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cap_2_(27-50) (1)

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CAPÍTULO 2
HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes 
objetivos de aprendizagem:
  Apresentar as diferenças entre história tradicional e nova história.
  Examinar o tratamento conferido à imagem na historiografi a.
  Identifi car as teorias de análise das imagens.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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29
HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
29
 Capítulo 2 
CONTEXTUALIZAÇÃO
Certamente você deve ter uma noção do que é história, mas você já parou 
para se perguntar como a história é construída? Esta questão é importante 
para repensarmos a noção que temos desta disciplina. Normalmente ouvimos 
que a História é uma ciência que estuda o desenvolvimento, a evolução das 
sociedades humanas, e que tem como objetivo o estudo do passado para a 
compreensão do presente. Estas afi rmações, no entanto, estão ancoradas em 
teorias da história do século XIX, de base positivista, que concebe a história 
como um movimento linear, contínuo e evolutivo. Sob a perspectiva cientifi cista 
do positivismo não existe margem para a subjetividade, na história, tampouco 
noutro tipo de fonte, senão o documento escrito. 
Atualmente, esta noção positivista, que privilegia o documento escrito e 
concebe a história como uma ciência objetiva, não se sustenta. Hoje a história, 
ou melhor, a historiografi a tem sido pensada sob as perspectivas do relativismo 
e do construtivismo. Neste sentido, a história é tratada como um discurso 
fabricado, que se fundamenta nas questões lançadas pelo historiador, e nas 
teorias e fontes utilizadas para responder problemas de pesquisa. Assim, 
quando pensamos a história hoje, devemos considerar as complexas relações 
que envolvem o trabalho do historiador; isto é: o contexto social e cultural em 
que ele está inserido. Em síntese, a questão não está mais em entender o que é 
a história, mas em compreender como as histórias (narrativas historiográfi cas) 
estão sendo construídas. 
Conceber a história como texto abre caminho para pensarmos o processo 
de trabalho do historiador, que se resume na interpretação do passado a 
partir das fontes coletadas e estudadas por ele. O documento não é mais 
visto como testemunho fi el da realidade. Ele não fala por si mesmo. É o 
historiador que constrói uma narrativa verossímil, a partir da confrontação 
de diferentes documentos. O documento, neste sentido, não é mais o lugar 
seguro onde a verdade histórica se esconde, mas sim, um indício cultural do 
passado. A importância de se compreender a história como uma construção 
e de problematizar os documentos históricos, faz parte da crítica à história 
tradicional, a qual privilegia a narrativa factual, as personalidades políticas e os 
documentos ofi ciais. 
É no contexto da crítica à historiografi a tradicional que situaremos os 
estudos da nova história e da história cultural, que passam a tratar a imagem 
como uma fonte de conhecimento. A imagem, na visão da nova história, é um 
documento como outro qualquer, indício cultural do tempo passado, que desafi a 
o pesquisador, ou educador, ao trabalho de interpretação. Este trabalho, no 
entanto, requer decodifi cação, associação e confrontação das imagens com 
outras fontes. Exige leituras, dedicação e sensibilidade por parte do analista. 
A questão não está 
mais em entender o 
que é a história, mas 
em compreender como 
as histórias (narrativas 
historiográfi cas) estão 
sendo construídas. 
A imagem, na visão 
da nova história, é 
um documento como 
outro qualquer, indício 
cultural do tempo 
passado, que desafi a 
o pesquisador, ou 
educador, ao trabalho 
de interpretação.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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Isto torna a leitura de imagem um trabalho extremamente instigante. Veremos, 
neste capítulo, que existem diferentes enfoques de tratamento da imagem: a 
iconografi a, que valoriza os detalhes; os estudos da história social da arte, que 
valorizam as formas de recepção da imagem; as leituras psicanalíticas, que 
destacam os aspectos inconscientes das imagens; e o estruturalismo, que lê 
os elementos visuais como um sistema de signifi cados. 
HISTÓRIA TRADICIONAL E NOVA HISTÓRIA
No século XIX, a história ocupava o lugar de honra entre as ciências 
humanas; não apenas pela erudição dos historiadores, ou pelo fato da 
história ser uma das mais antigas disciplinas dentre suas “irmãs” (sociologia, 
antropologia, linguística, fi losofi a etc), mas, sobretudo, pelo fato do texto 
histórico ter o poder de revelar o passado através de métodos de análise 
dos documentos. Por outro lado, a história tinha a nobre função de narrar a 
trajetória política dos Estados Nacionais modernos. 
A história era, enfi m, o meio legítimo de conhecer o passado. Entre os 
historiadores cientifi cistas do século XIX que mais se destacaram está o 
alemão Leopold Von Ranke, que, imbuido do espírito científi co, desejava 
transformar a história em uma área do conhecimento que mostrasse como 
realmente se desenrolaram os acontecimentos. Ele, juntamente com o fi lósofo 
e linguista Wilhelm Von Humboldt, priorizou a história política para conhecer 
o passado. Segundo Jacques Le Goff, Ranke “empobreceu o pensamento 
histórico, atribuindo excessiva importância à história política e diplomática” 
(1996, p. 90). 
Resumidamente podemos dizer que o historicismo de Humboldt e 
Ranke pensava a história como uma sucessão de acontecimentos no tempo, e 
caberia ao historiador o registro desses acontecimentos, a fi m de se conhecer 
a verdadeira face do passado, ou simplesmente, conhecer como se deram 
realmente as coisas. 
Historicismo:
1. “Conjunto de doutrinas fi losófi cas que buscam fazer da história 
o grande princípio explicativo da conduta, dos valores e de 
todos os elementos (artes, fi losofi a, religião etc.) da cultura 
humana.” (HOUAISS, 2002).
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
2. O seu fundamento é o reconhecimento de que os acontecimentos 
históricos devem ser estudados, não como anteriormente se fazia, 
como ilustrações da moral e da política, mas como fenômenos 
históricos. Na prática, manifestou-se pelo aparecimento da 
história como disciplina universitária independente, no nome e na 
realidade. Na teoria, expressou-se através de duas proposições: 
1) o que aconteceu deve ser explicado em função do momento em 
que aconteceu; 2) para o explicar existe uma ciência específi ca, 
usando processos lógicos, a ciência da história. Nenhuma 
destas proposições era nova, mas nova era a insistência nelas 
colocada, e que levou a exagerar, em termos doutrinais, as duas 
proposições: Da primeira, tirou-se a ideia de que fazer história de 
algo é dar uma explicação sufi ciente, e, os que viam uma ordem 
lógica na ordem cronológica dos acontecimentos consideraram 
a ciência histórica capaz de predizer o futuro. (NADEL apud LE 
GOFF, 1996, p. 88).
