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AN02FREV001/REV 4.0 1 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA Portal Educação CURSO DE LOGOTERAPIA Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação AN02FREV001/REV 4.0 2 CURSO DE LOGOTERAPIA MÓDULO I Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou distribuição do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências Bibliográficas. AN02FREV001/REV 4.0 3 SUMÁRIO MÓDULO I 1 INTRODUÇÃO À LOGOTERAPIA 1.1 A BIOGRAFIA DE UM SOBREVIVENTE 1.2 O QUE É LOGOTERAPIA? 1.3 A BUSCA DE SENTIDO COMO MOTIVAÇÃO HUMANA 1.4 PATOLOGIAS DECORRENTES DO VÁCUO EXISTENCIAL MÓDULO II 2 ANÁLISE DAS BASES CIENTÍFICAS E FILOSÓFICAS DA LOGOTERAPIA 2.1 FENOMENOLOGIA 2.2 EXISTENCIALISMO 2.3 PSICANÁLISE 2.4 FUNDAMENTOS ANTROPOLÓGICOS MÓDULO III 3 PRINCIPAIS CONCEITOS DA LOGOTERAPIA 3.1 VONTADE DE SENTIDO 3.2 VONTADE DE LIBERDADE 3.3 VÁCUO EXISTENCIAL 3.4 AUTOTRANSCENDÊNCIA 3.5 NOODINÂMICA 3.6 ENCONTRO MÓDULO IV 4 PATOLOGIAS DERIVADAS DA AUSÊNCIA DE SENTIDO 5 O USO DE RECURSOS LOGOTERAPÊUTICOS EM EMPRESAS 6 LOGOTERAPIA E EDUCAÇÃO 7 LOGOTERAPIA E ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL AN02FREV001/REV 4.0 4 8 LOGOTERAPIA, PROMOÇÃO DE SAÚDE E QUALIDADE DE VIDA 9 APRESENTAÇÃO DE TÉCNICAS LOGOTERAPÊUTICAS E CASOS CLÍNICOS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AN02FREV001/REV 4.0 5 MÓDULO I 1 INTRODUÇÃO À LOGOTERAPIA A logoterapia foi uma doutrina criada no século XX pelo médico Viktor Frankl, que afirmava ser a busca de um sentido para a vida o motor básico da existência humana. Sua vida teve influência determinante sobre sua obra, de forma que não seria possível compreender o sistema teórico por ele criado, sem retomarmos os acontecimentos de sua história pessoal (XAUSA, 1988). 1.1 A BIOGRAFIA DE UM SOBREVIVENTE Viktor Emil Frankl nasceu em Viena, no dia 26 de março de 1905. Foi educado dentro dos costumes judaicos, em uma atmosfera de grande afeto familiar. Filho de Gabriel e Elsa, ambos da Tchecoslováquia, era o segundo dos três filhos deste casal (XAUSA, 1988). AN02FREV001/REV 4.0 6 FIGURA 1 – VIKTOR FRANKL (AO MEIO) E SEUS IRMÃOS FONTE: Disponível em: <http://www.viktorandimovie.com/ResizeImage.aspx?h=500&w=600&img=%2fWebsites%2fviktorandi %2fPhotoGallery%2f1378861%2f0074_frankl.jpg&0 Acesso em: 01 jul. 2013. Desde muito cedo, já manifestava interesse pelo que viria se tornar a essência de sua teoria: o sentido da vida. Era um jovem insatisfeito com as teorias mecanicistas que vigoravam na época e conta que, aos 13 anos, um professor de história natural afirmou que a vida dos organismos, incluindo os homens, nada mais era que uma soma de processos físico-químicos, ao que, muito indignado, respondeu: “qual então o sentido da vida?”. Esse mesmo questionamento também foi tema de uma conferência que pronunciou, ainda na adolescência, aos 16 anos, na Comunidade de Trabalho Filosófica (FRANKL, 1990). No entreguerras, interessou-se pela leitura dos filósofos da natureza e pela psicanálise. Chegou a se corresponder com Sigmund Freud e, em uma dessas correspondências, anexou um manuscrito “sobre a origem da afirmação e negação mímicas”. Para surpresa de Frankl, Freud encaminhou o manuscrito para o periódico Internationale Zeitschrift für Psychoanalyse, que o publicou no ano de 1924. Frankl tinha então 19 anos (FRANKL, 1990). AN02FREV001/REV 4.0 7 FIGURA 2 – SIGMUND FREUD FONTE: Disponível em: <http://www.clarku.edu/micro/freudcentennial/images/freud_215.jpg> Acesso em: 01 jul. 2013. Suas leituras da psicanálise freudiana, no entanto, levaram-no com o tempo a tecer questionamentos em torno do que ele entendia como uma visão determinista e mecanicista do homem. Para Frankl (GOMES, 1992), ao colocar o homem como um ser guiado por seus impulsos sexuais e em busca do prazer, a psicanálise retirava-lhe a possibilidade de se sobrepor aos condicionamentos e modificar a própria vida. O distanciamento da teoria freudiana, no entanto, não fez com que Frankl (XAUSA, 1988) perdesse o respeito e admiração pela obra de seu mestre, tendo guardado consigo cartas e casos clínicos compartilhados com Freud e que posteriormente foram confiscadas pelos nazistas. Além de Freud, Viktor Frankl aproximou-se do também vienense Alfred Adler, fundador da psicologia individual. No seio dessa teoria, Frankl encontrou elementos mais próximos daquilo que o estimulava: uma compreensão integrada de AN02FREV001/REV 4.0 8 homem e a questão do sentido da vida (XAUSA, 1988). E assim como Freud, Adler determinou a publicação de outro trabalho científico de Frankl na Internationale Zeitschrift für Individualpsychologie, publicado em 1925 (FRANKL, 1990). FIGURA 3 – ALFRED ADLER FONTE: Disponível em: <http://www.alfredadler.org/assets/images/alfred%20adler%20photo%20small.jpg> Acesso em: 01 jul.2013. Em 1926, quando tinha 21 anos, Frankl pronunciou uma conferência sobre o sentido da vida, tendo como contexto a situação social da geração que sobrevivera à Primeira Guerra. No mesmo ano, no III Congresso Internacional de Psicologia Individual, apresentou um trabalho intitulado A neurose como expressão e meio, que abordava alguns casos de neurose como uma necessidade profunda de um significado para a vida. Ao mesmo tempo em que aí se encontra a semente originária da logoterapia, esse episódio lhe rendeu o afastamento de Adler, que não tolerou a nova teoria (XAUSA, 1988). AN02FREV001/REV 4.0 9 A partir de 1927, sua história registra novos rumos: Após a expulsão da Associação de Psicologia Individual o ponto principal da minha esfera de interesse transferiu-se da teoria para a prática. Eu organizei – primeiro em Viena e depois segundo o modelo de Viena, sem seis outras cidades – os chamados postos de aconselhamento da juventude, nos quais jovens em dificuldades psicológicas eram aconselhados gratuitamente. Como conselheiros apresentaram-se a mim, sem receber vencimentos, homens como August Aichhorn, Wexberg e Dreikurs, mas também Charlotte Buhler declarou-se pronta, como todos os outros, a receber em casa os que procuravam aconselhamento. Em 1930 organizei pela primeira vez uma ação especial, por época da distribuição dos certificados escolares, que teve como resultado que pela primeira vez em Viena, por muitos anos, não se registrou o suicídio de nenhum estudante (FRANKL, 1990, p. 120). FIGURA 4 – FRANKL COMO TERAPEUTA FONTE: Disponível em: <http://www.viktorandimovie.com/websites/viktorandi/images/0030_frankl_200.jpg> Acesso em: 01 jul.2013. Esse aconselhamento sistemático de jovens e suas conferências em organizações da juventude trabalhadora socialista fizeram com que acumulasse grande experiência e realizasse contatos acadêmicosestimulantes com grandes nomes que se interessaram por sua atuação, como foi o caso de Wilhelm Reich e Otto Potzl, que se tornou um amigo paternal para Frankl (FRANKL, 1990). AN02FREV001/REV 4.0 10 Foi também nessa época que Frankl se deu conta de que seu pai também realizara um serviço de assistência aos jovens. Se em sua adolescência achava aquilo extremamente tedioso, naquele momento surpreendeu-se, percebendo que realizava então trabalho muito semelhante (FRANKL, 1990). Em 1930, Frankl, que já tinha um doutorado em Filosofia, licenciou-se em Medicina e trabalhou no setor de neurologia, na Universidade de Viena. Seu anterior interesse pela psicanálise e pelo atendimento a pessoas em sofrimento o dirigiu para as especialidades da neurologia e da psiquiatria (FRANKL, 1990). Em 1937, estabeleceu uma clínica particular, mas não pôde mantê-la por muito tempo, já que não tardou para que as tropas de Hitler invadissem a Áustria, onde com a ajuda de seu amigo Otto Potzl, sabotava a eutanásia de psicóticos organizada pelas autoridades nazistas. Na época, a Gestapo, a polícia nazista, proibia a admissão de pacientes com doença mental e Viktor burlava essa regra, emitindo laudos falsos, que “transformavam” esquizofrenias em simples afasias (FRANKL, 1990). FIGURA 5 - VIKTOR E TILLY FONTE: Disponível em: <http://www.bookjive.com/wiki/images/thumb/9/97/ViktorFrankl4.jpg/200px-ViktorFrankl4.jpg> Acesso em: 01 jul.2013. Durante a Segunda Guerra, Viktor Frankl conseguiu um visto para emigrar para os Estados Unidos. Sua irmã emigrou para a Austrália e seu irmão, para a Itália, onde foi capturado pelos soldados da SS. Esse visto seria a chance de escapar e estabelecer uma vida ao lado de Tilly Grosser, com quem havia se casado AN02FREV001/REV 4.0 11 em 1941. No entanto, tomado de dúvidas, Frankl decidiu não abandonar seus pais sozinhos, em meio aos horrores da guerra. Foi nesse momento que começou a escrever sua primeira versão da obra Psicologia Médica (FRANKL, 1990). Em 1942, foi enviado para o campo de concentração de Auschwitz. Seus pais e Tilly também se tornaram prisioneiros, mas nunca mais teve contato com qualquer um deles. O trem avançava muito devagar, diria-se que estava indeciso, como se quisesse evitar seus passageiros, como se fosse possível, a atroz constatação: Auschwitz! À medida que ia amanhecendo faziam-se visíveis os perfis do imenso campo: a larga extensão de cerca das várias fileiras de arames farpados; a torre de observação, os focos e as intermináveis colunas de esfarrapadas figuras humanas, pardas à luz grisácea do amanhecer, arrastando-se pelos desolados campos para um destino desconhecido. Ouviam-se vozes isoladas e silvos de mando, mas não sabíamos o que queriam dizer. Minha imaginação me levava a ver forcas com