer um esboço do método materialista histórico-dialético concebido por Marx e fundamentado mais especialmente nos Grundrisse, Martins dá ênfase no modo como o desenvolvimento do Estado, das relações internacionais de produção e do mercado mundial influem sobre a acumulação de capital, modificando seu funcionamento, mesmo que ainda não construindo uma nova totalidade histórico-social, como se verifica na passagem do feudalismo para o capitalismo ao transformar a força de trabalho em mercadoria.
Nesse sentido, importa a análise básica proposta pelas teorias do imperialismo, já que foram as primeiras a levarem em conta esses novos elementos na análise da economia capitalista mundial sob a perspectiva marxista. Segundo sua ótica, os elementos logo acima citados – o desenvolvimento do Estado etc. - foram necessários para a superação das crises nos países centrais e para a criação de uma nova etapa de acumulação de capital comandada pelo capital financeiro (interpenetração e fusão do capital bancário com o capital industrial). Assim se fez depois que a formação do monopólio nos grandes centros exigiu um mercado mais amplo para os seus produtos, mas que era inviabilizado pela lentidão no aumento das massas salariais. Com a queda das taxas de lucro, a saída encontrada foi a exportação de capital para se realizar como investimento nas nações menos desenvolvidas, e a consequente obtenção de matérias-primas, minerais e produtos alimentícios, dessas nações, capazes de baratear os capitais constante e variável nos grandes centros. Para isso, se deu a repartição e a anexação do mundo entre as grandes potências.
A passagem para a abordagem da Teoria da Dependência por Martins aqui se dá pela limitação das teorias do imperialismo, apontadas pelo autor, ao focar, sobretudo, nos países centrais e ter dificuldade de perceber que o colonialismo, feito por estes, não era algo que os países sob o seu jugo não pudessem se libertar. As teorias da dependência ainda destacam a divisão do trabalho e as relações internacionais como eixos de um sistema de dominação mundial capitalista que estabelece um estado de compromisso entre as classes dominantes dos países centrais e dos países dependentes, e nesse sentido ultrapassam a teoria do imperialismo ao teorizar sobre esse estado e seu dinamismo. Além disso, acabam por se aproximar e antecipar uma teoria do sistema mundial que vem a ser desenvolvida posteriormente.
Martins também menciona outro aporte conceitual (melhor seria dizer categorial) de crucial importância e inédito fornecido pela Teoria da Dependência: a superexploração do trabalho. Esta é resultado das leis de concorrência que incidem sobre as taxas de lucro dos países dependentes, conforme sua anexação na divisão internacional do trabalho, e é condição sine qua non para o estabelecimento da situação de compromisso que permite o funcionamento da economia mundial capitalista. Contudo, a limitação da Teoria da Dependência, segundo Martins, está no fato de não tomar como objeto central a economia-mundo, ainda que se constitua como importante antecedente às teorias do sistema-mundial.
Martins ainda cita as teorias da crise como complementação final ao marxismo na análise da economia capitalista mundial, como forma de desafiar a visão liberal dominante. Elas se dividem, basicamente, em teorias cíclicas e teorias do desmoronamento. As primeiras são representadas da melhor forma por Nicolai Kondratiev com seus ciclos de 48 a 60 anos, divididos em fases A e B, de expansão e recessão. Esses ciclos se compatibilizam com os de menor dimensão, de 7 a 11 anos, descobertos por Marx, Juglar e Rodberus, e os ciclos curtos de 3 a 3,5 anos, descobertos por Kitchin. Já as teorias do desmoronamento partem das considerações de Marx nos Grundrisse e em O Capital que colocam a tendência decrescente da taxa de lucro como a lei mais importante da economia política, influenciando a obra de Grossmann, a respeito das contratendências da taxa de lucro, com destaque para o comércio exterior, o imperialismo e a inovação tecnológica, e a obra de Richta que trata, mais especificamente, da revolução científico-técnica.
Com tudo isso dado, Marxismo, escola dos Annales e ciências do Estado vão servir de suporte para, além de tentar superar os fundamentos metodológicos do liberalismo, construir uma teoria desse período de crise e transição, caracterizado por globalização, capaz de orientar as práticas antissistêmicas. Para isso, Martins buscará suporte na Teoria do sistema-mundo que se configura como próximo enfoque de sua obra.
 
Cap. 5 - Dependência e Desenvolvimento no Moderno Sistema Mundial 
	A visão marxista da dependência, segundo Martins (2011, p. 237), foi desenvolvida através das obras de Theotonio dos Santos, Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra e Orlando Caputo. Na visão desses autores, em geral, a dependência é vista como uma situação condicionante, em que certo grupo de países tem sua economia condicionada pelo desenvolvimento e expansão de outra economia à qual se encontra submetida, limitando o comportamento e ação dos homens pertencentes àqueles países. Tal fato origina a conclusão que a dependência condiciona a estrutura interna de economias nacionais que, por sua vez, redefinem a dependência em função das suas possibilidades estruturais.