A partir da defi nição de Nadel, percebemos o historicismo como uma teoria 
que legitima a história como disciplina científi ca que tem como eixo central a 
noção de progresso histórico.
Leopold von Ranke fazia parte de uma geração infl uenciada pelo 
positivismo, que combatia a história moralizante e idealista. Ele estava, neste 
sentido, imbuído da ideia de um fazer historiográfi co científi co, comprometido 
com um método que valorizava o documento, a fi m de recriar, verdadeiramente, 
o acontecido. Daí o grande interesse que os historiadores cientifi cistas nutriam 
pelos documentos escritos ofi ciais, considerados as únicas fontes válidas para 
recriar os fatos passados. Vejamos o que Edward Carr diz sobre a relação 
quase sagrada entre os historiadores oitocentistas e seus documentos.
O fetichismo dos fatos do século XIX era completado e 
justifi cado por um fetichismo de documentos. Os documentos 
eram sacrário do templo dos fatos. O historiador respeitoso 
aproximava-se deles de cabeça inclinada e deles falava em 
tom reverente. Se está nos documentos é porqueé verdade. 
(2006, p. 52-53). 
Por sua vez, são justamente os documentos ofi ciais (decretos, tratados, 
correspondências, memorandos, etc) que serviram como principais fontes 
para a construção da história tradicional da nação. Este tipo de história é 
legitimada pelo discurso positivista, que enfatiza o progresso dos estados 
nacionais modernos. A história nacional, que nasceu com o próprio Estado 
Nacional, prestigiou a narrativa da evolução histórica da nação. Entre 
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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os personagens deste tipo de história constam especialmente os povos 
primitivos (através de suas heranças culturais) e os heróis nacionais 
– aqueles que teriam dedicado suas próprias vidas à construção e ao 
desenvolvimento da nação. A história nacional ou tradicional nasceu, 
assim, no contexto de consolidação do Estado Nacional moderno, quando 
se buscou enaltecer certos valores políticos e culturais que interessavam 
às classes sociais dominantes. De modo didático, Peter Burke (1992) 
caracteriza a história nacional tradicional a partir de seis pontos: 
1. Ênfase ao modelo de escrita que privilegia a história política estatal.
2. Escrita baseada na narrativa dos acontecimentos; feita pelo encadeamento 
de fatos históricos.
3. Visão “de cima”, ou seja, privilegia o “feito dos grandes homens, estadistas, 
generais, ou ocasionalmente, eclesiásticos” (BURKE, 1992, p.12).
4. Fundamentação em documentos ofi ciais.
5. Valorização das ações dos grandes homens.
6. Objetividade, ou seja, busca apresentar o que realmente aconteceu. 
 
Por outro lado, a nova história deve ser compreendida como um conjunto 
historiográfi co heterogêneo, que tem em comum os paradigmas historiográfi cos 
que se opõem à história tradicional. Assim, não devemos compreender a nova 
história como um movimento fi losófi co ou político fechado e articulado, mas 
sim como uma reação generalizada ao historicismo. Peter Burke mostra que a 
expressão “nova história” surgiu em 1912, no título do livro do historiador norte-
americano James Robinson (The New History), e tinha como objetivo construir 
uma história utilizando diferentes fontes. (A reação à história rankeana também 
apareceu na Alemanha, em 1900, com Karl Lamprech; na frança, na década 
de 1920, com a Escola dos Annales.; na Inglaterra, nos anos 1930, com Lewis 
Namier). Porém, foi a partir da década de 1970 que houve uma reação mundial 
contra o modelo de história tradicional. 
Para cada uma das seis características da história tradicional apontadas 
anteriormente, Peter Burke apresenta seis contrapontos, que dão a ver a 
amplitude do movimento historiográfi co que estamos chamando de nova 
história. Vejamos as principais características da nova história: 
1. Coloca ênfase na noção de cultura, entendida como um sistema de 
representações que age sobre o real.
A nova história deve 
ser compreendida 
como um conjunto 
historiográfi co 
heterogêneo, que 
tem em comum 
os paradigmas 
historiográfi cos que 
se opõem à história 
tradicional.
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
2. Está centrada na análise do contexto (estrutura) e não em algum 
acontecimento isolado; e nas mudanças que se realizam a longo prazo. 
Está presente a noção de diferentes temporalidades históricas.
3. A história é vista “de baixo”. Problematiza a cultura popular e o cotidiano 
na história.
4. Utiliza diferentes fontes históricas, como os artefatos visuais e os 
depoimentos orais.
5. Preocupa-se com os movimentos coletivos.
6. A história é vista como uma construção discursiva. 
Não pretendo me deter em cada um dos pontos apresentados, mas 
simplesmente mostrar como podem ser diferentes as vertentes historiográfi cas, 
que estamos denominando de nova história. Fazem parte da nova história: a 
história econômica, a história das mentalidades, a micro-história, história das 
mulheres, história da infância e história do meio ambiente. 
Para se aprofundar nas características da Nova História 
indicadas anteriormente, sugiro a leitura do seguinte artigo:
BURKE, Peter. Abertura: a nova história, seu passado e seu futuro. 
In: BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas perspectivas. 
São Paulo: Ed. da UNESP, 1992. p. 7-37. 
Esta breve apresentação da nova história nos serve, todavia, para 
percebermos o cenário geral de difusão do uso das imagens como indícios 
históricos. A partir do que foi exposto, podemos dizer que as imagens 
começaram a ser tratadas como fontes históricas no processo de renovação 
da escrita da história, que inclui o questionamento da própria noção de 
documento. Contudo, apesar da renovação historiográfi ca ter vindo com força 
nas décadas de 1970 e 1980, veremos que, desde o começo do século XX, 
a história cultural propunha novas formas de escrever a história, a partir da 
leitura de imagens. 
