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as tradicoes antigas

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Círculo Iniciático de Hermes 
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A Idéia de Centro nas Tradições Antigas1 
por René Guénon em “Símbolos da Ciência Sagrada”, Editora Pensamento, Brasil 
tradução: J. Constantino Kairalla Riemma 
edição C:.I:.H:.: Fr. Goya 
 
Já tivemos ocasião de nos referir ao “Centro do Mundo” e aos diversos símbolos que o 
representam. Devemos voltar agora a essa idéia de Centro, que tem a maior importância em todas as 
tradições antigas, e indicar algumas de suas principais significações. Para os modernos, de fato, essa 
idéia não mais evoca de imediato tudo aquilo que evocava para os antigos. Aí, como em tudo o mais 
que se refere ao simbolismo, muitas coisas foram esquecidas e certos modos de pensar parecem ter-
se tornado totalmente estranhos à grande maioria de nossos contemporâneos. Cabe portanto insistir 
sobre isso, em particular porque a incompreensão é geral e completa a esse respeito. 
O Centro é, antes de tudo, a origem, o ponto de partida de todas as coisas; é o ponto 
principal, sem forma e sem dimensões, portanto invisível, e, por conseguinte, a única imagem que 
se pode atribuir à Unidade primordial. Dele, por sua irradiação, todas as coisas são produzidas, do 
mesmo modo que a Unidade gera todos os números, sem que sua essência seja por isso modificada 
ou alterada de alguma forma. Há, aí, um perfeito paralelismo entre dois modos de expressão: o 
simbolismo geométrico e o simbolismo numérico, de tal modo que se pode empregá-los 
indiferentemente e passar-se de um a outro da maneira mais natural. É preciso não esquecer, 
contudo, que em ambos os casos estamos lidando sempre com símbolos: a unidade aritmética não é 
a Unidade metafísica; trata-se apenas de uma representação, embora nada tenha de arbitrária, pois 
existe entre elas uma relação analógica real. E é essa relação que permite transpor a idéia da 
Unidade além do domínio da quantidade, à ordem transcendental. 
O mesmo acontece com a idéia de Centro, que é passível de uma transposição similar, mediante a 
qual se despoja de seu caráter espacial, que só é evocado a título de símbolo: o ponto central é o Princípio, o 
Ser puro. O espaço que ele preenche com sua irradiação, e só por essa irradiação (o Fiat Lux do Gênesis), sem 
a qual esse espaço apenas seria "privação" e nada, é o Mundo no sentido mais amplo da palavra, o conjunto 
de todos os seres e de todos os estados de existência que constituem a manifestação universal. 
A representação mais simples da idéia que acabamos de formular é o ponto no centro do círculo (Fig. 
1): 
 
 
 
Fig. 01 Fig.02 
 
o ponto é o emblema do Princípio, e o círculo é o emblema do Mundo. Ir impossível determinar 
qualquer origem no tempo para o emprego dessa representação, pois é encontrada com freqüência em objetos 
pré-históricos. Sem dúvida, é preciso ver nessa representação um dos signos que se ligam diretamente à 
tradição primordial. Às vezes, o ponto é rodeado de vários círculos concêntricos, que parecem representar os 
diferentes estados ou graus da existência manifestada, dispondo-se hierarquicamente conforme seu maior ou 
menor afastamento do Princípio primordial. 
O ponto no centro do círculo também foi utilizado, provavelmente desde uma época muito antiga, 
como uma representação do Sol, visto ser ele em verdade, na ordem física, o Centro ou o "Coração do 
Mundo". E essa figura permaneceu até nossos dias como o signo astrológico e astronômico usual do Sol. É 
talvez por essa razão que a maior parte dos arqueólogos, sempre que encontra esse símbolo, atribui-lhe uma 
significação exclusivamente "solar", enquanto que, na realidade, esta é muito mais ampla e profunda. 
Esquecem-se ou ignoram que o Sol, do ponto de vista de todas as tradições antigas, nada mais é em si que um 
símbolo do verdadeiro "Centro do Mundo", isto é, do Princípio divino. 
 
