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APOSTILA - EAD - FORMAÇÃO SÓCIOCULTURAL E ÉTICA - UNIFATECIE (1)

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Diretor Geral 
Gilmar de Oliveira
Diretor de Ensino e Pós-graduação
Daniel de Lima
Diretor Administrativo 
Eduardo Santini
Coordenador NEAD - Núcleo
de Educação a Distância
Jorge Van Dal
Coordenador do Núcleo de Pesquisa
Victor Biazon
Secretário Acadêmico
Tiago Pereira da Silva
Projeto Gráfico e Editoração
André Oliveira Vaz
Revisão Textual
Leandro Vieira
Web Designer
Thiago Azenha
FICHA CATALOGRÁFICA
FACULDADE DE TECNOLOGIA E 
CIÊNCIAS DO NORTE DO PARANÁ. 
Núcleo de Educação a Distância;
KOJO, Cléber Henrique Sanitá.
PERES, Paulino Augusto.
Formação Sóciocultural e Ética. Cléber Henrique Sanitá. Kojo.
Paulino Agusto. Peres
Paranavaí - PR.: Fatecie, 2019. 97 p.
Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária
Zineide Pereira da Silva.
UNIFATECIE Unidade 1
Rua Getúlio Vargas, 333,
Centro, Paranavaí-PR
(44) 3045 9898
UNIFATECIE Unidade 2
Rua Candido Berthier
Fortes, 2177, Centro
Paranavaí-PR
(44) 3045 9898
UNIFATECIE Unidade 3
Rua Pernambuco, 1.169,
Centro, Paranavaí-PR
(44) 3045 9898
UNIFATECIE Unidade 4
BR-376 , km 102, 
Saída para Nova Londrina
Paranavaí-PR
(44) 3045 9898
www.fatecie.edu.br
As imagens utilizadas neste 
livro foram obtidas a partir
do site ShutterStock
Professor Esp. Cleber Henrique Sanitá Kojo. 
• Especialista em História e Geografia pela Faculdade Integrada do Vale do Ivaí.
• Especialista em Gestão Escolar, Supervisão e Orientação pela ESAP - Faculda-
des Integradas do Vale do Ivaí.
• Especialista em Educação de Jovens e Adultos pela ESAP – Faculdades Inte-
gradas do Vale do Ivaí.
• Licenciatura Plena em História pela UNESPAR – FAFIPA, Paranavaí.
• Licenciatura Plena em Sociologia pela UNAR - Centro Universitário de Araras 
“Dr. Edmundo Ulson”.
• Docente da educação básica (Fundamental e Médio) da SEED, PR.
• Docente da educação básica (Médio) do Colégio Fatecie Premium.
• Docente do ensino superior, nos cursos de Arquitetura, Administração e Ciências 
Contábeis na UniFatecie.
• Supervisor de tutoria e Tutor da EAD UniFatecie.
Ampla experiência como docente da educação básica (Fundamental e Médio), 
Professor de cursinhos pré-vestibulares e prática docente na educação à distância.
Professor Esp. Paulino Augusto Peres
• Graduado em História pela UNESPAR (Universidade Estadual do Paraná) cam-
pus de Paranavaí/PR.
• Especialista em Didática e Tecnologia na Educação pela FATECIE (Faculdade 
de Ciências e Tecnologia do Norte do Paraná).
• Mestrando em Ensino Profissionalizante de História pela UNESPAR - Campo 
Mourão/PR.
• Professor na Escola Fatecie Max (séries finais do Ensino Fundamental).
• Professor no Colégio Fatecie Premium (Ensino Médio).
• Professor de Sociedade e Cultura na UniFatecie no curso de Ciências Contá-
beis.
• Professor formador e conteudista no EAD UniFatecie
• Tutor do EAD UniFatecie. 
AUTORES
Seja muito bem-vindo(a)!
Sejam bem-vindos ao nosso curso de Formação Sociocultural e Ética. A partir de 
agora partimos para uma viagem ao tempo para buscar nas nossas experiências históricas 
algumas explicações para o que ocorre no Brasil contemporâneo e claro, olhar para um 
horizonte futurístico e depositar nele nossa aprendizagem como uma forma de expectativa.
Em nossa viagem ao passado em busca desses espaços de experiências do Brasil 
e consequentemente, de nós mesmos, primeiro iremos compreender que durante toda a 
nossa história os detentores do poder no nosso país criaram mecanismos para manutenção 
de seu próprio poder, mantendo nas camadas mais baixas a população indígena, a branca 
mais empobrecida e claro, a população negra. Em seguida, você entenderá como funcio-
nou a escravidão no mundo em vários períodos históricos para após compreender como 
foi a escravidão moderna no Oceano Atlântico. Também compreenderá como era a vida 
do africano no Brasil através da biografia de um ex-escravizado chamado Mohammah G. 
Baquaqua e por fim, entenderá como esses escravizados no Brasil resistiam à escravidão 
para então ter contato com o maior exemplo de resistência negra no Brasil, o quilombo dos 
Palmares.
Nas Unidades III e IV retomaremos o fascínio sobre o assunto desta disciplina, 
observando, lendo ou estudando as unidades I e II, pois é o início de um grande desafio 
que vamos triunfar juntos. Proponho, uma construção conjunta sobre a História e Cultura 
dos primeiros moradores desse “Gigante pela própria natureza”, nossa querida terra, uma 
terra próspera, cheia de riquezas naturais e tão diversificada culturalmente, fazendo assim 
uma viagem temporal, desde a descoberta do Brasil até a atualidade. Vamos explorar a Lei 
11.645/2008, complementando a Lei 10.639/2003 apresentadas nos capítulos anteriores. 
Vale ressaltar que iremos verificar a visão eurocêntrica e os desafios de desmistificar essa 
ideia retrógrada, devemos assim elevar a história e a cultura indígena ao patamar que a 
mesma merece.
Dentro desse desafio, iremos conhecer muito além da lei 11.645/2008, pois obser-
vamos os seus impactos na sociedade, conhecendo assim um pouco da história e da cultura 
indígena. Temos que exaltar os desafios de superar o etnocentrismo e mostrar o conceito 
APRESENTAÇÃO DO MATERIAL
de “Índio” na sociedade atual. Vale destacar que vamos reconhecer a sociodiversidade indí-
gena, ou seja, reconhecer os direitos e as diferenças entre os povos os troncos linguísticos. 
Ressalta-se ainda que não se deve desprezar o Índio na historiografia brasileira, fazendo 
assim uma comparação entre passado e presente, semelhanças e diferenças, entre várias 
culturas que compõem esse povo, sobretudo seus aspectos religiosos.
Ao fim dessa viagem espero que seu horizonte de expectativas seja modificado, 
uma vez que todos nós, brasileiros, somos fruto de uma herança multiétnica de vários 
povos, desta forma, a humanização das relações entre esses povos só é possível quando 
os conhecemos melhor e possamos ver que o outro é igualzinho a mim.
Muito obrigado e bom estudo!
SUMÁRIO
UNIDADE I ...................................................................................................... 7
História e Cultura Africana
UNIDADE II ................................................................................................... 33
O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
UNIDADE III .................................................................................................. 52
História e Cultura Indígena
UNIDADE IV .................................................................................................. 72
Relações Étnico-Raciais e Direitos Humanos
7
Plano de Estudo:
• O ainda mal compreendido negro no Brasil
• Africanos são todos iguais? De onde veio a população negra no Brasil?
• O que foi a escravização?
• O africano no Brasil 
•	 A Resistência Negra
•	 Os quilombos como sinônimo de resistência negra
Objetivos de Aprendizagem:
• Contextualizar a história do africano no Brasil a fim de perceber que sua existência hoje 
se dá através de muita luta, e que sua cultura está presente no nosso dia a dia.
• Compreender que a africanidade no Brasil é composta de diversas etnias africanas e 
não de apenas um povo chamado africano, pois não existe um povo africano, mas povos 
africanos.
• Estabelecer a importância da compreensão da escravização negra no Brasil como ponto 
de partida para entender a existência do próprio negro no Brasil contemporâneo.
• Entender que os escravizados não aceitavam passivamente sua escravidão, mas resis-
tiam de diversas formas, sobretudo na forma de concentração quilombolas.
UNIDADE I
História e Cultura Africana
Professor Especialista Paulino Augusto Peres
8UNIDADE I História e Cultura Africana
INTRODUÇÃO
 Sejam bem-vindos ao nosso curso de Formação Sociocultural e Ética. A partir de 
agora, partimos para uma viagem no tempo em busca das nossas experiências históricas, 
algumas explicações para o que ocorre no Brasil contemporâneo e, claro, olhar para um ho-
rizonte futurístico, depositando nele nossa aprendizagem como uma forma de expectativa.Em nossa viagem ao passado, em busca desses espaços de experiências do Brasil 
e, consequentemente, de nós mesmos, primeiro iremos compreender que, durante toda a 
nossa história, os detentores do poder no nosso país criaram mecanismos para manutenção 
de seu próprio poder, mantendo nas camadas mais baixas a população indígena, a branca 
mais empobrecida e, claro, a população negra. Em seguida, você entenderá como funcionou 
a escravidão no mundo em vários períodos históricos para logo após compreender como 
foi a escravidão moderna no Oceano Atlântico. Também compreenderá como era a vida 
do africano no Brasil através da biografia de um ex-escravizado chamado Mohammah G. 
Baquaqua e, por fim, entenderá como esses escravizados no Brasil resistiam à escravidão 
para então ter contato com o maior exemplo de resistência negra no Brasil, o quilombo dos 
Palmares.
Ao fim dessa viagemm espero que seu horizonte de expectativas seja modificado, 
uma vez que todos nós, brasileiros, somos fruto de uma herança multiétnica de vários 
povos; desta forma, a humanização das relações entre esses povos só é possível quando 
os conhecemos melhor e possamos ver que o outro é igualzinho a mim. 
9UNIDADE I História e Cultura Africana
1. O AINDA MAL COMPREENDIDO NEGRO NO BRASIL
 