As imagens 
começaram a ser 
tratadas como 
fontes históricas 
no processo de 
renovação da escrita 
da história, que inclui 
o questionamento 
da própria noção de 
documento.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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A HISTÓRIA CULTURAL E O ESTUDO DA IMAGEM
Uma das obras precursoras da história cultural é “Outono da Idade 
Média”, do historiador Johan Huizinga (1872-1945). Além de ser um marco 
para a história cultural, o livro também se apresenta como um dos precursores 
no tratamento da imagem como fonte histórica. Segundo Peter Burke, “a 
prosa [do livro] é sensual, atenta a sons, como o dos sinos e tambores, e 
às imagens visuais” (2005, p. 20). Huizinga utilizou, por exemplo, quadros 
do pintor holandês Jan van Eyck para compor o clima cultural do período 
do renascimento. Da mesma maneira, Jakob Burckhardt (1818-1897), antes 
mesmo de Huizinga, utilizou obras de arte para compor o ambiente cultural 
renascentista. Em “A cultura do renascimento na Itália” (1860), Burckhardt 
procurou pensar a sociedade, que inclui as relações políticas, em termos 
culturais, numa articulação profícua entre arte e cultura. 
É importante notar que, em ambos os livros, a obra de arte é dessacralizada, 
ou seja, ela deixa de ser vista em sua individualidade, ou como resultado da 
genialidade do artista, para ser tratada como um indício cultural do tempo. Aliás, 
este é um dos grandes méritos dos estudos culturais, que consideram a obra de 
arte como uma imagem elaborada a partir de sistema de valores socialmente 
constituídos. Neste sentido, a obra de Burckhardt é uma das precursoras dos 
estudos culturais da imagem, justamente por considerar as imagens como 
objetos “através dos quais é possível ler as estruturas de pensamento e 
representação de uma época”. (BURKE, 2004, p.13). 
A história cultural teve, assim, decisiva infl uência nos estudos históricos 
sobre imagem, pois ampliou a noção de fonte histórica ao incorporar a 
linguagem visual no rol de representações analisadas pelo historiador. Isto 
equivale a considerar a imagem como indício cultural de um período histórico. 
O historiador passa a contar, então, com mais um conjunto de fontes para ler 
o passado. Para tal, as fontes visuais devem ser tratadas com desconfi ança e 
estranhamento pelo historiador. Elas não devem ser vistas como uma simples 
ilustração do passado (por mais realistas que sejam), pois a imagem é uma 
composição, e como tal mescla elementos concretos e imaginários. Ou seja, as 
representações visuais integram objetos concretos, que estão explícitos, mas 
também concepções mentais implícitas. Ao leitor das imagens cabe, então, 
interpretar os diferentes aspectos das imagens, a fi m de tornar compreensíveis 
ideias (ou ideologia) presentes na composição. 
Sabemos, no entanto, que as imagens vêm servindo para os mais 
diferentes usos. Enquanto documentos “ilustrativos”, elas serviram para o 
estudo da história da vestimenta, das mobílias e dos espaços urbanos. Os 
cenógrafos, arquitetos e restauradores, por exemplo, utilizam as pinturas 
e as fotografi as para recompor a forma das fachadas de prédios antigos. 
Ahistória cultural 
teve, assim, decisiva 
infl uência nos estudos 
históricos sobre 
imagem, pois ampliou 
a noção de fonte 
histórica ao incorporar 
a linguagem visual no 
rol de representações 
analisadas pelo 
historiador.
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
35
 Capítulo 2 
Neste sentido, a imagem tem simplesmente valor de evidência, por mostrar a 
aparência verdadeira de determinados objetos que não existem mais. Para este 
tipo de trabalho a fotografi a é um documento perfeito. Neste caso, o caráter 
subjetivo da imagem não tem importância, e sim os elementos concretos que 
aparecem na representação.
Considerar a imagem como uma cópia do real é acreditar que ela seja uma 
janela para o mundo, tal como ele era, porém, como apontamos anteriormente, 
devemos tomar cuidado com esta concepção e desconfi ar das leituras que 
consideram a imagem espelhos visuais do passado – quer dizer, refl exo exato 
do acontecimento. A imagem deve ser considerada, antes de tudo, como 
resultado de uma composição que, por sua vez, sofreu as infl uências do 
contexto cultural em que foi gestada.
Nem a imagem que pretendeu ser a mais fi el das cópias de 
uma realidade qualquer jamais o será, assim como acontece 
com qualquer interpretação historiográfi ca. Há sempre a 
arbitrariedade, a parcialidade e as escolhas do observador 
e do historiador, o que garante, sempre, olhares e versões 
diferentes sobre um mesmo objeto. (PAIVA, 2006, p. 55). 
O historiador Eduardo França Paiva compara o trabalho do produtor de 
imagens (seja um artista ou técnico) com o trabalho do historiador. Ambos, 
o artista e o historiador, não retratam a realidade tal qual ela é, mas sim um 
fragmento do real, visto sob determinado ponto de vista (que inclui a formação 
escolar e a experiência de vida). Assim, a pintura, tal qual o texto histórico, não 
passa de uma construção específi ca, que é resultado de escolhas pessoais, 
mas também das circunstâncias sócioculturais que cercaram seu autor. 
Portanto, a relação entre história cultural e imagem não pode ser 
compreendida sem considerarmos a noção de representação e de imaginário, 
uma vez que a imagem envolve tanto elementos concretos quanto simbólicos. 
Neste sentido, a imagem apresenta-se como uma fonte de estudo valiosa para 
o historiador, pois é um artefato que permite analisar aspectos ideológicos, 
sociais, econômicos e políticos da época em que foi construída. 
A relação entre 
história cultural e 
imagem não pode ser 
compreendida sem 
considerarmos a noção 
de representação e de 
imaginário, uma vez 
que a imagem envolve 
tanto elementos 
concretos quanto 
simbólicos.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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Atividade de Estudos: 
A partir daquilo que estudamos nesta seção, responda a seguinte 
questão:
1) Em que sentido o estudo da imagem contribui para a História 
Cultural? 
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ICONOGRAFIA: NOTAS E COMENTÁRIOS
A imagem importa ao historiador na medida em que é considerada uma 
fi guração prenhe de memória. Isto é: a imagem é tida como uma representação 
que incorpora fi guras carregadas de sentidos historicamente construídos. É 
neste sentido que a iconografi a é um método importante para a interpretação 
de imagens e compreensão do passado. 