1 Publicado na revista Regnabit, maio, 1926. 
 
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A relação que existe entre o centro e a circunferência, ou entre o que representam respectivamente, já 
está claramente indicada pelo fato de que a circunferência não poderia existir sem o seu centro, enquanto que 
este é absolutamente independente daquela. Tal relação pode ser indicada de modo ainda mais claro e 
explicito através de raios provenientes do centro e que terminam na circunferência. Esses raios, é evidente, 
podem ser representados em número variável, pois sua quantidade é indefinida, do mesmo modo que os 
pontos da circunferência que lhe assinalam as extremidades. Mas, na realidade, escolheu-se sempre, para as 
representações dessa espécie, números que tem, por si próprios, um valor simbólico particular. Nesse caso, a 
forma mais simples é a que apresenta apenas quatro raios dividindo a circunferência em partes iguais, ou seja, 
dois diâmetros retangulares formando uma cruz no interior dessa circunferência (Fig.2). Essa nova figura tem 
a mesma significação geral da primeira, mas a ela se juntam algumas outras secundárias que a completam: a 
circunferência, se a considerarmos sendo percorrida num certo sentido, é a imagem de um ciclo de 
manifestação, tal como os ciclos cósmicos, sobre os quais a doutrina hindu, em particular, oferece uma teoria 
bastante desenvolvida. As divisões determinadas na circunferência pelas extremidades dos braços da cruz 
correspondem, então, aos diferentes períodos ou fases nos quais se divide o ciclo. Tal divisão pode ser vista, 
por assim dizer, em diversas escalas, de acordo com a maior ou menor extensão dos ciclos. Teremos desse 
modo, por exemplo, e para permanecermos numa única ordem da existência terrestre, os quatro principais 
momentos do dia, as quatro fases da lua, as quatro estações do ano, e também, segundo a concepção que 
encontramos tanto nas tradições da Índia e da América Central, quanto da Antiguidade greco-latina, as quatro 
idades da humanidade. Aqui apenas indicamos sumariamente essas considerações, para dar uma idéia de 
conjunto daquilo que os símbolos em questão exprimem; no entanto, elas se vinculam mais diretamente ao 
que trataremos a seguir. 
Entre as figuras que comportam maior numero de raios, mencionaremos em especial as rodas ou 
"rodelas", que tem habitualmente seis ou oito raios (Figs. 3 e 4). A "rodela" céltica, que se perpetuou através 
de quase toda a Idade Média, apresenta-se sobre uma ou outra dessas duas formas. Essas mesmas figuras, 
especialmente a segunda, encontram-se com muita freqüência nos países orientais, em particular na caldéia e 
Assíria, na Índia (onde a roda é denominada chakra) e no Tibet. Por outro lado, existe um estreito parentesco 
entre a roda com seis raios e o crisma, resumindo-se a diferença no fato de que neste último, em geral, não se 
traça a circunferência à qual pertencem as extremidades dos raios. 
 
 
 
 
Fig. 03 Fig.04 
 
A roda, ao invés de ser apenas um signo "solar", como se afirma comumente em nossa época, é antes 
de tudo um símbolo do Mundo, o que se pode compreender sem dificuldade. Na linguagem simbólica da 
índia, fala-se sempre da "roda das coisas" ou da "roda da vida", o que corresponde claramente a essa 
significação. Fala-se, também, da "roda da Lei", expressão que o budismo adotou, corno muitas outras, das 
doutrinas anteriores e que, ao menos na origem; referia-se sobretudo às teorias cíclicas. Deve-se acrescentar 
ainda que o Zodíaco é representado também sob a forma de uma roda, nesse caso com doze raios, e que o seu 
nome em sânscrito significa literalmente "roda dos signos"; poder-se-ia traduzi-lo de igual modo por "roda 
dos números", de acordo com o sentido principal da palavra râshi, que serve para designar os signos do 
Zodíaco2. 
Existe, além disso, uma certa conexão entre a roda e os diversos símbolos florais; poderíamos 
mesmo, em certos casos pelo menos, falar de uma verdadeira equivalência3. Se considerarmos uma flor 
 
2 A“roda da Fortuna”, no simbolismo da Antiguidade ocidental, tem relações muito estreitas com a “roda da 
Lei”, e igualmente, embora isso não pareça tão claro à primeira vista, com a roda zodiacal. 
3 Entre outros indícios dessa equivalência, no que se refere à Idade Média, vimos a roda de oito raios e uma 
flor de oito pétalas representadas uma ao lado da outra numa mesma pedra esculpida, encaixada na fachada da 
antiga igreja de Saint-Mexme de Chinon, e que data muito provavelmente da época carolíngea. (Ver Cap.9: 
As flores Simbólicas; e 50: Os Símbolos da Analogia). 
 