A história do africano no Brasil confunde-se com a própria história do país. Foram 
trazidos ao Brasil como solução de um problema, quando os indígenas resistiam à escravi-
dão ou eram protegidos pelos padres jesuítas e com a falta de mão-de-obra nas lavouras 
de cana, e depois no trabalho nas minas criou-se um mercado escravocrata entre a colônia 
brasileira e o continente africano. Cinquenta anos após a chegada dos portugueses no 
nordeste brasileiro, o tráfico negreiro iniciou-se e foi ganhando força com o passar dos 
decênios.
Diante de um crescente número de africanos trazidos à revelia ao Brasil, esse 
povo misturou-se aos indígenas que aqui já viviam e aos portugueses que ocupavam aos 
poucos essas terras. O povo africano traz consigo, evidentemente, sua carga cultural, como 
linguagem, religião, práticas artísticas, etc. Isto é, o povo africano não pode ser pensado 
sem levar em consideração suas práticas culturais.
O tempo teve o trabalho de enraizar no nosso país a cultura africana e misturá-la 
com as culturas indígenas e europeia. A miscigenação cultural é característica desta terra e, 
ao mesmo tempo, pouco compreendida. É nesse ponto que devemos nos atentar ao fato da 
cultura dos povos africanos vindos ao Brasil ser pouco compreendida. Sabe-se da capoeira, 
samba e candomblé serem de origem africana, mas de qual parte da África? Seria a África 
um lugar tão sem significado e importância que podemos decretar todos os povos trazidos 
para serem escravizados aqui sem levar em consideração o lugar de origem desses muitos 
10UNIDADE I História e Cultura Africana
que foram enviados para cá? Qual o significado da capoeira: dança ou luta? Se dança, o 
que ela representa, se luta, contra que lutavam? E o samba, por que sambavam? Por ser 
um elemento ritualístico de uma religião ou por alegria? Por que João Gilberto afirmou que 
“Madame não gosta de samba”? Teria o cantor interpretado tal música apenas pela beleza 
da mesma ou o fato de Madame não gostar de samba nos apresenta uma desigualdade 
social que envolve elementos étnico-raciais?
Durante toda a história do Brasil, é realizada a manutenção de mecanismos que 
impediram a ascensão social do negro no Brasil. Durante todo o período colonial (1500-
1522) e imperial (1822-1889) a escravidão imperou de tal forma que até mesmo pressões 
estrangerias de potências mundiais criaram leis internacionais para forçar o Brasil a decla-
rar o fim de sua escravidão. Nenhum país no mundo teve uma escravidão tão duradoura 
quanto a nossa. O Brasil foi o último país no mundo a abolir sua escravidão. Decretos como 
o nº 1.331, de 17 de fevereiro de 1854[1], estabelecia que nas escolas públicas do país 
não seriam admitidos escravos e o Decreto nº 7.031-A, de 6 de setembro de 1878[2], esta-
belecia que os negros só podiam estudar no período noturno e diversas estratégias foram 
montadas no sentido de impedir o acesso pleno dessa população aos bancos escolares. 
Sendo a educação um meio de ascensão econômica e social, o impedimento aos negros 
de estudarem consolidou a manutenção destes nas camadas mais pobres.
Após o fim da escravatura, a teoria do embranquecimento da raça impede o negro, 
agora livre, de conseguir emprego, de alcançar cargos públicos de ser cidadão de fato. O 
imigrante europeu foi trazido ao país para fazer crescer o número de brancos no país e 
assim, embranquecer a população brasileira. O negro fora considerado, durante a primeira 
república, como um ser humano de segunda categoria, menos capaz, menos inteligente.
A história do povo africano no Brasil e sua cultura não pode ser contada sem com-
preender de onde esses povos vieram, porque foram escravizados e porque, mesmo após 
a escravidão, continuaram sendo colocados como cidadãos de segunda classe.
11UNIDADE I História e Cultura Africana
2. AFRICANOS SÃO TODOS IGUAIS? DE ONDE VEIO A POPULAÇÃO NEGRA NO 
BRASIL?
Segundo Alencastro, entre 1551 e 1575, cerca de 25 mil africanos tinham sido 
trazidos ao Brasil. Entre 1576 e 1600, houve um salto considerável para quase 200 mil afri-
canos. Entre 1676 e 1700 houve um pequeno recuo para cerca de 175 mil pessoas trazidas 
da África e mais de 350 mil entre 1741 e 1760[3]. A maior parte dos africanos trazidos ao 
nosso país era da costa oeste africana, sobretudo dos povos sudaneses e banto.
Da África Setentrional, no norte do continente, vieram ao Brasil povos de Castelo 
da Mina, Costa da Mina, povos Ajudá, Bissau, Oorin, Calabar e Cameron. Calcula-se que 
entre 1812 a 1820 17.691 escravizados tenham sido trazidos em 68 navios. Já da África 
Meridional ao sul do continente, 20.841 africanos foram trazidos em 69 navios negreiros ao 
país do Congo, Zaire, Cabinda, Angola, Moçambique, Quillemani, Cabo Lopes, Malambo, 
Rio Ambris e Zanzibar. Esta estatística não nos diz a nacionalidade dos negros trazidos ao 
Brasil, mas nos apresenta que os navios negreiros vinham da costa oeste africana, entre 
povos bantos e sudaneses.
Os dados, ainda que limitados, nos mostram a procedência dessas pessoas trazi-
das para o trabalho escravo no Brasil. O governo inglês proibira o comércio de escravos, 
tornando, assim, a atividade portuguesa em tráfico negreiro, e para despistar os ingleses, 
muitos documentos foram destruídos, outros nunca chegaram a existir com a intenção de 
enganar os britânicos.
O contingente de pessoas trazidas do Oeste da África fora chamado de “ouro negro” 
pelos mercantilistas europeus. Portugueses, franceses, holandeses e ingleses disputavam 
o comércio de escravos bantos e sudaneses no Oceano Atlântico. Reginaldo Brandi diz o 
seguinte sobre esses povos:
 
‘[...] os sudaneses constituem os povos situados nas regiões que hoje vão 
da Etiópia ao Chade e do sul do Egito a Uganda mais ao norte da Tanzânia’. 
Quanto aos bantos, eram povos da ‘África Meridional, estão representados 
por povos que falam entre 700 e duas mil línguas e dialetos aparentados, 
estendendo-se para o sul, logo abaixo dos limites sudaneses, compreenden-
do as terras que vão do Atlântico ao Índico até o cabo da Boa Esperança. O 
termo ‘banto’ foi criado em 1862 pelo filólogo alemão Willelm Bleek e significa 
‘o povo’, não existindo propriamente uma unidade banto na África’.[4]
 
Brandi afirma que bantos e sudaneses são definições genéricas e imprecisas, pro-
duzidas no contexto da apropriação europeia do continente e dos povos da África. Sendo 
assim, afirmações sobre a origem dos africanos no Brasil são quase sempre imprecisas.
12UNIDADE I História e Cultura Africana
Os bantos dividiam-se em dois grupos, os angola-congoleses e os moçambiques e 
tinham como destino o Maranhão, Pará, Pernambuco, Alagoas, Riode Janeiro e São Paulo. 
Os sudaneses também se dividiam em três subgrupos: yorubás, jejes e fanti-ashantis e seu 
destino principal era a Bahia. E, ao contrário do imaginário popular, esses povos falavam 
línguas diferentes, muitas vezes dentro de uma mesma fazenda, existiam escravizados de 
várias etnias e, desta forma, não conseguiam se organizar devido a impossibilidade trazida 
pela linguagem.
13UNIDADE I História e Cultura Africana
3. O QUE FOI A ESCRAVIZAÇÃO?
 
Para compreender a história do nosso país é essencial entender o que foi a ampla 
escravidão de pessoas no Brasil.
Os primeiros registros de escravidão de pessoas são de mais de cinco mil anos 
atrás, na região da Mesopotâmia, basicamente no mesmo tempo das primeiras civilizações 
sedentárias. O Código de Hamurabi estabelecia os parâmetros da escravização de pessoas, 
incluindo condições de vida e origem daquele escravizado da seguinte forma: a compra de 
um escravizado em mercados portuários; a escravização de prisioneiros de guerra e pes-
soas endividadas livres que poderiam ser levadas à escravidão. Essas motivações para a 
escravidão levavam as sociedades a terem múltiplos estratos sociais e estiveram presentes 
em diversas civilizações em diferentes regiões e diferentes períodos de tempo como na 
Grécia e Roma antiga.
No Império Romano, a escravidão estava presente nas mesmas possibilidades, 
incluindo o cenário em que um escravizado poderia conquistar ou comprar, não apenas a 
sua liberdade, mas também sua cidadania, por exemplo, pelo serviço militar. É importante 
notar que esses mecanismos eram universais, sem restrições étnicas e geográficas. Em 
Roma, as pessoas escravizadas poderiam ser romanas, germânicas, cartagineses, celtas, 
trácias, etíopes, basicamente todas as etnias dentro das fronteiras da República ou do 
Império. Entre os povos indígenas americanos, a escravidão pela guerra ou por dívidas era 
praticada, dentre outros, pelos povos mesoamericanos, pelos caribe, pelos comanches e 
14UNIDADE I História e Cultura Africana
os tupinambás. Sociedades chinesas, nórdicas, mongóis e japonesas também mantinham 
a prática da escravidão. Na África, praticamente todas as culturas e sociedades tinham o 
costume da escravidão por guerras ou por dívidas, como no Reino do Congo.
O tema escravidão também está presente nas religiões com séculos de debates 
internos de tradições religiosas, tanto a favor como contra a escravização de pessoas. Por 
exemplo, a ideia de que Noé amaldiçoou os africanos, descendentes de seu filho Cam, 
foi defendida por pessoas que aprovavam a escravização de africanos negros. Na bíblia 
existem regulamentos e menções sobre a escravidão, tanto no Antigo, quanto no Novo 
Testamento e diversos patriarcas bíblicos eram donos de pessoas escravizadas. Além 
disso, os textos regulavam e valorizavam quando uma pessoa libertava outras pessoas da 
escravidão, especialmente pela dedicação religiosa. No islã a escravização era autorizada 
para não muçulmanos que fossem tomados como prisioneiros de guerra ou comprados de 
mercadores de não muçulmanos e a alforria de escravizados que se convertessem ao islã 
era incentivada. Nas sociedades árabes a presença de pessoas escravizadas era bastante 
comum e, assim como no caso do Império Romano, não existiam restrições étnicas ou 
geográficas com a possibilidade de ascensão social de pessoas escravizadas[5].
Pode-se afirmar que até a virada do século XIX para o século XX a escravização 
de pessoas era tragicamente comum em diversas culturas, lugares e períodos históricos. 
Também é importante destacar que a crítica da escravidão também é antiga, por exemplo, 
a realizada pelo legislador ateniense, Sólon.
Em algumas discussões atuais, por vezes evocam a escravidão na antiguidade ou 
a realizada por muçulmanos como uma forma de contrapor ou até minimizar a escravidão 
que aconteceu nas américas entre os séculos XVI e XIX e os seus efeitos que duram 
até hoje. É importante compreender os motivos que fazem com que essa comparação 
seja infundada: a escravidão implantada na América pelos europeus tem origem na Idade 
Média, especialmente com as Cruzadas. Ao leste europeu, as Cruzadas resultaram na 
escravização de bálticos eslavos pelos reinos europeus. A palavra “escravo”, assim como 
a palavra em inglês “slave”[6], ambas vêm de referência aos povos eslavos. Nas Cruzadas 
no mar Mediterrâneo, ocorreram escravização, tanto de muçulmanos quanto de cristãos 
mutuamente.
Movidos pelo espírito chamado “cruzadístico”, inicia-se a expansão ultramarina 
portuguesa com a conquista de povos africanos, que acompanhada em 1452 da Bula Papal 
Dum diversas[7] do Pala Nicolau V que autoriza o rei português, Afonso V, o direito de 
aplicar a escravidão perpétua a sarracenos, pagãos e quaisquer descrentes como parte de 
uma escravidão pela guerra, assim como os casos anteriores. 
15UNIDADE I História e Cultura Africana
[...] outorgamos por estes documentos presentes, com a nossa Autoridade 
Apostólica, permissão plena e livre para invadir, buscar, capturar e subjugar 
sarracenos e pagãos e outros infiéis e inimigos de Cristo onde quer que se 
encontrem, assim como os seus reinos, ducados, condados, principados, e 
outros bens [...] e para reduzir as suas pessoas à escravidão perpétua. [...][8]
 