Iconografi a: “Estudo das representações fi guradas; repertório 
dessas representações. Estudo descritivo da representação visual 
de símbolos e imagens, tal como se apresentam nos quadros, 
gravuras, estampas, medalhas, efígies, retratos, estátuas e 
monumentos de qualquer espécie, sem levar em conta o valor 
estético que possam ter”. (HOUAISS, 2002). 
37
HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
37
 Capítulo 2 
Ler o passado através dos elementos simbólicos da imagem é um 
exercício que remonta à década de 1930, quando houve uma reação contra 
as leituras tradicionais da história da arte. De maneira geral, a história da arte 
considerava apenas os seus aspectos estéticos, deixando de lado a análise 
do seu conteúdo. Por outro lado, segundo Peter Burke (2004, p. 44), houve a 
reação também àqueles que consideravam a pintura uma cópia da realidade. 
A principal característica da iconografi a é a ideia de leitura de imagem. Isto 
quer dizer que a imagem, assim como o texto, deve ser interpretada em seus 
componentes visíveis, como também em seu aspecto subjetivo. 
Aby Warburg (1866-1929) e Erwin Panofsky (1890-1948) estão entre 
os principais intelectuais difusores da iconografi a, que tinham como foco de 
estudo as formas simbólicas nas imagens. Por sua vez, do estudo iconográfi co 
criado por Warburg, Panofsky criou seu próprio método, que foi publicado 
no livro: Studies in Iconology (1939). Este método consiste basicamente na 
leitura da imagem em três etapas: 1ª – pré-iconográfi ca; 2ª – iconográfi ca; 
3ª – iconológica. A primeira etapa consiste na descrição e identifi cação 
dos elementos visíveis em uma imagem; é a mais simples e superfi cial. Na 
segunda etapa deve-se levar em conta os signifi cados convencionais da 
imagem, ou seja, o reconhecimento dos elementos como integrantes de 
determinado evento histórico – para isso o leitor deve ser uma pessoa erudita, 
deve conhecer os textos clássicos de literatura e história. Por fi m, a iconologia 
consiste em estudar as características intrínsecas da imagem. “Panofsky 
insistia na ideia de que imagens são parte de toda uma cultura e não podem 
ser compreendidas sem um conhecimento daquela cultura”. Assim, “para 
interpretar a mensagem, é necessário familiarizar-se com os códigos culturais” 
(BURKE, 2004, p. 46). 
Portanto, a descrição de uma imagem, segundo Panofsky, nos coloca 
no nível da análise iconográfi ca da imagem: a etapa inicial de uma leitura 
imagética. Para o mesmo autor, esta descrição (análise superfi cial ou 
intuitiva) deve ser seguida por uma análise mais aprofundada, a iconológica, 
que pretende encontrar a “essência” da imagem ou reconstituir o “espírito 
de uma época”. Podemos considerar, assim, que a análise simbólica, ou 
interpretativa, tem como proposta inscrever a imagem em um contexto mais 
amplo, relacionando-a a outros documentos que tenham sido produzidos 
no mesmo período. 
A iconologia, por sua vez, ganhou outros sentidos ao longo do tempo. “Para 
Gombrich, por exemplo, o termo refere-se à reconstrução de um programa 
pictórico [...]”. (BURKE, 2004, p.46). Portanto, Gombrich contestou a função 
única da imagem como refl exo do “espírito da época”, pensando a interpretação 
da imagem em uma relação íntima com valores subjetivos de quem a analisa. 
Neste sentido, a leitura de uma imagem depende dos conhecimentos do 
A análise simbólica, 
ou interpretativa, 
tem como proposta 
inscrever a imagem 
em um contexto mais 
amplo, relacionando-a 
a outros documentos 
que tenham sido 
produzidos no
mesmo período.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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intérprete sobre determinado período histórico e da “escola pictórica” a que 
pertence a imagem. A leitura da imagem resulta tanto da erudição quanto das 
questões levantadas pelo estudioso. Em outras palavras, a imagem não fala 
por si, é preciso estudá-la, entendendo as condições específi cas e o contexto 
histórico em que foi produzida. Segundo o holandês Eddy de Jongh, “iconologia 
é uma tentativa de explicar representações no seu contexto histórico, em 
relação aoutros fenômenos culturais” (Ibid). Aproximamos-nos da imagem, 
enquanto fonte histórica particular, não menos ou mais importante que outro 
documento escrito. 
Panofsky e Gombrich, por sua vez, são herdeiros da “Escola de Warburg” 
que, na década de 1920, dinamizou os debates em torno da interpretação de 
imagens. A iconografi a (ou o estudo das representações imagéticas do grupo 
ligado a Aby Warbug) deu um novo status à obra de arte e, por sua vez, à 
própria noção de imagem, que passou a ser percebida como documento 
suscetível de uma análise sociocultural. A imagem ultrapassou, assim, a 
fronteira da história da arte, dos estilos artísticos, e passou a ser “testemunho” 
de certos ideais e práticas do tempo passado. 
Warburg chama atenção para os elementos internos da imagem artística. 
Fala da necessidade de uma “descrição densa” (que se assemelha à descrição 
que os antropólogos fazem das culturas primitivas) e chama a atenção para a 
análise dos detalhes em uma pintura. Daí a importância dos elementos que 
compõem a imagem, pois são potencialmente transmissores de memórias e 
sensibilidades. Por que memórias? Porque, de acordo com Warburg, cada 
imagem evoca outras imagens ou representações anteriores. Assim, a imagem 
– da mesma maneira que um texto – é composta de outras referências, não 
em forma de palavras, mas de elementos gráfi cos. 
Segundo Peter Burke, a história cultural das imagens desenvolveu-
se a partir dos estudos de Warburg, estudioso que se dedicou à análise 
das sobrevivências de elementos visuais em determinadas representações 
pictóricas. “Warburg interessou-se, em particular, pelos elementos da tradição, 
que chamou de esquemas ou fórmulas, visuais ou verbais, que persistiam com 
o passar dos séculos, embora seus usos e aplicações variassem”. (BURKE, 
2000, p. 239-240). Daí a importância das imagens para a história cultural, uma 
vez que, através de uma interpretação das mesmas, é possível “a identifi cação 
de estereótipos, fórmulas, lugares-comuns e temas recorrentes em textos, 
imagens e apresentações e o estudo de sua transformação, se tornaram parte 
importante da história cultural [...]”. (Ibid).
