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Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 1. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA Conceito de jurisdição A jurisdição simboliza a ação de dizer o direito (juris dictio). Mas essa expressão não simboliza a própria concepção do instituto. Jurisdição é um poder- dever projetado na CF/88 e usualmente entregue ao judiciário, para que este aplique a lei ao caso concreto, objetivando solucionar a demanda penal (que não se confunde com lide). Como a autotutela foi banida, em regra, do ordenamento, coube ao Poder Judiciário a missão constitucional de certificar o direito, dirimindo as demandas que lhe são apresentadas. OBS: Segundo Jacinto Coutinho, não temos lide no processo penal. Não temos conflito. O conceito tradicional de lide é inaplicável ao processo penal, já que teremos confluência de interesses, pois a acusação e a defesa almejam o justo provimento jurisdicional em um prazo razoável. Portanto, a ideia de lide como conflito de interesses é incompatível com o papel constitucional do Ministério Público. Conceito de competência É inimaginável que um só órgão resolvesse todos os conflitos num país continental. Segundo Tourinho Filho, competência é o âmbito, legislativamente delimitado, dentro do qual o órgão exerce o seu Poder Jurisdicional. Ou seja, a competência é conceituada como a medida ou delimitação da jurisdição. É uma forma de limitar o poder. A competência, portanto, é a quantidade de poder, conferido por lei, a um juiz ou a um tribunal, especificando o perímetro de sua atividade. Falar de competência é falar de delimitação de poder, pré-orquestrado em lei, e que ambienta o perímetro de atuação do juiz. 2. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Temos três critérios mais importantes de fixação da competência: (a) em razão da matéria; (b) em razão do lugar; (c) em razão da pessoa. 2.1. COMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE (EM RAZÃO DA MATÉRIA) Conceito Tal critério nos entrega qual é a justiça competente para julgar um crime: Justiça Comum ou Justiça Especial. O critério em razão da matéria objetiva identificar qual a Justiça competente e os critérios de especialização, levando em conta a natureza da infração (art. 69, III, CPP). Ex: cabe à Justiça Eleitoral o julgamento dos ilícitos criminais eleitorais. Estrutura a) Justiça Comum a.1) Justiça Comum Estadual: a sua competência é residual, pois lhe cabe julgar o que a Constituição Federal não consignou para as demais justiças. Ou seja, é competente para apreciar, por exclusão, todas as infrações que não sejam da alçada da justiça especializada ou da justiça comum federal. Embora se diga que a competência é residual, fato é que a justiça estadual processa e julga a maioria dos crimes. a.2) Justiça Comum Federal: A competência da justiça federal não é residual, estando integralmente contemplada na Constituição. OBS: Enquadramento. Enquadra-se a competência da Justiça Federal em dois artigos, quais sejam, o art. 108, CF (competência dos TRF’s) e art. 109, CF (competência dos juízes federais de primeiro grau). ADVERTÊNCIA: Não é todo o artigo 109 que trata de competência criminal. Neste sentido, os incisos que tratam de competência criminal são os incisos IV e seguintes. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 b) Justiça Especial O grande exemplo é a Justiça do Trabalho. Porém não tem competência para apreciar matéria penal, portanto não será matéria de estudo. b.1) Justiça Especial Eleitoral: a sua competência se aproxima muito do comportamento do político em ano eleitoral. A Justiça Eleitoral vai julgar as infrações eleitorais, que estão positivadas no Código Eleitoral (anterior à Constituição, mas recepcionado por esta com status de Lei Complementar) e na Lei 9.504/1997. Além dessas, a Justiça Eleitoral vai julgar infrações comuns conexas ou atinentes ao crime eleitoral. Assim, a infração sai da Justiça Comum e vai à Justiça Eleitoral, não interessando se esse crime for federal ou estadual. OBS: Quando a Lava Jato eclodiu existiam crimes eleitorais, inclusive o caixa 2 de campanha e existiam crimes comuns (lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, concussão, peculato etc.). Moro ficou com os crimes comuns federais e os crimes eleitorais ficaram na Justiça Eleitoral. A matéria foi parar no STF e este falou que a Justiça Eleitoral julga crimes eleitorais e crimes comuns conexos, não interessando se esse crime comum é estadual ou federal. Julga tudo na Justiça Eleitoral. Mas essa decisão do Pleno do Supremo foi com eficácia ex nunc, ou seja, a partir deste julgamento. Assim, em resumo, à Justiça Eleitoral cabe julgar as infrações eleitorais e as infrações comuns interligadas por conexão ou continência, pouco importando se estaduais ou federais. (STF – Pleno – Inq 4435 AgR-quarto/DF – Rel. Min. Marco Aurélio – julgado em 14 mar. 2019) OBS: O Código Eleitoral foi recepcionado pela Constituição Federal com status de lei complementar. Infrações de menor potencial ofensivo: Temos no Código Eleitoral infrações de menor potencial ofensivo. Se eu tenho uma infração eleitoral de Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 menor potencial ofensivo, onde ela vai ser julgada? Existem juizados criminais eleitorais criminais? Não. Então a solução da jurisprudência foi que todas elas irão tramitar na Justiça Eleitoral, independentemente se são de menor potencial ofensivo ou não, tendo o Código Eleitoral um rito criminal próprio. Assim, em resumo, não existem Juizados Especiais Criminais Eleitorais. Logo, resta aplicarmos os institutos benéficos da Lei dos Juizados na Justiça Eleitoral, quais sejam: (a) composição civil dos danos; (b) transação penal; (c) suspensão condicional do processo. Ou seja, embora não se aplique a Lei dos Juizados nos crimes eleitorais de menor potencial ofensivo, os institutos benéficos da aludida Lei aplicam-se na justiça Eleitoral, isto é, composição civil dos danos, transação penal e suspensão condicional do processo. b.2) Justiça Especial Militar A Justiça Militar acaba seguindo um pouco a própria percepção que temos do Militar. Ambiente hermeticamente fechado, regramento próprio etc. A JM julga tão somente as infrações definidas nos artigos 9º e 10 do Código Penal Militar. Antes, até bem pouco tempo, a Justiça Militar julga apenas crime militar. Isso hoje está errado, pois quando Temer, antes de sair da presidência, em seu último ano, ele determinou a intervenção do Rio de Janeiro, com a justificativa de combate ao tráfico de drogas e crime organizado. O custo daquilo para o Estado, representou o custo de um ano de toda a Polícia Federal, atuando em todo o Brasil. Essa intervenção trouxe uma reforma no Código Penal Militar, pois os militares não queriam se submeter a isso. Assim, reformaram o Código Penal Militar, trazendo situações especiais onde crimes comuns também serão julgados na Justiça Militar, notadamente nas operações GLO (para garantir a lei e a ordem). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Então desde o último mandato de Temer, a Justiça Militar julga crimes militares e, eventualmente, crimes comuns, dentro dos fatores circunstanciais trazidos na reforma do artigo 9º do Código Penal Militar. Dito isto, cabe à Justiça Militar julgar, tão somente, as infrações definidas nos artigos 9º e 10 do Código Penal Militar. Infrações de menor potencial ofensivo: nós temos crimes militares com pena de até 2 anos, mas não há uma Justiça Especial Penal Militar. Os institutos benéficos da Lei 9.099/95 são aplicados na esfera militar? O artigo 90-A proíbe a aplicação da Lei dos Juizados na esfera Militar. Portanto, NÃO HÁ A APLICAÇÃO SEQUER DOS INSTITUTOS BENÉFICOS, por disposição legal expressa. Dessa forma, a Leidos Juizados Especiais NÃO é aplicada na esfera militar, sem exceções (art. 90-A, Lei 9.099/95). Estrutura A Justiça Militar é bifurcada. O primeiro braço da Justiça Militar é a Justiça Militar Estadual. Justiça Militar Estadual: Ela julga, tão somente, os Policiais Militares e os Bombeiros Militares. Justiça Militar Federal: Lhe cabe julgar os membros das Forças Armadas: Marinha, Exército e Aeronáutica. Mas além desses membros, eventualmente, pode julgar pessoas comuns, se essas pessoas comuns incorrerem num crime militar federal. 2.1.1. Competência pela natureza da infração O legislador pode estabelecer o órgão competente para julgar determinado tipo de crime, em razão da natureza daquela infração. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Visa analisar qual o juízo competente. Em comarcas de apenas um juiz, este, evidentemente, enfeixará nas mãos todas as competências. Será uma competência plena e caberá a um único magistrado dirimir todas as demandas, independentemente da natureza específica do delito. Em comarcas onde diversos magistrados possuem igual competência penal, a solução será dada pela distribuição, sem ter importância a natureza da infração penal. Todavia, em localidades onde existe pluralidade de julgadores, pode haver a divisão do trabalho, em face da especialização pela natureza da infração. A distribuição observará essa competência específica. ADVERTÊNCIA: A previsão pode ser fixada na Lei de Organização Judiciária e, até, na Constituição Federal. Hipóteses Constitucionais PRIMEIRA HIPÓTESE: O art. 74, do CPP confere à lei de organização judiciária o estabelecimento da divisão de trabalho entre vários juízes com igual competência territorial. Essa repartição pode adotar a natureza do delito como critério, ressalvada a competência privativa para os crimes dolosos contra a vida, pois estas infrações penais, necessariamente, serão apreciadas pelo tribunal do júri (art. 5º, XXXVIII, alínea “d”, CF/88). Ou seja, de acordo com o dispositivo constitucional acima elencado, os crimes dolosos contra a vida, por sua natureza, vão à Júri. Então a competência do Júri está fixada na Constituição, definida pelo critério da natureza da infração. OBS: Os artigos 121 a 128 do Código Penal apontam quais os crimes dolosos contra a vida. SEGUNDA HIPÓTESE: De acordo com o art. 98, inciso I, da CF/88, as infrações de menor potencial ofensivo, por sua natureza (menor potencial ofensivo), serão julgadas em um órgão, qual seja, o Juizado Especial Criminal. As Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 infrações de menor potencial ofensivo são (a) os crimes com pena máxima de até 2 anos; e (b) as contravenções penais, pouco importando a quantidade de pena da contravenção (art. 61, da Lei 9.099/95). 