O papa era a maior autoridade política na Europa naquele período, por isso, uma 
bula papal tinha importância não somente na Europa, mas nos novos territórios que esses 
países conquistavam. Nesta Bula os portugueses eram autorizados a conquistar territórios 
não cristianizados e consignar a escravatura perpétua aos sarracenos e pagãos que cap-
turassem como forma de defesa, uma vez que estes vinham perseguindo e ameaçando 
cristãos da época. Esse documento é considerado frequentemente como o advento do 
comércio e tráfico europeu de escravos na África Ocidental.
Nesse contexto de guerra, entre os séculos XVI e XIX até um milhão de europeus 
foram escravizados por reinos muçulmanos, especialmente para servirem como remadores 
em galés, foram escravizados espanhóis, gregos, italianos e até islandeses. É importante 
notar, entretanto, que esse caráter de guerra religiosa com escravização foi restrito ao 
mediterrâneo e à Europa, não afetando o Brasil e nossa sociedade. Nenhuma expedição 
para captura de pessoas foi realizada por muçulmanos ao solo do continente americano. 
Esse é o primeiro motivo que invalidade a comparação entre a escravização realizada aos 
africanos com as demais escravizações.
Foi a África a região que mais sofreu com a escravização de pessoas de diferentes 
regiões e etnias. Até treze milhões de africanos foram escravizados por reinos muçulmanos, 
outros quatro milhões foram escravizados por povos ocidentais e árabes pelo Oceano Índi-
co e outros vinte milhões escravizados pelo Atlântico, destes, entre 11 e 12 milhões foram 
trazidos para as américas, principalmente para territórios onde hoje são Brasil, Estados 
Unidos da América, além do Caribe e destes, algo entre dois e quatro milhões morreram 
durante o tráfico antes de chegar ao destino final. No Brasil, os primeiros africanos escra-
vizados chegaram em 1538. No total, quatro milhões e oitocentos mil africanos chegaram 
ao litoral brasileiro, fora os que, propositadamente, não foram contabilizados no século XIX.
Com a cada vez maior presença portuguesa no continente africano e sua posição 
geográfica privilegiada, Portugal se torna no maior centro mercador de escravizados da 
Europa. No século XVI, mesmo indo além dos territórios muçulmanos, Portugal já está 
totalmente comprometido com o comércio de africanos escravizados. Outras potências 
europeias também investem nesse comércio de pessoas formado por escravos africanos 
negros.
16UNIDADE I História e Cultura Africana
Esse processo da escravização pelo Atlântico será um fenômeno próprio, diferente 
da escravidão que existia até o momento que já citamos aqui. O comérciode pessoas era 
realizado não mais como consequência de uma guerra justa, mas realizado no Atlântico 
como um processo mercantil. O africano era um produto em si mesmo, para ser lucrati-
vo. Também não era uma escravidão por dívida ou como pena criminal. A escravidão era 
uma atividade ampla, de larga escala, extremamente organizada, lucrativa e base para a 
economia dessas regiões do continente americano na produção de tabaco e açúcar, por 
exemplo. A escravidão do Atlântico é a única que é específica etnicamente, voltada contra 
pessoas negras, mesmo que adotassem o cristianismo. Esse é o segundo motivo que inva-
lida a comparação entre a escravidão do Atlântico e a Antiguidade. Ao contrário da antiga 
sociedade romana, por exemplo, o componente étnico que o tráfico atlântico adiciona ao 
comércio de escravos cria uma estrutura racial, ou seja, existe um povo que, por causa da 
sua cor de pele, é considerado escravo e isso é herdado pelos filhos perpetuamente.
Essa particularidade étnica cria uma estrutura racial. No nosso país, a cor da pele 
era prova suficiente da escravização, ser negro no Brasil e em outros territórios do conti-
nente americano era sinônimo de escravizado. Uma inversão sem o ônus de prova, isto é, 
a pessoa, por ser negra, tinha que provar sua inocência. Essa estrutura dura oficialmente 
mais de trezentos anos. Esse componente étnico da escravidão cria uma série de barreiras 
e efeitos nocivos vistos até hoje em todos os países americanos onde ocorreu a escravidão.
É importante frisar que não se trata de justificar ou amenizar a escravização de 
pessoas em outros lugares, mas enfatizar a importância de compreender que a escravidão 
do Atlântico é um fenômeno próprio que não pode ser comparado a uma estrutura, pois é 
uma estrutura econômica voltada especificamente para o comércio de seres humanos e 
exclusivamente porque é voltada para um típico específico de pessoa, o negro africano. E 
isso gerou e ainda gera problemas que afetam nossa sociedade e a compreensão disso é 
também essencial para superação e conserto desses problemas.
17UNIDADE I História e Cultura Africana
4. O AFRICANO NO BRASIL
A história do africano no Brasil é uma história de resistência. Entre 1500 e 1850, 
mais ou menos doze milhões de africanos foram raptados, escravizados e transportados 
para venda como mercadoria do outro lado do oceano. Cerca de um terço veio para o Brasil, 
que é, de longe, o país que mais recebeu escravos na Idade Moderna. Mas a história dos 
africanos na formação do Brasil vai muito do tráfico negreiro e da escravidão. Resistindo 
à toda violência, do rapto, do tráfico, do cativeiro e da imposição da cultura europeia, os 
africanos reconstruíram suas tradições e criaram diferentes alternativas para sobreviver ao 
escravismo e ao colonialismo.
Por muito tempo a história nos livros apenas falava dos africanos no Brasil como 
mão-de-obra, uma vez que era assim que os europeus os viam. A história dos africanos na 
formação do Brasil começa com o rapto praticado na África, seguido por longas viagens a 
pé até chegar nos navios e, após, a compra por algum fazendeiro no Brasil. E essa história 
prossegue na resistência e na construção de alternativas para buscar a liberdade em solo 
brasileiro.
Na época do descobrimento do Brasil por Portugal, o tráfico de pessoas escravi-
zadas existia em diversas partes da Europa, da África e da Ásia, sendo que os maiores 
praticantes desse comércio eram mercadores árabes. Estima-se que ao longo do século 
XVI, eles traficaram quatro vezes mais pessoas que os europeus. Mas isso foi mudando 
no decorrer do século, quando os portugueses passaram a controlar cada vez mais as 
18UNIDADE I História e Cultura Africana
rotas de comércio no interior da África, ampliando o acesso aos locais onde pessoas eram 
capturadas, criando novas guerras e expedições para escravizar mais pessoas. Eles não 
só conquistaram e ampliaram as rotas africanas, como colocaram essas rotas a serviço de 
um novo tipo de exploração econômica, a agricultura escravista.
Esse tipo de agricultura aconteceu primeiro nas ilhas que Portugal e Espanha 
tinham encontrado no início da expansão marítima, como as ilhas Canárias e Cabo Verde. 
Foi lá que a empresa colonial europeia criou as primeiras áreas de produção que usavam 
mão-de-obra escravizada para produzir mercadorias de grande valor, como o açúcar, que 
na época não era produzido na Europa. A Espanha também passou a comprar africanos 
escravizados para explorar nas ilhas do Caribe, onde as populações indígenas desapare-
ceram completamente.
Apesar da escravização realizada pelos espanhóis, eles não se estabeleceram na 
África, e assim, concederam a Portugal o monopólio desse comércio em acordos conhe-
cidos como asientos. Depois das ilhas atlânticas e do Caribe espanhol, o terceiro território 
que se tornou comprador de pessoas escravizadas foi o Brasil.
Os portugueses se especializaram no negócio escravista, um pioneirismo que 
garantiu a liderança mesmo depois da concorrência holandesa e inglesa entrar na disputa. 
E não só os portugueses, mas também a elite colonial nascida no Brasil que, a partir do 
século XVII, passou a controlar diretamente os portos africanos. Isso contribuiu para que 
um terço dos doze milhões de indivíduos que sobreviveram às travessias ao longo de 350 
anos vieram para o continente americano em navios de bandeira portuguesa ou brasileira.
Estima-se que dos quatro milhões de africanos trazidos para cá em navios ne-
greiros, cerca de 700 mil não sobreviveram à viagem. Para que se tenha uma base, esse 
número é dez vezes o total em toda a história dos Estados Unidos da América.
A história das travessias mudou ao longo do tempo, até porque no começo elas 
eram muito menos frequentes. No primeiro século vieram 34 mil escravos. No segundo sé-
culo foram mais de 900 mil. No terceiro século foram quase 2 milhões. E o auge aconteceu 
no século XIX, na mesma época em que o Brasil se formou como um país independente. 
Entre 1790 e 1830 o Brasil recebeu uma média de 17 mil escravizados por ano.
A história da escravização e da migração forçada geralmente começava com algu-
ma guerra entre diferentes povos da África, com ou sem a participação direta dos poderes 
europeus. Nessas guerras eram feitos prisioneiros, que ao longo da época das navegações 
começaram a ser vendidos para comerciantes e militares europeus. Também poderiam ser 
escravizadas por dívidas ou crimes e ainda existiam os que eram simplesmente raptados 
por comerciantes e militares europeus, sem qualquer tipo de acordo com os poderes locais.
19UNIDADE I História e Cultura Africana
O sucesso da empresa colonial no Brasil, no Caribe e em outras regiões da América 
fez com que mais investidores europeus se envolvessem no negócio, com apoio dos reis 
e da Igreja Católica, aumentando a demanda de escravos. O aumento da demanda e a 
concorrência entre as potências europeias fez com que a escravização se tornasse uma 
prática de dimensões muito maiores em qualquer momento na história da humanidade.
Existem poucas fontes publicadas mostrando o ponto de vista dos escravizados. 
Uma dessas fontes é a autobiografia de Mahommah Gardo Baquaqua, publicada em inglês 
em 1854 e traduzida para o português em 1988. Baquaqua nasceu na África Ocidental, hoje 
Genin, e pertenceu a uma família muçulmana poderosa. Graças a isso, ele foi alfabetizado 
em árabe e em ajami, que é uma escrita árabe praticada ao sul do Saara, e teve menor 
dificuldade para aprender sobre as línguas e culturas dos dominadores ao longo de sua 
vida.
O relato de Baquaqua mostra como era a experiência de se tornar escravo. Ele 
descreve desde a surpresa quando viu um homem branco pela primeira vez, ao chegar 
num grande porto do litoral africano, e conta que lá reencontrou por acaso um conhecido 
vindo de sua região. Também descreve como foi a viagem dentro do tumbeiro – navio 
negreiro – e comoresistia à escravidão todos os dias no Brasil.
Uma característica do tráfico negreiro era que ele misturava gente das mais varia-
das origens, etnias e línguas, quebrando os vínculos familiares, comunitários e religiosos. A 
pessoa era vendida como uma unidade, que pode ser separada dos pais, dos filhos e dos 
cônjuges, e uma vez separados, os reencontros eram raros. Isso fazia com que as pessoas 
que pertenciam a povos diferentes dividissem espaços nos navios e nas senzalas, o que 
era útil para os traficantes de escravos, pois evitava a união de todos contra eles.
Baquaqua também relatou que os europeus se esforçavam para apagar as identi-
dades das pessoas que eles escravizavam. Por exemplo, ao chegarem na feitoria comercial 
as pessoas tinham os cabelos cortados iguais para destruir suas identidades, já que, nas 
palavras de Baquaqua: “Na África, as nações das distintas partes do território têm seus 
modos diferentes de cortar o cabelo e são conhecidas por essa marca, a que parte do ter-
ritório pertencem[9]”. O que Baquaqua descreve é a tentativa europeia de transformar cada 
indivíduo escravizado numa “peça’ que pode ser vendida como qualquer outra mercadoria. 
Mas ele descreve também a resistência que é a grande marca de sua biografia.
Mohammah Baquaqua tinha sido feito prisioneiro numa guerra, depois foi escra-
vizado e embarcado num navio negreiro com destino ao Brasil, e em todo esse percurso 
ele narra a violência das correntes, das jaulas e das tentativas de destruir sua identidade. 
Quando viu uma grande embarcação pela primeira vez, a achou tão grandiosa que pensou 
20UNIDADE I História e Cultura Africana
se tratar de um objeto de adoração dos brancos. Já no embarque, trinta pessoas morreram 
afogadas quando afundou um dos barcos que os levava ao navio. A viagem foi um grande 
tormento. Muitos morreram. Baquaqua jamais esqueceu os horrores da travessia. A única 
comida que ele recebeu foi milho velho cozido, e um pouco de água. Segundo ele: “quando 
qualquer um de nós se tornava rebelde, sua carne era cortada com uma faca e o corte 
esfregado com pimenta e vinagre, para torna-lo pacífico”[10].
Os sobreviventes foram vendidos em Pernambuco, num mercado que funcionava 
na casa de um fazendeiro. Ele ficou dois dias esperando um comprador, que foi um comer-
ciante que o revendeu a um padeiro. O livro relata a experiência de trabalhar para este e 
outros proprietários e como sua liberdade foi conquistada de forma excepcional. Depois de 
trabalhar com o padeiro que o comprou, ele sofre castigos terríveis e tentou suicídio. 
As coisas iam de mal a pior e estava muito ansioso para trocar de senhor, 
então tentei fugir, mas logo fui apanhado, atado e restituído a ele. [...] fui mui 
severamente espancado. Eu disse a ele que não deveria mais me açoitar e 
fiquei com tanta raiva que me veio à cabeça a ideia de matá-lo e, em seguida, 
suicidar-me. [...]. [11]
 Diante da tentativa de suicídio foi vendido a outro proprietário, que fazia viagens 
marítimas pelo litoral brasileiro. Numa viagem a nova York, em 1847, ele conseguiu fugir com 
ajuda de religiosos abolicionistas dos Estados Unidos. Ele já sabia falar diversas línguas, 
incluindo o árabe, o português e o francês e aprendeu a escrever em inglês. Mudou-se 
para o Canadá, onde escreveu seu livro, depois foi para o Haiti, que era o único país do 
continente onde os negros chegaram ao poder. O final de sua vida não é conhecido, mas 
seus planos eram de retornar ao continente africano.
Essa história tem algo em comum com as demais histórias dos sobreviventes do 
tráfico negreiro, seja pela fuga, pela revolta ou pela negociação e busca de alforria: a resis-
tência.
21UNIDADE I História e Cultura Africana
5. A RESISTÊNCIA NEGRA
 