A conceitualização da dependência nesses moldes é resultado do esforço analítico metodológico que pretende substituir a teoria do desenvolvimento por uma teoria da dependência. Se antes a dependência era vista, por aquela, como um elemento coercitivo externo que simplesmente influi de alguma forma na conformação das nações, com a inovação que a teoria da dependência traz, a dependência passa a ser elemento analítico explicativo fundamental nas relações centro-periferia e no desenvolvimento condicionado da estrutura política, econômica e social das nações subdesenvolvidas.
Além disso, segundo Martins (2011, p. 237), essa visão rompe com os nacionalismos metodológicos e se propõe reinterpretar o próprio desenvolvimento capitalista, gerando novos conceitos e aportes para a teoria do valor. Tal desenvolvimento não deveria ser compreendido a partir da trajetória de expansão dos países centrais, mas a partir do desenvolvimento da economia mundial, na qual esses países se inserem como parte dela.
 É nesse sentido que a contribuição pioneira de Theotonio dos Santos e Marini, tal como afirma Martins (2011, p. 239), será a deapresentar uma teoria capaz de perceber o dinamismo das relações entre externo e interno, oferecendo uma visão madura da dependência, levando em conta os processos de competição por acumulação de mais-valia através da geração de mais-valia extraordinária, convertida em lucro extraordinário, originada, dentre outros fatores, da superexploração do trabalho (termo cunhado por Marini). Esses processos dependiam, dentre outras coisas, do advento de tecnologias poupadoras de força de trabalho e elevadoras de produtividades, exportadas pelos países desenvolvidos aos dependentes, implicando em uma situação de compromisso entre as classes dominantes dessas respectivas nações.
O resultado mais evidente apontado pela análise clássica da Teoria da Dependência será, portanto, o baixo nível de desenvolvimento do mercado interno, o que impossibilita atender a demanda de consumo das classes populares, mas não impede o desenvolvimento do capitalismo dependente em bases diferenciadas das dos países desenvolvidos, já que voltava sua produção preponderantemente para o mercado externo, mesmo depois do desenvolvimento de suas forças produtivas e da elevação de sua produtividade.
Fica claro então que, para essa teoria, subdesenvolvimento não é, como via o desenvolvimentismo, simples atraso em relação ao desenvolvimento. Desenvolvimento e subdesenvolvimento se conjugam no espaço e no tempo de expansão da economia-mundo. Porém, esta é uma constatação tanto da Teoria da Dependência caracterizada por Martins (2011, p. 231) como weberiana, formulada por Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto, quanto da Teoria da Dependência marxista. No que esta se diferencia, inclui-se a constatação dos limites do desenvolvimento do capitalismo dependente que financiam a importação de meios de produção via exportações de bens primários, elevando a dependência para um novo patamar financeiro e tecnológico.
Ainda segundo a visão marxista da dependência, passado o momento da necessidade de financiamento externo para a obtenção de meios de produção que reproduzisse o capital de maneira ampliada, a expansão da economia mundial desenvolve uma lógica integradora que difunde o desenvolvimento do setor de produção dos meios de produção para as economias dependentes, o que torna desnecessária a dependência econômica, mas impõe uma dependência política (Martins, 2011, p. 252). Tal lógica, entretanto, tem sua razão de ser não na integração física à economia dependente, mas no estabelecimento de um importante sistema nacional de inovação que utilizaria a integração física à economia mundial como um insumo para o desenvolvimento da capacidade interna.
Diante dessa constatação, a teoria clássica da dependência marxista nos fornece fundamental crítica ao desenvolvimento ambicionado pela Cepal via industrialização por substituição de importações. Isso porque demonstra que a incorporação de tecnologias por meio do comércio exterior só criava outro nível de dependência, tecnologicamente mais intensivo, já que não internalizava os fundamentos intangíveis da inovação tecnológica como a qualificação da força de trabalho e o desenvolvimento da cultura e da ciência nos países periféricos. Aqui portanto já emerge preocupação fundamental para o desenvolvimento de nossa temática que é a com a revolução científico-técnica apontada pelos dependentistas marxistas, principalmente Theotonio dos Santos, no momento que emerge, em plena década de 1970. Mais tarde, as ciências sociais convencionam inserir tal revolução no seio do processo chamado globalização.