2.2. COMPETÊNCIA RATIONE LOCI (EM RAZÃO DO LUGAR) Tal critério visa identificar o juízo territorialmente competente, considerando como parâmetro o local da consumação do delito, o domicílio ou a residência do réu. 2.2.1. Regras 2.2.1.1. PRIMEIRA REGRA: TEORIAS TERRITORIAIS I. Teoria do Resultado Por ela, a competência territorial é fixada pelo local da consumação do crime (art. 70, caput, CPP). A teoria do resultado, no Brasil, é apontada como regra geral. E quando o crime se consuma? Quando todos os elementos do tipo estiverem preenchidos. CONCLUSÃO 1: Ela é a regra geral. CONCLUSÃO 2: O crime está consumado quando são reunidos todos os elementos da sua descrição legal (art. 14, I, CP). II. Teoria da Ação A competência territorial é fixada pelo local do último ato de execução (art. 70, caput, CPP). OBS: Aplicação. A teoria da ação é exceção, mas ela tem aplicação. Por exemplo: é aplicada aos crimes tentados, que são aqueles que não se consumaram por circunstâncias alheias à vontade do agente. Se não há consumação, fixa-se a competência territorial no local da ação. PRIMEIRA APLICAÇÃO: Crimes tentados (art. 14, inciso II, CP). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 SEGUNDA APLICAÇÃO: O STJ vem dizendo, em precedentes contrariando lei federal (art. 70, CPP), que no caso de crime doloso contra a vida, se a morte ocorrer em um local diferente da execução, é melhor realizar o Júri no local da ação e não no local do resultado. Exemplo: sujeito A atirou no sujeito B em Feira de Santana e este morreu no hospital de Salvador. Segundo o CPP, o Júri será realizado em Salvador, pois lá que ocorreu a consumação do crime. Todavia, com os precedentes do STJ, o Júri será realizado em Feira de Santana, pois lá que ocorreu a ação. Assim, em resumo, nos crimes dolosos contra a vida, o crime deve ser julgado no local da ação, pela maior facilidade para a colheita probatória e para melhor responder a sociedade agredida. III. Teoria da Ubiquidade (híbrida) É a teoria do “tanto faz”. Tanto faz o local da ação, quanto o local do resultado. Há apenas uma hipótese da teoria da ubiquidade. OBS: Aplicação. A teoria da ubiquidade é aplicada aos chamados crimes à distância (art. 70, §§ 1º e 2º, CPP). Estes são aqueles que transcendem a fronteira do Brasil, vale dizer, ou a ação nasce no Brasil e o resultado ocorre no estrangeiro, ou a ação nasce no estrangeiro e o resultado ocorre no Brasil. Logo, a competência territorial brasileira será fixada pelo local, no Brasil, em que ocorrer a ação ou o resultado. AULA 26 DE AGOSTO 2.2.1.2. SEGUNDA REGRA: DOMICÍLIO OU RESIDÊNCIA DO RÉU Em que pese a importância da vítima, ela não serve para definição de competência. Nem na Lei Maria da Penha o domicílio da vítima é importante. No Processo Penal, jamais será o domicílio da vítima, sempre do réu. OBS: A segunda regra é subsidiária à primeira. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS: Domicílio da vítima não fixa competência criminal. E se o réu não tiver domicílio ou residência? Aí vem a terceira regra: 2.2.1.3. TERCEIRA REGRA: PREVENÇÃO Juiz prevento é o juiz que se antecipa, que chega primeiro. Ou seja, será competente o juiz que primeiro tomar conhecimento do fato (§ 2º, art. 72, CPP). Em outras palavras, se os dois critério anteriores não solucionarem a definição da competência territorial, será competente o juiz prevento, é dizer, o que primeiro recebe a inicial acusatória dando início ao processo, ou o magistrado que ainda na fase do inquérito, já está tomando medidas cautelares referentes ao futuro processo. A aplicação do critério da prevenção pressupõe juízes igualmente competentes, material e territorialmente. Destaca-se que o critério da prevenção para fixação da competência do juiz, em matéria criminal, é de difícil compatibilização com um dos pilares centrais do sistema acusatório, que é o da necessidade de um juiz imparcial. Parte da doutrina aponta que, em questões penais, o juiz prevento que, por exemplo, tenha deliberado sobre medidas cautelares ou investigativas, antes de deflagrado o processo penal, deveria se tornar impedido, ao invés de competente para julgar a causa. Nessa toada, a Lei nº 13.964/19 incluiu expressamente o juiz das garantias e explicou que o processo penal brasileiro deve ter estrutura acusatória. Assim, o Código expressamente dispõe que o juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências do juiz das garantias ficará impedido de funcionar o processo. Todavia, o juiz das garantias encontra-se com eficácia suspensa. Assim, em suma, juiz prevento é aquele que primeiro pratica um ato do processo (recebimento da inicial acusatória) ou aquele que, no inquérito, adota medidas cautelares inerentes ao futuro do processo (art. 83, CPP). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 ADVERTÊNCIA: Com o advento do juiz das garantias, cabe a este, adotar medidas cautelares preambulares e recebera inicial acusatória (art. 3º, “b”, CPP). Como o juiz das garantias está impedido de julgar a causa, o juiz prevento provavelmente será o juiz vinculado ao juiz das garantias. Questões complementares a) Quando a infração está consumada na divisa entre comarcas ou quando incerto o limite entre elas, a competência territorial será firmada pela prevenção, isto é, o juiz que se antecipar será o competente; b) Nas hipóteses de crime permanente ou continuidade delitiva, com dilação por mais de uma comarca, a competência será fixada pela prevenção; c) Se o réu tem mais de um domicílio ou residência, a competência territorial será fixada pela prevenção; d) Na ação penal privada, mesmo que o querelante saiba onde o crime se consumou, ele pode optar por ajuizar a ação no domicílio ou residência do réu. É, portanto, uma mera faculdade. ADVERTÊNCIA: Todavia, tal prerrogativa é inaplicável na ação privada subsidiária da pública. e) Competência territorial para crimes ocorridos em embarcações ou aeronaves: Conceito de território nacional: o Brasil é composto das fronteiras, do mar territorial (0 a 12 milhas náuticas, contadas na maré baixa) e do espaço aéreo (até a camada atmosférica). Conceito de território nacional por equiparação: compõem-se por embarcações e aeronaves de natureza pública e de bandeira brasileira. Isto é, essas embarcações e aeronaves são considerados territórios brasileiros em qualquer lugar do mundo. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Embarcações e aeronaves de natureza pública e de bandeira estrangeira: Essas embarcações e aeronaves nunca serão consideradas território brasileiro, pelo princípio da reciprocidade. Embarcações e aeronaves de natureza privada e de bandeira brasileira: Elas são consideradas Brasil quando estiverem no território brasileiro e, também, quando estiverem sobrevoando ou navegando alto mar. Embarcações e aeronaves de natureza privada e de bandeira estrangeira: São consideradas território brasileiro quando ingressarem em nosso território. OBS: Regras de competência. SÓ SE APLICAM SE A EMBARCAÇÃO OU AERONAVE ESTIVEREM NO CONCEITO DE TERRITÓRIO BRASILEIRO. I – Viagens nacionais: se o navio ou a aeronave iniciar a viagem e a encerrar em território brasileiro, o juízo competente é o do local onde primeiro a aeronave pousar ou o navio atracar após a ocorrência da infração, mesmo que fora da rota original. II – viagens internacionais: se o navio ou a aeronave vem do estrangeiro para o Brasil ou parte do Brasil em direção ao exterior, a competência será firmada, pressupondo que a infração aconteceu em território brasileiro (de acordo com os critérios delineados acima), no local da chegada, no primeiro caso, ou no da saída, no último. Assim, em suma, a competência territorial brasileira é fixada pelo local de saída, quando estiverem se distanciando do Brasil. Se estiverem se aproximando, a competência será fixada pelo local de chegada. OBS 1: Vale lembrar que as regras só são aplicáveis se a embarcação ou a aeronave estiver no conceito de território brasileiro. OBS 2: Direito de passagem inocente. O Brasil é signatário de tratado internacional, onde é consagrado o direito de passagem inocente, reconhecendo que não vai apurar infrações ocorridas em embarcações transitando na costa Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 brasileira, mas que não atracaram no Brasil, desde que o crime não tenha reflexos em nosso território. Em outras palavras, se uma embarcação estrangeira estiver apenas passando por águas territoriais brasileiras, e venha a ocorrer um crime em seu interior, sem reflexos eternos, ou seja, não atingindo a paz, a segurança e a boa ordem brasileira, mesmo reconhecendo que a infração tenha ocorrido no território nacional, o Brasil não irá julgá-la, em atenção ao direito de passagem inocente (art. 3º, da Lei 8.617/1993). Exemplo: navio estrangeiro que derramou óleo na costa brasileira recentemente. OBS: Há quem defenda também passagem inocente para aeronaves, a exemplo de Tourinho Filho. f) Competência territorial brasileira para crimes ocorridos no estrangeiro: O Código Penal goza de extraterritorialidade, sendo aplicado a infrações consumadas no estrangeiro (art. 7º, CP). Portanto, precisamos identificar qual o órgão no Brasil territorialmente competente. Nestas hipóteses, (a) o juízo competente será o da Capital do Estado onde por último tiver residido o acusado; e (b) caso ele nunca tenha residido no Brasil, será julgado na Capital da República, Brasília (art. 88, CPP). Exemplo: se um indivíduo mata um brasileiro em Paris, e foge para o Brasil, será julgado na capital do Estado onde por último tenha residido em nosso país. E se nunca tiver residido no Brasil, será julgado em Brasília. 