Se o método iconográfi co de Panofsky é criticado por considerar a existência 
de uma unidade cultural de uma época – na esteira do pensamento sobre “espírito 
do tempo” (o Zeitgeist) de Hegel - Warburg, por outro lado, possibilita pensar as 
39
HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
39
 Capítulo 2 
ambiguidades das imagens, o que ele percebeu em suas pesquisas sobre o 
período renascentista. De acordo com Warburg, uma imagem é composta de 
elementos antigos e novos. A imagem é, pois, uma fonte histórica híbrida, ou 
seja, ela mescla diferentes elementos simbólicos. O Nascimento da Vênus, de 
Sandro Botticelli, que foi analisado na tese de doutoramento de Warburg, por 
exemplo, é composto de símbolos da antiguidade, reelaborados a partir dos 
problemas específi cos do tempo em que o quadro foi produzido. A iconografi a 
de Warburg analisa a obra de arte como um verdadeiro testemunho histórico, 
mais que o resultado de um estilo estético preciso. De maneira geral, este 
estudioso concebe a imagem como um meio de acesso a ideias e sentimentos 
de uma época. 
Portanto, um estudo sobre a iconografi a dá a ver que as imagens não 
revelam o mundo, muito menos “valem por mil palavras”. Para que uma 
imagem “diga” algo é necessário que ela passe por um processo de análise, 
de leitura, em que sejam investigados os meios de produção e o contexto em 
que foi produzida. 
A Última Ceia (1495-8), de Leonardo da Vinci, por exemplo, é um 
quadro que trata de um tema da antiguidade, a partir do olhar humanista do 
renascimento. Além da simetria e da perspectiva (profundidade e volume), 
características da pintura renascentista, os personagens comunicam toda 
sua humanidade através de gestos realistas que denotam emoções. Partindo 
de uma análise iconográfi ca, podemos dizer que a pintura trata de uma 
cena da história bíblica, onde estão reunidos Cristo e seus apóstolos, antes 
da crucifi cação. O aspecto de tensão da Santa Ceia de Leonardo está na 
relação entre a agitação dos apóstolos e a serenidade de Cristo, após este ter 
anunciado que havia um traidor entre eles.
Figura 2 - A Última Ceia, Leonardo da Vinci
Fonte: Disponível em: <http://www.legal.adv.br/img/
shots/ceia.jpg>. Acesso em: 10 jul. 2009. 
Para que uma 
imagem “diga” algo 
é necessário que 
ela passe por um 
processo de análise, 
de leitura, em que 
sejam investigados os 
meios de produção e 
o contexto em que foi 
produzida.
40
 Linguagem Visual na Historiografi a
40
Acompanhe, a seguir, a interpretação da Última Ceia do historiador de 
arte Ernst Gombrich (1909-2000) que, além de identifi car os personagens da 
cena (análise iconográfi ca), dá a ver os sentimentos que os envolvem (análise 
iconológica). 
Leonardo, como Giotto antes dele, revertera ao texto das 
Escrituras e se esforçara por visualizar como teria sido 
a cena quando Cristo disse: “‘Em verdade vos digo que 
um dentre vós me trairá.’ E eles, muitíssimo contristados, 
começaram um por um a perguntar-lhe: ‘Porventura sou eu, 
senhor?’” (Mateus XXVI, 21-2). [...]. São essas interrogações 
e esses sinais que trazem movimento à cena. Cristo acabou 
de pronunciar as palavras trágicas, e os que estão a Seu lado 
recusam horrorizados ao ouvir a revelação. Alguns parecem 
protestar seu amor a Jesus e sua inocência, outros discutem 
gravemente a quem o Senhor poderia se referir, outros ainda 
parecem aguardar uma explicação para o que ele disse. S. 
Pedro, o mais impetuoso deles, precipita-se para S. João, 
que se senta à direita de Jesus. Ao segredar algo ao ouvido 
de S. João, empurra inadvertidamente Judas para diante e 
ergue os olhos com desconfi ança ou cólera, um contraste 
dramático com a fi gura do Cristo, calmo e resignado em 
meio a esse crescente alvoroço. (GOMBRICH, 1999, p.298).
Percebemos, nesta leitura, a sensibilidade de Gombrich, aliada a seus 
conhecimentos de história da arte. Além disso, este texto nos serve de 
lição: é possível e interessante reunir em um único texto as descrições e as 
interpretações acerca da imagem. 
Atividade de Estudos: 
1) Apresente cada uma das etapas do método de análise de 
imagens, propostas por Erwin Panofsky: pré-iconográfi ca; 
iconográfi ca e iconológica. 
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
UMA LEITURA DA PRIMEIRA MISSA NO BRASIL
Apresentarei uma análise da tela Primeira missa no Brasil (1861), 
pintada por Victor Meirelles (1832-1903), para mostrar os aspectos 
simbólicos envolvidos na leitura da imagem. Este famoso quadro ilustra 
a primeira missa realizada na colônia portuguesa, na América. A tela é 
uma das mais conhecidas pinturas brasileiras, em função de sua ampla 
reprodução em livros didáticos de história. Ela é convencionalmente aceita 
como uma ilustração do primeiro ritual católico realizado em solo brasileiro, 
feita a partir de elementos da Carta de Pero Vaz de Caminha (1500). Se 
a Carta de Caminha é considerada a certidão textual do nascimento do 
Brasil, a pintura de Meirelles é a certidão visual. 
Proponho, primeiro, a leitura de trechos da Carta, que descrevem a 
participação dos nativos em duas missas: a primeira teria ocorrido dia 26 de 
abril, domingo, e a segunda, dia 1º de maio, sexta-feira. 
 A missa de 26 de abril:
Enquanto estivemos à missa e à pregação, seria na 
praia outra tanta gente, poucomais ou menos como a de 
ontem, com seus arcos e setas, a qual andava folgando. E 
olhando-nos, sentaram-se. E, depois de acabada a missa, 
assentados nós à pregação, levantaram-se muitos deles e 
tangeram [tocaram] corno ou buzina e começaram a saltar e 
dançar um pedaço. 
 A missa de 1º de maio:
Disse missa o padre frei Henrique, a qual foi cantada e 
ofi ciada por esses já ditos [religiosos e sacerdotes]. Ali 
estiveram conosco a ela perto de cinqüenta ou sessenta 
deles [nativos], assentados todos de joelho assim como nós.