 
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simbólica tal como o lótus, o lírio ou a rosa4, o seu desabrochar representa, entre outras coisas (pois são 
símbolos com múltiplas significações) e por uma similaridade muito compreensível, o desenvolvimento da 
manifestação. Esse desabrochar é ainda uma irradiação ao redor do Centro, pois, aqui também, trata-se de 
figuras "centradas", o que justifica sua assimilação à roda5. Na tradição hindu, o Mundo é muitas vezes 
representado sob a forma de um lótus, em cujo centro se levanta o Mêru, a montanha sagrada que simboliza o 
Pólo. 
Mas, voltemos às significações do Centro, pois até aqui só expusemos a primeira delas, que se refere 
à imagem do Princípio. Encontraremos uma outra no fato de que o Centro é propriamente o "meio", o ponto 
eqüidistante de todos os pontos da circunferência, e que divide todos os diâmetros em duas partes iguais. No 
que dizíamos antes, o Centro era considerado de algum modo anterior à circunferência, que só tinha realidade 
pela irradiação dele; agora, é considerado em sua relação com a circunferência realizada, isto é, trata-se da 
ação do Princípio no seio da criação. O meio entre os extremos representados pelos pontos opostos da 
circunferência é o lugar em que as tendências contrárias, tocando seus extremos, neutralizam-se por assim 
dizer e permanecem em perfeito equilíbrio. Certas escolas de esoterismo muçulmano, que atribuem à cruz um 
valor simbólico da maior importância, dão o nome de "estação divina" (e1-maqâmul-ilâhi) ao centro da cruz, 
que designam como o lugar em que se unificam todos os contrários e se resolvem todas as oposições. A idéia 
que se exprime aqui de modo mais particular é a de equilíbrio, que se identifica a de harmonia; não são duas 
idéias diferentes, mas apenas dois aspectos de uma mesma idéia. 
Existe ainda um terceiro aspecto, ligado mais em particular ao ponto de vista moral (embora passível 
de receber também outras significações), que é a idéia de justiça. Pode-se relacionar o que dissemos aqui à 
concepção platônica segundo a qual a virtude consiste em um justo meio entre dois extremos. De um ponto de 
vista muito mais universal, as tradições extremo orientais falam seguidamente do "Meio Invariável", que é o 
ponto em que se manifesta a "Atividade do Céu", e, segundo a doutrina hindu, no centro de todo ser e de todo 
estado da existência cósmica, reside um reflexo do Princípio Supremo. 
O próprio equilíbrio, aliás, nada mais é que o reflexo, na ordem da manifestação, da imutabilidade 
absoluta do Princípio. Para considerar as coisas sob essa nova relação, é preciso olhar a circunferência como 
estando em movimento em torno de seu centro, o qual não participa desse movimento. A própria idéia de roda 
(rota) evoca de imediato a idéia de rotação, e essa rotação é a representação da mudança contínua a que estão 
submetidas todas as coisas manifestadas. Nesse movimento, só há um ponto que permanece fixo e imutável: o 
Centro. Isso nos leva de volta às concepções cíclicas sobre as quais dissemos algumas palavras anteriormente: 
o percurso de um ciclo qualquer, ou a rotação da circunferência, é a sucessão, seja sob o modo temporal, seja 
sob outro qualquer. A fixidez do Centro é a imagem da eternidade, em que todas as coisas são apresentadas 
em perfeita simultaneidade. A circunferência só pode girar ao redor de um centro fixo; do mesmo modo, a 
mudança, que não é suficiente por si mesma, supõe necessariamente um princípio exterior à mudança: é o 
"motor imóvel" de Aristóteles também representado pelo Centro. O Princípio Imutável é, por conseguinte e ao 
mesmo tempo, tudo aquilo que existe, muda ou se move; e não há realidade que, conseqüentemente, não 
dependa totalmente dele. E é isto que dá ao movimento seu impulso inicial e, também, o que a seguir o dirige 
e o governa; aquilo que lhe dá sua lei, pois a conservação da ordem do mundo é apenas uma espécie de 
prolongamento do ato criador. Ele é, segundo uma expressão hindu, o "ordenador interno" (antaryâmî), pois 
dirige todas as coisas do interior, residindo ele próprio no ponto mais interior de todos, que é o Centro. 
Ao invés da rotação de uma circunferência em torno de seu centro, pode-se considerar também a de 
uma esfera em torno de um eixo fixo; sua significação simbólica é exatamente a mesma. É por isso que as 
representações do "Eixo do Mundo" são tão numerosas e tão importantes em todas as tradições antigas; e o 
seu sentido geral é, no fundo, o mesmo das figuras do "Centro do Mundo", salvo talvez pelo fato de evocarem 
 