A resistência à escravização começava na África onde os capturados frequente-
mente tentavam fugas e revoltas e continuava nos navios negreiros, exemplo disso foi o 
navio La Amistad[12], quem em 1839 transportava clandestinamente pessoas para vender 
em Cuba, mas que foram frustrados por uma rebelião. Eles acabaram chegando ao sul dos 
Estados Unidos, onde a escravidão era legal, mas não o tráfico internacional de escraviza-
dos, o que levou essa situação a um tribunal. Segundo Baquaqua, os navios eram a pior 
parte da experiência, mas também era apenas o começo.
Mohammah Baquaqua relatou que o padeiro que o comprou em Pernambuco tinha 
tentado convertê-lo ao catolicismo à base de ameaças e açoites. Assim como aconteceu 
no caso das culturas e religiosidades indígenas os africanos eram submetidos às leis e 
instituições europeias que agiam em nome da conversão dos pagãos ao cristianismo[13].
Muitas tradições com origens africanas e indígenas se mantiveram e se mantêm 
vivas, além de terem se incorporado ao sincretismo religioso brasileiro. A sobrevivência 
de tradições, línguas e religiões e formas de expressão corporal e artística ao longo dos 
séculos foi o resultado de esforços imensos de muitas gerações para resistir às estratégias 
da elite escravista brasileira.
A imposição violenta também era uma das estratégias dos senhores para obter seu 
domínio sobre os escravizados. Torturas, marcas à ferro, correntes e troncos foram usa-
dos consistentemente no período escravagista. É algo próprio da natureza da escravidão. 
Enquanto no trabalho assalariado trabalha-se para não ficar sem dinheiro, na sociedade 
escravista trabalha-se para não ser torturado ou mesmo assassinado. A violência era a 
base do funcionamento do sistema escravista. A violência não era a única forma de con-
trole do sistema escravocrata, ela convivia com estratégias, negociações e promessas de 
liberdade.
Baquaqua conta que se esforçou ao máximo para mostrar serviço aos seus se-
nhores e também para aprender coisas que tornavam seu trabalho melhor, tipo a língua 
portuguesa. Quando aprendeu a contar até 100 em português, foi encarregado de vender 
pão na vila onde vivia e também nos campos e no mercado local, mas como ele conta no 
seu relato essas melhorias não significavam o fim da violência. Quando ele não conseguia 
vender todos os pães era açoitado no fim do dia.
Negociações entre senhores de escravos também aconteciam nas fazendas, sendo 
que neste caso as melhorias podiam incluir um pedaço de terra e um dia de folga por sema-
na. Alguns até mesmo conseguiam vender uma parte do que plantavam e juntar pequenas 
22UNIDADE I História e Cultura Africana
economias que podiam ser usadas para comprar alforria para si ou para os filhos. Era muito 
comum que pais e mães passassem a vida dedicados a livrar os filhos da escravidão. Para 
os senhores conceder melhorias e alforriar algumas pessoas era vantajoso, pois diminuía 
as chances de rebeliões.
Ainda em seu relato, Baquaqua conta alguns episódios que cogitou a possibilidade 
de atacar seus agressores, mesmo sabendo que suas chances eram muito pequenas e 
que sofreria as piores consequências possíveis. Além disso, muitos buscavam o suicídio e 
o desespero de saber que os filhos também sofreriam com a escravidão fazia com que as 
grávidas provocassem abortos. Os escravizados também manifestavam sua insatisfação 
prejudicando os lucros do senhor de escravos. Quebravam peças do engenho que demo-
ravam para serem substituídas, incendiavam plantações, escondiam e contrabandeavam 
ouro e diamante dentre outras coisas.
Baquaqua tentou o caminho da lealdade ao seu senhor, mas acabou desiludido. 
Segundo ele, o padeiro não oferecia qualquer retorno a seus esforços por se mostrar 
prestativo e obediente. Sem o reconhecimento de seu senhor, abandonou a estratégia da 
obediência. Ao ser vendido pelo padeiro a um traficante, foi levado para ser comercializado 
no Rio de Janeiro e quase foi comprado por um senhor de escravos também negro. O que 
acontecia no Brasil, não chegava a ter uma relevância tão expressiva quanto o número de 
senhores de escravos brancos, porém, a escravização de negros por outros negrosno Bra-
sil era frequente e bem mais comum no nosso país do que em outras regiões escravistas 
do continente.
Negociantes de Portugal e do Brasil controlavam o grande negócio do tráfico ne-
greiro por meio dos domínios de regiões estratégicas. Esse controle garantia baixos custos 
e estabilidade no fornecimento de pessoas escravizadas para as lavouras brasileiras, ao 
contrário dos Estados Unidos, por exemplo. Como era barato e fácil comprar escravos 
recém-chegados não era mal negócio para os senhores alforriar alguns escravizados. 
Desta forma os senhores podiam contar com aliados no controle dos escravos. Além de 
a promessa de alforria de alguns estimulava outros a serem leais em busca de liberdade.
As chances reais de alcançar a alforria eram muito pequenas. No caso baiano, por 
exemplo, apesar da maioria dos escravizados terem vindo da África, 69% dos alforriados 
eram negros nascidos escravos no Brasil. Quanto mais se distanciavam de suas origens, 
mais tinham acesso às brechas do sistema. Os nascidos no Brasil tinham mais chances 
que os nascidos na África, assim como os que falavam bem o português e seguiam a Igreja 
Católica. Os referidos como pardos também tinham mais chances que os referidos como 
pretos, isto é, quanto mais escura era a pele, menores eram as chances de conseguir a 
23UNIDADE I História e Cultura Africana
carta de alforria. Os escravizados que trabalhavam na Casa Grande tinham mais chances 
de alforria que os trabalhadores nas plantações e apenas da grande maioria das pessoas 
trazidas serem homens, libertavam duas vezes mais mulheres. Isso não representa um me-
lhor trato à mulher negra em relação ao homem negro. Muitas alforrias dadas às mulheres 
e crianças eram na verdade consequência da violência sexual realizada pelos senhores. 
De acordo com as leis escravistas o que definia se uma criança era livre ou escrava era a 
condição da mãe, sendo assim, se a mãe fosse livre, a criança era livre, se fosse escraviza-
da, a criança também era. Desta forma, mesmo os filhos bastardos dos senhores com uma 
escravizada, também nascia escravo.
Os senhores tratavam alguns escravizados melhores que os outros, por ter a pele 
menos escura, por trabalhar na Casa Grande, por ter nascido no Brasil, etc. Essas dife-
renças de tratamento por parte dos senhores criavam hierarquias e rivalidades entre os 
escravizados, sobretudo entre nascidos no Brasil e os nascidos na África e também entre 
os trabalhadores do campo e os que trabalhavam na Casa Grande.
Como já vimos no relato de Baquaqua, o tráfico negreiro separava pessoas que 
tinham origens e culturas em comum exatamente para dificultar a união entre os escravi-
zados e no interior dos engenhos o tratamento desigual também servia para reforçar essa 
desunião, dificultando a resistência. Os escravizados não eram geralmente um grupo uni-
forme e unido, mas sim pessoas muito diferentes entre si, se preocupando com sua própria 
sobrevivência, e apesar de todos os esforços dos senhores, continuaram resistindo, fosse 
através da lealdade conquistando pequenas melhorias no dia-a-dia, fosse pela obtenção 
do documento de alforria, fosse pelo boicote à produção da cana-de-açúcar, fosse pelo 
assassinato do feitor, fosse pela fuga para um quilombo.
24UNIDADE I História e Cultura Africana
6. OS QUILOMBOS COMO SINÔNIMO DE RESISTÊNCIA NEGRA
A palavra quilombo existe no Brasil a quase 450 anos e já esteva presente em 
textos escritos pelos colonizadores portugueses desde 1559. Nos textos escritos pelos 
portugueses a palavra quilombo tinha um significado muito simples: “um grupo de escravos 
fugidos que cabia às autoridades capturar ou exterminar” de acordo com as leis da época. 
Para os que viviam em quilombos, a palavra tinha um significado muito mais profundo, 
era uma forma de organização social para a defesa da liberdade. Na formação do Brasil 
a escravidão estava por toda a parte, nos engenhos, nas vilas e cidades criadas pela co-
lonização europeia e os quilombos eram uma negação deste mundo em uma busca pela 
emancipação.
Em cartas, relatórios, leis e outras fontes portuguesas temos acesso a diversas 
informações sobre como eram os quilombos e quem eram seus habitantes. Nessas fontes 
são descritas as habitações, as roças plantadas, o tempo de permanência da comunidade 
no local, as tecnologias que elas dominavam e as pessoas capturadas ou mortas. Nem sem-
pre os portugueses destacavam o nome dos escravizados, costumavam anotar as idades, 
sexo, locais de origem, etc. Essas informações eram importantes para as estratégias dos 
colonizadores que buscavam entender a resistência dos negros para melhor combatê-la e 
hoje servem para que conheçamos suas histórias, lutas e como era viver em um quilombo.
Para a historiadora, Maria Beatriz Nascimento, pioneira nos estudos dos quilombos, 
brasileira, trabalhou em Angola onde investigou o que significa quilombo na época em que 
essa palavra atravessou o oceano e chegou ao Brasil. Sua pesquisa concluiu que quilombo 
é um conceito que tem origem nos povos bantos, habitantes da África Centro-Ocidental e 
Leste.
Precisamente, a palavra é usada durante os séculos XVI e XVII para definir os 
acampamentos dos guerreiros jaga que resistiram por muito tempo aos colonizadores gra-
ças à sua forma de organização guerreira, mas acabaram se aliando aos europeus como 
forma de sobrevivência. Resistir à colonização era defender a própria liberdade, já que os 
europeus vinham realizando guerras para transformar o tráfico de pessoas escravizadas 
em um grande negócio. No Brasil, essa forma de organização serviu para que esses es-
cravizados continuassem resistindo à violência da escravização nos engenhos e em outras 
atividades.
Os primeiros quilombos da América surgiram em meados do século XVI e isso 
aconteceu não somente no Brasil, mas em todo o continente. “Onde houve escravidão, 
houve resistência”[14]. Segundo os historiadores João José Reis e Flávio dos Santos Go-