2.3. COMPETÊNCIA RATIONE PERSONAE (EM RAZÃO DA PESSOA) OU RATIONE FUNCIONAE (EM RAZÃO DA FUNÇÃO) Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 2.3.1. Conceito Leva em consideração a importância das funções desempenhadas por determinadas pessoas, que serão julgadas originariamente perante tribunal. É o chamado foro por prerrogativa de função. Exemplo: cabe ao STF o julgamento das infrações penais comuns praticadas pelo Presidente da República. Vale dizer, determinadas pessoas, em razão da alta relevância da função que desempenha, têm direito ao julgamento por órgão de maior graduação. Permite-se, assim, enaltecer a função desempenhada, e evitar as pressões indiretas que poderiam ocorrer se as diversas autoridades fossem julgadas pelos juízes de primeiro grau. 2.3.2. Enquadramento a) Supremo Tribunal Federal Poder Executivo: Presidente da República, Vice Presidente da República, os Ministros de Estado, Advogado Geral da União, Presidente do Banco Central e Controlador Geral da União. Poder legislativo: Senadores e Deputados Federais. Poder Judiciário: Os Ministros dos Tribunais Superiores (STF, STJ, TST, TSE e STM). Outras autoridades: Procurador Geral da República, Comandante das Forças Armadas, Membros do Tribunal de Contas da União e Chefes de missão diplomática permanente. AULA 02 DE SETEMBRO b) Superior Tribunal de Justiça Poder Executivo: Somente governadores. Poder Legislativo: Não há. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Poder Judiciário: Membros dos Tribunais Estaduais e membros dos Tribunais Regionais (desembargadores). Outras autoridades: Membros do MPU que atuam perante tribunais e os Conselheiros dos Tribunais de Contas dos Estados e dos Municípios. Estes, pois são comparados a desembargador. c) Tribunais de Justiça Poder Executivo: Prefeitos (art. 29, X, CF). Poder Legislativo: Deputados estaduais. Poder Judiciário: Juízes estaduais de primeiro grau. Outras autoridades: Todos os membros do MP estadual. Do promotor substituto ao Procurador Geral de Justiça. d) Tribunais Regionais Federais Poder Executivo: A CF/88 afirma que quando prefeito pratica um crime, ele é julgado no TJ. Mas o STF editou uma súmula nº 702, dizendo que se o prefeito praticar um crime federal, ele vai ser julgado no Tribunal Regional Federal. Então prefeitos que pratiquem crime federal. Poder Legislativo: Essa matéria foi resolvida pela ex-ministra do STF, Ellen Gracie, disse que se um Deputado Estadual praticar um crime federal, ele será julgado no TRF. Então os deputados estaduais que cometerem crime federal. Não há súmula, mas é matéria consolidada na jurisprudência. Poder Judiciário: Se um juiz estadual praticar um crime federal, será julgado no TJ. Então aqui apenas os juízes federais de primeiro grau, juízes do trabalho e juízes militares da União. Outras autoridades: Membros do MPU que atuam no primeiro grau. 2.3.3. Questões complementares Processo Penal II – Leonardo David – Prof.Nestor Távora – 2020.2 PRIMEIRA REGRA DE INTERPRETAÇÃO: O pleno do STF, com relatoria do Min. Barroso, tentou higienizar o foro por prerrogativa de função. Já que o Congresso Nacional não acabou com o foro, o STF promoveu uma filtragem, alegando que, para gozar de prerrogativa de função, é necessário que o crime seja praticado durante o desempenho da função, e é necessário que o crime diga respeito ao desempenho da função. Ou seja, um requisito temporal e funcional, respectivamente. Sem os dois elementos, não há que se falar em foro por prerrogativa. Se um parlamentar cometia um crime antes da condição de Deputado Federal, por exemplo, após a diplomação, o processo era remetido ao Supremo. Hoje, com o novo entendimento do Supremo, não há mais essa possibilidade. Porém, o STJ tem precedente diametralmente oposto ao do Supremo, não exigindo vínculo com o desempenho da função. Assim, em suma, para o Pleno do STF, o foro por prerrogativa de função exige que o crime seja praticado durante o desempenho da função (requisito temporal), e que diga respeito ao desempenho da função (requisito funcional). ADVERTÊNCIA: O Superior Tribunal de Justiça tem precedente em sentido diametralmente oposto. Imagine que eu sou Deputado Estadual (foro por prerrogativa no TJ), mas na próxima eleição fui diplomado Deputado Federal (foro por prerrogativa no STF). Imagine que o crime que eu pratiquei foi praticado durante a minha função do Deputado Estadual, e diz respeito à função do Deputado Estadual. Mas agora eu sou Deputado Federal. O processo vai ficar aonde? Não há solução concreta para isso. SEGUNDA REGRA DE INTERPRETAÇÃO: Foro por prerrogativa x deslocamento. Um promotor da Bahia tem foro por prerrogativa no TJ-BA. Mas imagine que esse promotor estava em Alagoas e praticou um crime. Será julgado onde? A solução dos Tribunais Superiores é que será julgado no TJ de origem (TJ- Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 BA), desde que cumpra o requisito funcional, de acordo com o entendimento do STF. Assim, autoridades com foro por prerrogativa no Tribunal de Justiça ou no TRF, ao praticarem crime fora do estado ou da região, serão julgadas no tribunal de origem. TERCEIRA REGRA DE INTERPRETAÇÃO: As autoridades com foro por prerrogativa no TJ e no TRF, ao praticarem crime eleitoral, serão julgadas no TRE. ADVERTÊNCIA: O mesmo não ocorre com o STF e o STJ, que julgam crime eleitoral. QUARTA REGRA DE INTERPRETAÇÃO: Cidadão comum. De acordo com o verbete sumular nº 704 do STF, o cidadão comum pode ser julgado diretamente em Tribunal, ao praticar o delito com autoridade que goza de prerrogativa. CONCLUSÃO: Tal atração não ofende direitos ou garantias fundamentais. QUINTA QUESTÃO DE INTERPRETAÇÃO: Foro por prerrogativa x júri. A competência do júri está prevista na CF/88. O foro por prerrogativa das autoridades, também. Assim, se uma dessas autoridades praticar um crime doloso contra a vida, vai para júri ou será julgada no seu tribunal de origem? Segundo a Súmula Vinculante nº 45, as autoridades com foro por prerrogativa estabelecido na CF/88 NÃO VÃO A JÚRI. O mesmo NÃO ocorre com a prerrogativa é fixada apenas na Constituição Estadual. SEXTA REGRA DE INTERPRETAÇÃO: Perpetuação no tempo da prerrogativa. Com a declaração de inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º, do art. 84, do CPP, temos as seguintes soluções: Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 I. Aos crimes, uma vez encerrado o cargo ou o mandato, encerra-se a prerrogativa. ADVERTÊNCIA: Para o STF, a renúncia ao mandato até antes da intimação para apresentar alegações finais, provoca a remessa dos autos ao primeiro grau de jurisdição. II. Às ações de improbidade administrativa, não há foro por prerrogativa em nenhum momento. 3. CONEXÃO E CONTINÊNCIA Conexão e continência são institutos que vão permitir reunir, no mesmo processo, crimes e/ou criminosos que poderiam ser julgados separadamente. Assim, a conexão e a continência estabelecem, em verdade, vínculos de atração, que permitem uma reunião processual de elementos que seriam passíveis de processos distintos, perante órgãos jurisdicionais diversos, para que os julgamentos ocorrem de maneira uniforme e simultânea. Almeja-se a economia de atos processuais, assim como evitar decisões contraditórias. OBS: Não são exatamente um critério de fixação, mas sim de modificação de competência. 3.1. CONEXÃO 3.1.2. Conceito É a interligação entre duas ou mais infrações, levando a que sejam apreciadas perante o mesmo órgão jurisdicional. Assim, infrações conexas são aquelas que estão interligadas, merecendo, portanto, em prol da celeridade do processo e para evitar decisões contraditórias, apreciação em processo único. Não há conexão de crime único. Quais são os elementos de atratividade? Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 3.1.3. Hipóteses a) Conexão intersubjetiva (art. 76, I, CPP). Se é conexão, dois ou mais crimes. Se ela é intersubjetiva, esses crimes foram praticados por duas ou mais pessoas. Então na conexão intersubjetiva, há dois ou mais delitos e dois ou mais sujeitos que contribuíram para o crime. Ou seja, na conexão intersubjetiva existem dois ou mais crimes praticados por duas ou mais pessoas. Elementos de atração: i. Conexão intersubjetiva por simultaneidade ou ocasional: Nesta modalidade, ocorrem várias infrações, praticadas ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, sem prévio ajuste entre os indivíduos. Ou seja, o vínculo entre as infrações se materializa pelo fato delas terem sido praticadas nas mesmas circunstâncias de tempo e de espaço. Por exemplo, torcedores enfurecidos que depredam estádio de futebol, sem estarem previamente acordados. São vários os crimes de dano, que devem ser julgados em conjunto, pois são conexos. ii. Conexão intersubjetiva concursal: Ocorre quando várias pessoas, previamente acordadas, praticam várias infrações, embora diverso o tempo e o lugar. Exemplo: uma gangue que pratica vários delitos em determinada cidade, porém em bairros diversos, para dificultar o trabalho da polícia. São também vários crimes praticados, mas em concurso de agentes, e que devem ser julgados conjuntamente, pois conexos. iii. Conexão intersubjetiva por reciprocidade: Ocorre quando várias infrações são praticadas, por diversas pessoas, umas contra as outras. A reciprocidade na violação de bens jurídicos é que caracterizaria o vínculo. Exemplo: num duelo, desafiante e desafiado acabam sofrendo e provocando lesões corporais recíprocas. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS: O crime de rixa NÃO SERVE DE EXEMPLO para caracterizar a conexão por reciprocidade, pois, para haver conexão, obrigatoriamente devem existir duas ou mais infrações vinculadas. Na rixa, o crime é ÚNICO. b) Conexão objetiva, material, teleológica ou finalista (art. 76, II, CPP) Ocorre quando uma infração é praticada para facilitar ou ocultar outra, ou para conseguir impunidade ou vantagem. Como exemplos, comparsas que mata o outro para ficar com todo o produto do crime; homicida que além da vítima, mata a única testemunha para ficar impune. Então na conexão lógica, o crime é praticado para levar vantagem, para criar impunidade ou para ocultar outra infração. c) Conexão instrumental ou probatória (art. 76, III, CPP) Nela, a prova da existência de um crime é essencial na demonstração da ocorrência de outro delito. Isto é, tem cabimento quando a prova de uma infração ou a prova de elemento do seu tipo penal influir na prova de outra infração. Exemplo: conexão entre o roubo da carga e a receptação. 3.2. CONTINÊNCIA Conceito É o vínculo que une vários infratores a uma única infração, ou a ligação de várias infrações por decorrerem de conduta única.Em outras palavras, a continência pode decorrer: (a) de coautoria relativamente a um único delito, quando teremos cumulação subjetiva; ou (b) de concurso formal de infrações penais atribuídas a um único agente, quando haverá cumulação objetiva. Então na continência prepondera o fato unidade. Seja porque um só crime foi praticado por duas ou mais pessoas, seja porque uma única conduta desaguou em dois ou mais resultados (art. 77, CPP). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Modalidades a) Continência por cumulação subjetiva (art. 77, I, CPP). Nela, um só crime é praticado por duas ou mais pessoas. b) Continência por cumulação objetiva (art. 77, II, CPP) Nela, uma só conduta provoca dois ou mais resultados. CONCLUSÃO: Aqui, estamos diante de concurso formal (arts. 70, 73 e 74, CP). 3.3. FORO PREVALENTE Conceito É o juiz ou o Tribunal competente para julgar todos os elementos (crimes e/ou criminosos) nas hipóteses de conexão e continência. Regras de foro prevalente Quando há conexão ou continência, a tendência é reunião. Então existe lá a atração e eu tendo a reunir perante o mesmo juiz ou tribunal. Mas essa regra de atração nem sempre vai levar à reunião, pois às vezes ela é proibida. Isto é, às vezes reunir tudo em um só processo pode ofender as regras de competência funcional. a) Justiça especial prevalece em detrimento da Justiça Comum Na concorrência entre a Justiça comum e a especializada, esta última prevalecerá. Logo, havendo conexão, por exemplo, entre crime eleitoral e outro comum, ambos serão apreciados perante a justiça especializada eleitoral. A justiça eleitoral julgará as infrações eleitorais e as comuns conexas. OBS: Tal regra não se aplica na Justiça Militar, que julga apenas as infrações definidas nos artigos 9º e 10 do Código Penal Militar. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS: Tal regra é aplicada para a Justiça Eleitoral, que julga infrações eleitorais e infrações comuns interligadas. OBS: Justiça Comum é gênero do qual fazem parte Justiça Comum Estadual e Federal. E se um crime federal é conexo com um crime estadual? Reúne tudo na Justiça Federal, pois esta prevalece, por força da Súmula 122 do STJ. AULA 16 DE SETEMBRO b) Concurso entre júri x demais órgãos da jurisdição comum E se um crime do júri é conexo com outro crime comum? Por exemplo, com uma lesão corporal. Prevalece o júri, ainda que o crime comum seja de menor potencial ofensivo, respeitando-se, nesse caso, a composição civil e transação penal. Se um crime doloso contra a vida for conexo a outro crime comum, ambos serão apreciados pelo Tribunal Popular, pois este é o prevalente. O júri aprecia os crimes dolosos contra a vida e, além deles, os crimes que lhes sejam conexos. Com o advento da Lei nº 11.313/2006, alterando o art. 60, da Lei nº 9.099/95, havendo concorrência entre crime doloso contra a vida e infração de menor potencial ofensivo, ambos irão a júri, devendo-se, contudo, quando a esta última, oportunizar-se a transação penal e a composição civil por danos. CONCLUSÃO: Júri julga os crimes dolosos contra a vida e as infrações comuns interligadas, mesmo que de menor potencial ofensivo. SEGUNDA CONCLUSÃO: Para a infração de menor potencial ofensivo, aplicaremos composição civil e transação penal (art. 60, da Lei 9.099/95). c) Jurisdição de maior hierarquia prevalece sobre a de menor hierarquia. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Imaginemos Matheus praticou um crime junto com deputado federal. Este tem foro por prerrogativa no Supremo e Matheus não. Se eles praticam crimes juntos, devem ser julgados no mesmo processo. Isso significa que os dois serão julgados no STF (Súmula Vinculante n. 704). CONCLUSÃO: O cidadão comum pode ser julgado em tribunal, ao praticar o delito com autoridade que goza da prerrogativa de função. d) Órgãos da mesma justiça e de mesma hierarquia concorrendo Tem um crime de roubo consumado em Salvador, conexo com três receptações consumadas em Feira de Santana. Roubo é crime de competência do juiz estadual de primeiro grau, receptação também. Tem órgãos que pertencem à mesma justiça e mesma hierarquia concorrendo, pois se o roubo consumado em Salvador é conexo com as receptações de Feira, há apenas um processo para julgar tudo. Nesse caso prevalece Salvador, pois nele consumou-se o crime mais grave. OBS: É preciso analisar os crimes de maneira individual, pois se fossem somadas as penas das receptações, daria uma pena maior que a do roubo. E se os dois tiverem a mesma pena máxima? Exemplo: um furto em Salvador conexo com três receptações em Feira. Nesse caso, prevaleceria Feira, pois se os crimes conexos têm a mesma pena máxima, prevalece o juiz que atua no local da consumação do maior número de crimes. Agora se eu tenho um furto simples em Salvador, conexo com uma receptação em Feira? Os crimes têm a mesma gravidade e a mesma quantidade por comarca. Será definido pela prevenção, ou seja, quem primeiro se antecipar. PRIMEIRA SOLUÇÃO: Prevalece o juiz atuante no local da consumação do crime mais grave. SEGUNDA SOLUÇÃO: Se os crimes possuem a mesma gravidade, prevalece o juiz atuante no local da consumação do maior número de crimes. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 TERCEIRA SOLUÇÃO: Se os crimes têm a mesma gravidade e idêntica quantidade por comarca, a prevalência é definida pela prevenção. 4. SEPARAÇÃO DE PROCESSOS Mesmo havendo conexão e continência, eventualmente os processos vão tramitar separados. Seja por imposição legal (art. 79, CPP), seja por conveniência da persecução penal (separação facultativa, art. 80, CPP). A operação lava jato levou a uma separação facultativa, na medida em que era tanto criminoso que não tinha como juntar todos. Então conexão e continência levam a uma tendência de reunir, mas eventualmente não haverá essa reunião. 4.1. Conceito Mesmo havendo conexão ou continência os processos podem tramitar separados, por imposição da lei, ou por conveniência da persecução penal. 4.2. Modalidades Separação obrigatória: É aquela imposta por lei (art. 79, CPP). Separação facultativa: É aquela justificada pela conveniência da persecução penal (art. 80, CPP). 5. PERPETUAÇÃO DA JURISDIÇÃO Eu tenho um roubo em Salvador, conexo com apenas uma receptação em Feira. O promotor vai ofertar apenas uma denúncia em Salvador. Imagine que o juiz em Salvador, instruindo o processo, absolve o réu pelo crime de réu (pelo crime que o tornou prevalente). O que ele fará com o crime conexo? Imagine, ainda, que o juiz de Salvador, na instrução do processo, desclassificou o roubo para um crime menos grave do que a receptação, ou Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 desclassificou o crime de roubo para um crime que ele não tem nem competência para julgar. O que ele fará com a receptação? As regras do jogo não podem ser alteradas depois que o jogo começou. Então ao juiz de Salvador não interessa o que fará com o crime que o tornou prevalente, ele deverá julgar o crime conexo. Isso é o chamado de “perpetuação da jurisdição”. Então uma vez prevalente, o juiz será sempre prevalente. Essa é a regra, mas comporta algumas exceções no tribunal do júri que será trabalhada posteriormente. 5.1. Conceito Assim, perpetuação da jurisdição é aquele instituto que diz que, se o juiz prevalente absolver o réu pelo crime que o tornou prevalente ou desclassificar essa infração, continuará competente para julgar os crimes conexos (art. 81, CPP). PRISÕES E LIBERDADE PROVISÓRIA 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 1.1. Conceito de prisão Tecnicamente, prisão é a restrição à nossa liberdade de locomoção, diante de ordem judicial motivada, de flagrante delito ou de transgressão disciplinarmilitar. E esse ato compromete o seu direito líquido e certo de ir, vir ou ficar (art. 5º, LXI, CF/88). 