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1 Medicina de Emergência 13ª ed. Geovana Silveira Choque INTRODUÇÃO Choque → hipóxia celular, tecidual e orgânica • Incapacidade do sistema circulatório de suprir as demandas de O2 → transporte inadequado, aumento da demanda e alteração na taxa de extração de O2 Emergência à vida → efeitos inicialmente reversíveis, mas que podem chegar à falência orgânica, SDMOS e morte Diagnóstico sindrômico → tratamento imediato + investigação etiológica 4 mecanismos → distributivo, cardiogênico, hipovolêmico e obstrutivo (não são exclusivos) Choque séptico é a forma mais comum de choque distributivo em UTI FISIOPATOLOGIA Passos do uso de O2 tecidual → difusão do O2 dos pulmões para o sangue, ligação à hemoglobina, transporte para a periferia pelo DC e difusão para a mitocôndria O2 entra nos pulmões por pressão negativa gerada pela inspiração → O2 alveolar se difunde para o sangue capilar pulmonar • Quantidade de O2 difundida depende da relação V/Q e da FiO2, além da membrana alvéolo-capilar, concentração de HB e sua afinidade pelo O2 → maior parte do O2 é carregado por proteínas plasmáticas e pouco O2 livre no plasma Hemoglobina é o principal carreador → complexo proteico de 4 cadeias polipeptídicas (2 alfas e 2 betas) + um grupo heme (ligação não covalente) • Heme → 1 átomo de Fe reduzido (Fe2+ ou ferroso), onde o O2 se liga • Cada HB carrega 4 O2 → afinidade pelo O2 da HB aumenta conforme ela se satura (carreador ideal por alterar afinidade) • Nos capilares pulmonares a ligação O2 + HB é facilitada e na periferia, a dissociação • Aumento da afinidade → diminuição da temperatura, do PCO2, do 2,3-DPG, aumento do pH e alterações da HB • Diminui a afinidade → diminuição do pH, aumento da PCO2, temperatura e do 2,3-DPG Transporte aos tecidos → depende da quantidade de O2 no sangue e do DC 2 componentes do conteúdo de O2 sanguíneo → quantidade de Hb e sua saturação Queda aguda da Sat ou uma anemia aguda, podem ser compensadas por aumento do DC Depois de extraído, o O2 vai para a mitocôndrias por difusão → pressão parcial de O2 de apensas 1 mmHg já basta para o metabolismo aeróbico normal Distribuição de O2 aos tecidos → depende dos mecanismos de controle da microcirculação local (fluxo total, tempo de trânsito e recrutamento capilar) Fatores autonômicos neurais e metabólicos regulam os esfíncteres arteriolares → aumenta densidade capilar (órgão com pouca reserva capilar sofre mais na hipóxia) O2 na mitocôndria → receptor final de elétrons do metabolismo aeróbico • Mesmo já na mitocôndria, pode ter situação que vai promover má uso do O2 → uso glicolítico anaeróbico da glicose e hiperlactatemia para gerar ATP Se diminui oferta gradual, o uso continua constante por causa da extração periférica → se diminuição progredir, desequilibra a adaptação 2 Medicina de Emergência 13ª ed. Geovana Silveira • Transporte de O2 aos tecidos crítico → inicia a produção anaeróbica de ATP (a partir de 10 ml/kg/min) Determinantes da perfusão tecidual e PA → DC e RVS • DC = FC x VS • VS é determinado pela pré-carga, contratilidade miocárdica e pós-carga • RVS depende do comprimento e diâmetro do vaso e da viscosidade do sangue • Qualquer alteração nesses parâmetros → hipotensão e choque Choque diminui o fornecimento de O2 para a mitocôndria → elas usam 98% do O2 corporal e produzem o ATP necessário para energia • O ATP é gerado por glicólise no citosol e fosforilação oxidativa mitocondrial (maior parte) → primeiro pela transferência de elétrons do ciclo de Krebs para a cadeia de transporte de elétrons pelo NADH e FADH2 • Substrato para a transferência de elétrons ou produção de ATP → glicólise ou B-oxidação de gorduras (ácidos graxos pelo ciclo de Krebs ou succinato pela cadeia de transporte de elétrons) • O choque diminui a oferta de O2 para fosforilação oxidativa para geração de ATP → se continuar a atividade metabólica sem produção de energia suficiente, o ATP diminui e ativa a apoptose • A via glicolítica não consegue suprir a fosforilação por muito tempo • No choque, a diminuição da atividade metabólica, diminui a necessidade energética e gera um estado em que a célula não funciona normal, nem permite queda de ATP para desencadear a apoptose (tipo hibernação) DIAGNÓSTICO Suspeitar de choque em caso de hipoperfusão Avaliar perfusão → PAM, PPC e PPA, debito urinário, nível de