25UNIDADE I História e Cultura Africana
mes, de todas as formas de resistência à escravidão que existiram no Brasil, a mais típica 
foi a fuga para formação de quilombos. Esses quilombos existiram do Rio Grande do Sul ao 
Amazonas e se formaram em todas as épocas da história do Brasil, desde o século XVI ao 
final do século XIX, quando foi abolida a escravidão.
O mais importante e conhecido quilombo do Brasil foi Palmares, também conhecido 
por seus habitantes por Angola Janga. O quilombo surgiu na Serra da Barriga entre os 
estados de Alagoas e Pernambuco por volta de 1580. A Serra da Barriga era uma região 
afastada das áreas ocupadas pelos portugueses e o acesso que já era difícil, passou a ser 
cada vez mais vigiado pelos quilombolas permitindo que a população dos Palmares cres-
cesse e um pequeno agrupamento se tornasse em um grande complexo de povoações. 
Sua produção incluía o plantio de milho, batata-doce, feijão, banana, criação de porcos e 
galinhas, a pesca, a caça, a fabricação de utensílios e instrumentos musicais e armar, in-
clusive de metal. Toda essa produção estava voltada para objetivos da própria comunidade, 
sendo o primeiro deles a proteção contra ameaças de escravização.
Ao longo de mais de um século, Palmares acolheu diferentes gerações de pessoas 
que conseguiam escapar das senzalas e dos canaviais. O quilombo dos Palmares não só 
cresceu como se tornou um Reino, Angola Janga, era provavelmente o fruto de uma união 
de duas linhagens de guerreiros africanos, a linhagem do reino fundada por Mbundu N’Go-
la, que também é a origem do nome do país africano, Angola e a linhagem dos guerreiros 
jagas[15], que utilizavam a denominação quilombo para seus acampamentos. É possível 
que o Reino Angola Janga (Palmares) tenha origem na liderança de uma princesa que já 
havia comandado batalhas contra os europeus na África antes de ser escravizada. Seu 
nome era Aqualtune e seu caso não foi o único, pois muitos herdeiros de linhagensreais 
africanas foram trazidos para a América para serem escravizados, além de chefes políticos, 
militares e religiosos.
A existência desses líderes as vezes se tornava uma ameaça séria para a escravi-
dão, já que podiam reorganizar as estruturas de poder que existiam na África. A história do 
Quilombo dos Palmares está cheia de exemplos dessa reinvenção das tradições africanas. 
O primeiro Rei de Angola Janga que teve contato com os europeus foi Ganga Zumba, 
mesmo nome que era dado aos reis Imbangala no Leste da África. Além do nome, Ganga 
Zumba também usava o cabelo em tranças longas e adornadas de conchas que, de acordo 
com sua tradição, representava autoridade, exatamente como os reis Imbangala. Como 
já expresso por Baquaqua, a primeira coisa que os colonizadores faziam ao capturar ou 
traficar um africano para ser escravizado, era cortar seus cabelos para tentar eliminar suas 
tradições.
26UNIDADE I História e Cultura Africana
O estilo de guerra praticado em Palmares ou Angola Janga, também eram inspira-
dos em tradições africanas. O quilombo se organizava em torno de povoados que recebiam 
o nome de mocambos e que mesmo sendo distantes entre si estavam ligados por uma 
rede mito eficaz de comunicação e mobilização de guerreiros. Uma estrutura pensada para 
defesa contra investida dos colonizadores que atacavam sempre de surpresa e que tornava 
necessária uma vigilância constante.
A estratégia de defesa foi tão bem-sucedida que ao longo do século XVII Palmares 
derrotou inúmeras tentativas portuguesas e holandesas de destruição. A primeira expedi-
ção conhecida ocorreu em 1655 quando o governo português conseguiu capturar alguns 
quilombolas e descobrir mais ou menos como se organizavam os mocambos. Nesta época, 
Pernambuco vivia o pior momento de uma grave crise de fome que atingiu principalmente 
as vilas e cidades portuguesas, como Olinda e Recife.
A fome era uma consequência do tipo de economia que os portugueses se estabe-
leceram na região com o foco total na produção de açúcar, deixando pouco espaço para a 
produção de artigos de primeira necessidade. Com a fome, as fugas para Palmares aumen-
taram, pois chegavam as notícias de que por lá havia comida. Com as fugas, os quilombos 
aumentavam sua população e sua capacidade de resistência a cada dia, levando senhores 
de engenho e autoridades portuguesas a concentrarem suas forças na sua destruição.
Destruir Palmares não era fácil, tanto pela distância e dificuldade do caminho quanto 
pelas técnicas de guerra que iam de postos de observação a armadilhas. Também ajudavam 
na defesa habitantes da região que dependiam dos alimentos do quilombo e o apoiavam. 
Pequenos proprietários de terras de origem portuguesa compravam comida de Palmares 
em troca de pólvora e armas de fogo, já que em Palmares não faltava comida, mas faltavam 
armas e munições para fazer frente às expedições portuguesas. Os quilombolas também 
trocavam seus alimentos por informações sobre os movimentos das tropas inimigas, além 
de manterem uma rede de informantes.
Apesar de todas as estratégias, as expedições dos portugueses e holandeses 
fizeram muitos estragos com a destruição de plantações, o incêndio de casas e a morte ou 
captura de muitos habitantes. Com as perdas dos Palmares, o rei Ganga Zumba aceitou 
fazer um acordo de paz com o capitão-general de Pernambuco, que representava o rei de 
Portugal. Esse acordo reconhecia a liberdade das pessoas nascidas em Palmares, mas 
não das pessoas que continuavam fugindo dos engenhos e das cidades. O acordo de paci-
ficação já havia sido proposto em 1663. O governador de Pernambuco enviara intérpretes 
de línguas africanas para negociações, mas foram assassinados pelos quilombolas.
Para quem tinha nascido em Palmares, aceitar um acordo poderia ser uma forma 
27UNIDADE I História e Cultura Africana
de tentar garantir sua liberdade sem precisar viver em constante ameaça, mas ao mesmo 
tempo o acordo enfraquecia Palmares, pois se fechava a novos membros em busca de 
emancipação. Depois de aceitar o acordo, o Rei Ganga Zumba acabou desacreditado e 
foi envenenado por seus próprios súditos, dando lugar ao último e mais importante líder 
de Palmares, Zumbi, que havia nascido em Palmares e teria sido um dos beneficiários do 
acordo de Ganga Zumba, mas entendia que a liberdade não poderia ser apenas para os 
que haviam nascido em Angola Janga (Palmares), mas sim para todos os negros, africanos 
ou não.
Zumbi nasceu livre, na Serra da Barriga, mas a liberdade durou pouco, quando 
ele ainda era bebê foi capturado por uma expedição e dado de presente a um padre que 
o rebatizou com um nome europeu, Francisco, em homenagem ao padre católico protetor 
dos pobres. Aos 15 anos o jovem se recusou a continuar sendo o escravo Francisco e 
retornou à sua terra natal para se tornar Zumbi[16]. Aos 17 anos comandou os guerreiros 
que venceram a maior expedição que já tinha sido montada para destruir Palmares.
Zumbi se tornou rei quando já era um guerreiro famoso depois de liderar uma rebe-
lião contra Ganga Zumba e contra a aliança de paz com os portugueses. Em seu reinado 
Palmares virou uma fortaleza e o mocambo principal chamado Macaco chegou a contar 
com uma muralha de cerca de cinco quilômetros de extensão.
A cada expedição portuguesa, Zumbi reagia com ataques aos engenhos que re-
sultavam na libertação de mais pessoas escravizadas, na aquisição de novas áreas para o 
quilombo e no incêndio dos canaviais que destruía a fonte de riquezas das forças inimigas. 
Zumbi usava verdadeiras táticas de guerra contra os colonizadores.
Os portugueses tentaram um novo acordo de paz rejeitado por Zumbi. Então, o 
governador de Pernambuco decidiu chamar um exército de bandeirantes paulistas para 
tentar destruir Palmares. Os bandeirantes eram comandados por Domingos Jorge Velho 
que tinha uma longa experiência nas guerras por escravização de povos indígenas em São 
Paulo.
Os Bandeirantes chegaram em 1691 em Pernambuco e foram derrotados na pri-
meira investida contra Palmares. Em 1693 voltaram com um exército de nove mil homens e 
continuaram avançando. No dia 20 de novembro de 1695 Zumbi foi morto numa emboscada 
armada pelos bandeirantes.
Depois de mais de um século de resistência o quilombo dos Palmares teve seus 
últimos habitantes degolados. Era o fim do maior quilombo que já existiu no Brasil, mas 
era apenas um capítulo da longa história da resistência quilombola que se reinventou e se 
espalhou por todas as regiões do país por muitos anos que viriam.
28UNIDADE I História e Cultura Africana
SAIBA MAIS
Mahommah Gardo Baquaqua foi um homem africano, sequestrado escravizado por tra-
ficantes. Nativo de Zooggoo na África Central (atual municipalidade de Djougou, no 
Benim), um reino tributário do reino de Bergoo, trabalhou no Brasil como cativo, contudo 
conseguiu fugir para Nova York em 1847 garantindo sua liberdade. O navio, que chegou 
a Nova Iorque em junho, foi abordado por abolicionistas locais, que o incentivaram a fugir 
do navio. Após a fuga, no entanto, foi preso na cadeia local, e apenas a colaboração dos 
abolicionistas (que facilitaram a fuga da prisão) impediu que fosse restituído ao navio. 
Foi então enviado ao Haiti, onde passou a viver com o reverendo Judd, um missionário 
batista. Convertido e batizado, em 1848, Baquaqua retornou aos Estados Unidos devido 
à instabilidade política que o Haiti vivia então; estudou no New York Central College, 
em McGrawville, por quase três anos. Em 1854 foi para o Canadá e sua bibliografia foi 
publicada no mesmo ano por Samuel Downing Moore em Detroit.
Não se sabe o que acontece com Baquaqua depois de 1857. Ele estava então na Ingla-
terra e havia recorrido à Sociedade da Missão Livre Batista Americana para ser enviado 
como missionário à África.
Em 2018, a biografia de Mahommah Baquaqua foi apresentada como enredo no carna-
val virtual, pelo G.R.E.S.V. Recanto do Beija-flor.
Sua biografiafoi publicada pelo abolicionista estadunidense Samuel Moore em 1854, 
seu relato foi fundamental pois revelou detalhes das operações do tráfico negreiro da 
época.
 