1.2. Modalidades de prisão a) Prisão pena: é fruto do trânsito em julgado da sentença condenatória. Ela revela a resposta do Estado pelo mal causado pelo crime. b) Prisão sem pena (cautelar ou provisória ou processual): é aquela que antecede o trânsito em julgado da condenação, sendo admitida na investigação ou no processo. OBS: Enquadramento da prisão sem pena. Quais são as prisões sem pena? Prisão em flagrante; (b) prisão preventiva; (c) prisão temporária. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 1.3. Execução provisória da pena É um senso comum no Brasil que a impunidade impera. O que se espera é que a lógica de justiça anda de mãos dadas com o aprisionamento das pessoas de imediato. O que se tentou fazer no Brasil, no ano e 2008, com o STF, foi a edição de duas Súmulas, que o STF rotulou como execução provisória de benefícios, ou seja, permitir que a pessoa que está presa, antes do trânsito em julgado, usufrui- se de benefícios típicos da LEP. Se o sujeito está preso há tanto tempo antes do trânsito em julgado, muito provavelmente a prisão dele é ilegal por excesso de tempo. Então eu não quero que o STF me dê “esmola”. Mas o STF idealizou essa execução provisória de benefícios. Em 2016, o STF colocou a cereja no bolo e nos impôs a própria execução provisória da pena, ou seja, permitir que o sujeito comece a cumprir a pena antes do trânsito em julgado da sentença. Os pressupostos para que isso ocorresse é (a) a condenação do réu deve ser confirmada por um tribunal; e (b) devem estar esgotadas as vias ordinárias de recurso. Mas a CF/88 fala que todos são presumivelmente inocentes. Todavia a imprensa vendeu que não transita em julgado nunca, pois a defesa se vale de tantos recursos, que o processo não avança. E o que o STF esqueceu? O art. 283, do CPP, diz que antes do trânsito em julgado da sentença, só cabe flagrante, preventiva ou temporária. Como justifica a execução provisória que não se encaixa em nenhuma dessas três previsões? A execução provisória não tem lastro legal. Aí o STF voltou à discussão em 2019, reconheceu que o art. 283 é constitucional, e afastou a execução provisória. Qual foi a grande polêmica? Quando o STF afastou a execução provisória, Lula foi libertado. Nós temos uma PEC, que já passou no Senado, faltando passar na Câmara, para regular na CF a execução provisória. O Pacote Anticrime inseriu a execução Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 provisória no art. 492 do CPP, em que se o sujeito é julgado no júri e pega 15 ou mais anos de prisão na sentença, haverá execução provisória em primeiro grau. Em síntese: PRIMEIRO MOMENTO: O STF editou as Súmulas 716 e 717 permitindo que o preso cautelar usufrua de institutos típicos da LEP, o que convencionamos chamar de execução provisória de benefícios. SEGUNDO MOMENTO: Em 2016, o STF julgou o HC 126.292, admitindo a execução provisória da pena, diante dos seguintes requisitos: i. Confirmação da condenação por um Tribunal ou que a condenação emane de um Tribunal; ii. Esgotamento das vias ordinárias, ou seja, da decisão, quando muito, só caberá Recurso Especial ou Extraordinário. Embasamento jurídico para justificar a execução provisória: i. O princípio da presunção de inocência não é absoluto, ou seja, flexibilizaram a presunção de inocência; ii. Os Recurso Especial e Extraordinário não possuem efeito suspensivo. Então eles não têm o condão de paralisar a decisão. TERCEIRO MOMENTO: O STF voltou ao tema no julgamento das ADC’s 43, 44 e 54, abordando a redação do art. 283 do CPP, que indica que antes do trânsito em julgado, só caberá prisão em flagrante, prisão preventiva e prisão temporária. CONCLUSÃO: Como desdobramento, o STF afastou a execução provisória da pena. QUARTO MOMENTO: O Pacote Anticrime introduziu a alínea “e” ao inciso I, do art. 492 do CPP, admitindo a execução provisória na sentença do júri que impõe ao réu 15 ou mais anos de privação da liberdade. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS 1: Foi retirado o efeito suspensivo do recurso de apelação em tal hipótese. OBS 2: O juiz pode deixar de determinar a execução provisória da pena, ao perceber que a situação jurídica pode ser revertida no Tribunal. OBS 3: O relator, no Tribunal do recurso de apelação, pode conceder efeito suspensivo, evitando a execução provisória da pena, desde que: (a) o recurso não seja meramente protelatório; (b) o recurso tenha substrato jurídico para reverter a decisão proferida. 2. PRISÕES EM ESPÉCIE 2.1. PRISÃO EM FLAGRANTE Flagrante é a qualidade de alguma coisa que está acontecendo naquele exato momento. Prisão em flagrante é uma ferramenta positivada no art. 5º, inciso LXI da CF/88, que autoriza a captura da pessoa que é surpreendida delinquindo, que funciona como ferramenta de preservação da sociedade. Com o flagrante, há três finalidades: (a) evitar a fuga; (b) evitar que o crime se consuma; (c) levantar indícios que vão contribuir para a adoção de futuras providências penais, seja o ajuizamento da ação criminal, seja a proposta do acordo de não persecução penal. Em síntese: 2.1.1. Etimologia (origem da palavra): a palavra flagrante deriva de “flagrare”, significando arder ou queimar. Na verdade, o flagrante é qualidade de algo que está acontecendo naquele momento. 2.1.2. Concepção instrumental da prisão em flagrante: é um instituto positivado no art. 5º, inciso LXI, da CF/88, que autoriza a captura daquele que é surpreendido praticando a infração, trazendo, assim, as seguintes finalidades: • Evitar a fuga; • Evitar a consumação do crime; Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 • Levantar indícios, que vão contribuir para a adoção de futuras providências penais. 2.1.3. Natureza jurídica do flagrante PRIMEIRA POSIÇÃO: A doutrina tradicional enquadra o flagrante como prisão cautelar. SEGUNDA POSIÇÃO: Segundo Aury Lopes Jr. e Luiz Flávio Gomes, o flagrante é medida pré-cautelar, tipicamente administrativa. O traço cautelar acontece quando o juiz analisa o auto e delibera. É a posição mais moderna. 2.1.4. Modalidades de flagrante A prisão em flagrante é uma prisão típica. Só posso prender em flagrante nas hipóteses positivadas na lei. a) Flagrante obrigatório ou compulsório: É aquele inerente à atuação das forças policiais (art. 144, CF/88). Ou seja, qualquer seguimento da polícia tem o dever de prender em flagrante, subsistindo tal dever até mesmo no período de folga. OBS: A nossa doutrina vem defendendo que o flagrante obrigatório representa estrito cumprimento do dever legal. b) Flagrante facultativo: É aquele inerente à atuação de qualquer pessoa do povo, funcionando como exercício regular de um direito (art. 301, CPP). c) Flagrante próprio, real, perfeito ou propriamente dito: Quem está em flagrante próprio? São duas situações: c.1) O sujeito que é preso cometendo a infração (art. 302, inciso I, CPP). Esse sujeito está realizando o núcleo do tipo penal no momento que é preso. Está praticando os atos executórios. CONCLUSÃO: O sujeito é capturado desenvolvendo os atos executórios. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 c.2) o agente capturado ao acabar de cometer o delito (art. 302, inciso II, CPP). Ele já concluiu os atos executórios, mas não se livrou do local do crime ou das circunstâncias do fato. CONCLUSÃO: O sujeito já concluiu os atos executórios, mas não se livrou do local do crime ou das circunstâncias do fato. d) Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase-flagrante: “quase- flagrante” é um falso cognato. Dá a ideia de que não houve flagrante, mas essa modalidade é como outra qualquer.Assim, nessa modalidade, o sujeito é perseguido logo após a prática do crime. Havendo êxito, ele será capturado em circunstâncias que façam presumir a responsabilidade penal (art. 302, inciso III, CPP). A palavra- chave, portanto, é a existência de “perseguição”. OBS 1: O conceito de perseguição é apresentado pelo art. 390 do CPP. OBS 2: Tempo da perseguição. Não há na lei prazo de duração da perseguição, que persiste no tempo enquanto houver necessidade (pode ser por horas, dias, semanas e, ainda assim, será prisão em flagrante). OBS 3: Requisito de validade. É necessário que a perseguição seja contínua, dispensando-se o contato visual. Se a perseguição for interrompida, não será mais prisão em flagrante. AULA 23 DE SETEMBRO e) Flagrante presumido, ficto ou assimilado: No flagrante presumido, o agente é preso, logo depois de cometer a infração, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que presumam ser ele o autor do delito (art. 302, IV, CPP). O legislador contou demasiadamente com o fator sorte. No flagrante presumido, o criminoso é encontrado logo após de praticar o delito, mas Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 encontrado com armas, objetos, papéis ou instrumentos que autorizem presumir a responsabilidade penal. É a situação mais delicada de flagrante, pois não raro ocorre a prisão de um inocente. f) Flagrante forjado É aquele realizado para incriminar uma pessoa inocente que não tem desejo de praticar crime nenhum. Então não há domínio cognitivo, essa pessoa não quer delinquir. A pessoa que é presa é vítima do mais absoluto arbítrio. Exemplo: empregador que insere objetos entre os pertences do empregado, acionando a polícia para prendê-lo em flagrante pelo furto, para com isso demiti-lo por justa causa. É uma modalidade ilícita de flagrante, onde o único infrator é o agente forjador, que pratica o crime de denunciação caluniosa, e sendo agente público, também incorre em abuso de autoridade. CONCLUSÃO: A prisão realizada é ilegal, devendo ser relaxada (art. 310, I, CPP). g) Flagrante esperado O flagrante esperado é uma idealização da doutrina: uma atuação da polícia que se antecipa ao criminoso. Então temos o tratamento da atividade pretérita da autoridade policial que antecede o início da execução delitiva, em que a polícia antecipa-se ao criminoso, e, tendo ciência de que a infração ocorrerá, sai na frente, fazendo campana (tocaia), e realizando a prisão quando os atos executórios são deflagrados. Exemplo: sabendo o agente policial, pelas investigações, que o delito vai ocorrer, aguarda no local adequado e, na hora “H”, realiza a prisão em flagrante. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Por que tem de aguardar o primeiro ato executório? Porque antes da execução há a mera preparação do crime e este é impunível. A polícia, em nenhum momento se intrometeu no comportamento dos criminosos. Ela apenas descobriu que o crime ia acontecer e aguardou. Quando o primeiro ato executório foi implementado, ela prendeu. OBS: O flagrante esperado não está na lei. É uma idealização da doutrina. Então se a espera for exitosa, na hora de lavrar o auto de flagrante, vai enquadrar como flagrante próprio. Assim, em síntese, o flagrante esperado ocorre por meio da realização de campana (tocaia), aguardando-se a realização do primeiro ato executório para a implementação da captura. OBS 1: Em nenhum momento, a polícia estimulou a prática do delito. OBS 2: Se a espera for exitosa, no momento da lavratura do auto, vamos enquadrar em uma das hipóteses do art. 302, CPP. h) Flagrante preparado, provocado, delito de ensaio ou delito putativo (imaginário) por obra do agente provocador No flagrante preparado, o agente é induzido ou instigado a cometer o delito, e, neste momento, acaba sendo preso em flagrante. É um artifício onde verdadeira armadilha é maquinada no intuito de prender em flagrante aquele que cede à tentação e acaba praticando a infração. Exemplo: policial disfarçado encomenda a um falsário certidão de nascimento de pessoa fictícia e, no momento da celebração da avença, com a entrega do dinheiro e o recebimento do documento falsificado, realiza a prisão em flagrante. O Estado começou a estimular a prática de delitos, para que pudesse capturar essas pessoas. A matéria foi parar no STF, e este disse que os fins não Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 podem justificar os meios, ou seja, não pode esperar que o Estado induza o delito para capturar o criminoso. De acordo com a Súmula 145 do STF, não se pode estimular a prática de crime, para capturar as pessoas seduzidas, pois os fins não justificam os meios. OBS 1: Em tal hipótese a prisão é ilegal, devendo ser relaxada. OBS 2: O fato praticado pela pessoa seduzida é atípico, pois será enquadrado como crime impossível. OBS 3: Flagrante preparado x tráfico de drogas. Se o traficante já tem a droga consigo ou em estoque ao ser abordado por policial disfarçado de usuário, a prisão é legal, pois a consumação do crime de tráfico é preexistente à provocação. OBS 4: O monitoramento por câmeras ou aparato similar de um estabelecimento comercial, não desnatura o crime de furto e não inviabiliza a concretização do flagrante (Súmula 567 do STJ). i) Flagrante prorrogado (retardado, postergado, diferido, estratégico ou ação controlada) É um flagrante de feição estratégica, pois a autoridade policial tem a faculdade de aguardar, do ponto de vista da investigação criminal, o momento mais adequado para realizar a prisão, ainda que sua atitude implique na postergação da intervenção. Na década de 1990, nós adotamos no Brasil a Lei de Combate e Repressão ao Crime Organizado. Ela foi uma cópia de muitos institutos do direito dos EUA. Um dos institutos foi a possiblidade da polícia monitorar uma facção criminosa, para entender como ela funciona. Então imagine que a polícia está monitorando a facção, podendo ser internamente, com a inserção do agente infiltrado, ou um monitoramento externo, sem filtrar ninguém. Mas há um grande problema, pois quando a polícia está monitorando uma facção criminosa, o art. 301 do CPP diz Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 que quando o policial se depara com a prática do crime, precisa prender imediatamente. Mas uma prisão antecipada pode ser um desastre. Assim, quando a polícia estiver monitorando a facção criminosa, ela pode diferir o flagrante, se isso for estratégico, desde que ela continue monitorando aquela facção criminosa, com o intuito de realizar a prisão no momento mais oportuno para prender o maior número de criminosos, para levantar provas e para enquadrar os sujeitos no crime principal daquela facção. São três situações que cabe esse flagrante: Crime organizado: É necessário que o delegado oficie ao juiz, que ouvindo o Ministério Público, poderá definir os limites da diligência. Tráfico de drogas: É necessário que o juiz delibere, com prévia oitiva do Ministério Público. Além disso, necessário o conhecimento do provável itinerário da droga, assim como dos infratores envolvidos. Lavagem de dinheiro: Da mesma maneira, é necessário prévia autorização do juiz, com a oitiva do Ministério Público. 2.1.5. PROCEDIMENTO 2.1.5.1. Procedimento macro a) Primeiro passo - Captura: simboliza o imediato cerceamento da liberdade. OBS: Uso de algemas. A matéria é regulada na Súmula Vinculante nº 11, no parágrafo único do art. 292, do CPP, e no Decreto 8.858/2016. b) Segundo passo – Condução coercitiva até a autoridade: O sujeito é apresentado ao delegado do local da captura. Inexistindo delegado, o sujeito é apresentado ao delegado da cidade mais próxima. c) Terceiro passo – Formalização da prisão: A formalização da prisão ocorre por meio da lavraturado auto de flagrante (APF). Portanto, teremos a lavratura do auto de flagrante (art. 304, CPP). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 d) Quarto passo – Recolhimento ao cárcere: Se o crime tem pena máxima de até quatro anos, o delegado é legitimado a arbitrar a fiança e o pagamento evita o recolhimento ao cárcere (art. 322, CPP). Fiança é direito. AULA 30 DE SETEMBRO 2.1.5.2. Desdobramento do procedimento Em até 24 horas da prisão – que ocorre com a captura –, o delegado tem as seguintes obrigações a cumprir: PRIMEIRA OBRIGAÇÃO: O delegado deve entregar ao preso a “Nota de Culpa”, como breve declaração informando os motivos e os responsáveis pela prisão, assim como quem são as eventuais testemunhas (art. 306, § 2º, CPP). A CF/88 consagra que toda pessoa que é presa tem o direito de saber os motivos pela qual está sendo presa. Essa informação é passada pela “nota de culpa”, que deve ser entregue em até 24 horas da prisão. SEGUNDA OBRIGAÇÃO: Nas mesmas 24 horas, uma cópia do auto é encaminhada à Defensoria Pública, se o preso não tem advogado (art. 306, § 1º, CPP). TERCEIRA OBRIGAÇÃO: Remeter o auto ao juiz (art. 306, § 1º, CPP). Em 24 horas da prisão, o auto de flagrante tem de chegar na mão do juiz (das garantias). Além de comunicada imediatamente a prisão ao juiz, o MP e à família do preso ou pessoa por ele indicada, o Código estatui ainda que, em 24 horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente (das garantias) o auto de prisão em flagrante. OBS 1: Nas 24 horas subsequentes, será realizada a audiência de custódia (art. 310, caput, CPP). OBS 2: AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 É o ato solene, em que o preso será ouvido pelo juiz na presença do MP e do advogado, para que o juiz possa deliberar sobre a situação prisional. Também se pode conceituar a audiência de custódia como o direito de que a pessoa presa possui de ser conduzida, sem demora, à presença de uma autoridade judicial (magistrado), que, por sua vez, irá analisar se os direitos fundamentais dessa pessoa foram respeitados; se a prisão em flagrante foi legal ou se deve ser relaxada (art. 310, I, do CPP), se a prisão cautelar deve ser decretada (art. 310, II, do CPP) ou se o preso poderá receber a liberdade provisória (art. 310, III, CPP) ou medida cautelar diversa da prisão (art. 319). Hipóteses conferidas ao juiz na audiência de custódia PRIMEIRA HIPÓTESE: Se a prisão for ilegal, deve ser relaxada (art. 310, I, CPP). CONCLUSÃO: O relaxamento caracteriza a libertação incondicional de quem foi ilegalmente preso. OBS: Tem-se entendido que não haverá vício formal se essa comunicação não atender o prazo fixado no art. 306, § 1º, do CPP, constituindo-se o retardo em mera irregularidade, sem o condão de ensejar o relaxamento da segregação cautelar. SEGUNDA HIPÓTESE: A prisão concretizada pode ser legal. Se na audiência de custódia o juiz percebe a legalidade, deve homologar o auto de flagrante, que consiste na chancela do juiz, validando tudo o que ocorreu na delegacia. Diante da homologação do auto de flagrante, é preciso analisar se é necessário manter o sujeito preso. Se for necessário, converte o flagrante em preventiva. Se não for necessário, concede ao preso a liberdade provisória. Assim, homologado o auto, o juiz pode adotar as seguintes medidas: a) Se a prisão for necessária, o flagrante será convertido em preventiva, desde que presentes os requisitos do art. 312, do CPP; Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS 1: A conversão só é admitida se não forem mais adequadas as medidas cautelares distintas da prisão (art. 310, II, CPP). Assim, a segunda hipótese é converter o flagrante em preventiva, desde que presentes os requisitos do art. 312 do CPP e que as medidas cautelares diversas da prisão não sejam mais adequadas. OBS 2: O STJ tem admitido a conversão de ofício, contrariando entendimento do STF do Min. Celso de Mello. Prisão preventiva não pode ser decretada de ofício pelo juiz (art. 311, CPP), mas a conversão do flagrante em preventiva de ofício é admitida pela Quinta e Sexta turma do STJ, e não é admitida pelo STF. b) Se a prisão for desnecessária, caberá ao juiz conceder ao sujeito liberdade provisória, com ou sem o pagamento de fiança (art. 310, III, CPP). 