consciência, TEC, livedo, cianose de extremidades, lactato sérico, pH e bicabornato, saturação mista de O2 venoso, PCO2 venoso misto, Sat O2 TEC > 2 s + livedo + diminuição da temperatura da pele → prediz baixo índice cardíaco TEC > 3 s → piora da perfusão e pior prognóstico Hipotensão está presente, mas é variável e pode ser leve (principalmente no portador de HAS) → PAS < 90 mmHg ou PAM < 70 mmHg (taquicardia associada) Outros sinais de hipoperfusão → pele fria e úmida, com vasoconstrição e cianose, debito urinário < 0,5 ml/kg/h e alteração do estado mental (torpor, desorientação e confusão) Hiperlactatemia presente (> 1,5 mmol/L) → normal é 1 mmol/L • A produção de lactato retarda e não causa acidose • Quando ATP vira ADP + fosfato, H+ é liberado, quando a demanda de ATP é atendida pela fosforilação, não acumula prótons, porque são usados pela mitocôndria • Na hipóxia → ATP de fontes mitocondriais aumenta a liberação de H+ e causa acidose • O lactato aumenta para evitar o acúmulo de piruvato e fornecer NAD+ para glicólise → logo aumento de lactato coincide com acidose e vira um marcador de presença Diagnóstico do choque pode ainda ser melhorado pelo uso do USG POC → derrame pericárdico, avaliação do tamanho e função dos ventrículos, avaliação da variação respiratória da dimensão da VCI, calculo da integral da velocidade aórtica pela via de saída de VE, exame abdominal e torácico para ver aorta e pneumotórax 3 Medicina de Emergência 13ª ed. Geovana Silveira MECANISMOS DE CHOQUE Hipovolêmico → redução do volume intravascular, da pré-carga (hemorragia ou perda de fluidos) • Hemorrágico → causa mais comum é o trauma contuso ou penetrante, depois HDA varicosa e úlcera péptica • Não hemorrágico → depleção de volume com perda de Na e H2O, de vários sítios anatômicos Cardiogênico → falha na bomba cardíaca (IAM, arritmia, etc.) • Cardiomiopatia → IAM de > 40% de VE, IAM de qualquer tamanho se acompanhado de isquemia intensa e grave por DAC, IAM de VD, exacerbação de ICC em paciente com cardiomiopatia dilatada grave, miocárdio atordoado após PCR, isquemia prolongada ou ECMO, choque séptico ou neurogênico avançados e miocardite • Arrítmica → as taquiarritmias atriais e ventriculares e as bradiarritmias podem gerar hipotensão • Mecânica → insuficiência valvar aórtica ou mitral grave, ruptura papilar ou de cordas tendíneas, dissecção retrograda da aorta descendente, ruptura do septo interventricular, mixomas atriais, ruptura de aneurisma de parede livre ventricular Obstrutivo → causa extracardíaca, muito associado à falência de VD (TEP, tamponamento cardíaco, etc.) • Vascular pulmonar → maioria dos casos é por insuficiência de VD por TEP ou HP, o VD falha por não conseguir vencer a resistência vascular pulmonar alta (pacientes com disfunção de VD e HP preexistente devem evitar sobrecarga de volume, isquemia ou hipóxia, que podem gerar disfunção de VD crônica agudizada e colapsar) • Mecânica → apresentação clinica de choque hipovolêmico, porque seu quadro é de diminuição de pré-carga (diminui retorno venoso ao AD ou enchimento inadequado de VD), por pneumotórax hipertensivo, tamponamento pericárdico, pericardite e cardiomiopatia restritiva Distributivo → vasodilatação sistêmica com queda da RVS (sepse, anafilaxia,etc) • Choque séptico → asepse é a resposta desregulada do hospedeiro á infecção e o choque séptico é a necessidade de vasopressor + lactato > 2 mmol/L, com ressuscitação volêmica adequada, é o tipo mais comum, com mortalidade de 50% • Choque neurogênico → TCE grave, lesão da medula, por interrupção das vias autônomas, alterando tônus vagal e diminuindo RVS • Choque anafilático → pacientes com reação alérgica grave, mediada por IgE, além do choque, há broncoespasmos e aumento da resistência de vias aéreas 4 Medicina de Emergência 13ª ed. Geovana Silveira • Choque por cianeto e monóxido de carbono → disfunção mitocondrial • Choque endócrino → crise addisoniana (insuficiência adrenal por falta de mineralocorticoides), pelo tônus vascular alterado e hipovolemia e na tireotoxicose pode ter insuficiência cardíaca de alto DC, as duas podem levar à disfunção de VE e taquiarritmias Os 3 primeiros são de baixo DC → transporte inadequado de O2 No distributivo altera a extração de O2 → DC inicialmente alto, mas com a depressão miocárdica, reduz A anamnese e exame físico ajudam na etiologia (choque pode ser