REFLITA
“Oh! a repugnância e a imundície daquele lugar horrível (navio negreiro) nunca serão 
apagadas de minha memória. Não: enquanto a memória mantiver seu posto nesse cé-
rebro distraído, lembrarei daquilo. Meu coração até hoje adoece ao pensar nisto.”
Baquaqua. Mohammah Gardon. Biografia. p. 272.
 
29UNIDADE I História e Cultura Africana
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa viagem chega ao fim. O espaço de experiência contemplado nos apresentou 
um negro no Brasil que fora trazido à revelia ao país. Não foi uma bela viagem, porém, 
humanizante.
Conforme vimos, o negro no Brasil fora colocado sob um trabalho compulsório. 
Uma vez aqui, teve de resistir das mais diversas formas. Uns optaram pela estratégia da 
obediência e lealdade. Era a melhor forma, para alguns, de se apegarem às suas próprias 
vidas. Outros, boicotaram a produção, quebraram peças dos mecanismos do engenho ou 
queimaram as lavouras podendo garantir algum tempo de descanso. Ou isso ou continuar 
trabalhando dezesseis horas por dia cortando cana-de-açúcar. Alguns, em total desespero, 
ou tiravam as vidas de seus senhores ou até mesmo tiravam suas próprias vidas, pois para 
estes, a morte era a única saída de tal situação. E ainda tiveram aqueles que braviamente 
fugiram das fazendas e construíram vilas chamadas de concentrações quilombolas.
Aprendemos que o africano no Brasil tem sua própria história e que essa história 
é a história do próprio Brasil. Ela nos construiu e continua nos construindo, sendo assim, 
não podemos deixar que ela seja esquecida, não apenas porque a escravidão é um crime 
contra a humanidade, mas porque a cultura africana está presente no nosso dia-a-dia e 
muitas vezes nem percebemos.
 
30UNIDADE I História e Cultura Africana
Leitura Complementar
LARA, Silvia Hunold. Biografia de Mohammah Gardon Baquaqua. Revista História Brasilei-
ra, São Paulo, v. 8, n. 16, p. 269-284, 1988. 
Material Complementar
 
LIVRO 
Título: O Trato dos Viventes: Formação do Brasil no Atlântico Sul 
– Séculos XVI e XVII.
Autor(a): Luiz Felipe de Alencastro.
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: O padre Antônio Vieira escrevia: “Angola... de cujo triste 
sangue, negras e infelizes almas se nutre, anima, sustenta, serve 
e conserva o Brasil”. Em O trato dos viventes, o historiador Luiz 
Felipe de Alencastro mostra que a colonização portuguesa, ba-
seada no escravismo, deu lugar a um espaço econômico e social 
bipolar, englobando uma zona de produção escravista situada no 
litoral da América do Sul e uma zona de reprodução de escravos 
centrada em Angola.
FILME/VÍDEO 
Título: Amistad
Diretor: Steven Spielberg
Ano: 1997
Sinopse. Costa de Cuba, 1839. Dezenas de escravos negros se li-
bertam das correntes e assumem o comando do navio negreiro La 
Amistad. Eles sonham retornar para a África, mas desconhecem 
navegação e se vêem obrigados a confiar em dois tripulantes so-
breviventes, que os enganam e fazem com que, após dois meses, 
sejam capturados por um navio americano, quando desordenada-
mente navegaram até a costa de Connecticut. Os africanos são 
inicialmente julgados pelo assassinato da tripulação, mas o caso 
toma vulto e o presidente americano Martin Van Buren (Nigel Haw-
thorn), que sonha ser reeleito, tenta a condenação dos escravos, 
pois agradaria aos estados do Sul e também fortaleceria os laços 
com a Espanha, pois a jovem Rainha Isabella II (Anna Paquin) 
alega que tanto os escravos quanto o navio são seus e devem ser 
devolvidos. Mas os abolicionistas vencem, e no entanto o governo 
apela e a causa chega a Suprema Corte Americana. Este quadro 
faz o ex-presidente John Quincy Adams (Anthony Hopkins), um 
abolicionista não-assumido, sair da sua aposentadoria voluntária, 
para defender os africanos.
31UNIDADE I História e Cultura Africana
 