4 O lírio tem seis pétalas; o lótus, nas representações mais comuns, tem oito; as duas formas correspondem, 
portanto, às rodas de seis e oito raios. Quanto à rosa, ela é representada com um número variável de pétalas, o 
que pode modificar sua significação ou, pelo menos, dar-lhe matizes diferentes. Sobre o simbolismo da rosa, 
ver o artigo muito interessante de Charbonneau-Lassay (Regnabit, mar. 1926). 
5 Na figura do crisma sobre a rosa, da época merovíngia, que foi reproduzida pelo Sr. Chabornneau-Lassay 
(Regnabit, mar. 1926), a rosa central tem seis pétalas orientadas segundo os braços do crisma; este, além 
disso, está encerrado num círculo, o que expressa, tão claramente quanto possível, sua identidade com a roda 
de seis anos. 
 
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mais diretamente o papel do Principio Imutável em relação à manifestação universal do que as outras relações 
sob as quais o Centro pode ser também considerado. Quando a esfera, terrestre ou celeste, realiza a rotação 
em tomo de seu eixo, há dois pontos da esfera que permanecem fixos: são os pólos, que se constituem nas 
extremidades do eixo ou em seu ponto de encontro com a superfície da esfera. É por isso que a idéia de Pólo é 
equivalente à idéia de Centro. O simbolismo que se refere ao Pólo, e que se reveste às vezes de formas muito 
complexas, encontra-se também em todas as tradições, onde possui um lugar considerável. E se a maior parte 
dos eruditos modernos ainda não se apercebeu disso, é mais uma prova de que lhe falta a verdadeira 
compreensão dos símbolos. 
Uma das figuras mais impressionantes, que resume as idéias que acabamos de expor, é a swastika, ou 
suástica (Figs. 5 e 6), que é essencialmente o "signo do Pólo". Acreditamos que, na Europa moderna, até 
agora, não se conhece seu verdadeiro significado. Tentou-se inutilmente explicar esse símbolo pelas teorias 
mais fantasistas; chegou-se mesmo a ver nele o esquema de um instrumento primitivo destinado à produção 
do fogo; na verdade, se houver em certas circunstâncias, alguma relação com o fogo, é por razões muito 
diferentes. Foi com freqüência considerado como um signo "solar", que, no entanto, só poderia, assim, ter-se 
tornado de forma acidental ou de um modo muito indireto; a esse respeito poderíamos repetir aqui o que 
dissemos a propósito da roda e do ponto no centro do círculo. Os que estiveram mais próximos da verdade 
foram aqueles que consideraram a suástica como símbolo do movimento, mas essa interpretação é ainda 
insuficiente, porque não se trata de um movimento qualquer, mas, sim, de um movimento de rotação que se 
realiza em torno de um centro ou de um eixo imóvel. E o ponto fixo é precisamente o elemento essencial ao 
qual se refere de forma direta o símbolo em questão.Todas as outras significações que a mesma figura 
comporta derivam-se desta: o Centro imprime movimento a todas as coisas e, como o movimento representa a 
vida, a suástica torna-se, por isso, um símbolo da vida, ou, mais exatamente, do papel vivificante do Princípio 
em relação à ordem cósmica. 
 