gente pendurada nelas. Estremeci de horror, mas não andava muito desencaminhado, já que passo a passo nós fomos acostumando a um horror imenso e terrível (FRANKL apud XAUSA, 1988, p. 30-31). Esse trecho faz parte do livro Em Busca de Sentido – um psicólogo no campo de concentração, onde Frankl registrou sua experiência nos quatro campos de concentração pelos quais passou em um período de três anos. Para a escrita do livro, Frankl permaneceu em uma espécie de isolamento catártico, ao longo de nove dias, ditando sua história. De início, ele não queria publicar o livro em seu nome, por ser contra exibições sobre as experiências vividas. No entanto, seus amigos acabaram o convencendo de que uma publicação anônima perderia o valor (FRANKL, 1990). Com esse relato, o teórico não tinha como objetivo descrever os grandes horrores de um campo de concentração, o que, segundo ele, já estavam sendo bastante denunciados, mas sim as pequenas torturas, tentando responder de que modo se refletia na mente do prisioneiro médio a vida cotidiana dos campos. “Médio”, porque Frankl estava preocupado com o prisioneiro comum e desconhecido e não com aqueles, denominados Capos, que dispunham de privilégios e colaboravam com os guardas dos campos (FRANKL, 1984). Frankl reconheceu que essa vivência nos campos de concentração foi o experimentum crucis, ou seja, o experimento decisivo para o desenvolvimento de sua teoria (FRANKL, 1984). AN02FREV001/REV 4.0 12 Ali pôde verificar e validar existencialmente que aqueles capazes de se orientar para o futuro tinham maiores chances de sobreviver aos horrores vivenciados cotidianamente ou, em outras palavras, quem tinha um sentido pelo qual viver era capaz de suportar qualquer sofrimento (FRANKL, 1984). Desde o primeiro momento nos campos, Frankl, com olhar curioso, observava as reações de seus companheiros e as suas próprias. Conta que quando seu transporte se aproximou do campo em que ficariam ele e seus companheiros foram confrontados com um primeiro choque: tratava-se de Auschwitz, com suas câmeras de gás, fornos crematórios e execuções em massa (FRANKL, 1984). FIGURA 6 – ENTRADA DO CAMPO DE AUSCHWITZ FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/-omoZjiuHBJs/TyMYctmr- fI/AAAAAAAAAi0/187Ty75VtYo/s1600/trabajo.jpg> Acesso em: 01 jul.2013. De imediato, as bagagens de todos foram tomadas e os prisioneiros, separados em dois grupos. Para o primeiro deles, foram enviados aqueles capacitados para o trabalho; para o segundo, os doentes e incapacitados. Essa primeira seleção já significou a sentença de morte para cerca de 90% dos que estavam no mesmo transporte que Frankl, já que este segundo grupo – o de incapacitados e doentes – foi encaminhado diretamente para um dos prédios crematórios, identificado em várias línguas como “casa de banho” (FRANKL, 1984). AN02FREV001/REV 4.0 13 O grupo diminuto que restou, e do qual Frankl fazia parte, acabou também tendo seus pertences pessoais, como joias e relógios, recolhidos pelos guardas da SS. Foi nesse momento que Frankl perdeu o manuscrito de Psicologia Médica, que até então havia conseguido ocultar (FRANKL, 1984). Depois desse choque inicial, Frankl observou que, aos poucos, os prisioneiros passavam a vivenciar uma profunda apatia. Com o passar dos dias, qualquer esperança de sair daquela situação se desfazia e era possível observar um humor negro entre os presos. A apatia pelo próprio sofrimento e dos demais ficava cada vez mais evidente e o que nos primeiros dias causava compadecimento, revolta e nojo já não parecia atingir ninguém (FRANKL, 1984). Passavam a se sobrepor os instintos primitivos, como à fome e o único objetivo passava a ser o de preservar a própria vida. O momento da rala sopa diária era ansiosamente aguardado e falava-se e fantasiava-se sobre comidas a todo o tempo (FRANKL, 1984). Tudo aquilo que fugisse ao propósito de sobreviver era descartado como supérfluo, o que levava a um retraimento frente às questões intelectuais e culturais, sendo que quase nada interessava aos presos, exceto a religião e a política. Era marcante também a inibição sexual dos presos (FRANKL, 1984). É importante lembrar que a apatia também encontrava suas causas fisiológicas na fome, na falta de sono e na ausência de tóxicos como a nicotina e a cafeína (FRANKL, 1984). Outro fator que afetava o humor do preso era o fato de que se antes era “alguém”, passava então a ser tratado como “ninguém”, apenas um número. O próprio Frankl deixara de ser um médico respeitado para se tornar o prisioneiro 119.104. Sobre essa desumanização que ocorria nos campos, Frankl relata: (...) certa vez estive trabalhando numa estrada de ferro, em plena tempestade de neve. A tempestade seria razão suficiente