combinado) TRATAMENTO Suporte hemodinâmico e ventilatório precoces são essenciais → O2 precoce é importante para aumentar oferta aos tecidos e prevenir HP Iniciar enquanto ainda pesquisa etiologia e quando conhecida, tratar imediatamente → controle de sangramento na hemorragia, cateterismo na SCA, trombolítico na TEP, ATB no choque séptico Cateter arterial para monitorar PA e coletar sangue e cateter venoso para ressuscitação volêmica e drogas vasoativas A oximetria de pulso não é confiável na vasoconstrição periférica → avaliar por gasometria VM → em paciente com dispneia severa, hipóxia, acidemia grave e persistente, rebaixamento de nível de consciência, com vantagem de redução da demanda de O2 pelos músculos respiratórios e diminuição da pós-carga (aumenta a pressão intratorácica) Cuidado com a preferência pelo uso de VNI → no choque, se falhar, leva à rápida insuficiência respiratória e PCR Queda abrupta da PA após IOT sugere hipovolemia e diminuição do retorno venoso → uso de mínimas doses de sedativos para evitar nova queda da PA e do débito urinário • Sequencia rápida com etomidato (0,3 mg/kg) ou quetamina (1-2 mg/kg) EV + bloqueador neuromuscular (succinilcolina ou rocurônio) Ressuscitação volêmica → aumenta DC e melhora fluxo sanguíneo microvascular (ringer lactato é primeira escolha) Coloides aumentam incidência de disfunção renal → albumina eficaz em cirróticos Manobra de elevação passiva dos MMII → aumento de > 15% do DC pelo eco prediz resposta positivas a 300-500 ml de cristaloide Limite de pressão venosa central de 8-12 mmHg → evita sobrecarga volêmica (pior prognóstico) Se hipotensao persistente após ressuscitação → vasopressor (junto com a reposição volêmica) Alvo de PAM é de 65 mmHg Noraepinefrina é a primeira escolha → aumento da PAM com pouco efeito na FC e no DC Dopamina → mais associada a arritmias e eventos cardiovasculares e no choque cardiogênico com aumento da mortalidade Epinefrina → mais forte, com efeito B-adrenérgico em dose baixa e A-adrenérgico em dose alta, é de segunda ou terceira linha e deve evitar no choque cardiogênico Pode desenvovler falta de vasopressina nas formas hiercinêmicas do choque distributivo → baixas doses aumentam bem a PA, indicada também como segunda droga no choque séptico , que já em uso de 5 Medicina de Emergência 13ª ed. Geovana Silveira nora, ainda está hipotenso e sem depressão miocárdica, máximo de 0,04 U/min e somente em paciente com DC normal ou alto Dobutamina → ionotrópico de escolha pra aumento de DC, independente de uso de nora, pouco efeito sobre a PA (aumenta um pouco na disfunção miocárdica e diminui na hipovolemia), no paciente com PAS < 80 mmHg, deve usar junto com vasopressor Vasodilatadores → aumenta o DC sem aumentar demanda de O2 miocárdico, porém podem abaixar muito a PA, o uso de nitrato melhora a perfusão microvascular e função celular em pacientes com choque cardiogênico Balão intra-aórtico → reduz pós-carga e aumenta o fluxo coronário, mas não é recomendado de rotina O ECMO pode ser usado no choque cardiogênico reversível e como transplante de ponte para coração A ressuscitação deve restaurar a PA e oferecer condições para metabolismo adequado (correção de hipotensão é pré-requisito nesse) → PAM inicial de 65-70 mmHg é um bom objetivo, mas deve analisar depois pelos parâmetros de perfusão (estado mental, pele, diurese) No paciente oligúrico → analisar efeitos da PA no débito urinário regularmente, a não ser que haja IRA Pode aceitar uma PA <65-70 mmHg se o paciente não tiver alteração neurológica → limitar perda de sangue e coagulopatia, até conter o sangramento Na hemorragia digestiva grave e sem cardiopatia → Hb de 7 a 9 g/dl Saturação de O2 no sangue venoso misto → avaliar equilíbrio entre demanda e oferta • Saturação de O2 venoso central é medido na VCS por cateter venoso central • A ScvO2 é menor que a SvO2, mas em condições graves pode ser maior As mudanças do lactato são mais lentas que as da PA e do débito urinário → diminui ao longo de horas com terapia eficaz • Paciente com > 3 mmol/L na entrada, que reduz 20% em 2h tem menor mortalidade Realizar medidas especificas para cada etiologia → drenagem torácica (pneumotórax), drenagem pericárdica (tamponamento cardíaco), uso de ATB em 1h no choque séptico (aumento de mortalidade de 7,8 por hora de atraso)
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