 
 
 
Fig. 05 Fig.06 
 
Se compararmos a suástica com a figura da cruz inscrita na circunferência (Fig. 2), poderemos nos 
dar conta de que são, no fundo, dois símbolos equivalentes, com a única diferença de que a rotação, ao invés 
de ser representada pelo traçado da circunferência, é apenas indicada na suástica por linhas acrescentadas às 
extremidades dos braços da cruz em ângulos retos; essas linhas são tangentes à circunferência, marcando a 
direção do movimento nos pontos correspondentes. Como a circunferência representa o Mundo, o fato de se 
encontrar subentendida indica muito claramente que a suástica não é uma representação do Mundo, mas sim 
da ação do Princípio em relação ao Mundo6. 
Se atribuirmos à suástica o movimento de rotação de uma esfera, como o da esfera celeste em torno 
do seu eixo, é necessário supô-la traçada no plano equatorial; assim, o ponto central será a projeção do eixo 
sobre o plano que lhe é perpendicular. É secundária a importância do sentido de rotação indicado pela figura, 
pois são encontradas as duas formas que reproduzimos acima7, sem que seja preciso ver nisso a intenção de 
estabelecer entre elas uma oposição qualquer8. Sabemos muito bem que, em certos países em certas épocas, 
 
6 A mesma observação valeria também para o crisma comparado à roda. 
7 A palavra swastika é, em sânscrito, a única que serve para designar, em qualquer caso, o símbolo em 
questão; o termo sauwastica, que alguns aplicaram a uma das formas para distingui-la da outra (que seria 
então a verdadeira suástica), é apenas um adjetivo derivado de swastika e indica aquilo que se refere a esse 
símbolo ou as suas significações. 
8 A mesma observação vale para outros símbolos, em especial para crisma de Constantino, no qual o P está às 
vezes invertido, o que levou alguns a pensarem que deveria ser então considerado como o signo do Anti-
Cristo. Tal intenção pode ter existido de fato em alguns casos, mas existem outros em que isso é 
evidentemente impossível de ser admitido (nas catacumbas, por exemplo). De igual modo, o “quatro de cifra” 
corporativo, que é, aliás, uma modificação desse mesmo P do crisma (veja Cap.67), está voltado 
indiferentemente em um sentido ou outro, sem que se possa atribuir esse fato a uma rivalidade entre as 
 
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podem ter ocorrido cismas em que seus partidários deram voluntariamente à figura uma orientação contrária 
àquela que era habitual naquele meio do qual haviam se desligado, tendo isso como finalidade seu 
antagonismo por meio de uma manifestação exterior. Mas isso não afeta em nada a significação essencial do 
símbolo, que permanece a mesma em todos os casos. 
A suástica, longe de ser exclusivamente oriental, como se acreditou algumas vezes, é na realidade 
um daqueles símbolos muito difundidos, sendo encontrado em quase toda parte, do Extremo Oriente ao 
Extremo Ocidente, pois existe até em certos povos indígenas da América do Norte. Na época atual, 
conservou-se em particular na Índia e na Ásia Central e Oriental, e é provável que apenas nessas regiões 
exista quem saiba ainda o que ele significa. Entretanto, mesmo na Europa, ele não desapareceu inteiramente9. 
Na Lituânia e na Curlândia, os camponeses ainda traçam10 esse signo em suas casas, embora sem dúvida não 
mais conheçam o seu sentido e só vejam nele uma espécie de talismã protetor; mas, o que talvez seja mais 
curioso, é que eles lhe dão o nome sânscrito de swastika11. Na Antigüidade, encontramos esse signo em 
especial entre os celtas e na Grécia pré-helênica12; e, ainda, no Ocidente, como escreveu o Sr. Charbonneau-
Lassay13, foi antigamente um dos emblemas de Cristo, permanecendo em uso como tal até perto do final da 
Idade Média. Do mesmo modo que o ponto no centro do circulo e a roda, a suástica remonta 
incontestavelmente aos tempos pré-históricos, e, de nossa parte, vemos esse signo ainda, sem qualquer 
hesitação, como um dos vestígios da tradição primordial. 
Não terminamos ainda de indicar todas as significações do Centro: ele é, em primeiro lugar, um 
ponto de partida, mas é também um ponto de finalização; tudo procede, dele, e tudo deve finalmente a ele 
retomar. Já que todas as coisas só existem por causa do Princípio e não poderiam subsistir sem Ele, deve 
existir entre elas um vínculo permanente, representado pelos raios que juntam ao centro todos os pontos da 
circunferência. Esses raios podem ser percorridos em dois sentidos opostos: em primeiro lugar, do centro para 
a circunferência, e, a seguir, da circunferência voltando para o centro. São como que duas fases 
complementares, sendo a primeira representada pelo movimento centrífugo e a segunda pelo movimento 
centrípeto. Essas duas fases podem ser comparadas à respiração, de acordo com um simbolismo 
freqüentemente referido pelas doutrinas hindus, além de ter uma analogia não menos notável com a função 
fisiológica do coração. Com efeito, o sangue parte do coração espalhando-se por todo o organismo, 
vivificando-o, e retornando a seguir ao coração, cujo papel como centro orgânico é, na verdade, completo e 
corresponde por inteiro à idéia que, de um modo geral, devemos ter a respeito do Centro na plenitude de sua 
significação. 
Todos os seres, por dependerem de seu Princípio em tudo o que são, devem consciente ou 
inconscientemente aspirar a retornar para Ele. Essa tendência de retomo ao Centro tem, do mesmo modo, em 
todas as tradições, sua representação simbólica, que pode ser exemplificada com a orientação ritual, voltada 
exatamente na direção de um centro espiritual, imagem terrestre e sensível do verdadeiro "Centro do Mundo". 
A orientação das igrejas cristãs é um desses casos e refere-se essencialmente à mesma idéia conhecida por 
todas as religiões. No islã, essa orientação (qibla) é como que a materialização, se assim pudermos falar, da 
intenção14 (niyya) pela qual todas as potências do ser devem ser dirigidas para o Princípio Divino; e muitos 
outros exemplos poderiam ser facilmente encontrados. Haveria muito o que dizer sobre essa questão, mas 
 