E quando se veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em 
pé, com as mãos levantadas, eles se levantaram conosco e 
alçaram as mãos, fi cando assim até ser acabado; e então 
tornaram-se a assentar como nós. E quando levantaram a 
Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim 
todos, como nós estávamos com as mãos levantadas, e em 
tal maneira sossegados, que, certifi co a Vossa Alteza, nos 
fez muita devoção.
Estiveram assim conosco até acabada a comunhão; depois 
da qual comungaram esses religiosos e sacerdotes e o 
Capitão com alguns de nós outros.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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Alguns deles, por o Sol ser grande [cerca de meio-
dia], quando estávamos comungando, levantaram-se, 
e outros estiveram e ficaram. Um deles, homem de 
cinqüenta ou cinquenta e cinco anos, continuou ali com 
aqueles que ficaram. Esse, estando nós assim, ajuntava 
estes, que ali ficaram, e ainda chamava outros. E 
andando assim, entre eles falando, lhes acenou com o 
dedo para o altar e depois apontou o dedo para o Céu, 
como se lhes dissesse alguma coisa de bem; e nós 
assim o tomamos. (CAMINHA, 2002, p.115).
As missas, pelo que consta na Carta, foram celebradas com muito prazer 
e devoção. Na primeira, parece que os nativos fi zeram seu próprio ritual; na 
segunda, eles já começam a imitar o movimento de se ajoelhar, ensaiando os 
primeiros movimentos de aculturação. As missas tiveram como cenário a praia, 
e, como vimos, contaram com a presença dos nativos da terra. Contudo, 
não podemos esquecer que a Carta de Pero Vaz de Caminha foi escrita 
para o agrado do rei D. Manuel, e por isso, procurou mostrar a inocência e 
afabilidade do nativo, características que facilitariam a conversão deles aos 
costumes da civilização, levada pela mão dos colonizadores portugueses. 
A Carta traz, então, o olhar de um escrivão português que refl ete os 
interesses colonialistas da Coroa portuguesa: expandir a fé, conquistar 
territórios e encontrar metais preciosos. 
A representação visual da missa (o quadro de Meirelles), por sua vez, 
foi elaborada trezentos e sessenta anos depois, passados exatos trinta e 
oito anos da independência do Brasil. A representação da Primeira Missa, de 
Meirelles, foi elaborada em um contexto completamente diferente do contexto 
que envolveu a redação da Carta de Caminha. Neste sentido, as missas, 
na Carta, são usadas para a construção da origem mítica do nascimento da 
nação, que consiste na miscigenação harmoniosa entre brancos e índios. A 
missa – enquanto ato capital da civilização cristã no novo mundo, foi resgatada 
da Carta para compor o cenário do primeiro momento de aculturação do nativo. 
Escreve Eduardo França Paiva:
Malgrado a beleza e a refi nada técnica da obra, ela, assim 
como tantas outras que experimentaram trajetória similar, 
não são, nem poderiam ser, o retrato de uma realidade 
ou da forma que ela teria sido verdadeiramente. Mas isso 
não a faz menos apreciável aos olhos dos historiadores. 
Ao contrário, trata-se de um registro extremamente rico 
sobre as intenções ofi ciais de se inventar, de se criar uma 
identidade histórica para a jovem nação, que se tornou 
independente em 1822. Era preciso inventar o Brasil e seu 
passado. (PAIVA, 2006, p. 92).
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
43
 Capítulo 2 
A pintura revela, então, os objetivos da elite na segunda metade do 
século XIX, que investiu em representações que fundamentariam a cultura 
nacional através das relações culturais amistosas entre nativos e europeus. 
“Sob a égide católica, associam-se, numa cena de elevação espiritual, as duas 
culturas. Criava-se ali o ato de batismo da nação brasileira”. (COLI, 1998, 
p. 380). Sabemos, no entanto, que o processo de colonização na América 
portuguesa se deu a ferro e fogo. Os povos nativos foram escravizados ou 
confi nados em missões jesuíticas. Segundo Boris Fausto, “a chegada dos 
portugueses representou para os índios uma verdadeira catástrofe. [...]. Os 
índios que se submeteram ou foram submetidos sofreram a violência cultural, 
as epidemias e mortes”. (2008, p. 40). Este fato certamente era conhecido no 
século XIX, porém, a imagem ofi cial que se queria da nação deveria integrar 
e não dividir os povos e culturas. A tela de Victor Meirelles traz, assim, uma 
imagem romântica da miscigenação. 
Segundo Jorge Coli, o quadro Primeira Missa no Brasil “se tornou a 
verdade visual do episódio narrado na carta” (1998, p. 383). Coli mostra, ainda, 
que a imagem de Meirelles perpetuou-se no imaginário nacional, quando 
serviu de modelo para o fi lme ”A descoberta do Brasil” (1937), de Humberto 
Mauro. Podemos concluir que o quadro inventou defi nitivamente o próprio 
descobrimento do Brasil e de sua gente. 
 
Figura 3 - Reprodução do quadro Primeira Missa no Brasil
Fonte: Disponível em: <http://www.moderna.com.br/moderna/didaticos/ei/
aventuradeaprender/datas/images/indio1.jpg>. Acesso em: 09 jul. 2009.
A beleza da pintura é inebriante, por isso, é necessário o distanciamento 
para não sermos seduzidos pela imagem. A fi m de escapar da força sedutora 
da imagem, Eduardo Paiva chama a atenção para a importância do trabalho 
do historiador, pois é a partir da pesquisa e do olhar crítico do historiador 
que é possível compreender melhor a obra. O cenário da missa é a praia, 
como indica a Carta. Contudo, a praia que aparece no quadro é mais uma 
representação do litoral criado por Meirelles, do que propriamente uma praia 
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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do litoral brasileiro, no ano de 1500. Note que, na extremidade esquerda do 
quadro, o pintor colocou um coqueiro, que serve de elemento simbólico, para 
mostrar aos espectadores que a primeira missa se deu em uma praia. Porém, 
o coqueiro, como assinala Paiva, não é originário do Brasil; ele foi trazido da 
Índia pelos colonizadores portugueses. O coqueiro não poderia, então, ter sido 
incluído na paisagem do descobrimento. Desta forma, podemos concluir que a 
identifi cação do coqueiro com a praia faz parte do imaginário que se tem das 
praias da Bahia, que, por sua vez, não corresponde à realidade da paisagem 
do litoral brasileiro no período do descobrimento. 