2.1.5.3. Questões complementares envolvendo o flagrante PRIMEIRA QUESTÃO: Infração de menor potencial ofensivo. Nos crimes com pena de até 2 anos e contravenções, o auto de flagrante é substituído pelo TCO, e o sujeito é liberado independente de fiança, desde que seja imediatamente encaminhado ao JECRIM, ou assuma tal compromisso (art. 69, Lei 9.099/95). SEGUNDA QUESTÃO: Crimes de ação privada e de ação pública condicionada. A lavratura do auto depende da prévia manifestação de vontade do legítimo interessado. 2.1.5.4. Crimes permanentes O crime permanente é o crime que está se consumando a todo tempo, enquanto perdurar a permanência. Exemplo: sequestro. No crime permanente a Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 prisão em flagrante é cabível a qualquer tempo, enquanto perdurar a permanência (art. 303, CPP). ADVERTÊNCIA: De acordo com o STF e o STJ, a invasão domiciliar para prender em flagrante exige que existam prévios indícios justificando a invasão. Precedente: STF. RE nº 603.616. 2.2. PRISÃO PREVENTIVA I – É a prisão de natureza cautelar mais ampla, sendo uma eficiente ferramenta de encarceramento durante toda a persecução penal, leia-se, durante a investigação preliminar (inquérito policial e demais procedimentos investigativos) e na fase processual. É cabível durante toda a persecução penal, portanto. Pode ser decretada, ainda, mesmo antes de iniciada a investigação criminal. CONCLUSÃO: A preventiva é cabível no inquérito, no processo e, se for urgente, mesmo antes de deflagrada a investigação. II – É decretada pelo juiz, mediante provocação pelos seguintes legitimados: (a) Ministério Público; (b) Querelante; (c) Delegado; e (d) Assistente de acusação. O assistente de acusação é a vítima do crime ou os seus sucessores, que podem se habilitar no processo para auxiliar o MP. OBS 1: Pela atual redação do art. 311 do CPP, não cabe preventiva de ofício. Juiz não pode decretar prisão preventiva de ofício, portanto. Em 2011 proibiram decretação de ofício na fase do processo, ficando só no inquérito. Com o Pacote Anticrime, a decretação de ofício na fase do inquérito também acabou. Todavia, se o juiz converter o flagrante em preventiva de ofício, o STJ diz que pode. OBS 2: O art. 20 da Lei Maria da Penha autoriza a decretação de ofício no inquérito e no processo. Tal dispositivo ofende o sistema acusatório. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 III – Prisão preventiva não tem prazo de duração, desde que cumpridos os requisitos do art. 312 do CPP. 2.2.1. Requisitos da prisão preventiva Para a decretação da preventiva é fundamental a demonstração de prova da existência do crime, revelando a materialidade, assim como indícios suficientes de autoria ou participação na infração (art. 312, CPP). Aqui não se utiliza o periculum in mora, tampouco o fumus boni iuris, utilizados no processo civil. No processo penal: i. Fumus commissi delicti: consiste na fumaça da prática do delito. Necessário indícios de autoria e de prova da materialidade, ou seja, prova da existência do crime. Então quanto à autoria, necessita-se de meros indícios; quanto à materialidade é preciso de provas, vale dizer, a constatação de que o crime ocorreu. OBS: É o que chamamos de justa causa da preventiva. O fumus commissi delicti, sozinho, não serve para decretar a preventiva. Necessário acoplar ao periculum libertatis, isto é,perigo da liberdade. Se a liberdade da pessoa oferece perigo, essa pessoa precisa ser presa. OBS 1: Ele nos entrega as hipóteses de decretação da preventiva. OBS 2: O pacote anticrime formulou uma intervenção no caput do artigo 312 para dizer que eu preciso de indícios que revelem que o Estado de liberdade da pessoa é um risco. Ou seja, as hipóteses de decretação da preventiva, traduzidas no periculum libertatis, também precisam estar materializadas por meio de lastro indiciário. Necessário indícios de que a liberdade da pessoa é um perigo e, portanto, ela precisa ser presa (art. 312, CPP). Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 OBS 3: De acordo com o § 1º, do art. 315 do CPP, e com o § 2º do art. 312 do CPP, os argumentos que autorizam a preventiva devem ser novos ou contemporâneos. OBS 4: A prisão preventiva não pode ser uma prisão banal. Vale dizer, não se decreta preventiva diante da mera instauração do inquérito; diante da mera oferta ou recebimento da denúncia; ou como uma forma de antecipar o cumprimento de pena. Para sua decretação imprescindível a sua necessidade. 2.2.2. Hipóteses de decretação Quando é que a preventiva pode ser decretada? Há sete hipóteses de decretação: a) Garantia da ordem pública: não se tem um conceito exato do significado da expressão ordem pública, o que tem levado a oscilações doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao seu real significado. Todavia, é a hipótese que mais faz incidir a prisão preventiva. Para Rômulo Moreira e Aury Lopes Jr., o fundamento da garantia da ordem pública não tem respaldo constitucional, por força da sua abstração. Uma segunda posição, capitaneada por Guilherme Nucci, diz que a garantia da ordem pública estará em risco se houver: (a) repercussão social do fato; (b) gravidade concreta do crime (não é a mera quantidade de pena); (c) perigosidade do agente (periculosidade é para inimputável). Esses argumentos servem de maneira individual ou conjugada. Há, ainda, uma terceira posição, capitaneada pelo STJ, que diz que a garantia da ordem pública estará em risco quando o sujeito em liberdade provavelmente vai continuar praticando crimes. b) Garantia da ordem econômica: se eu prendo alguém para garantir a ordem econômica, significa que aquele sujeito em liberdade provavelmente continuará praticando crimes contra a ordem Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 econômica. Todavia, a garantia da ordem econômica é espécie do gênero garantia da ordem pública. Então é um fundamento ocioso, de modo que se ele deixar de existir, não fará falta. c) Garantia da instrução criminal: instrução criminal é a livre produção da prova. Se o sujeito estiver comprometendo a instrução criminal, será preso. Ou seja, impede-se que o agente destrua provas, ameace testemunhas, ou comprometa de qualquer maneira a apuração dos fatos. Deve-se, com isso, imprimir esforço no atendimento ao devido processo legal, que é expressão de garantia, na faceta da justa e livre produção do manancial de provas. d) Garantia de aplicação da lei penal: almeja-se evitar ou coibir a fuga, impedindo o sumiço do autor do fato, que deseja eximir-se de eventual cumprimento da sanção penal. Mas a fuga não se presume, se demonstra. Fuga não pode ser especulativa. OBS 1: A mera situação econômica não é fundamento individual de prisão, na suposição de fuga. OBS 2: A ausência do réu ao interrogatório, por si só, mesmo que injustificada, não autoriza a decretação da preventiva por suposição de fuga. e) Ausência de identificação civil: quem não está identificado civilmente (sem RG, passaporte, CNH), será preso preventivamente, até apresentar o documento ou esclarecer a dúvida quanto à identidade. Mas não é o fato de não ter identificação civil que será necessariamente preso. É preciso haver um fato pretérito (delito). CONCLUSÃO: A prisão persiste até a apresentação do documento ou o esclarecimento da dúvida quanto à identidade. f) Descumprimento de medida protetiva na violência doméstica: A Lei Maria da Penha traz as medidas protetivas de urgência, que são Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 medidas cautelares criadas para blindar a vítima da violência doméstica. OBS: O descumprimento também acarreta responsabilidade penal (art. 24- A, da 11.340/06). g) Descumprimento de medida cautelar do art. 319 do CPP: quando o auto de prisão em flagrante é lavrado, vai para o juiz. Se entender legal, homologa. Se entender necessário, converte em preventiva, a não ser que as medidas cautelares diversas da prisão sejam suficientes. OBS: O juiz poderá adotar as seguintes medidas: i. Substituir a medida por outra; ii. Cumular a medida com outra; iii. Decretar a preventiva. AULA 7 DE OUTUBRO 2.2.3. Crimes que comportam a preventiva Sendo o encarceramento cautelar medida de exceção, o legislador restringiu o cabimento da preventiva a uma gama restrita de delitos. A regra é que, preenchido os pressupostos, a preventiva é cabível aos crimes dolosos mais graves (pena máxima superior a quatro anos), independentemente de ser apenado com reclusão ou detenção (art. 313, I, CPP). CONCLUSÃO 1: Se a pena máxima é de até 4 anos, não cabe preventiva. CONCLUSÃO 2: Ficam de fora os crimes culposos e as contravenções penais, sob pena de abuso de autoridade, de forma peremptória, pois representaria uma desproporcionalidade manifesta a decretação de preventiva em tais infrações. 