parainterromper o trabalho; e para não sentir muito frio, aplico todo o ímpeto em ‘entupir’ com pedras os espaços debaixo dos trilhos. Paro por um momento, a fim de tomar fôlego, e me apoio na ferramenta. Por infelicidade, no mesmo instante o guarda se vira em minha direção e pensa naturalmente que estou vadiando. O que me dói agora, apesar de tudo e a despeito da insensibilidade crescente, não é a perspectiva de alguma carraspana ou bordoada, e sim o fato de que para aquele guarda essa figura decrépita e esfarrapada, que só de longe lembra vagamente um ser humano, não merece sequer uma repreensão. Ao invés, ele não faz mais do que levantar uma pedra do chão e, como se estivesse brincando, atira-a em minha direção. Desse jeito - foi o que senti - chama-se a atenção de um bicho AN02FREV001/REV 4.0 14 qualquer, assim se adverte o animal doméstico de seu ‘dever’, o animal com que se tem uma relação tão superficial que ‘nem’ se chega a castigá-lo (1984, p. 17). Outra vivência dos prisioneiros dos campos era a de falta de futuro. A partir do momento em que se entrava em algum campo de concentração nazista, não havia mais certeza sobre quanto tempo ali permaneceria e como aquilo terminaria. O problema é que sem um ponto fixo no futuro, o homem não consegue propriamente existir. Vive-se apenas o presente, sem um rumo. A consequência disso, é que o homem não consegue se propor a nenhuma missão e a vida passa a carecer de sentido (FRANKL, 1984). Para Frankl ter um objetivo marcado no futuro forma justamente o que ele chama de apoio espiritual, capaz de preservar o homem de sucumbir. No campo de concentração, os prisioneiros que tinham um objetivo marcado no futuro, apresentavam mais chances de suportar a experiência. Ele próprio estava convencido de que para sua sobrevivência contribuíra sua decisão, ainda no campo, de reescrever o manuscrito perdido de Psicologia Médica, o que fez utilizando-se de um toco de lápis e do verso em branco de formulários da SS (FRANKL, 1984). Além de se apoiar em sua obra, Frankl também encontrava no amor de Tilly e suas lembranças, assim como na esperança de reencontrá-la, um motivo para sobreviver: Passo a compreender que a pessoa, mesmo que nada mais lhe reste neste mundo, pode tornar-se bem-aventurada - ainda que somente por alguns momentos – entregando-se interiormente à imagem da pessoa amada. Na pior situação exterior que se possa imaginar, numa situação em que a pessoa não pode realizar-se através de alguma conquista, numa situação em que sua conquista pode consistir unicamente num sofrimento reto, num sofrimento de cabeça erguida, nesta situação a pessoa pode realizar-se na contemplação amorosa da imagem espiritual que ela porta dentro de si da pessoa amada (1984, p. 25) Para aqueles que não conseguiam encontrar um sentido para a existência dentro dos campos, – seja pela realização de uma obra, do amor a alguém ou da capacidade de suportar dignamente o sofrimento - o esgotamento físico se somava, não raro, à perda dos princípios morais. E diante disso, Frankl se dirigia o seguinte questionamento: AN02FREV001/REV 4.0 15 Onde fica a liberdade humana? Não haveria ali um mínimo de liberdade interior (geistg) no comportamento, na atitude frente às condições ambientais ali encontradas? Será que a pessoa nada mais é que o resultado da sua constituição física, da sua disposição caracterológica e da sua situação social? E, mais particularmente, será que as reações anímicas da pessoa a esse ambiente socialmente condicionado do campo de concentração estariam de fato evidenciando que ela nem pode fugir às influências desta forma de existência às quais foi submetida à força? Precisa ela necessariamente sucumbir a essas influências? Será que ela não pode reagir de outro modo, "por força das circunstâncias” (1984, p. 41) Como resposta a essa questão, Frankl percebeu que alguns poucos prisioneiros mostravam-se capazes de agir “fora do esquema”, de forma que era possível privá-los de tudo, menos da liberdade de assumir uma atitude alternativa frente às condições dadas por aquele ambiente. Havia os que iam de barracão em barracão consolando os demais. Da mesma forma, o próprio Frankl, mesmo correndo riscos de infecção, voluntariou-se para prestar serviços como médico, durante uma epidemia de tifo exantemático em um dos campos. “Sabendo que no grupo de trabalho poderia morrer em pouco tempo, preferiu ajudar os seus camaradas como médico, pois, com isso, daria algum sentido à sua morte” (XAUSA, 1988, p. 36). Foi assim, com essa rica bagagem de observações que Frankl foi libertado do campo de concentração, ao fim da guerra. No entanto, nesse primeiro momento após a libertação, o mundo parecia ainda não causar impressão, como se o sentimento