WEB
Apresentação do link: Canal Revisão. Tráfico Negreiro. Apresentação de Pirula. 
Tópicos abordados: Os africanos na formação do Brasil, para além da escravidão; História 
do tráfico de pessoas escravizadas na África, e da África para a América; O predomínio 
português e brasileiro no mercado atlântico de escravos; O processo de escravização da 
perspectiva de um africano (Mahommah Gardo Baquaqua); As experiências e as estraté-
gias para a conquista da liberdade.
Link do site: https://www.youtube.com/watch?v=TjcQTVLQDF0
 
Apresentação do link: Canal Nerdologia. A Origem da Escravidão no Brasil. Apre-
sentação e Roteiro de Felipe Figueiredo. Tópicos abordados: A origem da escravidão nas 
sociedades agricultoras; As primeiras sociedades escravagistas na antiguidade; A escravi-
dão como prática durante a Idade Média; A escravidão árabe e europeia; A escravidão no 
continente africano; A escravidão moderna no Oceano Atlântico e seu caráter econômico e 
racial; A escravidão do Atlântico como fenômeno novo e incomparável aos demais tipos de 
escravidão.
Link do site: https://www.youtube.com/watch?v=qXBmkswwRfw
https://www.youtube.com/watch?v=TjcQTVLQDF0
https://www.youtube.com/watch?v=TjcQTVLQDF0
https://www.youtube.com/watch?v=qXBmkswwRfw
https://www.youtube.com/watch?v=qXBmkswwRfw
32UNIDADE I História e Cultura Africana
[1] Vide link na referência bibliográfica.
[2] Idem 1.
[3] ALENCASTRO: 2000.
[4] BRANDI: 2000.
[5] Importante destacar que árabes e muçulmanos não são a mesma coisa. Árabe se refere a um povo que 
surgiu na península arábica, onde hoje está a Arábia Saudita e muçulmano é o seguidor da religião islâmica.
[6] Palavra inglesa referente a escravo.
[7] Bula papal redigida no dia 18 de Junho de 1492 pelo Papa Nicolau V.
[8] Assunção: 2004.
[9] LARA: 1988.
[10] Idem 9.
[11] LARA: 1988.
[12] Esse acontecimento inspirou o cineasta Steven Spielberg a produzir o filme Amistad.
[13] Entenda-se aqui cristianismo como catolicismo, uma vez que o cristianismo protestante não era permitido 
no Brasil até o início do século XIX, mesmo assim, após a permissão de culto protestante no Brasil, o mesmo 
não poderia ser realizado em locais públicos estando limitados a celebrações domésticas.
[14] GOMES, Flávio dos Santos; REIS, João José. Liberdade por um fio. São Paulo. Companhia das Letras. 
1996.
[15] Designação genérica para grupos étnicos nômades guerreiros da África de origem ainda incerta.
[16] Fantasma ou espectro no idioma quimbundo. 
33
Plano de Estudo:
1. OS AGENTES DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL
2. O MAIOR LEGADO DA ESCRAVIDÃO: O RACISMO
 
Objetivos de Aprendizagem:
● Compreender o processo de abolição no Brasil e evidenciar o movimento abolicionista 
para destacar que foram os negros que lideraram esse processo e não uma princesa 
branca ou grupos brancos como se está no imaginário popular.
● Contextualizar o racismo no Brasil como um fenômeno que surge com a escravidão e não 
acaba com o fim da mesma, pois vários mecanismos de desprezo a população negra no 
Brasil ocorre durante a nossa história pós fim da escravatura.
● Compreender os dois tipos de preconceitos categorizados por Oracy Nogueira, o de 
marca e o de origem para que o aluno possa compreender que o racismo se apresenta de 
diversas formas em diversos locais do mundo
● Estabelecer a importância de entendermos que o Brasil é um país racista e que esse 
racismo é camuflado, escondido e que se torna evidente em momentos de conflito de 
forma cruel.
UNIDADE II
O Negro no Brasil: Abolição 
e seu Legado
Professor Especialista Paulino Augusto Peres
34UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
Olá, caros estudantes. Iniciamos no módulo anterior nossa viagem ao passado para 
compreendermos como foi a escravidão no Brasil. Neste módulo essa viagem continua. A 
iniciamos com a abolição da escravatura no nosso país.
Em uma de nossas paradas perceberemos que a abolição da escravidão no Bra-
sil pouco tem a ver com movimentos brancos. O abolicionismo foi liderado por negros. 
Aprincesa Isabel, abolicionista, era apenas uma personagem na abolição, os principais 
protagonistas eram negros.
Em nossa última parada você terá contato com uma comparação realizada pelo 
sociólogo Oracy Nogueira sobre o preconceito nos Estados Unidos e Brasil, sendo a versão 
americana nomeada preconceito de origem e no Brasil, preconceito de marca.
Espero que você compreenda o racismo como legado da escravidão negra no 
Brasil durante mais de 300 anos.
INTRODUÇÃO
35UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
1. OS AGENTES DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL
https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2010/05/carta-lei-aurea.jpg
Em 2018 tivemos o aniversário de 130 anos da assinatura da lei áurea que encer-
rou escravidão de pessoas negras no Brasil. Costumamos ver essa lei nas escolas como 
se tivesse acontecido de repente com uma assinatura e fim. A Lei Imperial nº 3.353, nome 
https://www.infoescola.com/wp-content/uploads/2010/05/carta-lei-aurea.jpg
36UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
oficial da Lei Áurea, foi apresentada à Câmara Geral, atual Câmara dos Deputados, pelo 
então ministro da agricultura no dia 8 de maio de 1888. Foi aprovada e levada ao Senado 
que também a aprovou no dia 13 de maio e após foi assinada pela princesa Isabel como 
regente do Brasil.
A luta pela abolição, entretanto, tinha começado bem antes. Os primeiros movimen-
tos abolicionistas no Brasil foram sociedades religiosas como os jesuítas que protestavam 
contra a escravidão de indígenas ainda no século XVII. O modelo de escravidão indígena já 
estava em declínio, substituído pela escravidão negra africana, mais lucrativa e geralmente 
aceita.
Oficialmente a escravidão indígena foi proibida em 1757 por meio de um decreto 
do Marquês de Pombal, então Secretário de Estado do Reino de Portugal. Alguns anos 
depois em 1761 o mesmo Marquês de Pombal decretou o fim da escravidão negra, porém, 
isso foi implementado apenas na metrópole europeia, territórios na Índia e depois à ilha de 
madeira.
Para a Coroa abolir a escravidão negra na América seria um grande impacto eco-
nômico tanto na queda de produção nos territórios quanto no fim do tráfico de pessoas.
Em 1822 o Brasil quase foi fundado como um país sem escravidão e teria sido o 
primeiro país da América do Sul, mas foi a do Chile que aboliu toda forma de escravidão 
em 1823 logo após a sua independência. Nessa época o abolicionismo já era discutido 
mundialmente por movimentos abolicionistas ingleses e estados que já haviam abolido a 
escravidão nos Estados Unidos.
Uma das principais figuras da independência e da institucionalização do Brasil foi 
José Bonifácio que classificava a escravidão como um câncer que destruiu as bases de uma 
sociedade. Seu desejo, entretanto, não se tornou realidade com as oligarquias defendendo 
seus interesses de manutenção do regime escravista. No fim das contas o Brasil foi o último 
país de todo o continente americano a abolir a escravidão.
No período regencial o Brasil sofreu pressões do Reino Unido para abolir o tráfico 
de pessoas. Nesse período surge a expressão “para inglês ver” quando algo é prometido 
sem intenção de ser cumprido, no caso, “para inglês ver” foram as primeiras leis brasileiras 
contra o comércio de africanos, como as leis do Sexagenário e Ventre-livre. Na verdade, 
o efeito foi contrário, os fazendeiros brasileiros passaram a investir cada vez mais nesse 
comércio e ocorreu um aumento de preços pois temiam que o tráfico poderia acabar a 
qualquer momento.
O comércio atlântico de pessoas negras é progressivamente combatido com forte 
pressão britânica, incluindo o uso da força contra navios e chega ao fim em 1856. Ele foi 
37UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
substituído, porém, pelo comércio interno entre diferentes regiões do Brasil que transforma 
o comércio de pessoas em um fenômeno nacional. A isso soma-se a Guerra do Paraguai, 
quando milhares de soldados negros retornaram vitoriosos corriam o risco de voltar à condi-
ção de escravidão. O movimento abolicionista brasileiro vai ter grande impulso com a soma 
desses dois contextos.
A professora Ângela Alonso no livro flores votos e balas, o movimento abolicionista 
foi essencial para exercer pressão para exigir pressão e exigir o fim da escravidão no Brasil. 
A coroa não podia se indispor com as principais oligarquias promovendo a escravidão. 
Essas por sua vez, tinham interesse na manutenção do escravismo e dominavam políticos 
marcada pelo voto censitário. Já a revolta contra a escravidão levava repressão com o uso 
da força, com pouca simpatia popular. Desta forma, o movimento abolicionista, sabendo da 
falta de popularidade das repressões aumentava sua pressão ao Governo.
Algumas figuras abolicionistas são bem conhecidas, como o poeta Castro Alves, a 
maestrina Chiquinha Gonzaga e o diplomata Joaquim Nabuco, dentre outros. De grande 
importância para a época foram os abolicionistas negros, que eram usados de exemplo na 
prática de como as políticas do país não os beneficiavam.
Um abolicionista negro famoso foi Luiz Gama, filho de uma negra livre e pai branco. 
Mesmo tendo nascido livre foi escravizado aos 10 anos de idade, situação que durou até os 
seus 17. Após ter passado pela escravidão, Luiz Gama conseguiu se alfabetizar e se tornou 
advogado, defendendo outros negros gratuitamente. Outro exemplo foi José do Patrocínio, 
filho de um clérigo branco com uma negra escravizada. Patrocínio cresceu como liberto, 
protegido pelo pai e formou-se em farmácia. Outro abolicionista negro foi André Rebouças, 
engenheiro que hoje é homenageado com o nome de locais em diversas cidades brasilei-
ras. Em comum os três atuaram como jornalistas, escrevendo panfletos e sátiras e criando 
jornais abolicionistas para colocar a sociedade brasileira contra a escravidão.
O fim da escravidão no Brasil foi um processo demorado que sofreu resistência e foi 
consequência de pressão popular com diversos movimentos organizados e manifestações 
culturais e sociais contra o escravismo.
Os Estados Unidos têm uma história particular em que a escravidão era legalizada no 
sul do país e ao norte fora abolida logo após a independência ou era pouco presente e abolida 
na primeira metade do século XIX. Isso permite compararmos hoje, mais de 150 anos depois 
do fim da escravidão nos Estados Unidos os contrastes entre as regiões livres e as com escra-
vidão. O IDH (índice de desenvolvimento humano) é uma medida comparativa para classificar 
diferentes regiões pelos critérios de expectativa de vida, escolaridade e renda por pessoa. O 
IDH nos fornece um parâmetro objetivo sobre o desenvolvimento de cada sociedade.
38UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
 