OUTRAS TEORIAS DE LEITURA DA IMAGEM
A análise iconográfi ca é criticada por seu caráter especulativo e também 
por seus próprios limites. No primeiro caso, o método iconográfi co é acusado 
de deixar de lado os aspectos sociais ligados à produção das imagens; no 
segundo caso, por sua excessiva atenção às alegorias que compõem a 
imagem. Vale lembrar, no entanto, que a iconografi a nasceu para a análise das 
pinturas, em particular da arte renascentista. Sabemos que esta abordagem 
tem seus limites, pois nem todas as imagens trazem personagens ou objetos 
alegóricos para serem analisados. Estes objetos são comuns nas pinturas de 
motivos bíblicos ou mitológicos. 
Sobre o caráter limitado da teoria iconográfi ca temos o exemplo das pinturas 
de paisagens da natureza. Neste caso, o desafi o lançado ao historiador ou 
leitor não é decodifi car códigos para compreender a mensagem que a imagem 
transmite, já que em uma paisagem natural lidamos com a representação de 
elementos naturais e não com objetos construídos pelo homem. Importa à 
leitura da paisagem, no entanto, que o analista estabeleça associações entre 
os elementos naturais (água, rocha, mata etc) representados na imagem e no 
imaginário historicamente construído sobre os mesmos elementos. 
Sobreo estudo da análise do imaginário da paisagem, sugiro a 
leitura do livro:
SCHAMA, Simon. Paisagem e memória. São Paulo: Companhia 
das Letras, 1996. 
Em função do caráter limitado da iconografi a, surgiram outras teorias 
de leitura da imagem. Contudo, consideramos que elas não se contrapõem 
45
HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
à análise iconográfi ca, mas servem para enriquecê-la. Ou seja, as teorias 
somadas nos auxiliam a compreender melhor uma imagem. Por isso, elas não 
devem ser vistas como aportes metodológicos que, simplesmente, se opõem 
à iconografi a. 
Dentre as metodologias de análise da imagem, que não a iconográfi ca, 
temos o método advindo da semiótica, da psicanálise e da teoria da recepção. 
Nosso objetivo não é aprofundar cada um destes enfoques teóricos, até porque 
não caberia nos objetivos deste Caderno, mas apenas apresentar, em linhas 
gerais, suas principais características. Começarei pela semiótica. 
A semiótica ou teoria estruturalista de análise leva em conta as conexões 
entre os elementos que compõem uma imagem. Seu interesse repousa no 
signifi cado integral da obra, e não em uma interpretação isolada dos elementos 
que a constituem (como propõe a iconografi a). A imagem é, neste sentido, 
tratada como um sistema integrado de signos. A semiótica é, em sua origem, 
um método de estudo do texto, e foi adaptada para a leitura de imagens na 
década de 1960, por Roland Barthes (1915-1918). 
Semiótica: Segundo Winfried Nöth, a semiótica é, de 
maneira geral, “a ciência dos signos e dos processos signifi cativos 
(semiose) na natureza e na cultura”. (NÖTH, 1995, 17). O que 
nos interessa aqui, no entanto, é perceber a análise semiótica, 
que associa as idéias de representação e de estrutura. Esta 
associação pode ser vista, por exemplo, na antropologia estrutural 
de Claude Lévi-Strauss (1829-1902), que buscou estabelecer uma 
relação entre hábitos e sistemas culturais mais amplos. O próprio 
estruturalismo (teoria que defi ne os fatos linguísticos a partir das 
estruturas ou sistemas), segundo Nöth, baseia-se nas noções da 
semiótica, desenvolvidas por Fernand de Saussure (1857-1913). 
“O estruturalismo possui uma base semiótica, que se evidencia na 
preocupação com a ideia de signo, da estrutura e dos sistemas 
sígnicos”. (NÖTH, 1996, p.111). 
A análise semiótica, entretanto, se assemelha à iconografi a em sua 
preocupação com os signos ou indícios presentes em uma imagem. Por 
exemplo, o gato, em pinturas renascentistas, signifi ca sensualidade, enquanto 
o cachorro, a fi delidade no casamento. A diferença, entretanto, está no objetivo 
do estruturalismo, que enfatiza a análise da composição como um todo, 
incluindo sua forma artística ou sua estética. 
A semiótica ou 
teoria estruturalista 
de análise leva em 
conta as conexões 
entre os elementos 
que compõem uma 
imagem. Seu interesse 
repousa no signifi cado 
integral da obra, e não 
em uma interpretação 
isolada dos elementos 
que a constituem.
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 Linguagem Visual na Historiografi a
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Concepção estruturalista: Segundo Marilena Chauí, “A 
concepção estruturalista veio mostrar que os fatos humanos 
assumem a forma de estruturas, isto é, de sistemas que criam 
seus próprios elementos, dando a eles sentido pela posição e 
pela função que ocupam no todo. As estruturas são totalidades 
organizadas segundo princípios internos que lhes são próprios 
e que comandam seus elementos ou partes, seu modo de 
funcionamento e suas possibilidades de transformação temporal 
ou histórica. Nelas, o todo não é a soma das partes nem um 
conjunto de relações causais entre elementos isoláveis, mas um 
princípio ordenador, diferenciador e transformado. Uma estrutura é 
uma totalidade dotada de sentido”. (2003, p. 229-30).
Assim, na concepção estruturalista, o sistema de signos que compõe uma 
imagem é visto como “um subsistema de um todo maior. Este todo, descrito 
pelos linguistas como langue (linguagem), é o repertório a partir do qual os 
falantes individuais fazem suas escolhas (parole)”. (BURKE, 2004, p. 217). 
Segundo a visão estruturalista, que tem como base a semiótica, os 
conteúdos das imagens formam “textos fi gurativos”. Ou seja, a imagem é 
tratada como discurso em que as fi guras se colocam no lugar das palavras. 
Cabe então ao leitor interpretar o signifi cado do texto-imagem como um todo 
e não decodifi car as fi guras isoladamente. Entender a imagem como um todo 
quer dizer, por exemplo, identifi car seus confl itos internos, as semelhanças e/
ou oposições. 