de alegria tivesse sido desaprendido (FRANKL, 1984). O corpo, por outro lado, corria em satisfazer suas necessidades. A primeira delas, a de comer, era buscada com voracidade. A segunda, curiosamente, era a de falar sem pausas sobre as experiências vividas nos campos (FRANKL, 1984). Somente com o passar dos dias, os sentimentos voltavam a aparecer. Entre eles, a amargura e a decepção e a revolta, contra a inércia e superficialidade das outras pessoas, incapazes de alcançar a gravidade das experiências vividas nos campos. Além dos próprios horrores que experimentou, Frankl perdeu seus pais, seu irmão e sua primeira esposa, que não sobreviveram aos campos em que estiveram. O trabalho passou a ser a única atividade que o interessava e assim iniciou a escrita de uma terceira versão de Psicologia Médica (FRANKL, 1984). Frankl retornou às suas atividades como chefe de um departamento de neurologia da Policlínica, onde conheceu sua segunda esposa, Eleonore, com quem se casou em 1947 (XAUSA, 1988). AN02FREV001/REV 4.0 16 FIGURA 7 – FRANKL E ELEONORE FONTE: Disponível em: <http://www.viktorandimovie.com/ResizeImage.aspx?h=500&w=600&img=%2fWebsites%2fviktorandi %2fPhotoGallery%2f1378861%2ffrankl_wedding_1948.jpg&0>. Acesso em: 01 jul.2013. Foi a partir daí que sua doutrina, a logoterapia, teve um desenvolvimento pleno. Apesar de seus postulados já terem sido formulados por Frankl antes da guerra, foi só após a experiência nos campos e sua libertação que a logoterapia ganhou forma. Passou a lecionar nas décadas seguintes e realizar publicações científicas que conquistaram públicos do mundo todo. A edição inglesa de O Homem em Busca de Sentido, por exemplo, vendeu milhões de exemplares, sendo considerado um best-seller (XAUSA, 1988). Em abril de 1984, Viktor Frankl veio ao Brasil, onde realizou uma conferência durante o I Encontro Latino-Americano Humanístico Existencial, na cidade de Porto Alegre. A partir disso, foram organizadas a Sociedade Brasileira de Logoterapia e várias outras associações voltadas para essa forma de psicoterapia (RODRIGUES, 1991). Figura 8. Viktor e Eleonore AN02FREV001/REV 4.0 17 1.2 O QUE É LOGOTERAPIA? FIGURA 8 – “PRA QUE A GENTE ESTÁ NO MUNDO?” FONTE: Disponível em: <https://encrypted- tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcRbZDWW2AJfqT4rPTaa- cSa32gZO6JME4xlzXUvy38McEnXLdG6>. Acesso em: 01 jul.2013. A tirinha acima, utilizando-se do humor, apresenta uma preocupação inerente à vida humana. Como se questiona a personagem Mafalda, “afinal de contas para que a gente está no mundo?” ou, em outras palavras, qual o sentido da existência? É com base nessa questão que se construiu a doutrina de Viktor Frankl. O termo grego “logos” significa sentido e, assim, é possível entender logoterapiacomo o “tratamento através do sentido” (RODRIGUES, 1991). AN02FREV001/REV 4.0 18 Essa escola teve origem na cidade de Viena, nas décadas de 20 e 30, quando Viktor Frankl percebeu que as pessoas, principalmente as mais jovens, vindas das ruínas da Primeira Guerra Mundial, estavam terrivelmente abaladas e que só poderiam se recuperar quando se dedicassem a encontrar um sentido para suas vidas (RODRIGUES, 1991). Foi nesse momento que Frankl se afastou das escolas freudiana e adleriana e se aproximou do “movimento existencial de psiquiatria” (ou Escola Existencial), que representava um complexo conjunto de teorias, abarcando a filosofia, a antropologia e a psicologia. Ali encontrou considerações sobre a dimensão espiritual do homem; uma dimensão que o leva a buscar sentido e realizar valores por meio do seu trabalho, de seu poder criativo, do amor ou do sofrimento (RODRIGUES, 1991). Mas apesar dessa teoria encontrar suas sementes já nesse período, é só após o experimentum crucis da Segunda Guerra, em que foi prisioneiro dos campos de concentração nazistas, que Frankl consolidou sua teoria (XAUSA, 1988). Durante os três anos como o prisioneiro 119.104, ele pôde comprovar que o homem, apesar dos horrores que enfrenta, tem maiores chances de sobreviver, a partir do momento em que encontra um sentido, um objetivo pelo qual dedicar sua vida. Aqueles que perdiam a capacidade de enxergar um sentido, que sentiam que nada mais os esperava para além do sofrimento, desesperavam-se, adoeciam ou se jogavam aos fios de arame farpado eletrificados, que cercavam os campos (RODRIGUES, 1991). A logoterapia se volta para o sentido da existência humana, bem como para a busca de cada homem por este sentido (FRANKL, 2003a). Mas o que seria esse sentido da existência humana, este “sentido para a vida”? Primeiramente, Frankl (1984) esclarece que não cabe pensar “no” sentido “da” vida, assim como seria impossível dizer qual a melhor jogada do xadrez, sem saber