No primeiro mapa dos Estados Unidos quanto mais clara a cor do mapa menor o 
IDH. No segundo mapa vemos onde era e não era legal a escravidão nos Estados Unidos 
em 1861. Perceba que os antigos estados escravistas são hoje os estados com menor IDH. 
Também esses estados são os que possuem o menor índice de mobilidade social, onde 
a chance de alguém melhorar sua condição de vida por seus próprios esforços é menor. 
Estes estados também estão entre os com maior índice de pobreza nos Estados Unidos.
Esse exemplo americano é para percebermos que a escravidão gerou o seu legado 
na sociedade contemporânea, não só nos EUA, mas também em todos os países que 
tiveram a escravidão como instrumento de mão-de-obra em seu território, entre ele o Brasil. 
Esse legado da escravidão e seus modelos de sociedade autoritária e de economia pouco 
liberal dura até hoje, inclusive no Brasil.
39UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
2. O MAIOR LEGADO DA ESCRAVIDÃO: O RACISMO
“Não é de bom tom puxar o assunto da cor”, pois, afinal de contas, “em casa de 
enforcado não se fala em corda”.
Oracy Nogueira
A desigualdade social é um fenômeno mundial na sociedade contemporânea e éreflexo da má distribuição de renda. Não é novidade para ninguém que o Brasil é um país 
onde muitos têm muito pouco e poucos têm muito. Hoje estamos entre os dez países entre 
os mais desiguais do mundo. Metade da população é negra, mas mesmo assim, o negro 
tem cinco vezes mais chances de ser analfabeto que um branco.
Oracy Nogueira, em sua obra “Preconceito racial de marca e preconceito racial 
de origem” analisa o racismo através de um olhar sociológico e se orienta no sentido de 
desvendar o estado das relações entre os componentes brancos e negros da população 
brasileira[1].
O autor faz uma análise entre o racismo no Brasil e nos Estados Unidos da América 
a partir de análises sociológicas e antropológicas e utiliza como método os tipos ideias de 
Weber. Ele apresenta em seus estudos que Estados Unidos e Brasil representam dois tipos 
de situações raciais, o de origem e o de marca.
Analisando as obras brasileiras sobre o assunto, percebe-se que muitos tentaram 
negar ou subestimar o preconceito racial existente no nosso país. Até mesmo hoje em dia 
é possível ver essa ideia. Nas redes sociais existe uma enxurrada de argumentos racistas, 
40UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
mas, também é possível ver a negação do racismo em livros como é o caso do livro “Não 
somos racistas” de Ali Kamel, atual diretor geral de jornalismo da Rede Globo. Essa ideia 
de Kamel não é novidade na intelectualidade brasileira.
Voltando a Nogueira, sua obra aponta também para a intensidade do racismo, onde 
nos Estados Unidos o racismo era explícito havendo, inclusive, diversas leis que separa-
vam brancos e negros na sociedade, já no Brasil, leis racistas também existiram, em menor 
quantidade e o racismo se apresentou de forma implícita. Desta forma, Nogueira chamou 
o racismo explícito norte-americano de racismo de origem, e sua versão brasileira, mais 
implícita de racismo de marca.
Entende-se racismo de marca como preconceito de cor, uma vez que está associa-
do ao fenótipo[2] do indivíduo, já o de origem está relacionado a um preconceito ligado à 
genealogia do indivíduo.
Primeiro é necessário compreender o preconceito racial como uma disposi-
ção (ou atitude) desfavorável, culturalmente condicionada, em relação aos 
membros de uma população, aos quais se têm como estigmatizados, seja 
devido à aparência, seja devido a toda ou parte da ascendência étnica que 
se lhes atribui ou reconhece. (NOGUEIRA: 1998).
Sendo o racismo uma disposição desfavorável a alguém ou pela aparência ou pela 
etnia, ou pela cultura, explicaremos esse racismo de duas formas, já anunciadas aqui: 01) 
quando o preconceito de raça se apresenta em relação à aparência da pessoa, quando 
toma os traços físicos do indivíduo, a fisionomia, os gestos, o sotaque, é nomeado como 
racismo de marca, mas; 02) quando apenas a suposição de que este indivíduo descende de 
certo grupo étnico para que sofra as consequências do preconceito, denomina-se, racismo 
de origem.
A atuação entre essas duas formas de racismo é diferente. O preconceito de marca 
se apresenta com o desprezo direcionado àquele que sofre o preconceito, enquanto que 
o de origem é marcado pela exclusão total dos membros do grupo atingido, no caso aqui 
especificado, dos negros. Isto é, no Brasil, cujo preconceito é o de marca, conforme Oracy 
Nogueira, um negro teria dificuldades em participar de certo grupo, como por exemplo, 
um clube recreativo. Os representantes do clube, normalmente de classe média, brancos 
se manifestam contrários à sua admissão, entretanto, se esse indivíduo de pele negra 
contrabalançar a suposta desvantagem da cor da pele apresentando vantagens inegáveis 
como superioridade intelectual, diploma de curso superior, boa profissão e boa condição 
econômica, além de outras qualidades, pode ser aceito mais facilmente, abrindo-lhe uma 
exceção.
41UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
Já nos Estados Unidos, ocorre o oposto, as restrições que são impostas aos negros 
são mais amplas e aceitas, independentemente das condições pessoais como nível esco-
lar, econômico e cultural. O preconceito racial nos Estados Unidos se apresenta da mesma 
forma a um operário e a um doutor. O negro naquele país será escanteado para bairros 
exclusivos para negros, mesmo que hoje não haja uma lei que determine isso, é cultural 
aceitar que a população negra não deva morar no bairro de brancos. Até há algumas déca-
das os negros não poderiam frequentar as mesmas escolas, faculdades, hospitais, ônibus, 
que os brancos. Também não poderiam aguardar na mesma sala de espera que os brancos 
e aeroportos, não poderiam beber no mesmo bebedouro ou utilizar o mesmo banheiro. Até 
mesmo igrejas que não aceitavam negros era comum por lá.
O preconceito de marca varia subjetivamente, a relação entre quem pratica e sofre 
preconceito é sempre subjetiva. O brasileiro olha o indivíduo negro e através da tonalidade 
de sua pele exerce seu preconceito. Pessoas de pele mais escura sofre mais preconceito 
que as pessoas de pele menos escura, desta forma, frases como “você não é negro, mas 
sim moreno” são comuns, pois, tenta-se clarear a pessoa, como se ser negro com uma pele 
mais escura não fosse bom. É bom lembrarmos que isso acontece largamente no Brasil de 
forma inconsciente, pois as pessoas que dizem tais frases não se percebem como racistas, 
e, portanto, não percebem que tal frase apresenta a tonalidade da pele do negro como algo 
que prioriza tons de pele mais claros.
Quando o preconceito é de marca podemos perceber que quando alguém que se 
gosta é negro (amigo ou familiar) o julgamento sobre essa pessoa sofre variação e frases 
como “ele é negro, mas é um cara legal”, “é negro, mas é inteligente” ou ainda “é negro de 
alma branca” mostram subjetividade do julgamento. Talvez a frase mais emblemática seja 
“negro de alma branca”, pois a palavra “negro” foi há muito utilizada como sinônimo para 
algo ruim: “peste negra”, “alma negra”, “livro negro”, etc., logo, o negro que se tem afeição 
teria “alma branca”, pois a cor branca é associada a coisas boas, mas, negro não.
Com o racismo de origem isso não ocorre, pois, não importa ao preconceituoso 
a tonalidade da pele do mesmo, frases como “ele não é negro, ele é moreno” não fazem 
sentido, pois o que importa é a ascendência do indivíduo. Nos Estados Unidos o grupo 
sofre preconceito por questões hereditárias.
Nos Estados Unidos [...] o branqueamento, pela miscigenação, por mais com-
pleto que seja, não implica incorporação do mestiço ao grupo branco. Mesmo 
de cabelos sedosos e loiros, pele [branca], nariz afilado, lábios finos, olhos 
verdes, sem nenhum [traço] característico que se possa considerar como ne-
groide e, mesmo, lhe sendo impossível, biologicamente, produzir uma des-
cendência negroide, ‘por mais esforço que faça, para todos os efeitos sociais, 
o mestiço continuará sendo um ‘negro’. (NOGUEIRA: 1998).
42UNIDADE II O Negro no Brasil: Abolição e seu Legado
 Se você for descendente de negros, você sofrerá preconceito. Se você for filho 
de um pai negro e uma mãe branca e nascer com a pele branca, sofrerá com o racismo, 
pois, o que importa ao racismo de origem é, como o nome sugere, sua origem negra, e não 
somente a cor de sua pele. É assim que, nos Estados Unidos, o negro é definido.
No Brasil essa ideia é inconcebível, pois, mesmo sendo filho de negros, se a pessoa 
é branca, se os traços são de pessoas brancas, essa pessoa não passa por preconceitos 
referentes à sua cor. O racismo no brasil está ligado à cor da pele, nos Estados Unidos, à 
sua origem.
Nogueira cita uma situação de uma mulher branca de ascendência negra que foi, 
através de um anúncio, empregada como secretária. Durante seis meses trabalhou e havia 
sido considerada uma funcionária eficiente, então, resolveu revelar sua verdadeira identi-
dade como descendente de negros, acreditando que seria aceita por sua eficiência. Sua 
confissão poderia

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