A leitura psicanalítica da imagem, por sua vez, dá ênfase às manifestações 
inconscientes na produção de uma obra. As teorias de Sigmund Freud (1856-
1939), presentes em Interpretação dos Sonhos (1899), servem de referencias 
para pensarmos esta forma de compreender a imagem. Na leitura psicanalítica os 
conteúdos das imagens são verdadeiras projeções subjetivas. 
O enfoque psicanalítico é ao mesmo tempo necessário e 
impossível. É necessário porque as pessoas de fato projetam 
suas fantasias inconscientemente nas imagens, mas é 
impossível justifi car este enfoque em relação ao passado 
de acordo com critérios acadêmicos normais porque as 
evidências cruciais foram perdidas. (BURKE, 2004, p. 216).
O enfoque da psicanálise é particularmente difícil aos historiadores, já 
que o interesse do historiador repousa no estudo da sociedade e na cultura, 
Segundo a visão 
estruturalista, que 
tem como base 
a semiótica, os 
conteúdos das 
imagens formam 
“textos fi gurativos”. 
Ou seja, a imagem é 
tratada como discurso 
em que as fi guras se 
colocam no lugar 
das palavras.
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
e não no indivíduo, Por outro lado é extremamente difícil comprovar (por 
meio da confrontação de fontes textuais ou imagéticas) que certo elemento 
em uma obra visual tem um sentido preciso. Como afi rmar que determinado 
objeto em uma pintura é símbolo fálico, que representa o domínio dos valores 
masculinos sobre os femininos? Entretanto, a análise psicanalítica é importante 
para pensarmos, por exemplo, as mensagens subliminares presentes nos 
comerciais de televisão. Neles são vendidos produtos que teriam pretensos 
poderes mágicos, como determinada sandália, que tem o poder de transformar 
uma menina em uma mulher. Este é um mundo de imagem e sedução a que 
devemos estar atentos, enquanto pais, professores e cidadãos.
Para discussão sobre o assunto mídia e consumo, sugiro que 
você assista ao vídeo “Criança, a alma do negócio” (2008). Para 
isso, basta acessar o seguinte site:
h t tp : / /www.a lana .o rg .b r /C r i ancaConsumo/B ib l i o teca .
aspx?v=8&pid=40
Por fi m, o terceiro enfoque relaciona-se com a recepção das imagens. 
Trata-se das análises oriundas da história social da arte. Esta vertente de 
estudos da arte baseia-se na relação entre obra de arte e suas condições 
de produção, distribuição e consumo na sociedade. O foco da história 
social da arte está nas relações entre arte e sociedade: perceber tanto as 
relações entre artistas e patrocinadores (que incluem as políticas culturais) 
como também a forma como a obra de arte ou imagem foi ou é recebida 
pelo público-espectador. 
Assim, na contramão dos estudos estruturalistas, a preocupação deste 
terceiro enfoque está no processo de recepção. Ou seja, nas diferentes 
formas de apropriação social da imagem. “O estudo dos efeitos das imagens 
na sociedade tomou virtualmente o lugar das análises sobre a infl uência da 
sociedade na elaboração da imagem”. (BURKE, 2004, p. 226-7). O sujeito está 
no centro da análise: ele é visto tanto como “refém” das estratégias de mídia, 
quanto “ator” que ressignifi ca o que lhe é oferecido por esta mesma mídia. 
A análise psicanalítica 
é importante 
para pensarmos, 
por exemplo, 
as mensagens 
subliminares presentes 
nos comerciais de 
televisão.
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Atividade de Estudos: 
1) Apresentea principal diferença entre o método iconográfi co e o 
semiótico de interpretação da imagem.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Vimos, neste capítulo, o quanto as transformações na historiografi a (em 
particular as reações nos anos 1960 e 1970 contra a história tradicional) 
contribuíram para inclusão das imagens nos estudos históricos. E dentre 
as tendências historiográfi cas contemporâneas, destacamos a dedicação 
dos trabalhos de história cultural na incorporação da análise da imagem, 
isto porque a imagem serve como fonte privilegiada para se pensar as 
representações sociais. 
Assim, ao invés de tratar a imagem como ilustração, devemos considerá-
la uma fonte que complementa o texto, assim como o texto é fonte que 
completa a imagem. Por meio das imagens, o historiador pode ter acesso a 
informações que não teria por outro meio. Muitas vezes, uma imagem guarda 
detalhes em sua composição que não encontramos em textos. Estes mesmos 
detalhes servem ao historiador como verdadeiras pistas para a compreensão 
do passado. Este, aliás, é o princípio do método iconográfi co (o qual vimos 
Ao invés de tratar 
a imagem como 
ilustração, devemos 
considerá-la uma fonte 
que complementa o 
texto, assim como 
o texto é fonte que 
completa a imagem.
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HISTORIOGRAFIA E IMAGEM
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 Capítulo 2 
anteriormente) que busca, da mesma maneira que um detetive, compor uma 
cena a partir de indícios. A diferença é que o historiador busca desvendar um 
contexto, e o detetive, um crime. 
É importante frisar também que o método de análise da imagem depende, 
por um lado, das escolhas que o historiador-leitor faz, e por outro, das próprias 
informações disponíveis sobre a imagem em estudo. Enquanto a iconografi a, a 
semiótica e a psicanálise dão ênfase à leitura dos conteúdos, a história social 
da arte e as teorias da recepção abriram o caminho para analisar os aspectos 
mercadológicos ligados à imagem. Cabe então a você decidir a maneira de ler 
a imagem, que não exclui a utilização de diferentes enfoques teóricos. 
REFERÊNCIAS
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______. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru, SP: EDUSP, 2004.
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sobre o achamento do Brasil. São Paulo: Martin Claret, 2002.
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história visual no século XIX brasileiro. In: FREITAS, Marcos C. de. (org.). 
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GOMBRICH, E. H. A história da arte. 16. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1999.
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Janeiro: Objetiva, 2002. Versão 1.0.5a, 1 CD – ROM.
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LE GOFF, Jacques. História e memória. 4. ed. Campinas, SP: Ed. da 
UNICAMP, 1996. 
NÖTH, Winfried. Panorama da semiótica: de Platão a Pierce. São Paulo: 
Annablume, 1995. 
______. A semiótica no século XX. São Paulo: Annablume, 1996. 
PAIVA, Eduardo F. História e imagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. 
PESAVENTO, Sandra J. História e História Cultural. 2. ed. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2005.

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