quais as condições particulares de cada partida e a personalidade singular do adversário. O sentido se alteraria de pessoa para pessoa e de momento a momento, podendo apenas ser encarado frente a situações concretas. O sentido é aquilo que é preciso fazer diante de cada situação que se apresenta diante do homem. Mas além de uma necessidade, o sentido é uma AN02FREV001/REV 4.0 19 possibilidade e, assim que realizado, fica guardado e protegido no passado na forma de uma realidade (FRANKL, 2003b). Langle (1992) explica que o sentido pode ser visto como um modo específico de dar forma às situações que se apresentam. E ao “dar forma”, o homem, fazendo uso de sua liberdade condicional, precisa decidir dentre as possibilidades oferecidas, diferenciar, planejar e agir. Uma vida com sentido é aquela em que o homem, em sua forma única e de modo criativo, coloca-se a serviço da proposta de cada hora. Assim, o sentido é uma forma de envolvimento, de engajamento dedicado a uma dada tarefa ou causa (LANGLE, 1992). E onde a logoterapia se enquadra dentro das diferentes formas de psicoterapia? Sobre isso, Lukas (1989) explica que a logoterapia foi chamada de Terceira Escola de Viena, em comparação às escolas criadas por dois outros vienenses: Sigmund Freud, criador da psicanálise, considerada da Primeira Escola de Viena, e Alfred Adler, fundador da psicologia individual, tida como a Segunda Escola de psicoterapia. Já nos compêndios americanos, a logoterapia é entendida como pertencente à “terceira força”. A primeira força se refere à psicanálise, a segunda ao behaviorismo e a terceira, à psiquiatria existencial. Essa última ficou conhecida na Europa como Psicologia Humanística, termo criado por Charlotte Buhler, e abarcaria a Gestalt, a psicoterapia do diálogo, o psicodrama, a análise transacional e a logoterapia (LUKAS, 1989). Os esquemas abaixo, apresentados por Lukas (1989) são bastante ilustrativos para que se compreenda o modo como as diferentes escolas de psicoterapia se distribuem. Enquanto no primeiro desenho (gráfico 1), as três escolas (psicanálise, psicologia individual e logoterapia) se mostram equivalentes, no segundo (gráfico 2), referente à classificação norte-americana, há diferença nas tendências e número de adeptos de cada escola. Nos Estados Unidos, a psicanálise passa, cada vez mais, para o segundo plano; a terapia comportamental ocupa uma posição média e a psicologia humanística inunda o mercado. AN02FREV001/REV 4.0 20 GRÁFICO 1. Classificação das três escolas de Viena, com os nomes de seus fundadores e as respectivas datas de nascimento e morte 1 (LUKAS, 1989) 1 A edição do livro de Lukas, que contém este esquema, data de 1989, não contendo assim a data de falecimento de Frankl, em 1997. AN02FREV001/REV 4.0 21 GRÁFICO 2. Classificação norte-americana da psicoterapia (LUKAS, 1989) Apesar de integrar a psicologia humanística, a logoterapia se distingue em um ponto fundamental. Enquanto os defensores da psicologia humanística defendem que a autorrealização é a mais alta meta da existência humana, a logoterapia se utiliza do conceito de autotranscendência, pelo entendimento de que a autorrealização não seria uma meta da existência, como um fim em si mesmo, mas sim uma consequência da capacidade do homem de encontrar um sentido fora de si (LUKAS, 1989). A terapia que tem como base a doutrina de Frankl não objetiva chegar a um sentido por meio do tratamento, mas o contrário: seria pelo sentido que o tratamento se daria (FRANKL, 1989). Frankl (1989) pontua que as abordagens terapêuticas tradicionais não consideram o valor do sentido e de sua busca para a existência humana e, assim, só AN02FREV001/REV 4.0 22 podem oferecer um auxílio incompleto. A logoterapia teria assim um papel complementar às outras terapias, possibilitando que o homem receba cuidado em todas as suas dimensões. Esse cuidado oferecido, no entanto, não implica que o logoterapeuta dê um sentido para a vida de seus pacientes. Isso porque o sentido só pode ser encontrado pela própria pessoa e em algo externo a ela. Mas apesar de não ser possível a nenhum psicoterapeuta indicar ao paciente um sentido, ele pode lhe afirmar que a vida tem um sentido, mesmo nas situações mais degradantes (FRANKL, 1978) A teoria da Gestalt, fundada por Max Wertheimer e Kurt Lewin, ajuda a compreender porque esse sentido deve ser encontrado, como algo objetivo, e não apenas dado, atribuído ao bel-prazer. O encontro do sentido está em estreita relação com a percepção da realidade. Haveria um desafio inerente a cada situação e este teria uma qualidade objetiva. Assim, não se trata de injetar sentido, mas sim extrair um sentido das coisas e situações. Olhada deste ponto de vista, a vida não se assemelha