diferentes corporações ou ao desejo de se distinguirem entre si, pois são encontradas as duas formas nas 
marcas pertencentes a uma mesma corporação. 
9 Não nos referimos aqui ao uso inteiramente artificial da suástica, em especial por certos grupos políticos 
alemães, que fizeram dela, com total arbitrariedade, um signo de anti-semitismo, a pretexto de que esse seria o 
emblema conveniente para a pretensa “raça-ariana”, o que não passa de pura fantasia. 
10 Não esquecer que este texto foi escrito para publicação em 1926. (N.T.) 
11 O lituano é, por sinal, dentre todas as línguas européias, a que tem maior semelhança com o sânscrito. 
12 Existem diversas variantes da suástica, por exemplo uma forma com braços curvos (com aparência de dois 
S cruzados), que vimos em particular numa moeda gaulesa. Além disso, certas figuras que só guardaram um 
mero caráter decorativo, como a cercadura “grega”, são originalmente derivadas da suástica. 
13 V. Regnabit, mar. 1926, pp. 302-303. 
14 A palavra “intenção” deve ser tomada aqui em seu sentido estritamente etimológico (de in-tendere, tender 
para). 
 
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como sem dúvida teremos ocasião de voltar a ela na seqüência destes estudos, nos contentaremos, por ora, em 
indicar, de forma sucinta, um último aspecto do simbolismo do Centro. 
Em resumo; o Centro é, ao mesmo tempo, o princípioe o fim de todas as coisas; ele é, segundo um 
simbolismo muito conhecido, o Alfa e o Omega. Melhor ainda, é o princípio, o meio e o fim. Esses três 
aspectos estão representados pelos três elementos do monossílabo Aum, ao qual o Sr. Charbonneau-Lassay 
referiu-se como emblema de Cristo, e cuja associação à suástica, entre os signos do convento do Carmo de 
Loudun, parece-nos particularmente significativa. De fato, esse símbolo, muito mais completo que o Alfa e o 
Omega, e capaz de sentidos que poderiam propiciar desenvolvimentos quase que indefinidos, é, por uma das 
concordâncias mais surpreendentes que se poderiam encontrar, comum à antiga tradição hindu e ao 
esoterismo cristão da Idade Média. Em ambos os casos, ele é, igualmente e por excelência, um símbolo do 
Verbo, que é na realidade o verdadeiro "Centro do Mundo".

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