2.2.3.1. Exceção Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Eventualmente a prisão preventiva pode ser decretada independente da quantidade de pena máxima prevista para o crime. Não se aplica para crime culposo, mas ao crime doloso, o quantitativo da pena máxima, eventualmente, pode ser desconsiderado. Hipóteses: • Reincidência em crime doloso (sentença condenatória já transitada em julgado); • Ausência de identificação civil; • Descumprimento de medida protetiva na violência doméstica; • Descumprimento de medida cautelar do art. 319, do CPP. 2.2.4. Questões complementares 2.2.4.1. Preventiva x excludente de ilicitude Se pela análise dos autos houver indícios de que o sujeito atuou amparado por excludente de ilicitude, a preventiva não será decretada (art. 314, CPP). Não só as excludentes de ilicitude previstas na parte geral do CP impedem o cárcere, mas também, por analogia, as previstas na parte especial e na legislação extravagante. 7 2.2.4.2. Fundamentação do mandado O art. 315, do CPP, impõe fundamentação da decisão (interlocutória) que decreta, substitui por outra medida cautelar ou denega a prisão preventiva. Tal exigência decorre também do princípio constitucional da motivação das decisões judiciais (art. 93, IX, CF). A decisão judicial deve ser motivada, explicitando as razões que justificam o encarceramento. O § 2º do art. 315 do CPP adota técnica similar ao § 1º do art. 489 do CPC, indicando quando a decisão judicial não está motivada. 2.2.4.3. Tempo da preventiva Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Nós não temos, na lei, prazo de duração da preventiva, que persiste no tempo, diante da necessidade, que é medida pela presença das hipóteses de decretação. CONCLUSÃO 1: Se os fundamentos desaparecem, a preventiva será revogada. Se reaparecerem, a preventiva pode ser redecretada (art. 316, CPP). OBS: Direito ao não esquecimento. O parágrafo único do art. 316 do CPP assegura o direito ao não esquecimento. A situação prisional, perenizada no tempo, sem a verificação da manutenção dos requisitos autorizadores, perde a contemporaneidade, exigida pelos § 2º do art. 312 do CPP, como também pode simbolizar a antecipação do cumprimento da própria pena, inadmitida pelo § 2º do art. 313 do CPP. Por conseguinte, deve o juiz, de ofício,revisitar a cárcere, sob pena de tornar ilegal a medida (art. 316, parágrafo único, CPP), robustecendo a transitoriedade da preventiva, característica que lhe é inerente. Assim, a cada 90 dias, o juiz deverá reavaliar o mandado, o que deve ser feito de ofício. Para que o sujeito continue preso, o juiz deverá remotivar a prisão. CONCLUSÃO: A omissão leva à ilegalidade da prisão, que merece relaxamento. 2.2.4.4. Substituição da preventiva por prisão domiciliar Por critérios essencialmente humanitários, a preventiva pode ser substituída por domiciliar, diante das hipóteses do art. 318 do CPP. OBS 1: O art. 318-A do CPP aponta restrições inerentes ao tratamento da mulher. OBS 2: De acordo com o art. 318-B do CPP, a substituição pode ser cumulada com outras medidas cautelares pessoais. 2.3. PRISÃO TEMPORÁRIA (LEI 7.960/89) Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 A temporária é a prisão de natureza cautelar, com prazo preestabelecido de duração, cabível exclusivamente na fase do inquérito policial (ou de investigação preliminar equivalente), objetivando o encarceramento em razão das infrações seletamente indicadas na legislação. É decretada pelo juiz a requerimento do Ministério Público ou por representação do delegado, com prazo, desde que presentes os requisitos do art. 1º, da Lei 7.960/89. OBS: Prisão temporária NUNCA poderá ser decretada de ofício. OBS: O querelante e o assistente de acusação não foram contemplados como legitimados a provocar o juiz. Malgrado a Lei 7.960/89 indique o cabimento apenas durante a tramitação do inquérito, o CPP ampliou o âmbito de incidência da medida cautelar ao disciplinar o seu cabimento durante as investigações, sem restringir-se ao inquérito policial (art. 282, § 2º, CPP) 2.3.1. Hipóteses de prisão temporária Como medida cautelar de segregação da liberdade, é essencial a presença do fumus commissi delicti e do periculum libertatis para que a temporária seja decretada, revelando a necessidade da prisão. Para a imposição da medida, devem ser atendidos os requisitos específicos, a par dos pressupostos gerais regrados no art. 282, do CPP, observando-se o juízo de proporcionalidade a partir da (a) necessidade; (b) adequação. O cabimento da prisão temporária é excepcionalíssimo, pelo que, além desses pressupostos, devem ser preenchidos os requisitos para a sua decretação que, com supedâneo no art. 1º da Lei 7.960/89, é admitida nas seguintes hipóteses: a) Imprescindibilidade para as investigações do inquérito policial; b) Se o sujeito não tem residência fixa ou identificação civil; Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 c) Quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado em um dos crimes graves previstos em lei, quais sejam, aqueles elencados no inciso III, art. 1º, da Lei 7.960/89, bem como os crimes hediondos. OBS: Os crimes que comportam temporária estão listados no art. 1º, inciso III, da Lei 7.960/89, e no art. 1º, da Lei 9.072/90. ADVERTÊNCIA 1: Conjugação de incisos. O fumus commissi delicti é simbolizado pelo inciso III e o periculum libertatis é simbolizado pelo I e/ou II. Mas é necessária a presença dos dois para a decretação da temporária. Assim, conjuga-se os dois: para decretar a temporária, sempre vai ser preciso o inciso III. E o inciso III será somado e/ou ao II. Prisão temporária = inciso III + inciso I e/ou inciso II. 2.3.2. Procedimento PRIMEIRO PASSO: Provocação emanada do MP ou do delegado, já que nunca poderá ser decretada de ofício. SEGUNDO PASSO: A provocação é feita ao juiz que dispõe de 24 horas para deliberar. 2.3.2.1. Questões complementares ao procedimento a) Prazo Crimes comuns: 5 dias com prorrogação por mais 5. A prorrogação pressupõe requerimento do MP ou representação da autoridade policial, devidamente fundamentados, cabendo ao magistrado deliberar quanto à sua admissibilidade. Incabível prorrogação de ofício. Deve o juiz ouvir o MP quando a provocação for feita pela autoridade policial. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Crimes hediondos e assemelhados (tráfico de drogas, terrorismo e tortura): 30 dias prorrogáveis por mais 30. OBS 1: A decretação da temporária e a prorrogação do prazo exigem ordem judicial motivada com prévia oitiva do MP. OBS 2: A temporária se autorevoga pelo decurso do tempo e a libertação do sujeito independe da expedição de alvará de soltura (art. 2º, Lei 7.960/89). OBS 3: No mandado o juiz aponta o termo final da prisão. OBS 4: O dia da prisão já é o primeiro dia do prazo. b) O mandado será expedido em duas vias, sendo que, uma delas fica com o preso, funcionando como nota de culpa. c) Postura do juiz Para fiscalizar o bom andamento da prisão temporária, o juiz pode adotar as seguintes medidas: (i) determinar que o preso lhe seja apresentado; (ii) submeter o preso a exame de corpo de delito; (iii) requisitar informações ao delegado. AULA 14 DE OUTUBRO d) Separação do preso O art. 300 do CPP tem redação similar ao art. 3º da Lei 7.960/89, de forma que o preso cautelar ficará separado do preso definitivo. NÃO SE TRATA DE FACULDADE, É IMPOSIÇÃO. Porém na prática não funciona. OBS: Com o art. 84 da Lei 7.210/84 (LEP), temos entre os presos cautelares a seguinte tripartição: i. Autores de crimes hediondos e assemelhados; ii. Autores de crimes praticados com violência ou grave ameaça contra a pessoa; Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 iii. Autores dos demais crimes e contravenções. PROCEDIMENTOS CRIMINAIS 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 1.1. Enquadramento terminológico O procedimento é uma sequência lógica de atos, concatenados em lei e destinados a uma finalidade. OBS: Não se pode confundir procedimento com processo. O processo é um procedimento em contraditório, ou seja, há uma sequência lógica de atos, necessariamente em contraditório, e enriquecida pela relação jurídica entre os sujeitos processuais (juiz e as partes). Então no processo soma-se duas vertentes: o aspecto objetivo do processo (sequência lógica de atos em contraditório), e aspecto subjetivo (a relação nutrida entre o juiz e as partes). Há diversos outros conceitos. O rito, por sua vez, é a amplitude assumida por um procedimento. Há procedimentos com rito mais célere (sumário ou sumaríssimo) e procedimentos amis amplos, com rito especial. Então rito é a frequência, a amplitude assumida por determinado procedimento criminal. Por fim, a ação é o direito público e subjetivo previsto na Constituição Federal de exigir do Estado-juiz a aplicação da lei ao caso concreto, para a solução da demanda penal. 1.2. Classificação dos procedimentos criminais a) Procedimento comum Ele pode assumir três ritos diferentes: (a) procedimento comum de rito ordinário; (b) procedimento comum de rito sumário; (c) procedimento comum de rito sumaríssimo. Processo Penal II – Leonardo David – Prof. Nestor Távora – 2020.2 Procedimento comum de rito ordinário: é aplicado supletivamente para suprir eventuais lacunas de qualquer outro procedimento criminal. É o “soldado de reserva”. É a grande referência. b) Procedimentos especiais Algo que não é comum, é porque é especial. Mas por que um procedimento criminal é especial? A especialidade do procedimento é definida pela natureza do crime ou pelo órgão jurisdicional perante o qual o procedimento é deflagrado. OBS: Principais hipóteses: • Júri; • Lei de Drogas; • Ações originárias em tribunal; • Crimes de responsabilidade dos funcionários públicos; • Crimes contra a propriedade imaterial que deixam vestígios; • Crimes contra a honra. 1.3. Escolha do rito no procedimento comum a) Rito ordinário Rito ordinário é aplicado
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