Com a revolução científico-técnica, altera-se os padrões de acumulação nos países dependentes através da integração dos mercados nacionais aos internacionais, destruindo parte do setor industrial e de bens de capital voltados para o mercado interno desses países, devido à concorrência da exportação de mercadorias dos países centrais. O resultado disso é a construção de uma divisão internacional do trabalho que articula a participação dos países dependentes na produção de partes e componentes de maquinarias, equipamentos e componentes microeletrônicos, combinando-se com restrições macroeconômicas que desvinculam-se da construção de uma infraestrutura científica e tecnológica que estabeleça sinergias com essa base material para desenvolvê-la. (Martins, 2011, p. 252)
Ruy Mauro Marini caracteriza esse padrão como economia de anexação. Nele, cria-se um setor industrial desvinculado do mercado interno, com altas taxas de importação e exportação, cuja competitividade permanece fundada na superexploração do trabalho. Logo, não agrega-se valor por parte do setor manufatureiro, não se compensa a destruição dos segmentos industriais voltados para o mercado interno, nem eleva-se a participação do setor secundário na economia ou melhora-se os seus termos de troca. (Martins, 2011, p. 252-253).
	Aliado à revolução técnico-científico e o fenômeno da globalização, emerge como superestrutura ideológica desses processos o neoliberalismo, o qual Martins (2011) o trata como um dos seus eixos analíticos para atualização da Teoria da Dependência, com o fim de identificar seus impactos na América Latina. Para o autor, o aprofundamento da crise da hegemonia estadunidense nos anos de 1980 configura uma trajetória de crise estrutural da economia-mundo capitalista da qual esse sistema não se desvencilhará mais. Nesse contexto, surge o neoliberalismo como ideologia hegemônica que expõe os países periféricos que se ajustam aos seus marcos estruturais a profundos desequilíbrios macroeconômicos, gerando taxas medíocres de crescimento e crises de legitimidade. (Martins, 2011, p. 254)
Martins sintetiza os efeitos do neoliberalismo na América Latina, ao mesmo tempo que utiliza os conceitos formulados pela Teoria Dependência Marxista nesse novo contexto, a atualizando. Para ele, a América Latina vive um momento crítico que implica um alto nível de dependência financeira devido sua exposição ao neoliberalismo, que tende conjugar déficits no fluxo de capitais com déficits comerciais. O câmbio flutuante, nesse contexto, serve de mecanismo de ajuste às crises. Durante o período expansivo, ao se valorizar pela entrada de capitais, gera diminuição do superávit comercial e tendência para seu déficit, implicando na necessidade de novos ingressos de capitais para financiá-lo. Já na eclosão da crise, com a saída de capitais, o câmbio se desvaloriza gerando saldos comerciais, mas também o aumento do endividamento externo e dos encargos fatoriais de conta corrente pagos em dólar. Sendo os movimentos de capitais mais dinâmicos que o comércio internacional, o câmbio não é suficiente para gerar superávit necessário para aplacar o déficit. Logo, torna-se necessário aprofundar a superexploração do trabalho. (Martins, 2011, p. 255-256)
Entretanto, Martins alerta que a ascensão chinesa e sua projeção no comércio internacional têm matizado os efeitos negativos do neoliberalismo sobre a expansão da América Latina, contribuindo para que os impactos dos movimentos do capital estrangeiro fossem matizados. Faz isso elevando o nível de competição internacional no setor de alta tecnologia, pressionando os preços dos produtos manufaturados para baixo e aumentando a demanda por produtos básicos e matérias-primas estratégicas, incrementando seus preços e agindo, portanto, contra a tendência da deterioração dos termos de troca em desfavor das economias dependentes. Porém, Martins não deixa de alertar que tal fato é provisório e que a economia dependente não pode se confiar nisso permanentemente. Além do que, a elevação dos preços dos produtos primários torna-se fonte de lucro extraordinário das burguesias da região e pode conduzir a um movimento de reprimarização dessas economias, capaz de aprofundar as contradições sociais de nossas formações, coisa, ao que parece, já se aventura e já é alvo de grande discussão, atualmente.
Martins identifica que o neoliberalismo entra em crise a partir da segunda metade dos anos 1990, quando se aprofunda a crise do balanço de pagamentos na AméricaLatina. Com uma conjuntura virada à esquerda, articulada com o fim do crescimento acelerado da economia estadunidense e a ofensiva mundial e regional dos movimentos sociais, desenvolvem-se os movimentos por outra globalização nos fóruns sociais mundiais; entra em cena a revolução bolivariana desde a Venezuela, se estendendo ao Equador, Bolívia, Nicarágua e Honduras através da Alba, que rompe o isolamento cubano; passam à ofensiva os movimentos indígenas e os de protesto contra a vulnerabilidade social e econômica gerada pelo neoliberalismo. (Martins, 2011, p. 265)
Tudo isso, segundo o autor, abre espaço na região para o desenvolvimento, ainda em gestação, das teorias do sistema mundial. É a partir dessas teorias que Martins (2011) promove a atualização da Teoria Marxista da Dependência para o contexto da globalização neoliberal, nos proporcionando novas formas de pensar o desenvolvimento regional, levando em conta os novos fenômenos globais que despontam na atualidade.

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