àquele ‘teste de Rohrschach’, em que o indivíduo recebe uma folha cheia de manchas de tinta e deve dizer que figura elas lhe sugerem, a fim de que essa figura, projetada pelo âmbito subjetivo da pessoa, forneça ao psicólogo algum indício sobre o caráter e o inconsciente da pessoa em observação. A vida assemelha-se antes a um quebra-cabeça, em que é preciso achar a figura do ciclista; temos que virar o desenho de um lado para outro, até acharmos a sua silhueta, escondida de cabeça para baixo entre as árvores atrás da capela. Ele está lá: é uma realidade objetiva (FRANKL, 2003a, p. 28) Além disso, a logoterapia se diferencia das demais escolas de psicoterapia, por não poupar o paciente de uma confrontação como sentido específico que ele deve realizar. O logoterapeuta auxilia o paciente no percurso de busca desse sentido, que está ante o ser, sem se confundir com ele (FRANKL, 1989). AN02FREV001/REV 4.0 23 1.3 A BUSCA DE SENTIDO COMO MOTIVAÇÃO HUMANA FIGURA 8 – O SENTIDO DA VIDA FONTE: Disponível em: <http://1.bp.blogspot.com/- u6ltJk87OsA/Tfl7RnTqJPI/AAAAAAAABZY/_EWoAE3nNMs/s1600/sentido1.gif> Acesso em: 01 jul. 2013. Para Frankl (2003a), a busca de sentido constitui uma motivação primária na vida dos homens, além de constituir aquilo que o diferencia dos outros animais. Com o apoio de pesquisas realizadas na Europa e em sua clínica em Viena, constatou que a grande maioria das pessoas precisa de “algo” em função do qual viver e que, diferente do que formulam as teorias psicodinâmicas, essa necessidade não se trataria de uma racionalização secundária: A busca do indivíduo por um sentido é uma força primordial em sua vida, e não uma "racionalização secundária" de impulsos instintivos. Esse sentido é exclusivo e específico, uma vez que precisa e somente pode ser cumprido por aquela determinada pessoa. Somente então esse sentido assume uma importância que possa satisfazer à sua própria vontade de sentido. Alguns autores sustentam que sentidos e valores são ‘ainda mais que mecanismos de defesa, formações reativas e sublimações’. Mas, pelo que toca a mim, eu Imagem 7. AN02FREV001/REV 4.0 24 não estaria disposto a viver função dos meus ‘mecanismos de defesa’. Nem tampouco estaria pronto a morrer simplesmente por amor às minhas ‘formações reativas’, O que acontece, porém, é que o ser humano é capaz de viver e até de morrer por seus ideais e valores! (FRANKL, 1984, p. 58) Além disso, a busca de um sentido independe, na maior parte dos casos, da satisfação de outras necessidades humanas. No caso de situações de extrema necessidade, é provável que as pessoas busquem primeiramente satisfazer suas necessidades básicas e, só a partir daí, dedicarem-se a buscar um sentido. No entanto, no outro oposto, uma vida de abundância não garante que um sentido seja buscado e encontrado (FRANKL, 1990). FIGURA 9 – QUAL O SENTIDO DA VIDA? FONTE: Disponível em: <http://2.bp.blogspot.com/_imUKCPla1_c/S6Y8OuPfm2I/AAAAAAAABe8/5yLySRsf2FM/s400/calvin+s entido_de_vida1.jpg> Acesso em: 01 jul. 2013. Na busca por um sentido, o homem conta com sua consciência, chamada por Frankl (1990) de “órgão do sentido”. Ela teria a função não só de descobrir o sentido inerente a cada situação, mas também vetar aqueles meios que abrem mão da responsabilidade para realização do sentido. AN02FREV001/REV 4.0 25 Em alguns casos, a vontade de sentido pode ser frustrada. Quando isso ocorre, temos o que a logoterapia denomina de frustração existencial, que pode resultar nas chamadas neuroses noogênicas, que teriam origem em problemas existenciais (FRANKL, 1989). Apesar de terem muitas vezes sintomas semelhantes, é muito importante não confundir uma frustração existencial com uma patologia. A preocupação humana a respeito do sentido da vida e se essa vale ser vivida constitui uma angústia existencial, não uma doença mental e decidir calar essa questão implica calar algo essencialmente humano (FRANKL, 1990). Diferente das neuroses psicogênicas, relacionadas aos complexos e conflitos no sentido tradicional, a neurose noogênica estaria mais ligada aos conflitos de natureza moral e à sensação de falta de sentido, ou seja, está voltada aos problemas de ordem existencial (FRANKL, 1990). Frankl explica que, em alguns casos, a sensação de falta de sentido pode não ser a origem de doenças, mas justamente um de seus sintomas – e isso vale tanto para doenças psíquicas quanto para as doenças somáticas. Como exemplo, aponta as depressões endógenas, que encontrariam em componentes bioquímicos e hereditários sua causa e teriam como sintoma a sensação de que a vida não possui qualquer sentido. Nesses casos, frisa o autor, a logoterapia isolada não teria condições de auxiliar o paciente, sendo necessário lançar mão de uma farmacologia adequada. Mas ela teria uma função complementar às demais formas de tratamento, possuindo um efeito terapêutico mesmo que não se trate de uma neurose noogênica (FRANKL, 1990). Diante disso, é importante que se faça corretamente o diagnóstico diferencial entre depressão endógena, psicogênica ou noogênica para empreender uma intervenção adequada, considerando as terapêuticas disponíveis e a necessidade de olhar para o homem, considerando suas diferentes dimensões: somática, psíquica e espiritual (FRANKL, 1990). AN02FREV001/REV 4.0 26 1.4 PATOLOGIAS DECORRENTES DO VÁCUO EXISTENCIAL Frankl (1990) afirma que cada época tem sua própria forma de "neurose coletiva" e sua própria psicoterapia para lidar com ela. Baseado nas notícias e pesquisas que lhe chegavam de centros universitários, atentando-se às principais queixas de seus pacientes, concluiu que a neurose de nosso tempo seria o vácuo existencial, estado marcado por uma sensação de falta de sentido, de futilidade e absurdo diante da vida. Os principais sintomas do vácuo existencial constituiriam a chamada “tríade da neurose de massa”, ou seja, a depressão, a agressão e a toxicodependência. No caso da depressão, Frankl (2003a) discute sua manifestação extrema, o suicídio. Em uma pesquisa realizada na Idaho State University, um de seus doutorandos entrevistou 60 jovens que haviam tentado cometer suicídio. Em 85% desses casos, o entrevistado referiu que sua vida carecia de sentido. E, dentre estes, 93% tinham um ambiente socioeconômico favorável e uma boa relação com sua família. FIGURA 10 – FRUSTRAÇÃO EXISTENCIAL FONTE: Disponível em: <https://encrypted- tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcQ7NWTp- UGpzOLgFbknTye2dAXG1beDNXhxWUgJ_u0tIEX3dJy_zw>. Acesso em: 01 jul. 2013. Assim, a falta de um sentido para a vida aparece como um forte elemento de motivação para dar fim à própria vida. Obviamente, nem todo suicídio terá esta AN02FREV001/REV 4.0 27 razão, mas, para Frankl (1990), ele certamente não seria cometido, caso a pessoa tivesse algo pelo qual viver. No caso das agressões e, mais marcadamente, da criminalidade, Black e Gregson, de uma universidade na Nova Zelândia, encontraram que quanto maior a sensação de falta de sentido maior a predisposição para o comportamento agressivo. Por outro lado, quando um sentido é encontrado, especialmente aquele que emerge de uma tarefa em comum, as agressões são abandonadas. Foi o que constatou a socióloga Carolyn Wood Sherif, ao estudar um acampamento de escoteiros: as agressões recíprocas que ocorriam entre três grupos foram abandonadas, a partir do momento em que os jovens precisaram se mobilizar para desatolar um carro que transportava alimentos (FRANKL, 1990). Por fim, sobre a toxicodependência, um estudo com 416 estudantes, obteve correlação significativa entre o grau da sensação de falta de sentido com o índice de envolvimento com drogas. Em outra pesquisa, realizada por Annemarie Forstmeyerm na Universidade do oeste da Califórnia, 90% dos casos crônicos de alcoolismo investigados revelaram uma forte sensação de falta de sentido (FRANKL, 1990). Nowlis levantou o problema sobre porque os estudantes seriam atraídos pela droga e achou que uma das razões, com frequência afirmada por eles, era o ‘desejo de encontrar um significado para a vida. Uma pesquisa sobre 455 estudantes da área de San Diego,conduzida por Judd e outros para a National Comission of Marijuana and Drug Abuse, concluiu que os consumidores de marijuana e alucinógenos denotavam ser preocupados pela falta de sentido para suas vidas mais que os não consumidores (FRANKL, 1989, p. 21) AN02FREV001/REV 4.0 28 FIGURA 11 - TOXICODEPENDÊNCIA FONTE: Disponível em: http://www.boasnoticias.pt/img/drogas-11.jpg>. Acesso em: 01 jul. 2013. E quais seriam as causas dessa "neurose coletiva"? Para Frankl (1990), ao contrário dos animais, o homem não possui instintos que determinem o que ele precisa fazer e, ao contrário dos homens de tempos antigos, as tradições não lhes dizem mais o que devem fazer. O resultado disso é que os homens de nosso tempo parecem não saber mais o que querem e, com facilidade, aderem ao que querem dele (casos de totalitarismo) ou apenas querem o que os outros fazem (casos de conformismo). Além das patologias propriamente ditas, o vácuo existencial também se evidencia em diversas formas de fuga, observáveis no homem contemporâneo. Frente ao tédio, algumas pessoas dedicam-se excessivamente ao trabalho, ao divertimento; refugiam-se nos romances, na televisão, nas atividades esportivas. São meios de obter pseudossentidos que alienam o homem de sua consciência e liberdade (XAUSA, 1988). FIM DO MÓDULO I
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